Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FÁTIMA GOMES | ||
Descritores: | GARANTIA BANCÁRIA GARANTIA AUTÓNOMA CLÁUSULA ON FIRST DEMAND ALTERAÇÃO ANORMAL DAS CIRCUNSTÂNCIAS FORÇA MAIOR FACTOS NOTÓRIOS NEGÓCIO INDIRETO BANCO GARANTIA DE BOA EXECUÇÃO DO CONTRATO RENOVAÇÃO DO NEGÓCIO PAGAMENTO CÂMARA DE COMÉRCIO INTERNACIONAL CONTRATO DE CONSÓRCIO CONTRATO DE EMPREITADA BOA FÉ PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE | ||
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Data do Acordão: | 04/20/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I. Na presente acção estão em causa duas contragarantias prestadas pelo um banco (contragarante) a pedido de um ordenador, emitidas em favor de outro banco (garante de 1º plano), o que envolve uma operação de garantia indirecta, em que se visava assegurar obrigações assumidas pelo ordenador em contrato de empreitada relativo à construção de dois novos terminais de passageiros no aeroporto internacional Tripoli, na Líbia em favor do dono da obra (beneficiário), destinando-se a assegurar determinadas obrigações emergentes deste contrato base. II. Tais contra-garantias foram prestadas sob a forma de garantia bancária autónoma, à primeira solicitação, e discute-se se no seio âmbito de pode obviar à sua renovação com fundamento da guerra do Iraque e seus eventos subsequentes. III. As contragarantias foram emitidas ao abrigo do princípio da autonomia contratual com aplicação das Regras Uniformes para Garantias de Pagamento URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI e das Regras e Usos Uniformes para os Créditos Documentários denominadas UCP 600 publicadas pela Câmara do Comércio Internacional. IV. Tendo sido solicitada ao contragarante a sua renovação ou pagamento, na formulação “extende or pay”, já depois da situação social conturbada que se vivia na Líbia e da qual o contragarante estava ciente - e também era facto notório -, e não tendo este recusado a sua renovação, com oposição do ordenador, deve considerar-se que a renovação não pode produzir efeitos sobre o ordenador – art.º 334.º, 762.º e 437.º do CC -, como causa de força maior; V. A causa de força maior impeditiva da manutenção das obrigações do ordenador estava contratualiza no contrato com dono da obra, nos termos do qual as garantias e contra-garantias estavam previstas e com base no qual foram negociadas e emitidas. O contrato de empreitada previa ele próprio a possibilidade de existência de causa de força maior e regulava os seus efeitos (cf. factos provados 14, 17 e 26); a prestação das garantias de adiantamento e boa execução resultavam desse mesmo contrato como obrigação das AA.; se o contrato admite que as obrigações dele decorrentes para as partes ficam suspensas por causa de força maior, deve essa força maior, repercutir-se nas obrigações de prestação de garantia, seja pela devolução das prestadas, seja pela não renovação. VI. O direito não pode ser indiferente a eventos como a guerra e, por isso, se tem admitido que a garantia bancária autónoma não é totalmente autónoma nem automática. VII. A exigência de renovação ou pagamento tem ainda de ser efectuada de acordo com os termos acordados, nomeadamente beneficiário, valor, data de validade, devendo o contragarante averiguar se tais elementos estavam em conformidade com o pedido recebido, recusando-o se tal desconformidade lhe fosse evidente, por dispor de prova líquida. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1. ODEBRECHT PORTUGAL, S.A., actualmente BENTO PEDROSO CONSTRUÇÕES, S.A., e ODEBRECHT ENGINEERING AND CONSTRUCTION LIMITED, intentaram acção declarativa, na forma de processo comum, contra: - BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A. (1ºR); - LIBYAN CIVIL AVIATION AUTHORITY (em português Autoridade Líbia de Aviação Civil), pessoa colectiva de direito público …. (2ºR); - TRANSPORTATION PROJECTS BOARD (T.P.B.), (em português Conselho de Projecto de Transportes), pessoa colectiva de direito público …. (3ºR); - ARAB BANKING CORPORATION (B.S.C.), com sede no …. (4ºR); - ABC INTERNATIONAL BANK, PLC, com sede em …. (5ºR). Formulam o seguinte pedido: “Termos em que deve apresente acção ser julgada procedente por provada, e consequentemente: 1. Relativamente à Garantia de Adiantamento a. Ser o 1º Réu condenado a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30.10.2014, a contra-garantia bancária número …658, prestada a favor do 4º Réu (“Arab Banking Corporation”) e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões de renovação, concretamente a indicada no artigo 151.º supra, bem como não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contragarantia ou da carta de crédito n.º …..004, prestada a favor da 2ª Ré; b. Na eventualidade de o 1.º Réu, após 30.10.2014, voltar a emitir ou prorrogar a contra-garantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, então deve determinar-se que aquele não pode exigir de qualquer uma das Autoras o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das Autoras seja titular, ou co-titular, junto do 1.º Réu, bem como de proceder à compensação desses montantes com quaisquer créditos de que qualquer uma das Autoras seja titular perante o 1.º Réu. 2. Relativamente à Garantia de Boa Execução dos Trabalhos a. Ser o 1º Réu condenado a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30.4.2015, a contra-garantia bancária número ….649, prestada a favor do 5º Réu (“ABC International Bank PLC”) e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões de renovação, concretamente a indicada no artigo 185.º supra, bem como não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contra-garantia ou da carta de crédito n.º …..005, prestada a favor da 2ª Ré; b. Na eventualidade de o 1.º Réu, após 30.4.2015, voltar a emitir ou prorrogar a contra-garantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, então deve determinar-se que aquele não pode exigir de qualquer uma das Autoras o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das Autoras seja titular, ou co-titular, junto do 1.º Réu, bem como de proceder à compensação desses montantes com quaisquer créditos de que qualquer uma das Autoras seja titular perante o 1.º Réu.”. Alegam, essencialmente, ter sido celebrado, em 3-2-2008, entre um consórcio, que integrava 2ª A., e o Estado …. um contrato de empreitada, sendo a obra a realizar no aeroporto internacional Tripoli, na Líbia; nessa sequência, o R. Banco Comercial Português, S.A., e por conta da 2ª A., prestou, perante o 4º R., uma contra-garantia bancária à primeira solicitação, válida até 1-10-2009, a “Contra-Garantia BCP ….”, e, perante o 5º R., uma outra contra-garantia bancária à primeira solicitação, válida até 31-10-2009, a “Contra-Garantia BCP …., renováveis consoante as garantias – cartas de crédito …004 e ….005 - também o fossem; entretanto, em 2011, teve lugar um conflito armado na ….., que se prolongou por vários anos, o que impediu a conclusão da obra; por isso, a 2ª A. solicitou que as autoridades … diligenciassem pelo cancelamento daquelas garantias, entendendo que tal justifica a não renovação das mesmas. 2. Entretanto, ainda antes da apresentação de qualquer contestação, as AA. desistiram da instância relativamente às rés LIBYAN CIVIL AVIATION AUTHORITY, TRANSPORTATION PROJECTS BOARD (T.P.B.), ARAB BANKING CORPORATION (B.S.C.) e ABC INTERNATIONAL BANK, PLC, desistência homologada por sentença de fls. 911. 3. Na contestação o R. BCP, SA, para além de invocar a nulidade da citação, por falta de documentos, impugnou parte da factualidade alegada, concluindo pela improcedência da acção. E, em reconvenção, pede a condenação das AA. no pagamento das comissões devidas pela emissão e manutenção das garantias bancárias números ….658 e …649 já vencidas na presente data, no montante total de capital de € 747.566,07, a que acrescem os juros de mora vencidos, que se computam na presente data em € 16.986,84, e os juros vincendos, até integral pagamento, e ainda no pagamento das comissões vincendas enquanto as referidas garantias bancárias não se mostrarem canceladas, montantes acrescidos dos juros de mora que se vencerem até integral pagamento, e, bem assim, da comissão pela recuperação dos valores em dívida, nos termos do disposto no artigo 9º do Decreto-Lei nº 58/2013, de 8 de Maio, a incidir sobre as prestações que se encontrem vencidas e em incumprimento. Pretende, deste modo, o pagamento das comissões devidas até efectivo e integral cancelamento das garantias prestadas. 4. As AA. replicaram invocando, entre o mais, a caducidade das garantias. 5. Entretanto, o R. BCP, S.A., apresentou articulado superveniente, alegando que, a 13-10-2016, recebeu a confirmação do Arab Banking Corporation (B.S.C.) do cancelamento da contragarantia bancária com o nº …658 e a 14-10-2016, recebeu do ABC International Banque, PLC, confirmação do cancelamento da contragarantia bancária com o nº …649, não havendo, assim, lugar a prestações vincendas, pelo que se tornou inútil, nesta parte, o pedido formulado. 6. Seguiu-se a prolação do despacho saneador no qual, conhecendo-se imediatamente do mérito da causa, se decidiu: a) Condenar o réu o R. a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30-10-2014, a contragarantia bancária nº …658, prestada a favor de “Arab Banking Corporation” e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões de renovação às autoras a partir dessa data, bem como não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contragarantia ou da carta de crédito nº ….004; b) Na eventualidade de o R. Banco BCP, S.A., após 30-10-2014, voltar a emitir ou prorrogar a contragarantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, determinar que o R. não pode exigir de qualquer uma das AA. o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das AA. seja titular, ou co-titular, ou de proceder à compensação desse montantes com quaisquer créditos de que qualquer uma das AA. seja titular perante o Banco R.; c) Condenar o R. a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30-4- 2015, a contragarantia bancária nº ….649, prestada a favor de “ABC International Bank PLC” e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões posteriormente a essa data, bem como a não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contragarantia ou da carta de crédito nº …..005; d) Na eventualidade de o R. Banco BCP, S.A., após 30-4-2015, voltar a emitir ou prorrogar a contragarantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, determinar que o R. não pode exigir de qualquer uma das AA. o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das AA. seja titular, ou co-titular, junto do banco R., bem como de proceder à compensação desses montantes com quaisquer créditos e que qualquer uma das AA. seja titular perante o Banco R.; e) Absolver as AA. dos pedidos contra elas formulados pelo R. Banco BCP, S.A., em sede de reconvenção. 7. Inconformado, o R. Banco Comercial Português, S.A., interpôs recurso, na sequência do qual foi proferido acórdão – fls 1345 e ss. – que anulou a sentença proferida, devendo os autos prosseguir os respectivos termos com produção de prova. 8. Entretanto, e aquando da identificação do objecto do litígio - fls 1448 – decidiu-se, atento o articulado superveniente supra referido, julgar extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, relativamente ao pedido de pagamento de prestações vincendas formulado na reconvenção. 9. E, realizado o julgamento, foi proferida sentença na qual se decidiu novamente nos seguintes termos: “Pelo exposto, tudo ponderado e nos termos das disposições legais acima referidas, julgo procedente esta acção intentada pelas autoras ODEBRECHT PORTUGAL, S.A. (actualmente tendo retomado a anterior designação de “Bento Pedroso Construções, S.A.”) e ODEBRECHT ENGINEERING AND CONSTRUCTION LIMITED, e improcedente a reconvenção formulada pelo réu BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A. e, em consequência, decido: a) Condenar o réu a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30.10.2014, a contra-garantia bancária número …658, prestada a favor de “Arab Banking Corporation” e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões de renovação às autoras a partir dessa data, bem como não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contragarantia ou da carta de crédito n.º …004; b) Na eventualidade de o réu Banco BCP SA, após 30.10.2014, voltar a emitir ou prorrogar a contra-garantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, determinar que o réu não pode exigir de qualquer uma das Autoras o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das Autoras seja titular, ou co-titular, ou de proceder à compensação desses montantes com quaisquer créditos de que qualquer uma das Autoras seja titular perante o Banco Réu; c) Condenar o réu a não voltar a emitir ou prorrogar, após a data de 30.04.2015, a contra-garantia bancária número …649, prestada a favor de “ABC International Bank PLC” e, concomitantemente, não cobrar quaisquer comissões posteriormente a essa data, bem como não pagar quaisquer quantias, ou disponibilizar quaisquer fundos, ao abrigo da referida contra-garantia ou da carta de crédito n.º …..005; d) Na eventualidade de o réu Banco BCP SA, após 30.04.2015, voltar a emitir ou prorrogar a contra-garantia, e/ou efectuar qualquer pagamento no âmbito da mesma ou da carta de crédito, determinar que o réu não pode exigir de qualquer uma das Autoras o reembolso dos montantes que porventura venha a desembolsar, ficando, em consequência, também impedido, para o efeito, de debitar qualquer conta bancária de que qualquer uma das Autoras seja titular, ou co-titular, junto do banco réu, bem como de proceder à compensação desses montantes com quaisquer créditos de que qualquer uma das Autoras seja titular perante o Banco réu; e) Absolver as autoras dos pedidos contra elas formuladas pelo réu Banco BCP em sede de reconvenção. Custas da acção e da reconvenção pelo réu Banco BCP SA. Valor da acção e da reconvenção: o fixado a fls. 1511, ou seja, 764.552,91 euros.” 10. Inconformado, o R. interpôs recurso de apelação em que impugnou a matéria de facto fixada e o direito aplicável. O recurso foi conhecido pelo TR….., que alterou parte da matéria de facto, aditando ponto, e decidiu nos seguintes termos: “Acorda-se, em face do exposto, e julgando a apelação parcialmente procedente, em: - julgar a acção improcedente, absolvendo-se o R. Banco Comercial Português, S.A., dos pedidos formulados; - e julgando a reconvenção parcialmente procedente, condenar a 2ª A. a pagar ao R. Banco Comercial Português, S.A., as comissões devidas, nos termos acordados, pela emissão e manutenção das garantias nº ….658 e …649, vencidas desde 26-2-2015 e 15-4-2015, consoante discriminado a fls 1039, até 13-10-2016 e 14-10-2016, respectivamente, obrigação pela qual a 1ª A. responde como fiadora. - absolver as AA. do demais pedido. Custas da acção pelas AA., e da reconvenção por ambas as partes, atento o respectivo decaimento.” 11. Inconformada com a decisão dela apresentou a A. recurso de revista, no qual formula as seguintes conclusões (transcrição): 1. A presente acção tem por objecto duas contra-garantias prestadas pelo ora Recorrido a pedido da ora 2ª Recorrente, inseridas numa operação de garantia indirecta e visando assegurar obrigações assumidas pela ora 2ª Recorrente em contrato de empreitada relativo à construção de dois novos terminais de passageiros no aeroporto internacional de Tripoli, na Líbia. 2. Tais contra-garantias foram prestadas sob a forma de garantia bancária autónoma, à primeira solicitação, figura jurídica muitíssimo difundida no comércio internacional e interno, e, por isso, socialmente típica, não obstante a sua aticipicidade legal. 3. Sem prejuízo da referida atipicidade legal, a validade da garantia autónoma baseia-se, desde logo, no princípio da liberdade contratual, no caso da ordem jurídica portuguesa expressamente acolhido no artigo 405º do Código Civil, e o seu enquadramento jurídico deve ser efectuado com recurso ao regime geral das obrigações e tendo ainda em consideração o seu enfoque jurisprudencial e doutrinal e as práticas bancárias nacionais e internacionais que conjugadamente acabam por traduzir verdadeiros usos bancários. 4. Com relevância para o enquadramento jurídico das garantias dos autos e exercício dos direitos e obrigações associados às mesmas relevam também as Regras Uniformes para Garantias de Pagamento e as Regras e Usos Uniformes para os Créditos Documentários denominadas UCP 600 publicadas pela Câmara do Comércio Internacional e ainda o disposto no artigo 406.º, n.º 1 do Código Civil (que estabelece o princípio geral do pontual cumprimento do contrato), no artigo 334.º do Código Civil (que considera ilegítimo o exercício de um direito quando o titular exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito), e no artigo 762.º do Código Civil (que determina que no cumprimento da obrigação, assim como no exercício do direito correspondente, devem as partes proceder de boa fé). 5. A questão central em discussão nos autos é a de saber se, não obstante a natureza das garantias prestadas pelo Recorrido, a sua automaticidade não é absoluta e ilimitada e se, no caso concreto, se impõe estabelecer limites à respectiva exigibilidade e manutenção. 6. Em sede de enquadramento jurídico da questão acima enunciada, o Acórdão recorrido fez referência expressa a que tanto a doutrina como a jurisprudência admitem que em «casos excepcionais e de todo intoleráveis para o Direito» «possa o garante recusar, a solicitação do ordenante, o cumprimento – parecendo poder incluir-se aqui também a renovação da garantia» mas, surpreendentemente face a tal enquadramento e à matéria dada como provada, concluiu em sentido oposto no caso concreto, revogando a sentença de 1ª instância, 7. Com o que fez uma incorrecta interpretação e aplicação do Direito aos factos provados nos autos, violando o disposto nos arts. 406.º, n.º 1, 334.º e 762.º do CC. 8. Em síntese, a decisão de improcedência da acção proferida pelo Tribunal recorrido resulta de: (i) uma aparente diferenciação entre situações de “pedido de pagamento” e “pedido de renovação/manutenção em vigor” das garantias bancárias; (ii) do argumento puramente formal defendido pelo banco Recorrido segundo o qual o texto das contra-garantias determina que a libertação das responsabilidades do Recorrido depende de o mesmo ser desonerado pelos beneficiários e no não reconhecimento de que a situação de conflito que deflagrou na …. determinou a extinção das contra-garantias; e (iii) de uma total desconsideração dos vícios formais e das fraudes verificadas nos pedidos de chamamento das contra-garantias. 9. Ao contrário do sustentado pelo Tribunal recorrido, não há qualquer razão para tratar diferentemente “pedidos de pagamento” e “pedidos de renovação/manutenção em vigor” das garantias bancárias dos autos uma vez que as mesmas se encontravam sujeitas à regra de “extend or pay”, ou seja, perante um pedido de renovação das mesmas o garante estava obrigado, caso as não renovasse, a proceder ao pagamento dos valores garantidos, pelo que os pedidos de renovação se reconduziam necessariamente a pedidos de pagamento. 10.O argumento formal de que o texto das contra-garantias determinava que a libertação das responsabilidades do garante dependia de desoneração pelo beneficiário, desconsidera, por completo, que, pese embora a sua natureza autónoma (isto é, independente do negócio garantido), encontra-se há muito assente na doutrina e jurisprudência que as garantias bancárias não correspondem a um negócio abstracto mas antes causal, desempenhando uma função económico-social de garantia, em última análise, de determinadas obrigações emergentes do contrato base, encontrando-se vinculadas às obrigações cujo cumprimento se destinam a assegurar. 11. Donde, tornando-se ilícita ou desaparecendo a causa que lhes está subjacente, ficam as garantias igualmente afectadas na sua validade ou existência. 12. Conforme também é sustentado pela jurisprudência e pela doutrina, em decorrência do carácter causal das garantias bancárias, existe um dever de recusa de pagamento ou renovação de uma garantia bancária quando tenham desaparecido as respectivas causas ou ocorrido alterações de circunstâncias ou motivos de força maior. 13. Assim, apesar da natureza autónoma destas garantias, não podem as mesmas ser exigidas de forma ilimitada ou irrestrita pelos respectivos beneficiários e, conforme advogam a jurisprudência e a doutrina, em situações de fraude manifesta, de abuso evidente por parte do beneficiário ou de extinção da obrigação garantida mais do que uma possibilidade de recusar o cumprimento ou renovação da garantia, tem o garante o dever de não o fazer. 14. Dito por outras palavras, o banco garante, mais do que pode, deve recusar a renovação ou o pagamento de uma garantia se estiver na posse de prova líquida e inequívoca de um comportamento abusivo do credor, que engloba o dolo, o abuso de direito, má-fé e, de um modo geral, as situações em que se demonstre estarem preenchidos os pressupostos que obstam à execução da garantia. 15. No caso dos autos, é clara a natureza causal das obrigações envolvidas: por um lado, a Carta de Crédito …..004 e a contra-garantia ….658 emitida pelo Recorrido visaram garantir o reembolso da parte do preço do contrato de empreitada objecto de adiantamento e, por outro, a Carta de Crédito …..005 e a contra-garantia …649 emitida pelo Recorrido visaram garantir a boa execução dos trabalhos acordados no contrato de empreitada. 16. Não obstante tal natureza causal, o Tribunal recorrido aderindo à argumentação formalista do Recorrido e de perspectiva puramente interbancária, desconsiderou por completo um conjunto de factos provados nos autos dos quais resulta inequivocamente (i) a ligação entre as contra-garantias prestadas pelo Recorrido e o contrato de empreitada dos autos, (ii) os efeitos do conflito na Líbia no contrato de empreitada, que conduziram ao desaparecimento da causa subjacente à emissão e manutenção das contra-garantias dos autos. 17. A factualidade provada nos autos (maxime a constante dos factos provados n.ºs 14, 17, 18, 23, 26, 31 a 37, 42 a 70, 73, 75 a 85, 88 e 89), não pode deixar de se reconduzir a uma situação de impossibilidade absoluta e definitiva do próprio objecto do contrato de empreitada e concretamente da prestação a que o consórcio se obrigou e à qual se destinava a Garantia de Boa Execução, sublinhando-se que, conforme era do conhecimento do Recorrido, o aeroporto de Tripoli foi ocupado por milícias e o estaleiro da obra totalmente destruído. 18. Assim, considerando os factos provados – que constituem prova inequívoca de desaparecimento do contrato-base em resultado do conflito na Líbia -, os pedidos de renovação ou realização de pagamentos no âmbito das garantias bancárias emitidas ao abrigo do contrato de empreitada revestem carácter abusivo pelo desaparecimento da respectiva causa subjacente, resultando inequívoco que o Recorrido, tendo conhecimento dos factos em causa, tinha não apenas o poder mas o dever de recusar a renovação ou o pagamento das contra-garantias e, consequentemente, de não cobrar quaisquer comissões relativas às mesmas. 19. Cumpre ainda ter presente que o contrato de empreitada celebrado pelo consórcio liderado pela 2ª Recorrente ficou totalmente desfigurado, cingindo-se a um molho de papéis sem qualquer adesão à brutal realidade dos factos, enquadramento que é igualmente do conhecimento de todas as partes envolvidas na estrutura de garantias, incluindo o Recorrido. 20. Segundo a doutrina e jurisprudência indicadas no corpo destas alegações que citam os arts. 334.º e 762.º do CC, a ocorrência de eventos bélicos, como alteração anormal das circunstâncias, pode ser considerada como um dos casos em que os bancos garantes se podem opor à execução da garantia autónoma, por facto não imputável ao devedor. 21. A tudo o que antecede, acresce ainda que, como ficou provado nos autos (facto provado 67), o contrato base de empreitada ficou suspenso desde 01.03.2011, por causas de força maior, suspensão essa do conhecimento do ora Recorrido, seja porque oportunamente lhe foi dado conhecimento disso mesmo, seja porque os eventos na Líbia constituem factos notórios do conhecimento do cidadão médio e, por maioria de razão, de instituições de crédito com exposição bancária a projectos em curso no país. 22. A suspensão do contrato base por causa de força maior deve determinar a suspensão das garantias bancárias que lhe estão associadas, paralisação essa que se materializa na proibição quer de renovar as garantias bancárias, quer de realizar quaisquer pagamentos no âmbito das mesmas e de cobrar as respectivas comissões. 23. Seria profundamente injusto e abusivo que, não podendo o devedor cumprir com os termos do contrato por causas que lhe são absolutamente alheias, continuasse ainda assim vinculado a ter de suportar os encargos decorrentes da manutenção de uma garantia bancária ou mesmo assistir à satisfação de um pedido de reembolso no âmbito de um pedido de extend or pay. 24. O Acórdão recorrido ignora também a factualidade provada relativa aos vícios formais e às fraudes verificadas nos pedidos de chamamento das contra-garantias que impediram a sua renovação e determinaram a sua extinção. 25. A este propósito é de notar que o Arab Banking Corporation não requereu, até ao termo de vigência da contragarantia ….658, a renovação ou o pagamento da mesma, o que vale por dizer que não submeteu qualquer pedido de extensão ou pagamento (factos provados 99 a 104), circunstância que, à face do disposto no 22.º da URDG 458, determinou a caducidade da mesma contragarantia, extinguindo-se, consequentemente, os direitos resultantes para o Arab Banking Corporation e as obrigações decorrentes para as Recorrentes do referido negócio. 26. O entendimento referido na conclusão anterior encontra-se aliás em linha com o parecer emitido em 19.11.2014 por AA (cf. doc. 57 junto com a p.i.), e corresponde, de resto, à única interpretação do texto da contragarantia …658 que atribui algum efeito útil ao prazo de vigência estipulado. 27. Por outro lado, os processos de renovação da Carta de Crédito …..004 e da Carta de Crédito ….005 contêm vícios formais que afectam a respectiva validade e, consequentemente, das duas contragarantias emitidas pelo Recorrido, sendo que, no caso da Garantia de Adiantamento, foi o próprio Recorrido quem alertou as Recorrentes para as indicadas discrepâncias, inclusive ao nível da identificação do beneficiário da garantia que alegadamente teria feito o pedido de chamamento. 28. Nos termos do disposto nos artigos 3.º e 9.º das URGD 458, «todas as instruções para a emissão de Garantias e suas alterações, bem como os textos dessas próprias Garantias e alterações devem ser claros e precisos» e «no caso de os documentos não estarem conformes ou dos seus textos não serem condizentes entre si, eles serão recusados.». 29. É ainda de sublinhar que o próprio “Arab Banking Corporation” também suspeitou da genuinidade dos pedidos de renovação, tendo por isso solicitado ao “Sahara Bank” para que este apresentasse o original desses pedidos (doc. 54 junto com a p.i.) e na ausência de uma resposta às várias insistências, o “Arab Banking Corporation”, confirmando as suas suspeitas quanto à existência de fraude, extinguiu em 30.4.2015 as cartas de crédito por si emitidas, do que foi dado conhecimento ao Réu (cf. docs. 6 e 4 juntos com o requerimento de 1.7.2015 apresentado pelas Autoras em cada um dos procedimentos cautelares apensos). 30. A situação de fraude no pedido de chamamento das garantias bancárias coloca o banco garante no dever de recusar esse chamamento, dever esse que o Recorrido não cumpriu. 31. Contra o que antecede não se diga que apenas em 2016, através dos documentos juntos pelo Recorrido com o seu articulado superveniente, foi o Recorrido desonerado das suas obrigações relativamente às contra-garantias que prestou, já que (i) tais documentos contêm tão somente uma confirmação de um cancelamento que já tinha sido efectuado e do qual o Recorrido tinha conhecimento e (ii) independentemente desse documentos, o Recorrido, face à factualidade e evidência do que lhe foi dado conhecimento, tinha o dever de cancelar, por sua iniciativa, as garantias bancárias que emitiu ou de recusar o respectivo pagamento. 32. De resto, contrariamente ao mencionado no Acórdão recorrido que aderiu exclusivamente ao formalismo da tese do banco Recorrido e à óptica da relação deste com os outros bancos beneficiários, não é exacto que o «R. BCP (…) estava obrigado a cumprir o acordado, ou seja, a manter o contrato, enquanto não fosse desonerado pelo respectivo beneficiário» mas sim que o Recorrido apenas seria libertado das suas responsabilidades «depois de o ABC ser ele próprio liberto de todas as suas responsabilidades respeitantes ou relacionadas com a carta de crédito» (- cf. facto provado n.º 128). 33. Assim, na verdade a desoneração do Recorrido nem sequer estava dependente de uma qualquer declaração de desoneração por parte do beneficiário, mas apenas de que o beneficiário estivesse ele próprio liberto das suas responsabilidades. 34. Ora, pelos motivos referidos nos sub-capítulos 4.1, 4.2 e 4.3 que culminaram numa impossibilidade absoluta e definitiva do objecto do contrato de empreitada, os bancos beneficiários das contra-garantias – que não podiam deixar de ter conhecimento dos factos em causa dada a natureza pública e notória dos mesmos – ficaram eles próprios libertos das respectivas responsabilidades e impedidos de, sob pena de actuação abusiva, requerer o pagamento ou renovação das garantias, devendo assim ter-se por necessariamente verificada a desoneração do Recorrido. 35. Assim, havendo prova inequívoca da existência de fraude nos pedidos de renovação das garantias bancárias e de que os bancos beneficiários das mesmas podiam, rectius, deviam recusar tais pedidos, tinha também o Recorrido o dever de recusar a renovação das contra-garantias. 36. A decisão do Tribunal recorrido de julgar parcialmente procedente a reconvenção, condenando as ora Recorrentes no pagamento das comissões até à extinção das garantias bancárias, merece igualmente a maior censura. 37. Desde logo, tal decisão ignora que a suspensão dos contratos de garantia teve lugar por força de providências cautelares decretadas previamente aos presentes autos. 38. Desde a prolação das decisões que decretaram a suspensão das garantias bancárias, relativamente às quais, aliás, o Recorrido não deduziu oposição nem recorreu, ficou suspensa a fonte contratual para a cobrança de quaisquer comissões, não podendo o Recorrido exigir o pagamento de quaisquer comissões uma vez que o direito à sua cobrança – e a correspondente obrigação de pagamento – ficou suspenso, por sentença transitada em julgado. 39. O entendimento do Tribunal recorrido de que proferida a decisão final volta a poder ser exigido o cumprimento das obrigações suspensas não merece acolhimento, pois tendo ocorrido, entretanto, na pendência dos autos, a extinção das garantias bancárias, não há cumprimento que possa voltar a ser exigido. 40. Por outro lado, tal decisão de condenação na reconvenção ignora que a obrigação de pagamento das comissões referente ao período de suspensão dos respectivos contratos de garantia implicaria que as Recorrentes fossem colocadas também numa situação de desequilíbrio, profundamente injusta e abusiva, por força dos prejuízos para si decorrentes, sobretudo considerando os avultadíssimos valores das comissões em questão. 41. A decisão do Tribunal recorrido de que as comissões seriam devidas em resultado de o Recorrido «ter de manter, mesmo durante o período da suspensão, custos com a operação» não tem suporte factual, visto apenas se encontrar provado nos autos que «na fixação do valor da comissão (…) são considerados, essencialmente, (…) custos do risco, custo de capital e custo operacional», não sendo discriminados os valores de tais custos. 42. O pagamento das comissões previstas nos contratos de garantia bancária sub judice consubstancia, nos termos do artigo 1167.º, alínea b), do Código Civil, a retribuição, ao banco garante, pelos valores que este se comprometeu a disponibilizar, à primeira solicitação, aos beneficiários. 43. As comissões destinam-se a remunerar o banco garante pelo facto de, a qualquer momento, ter que entregar aos beneficiários da garantia os valores garantidos, com o consequente ónus (e o risco) de cobrança dos mesmos junto do ordenante. 44. Desde o decretamento da suspensão dos contratos de garantia, o Recorrido não só ficou dispensado, como proibido, de entregar aos beneficiários os valores garantidos, pelo que deixou de correr o risco da entrega aos beneficiários e cobrança, junto da 2.ª Recorrente, daqueles valores, o que ainda se tornou mais evidente face à ordem preliminar decretada pelos tribunais franceses e dirigida à dona da obra. 45. Não podendo as garantias bancárias ser executadas ou prorrogadas, por força das decisões, deixou de existir qualquer razão para o Recorrido cobrar- se de uma remuneração por essas garantias, a qual corresponderia a um pagamento por um serviço que não estava, nem podia estar, a prestar e a uma remuneração por um risco que não estava, nem poderia estar, a assumir, sendo, por isso, inexistente. 46. Também pelo exposto, não assiste ao Recorrido, desde o decretamento das decisões judiciais de suspensão, qualquer direito de cobrança das comissões previstas nos contratos de garantia bancária, sob pena de este, inclusivamente, remunerando-se por um risco inexistente, se constituir numa situação de enriquecimento sem causa face às Recorrentes. 47. Quanto ao eventual custo de capital, além de não se mostrar quantificado, há que dizer que, tendo os contratos de garantia ficado suspensos por força do decretamento das providências, não se compreende se e por que motivo é que o Recorrido terá mantido provisionadas as quantias objecto das garantias bancárias, sendo certo que se o fez fê-lo por sua livre iniciativa. 48. Seja como for, ainda que o Recorrido tivesse de facto essa obrigação, designadamente, ao abrigo das regras aplicáveis à sua actividade, não existe qualquer fundamento contratual, nem extracontratual, para este pretender repercutir na 2.ª Recorrente o seu eventual custo. 49. Não existe qualquer fonte de responsabilidade obrigacional pelo pagamento de quaisquer comissões, não podendo o Recorrido muito menos ao abrigo de um contrato suspenso por decisão judicial, imputar à 2.ª Recorrente um custo decorrente de uma – alegada mas não provada – exigência inerente à sua própria actividade. 50. Donde, se porventura o Recorrido manteve provisionados esses montantes, o eventual custo daí emergente só ao próprio é imputável, porquanto se trata de um custo decorrente da sua actividade financeira e que apenas por sua iniciativa quis manter. 51. Aliás, se fosse exigível que o ordenante pagasse também esse custo, para além das comissões contratualmente devidas a título de remuneração, haveria um duplo recebimento por parte do Recorrido, na medida em que receberia pelo risco assumido de ter que entregar os valores garantidos a terceiro e ter que obter a sua cobrança e, simultaneamente, pelo alegado custo de provisionamento desses mesmos montantes. 52. Por último, quanto aos alegados custos operacionais, além de não se mostrarem quantificados, há que dizer que, encontrando-se suspensos os contratos-fonte, não é possível manterem-se os custos operacionais associados aos mesmos, pelo que, novamente, não tem a 2.ª Recorrente qualquer obrigação de proceder ao pagamento de valores associados a serviços operacionais que necessariamente deixaram de se realizar, sob pena, novamente, se estar perante uma situação de enriquecimento sem causa. 53. Por outro lado, importa sublinhar que nunca se verificaria qualquer situação de responsabilidade extracontratual ao abrigo da qual o Recorrido pudesse exigir o pagamento dos alegados custos operacionais, porquanto não existe qualquer facto ilícito e culposo praticado pelas Recorrentes, cumprindo recordar que estas não pagaram as comissões que o Recorrido tentou cobrar com respaldo em ordens judiciais. 54. De resto, mesmo que se considerasse haver ilícito da parte das Recorrentes – o que só por cautela de patrocínio se concede – este sempre seria um caso de culpa do lesado com exclusão de qualquer indemnização (artigo 570º do Código Civil), uma vez que o Recorrido foi informado, em 30.4.2015, que o “Arab Banking Corporation” havia cancelado as cartas de crédito (cf. Doc. 4 junto com os requerimentos apresentados em 1.7.2015 nos procedimentos cautelares apensos), pelo que só por sua teimosia insistiu em manter as contra-garantias que prestou. 55. Por último, a decisão do Tribunal recorrido de condenar a 1ª Recorrente no pedido reconvencional, considerando que a mesma se teria constituído fiadora das obrigações assumidas pela 2ª Recorrente perante o Recorrido, assenta em errada interpretação do teor da carta conforto junta com a p.i. como doc. 10 e viola o disposto no art. 627.º do Código Civil. 56. Da carta em questão não resulta a prestação de uma garantia pessoal, maxime, uma fiança, dela apenas resultando para a 1ª Recorrente a assunção de uma obrigação de meios, no sentido de desenvolver esforços com vista a tentar proporcionar o efectivo cumprimento pela 2ª Recorrente mdas obrigações por esta assumidas junto do Recorrido, pelo que inexiste título para imputar à 1ª Recorrente responsabilidade pelo pagamento das comissões. Termos em que deve ser concedido provimento ao recurso, revogando-se o Acórdão recorrido e sendo julgada a acção procedente e a reconvenção improcedente, assim se fazendo a costumada Justiça! 12. Foram apresentadas contra-alegações defendendo a manutenção do decidido no acórdão recorrido. Mais se solicita, ao tribunal recorrido: “Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 614º, nºs 1 e 2 do Código de Processo Civil (“CPC”), aplicável ex vi do artigo 666º, nº 1 do CPC, requerer a rectificação do Venerando Acórdão proferido por este Tribunal, na parte em que é omisso quanto às custas do Recurso de Apelação” No acórdão recorrido a condenação em custas (supra transcrita e aqui repetida) foi a seguinte: “Custas da acção pelas AA., e da reconvenção por ambas as partes, atento o respectivo decaimento.” Houve posterior pronúncia do Tribunal recorrido, em conferência, quanto ao pedido de rectificação do acórdão na parte relativa às custas da apelação, nos seguintes termos: “Proferido o acórdão, suscitou o recorrido, nas suas contra-alegações, a questão da sua rectificação quanto a custas. Alegou ser o mesmo omisso relativamente às custas do recurso. E assiste-lhe razão: fixaram-se, atenta a decisão proferida, as custas da acção e da reconvenção; mas omitiu-se a sua fixação quanto ao recurso. Pelo que, e nos termos do disposto nos art.s 614º, ex vi art. 666º, nº 1, ambos do CPC, acorda-se em fixar as custas do recurso nos seguintes termos: custas por recorrente e recorridas, atento o respectivo decaimento.” Dispensados os vistos, cumpre analisar e decidir II. Fundamentação De facto 13. FACTOS PROVADOS (com alterações e aditamentos pelo TR.., a negrito): 1 - A primeira Autora é uma sociedade comercial que se dedica à construção civil, que detém directa e indirectamente a segunda Autora, sociedade que se dedica igualmente à construção civil; 2 - Por sua vez, o 1.º Réu é uma instituição de crédito, que opera sob a designação comercial “Millennium BCP”; 3 - A segunda ré é uma pessoa colectiva de direito público … à qual, conforme resulta da respectiva designação, compete, designadamente regular as actividades e, bem assim, o funcionamento das infra-estruturas e equipamentos, afectos à aviação civil na Líbia; 4 - A terceira Ré é uma pessoa colectiva de direito público líbio que, por decisão do Estado …, sucedeu em determinados direitos e obrigações que pertenciam inicialmente à segunda Ré, a “Autoridade Líbia de Aviação Civil”; 5 - O quarto Réu é uma instituição de crédito sediada no Bahrain, também conhecida por “ABC Bahrain”; 6 - O quinto Réu é a sucursal inglesa do 4º Réu; 7 - Em 2006, a 1.ª Autora iniciou a prospecção de oportunidades de negócio em mercados emergentes na região do Magrebe, em particular na Líbia; 8 - Nesse âmbito, a 1.ª Autora tomou conhecimento de que o Estado líbio pretendia levar a cabo a ampliação do aeroporto internacional Trípoli, empreitada que se inseria num programa de modernização que tinha como principal objectivo dotar as principais cidades do país de infra-estruturas adequadas; 9 - Tendo interesse em participar nesse projecto de construção, a 1.ª Autora manteve conversações para apresentação de uma proposta perante o Estado líbio; 10 - No entanto, devido ao enquadramento legal líbio, ficou estabelecido que o negócio seria formalizado através da subsidiária da 1.ª Autora sediada em Malta, aqui 2.ª Autora, que constituiu para o efeito uma sucursal na Líbia; 11 - Assim, no dia 29.09.2007, a 2.ª Autora outorgou, através da sua sucursal líbia, um contrato de consórcio (joint venture) com a sucursal líbia da empresa turca “TAV - Tepe Afken Investment Construction and Operation,bCo.”, também conhecida por “TAV”, e com a empresa líbia “Libyan Consolidated Contractors Company”, também conhecida por “LCCC”, detida pelo parceiro libanês do consórcio; 12 - O consórcio funcionaria sob a designação “Odebrecht TAV LCCC Joint Venture for the New Trípoli Airport” ou, na forma abreviada, “OTCJV” ou “ODCTC JV” e tinha como único objectivo a negociação e execução de um contrato de construção visando a expansão do aeroporto internacional de Trípoli, na Líbia; 13 - A 2.ª Autora detém uma participação de 50% no referido consórcio, tendo sido designada no contrato como líder da joint venture; 14 - No dia 03.02.2008 (correspondente ao ano de 1376 do calendário islâmico) e após diversas negociações entre as partes, o dito consórcio, liderado pela 2ª Autora, celebrou, com o Estado líbio, através da 2ª Ré, a “Autoridade Líbia de Aviação Civil” (“Libyan Civil Aviation Authority”, também designada por “LCAA”), entidade adjudicante pública de direito …, um contrato de empreitada cujo objecto consistia na construção de dois novos terminais de passageiros do aeroporto internacional de Trípoli, na Líbia, com capacidade para 20 milhões de passageiros por ano, e respectivos acessos; 15 - O contrato foi celebrado de acordo com o modelo de “reimbursable cost plus”, ou seja, o consórcio seria reembolsado pelos custos da obra, sobre os quais incidiria uma determinada margem de lucro líquida (net profit margin) e de custos administrativos de estrutura (overhead), fixando-se um preço máximo (“Estimated Maximum Cost”) ao qual poderia acrescer um bónus; 16 - Na data de celebração do contrato, as partes fixaram, como Estimativa Preliminar (“Preliminary Estimate”) do Estimated Maximum Cost, o valor de € 969.819.778,96 (novecentos e sessenta e nove milhões oitocentos e dezanove mil setecentos e setenta e oito euros e noventa e seis cêntimos); 17 - O contrato pressupunha a consignação da área do Terminal Este e da área do Terminal Oeste ao consórcio liderado pela 2.ª Autora respectivamente em 15.09.2007 e em 31.10.2007; 18 - Por força da Cláusula 6ª do contrato, o consórcio liderado pela 2ª Autora comprometeu-se a entregar à dona da obra, no prazo de 30 dias após a assinatura do contrato, uma carta de crédito, designada no contrato por Garantia de Boa Execução (“Performance Guarantee”): (i) a fim de garantir a boa execução dos trabalhos e eventuais obrigações vencidas; (ii) de valor equivalente a 10% da Estimativa Preliminar fixada pelas partes, ajustável de acordo com o preço máximo; (iii) válida pelo período de execução do contrato. 19 - Nos termos da Cláusula 24.ª do contrato, o consórcio liderado pela 2.ª Autora deveria preparar autos de medição mensais com os custos do respectivo período, os quais seriam, depois, certificados pela “Aéroports de Paris Ingéniérie”, entidade contratada pela dona da obra para exercer as funções de fiscalização da obra, também conhecida por “ADPI”; 20 - O pagamento dos montantes devidos nos termos do contrato deveria ser efectuado no prazo de 30 dias após a recepção, pela dona da obra, do respectivo auto de medição mensal (statement of charges) aprovado pela entidade fiscalizadora da obra e da correspondente factura; 21 - Sem prejuízo, a dona da obra aceitou adiantar ao consórcio liderado pela 2.ª Autora um montante equivalente a 15% da Estimativa Preliminar (Preliminary Estimate), que seria pago nos termos seguintes: (a) 2% da Estimativa Preliminar seria transferido no prazo de 7 (sete) dias contados da data em que a dona da obra recebesse uma carta de crédito (designada no contrato de letter of guarantee) do consórcio, num montante equivalente à totalidade do adiantamento; (b) Os remanescentes 13% seriam transferidos no prazo de 21 (vinte e um) dias após o registo do contrato e pagamento do imposto do selo junto das autoridades fiscais líbias; 22 - O montante mencionado em (b) seria sucessivamente abatido, na proporção que representava do preço total (i.e., 13%), aos montantes que o consórcio liderado pela 2.ª Autora tivesse direito a receber ao abrigo do contrato; 23 - Em contrapartida do adiantamento a 2.ª Autora obrigou-se a entregar à dona da obra (então a “Autoridade Líbia de Aviação Civil”) uma Garantia de Adiantamento, concretamente uma carta de crédito, válida pelo período de duração do contrato, emitida ou garantida por um banco comercial a funcionar na Líbia, no valor de 15% da Estimativa Preliminar; 24 - Esta garantia era passível de redução para 13% após registo do contrato de empreitada e pagamento do imposto do selo, bem como de subsequentes reduções em função do valor da garantia recuperado pela dona da obra ao longo da vigência do contrato através da dedução aos montantes devidos ao consórcio; 25 - Refira-se, por último, que o consórcio liderado pela 2.ª Autora podia suspender os trabalhos, entre outros motivos, quando a dona da obra estivesse em mora no pagamento de montantes devidos ao abrigo do contrato por mais de 45 (quarenta e cinco) dias; 26 - E que, se ocorressem circunstâncias excepcionais, gerais, inevitáveis e imprevisíveis que tornassem o cumprimento do contrato de empreitada impossível, ou seja, causas de força maior (force majeure), as partes ficariam libertas do dever de cumprir as obrigações emergentes do contrato (cf. Cláusula 34.ª do DOC. 4); 27 - Em 21.07.2010, o consórcio liderado pela 2.ª Autora foi informado pela 2ª Ré, a “Autoridade Líbia de Aviação Civil”, de que, na sequência de um conjunto de decisões do Estado líbio, os projectos aeroportuários de Trípoli, Benina e Sebha e, consequentemente, os direitos e obrigações resultantes do contrato de empreitada de 03.02.2008, tinham sido transferidos para a “Autoridade de Execução de Projectos de Transporte” (“Transport Projects Execution Authority”) da “Autoridade de Projectos Públicos” (“Public Projects Authority”); 28 - Posteriormente, por carta de 16.08.2010, foi o consórcio liderado pela 2.ª Autora informado de que, afinal, a designação da nova contraparte no contrato de empreitada passaria a ser “Conselho de Projectos de Transporte” (“Transportation Projects Board”, também designada por “TPB”), a aqui 3ª Ré; 29 - Assim, a partir dessa data, a contraparte do consórcio liderado pela 2.ª Autora no contrato de empreitada (melhor dizendo, a dona da obra) passou a ser a 3ª Ré, muito embora se tenha tratado de uma alteração meramente formal, porquanto o verdadeiro dono da obra nunca deixou de ser o Estado líbio; 30 - O consórcio liderado pela 2.ª Autora obrigou-se a entregar uma carta de crédito para garantia de reembolso de parte do preço do contrato de empreitada que seria objecto de adiantamento pela dona da obra; 31 - Em cumprimento do disposto no contrato, a 2.ª Autora solicitou ao 1º Réu (BCP), em 2007, que, em nome próprio e por conta da 2.ª Autora, requeresse, junto do Arab Banking Corporation (B.S.C.) a emissão de uma garantia bancária, sob a forma de carta de crédito (stand-by letter of credit), em benefício da 2ª Ré, a “Autoridade Líbia de Aviação Civil”; 32 - Em conformidade, no dia 30.01.2008, o 1º Réu (BCP) solicitou ao 4º Réu (Arab Banking Corporation), em nome próprio e por conta da 2.ª Autora, a emissão de uma carta de crédito, confirmada pelo “Sahara Bank”, instituição de crédito líbia, a favor da “Autoridade Líbia de Aviação Civil”, por um montante não superior a € 145.472.966,85, para garantia do montante do preço objecto de adiantamento (advance payment obligations) (DOC. 8); 33 - Para garantia de 50% dos montantes eventualmente devidos ao abrigo da referida carta de crédito, até um máximo de € 72.736.483,43 (setenta e dois milhões setecentos e trinta e seis mil quatrocentos e oitenta e três euros e quarenta e três cêntimos), o 1º Réu prestou por conta da 2.ª Autora, perante o 4º Réu (e por exigência deste), através de swift enviado em 30.01.2008, uma contra-garantia bancária à primeira solicitação, válida até 01.10.2009, com o número …658, adiante designada por “Contra-Garantia BCP ….658” (DOC. 8); 34 - Uma vez prestada pelo 1º Réu a Contra-Garantia BCP ….658, o 4º Réu emitiu a carta de crédito número ….004 em 11.02.2008, em benefício da “Autoridade Líbia de Aviação Civil”, daqui em diante designada por “Carta de Crédito …..004” (DOC. 9); 35 - E no dia 11.02.2008, remeteu um swift ao “Sahara Bank”, solicitando que confirmasse a autenticidade da referida carta de crédito, cujo texto constaigualmente da mensagem enviada (DOC. 9); 36 - Esta comunicação, à semelhança de outras de formato idêntico, foram remetidas através da rede SWIFT, acrónimo de Society for Worldwide Interbank Financial Telecommunication, sistema electrónico de comunicações em ambiente seguro, frequentemente utilizado para transacções interbancárias internacionais; 37 - A Carta de Crédito ….004 era pagável aos balcões do “Sahara Bank” mediante simples solicitação escrita da dona da obra nesse sentido e seria válida até 01.09.2009, podendo, até essa data, ser renovada mediante simples solicitação da beneficiária (DOC. 9); 38 - Na sequência da emissão da Carta de Crédito …..004, pelo 4º Réu, e do cumprimento das demais formalidades, a dona da obra procedeu ao adiantamento de parte do preço a favor do consórcio liderado pela 2.ª Autora; 39 - Como condição para a emissão da Contra-Garantia BCP ….658 por conta da 2.ª Autora, o 1.º Réu solicitou à 1.ª Autora a emissão de uma carta de conforto; 40 - Nessa conformidade, a 1.ª Autora emitiu, em 22.11.2007, a carta de conforto junta como DOC. 10; 41 - Nos termos da referida carta de conforto, a 1.ª Autora declarou, entre outros aspectos, que faria “tudo quanto estiver ao nosso alcance para que a Odebrecht Engineering & Construction Limited [i.e., a 2.ª Autora] esteja sempre munida dos meios que lhe permitam, com pontualidade, fazer face às obrigações assumidas, por via daquelas facilidades [em particular, a Contra-Garantia BCP], perante esse Banco, pondo à sua disposição os fundos necessários, se for caso disso” (DOC. 10); 42 - Nos termos da cláusula 10ª do contrato de empreitada junto como DOC. 4, o Consórcio construtor, liderado pela 2ª Autora, obrigou-se a entregar à dona da obra (então a Autoridade Líbia de Aviação Civil, aqui 2ª Ré) uma carta de crédito para garantia de reembolso de parte do preço da empreitada, objecto de adiantamento; 43 - Esta carta de crédito foi, efectivamente, emitida pelo 4º Réu “Arab Banking Corporarion (B.S.C.) - a designada “Carta de Crédito ….004”, junta como DOC. 9; 44 - Para que a “Carta de …004” fosse emitida, as Autoras solicitaram ao 1.º Réu que emitisse a “Contra-Garantia ….658” a favor do 4º Réu junta como DOC. 8; 45 - Em cumprimento do disposto no contrato, e nos termos que resultam do formulário e anexo juntos como DOC. 10, a 2.ª Autora, em 2007, solicitou ao 1.º Réu (BCP) que, em nome próprio e por conta da 2.ª Autora, requeresse ao 5º Réu, o “ABC International Bank, PLC” (ou ABCIB), a emissão pelo 4º Réu, o “Arab Banking Corporation (B.S.C.)” de uma garantia bancária, sob a forma de carta de crédito (standby letter of credit), em benefício da “Autoridade Líbia de Aviação Civil”; 46 - Na sequência e em conformidade com o solicitado pela 2ª Autora ao 1.º Réu, este, no dia 30.01.2008, solicitou ao 4º Réu, o “ABC International Bank, PLC”, em nome próprio e por conta da 2.ª Autora, que requeresse ao 4º Réu, o “Arab Banking Corporation (B. S. C.)” a emissão de uma carta de crédito, confirmada pelo “Sahara Bank”, instituição de crédito …, a favor da “Autoridade Líbia de Aviação Civil”, por um montante não superior a € 96.981.977,90, para garantia das obrigações do consórcio construtor decorrentes do contrato de empreitada (DOC. 12); 47 - Idêntico procedimento – e concretamente o pedido junto do 4º Réu, “Arab Banking Corporation (B. S. C.) para que emitisse uma carta de crédito, confirmada pelo “Sahara Bank”, a favor do dono da obra por montante não superior a € 96.981.977,90 – foi observado pelas restantes instituições de crédito em nome próprio e por conta dos demais membros do consórcio; 48 - Para garantia de 29,37% dos montantes eventualmente devidos ao abrigo da referida carta de crédito, até um máximo de € 28.490.988,95, o 1.º Réu prestou por conta da 2.ª Autora, perante o 5º Réu, “ABC International Bank, PLC” (ABCIB)” – e por exigência deste – através de swift enviado em 30.01.2008, uma contra-garantia bancária à primeira solicitação, válida até 31.10.2009, com o número …..649, adiante designada por “Contra- Garantia …649” (DOC. 12); 49 - Uma vez prestada pelo 1.º Réu a Contra-Garantia …649 (e emitida a referida carta de indemnização), o 5º Réu, “ABC International Bank, PLC” (ABCIB), emitiu, a favor do 4º Réu, “Arab Banking Corporarion (B.S.C.), uma contra-garantia bancária no valor de € 48.490.988,95, adiante designada “Contra-Garantia ABCIB” (nos termos indicados na segunda parte do swift com a hora de 9:59:09, junto como DOC. 12); 50 - Tendo o 4º Réu, “Arab Banking Corporation (B.S.C)” (ABC Bahrain) emitido a carta de crédito número ….005 em 11.02.2008, em benefício da “Autoridade Líbia de Aviação Civil”, daqui em diante designada por “Carta de Crédito ….005” (DOC. 13); 51 - E no dia 11.02.2008, remetido um swift ao “Sahara Bank”, solicitando que confirmasse a autenticidade da referida carta de crédito, cujo texto consta igualmente da mensagem enviada (DOC. 13); 52 - Essa confirmação veio a ser disponibilizada em 24.02.2008 pelo “Sahara Bank”; 53 - A Carta de Crédito 20005 era pagável aos balcões do “Sahara Bank” mediante simples solicitação escrita da dona da obra nesse sentido e seria válida até 30.09.2010, podendo, até essa data, ser renovada mediante simples solicitação da beneficiária (DOC. 13); 54 - Em Fevereiro de 2011, teve início na Líbia um conflito armado interno à escala nacional, que opôs, de um modo geral, os partidários do regime de Khadafi aos seus opositores; 55 - Os contornos e a evolução desta guerra civil foram objecto de ampla difusão na comunicação social internacional, sendo, por isso, factos do conhecimento do cidadão comum e, nessa medida, notórios; 56 - Os protestos alastraram de imediato para todo o território líbio, tendo os dissidentes do regime … constituído, em 27.02.2011, uma organização denominada “Conselho de Transição Nacional”, com o intuito de agir como a face política da revolução e vir a formar um governo interino; 57 - Em 28.02.2011, o Conselho da União Europeia proferiu a Decisão 2011/137/PESC, que impôs um conjunto de sanções económicas e diplomáticas à Líbia, incluindo a proibição de realização de disponibilização de fundos a diversas pessoas e entidades líbias; 58 - Em 17.03.2011, o Conselho de Segurança das Nações Unidas aprovou a imposição de uma zona de exclusão aérea sobre a Líbia, a que se seguiram diversos bombardeamentos sobre o país levados a cabo pela NATO; 59 - Nos meses seguintes, a Líbia foi palco de uma guerra civil que devastou o país; 60 - Após vários meses de conflitos, no dia 20.08.2011, os rebeldes lançaram uma ofensiva sobre Trípoli, tendo tomado o controlo da capital três dias depois; pouco tempo mais tarde, no dia 27.08.2011, a última base militar das forças de Khadafi foi capturada pelos rebeldes líbios; 61 - Não obstante, a resistência do regime líbio continuou até ao dia 20.10.2011, data da morte de Khadafi, tendo o Conselho Nacional de Transição proclamado o fim da guerra e a libertação da Líbia no dia 23.10.2011; 62 - No entanto, apesar dessa declaração do Conselho Nacional de Transição, o país continuou a ser palco de inúmeros confrontos e ataques levados a cabo por diversas milícias das mais variadas proveniências, por grupos pró e contra Khadafi, outras ainda por islamitas ou grupos que integravam rebeldes da revolução de 2011 que se recusaram a depor as armas quando foi declarado o fim da guerra civil em Outubro de 2011; 63 - A título de exemplo da situação que se continuou a viver na Líbia, destacou-se o assassinato do embaixador dos Estados Unidos da América na Líbia e de três outros cidadãos …, ocorrido em Setembro de 2012, o rapto do primeiro-ministro … em Outubro de 2013 por uma milícia e uma tentativa de golpe de Estado em Maio de 2014 liderada pelo General Khalifa Haftar, para além de sucessivos conflitos armados de duração e dimensão variáveis no referido período, nas cidades de Trípoli, Benghazi e noutras localidades do país, dos quais resultaram inúmeros mortos, feridos e elevados prejuízos patrimoniais, devastadores da economia do país, nomeadamente a nível da produção de barris de petróleo, principal fonte de receitas do Estado ….; 64 - Confrontado, em 2011, com a gravidade do conflito e com o risco que o mesmo constituía para a segurança dos milhares de trabalhadores que se encontravam afectos aos trabalhos de construção dos terminais do aeroporto internacional de Trípoli, o consórcio liderado pela 2.ª Autora (à semelhança, de resto, das restantes empresas internacionais com presença na Líbia) desmobilizou, nos meses que se seguiram à revolução, a totalidade dos trabalhadores estrangeiros e parte dos equipamentos que se encontravam afectos à obra, tendo apenas mantido, para tentar proteger o estaleiro da obra, alguns trabalhadores locais, em particular uma equipa de segurança que se deslocava esporadicamente ao local quando as circunstâncias assim o permitiam; 65 - Essa decisão de desmobilização foi comunicada à dona da obra, então a 3ª Ré, por carta datada de 22.02.2011, com fundamento nas “circunstâncias gerais, inevitáveis e imprevisíveis em curso na Líbia” (DOC. 14); 66 - No dia 23.02.2011, a “ADPI”, entidade responsável pela fiscalização da obra, remeteu uma carta à dona da obra, ora 3ª Ré, a comunicar a suspensão do contrato celebrado entre ambas as entidades, com fundamento em causa de força maior (DOC. 15); 67 - E, no dia 01.03.2011, o consórcio liderado pela 2.ª Autora comunicou igualmente à dona da obra, 3ª Ré, a suspensão do contrato de empreitada com fundamento em causa de força maior, tendo invocado, para o efeito, a “persistência de circunstâncias excepcionais, gerais, inevitáveis e imprevisíveis em curso na Líbia” (DOC. 16); 68 - Adicionalmente, o consórcio informou a 3ª Ré, por carta de 30.03.2011, que as circunstâncias que constituíam causas de força maior “eram do conhecimento público, e incluem designadamente agitação civil, actos de guerra, a criação de uma zona de exclusão aérea, sanções internacionais e acções militares”, e que, em qualquer caso, o consórcio “tinha o direito de suspender os trabalhos ao abrigo da Cláusula 28.ª do Contrato devido ao atraso superior a 45 dias no pagamento de montantes substanciais devidos à ODCTC JV ao abrigo do Contrato” (DOC. 17); 69 - Alguns meses após a declaração formal, pelo Conselho Nacional de Transição, de que a guerra civil havia terminado, o consórcio liderado pela 2.ª Autora remeteu, em 27.02.2012, uma carta à 3ª Ré, na qualidade de dona da obra, elencando um conjunto de condições que deveriam estar verificadas previamente ao estabelecimento de quaisquer negociações para o reinício do contrato de empreitada, a saber: (i) Condições de natureza logística (condições de segurança, funcionamento normal das instituições estaduais e do governo, abertura dos portos e aeroportos principais e disponibilidade de matérias-primas e recursos); (ii) Condições de natureza contratual (celebração de aditamento ao contrato, emissão de novas garantias e apólices de seguro); (iii) Condições de natureza financeira (pagamento de montantes em dívida e de uma compensação pelos prejuízos sofridos pelo consórcio com os acontecimentos na ….658) (DOC. 19); 70 - Preenchidas as referidas condições, a remobilização dos trabalhadores dependeria ainda do cumprimento das fases seguintes: (i) 1.ª Fase: levantamento de prejuízos causados pela guerra civil e subsequente suspensão dos trabalhos; preparação de um novo orçamento e cronograma de execução dos trabalhos; (ii) 2.ª Fase: Alteração dos termos do acordo em matéria de preço e prazo e celebração de acordo para compensação por prejuízos (DOC. 19); 71 - Na sequência dessa carta, foi realizada, em 13.03.2012, uma reunião na Líbia na qual estiveram presentes representantes da dona da obra, aqui 3ª Ré, da entidade fiscalizadora da obra e do consórcio liderado pela 2.ª Autora (DOC. 20); 72 - Da referida reunião resultou, de um modo geral, que as partes averiguariam a viabilidade de implementar o plano acima descrito (DOC. 20); 73 - Contudo, a situação caótica que a Líbia continuava a atravessar impediu que o projecto de reiniciar os trabalhos saísse do papel, não tendo passado de meras intenções. Em particular, nenhuma das condições logísticas, contratuais ou financeiras acima descritas se verificou; 74 - A suspensão das obras desde Fevereiro de 2011 provocou uma deterioração visível das construções existentes, agravada pelos danos colaterais resultantes dos constantes conflitos sob a forma de bombardeamentos, explosões e tiroteios de que a cidade de Trípoli tem sido palco; 75 - Já no segundo semestre de 2014, a situação sociopolítica na Trípoli assumiu proporções ainda mais dramáticas, encontrando-se o país em clima de pré-guerra civil, desta feita opondo milícias islamitas a forças nacionalistas; 76 - As milícias islamitas tomaram de assalto e ocuparam a cidade de Trípoli, incluindo o aeroporto internacional de Trípoli, forçando o Parlamento a sair da cidade e a estabelecer-se em Tobruk (DOC. 21); 77 - Adicionalmente, as ditas forças islamitas estabeleceram um parlamento e um governo paralelos, controlando actualmente, pela força, os ministérios e instituições sediados em Trípoli, incluindo a própria dona da obra, que acaba assim por ter de obedecer a dois governos ou, pior ainda, não saber a quem responder; 78 - Na sequência da formação desse governo paralelo, o Supremo Tribunal da Líbia invalidou as eleições realizadas em Junho, dissolvendo, formalmente, o Parlamento reconhecido pela comunidade internacional (DOC. 22); 79 - O que, somado à queda verificada dos preços do petróleo nos mercados internacionais, afecta muito gravemente a situação económica da …, cujo produto interno provém, na sua quase totalidade, do sector energético; 80 - Para além disso, o Banco Central da Líbia, que concentra as receitas provenientes da comercialização de petróleo, bloqueou a realização de quaisquer pagamentos a entidades públicas devido ao aludido caos institucional; 81 - Na sequência de confrontos ininterruptos entre milícias Líbia e milícias partidárias do actual regime, na zona do aeroporto internacional de Trípoli entre Julho e Agosto de 2014, o estaleiro da obra foi totalmente destruído, ficando ocupado desde Agosto de 2014, por milícias islamitas provenientes de Misrata (DOC. 24); 82 - Na sequência da eclosão desses confrontos, o consórcio liderado pela 2.ª Autora viu-se obrigado a evacuar a equipa de segurança que se encontrava no local em Agosto de 2014; 83 - Já no decurso do ano de 2015, assistiu-se a um agravamento do caos político e económico na Líbia que provocou um movimento massivo de imigração, com centenas de milhares de imigrantes a procurarem fugir do país (DOC. 26); 84 - Face à suspensão do contrato durante mais de quatro anos (desde Fevereiro de 2011) e, em especial, à total indefinição em redor do futuro do projecto e da própria Líbia à luz dos recentes acontecimentos ocorridos já no segundo semestre de 2014 e no decurso do corrente ano, ficou evidente para o consórcio liderado pela 2.ª Autora que a retoma do contrato de empreitada se afigura impossível; 85 - E ainda que a retoma dos trabalhos pudesse ser equacionada, jamais poderia ocorrer à luz do actual contrato, carecendo de um novo acordo entre as partes quanto aos seus elementos essenciais, como por exemplo prazos, novos trabalhos, contrapartida e materiais; 86 - A revolução líbia provocou – e continua a provocar ainda – constrangimentos operacionais e financeiros no consórcio construtor – e, consequentemente nas Autoras – quer no que se refere ao atraso no pagamento dos montantes devidos nos termos do contrato de empreitada, quer no que se refere aos elevados custos daí decorrentes, incluindo com a manutenção das garantias bancárias; 87 - Com o início da revolução, e fruto do caos político, social e económico em que mergulhou a Líbia, a 3ª Ré interrompeu os pagamentos ao consórcio liderado pela 2.ª Autora; 88 - No início de Outubro de 2014, o consórcio liderado pela 2.ª Autora era credor da 3ª Ré, só em autos de medição referentes ao período compreendido entre Julho de 2010 e Janeiro de 2011, certificados pela entidade fiscalizadora da obra “ADPI”, aprovados pela referida dona da obra e registados juntos das finanças líbias, pelo montante de € 85.127.3336,32, a que corresponde um montante líquido (i.e. depois da dedução do adiantamento em função dos pagamentos recebidos) de € 74.060.782,80 (setenta e quatro milhões sessenta mil setecentos e oitenta e dois euros e oitenta cêntimos) (cfr. DOC. 30); 89 - Nessa conformidade, o consórcio liderado pela 2.ª Autora remeteu, no dia 02.10.2014, uma carta à 3ª Ré a declarar a compensação dos montantes seguintes: (i) por um lado, € 74.060.782,60, relativos a parte dos montantes acima referidos de que o consórcio era credor (cf. artigo 134.º), há muito reconhecidos pela dona da obra como sendo devidos; (ii) por outro lado, € 49.705.475,44 referente ao montante do adiantamento do preço do contrato que ainda não havia sido objecto de dedução (DOC. 31); 90 - Atendendo a que (i) o reembolso desse montante se encontrava garantido pela Carta de Crédito …004 (por sua vez associada à Contra-Garantia …..658), (ii) mesmo depois de operada a compensação, a dona da obra continuava devedora do consórcio construtor, a título de trabalhos por este executados e por aquela aprovados, pelo valor de € 24.355.307,36 (montante superior ao então garantido pela Carta de Crédito …..005), (iii) face aos elevadíssimos prejuízos incorridos pelos consórcio e (iv) ainda à impossibilidade de ser retomado o contrato na sequência da suspensão dos trabalhos durante três anos e meio, (v) agravada pela total indefinição face ao futuro, o consórcio liderado pela 2.ª Autora informou, na mesma carta, a 3ª Ré que não subsistia a obrigação de manter as garantias bancárias associadas ao contrato, pois tinham perdido o respectivo fundamento e razão de ser, solicitando que aquela diligenciasse pelo respectivo cancelamento junto do Sahara Bank (DOC. 31); 91 - Na ausência de resposta ao pedido de cancelamento das garantias bancárias associadas ao contrato (a Garantia de Adiantamento e a Garantia de Boa Execução dos trabalhos), o consórcio construtor solicitou ao Tribunal de Comércio de Nanterre, em França, como apoio da acção arbitral a instaurar contra as aqui 2ª e 3ª Rés (cf. Cláusula 52ª do contrato de empreitada), a emissão de uma ordem preliminar no sentido de a impedir de executar ou renovar aquelas garantias, com fundamento que a manutenção das referidas garantias é abusiva e fraudulenta e constitui uma forma de pressão ilegítima, no quadro do procedimento arbitral a instaurar; 92 - Aderindo aos fundamentos do consórcio construtor, suportados na factualidade acima descrita relativa à situação na Líbia, à suspensão do contrato e ao incumprimento da dona da obra, designadamente por atraso no pagamento de valores devidos e reconhecidos ao abrigo do contrato, o mesmo Tribunal, com data de 16.2.2015 emitiu a ordem requerida, e determinou a interdição da 2ª e da 3ª Rés de procederem à renovação ou execução das garantias (DOC. 32); 93 - Subsequentemente, em 5.3.2015, o consórcio construtor instaurou contra a 2ª e a 3ª Rés, ao abrigo da cláusula 52ª do contrato de empreitada junto como DOC. 4, uma acção arbitral, que se encontra pendente na International Court of Arbitration (ICC), em Paris; 94 - Na sequência de pedidos nesse sentido por parte da dona da obra, a Carta de Crédito ….004 foi sendo objecto de sucessivas renovações; 95 - Consequentemente, também a Contra-Garantia …658 foi sendo sucessivamente renovada; 96 - Durante este período, o montante titulado pela Carta de Crédito ….004 foi objecto de redução para € 58.956.863,96, no seguimento de instruções emitidas pela 2ª Ré (cf. mensagem swift de 19.03.2012, remetida pelo Sahara Bank ao “ABC Bahrain”, DOC. 33); 97 - Como tal, também a Contra-Garantia ….658 foi reduzida para metade desse montante, i.e., € 29.478.431,99; 98 - As prorrogações da Contra-Garantia ….658 processavam-se da seguinte forma: (i) O 4º Réu enviava um swift para o 1º Réu referindo que a validade da carta de crédito tinha sido prorrogada até certa data e que a contra-garantia do 1º Réu tinha sido prorrogada e manter-se-ia válida até determinada data, i.e., trinta dias após a data de validade da carta de crédito (sem prejuízo de o 1.º Réu poder libertar-se da sua responsabilidade mediante depósito do montante da Contra-Garantia ….658 numa determinada conta bancária indicada pelo 4º Réu); (ii) O 1.º Réu enviava uma comunicação por email às Autoras, solicitando autorização para prorrogação da Contra-Garantia ….658; (iii) Após confirmação das Autoras, o 1.º Réu respondia então ao 4º Réu, novamente via swift, informando-o da prorrogação da Contra-Garantia ….658 e estabelecendo uma nova data de validade (cf. swifts e email a respeito da renovação da Carta de Crédito ….004 e da Contra-Garantia ….658 ocorrida entre Junho e Julho de 2013, DOCs. 34 a 36); (iv) (eliminado pelo TR…..); 98-A - Pela emissão e existência da garantia ….658 era cobrada pelo 1º Réu à 2ª A., trimestral e postecipadamente, uma comissão no valor anual correspondente a 1,25% do montante garantido (aditado pelo TR…..); 99 - Na sequência do swift junto como DOC. 36, a Carta de Crédito ……004 renovou-se até 30.03.2014 e a Contra-Garantia …..658 foi prorrogada até 30.04.2014; 100 - Posteriormente, em 23.03.2014, i.e., ainda dentro do período de vigência da Contra-Garantia …658, o 4º Réu remeteu um swift ao 1.º Réu a comunicar a renovação da Carta de Crédito ….004 até 30.09.2014 e a prorrogação da Contra-Garantia ….658 até 30 dias após o 4º Réu ter sido liberado das suas responsabilidades emergentes da carta de crédito, i.e., 30.10.2014 (DOC. 37); 101 - Prorrogação essa que veio a ser autorizada pelas Autoras; 102 - Assim, a Carta de Crédito ABC …..004 renovou-se até ao dia 30.09.2014; 103 - Concomitantemente, a Contra-Garantia ….658 renovou-se até ao dia 30.10.2014; 104 - Chegados a 30.10.2014, o 4º Réu não enviou qualquer comunicação – suift ou outra – ao 1º réu a solicitar a prorrogação da Contra-Garantia …658, ou a comunicar-lhe que estava liberto das obrigações para si emergentes da referida garantia bancária (alterado pelo TR….); 105 - As Autoras interpretaram esta ausência de renovação no contexto da situação dramática vivida na Líbia e, em especial, em Trípoli, no decurso do segundo semestre de 2014, tendo assumido que a dona da obra concordara com a extinção da Carta de Crédito ….004; 106 - Em 31.10.2014, o 1.º Réu enviou um email às Autoras onde refere que “a expectativa existente de não pedido de prorrogação por parte do Arab Bank Corporation Bahrain da contra-garantia Nr. …..658 – GB de Advance Payment no valor de € 29.478.431,99 – concretizou-se, pelo que a nossa contragarantia a/f daquele banco foi cancelada em 30/10/2014” (DOC. 38); 107 - Porém, por email de 11.11.2014, o 1.º Réu veio transmitir às Autoras que “contrariamente às expetativas, acabámos de receber mensagem swift do Arab Banking Corporation, informando que a sua SBLC (GB de Advance Payment) foi prorrogada até 31/03/2015 e portando dá nota que a n/contragarantia se encontra prorrogada nos termos do Swift que se anexa. Não sei se já tinham sido informados deste desenvolvimento e em face das negociações que podem ter tido e apesar do que já “discutimos” a este propósito, necessitamos saber se dão o acordo a esta prorrogação. Como já tínhamos referido em conversa anterior não é problema a reativação da contragarantia em termos formais” (DOC. 39); 108 - O 4º Réu (Arab Banking Corporation) enviara em 10.11.2014, um swift ao 1.º Réu, informando que havia renovado a Carta de Crédito ….004 a favor da “dona da obra”, pelo que entendia que a Contra-Garantia …..658 se tinha renovado em conformidade (DOC. 40); 109 - O referido swift faz menção a uma outra entidade, designada por “HIB”, acrónimo de “Housing Infrastructure Board”; 110 - Confrontadas com o pedido de renovação do 4º Réu e perante a posição do 1º Réu, as Autoras, face ao cancelamento já ocorrido da Contra-Garantia, comunicaram a este último que não aceitavam essa renovação (DOC. 42); 111 - O primeiro réu cobrou a comissão pela emissão e existência da garantia (alterado pelo TR….); 112 - Por carta de 3.2.2015, o 1.º Réu, esclarecendo eventuais dúvidas que ainda pudessem subsistir face ao seu entendimento sobre a validade da garantia, veio informar que “esta garantia se encontra plenamente em vigor, pelo que se mantêm registadas e contabilizadas as responsabilidades que dela emergem, na medida em que, até à data, não há evidência de que a Arab Banking Corporation esteja liberada das obrigações decorrentes da standby letter of credit por ela emitida. Consequentemente, mantém o Banco igualmente como plenamente eficazes, em seu benefício, os direitos advenientes da emissão da garantia a pedido e por conta da Odebrecht, nomeadamente o direito à percepção das respectivas comissões periódicas e o direito de regresso sobre a Odebrecht, em caso de pagamento da garantia, bem como os demais direitos que emergem das cartas-conforto prestadas pelas sociedades “Construtora Norberto Odebrecht, S.A.”, por escrito de 14-11-2007, e “Bento Pedroso Construções, S.A.”, que actualmente usa a firma “Odebrecht Portugal, S.A.”, por escrito de 22-11-2007” (DOC. 44); 113 - A esta missiva do 1º Réu, responderam as Autoras por carta de 13.2.2015 (DOC. 45), aí sublinhando, entre outros aspectos que “em função das instruções claras e inequívocas recebidas dos Autoras no sentido de não renovar (nem pagar) a referida Garantia Bancária, cabe ao Banco Comercial Português agir em conformidade, comunicando tal facto ao ABC Bahrain, de forma igualmente clara e inequívoca. (…) As ora signatárias reiteram, por isso, o seu entendimento de que todas as relações contratuais decorrentes da Garantia Bancária cessaram no dia 30 de Outubro de 2014, incluindo as decorrentes das cartas-conforto conferidas no âmbito da emissão da Garantia Bancária”; 114 - Na sequência de pedidos nesse sentido por parte da dona da obra, a Carta de Crédito …005 foi sendo objecto de sucessivas renovações; 115 - Consequentemente, também a Contra-Garantia ….649 foi sendo sucessivamente renovada; 116 - Durante este período, o montante titulado pela Carta de Crédito …..005 foi objecto de redução para € 19.396.395,58, no seguimento de instruções emitidas pela dona da obra (cf. mensagem swift remetida pelo S..Bank ao 4º Réu junto como DOC. 46); 117 - Com tal, a contra-garantia do ABC International Bank PLC foi reduzida para metade daquele montante, isto é, € 9.698.197,79 (cf. mensagem swift remitida pelo 4º Réu (Arab Banking Corporation) ao 4ª Réu (ABC International Bank PLC) junto como DOC. 47; 118 - Tendo a Contra-Garantia 5649 sido reduzida para 29,37% daquele mesmo montante, i.e., € 5.698.197,79 (cf. DOC. 48 e DOC. 49); 119 - As prorrogações da Contra-Garantia …649 processavam-se da seguinte forma: (i) O 5º Réu (“ABC International Bank PLC”) enviava um swift para o 1.º Réu referindo que a validade da Carta de Crédito …005 foi prorrogada até certa data e que a Contra-Garantia ABCIB foi também prorrogada, pelo que a Contra-garantia …649 foi igualmente prorrogada e manter-se-á válida até determinada data, solicitando ao 1.º Réu que informe se a Contra-Garantia ….649 é prorrogada até determinada data, i.e., trinta dias após a data de validade da carta de crédito ou se pretende libertar-se da sua responsabilidade mediante pagamento do montante da Contra-Garantia ….649); (DOC. 50); (ii) O 1º Réu enviava uma comunicação por e-mail às Autora, solicitando autorização para prorrogação da Contra-Garantia ….649; (iii) Após confirmação das Autoras, o 1.º Réu respondia então ao 5º Réu (“ABC International Bank PLC”), novamente via swift, informando a prorrogação da Contra-Garantia ….649 e estabelecendo uma nova data de validade; (iv) (eliminado pelo TR......); 119-A - Pela emissão e existência da Contra-Garantia ….649 era cobrada pelo 1º Réu à 2ª A., trimestral e postecipadamente, uma comissão no valor anual correspondente a 1,25% do montante garantido (aditado pelo TR......). 120 - Em conformidade com o procedimento acima exposto, em 25.09.2014, o 5º Réu (“ABC International Bank PLC”) remeteu um swift ao 1.º Réu a comunicar a renovação da Carta de Crédito …005 até 31.03.2015 e, concomitantemente a prorrogação da Contra-Garantia ABCIB e da prorrogação da Contra-Garantia …649 até 30 dias depois, isto é, 30.4.2015 (DOC. 51); 121 - O que o 1.º Réu confirmou, cobrando a respectiva comissão; 122 - Na última renovação da Carta de Crédito ….005, o 4º Réu (Arab Banking Corporation), nas comunicações SWIFT feitas para os bancos contragarantidores, designadamente para o 5º Réu (ABC International Bank PLC), citou a mensagem de renovação ou pagamento (extend or pay) recebida do Sahara.Bank, em nome da dona de obra, mensagem essa que: a) indicava erradamente como beneficiário da Carta de Crédito o “HIB” (e não a Libyan Civil Aviation Authority); b) referia que o montante da Carta de Crédito ascenderia a € 96.989.977,90 (e não € 19.396.395,58); 123 - O 4º Réu (Arab Banking Corporation) e o 5º Réu (ABC International Bank PLC) não rejeitaram o pedido efectuado e procederam à correcção dos elementos discrepantes; 124 - Em face do exposto, as Autoras, por carta de 27.2.2015, comunicaram ao 1.º Réu que se opunham a essa renovação e, concretamente, que “havendo um pedido (cuja ilegitimidade é evidente pelos argumentos referidos) de extend or pay por parte do ABC International Bank Plc., informamos o Banco Comercial Português de que não autorizamos a que se proceda à renovação da Garantia Bancária nem ao pagamento de quaisquer montantes que sejam exigidos no âmbito da mesma, sob pena de estar a colaborar com um comportamento abusivo e ilegal por parte daquela entidade” (DOC. 52); 125 - Da mesma carta consta ainda o pedido das Autoras, no sentido de que “dada a urgência da situação e os potenciais prejuízos que a mesma pode acarretar para o Grupo Odebrecht, solicitamos confirmação de V. Ex.as, até ao dia 4 de Março de 2015, de que partilham do nosso entendimento e de que agirão em conformidade com o exposto”; 126 - Por carta de 31.3.2015 (DOC. 53), o 1.º Réu, confirmando a existência de um novo pedido (com data de 19.3.2015) de renovação ou pagamento da Carta de Crédito …..005 por instruções da dona da obra, concluiu que “não pode aderir a todos os entendimentos expressos nas cartas [das Autoras] a que se responde”; 127 - As duas (contra)-garantias bancárias emitidas pelo R. BCP, com os números ….658 e …..649, prestadas pelo primeiro a pedido das AA., a favor, respectivamente, do Arab Banking Corporation (B.S.C) e do ABC International Bank, PLC, foram prestadas no contexto mais amplo de garantia, por estas últimas entidades, de obrigações assumidas pelas AA. no contexto de um contrato de empreitada perante a Libyan Civil Aviation Authority e a Transportation Projects Board; 128 - O pedido de garantia e a (contra-)garantia prestada foram-no com a redacção solicitada pela segunda autora, sendo que, dos termos das mesmas resulta que tal (contra-)garantia era “automaticamente renovável a pedido escrito do ABC. Apesar da sobredita data de validade (podendo o prazo da mesma ser estendida) nós Banco Comercial Português, S.A. seremos somente libertados de todas as nossas responsabilidades junto do ABC relativamente à garantia bancária depois de o ABC ter ele próprio sido liberto de todas as suas responsabilidades respeitantes ou relacionadas com a carta de crédito mesmo que os documentos originais da carta de crédito não tenham sido devolvidos ao ABC.”; 129 - Tal garantia encontra-se subordinada à regra de extend or pay, i.e., o aqui R. poder-se-ia opor à aludida renovação automática depositando à ordem da instituição garantida o montante correspondente; 130 - A 10 de Novembro de 2014 o Arab Banking Corporation (B.S.C.) enviou ao R. um swift informando que havia procedido à renovação da stand-by letter of credit …004 por instruções do beneficiário datadas de 11 de Setembro de 2014; 131 - Pelo que o réu BCP SA considerou que a garantia por si prestada se encontrava em vigor e procedeu à cobrança da correspondente prestação trimestral da comissão de garantia, ainda que tenha procedido ao estorno da mesma na sequência da providência cautelar requerida pelas AA. e decretada por este Tribunal da Comarca …; 132 - A (contra-)garantia bancária número ….649 teve a redacção solicitada pela segunda autora, sendo que, à semelhança do que sucede quanto à garantia bancária número ….658, também neste caso a (contra-)garantia do R. era automaticamente renovável mediante comunicação do ABC International Bank, PLC, e encontrava-se subordinada à regra extend or pay, sendo que o Banco Comercial Português, S.A., seria somente libertado de todas as suas responsabilidades junto do ABC relativamente à garantia bancária depois de o ABC ter ele próprio sido liberto de todas as suas responsabilidades respeitantes ou relacionadas com a carta de crédito, mesmo que os documentos originais da carta de crédito não tenham sido devolvidos ao ABC (alterado pelo TR......); 133 - A (contra-)garantia bancária número ….649 veio, também, a ser objecto de várias renovações, nos termos – extend or pay – supra- referidos, em decorrência da renovação da stand-by letter of credit …..005; 134 - O banco réu procedeu, efectivamente, à cobrança da correspondente prestação trimestral da comissão de garantia, ainda que tenha procedido ao estorno da mesma na sequência da providência cautelar requerida pelas AA. e decretada por este Tribunal da Comarca …..; 135 - A 13 de Outubro de 2016 o Banco réu recebeu a confirmação do Arab Banking Corporation (B.S.C.) do cancelamento da (contra-)garantia bancária com o nº …..658 e a 14 de Outubro de 2016, recebeu do ABC International Bank, PLC, confirmação do cancelamento da (contra-)garantia bancária com o nº …...649, pelo que, considerou tais garantias canceladas a partir dessas datas. 136 - Quando ocorre o cancelamento de uma garantia bancária o Banco R., através do departamento específico para o efeito, envia uma notificação formal para o ordenante com a indicação do cancelamento, distinta da comunicação junta a fls 361 (aditado pelo TR..); 137 - O e-mail junto a fls 361 resultou de um erro de lançamento no sistema informático do Banco R.. (aditado pelo TR..); 138 - Na fixação do valor da comissão pela emissão e existência das garantias são considerados, essencialmente, os seguintes factores: custo do risco, custo de capital e custo operacional (aditado pelo TR..). Não vieram dados como não provados factos que merecessem ser considerados na decisão da causa. De Direito 14. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões do Recurso, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que sejam de conhecimento oficioso e devendo limitar-se a conhecer das questões e não das razões ou fundamentos que àquelas subjazam, conforme previsto no direito adjetivo civil - arts. 635º n.º 4 e 639º n.º 1, ex vi, art.º 679º, todos do Código de Processo Civil. A questão suscitada prende-se com a definição de existência de motivos válidos para o banco Réu não renovasse as garantias prestadas e não pudesse ser remunerado pelas renovadas em contravenção. 15. Como se disse no acórdão recorrido, pode apresentar-se uma síntese dos factos da causa destacando o seguinte: “em cumprimento do estabelecido no contrato de empreitada celebrado entre um consórcio, liderado pela 2ª A., e uma empresa …. – actualmente a 3ª R. – obrigou-se a 2ª A. a prestar, a favor da dona da obra, duas garantias: uma de adiantamento e outra de boa execução da obra; - relativamente à garantia de adiantamento, e após solicitação ao 1º R., o Banco Comercial Português, S.A., foi emitida pelo Arab Banking – 3º R. – a Carta de Crédito …004 em benefício da dona da obra, mas após a prestação, por parte do BCP, de uma (contra-)garantia bancária à primeira solicitação, a Contra Garantia BCP …658; - relativamente à garantia de boa execução da obra, e após solicitação ao 1º R., foi emitida pelo R. ABC International Bank uma contra- garantia – a Contra-Garantia ABCIB – para que o R. Arab Banking emitisse a Carta de Crédito ….005 em benefício da dona da obra, mas após prestação, por parte do BCP, de uma (contra-)garantia à primeira solicitação, a Contra-Garantia BCP …..649; - as contra-(garantias-) prestadas pelo R. BCP eram renováveis, consoante as cartas de crédito também o fossem; - entretanto, eclodiu um conflito armado na …, que impediu a conclusão da obra; solicitou, por isso, a 2ª A. que a dona da obra diligenciasse pelo cancelamento das garantias, o que justificaria a não renovação das mesmas. Por isto, as AA. pedem que o 1º R seja condenado a não emitir ou prorrogar as contragarantias …658 e ….649, logo, a não cobrar as respectivas comissões, bem como a não efectuar qualquer pagamento ao beneficiário com base nas mesmas; caso o faça, seja declarado que não pode exigir das AA. o reembolso dos montantes pagos. 16. Não vem questionado que, no caso dos autos, estarmos perante garantias bancárias autónomas à primeira solicitação e que se inserem numa relação do tipo quadrangular, pois são contragarantias ou garantias indirectas[1]. Não vem colocado em causa o entendimento dominante: atendendo às suas características contratuais e à construção doutrina e jurisprudencial que sobre a mesma tem sido efectuada, o sentimento geral é no sentido de que “os efeitos da garantia bancária autónoma não poderão ser perturbados pela intervenção de medidas que se traduzam na inibição do garante de entregar a quantia cujo pagamento garantiu (ou na inibição do beneficiário de executar a garantia), se e enquanto não houver uma decisão definitiva num processo contencioso pendente entre o beneficiário e o dador da garantia”, posição que a 1ª instância reconheceu na sua análise, sem prejuízo de reconhecer que tais características e regime comportam excepções, de carácter mínimo, quando necessárias para compatibilizar diversos valores jurídicos, sujeitando-as a um juízo de proporcionalidade e razoabilidade (cf. sentença), com recurso ao princípio da boa fé e proibição de abuso de direito ou “pela necessidade de evitar benefícios decorrentes de factos ilícitos, designadamente envolvendo fraudes ou falsificação de documentos” (sentença). No âmbito das excepções têm sido incluídas as situações de “alteração superveniente das circunstâncias que fundaram a decisão de contratar por força maior (revolução e guerra civil em curso) e que, posteriormente, desembocam mesmo numa impossibilidade de manutenção do contrato” (sentença), ou mesmo fazendo apelo a causa de força maior que torne impossível o cumprimento do acordado. Como também se admite “a necessidade de suavizar este instituto, impondo limites à autonomia, a fim de evitar que o beneficiário abuse da sua posição de forma a fazer uma utilização intolerável dos direitos que lhe são conferidos, obstando a que a garantia seja cega” (sentença). Será o caso de existir fraude manifesta ou abuso inequívoco, à luz dos art.º 762.º e 335.º do CC. Por fraude entende-se “o recurso à garantia que viola de forma evidente o equilíbrio de interesses efectivado pela operação comercial entre o mandante e o beneficiário” (sentença). 17. Na 1ª instância, o tribunal considerou que devido à guerra da Líbia desde 2011, o accionamento da garantia configuraria uma flagrante situação de desequilíbrio da relação jurídica principal que a obrigação do garante visa assegurar. E mais se considerou que também haveria abuso na sua execução, alteração das circunstâncias em que as partes fundaram a obrigação de contratar (por causa da Guerra na Líbia), por ter repercussões nas condições de execução dos contratos de empreitada que justificaram a emissão das garantias. A guerra alterou o objecto, prazo, preço e até mesmo, entidade adjudicante do contrato de empreitada. E tais alterações comunicam-se à(s) contragarantia (s). 18. Diversamente, a 2ª instância teve um entendimento diverso. Para o efeito destaca (citação, da nossa responsabilidade, a partir do acórdão): “Não está em causa qualquer pedido de cumprimento por parte do credor beneficiário – neste caso, de qualquer dos referidos bancos – ou sequer do dono da obra. Antes, saber se, nos termos do contrato de garantia – celebrado entre o R. BCP e os referidos bancos – os mesmos se renovaram, mantendo-se em vigor até 13 de Outubro de 2016 e 14 de Outubro de 2016, datas do seu cancelamento por parte daqueles bancos, consoante ponto 135. Ou se se devem considerar extintos desde 30-10-2014 e 30-4-2015, consoante entendem as AA.. Já vimos não existir qualquer relação entre o Banco R. e a dona da obra. Resultando do contrato de garantia que “…tal (contra-)garantia era automaticamente renovável a pedido escrito do ABC. Apesar da sobredita data de validade (podendo o prazo da mesma ser estendido) nós Banco Comercial Português, S.A., seremos somente libertados de todas as nossas responsabilidades junto do ABC relativamente à garantia bancária depois de o ABC ter ele próprio sido liberto de todas as suas responsabilidades respeitantes ou relacionadas com a carta de crédito mesmo que os documentos originais da carta de crédito não tenham sido devolvidos ao ABC” – ponto 128. Ora, tendo o R. BCP, na sequência da solicitação da 2ª A., celebrado os contratos de (contra-)garantia com o Arab Banking Corporation e com o ABC International Bank nos termos referidos, estava obrigado a cumprir o acordado, ou seja, a manter o contrato enquanto não fosse desonerado pelo respectivo beneficiário, independentemente das vicissitudes que o conflito gerou no contrato de empreitada. Doutro modo, incorria em responsabilidade perante os referidos bancos – que haviam prestado garantias à dona da obra, mas porque também lhes prestaram (contra-)garantias. Não parece, assim, e até porque nem está em causa qualquer pedido de cumprimento do contrato de empreitada por parte do dono da obra, que o Banco R. devesse actuar doutro modo, imiscuindo-se nas vicissitudes daquele contrato e incorrendo em responsabilidade contratual para com os bancos a quem prestou as (contra-)garantias - os beneficiários das mesmas, portanto. Como refere o recorrente, não obstante o conflito que deflagrou na … constitua um facto público e notório, não se pode inferir daí, sem mais, a automática extinção das (contra-)garantias bancárias. O que, e para além do que já se disse, implicava uma ingerência do R. BCP no contrato de empreitada, ao qual era alheio e assim se deve manter – atente-se, aliás, que mesmo depois da deflagração do conflito, as partes mantiveram conversações sobre o eventual prosseguimento dos trabalhos – pontos 69 e ss. - não resultando sequer dos autos que o contrato de empreitada tenha sido extinto. Em suma, tratando-se de (contra-) garantias, estão, em primeira linha, dependentes da sorte das garantias prestadas. Pelo que, mantendo-se estas – o que não depende do R. BCP - terão de se manter igualmente as (contra-)garantias, independentemente das vicissitudes do contrato de empreitada. Não sendo exigível que o R. BCP, não obstante a situação descrita relativamente ao contrato de empreitada e as respectivas consequências para a 2ª A., entre em litígio com os bancos que prestaram as garantias em benefício da dona da obra – até porque, repete-se, nem está em causa qualquer pedido de pagamento por parte do dono da obra. 19. Analisando a relação entre AA. e 1ªR: – não se trata de uma relação de cobertura no sentido tradicional, pois esta tem como intervenientes o garantido (os AA.) e o garante de 1º plano (os bancos estrangeiros). A relação de cobertura é uma relação em que o garante de 1º plano se compromete a prestar a garantia, mediante retribuição, a pedido do garantido. Nestes casos, o garante, em geral um banco, assume o compromisso de emitir uma garantia a favor de um terceiro (beneficiário – autoridades líbias) que venha a ser designado pelo garantido e como contrapartida desta obrigação exige, do garantido, o pagamento de uma comissão; - não se trata de uma relação de atribuição, denominada contrato base, pois esta estabelece-se entre o garantido (os AA) e o beneficiário da garantia (autoridades líbias) – envolvendo o contrato de empreitada para a construção do aeroporto; - não se trata de uma relação de execução, a qual envolve o garante (os bancos estrangeiros) e o beneficiário da garantia (autoridades líbias). Mas já será uma relação que se assemelha à relação de cobertura acima indicada – tem como intervenientes o garantido (os AA.) e um contragarante (o 1ºR), que assumiu um compromisso de garantia em favor dos garantes de 1º plano (os bancos estrangeiros), a pedido dos garantidos (AA.), e que vem a resultar na emissão de “carta de garantia”. 20. Que dizer sobre a decisão recorrida e a posição da 1ª instância? A perspectiva do tribunal de 1ª e 2ª instância são distintas e nenhuma das posições se pode afirmar completamente errada. Mas a aplicação das considerações efectuadas pelo TR ao caso concreto afigura-se ser, in casu, demasiado formalista e retirar aos AA., em relação às contragarantias, qualquer possibilidade de defesa face a situações excepcionais que, estivesse em causa uma execução da garantia, lhe seriam facultadas. Ao assim proceder é como se se afirmasse que no âmbito das contragarantias vigora sempre e em qualquer circunstância o princípio da autonomia e automaticidade. Se essa posição não é absolutamente chocante perante casos duvidosos, no caso concreto, em que os bancos contragarantidos vieram libertar o 1ºR da responsabilidade inerente à emissão das contragarantias, faz-nos duvidar da bondade da solução e do justo equilíbrio das relações entre AA. e 1ºR, que se viu confrontado com uma situação inevitável e fora do seu controlo, tendo procurado junto das instâncias judiciais a protecção que a ordem jurídica deve oferecer quando as relações contratuais e a autonomia privada não oferecem uma solução aceitável. 21. Com relevo para a resolução do recurso destacamos: 1. Os factos provados: 14, 18, 23, 25, 26, 31 a 60, 64 a 67, 69, 72 a 75, 81 a 85, 90 a 110, 112 a 119, 122 a 124 e 127 a 129, que aqui se dão por reproduzidos; 2. Dos documentos juntos aos autos e dos factos provados resulta, com relevo, para julgamento do conflito entre as partes o seguinte: a) Contrato de empreitada celebrado entre Autoridade de Aviação Civil da Líbia (adjudicante) e o consórcio, que integra as AA. na presente acção, figurando estas como segunda parte em 3/2/2008; tendo por objecto a construção de dois novos terminais no aeroporto Internacional de Tripoli; a segunda parte assumiu o compromisso de executar a empreitada objecto do contrato; prazo de conclusão previsto para terminal Leste – 1/9/2009; prazo de conclusão prevista de terminal Oeste até setembro de 2009; art.º 3º - admitia-se que a segunda parte pudesse não ter condições de concluir a obra no prazo indicado, por razões de força maior alheias o seu controlo, estabelecendo-se a obrigações de notificar a 1ª parte dos motivos e do período adicional necessário; para assegurar a boa execução da obra a segunda parte devia apresentar garantia no valor de 10% da estimativa preliminar, devendo a mesma manter-se durante o período de execução e até recepção definitiva (art.º 6.º); art.º10º também se exigia garantia por adiantamento do preço; resolução do contrato pela 1ª parte (art.º30.º), com execução da garantia; art.º 34.º (alteração das circunstâncias e força maior) - com possibilidade de segunda parte resolver o contrato e com indicação de ficar desonerada do cumprimento das suas obrigações em caso de força maior que impossibilite o cumprimento, remetendo para art.º 28.º; direito aplicável ao contrato (art.º 52 – Líbio), com submissão a arbitragem da CCI; anexo 9 – modelo de carta de crédito standby referente a garantia de boa execução/caução/pagamento antecipado; b) Documentos recebidos pelo BCP a solicitar a renovação das contragarantias, por mensagem swift, com indicação de ter sido recebida a mensagem do Sahara Bank, Lybia, que se passava a transcrever, continham a identificação do n.º da contragarantia, data de emissão e valor; na citação do texto vê-se ainda a indicação da garantia de 1º plano que a contragarantia assegurada, com numero (…..004[2] [3]), valor e beneficiário Libyan Civil Aviation Authority; indicação do banco estrangeiro que solicitava o pedido; indicação de ordenador (TAV-TEPE AKFEN INV); continha a indicação de que foi requerido o pagamento total da garantia bancária, e a seguinte expressão/oes: caso “v.exas. não consigam prorrogar a validade da garantia até … excepto em caso de instruções para a renovação recebidas por nós durante o corrente período de validade, consideraremos este swift como uma interpelação formal para pagamento e creditação do valor total da Libyan Civil Aviation Authority para a nossa A/C com envio de swift urgente da vossa parte”; mais indicava: “recordamos que, nos termos em que requereu ao banco (ABC) a emissão do SLBC em seu nome, o SLBC era renovável/prorrogável mediante simples primeira solicitação do beneficiário. Em .. de … (ano) foi recebida a solicitação do beneficiário. A validade do SBLC foi, desta forma, prorrogada até…..(dia e ano) e nos termos da contragarantia a sua responsabilidade perante o banco (ABC ou Sahara Bank) foi automaticamente prorrogada, passando a ser válida até 30 dias após o banco ser libertado de todas as responsabilidades em virtude ou relacionadas com o SBLC. Caso queira libertar-se da responsabilidade perante o banco (ABC ou Sahara Bank)) antes do fim do prazo da SBLC, por favor considere esta mensagem como interpelação formal e válida para pagamento do valor total da contragarantia e para providenciar creditação na nossa conta n.º….” – assim, doc. 34 – fls. 344 e ss vol. 2 (autos em papel); doc. 37 – fls. 356 e ss vol. 2 (autos em papel); c) Email do BCP dirigido a BB confirmando o cancelamento da contragarantia n.º ….658, no valor de 29.478.431,99 Euros, dada pelo BCP ao ABC em 30/10/2014 – doc. 38, datado de 31/10/2014; d) Doc. 39 – email do BCP dirigido a BB, datado de 11 de Nov de 2014, invertendo a informação de cancelamento da garantia e indicando que a mesma a garantia dada pelo ABC está prorrogada até 31/3/2015 e a contragarantia do BCP também (conforme swift – doc. 40); e) Teor do swift reproduzido no doc. 40, de 10/11/2014 – com indicação do valor da garantia bancária do ABC de 58.956.863,96 euros e beneficiário a H.... – fls. 367, vol. 2 (autos em papel); identificação da SBLC n.º …..047; f) Doc. 41 do BCP aos AA dando conta dos elementos discrepantes do doc. 40 e pedindo instruções g) Doc. 52 – com indicação dos elementos que constituiriam prova líquida da legitimidade da recusa na renovação da garantia ……658 pelo BCP 22. Vejamos agora alguns dos argumentos do tribunal recorrido para inverter a decisão da 1ª instância. Um desses argumentos foi o de que o 1ºR estaria vinculado por ser distinta a situação de um “pedido de pagamento da garantia bancária” face a um “pedido de renovação/manutenção em vigor”; in casu não teria ocorrido um pedido de pagamento, mas uma solicitação de renovação/manutenção, pelo que os motivos que permitem a recusa de pagamento nas garantias bancárias autónomas, ainda que assumidamente excepcionais (como fraude ou alteração das circunstâncias) não seriam aplicáveis à situação mas apenas ao pedido de pagamento. Tal como defende o recorrente, não cremos que assista razão ao tribunal a quo quando, nos termos em que o faz, trata diferentemente “pedidos de pagamento” e “pedidos de renovação/manutenção em vigor” das garantias bancárias dos autos. É que as garantias bancárias em discussão (contragarantias, mais propriamente) estavam contratualmente sujeitas ao regime “extend or pay”, o que significa que se o banco se recusa a renovar a contragarantia por si prestada é como se a mesma tivesse sido exigida pelo credor, ficando o banco obrigado a pagar valores garantidos. Isto mesmo resulta dos diversos documentos contratuais juntos aos autos (nomeadamente, doc. 34 ou 37) e do texto da proposta e da garantia (contragarantia) emitida pelo 1º R. (cf. anexo ao contrato de empreitada a fls. 562 dos autos em papel, vol. 2; doc. 7 e doc. 11, dos autos em papel, vol. 1). É defensável que as excepções das AA. que pudessem ser invocadas contra as garantias (e garantes de 1º plano) se pudessem também invocar na sua relação com o 1ºR, ainda que este tenha assegurado pela contragarantia outra entidade, quer esta seja igualmente contragarante ou garante de 1º plano face ao beneficiário, atenta a cadeia de ligações estritas que existem entre as diversas entidades envolvidas no assegurar da operação resultante da celebração do contrato de empreitada; e mesmo que não se defenda em absoluto que o contragarante está sempre sujeito às mesmas limitações de pagamento/renovação que os AA. poderiam opor ao garante de 1º plano e ao beneficiário, não devem existir dúvidas de que, in casu, atento o relacionamento que se foi estabelecendo entre as AA. e o 1ºR, este sabia e não podia ignorar a especificidade da situação relativa à guerra da … e todas as consequências que daí advieram para o país e para os negócios em curso, muito em especial para o do contrato de empreitada celebrado entre as AA. e a autoridade … (dono da obra), já que as AA. sempre colocaram a 1ªR a par da informação e do desenvolvimento do projecto e era público e notório que a Guerra não poderia ter sido indiferente ao desenrolar do projecto. O regime dos arts. 334.º e 762.º do CC deve ser aplicável a eventos bélicos, porventura como alteração anormal das circunstâncias, e tem sido considerada pela doutrina e jurisprudência como um dos casos em que os bancos garantes se podem opor à execução da garantia autónoma, por facto não imputável ao devedor. Estamos em crer que se pode afirmar que, atento o carácter causal da garantia bancária – reconhecido pela doutrina e jurisprudência – há que admitir a aplicação à contragarantia dos motivos que sustentam o dever de recusa de pagamento ou renovação de uma garantia bancária de 1º plano: seja porque se demonstre que a sua causa desapareceu, seja porque a mesma sofreu uma alteração de circunstâncias, seja porque ocorrem motivos de força maior que impõem uma solução diversa da inicialmente prevista. Considerando que a Carta de Crédito ….004 e a contragarantia …..658 emitida pelo 1ºR visaram garantir o reembolso da parte do preço do contrato de empreitada objecto de adiantamento e, por outro, a Carta de Crédito …005 e a contragarantia …649 emitida pelo 1ºR visaram garantir a boa execução dos trabalhos acordados no contrato de empreitada, existindo um motivo de força maior a paralisar as obrigações decorrentes desses contratos, deve a mesma reflectir-se nas garantias prestadas. O contrato de empreitada previa ele próprio a possibilidade de existência de causa de força maior e regulava os seus efeitos (cf. factos provados 14, 17 e 26); a prestação das garantias de adiantamento e boa execução resultavam desse mesmo contrato como obrigação das AA.; se o contrato admite que as obrigações dele decorrentes para as partes ficam suspensas por causa de força maior, deve essa força maior, repercutir-se nas obrigações de prestação de garantia, seja pela devolução das prestadas, seja pela não renovação. Se uma das partes do contrato de empreitada não retira do teor do mesmo as ilações das vinculações que assumiu – reconhecer a importância e efeitos da causa de força maior – e exige a renovação das garantias na modalidade “extend or pay”, está a mesma a indiciar que recorrerá à sua execução em situação ilícita. 23. Não se desconhece, nem se desconsidera o argumento do 1ºR no sentido de estar vinculado perante outras instituições, e de correr o risco de, ao não renovar as garantias, ser obrigado a honrar o seu compromisso perante as instituições junto das quais se vinculou; mas não se aceita que essa ordem de razões possa bloquear em absoluto a posição das partes do contrato de empreitada que contavam com a cláusula de força maior. 24. A força maior é, na nossa perspectiva, não apenas uma estipulação contratual a respeitar, mas um princípio norteador da ordem pública internacional do Estado Português; uma decorrência da boa fé no cumprimento dos contratos e do seu equilíbrio. O valor reputacional do 1ºR não se sobrepõe a esse valor, não podendo este dizer que opta por ignorar a situação dos AA. porque para si é mais importante não ser responsabilizado perante as instituições junto das quais se vinculou. Não quando estamos perante uma situação tão gritante como a de uma guerra e com os contornos que ela teve no país em que ocorreu e no contrato que ligava as AA. e o dono da obra, conforme resulta dos factos provados. 25. Não nos impressiona em demasia a construção da garantia bancária autónoma como garantia desligada do contrato de empreitada, no sentido de ser de todo indiferente o que ocorre com este e de a garantia ter surgido na prática internacional exactamente para promover este desligar de vínculos. Não nos parece que a admissão de situações de verdadeira excepção à suposta autonomia desvirtuem a sua aplicabilidade prática e as suas vantagens. A regra continuará a ser a de as vicissitudes do contrato não afectarem a garantia. Mas o caso dos autos não se insere nessa regra; houve um factor totalmente imprevisível e incontrolável a influenciar a sorte do contrato de empreitada; esse factor afectará o contrato e as garantias associadas, de 1º plano e as contragarantias. 26. A disponibilização pelas ordens jurídicas aos seus cidadãos e empresas de mecanismos de defesa, mesmo que cautelares, dos seus direitos é ainda um argumento que não pode ser desconsiderado. Quer a providência cautelar instaurada em Portugal, quer a instaurada em França, ambas deferidas, apontam no sentido de o contrato de empreitada estar sujeito ao regime da força maior e à suspensão da execução das garantias e contragarantias, com as respectivas consequências. 27. Nem se diga que esta ideia não tem base de sustentação contratual. É que as garantias prestadas foram-no com base em modelos pré-fornecidos e com indicação da sua sujeição a regras Uniformes da Câmara de Comércio Internacional – as URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI e as UCPDC, n.º 600, da CCI – que foram incorporadas nos textos contratuais, assumindo-se como regras que disciplinam as relações entre as partes. E tais regras uniformes acolhem a ideia já indicada – a relevância da força maior como elemento de perturbação do contrato e seu efeito nas garantias prestadas (art.º 13.º URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI). 28. Há ainda que destacar a especificidade da contragarantia ….658 do 1ªR, em favor do ABC, para contragarantia das obrigações assumidas pelo ABC em favor do LCAA, com o n.º …004: a) Caducidade da garantia por não haver pedido de renovação ou execução dentro do prazo de validade, comunicação da caducidade aos AA. e impossibilidade de “reversão” da caducidade – por forças das regras Uniformes da Câmara de Comércio Internacional – as URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI (19.º, 25.º ). A extinção da obrigação por não ter sido exigida dentro do seu prazo de validade não é susceptível de ser revertida, dando origem a nova garantia, sem acordo dos AA. (ordenantes) – cf. doc. 38 e factos provados 99 a 104. b) Desconformidades identificadas pelo 1ªR no pedido de renovação da contragarantia recebido em 10 de Novembro de 2014 e o dever se recusa da renovação – por forças das regras Uniformes da Câmara de Comércio Internacional – as URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI (art.º 9.º e 16.º); UCPDC, n.º 600, da CCI (art.º 14.º, 16.º) – tornavam exigível ao 1ºR a recusa da renovação da contragarantia solicitada em 10 novembro de 2014 (art.º 20.º, c) cf. doc. 40 e doc. 41, e factos provados: - O beneficiário da garantia não era o que estava acordado mas uma instituição denominada H....; - o pedido não respeitava as exigências do art.º 20.º, al. b) da URDG, n.º 458, versão 2008 da CCI III. Decisão Em face do exposto, revoga-se o acórdão recorrido e repristina-se a sentença. As custas do recurso de revista correm pela recorrida, com redução do remanescente da taxa de justiça a 10% do valor total, atento o comportamento das partes, o valor da causa (764.552,91 euros) e a complexidade do processo. Lisboa, 20 de Abril de 2021 Fátima Gomes (relatora), que assina electronicamente Fernando Samões, que assina electronicamente Maria João Vaz Tomé Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade da Exma. Senhora Conselheira, Maria João Vaz Tomé, que também compõe este Colectivo. _______ [1] O TR… socorre-se da obra de MÓNICA JARDIM, in A Garantia Autónoma, 79, para explicitar os contornos da garantia indirecta. Em apoio bibliográfico cf. ainda a bibliografia citada na sentença. |