Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2219/16.3T8STS-C.P2.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: ANA PAULA BOULAROT
Descritores: PRAZO DE PRESCRIÇÃO
PRESTAÇÕES PERIÓDICAS
LISTA DE CRÉDITOS RECONHECIDOS E NÃO RECONHECIDOS
DIREITO DA UNIÃO EUROPEIA
REGULAMENTO
IRREGULARIDADE
EXECUÇÃO
REVISTA EXCECIONAL
Data do Acordão: 11/17/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: NEGA-SE A REVISTA.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO.
Sumário :
I - O IAPMEI - Agência para a Competitividade e Inovação, IP, é uma agência pública a quem cumpre promover a competitividade e o crescimento empresarial, assegurar o apoio à conceção, execução e avaliação de políticas dirigidas à atividade industrial, visando o reforço da inovação, do empreendedorismo e do investimento empresarial.
II - No exercício da sua atividade a devedora insolvente candidatou-se ao Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial, regulado pelo DL n.º 70-B/2000, de 05-05, e pela Portaria n.º 262/2004, de 11-03, tendo nessa sequência sido celebrado com o IAPMEI um contrato de concessão de incentivos financeiros ao investimento, no âmbito do qual foi concedido àquela um incentivo financeiro, com uma parte reembolsável, em prestações, nos termos do clausulado entre as partes.
III - O prazo prescricional aplicável às prestações em divida rege-se pelo preceituado nos arts. 310.º, al. g), e 307.º do CC, sendo inaplicável o art. 3.º do Regulamento (CE EURATON) 2988/95 do Conselho de 18-12-1995, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades europeias.
IV - As medidas especiais materiais de âmbito horizontal relativamente a controlos e sanções destinadas ao efeito, tendo em atenção os subsídios não reembolsáveis concedidos aos agentes económicos ao abrigo dos incentivos concedidos, adotadas neste Regulamento, constituem coisa diversa dos estímulos nacionais concedidos ao abrigo do sistema SIME, no âmbito do qual foi outorgado o estímulo financeiro cujo reembolso constitui a ratio essendi destes autos.
V - In casu não se está face a um qualquer apoio económico, não reembolsável, concedido ao abrigo de algum programa comunitário, enquadrável nas disposições prescritas no citado Regulamento CE EURATON, mas antes, como decorre da factualidade, face a um contrato celebrado entre o IAPMEI e a ERMESA, no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um estímulo financeiro reembolsável em prestações, o qual não veio a ser satisfeito pontualmente.
Decisão Texto Integral:


PROC 2219/16.3T8STS-C.P2.S1

6ª SECÇÃO

ACORDAM, NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I Por apenso aos autos de insolvência ERMESA – SOCIEDADE METALOMECÂNICA, SA, decorrido o prazo da reclamação de créditos, veio o Sr. Administrador da Insolvência, ao abrigo do disposto no artigo 129.º, n.º 1, do CIRE, apresentar a lista de todos os créditos por si reconhecidos – cfr. fls. 2 – e a lista de créditos não reconhecidos – cfr. fls. 4 e 5; mais juntou os documentos comprovativos do cumprimento do disposto no artigo 129º, n.º 4 do CIRE, que constam a fls. 6 e seguintes.

Da relação de créditos reconhecidos /não reconhecidos, a que alude o artigo 129º, n.º 1 do CIRE, encontrava-se reconhecido ao Ministério Público, entre outros, um crédito de €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora, relativo a subsídios e juros do IAPMEI – AGÊNCIA PARA A COMPETITIVIDADE E INOVAÇÃO, I.P.

A lista dos credores reconhecidos / não reconhecidos foi alvo de impugnações, entre as quais, a fls. 216 e seguintes, pela insolvente ERMESA – Sociedade Metalomecânica, SA, relativamente aos créditos de Banco Comercial Português, S.A., Banco Popular Portugal, SA, COFIDIS, SA, Instituto da Segurança Social, IP, Ministério Público/ Autoridade Tributária.

Na impugnação apresentada a devedora insolvente ERMESA – SOCIEDADE METALOMECÂNICA, S.A. alegou que tal crédito não existe.

Para o efeito, alegou que o IAPMEI teve em seu poder garantia bancária emitida pelo BANIF para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval; entretanto, em tal relação contratual houve atribuição de prémio à sociedade ERMESA e esta realizou amortização da dívida, para além dos reembolsos a que estava adstrita; deste modo, em 4.3.2015, a ERMESA solicitou ao BANIF a devolução livrança que caucionava a garantia bancária, que já expirara, tendo a mesma sido levantada pessoalmente, o que significa que todas as obrigações para com o IAPMEI estavam e estão regularizadas.

Mais alegou que se assim não se entender, o IAPMEI poderia ter reclamado o seu crédito no processo de insolvência n.º 2200/11...., o que não fez.

O processo de insolvência n.º 2200/11...., do extinto ...º Juízo do Tribunal Judicial de ....., por sentença proferida em 16 de Setembro de 2011, foi declarado encerrado por homologação de plano de insolvência, nos termos do artigo 230º, n.º 1, alínea b) do CIRE, tendo por sentença de verificação e graduação de créditos proferida em 11 de Fevereiro de 2013 sido homologada a lista dos credores reconhecidos apresentada pela então administradora da insolvência. O IAPMEI ou o Ministério Público em sua representação não reclamaram em tal processo qualquer crédito, o qual não lhe foi reconhecido, sendo certo ainda que estes também não impugnaram a relação de créditos apresentada nem apresentaram verificação ulterior de créditos.

Conclui que ao abrigo do n.º 1 do artigo 91º do CIRE a declaração de insolvência determina o imediato vencimento de todas as obrigações do insolvente, pelo que cabia ao IAPMEI o ónus de reclamar o seu crédito em tal processo, o que não fez, pelo que não existindo qualquer crédito, nenhum crédito pode ser reconhecido a este instituto.

Proferiu-se despacho que convidou a devedora impugnante a aperfeiçoar a impugnação e no uso de tal faculdade veio a devedora ERMESA – SOCIEDADE METALOMECÂNICA, S.A. alegar que o crédito reconhecido pelo Sr. Administrador da Insolvência diz respeito a parte do capital do incentivo recebido ao abrigo do contrato de financiamento n.º ......, mediante o qual o IAPMEI lhe atribuiu uma comparticipação financeira com natureza de subsídio reembolsável no valor de 1.102.617,00€, comparticipação esta atribuída no âmbito dos fundos comunitários do QREN, Programa SIME II – Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial; tal incentivo deveria ser reembolsado pela insolvente em dez prestações semestrais com início em 31 de Julho de 2009 e termo em 31 de Setembro de 2014.

A insolvente amortizou €87.359,46, em 21 de Abril de 2010 e €18.380,55 em 6.de Agosto de 2010. Em 21 de Julho de 2010, o IAPMEI atribuiu um prémio no valor de €237.741,02, que se traduz no não reembolso deste montante, tendo o incentivo reembolsável ficado reduzido a €759.135,97. Em 23 de março de 2013, o IAPMEI atribuiu novo prémio à devedora insolvente, ora no valor de €530.311,83, com o que o incentivo reembolsável ficou reduzido ao montante €228.824,13.

Em 16 de Setembro de 2011 foi proferida no processo de insolvência n.º 2200/11.... sentença de insolvência da ora devedora /insolvente e o crédito do IAPMEI não foi em tal processo reclamado ou reconhecido, tendo a sentença de homologação do Plano de Insolvência aprovado transitado em julgado em 17 de Julho de 2012.

O prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE Euratom) n.º 2988/95, do Conselho, de 18.12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização. Tal prazo conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data de cessação da mesma (cfr. art. 3º, n.º 1 do Regulamento).

Na data do último pagamento, 6 de Agosto de 2010, a insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído, nada mais tendo liquidado ao IAPMEI. Em 2 de Setembro de 2015, data em que o IAPMEI instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição, por força do citado artigo 3º, n.º 1 do Regulamento, razão pela qual tal crédito está prescrito.

Por decisão proferida em 15 de Março de 2018 foi julgada procedente a impugnação deduzida por ERMESA – Sociedade de Metalomecânica, S.A., no que ao crédito reconhecido ao IAPMEI concerne, excluindo-se tal crédito da lista de créditos.

Por acórdão do Tribunal da Relação ..... proferido em 30 de abril de 2020, proferiu-se a seguinte decisão:

Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar procedente a apelação e nessa conformidade:

- determinar a notificação do IAPMEI, IP para responder, querendo, à impugnação inicial e à impugnação aperfeiçoada, nos termos e para os efeitos do art. 131º/2/3 CIRE, no prazo de 10 dias, sob pena de a impugnação ser julgada procedente;

- anular o despacho que se seguiu, proferido em 15 de março de 2018 ( data da conclusão 08 de março de 2018 – Ref. Citius .....) na parte que julgou procedente a impugnação e não reconheceu o crédito de IAPMEI, IP;

- anular o segmento da sentença de graduação, que não considerou a eventual graduação deste crédito, o qual deve ser incluído na graduação, caso venha a ser julgado verificado e reconhecido”.

Após baixa dos autos ao tribunal de 1ª instância, notificou-se o credor IAPMEI da impugnação e para querendo responder.

Em sede de resposta, o IAPMEI confirmou a celebração do contrato n.º ....., no âmbito do qual foi atribuído à ora insolvente uma comparticipação financeira com natureza de subsídio reembolsável no valor de €1.102.617,00, subsídio que deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31 de Julho de 2009 e termo em 31 de janeiro de 2014.

Mais confirmou que a ERMESA amortizou €87.359,46 em 21 de Abril de 2010 e em 6 de Agosto de 2010 amortizou €18.380,55, montantes imputados ao pagamento do capital em dívida.

Confirmou igualmente que em 21 de Julho de 2010 foi decidido a atribuição de um prémio à ERMESA, no valor de €237.741,02, que se traduz no não reembolso deste montante; e que em 23 de Fevereiro de 2013 foi decidido a atribuição de um novo prémio à ERMESA, ora no valor de €530.311,83, que também se traduz no não reembolso de tal montante; deste modo, o capital em dívida consolidou-se em €228.824,13. O credor confirmou também a pendência do processo de insolvência n.º 2200/11...., onde os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa que relativamente aos credores com garantia de terceiros o pagamento do capital se efetuasse em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a 1ª dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.

O crédito do IAPMEI, apesar de não reclamado em tal processo nem reconhecido, tem de observar o indicado plano, atento o disposto no art. 217º, n.º 1 do CIRE. A sentença de homologação do plano transitou em 17 de Julho de 2012, pelo que o pagamento das indicadas prestações semestrais iniciaram-se em 17 de Julho de 2014. Acresce que por carta datada de 12 de Janeiro de 2015, o IAPMEI interpelou a ERMESA para o pagamento da 1ª prestação, o que esta não concretizou, pelo que se consideraram vencidas todas as prestações de capital (art. 781ºdo CC). Os juros de mora vencidos desde 17 de Julho de 2014 até 15.4.2015 ascendem a €5.692,06, tendo sido emitida a competente certidão de dívida que é título executivo nos termos do art. 14º, n.º 2 do D.L. n.º 266/2012, de 28 de Dezembro.

Mais alegou que o seu crédito não se encontra prescrito, nos termos do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, já que este regulamento não se aplica ao caso presente, já que o crédito do IAPMEI provem de subsídio reembolsável em mora e não de incentivo não reembolsável e só nestes casos é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.

No que concerne à alegação da inexistência do crédito por via da devolução da garantia bancária por parte da entidade bancária emitente não assiste razão à impugnante, pois a simples devolução da garantia não extingue o crédito, sendo ademais certo que até corre termos no processo n.º 1118/18...., na Unidade Orgânica ... do Tribunal Tributário de ..., oposição deduzida pelo Banco Santander Totta, SA à execução fiscal instaurada pelo IAPMEI onde reclama o mesmo montante reclamado nestes autos, oposição que mereceu contestação deste, aguardando-se sentença.

Mais alega que o facto de o IAPMEI não ter reclamado o seu crédito no processo de insolvência n.º 2200/11.... não extingue o ora reclamado e reconhecido crédito.

Em sede de saneador proferiu-se sentença a julgar improcedente a impugnação apresentada pela Insolvente relativamente aos créditos reclamados pelo Ministério Publico em nome de IAPMEI, julgando-se verificados o crédito que consta da relação de créditos elaborada pelo AI, no montante de €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora.

A devedora/Insolvente veio interpor recurso da sentença, o qual a final foi julgado improcedente, com a confirmação da decisão impugnada.

Irresignada, recorreu a Insolvente de Revista excepcional, nos termos do artigo 672º, nº 1, alíneas a), b) e c) do CPCivil, tendo a mesma sido admitida pelo Acórdão da Formação que faz fls 665 a 680, uma vez que se considerou estarmos face a uma questão - a da prescrição - cuja cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é necessária para uma melhor aplicação do direito, apresentando para o efeito, e no que à economia da problemática decidenda diz respeito, as seguintes conclusões:

- A presente revista é admissível à luz do disposto no nº 3 do artº 671º CPC, para efeitos da melhor aplicação do direito, também aqui em matéria de grande relevância jurídica, sobretudo no momento em que da execução dos fundos europeus do PRR – Plano de Recuperação e Resiliência, resultarão por certo diversos litígios sobre a aplicação do Regulamento (CE, Euratom) nº 2988/95 do Conselho, de 18-12, designadamente em matéria de interpretação do disposto no seu artº 3º.

- Na impugnação do crédito reclamado pelo Recorrido, a Insolvente evocou ainda a prescrição, à luz do previsto no artº 3º nº 1 do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18-12, ou seja, o decurso do prazo de 4 anos.

- O prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no artº 3º nº 1 do Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95, do Conselho, de 18-12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização.

- Tal prazo de prescrição conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data da cessação da mesma (cfr. artº 3º nº 1 do citado Regulamento).

- Sendo certo que, em 6-8-2010, data do último pagamento das prestações semestrais a que estava obrigada, a Insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído e desde aquela data a Insolvente não liquidou ao Recorrido mais nenhuma das prestações semestrais a que estava obrigada.

- Em 2-9-2015, data em que o Recorrido instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à Insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição aplicável por força do artº 3º nº 1 do citado Regulamento.

- Encontra-se por isso prescrito o crédito reclamado nos presentes autos, pelo que a Insolvente nada deve ao IAPMEI.

- Quer no requerimento de esclarecimentos complementares à impugnação do crédito reclamado pelo Recorrido, quer nas suas alegações de recurso para a Veneranda Relação ....., a Recorrente articulou o facto que, em seu entender, constitui o ato (ou omissão) que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União, a partir do qual se conta a prescrição invocada.

- Assim é manifesto que, ao contrário do que erradamente foi entendimento do acórdão “a quo” o recorrente indicou nos autos o ato/omissão e respetiva data, a partir da qual se verifica o incumprimento do direito da União bem como a lesão do orçamento da União: a data (6-8-2010) do último pagamento realizado, momento a partir do qual entrou em incumprimento, facto esse que está provado nos autos (cfr. Ponto 6 da matéria provada).

Não foram apresentadas contra alegações.

II Põe-se como único problema a resolver nesta Revista o de saber se ao crédito peticionado é ou não aplicável o prazo prescricional de quatro anos por aplicação do artº 3º nº 1 do Regulamento (CE EURATOM) nº 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro.

As instâncias declararam como assentes os seguintes factos:

1.Entre o Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e a ERMESA, SA foi celebrado o contrato n.º ....., no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um incentivo financeiro reembolsável no valor de €1.102.617,00, nos termos do documento de fls. 563 e seguintes e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.

2. O incentivo financeiro reembolsável referido em 2 deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31.7.2009 e termo em 31.1.2014.

3. Em 21.4.2010, a ERMESA, SA amortizou €87.359,46.

4. Em 6.8.2010, a ERMESA, SA amortizou €18.380,55.

5. Em 21.7.2010 foi decidida a atribuição de um prémio à ERMESA, SA, no valor de €237.741,02, que se traduziu no não reembolso deste montante.

6. Em 23.2.2013 foi decidida a atribuição de um novo prémio à ERMESA, SA, no valor de €530.311,83, que se traduz no não reembolso de tal montante.

7. Considerando o referido em 3, 4, 5 e 6, o incentivo referido em 1 reduziu-se a €228.824,13.

8. O IAPMEI teve em seu poder uma garantia bancária emitida pelo BANIF para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval.

9. Em 4.3.2015 a ERMESA, SA solicitou ao BANIF a devolução da livrança referida em 8, a qual foi por aquela levantada pessoalmente nas instalações deste.

10. No extinto ...º Juízo Cível do Tribunal de ....... correu termos o processo de insolvência de ERMESA, SA, sob o n.º 2200/11.....

11. No processo referido em 10 os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa, relativamente aos credores com garantia de terceiros, o pagamento do capital em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.

12. A sentença de homologação do plano transitou em 17.7.2012.

13. O IAPMEI não reclamou o seu crédito no processo de insolvência referido em 10.

14. Por carta datada de 12.1.2015, o IAPMEI interpelou a ERMESA, SA para o pagamento da 1ª prestação do seu crédito, vencida em 17.7.2014.

15. A ERMESA, SA não efetuou o pagamento reclamado nos termos referidos em 14.

16. Os juros de mora vencidos desde 17.7.2014 até 15.4.2015 ascendem a €5.692,06. 17. Com data de 30.7.2015 foi emitida pelo IAPMEI certidão de dívida nos termos do art. 14º, n.º 2 do D.L. n.º 266/2012, de 28/12, de onde consta ser a empresa ERMESA – Sociedade Metalomecânica, SA devedora do montante de €228.824,13, respeitante a parte do capital do incentivo recebido por força da assinatura do contrato n.º ..... no âmbito do Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial (SIME), e do montante de €5.692,06, respeitante a juros contratuais contados desde 17.7.2014 até 15.4.2015 sobre o capital referido antes.

18. Em 2.9.2015, o IAPMEI instaurou contra a ERMESA, SA processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente.

19. Em 12.7.2017 foi junta aos presentes autos a relação de créditos reconhecidos elaborada nos termos do art. 129º, n.º 1 do CIRE, de onde consta, ademais, o seguinte crédito, reconhecido ao Ministério Público: €259.742,68, sendo €228.824,13 de capital e €30.918,55 de juros de mora, relativo a subsídios e juros do IAPMEI – Agência para a Competitividade e Inovação, I.P.

Vejamos.

Lê-se a propósito da questão da prescrição, no Aresto sob censura o seguinte:

«[P]rescrição do crédito -

Nos pontos 6 a 12 das conclusões de recurso, a apelante insurge-se contra o segmento da sentença que julgou improcedente a exceção de prescrição.

Considera o apelado que o Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro não se aplica ao caso e que os fundamentos da decisão não merecem censura.

Está em causa apurar se o crédito reclamado pelo IAPMEI se mostra prescrito por aplicação da regra contida no art. 3º/1 do Regulamento (CE Euratom) nº 2988/95 do Conselho de 18 de dezembro.

Na sentença julgou-se improcedente a exceção, com os fundamentos que se transcrevem:

“ Por fim, quanto ao terceiro e último argumento apresentado pela insolvente, relacionado com a prescrição do crédito em apreço, entende a mesma que prazo para ser pedida a devolução das quantias irregularmente recebidas no âmbito da atribuição de ajudas comunitárias é o previsto no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95, do Conselho, de 18.12, ou seja, de 4 anos, sob pena de prescrição do respetivo procedimento de regularização; tal prazo conta-se a partir da data em que foi praticada a irregularidade ou, no caso de irregularidade continuada, a partir da data de cessação da mesma (cfr. art. 3º, n.º 1 do Regulamento); na data do último pagamento, 6.8.2010, a insolvente entrou em incumprimento do plano de reembolso do incentivo atribuído, nada mais tendo liquidado ao IAPMEI; consequentemente, em 2.9.2015, data em que o IAPMEI instaurou o processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora / insolvente, já havia decorrido o prazo de prescrição, por força do citado art.3º, n.º 1 do Regulamento, razão pela qual tal crédito está prescrito.

Entende o IAPMEI, no entanto, que não assiste razão à insolvente, não estando o crédito reclamado e reconhecido extinto por prescrição, nos termos do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, já que este regulamento não se aplica ao caso presente, pois o seu crédito provem de subsídio reembolsável em mora e não de incentivo não reembolsável e só nestes casos é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.

O Regulamento (CE EURATOM) n.º 2988/95 do Conselho de 18/12, relativo à proteção dos interesses financeiros das Comunidades Europeias, adotou uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito comunitário (art. 1º, n.º 1).

De acordo com o art. 3º, n.º 1 de tal regulamento, o prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº 1 do artigo 1º, contando-se tal prazo, quanto às irregularidades continuadas ou repetidas, desde o dia em que cessou a irregularidade.

No entanto, a prescrição do procedimento é interrompida por qualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente, tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade, começando a correr novo prazo de prescrição a contar de cada interrupção.

Tendo em consideração o exposto e se considerarmos, como a insolvente, que a mesma incumpriu com o contrato celebrado com o IAPMEI em 6.8.2010 (data em que pagou a última prestação semestral), o crédito em causa teria prescrito em 6.8.2014, pelo que, quanto em 2.9.2015 foi instaurada por este instituto a ação executiva com vista a recuperar o crédito devido, já estaria o mesmo prescrito.

Sucede que com a aprovação do plano de insolvência no processo de insolvência n.º 2200/11...... do extinto ...º Juízo Cível do Tribunal de ......., ainda que o crédito do IAPMEI não tenha aí sido reclamado, ficou o mesmo vinculado aos seus termos e alterações introduzidas a todos os créditos (cfr. art. 217º, n.º 1 do CIRE). Deste modo, o seu indicado crédito haveria de ser pago em 16 prestações semestrais, sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos após o trânsito em julgado da sentença homologatória do Plano de Insolvência, o qual ocorreu em 17.7.2012.

Assim, a primeira das 16 prestações do indicado crédito haveria de ser paga em 17.7.2014, o que não sucedeu, pelo que o IAPMEI interpelou a ERMESA ao seu pagamento por carta datada de 12.1.2015.

Em face do exposto e por via das alterações introduzidas aos créditos sobre a insolvência, que vincularam o IAPMEI, não é possível afirmar-se que em 6.8.2014 ou mesmo em 2.9.2015 já haviam decorrido os 4 anos de prescrição previstos no art. 3º, n.º 1 do Regulamento (CE EURATOM) n.º 2298/95 do Conselho de 18/12; os indicados 4 anos apenas culminaram em 17.7.2018, sendo contudo certo que, por via da execução instaurada em 2.9.2015, tal prazo sempre se teria interrompido.

Esta conclusão retira valor à defesa do IAPMEI, no sentido de que o Regulamento (CE EURATOM) N.º 2298/95, do Conselho de 18.12 se aplica tão só a incentivos não reembolsáveis, estando na origem do crédito reclamado um incentivo reembolsável e juros contratuais.

Na verdade, sabendo-se que as normas regulamentares constantes dos Regulamentos Comunitários são de aplicação obrigatória e imediata na ordem jurídica nacional, passando a fazer parte da mesma com um valor na respetiva hierarquia, considerando ainda o primado das normas de direito comunitário, e tendo-se concluído que à luz do indicado art. 3º, n.º 1 do Regulamento citado o crédito aqui em causa não se encontra prescrito nem se encontrava prescrito à data em que foi reclamado / reconhecido pelo Sr. Administrador da Insolvência, torna-se menos importante apurar se tal Regulamento se aplica apenas a incentivo não reembolsável, sendo que só neste caso é que ocorre a irregularidade que tem como consequência a rescisão do contrato, que equivale à sanção administrativa de que fala o supra mencionado normativo.

Em face do exposto, falece igualmente este terceiro e último argumento apresentado pela insolvente”.

Entendemos que se deve julgar improcedente a exceção, ainda que não se acompanhe todos os fundamentos expostos na sentença. Nos termos do art. 298º CC ficam sujeitos a prescrição, pelo seu não exercício durante o lapso de tempo estabelecido na lei, os direitos que não sejam indisponíveis ou que a lei não declare isentos de prescrição. Assim, como regra, todos os direitos estão sujeitos a prescrição.

A prescrição tem por fundamento específico a recusa de proteção a um comportamento contrário ao direito, a negligência do titular e ainda, a necessidade de obviar, em face do decurso do tempo, à dificuldade de prova por parte do sujeito passivo da relação jurídica.

O prazo de prescrição destina-se a servir a segurança e certeza da ordem jurídica, pondo-se assim termo a situações contrárias ao direito e à prejudicial ou perturbante dilação do seu exercício17.

A prescrição pode definir-se como a extinção dos direitos em consequência do seu não exercício durante certo lapso de tempo e daqui decorre que completada a prescrição, o beneficiário tem a faculdade de recusar o cumprimento da obrigação ou de se opor ao exercício do direito prescrito (art. 304º CC).

Contudo, a prescrição para ser eficaz necessita de ser invocada, por aquele a quem aproveita ou seu representante e tratando-se de incapaz, pelo Ministério Público, não sendo, pois, de conhecimento oficioso – art. 303º CC. Se tiver decorrido o prazo de prescrição e não sendo suscitada, mantém-se o devedor adstrito ao cumprimento.

Constitui uma exceção de carácter pessoal devendo ser invocada por quem dela pretenda beneficiar.

Em regra, os efeitos da interrupção da prescrição limitam-se ao direito e às pessoas em relação às quais a prescrição é interrompida.

Constituindo a prescrição matéria de exceção recai sobre a parte que a invoca o ónus da prova da sua ocorrência ( art. 342º/2 CC). Recaía sobre o apelante o ónus da prova dos factos que configuram a exceção, o que não logrou provar e os argumentos desenvolvidos nas conclusões de recurso não podem ser atendidos, por não terem sustentação no regime legal aplicado ao caso, pelos motivos que se passam a expor.

As normas regulamentares constantes dos Regulamentos Comunitários são de aplicação obrigatória e imediata na ordem jurídica nacional, passando a fazer parte da mesma com um valor na respetiva hierarquia, considerando ainda o primado das normas de direito comunitário ( art. 4º do Tratado da União Europeia).

O Regulamento n.º 2988/95(CE, EURATOM) do Conselho de 18 de dezembro de 1995 introduz, de acordo com o seu artigo 1º, “uma regulamentação geral em matéria de controlos homogéneos e de medidas e sanções administrativas relativamente a irregularidades no domínio do direito da União”, para, conforme resulta do terceiro considerando do referido regulamento, “combater em todos os domínios os atos lesivos dos interesses financeiros da União” (Acórdãos de 11 de junho de 2015, Pfeifer & Langen, C-52/14, EU:C:2015:381, n.o 20 e jurisprudência referida, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 23).

O Regulamento prevê no art. 3º:

1. §1º O prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade referida no nº1 do art. 1º.[…] […]

§3º A prescrição do procedimento é interrompida por qualquer ato, de que seja dado conhecimento à pessoa em causa, emanado da autoridade competente tendo em vista instruir ou instaurar procedimento por irregularidade. O prazo de prescrição corre de novo a contar de cada interrupção”.

O Tribunal de Justiça da União Europeia quando colocado perante questões prejudiciais relacionadas com a interpretação destas normas tem mantido a seguinte interpretação sintetizada nos considerandos 28 a 35 do acórdão 03 de outubro de 2019, processo C-378/18 (acessível em eur-lex.europa.eu; ECLI:EU:C:2019:832 6 ACÓRDÃO DE 3. 10. 2019 — PROCESSO C-378/18 WESTPHAL) e que se passam a transcrever:

“28. Além disso, com a adoção do Regulamento n.º 2988/95, em particular do seu artigo 3.º,n.º 1, primeiro parágrafo, o legislador da União decidiu instituir uma regra geral de prescrição aplicável na matéria, mediante a qual pretendia, por um lado, definir um prazo mínimo aplicado em todos os Estados-Membros e, por outro, renunciar à possibilidade de iniciar um procedimento devido a uma irregularidade lesiva dos interesses financeiros da União depois de decorrido um período de quatro anos posterior à prática dessa irregularidade (Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 27, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 39).

29. Daqui resulta que, a partir da data da entrada em vigor do Regulamento n.o 2988/95, qualquer irregularidade lesiva dos interesses financeiros da União pode, em princípio, com exceção dos sectores para os quais o legislador da União previu um prazo inferior, iniciar um procedimento pelas autoridades competentes dos Estados-Membros, no prazo de quatro anos (Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 28, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 40).

30. O artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2988/95 fixa, em matéria de procedimentos, um prazo de prescrição que é contado a partir da data em que foi praticada a irregularidade, a qual, segundo o artigo 1.o,n.o 2, do mesmo regulamento, consiste em «[q]ualquer violação de uma disposição de direito da União que resulte de um ato ou omissão de um agente económico que tenha ou possa ter por efeito lesar o orçamento geral da União» (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.os 21 e 22, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 38).

31. Esse prazo é, pois, aplicável tanto às irregularidades que são objeto de uma medida administrativa para retirar a vantagem indevidamente obtida, em conformidade com o artigo 4.o do referido regulamento, como às irregularidades que dão lugar à aplicação de uma sanção administrativa, na aceção do artigo 5.o deste (v., neste sentido, Acórdãos de 11 de junho de 2015, Pfeifer & Langen, C-52/14, EU:C:2015:381, n.o 23 e jurisprudência referida, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 26).

32. Por força do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, do Regulamento n.o 2988/95, o prazo de prescrição do procedimento é de quatro anos a contar da data em que foi praticada a irregularidade. De acordo com o artigo 3.o,n.o 1, segundo parágrafo, desse regulamento, relativamente às irregularidades continuadas ou repetidas, esse prazo de quatro anos corre desde o dia em que cessou a irregularidade.

33. Dado que a prática da irregularidade pressupõe a reunião de duas condições, a saber, um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União, o prazo de prescrição começa a correr, por conseguinte, a partir do momento em que tenham ocorrido tanto o ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União como a lesão do orçamento, situando-se o início do prazo de prescrição, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, sempre na data do facto ocorrido em último lugar (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.os 24 a 26, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 47).

34. A regra que estabelece a prescrição de quatro anos, constante do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, primeiro período, do Regulamento n.o 2988/95, que é diretamente aplicável nos Estados-Membros, só pode ser afastada por uma regulamentação sectorial, na aceção do artigo 3.o,n.o 1, primeiro parágrafo, segundo período, desse regulamento, quando essa regulamentação sectorial preveja um prazo mais curto, mas não inferior a três anos (v., neste sentido, Acórdãos de 29 de janeiro de 2009, Josef Vosding Schlacht-, Kühl-und Zerlegebetrieb e o., C-278/07 a C-280/07, EU:C:2009:38, n.o 44, e de 22 de dezembro de 2010, Corman, C-131/10, EU:C:2010:825, n.o 42).

35. É à luz destas considerações e face à jurisprudência constante do Tribunal de Justiça segundo a qual, para determinar o alcance de uma disposição do direito da União, há que ter simultaneamente em conta os seus termos, o seu contexto e as suas finalidades (Acórdão de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.o 22), que há que responder à questão submetida”.

A sentença considerou aplicável o regulamento e na interpretação da norma contida no art. 3º entendeu que a interrupção da prescrição apenas ocorreu com a instauração do processo de execução contra o devedor e que nessa data ainda não tinha decorrido o prazo de 4 anos.

Nas conclusões de recurso a apelante não indica como se verifica o prazo de prescrição previsto no regulamento.

Recaía sobre o apelante o ónus de provar “a data em que foi praticada a irregularidade”, pois é a partir desta data que se inicia o prazo de quatro de anos de prescrição.

Como decorre da jurisprudência citada “a prática da irregularidade pressupõe a reunião de duas condições, a saber, um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União, o prazo de prescrição começa a correr, por conseguinte, a partir do momento em que tenham ocorrido tanto o ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União como a lesão do orçamento, situando-se o início do prazo de prescrição, de acordo com a jurisprudência do Tribunal de Justiça, sempre na data do facto ocorrido em último lugar (v., neste sentido, Acórdãos de 6 de outubro de 2015, Firma Ernst Kollmer Fleischimport und -export, C-59/14, EU:C:2015:660, n.os 24 a 26, e de 2 de março de 2017, Glencore Céréales France, C-584/15, EU:C:2017:160, n.o 47)”.

Os factos provados não permitem tal enquadramento legal. Com efeito, provou-se:

1.Entre o Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e a ERMESA, SA foi celebrado o contrato n.º ....., no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um incentivo financeiro reembolsável no valor de €1.102.617,00, nos termos do documento de fls. 563 e seguintes e que aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os legais efeitos.

2. O incentivo financeiro reembolsável referido em 2 deveria ser reembolsado em 10 prestações semestrais, com início em 31.7.2009 e termo em 31.1.2014. 3. Em 21.4.2010, a ERMESA, SA amortizou €87.359,46. 4. Em 6.8.2010, a ERMESA, SA amortizou €18.380,55.

5. Em 21.7.2010 foi decidida a atribuição de um prémio à ERMESA, SA, no

valor de €237.741,02, que se traduziu no não reembolso deste montante.

6. Em 23.2.2013 foi decidida a atribuição de um novo prémio à ERMESA, SA, no valor de €530.311,83, que se traduz no não reembolso de tal montante.

7. Considerando o referido em 3, 4, 5 e 6, o incentivo referido em 1 reduziu-se a €228.824,13.

O incentivo reduziu-se em 23 de fevereiro de 2013 para o valor € 228 824,13, valor este que é reclamado no presente processo, acrescido de juros.

Nada se apurou em concreto que revele a verificação de “um ato ou omissão que constitui uma violação do direito da União assim como uma lesão do orçamento da União”, pressupostos de que depende a invocação do prazo de prescrição, o que significa que os factos não permitem concluir que estavam reunidos os pressupostos para a apelante invocar o alegado prazo de prescrição.

Argumenta o apelante, sob os pontos 6, 7, 8 das conclusões de recurso, que “os prazos fixados para o pagamento de créditos reclamados no Processo de Insolvência nº 2200/11.... do extinto ...º Juízo Cível do Tribunal de ....... não beneficiam o IAPMEI que nesse processo não reclamou o seu crédito sobre a Insolvente; aqueles prazos de pagamento não interromperam o prazo de prescrição do crédito reclamado nos presentes autos, visto que o IAPMEI não foi parte no processo”.

Provou-se:

8. O IAPMEI teve em seu poder uma garantia bancária emitida pelo BANIF para assegurar o crédito no valor de €551.308,50, caucionada por livrança com aval.

9. Em 4.3.2015 a ERMESA, SA solicitou ao BANIF a devolução da livrança referida em 8, a qual foi por aquela levantada pessoalmente nas instalações deste.

10. No extinto ...º Juízo Cível do Tribunal de ....... correu termos o processo de insolvência de ERMESA, SA, sob o n.º 2200/11..... 11. No processo referido em 10 os credores aprovaram um Plano de Insolvência, o qual previa, relativamente aos credores com garantia de terceiros, o pagamento do capital em 16 prestações semestrais sucessivas e crescentes, vencendo-se a primeira dois anos depois do trânsito em julgado da sentença homologatória do plano.

12. A sentença de homologação do plano transitou em 17.7.2012.

13. O IAPMEI não reclamou o seu crédito no processo de insolvência referido

em 10.

De acordo com o disposto no art. 217º, n.º 1 do CIRE, com a sentença de homologação (do plano de insolvência) produzem-se as alterações dos créditos sobre a insolvência introduzidas pelo plano de insolvência, independentemente de tais créditos terem sido, ou não, reclamados ou verificados. Daqui se extrai que a reclamação de créditos nem sequer é necessária para que estes fiquem abrangidos pelo plano de insolvência aprovado e homologado.

Por outro lado, na sentença sob recurso, não se atribuiu à sentença proferida no Processo de Insolvência nº 2200/11.... do extinto ...º Juízo Cível do Tribunal de ....... que homologou o plano e transitou em 17 de julho de 2012, qualquer efeito interruptivo do prazo de prescrição.

Tal efeito é atribuído, tão só, à instauração da execução em 02 de setembro de 2015 (ponto 18 dos factos provados).

Porém, como se referiu, não estão reunidos os pressupostos para se aplicar o prazo de prescrição previsto no art. 3º º/1 do Regulamento, ficando assim prejudicadas as questões suscitadas sob os pontos 9 e 10 das conclusões de recurso.

De todo o modo, sempre se dirá, que estando em causa a aplicação do regime previsto no Regulamento, seria à luz de tal regime que se devia apreciar dos fundamentos para a interrupção do prazo de prescrição. O diploma em causa regula tal matéria – art. 3º/1,§3º - e por isso, não se aplicaria ao caso o regime previsto no art. 323º/1 CC, quando, além do mais, a apelante não faz referência a qualquer regime de exceção

O IAPMEI - Agência para a Competitividade e Inovação, IP, é uma agência pública a quem cumpre promover a competitividade e o crescimento empresarial, assegurar o apoio à conceção, execução e avaliação de políticas dirigidas à atividade industrial, visando o reforço da inovação, do empreendedorismo e do investimento empresarial.

No exercício da sua actividade a devedora Insolvente candidatou-se ao Sistema de Incentivos à Modernização Empresarial, regulado pelo DL 70-B/2000, de 5 de maio e pela Portaria 262/2004, de 11 de Março, tendo nessa sequência sido celebrado com o IAPMEI um contrato de concessão de incentivos financeiros ao investimento, no âmbito do qual foi concedido àquela um incentivo financeiro, com uma parte reembolsável, nos termos das cláusulas segunda, terceira e décima quarta, como decorre do contrato havido entre as partes e constante de fls 563 a 575.

In casu não estamos face a um qualquer apoio económico, não reembolsável, concedido ao abrigo de algum programa comunitário, enquadrável nas disposições prescritas no citado Regulamento CE EURATON, mas antes, como decorre da factualidade provada nos pontos 1.a 4., a um contrato celebrado entre o Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas e ao Investimento e a ERMESA, no âmbito do qual foi atribuído a esta sociedade um incentivo financeiro reembolsável em 10 prestações semestrais, com início em 31 de Julho de 2009 e termo em 31 de Janeiro de 2014. no valor de €1.102.617,00, tendo aquela amortizado em 21 de Abril de 2010 a quantia de  €87.359,46 e em 6 de Agosto de 2010 a quantia de €18.380,55, contrato inserido no desenvolvimento estratégico para os diversos sectores de actividade da economia portuguesa, através de apoios directos e indirectos às empresas e demais agentes económicos, bem como à envolvente empresarial, para o período de 2000 a 2006, prevenido pelos artigos 1º e 2º do DL 70-B/2000, de 5 de Maio.

O Regulamento (CE EURATON) 2988/95 do Conselho de 18 de Dezembro de 1995, relativo à protecção dos interesses financeiros das Comunidades europeias, adoptou medidas especiais materiais de âmbito horizontal relativamente a controlos e sanções destinadas ao efeito, tendo em atenção os subsídios não reembolsáveis concedidos aos agentes económicos ao abrigo dos incentivos concedidos.

Tais incentivos comunitários constituem coisa diversa dos estímulos nacionais concedidos ao abrigo do sistema SIME, no âmbito do qual foi concedido o incentivo financeiro cujo reembolso constitui a ratio essendi destes autos, sendo que a Recorrente não alega, nem tão pouco apresenta qualquer prova que nos conduza à conclusão por si esgrimida de que o crédito aqui peticionado enquadra um subsidio comunitário não reembolsável, de forma a que o mesmo possa estar prevenido pelas disposições regulamentares citadas.

Por outra banda, não se concebe que tal crédito proveniente de um contrato firmado entre a Recorrente e o IAPMEI, reembolsável em dez prestações semestrais, possa constituir, nessa medida, um comportamento irregular face ao orçamento comunitário, objecto, quiça, das sanções administrativas ali previstas, não havendo lugar a quaisquer procedimentos estranhos às intercorrências processuais estaduais próprias, nomeadamente as executivos, para cobrança coerciva em termos processuais civis, aplicáveis aos termos contratualizados se incumpridos.

A defesa por via de excepcção em que se arrrima a Recorrente carece de qualquer substracto no Regulamento CE EURATON invocado, cujo artigo 3º aqui não tem aplicação, por o prazo prescricional de quatro anos aí consignado ser extravagante no que tange à espécie contratual em análise, diversa da atribuição de benefícios comunitários a que se refere a apontada regulamentação.

Efectivamente, tratando-se como se trataram de prestações semestrais acordadas entre as partes e com início em 31 de Julho de 2009 e termo em 31 de Janeiro de 2014, das quais foram satisfeitas as duas primeiras em 21 de Abril 2010 e em 6 de Agosto de 2010, sendo que, no bom rigor das contas, tais prestações deveriam ter sido pagas em Julho de 2009 e em Janeiro de 2010, vencendo-se as subsequentes, respectivamente em Janeiro e Julho de 2011, Janeiro e Julho de 2012, Janeiro e Julho de 2013 e Janeiro de 2014, prestações essas porque periodicamente renováveis estariam sempre sujeitas a um prazo de prescrição de cinco anos, como deflui do artigo 310º, alínea g) do CCivil.

Ora, como decorre da materialidade assente, em 2.9.2015, o IAPMEI instaurou contra a ERMESA, SA processo executivo para obter a devolução do incentivo atribuído à devedora/insolvente (ponto 18. da matéria assente), tendo sido interrompido, dessa forma, o prazo prescricional em curso, sendo devida a quantia peticionada, atentando-se ainda na circunstância de que tal quantia seria devida na totalidade desde Janeiro de 2011, data do primeiro incumprimento e a partir da qual se contaria aquele prazo prescricional de cinco anos, nos termos do disposto no artigo 307º do CCivil, pelo que na data da instauração do processo executivo tal prazo ainda não se mostrava decurso.

Improcedem, in totum, as conclusões da Recorrente.

III Destarte, nega-se a Revista, mantendo-se a decisão plasmada no Acórdão impugnado embora com fundamentação algo diversa.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 17 de Novembro de 2021

Ana Paula Boularot (Relatora)

Fernando Pinto de Almeida

José Rainho

Sumário (art. 663º, nº 7, do CPC).