Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
3454/16.0T8LRA.C1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO (CÍVEL)
Relator: ROSA TCHING
Descritores: CONTRATO DE UTILIZAÇÃO
CENTRO COMERCIAL
NEGÓCIO ATÍPICO
RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO
CUMPRIMENTO DEFEITUOSO
CARÁCTER SINALAGMÁTICO
EXCEÇÃO DE NÃO CUMPRIMENTO
INFILTRAÇÕES
OBRAS
ABUSO DE DIREITO
VENIRE CONTRA FACTUM PROPRIUM
Data do Acordão: 09/10/2020
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: PROVIMENTO PRACIAL DA REVISTA
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. O “contrato de utilização de espaço ou loja em centro comercial ”, configura um contrato atípico que tem por objeto a cedência do gozo de uma loja ou espaço integrado num centro comercial e a prestação de um conjunto de serviços essenciais que respeitam não só ao rendimento do espaço em si, mas também ao funcionamento de bens e serviços de interesse comum, possibilitando, deste modo, a utilização daquele espaço com os benefícios inerentes à organização e manutenção do centro comercial, mediante o pagamento de uma prestação pecuniária.

II. Significa isto, por um lado, que a obrigação assumida pela locadora/entidade gestora deste espaço respeitante à prestação de serviços logísticos indispensáveis ao funcionamento do centro comercial, tais como segurança, conservação, limpeza, manutenção, ventilação e obras, não reveste a natureza de dever acessório de conduta nem de dever acessório da prestação principal, fazendo, antes, parte do dever principal que constitui o cerne daquela obrigação.

III. E, por outro lado, que a prestação pecuniária devida pela cedência da utilização de um espaço integrado num “ centro comercial”, não é devida pela simples cedência do espaço em si, mas pela cedência de um espaço “especial”, capaz de atrair clientela e proporcionar maiores lucros, por se encontrar integrado no referido todo organizado e valorizado por aqueles mesmos.

IV. Do contrato de contrato de utilização de espaço ou loja em centro comercial, resulta, assim, um vínculo sinalagmático constituído, por um lado, pela obrigação do arrendatário/lojista efetuar o pagamento da prestação devida pela ocupação do espaço ou da loja e, do outro, pela obrigação do locador/gestor do centro assegurar a fruição do espaço ou loja com as contrapartidas essenciais ao centro comercial.

V. Assim, se a locadora/entidade gestora cumpre defeituosamente a sua prestação, não efetuando com a maior brevidade possível as obras com vista a eliminar, de forma eficaz, as infiltrações das águas pluviais pela cobertura, prejudicando, desse modo, a imagem comercial do espaço cedido, à luz do disposto no artigo 428º, do Código Civil, é lícito ao locatário /lojista suspender o pagamento das prestações pecuniárias devidas até à eliminação daquelas anomalias.

Decisão Texto Integral:  

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO CÍVEL




***



I. Relatório


1. BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A, instaurou contra NEW LINEO CINEMAS DE PORTUGAL, LDA. ação declarativa, de condenação, com processo comum, pedindo que seja:

a) Declarada a resolução do contrato;

b) Condenada a ré a desocupar o imóvel, entregando-o livre de pessoas e bens e no estado em que se encontra;

c) Condenada a ré a pagar as rendas que à data da entrada da ação em Tribunal correspondem às rendas de outubro, novembro e dezembro de 2015, bem como janeiro de 2016 a novembro de 2016 no valor de €140.000,00 mais IVA à taxa legal, e as rendas que se vençam no decurso do processo, uma vez que subsiste a ocupação do imóvel;

d) Condenada a Ré na sanção pecuniária mensal prevista no n.º 2 da cláusula 22 do contrato de utilização de espaço em centro comercial;

e) Condenar-se a Ré nos termos do art. 829.º-A do Código Civil ao pagamento de quantia pecuniária a fixar pelo douto tribunal por cada dia de atraso no cumprimento.

Alegou, para tanto e em síntese, que, em 2014 sucedeu à empresa SIMO na posição de locador de contrato de utilização de espaço de centro comercial que esta havia celebrado em 2006 com a ré e que a ré não pagou as rendas no ano de 2015, pelo que declarou resolvido o contrato.

Mais alegou que os defeitos imputados pela ré já existiam quando assumiu a posição de locador e eram conhecidos daquela.


2. A ré contestou, impugnando os factos alegados pelo banco autor e, invocando a compensação decorrente de prejuízos que teve com os defeitos da coisa, deduziu reconvenção, pedindo:

- a condenação do banco autor no reconhecimento de que deve à demandada a quantia de €47.955,40, a título de danos emergentes e lucros cessantes, assim como a reconhecer a compensação aí formulada e peticionada com um saldo positivo a favor do demandante no valor de €99.644,60;

- seja julgado parcialmente procedente, por provado, o remanescente do pedido formulado pelo banco autor na alínea c) da respetiva petição por reporte às prestações respeitantes aos meses de Dezembro de 2015 a Novembro de 2016, em singelo, no valor de € 147.600,00 e às prestações vincendas, condenando-se a Ré no pagamento ao A. do diferencial de € 99.644,60, que resulta da compensação formulada no pedido reconvencional, mas apenas contra emissão e entrega simultânea pelo demandante das correspondentes faturas.


3. Prosseguiu o processo os seus termos tendo, em 24.01.2019, sido proferida sentença que decidiu:

1. Julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência,

2. Condenou a Ré NEW LINEO CINEMAS DE PORTUGAL, LDA., a pagar ao Autor BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A., SOCIEDADE ABERTA, a quantia de €120.000,00 (cento e vinte mil euros), acrescida do IVA, correspondente às rendas de dezembro de 2015 a novembro de 2016, acrescida ainda da quantia correspondente às rendas que se vencerem no decurso do processo, contra emissão e entrega simultânea das correspondentes faturas, acrescida de IVA.

3. Absolveu a Ré dos restantes pedidos formulados pelo Autor.

4. Julgou a presente reconvenção parcialmente procedente e, em consequência,

5. Condenou o Autor BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A., SOCIEDADE ABERTA, a reconhecer que deve à Ré NEW LINEO CINEMAS DE PORTUGAL, LDA., a quantia de €15.505,47 (quinze mil, quinhentos e cinco euros e quarenta e sete cêntimos), e a reconhecer o direito da Ré ver compensada tal quantia sobre o crédito do Autor acima reconhecido.

6. Absolveu o Autor do restante pedido reconvencional.


4. Em 27.09.2019, o autor Banco Comercial Português, S.A e ré, New Lineo – Cinemas de Portugal, Ldª celebraram transação quanto ao pagamento das rendas em que a ré foi condenada, nos seguintes termos:

« a) O réu pagará ao autor as rendas vencidas desde Dezembro de 2015 a Fevereiro de 2019, no montante unitário de 10.000,00€, acrescidas de IVA à taxa legal de 23%, totalizando o montante de 479.700,00€, até ao dia 8 de Março de 2019, mediante a prévia emissão e envio pelo demandante  da correspondente factura original;

b) Na pendência da acção e de acordo com o doutamente decidido no ponto 2 da douta sentença, a autora emitirá mensalmente as facturas correspondentes às rendas que se forem vencendo, sendo obrigação da Ré o pagamento pontual das mesmas ».


5. Por sentença proferida em 04.03.2019, o Tribunal de 1ª Instância homologou esta transação, condenando e absolvendo as partes nos seus precisos termos e determinando, em consequência, a extinção da instância, para os efeitos do disposto nos artigos 277.º, al. d), 283.º, n.º 2, 284.º e 290.º, n.º 4, do Código de Processo Civil.


6. Inconformado com a sentença proferida em 24.01.2019, na parte em que julgou improcedente o pedido de declaração da resolução do contrato e, consequentemente, a desocupação do imóvel por parte da ré e considerou legítima a invocação da exceção de não cumprimento por parte da ré, dela apelou o banco autor para o Tribunal da Relação de Coimbra, tendo a ré interposto recurso subordinado quanto ao pedido reconvencional.


7. Por acórdão proferido em 03.11.2019, Tribunal da Relação, com um voto de vencido em relação à reconvenção, negou provimento aos recursos interpostos, confirmando a sentença recorrida.

8. Inconformado com o acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, o banco autor dele interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

« I. O douto Acórdão proferido nos presentes autos encontra-se em manifesta contradição, tendo resultado em decisões absolutamente opostas, com o Acórdão desse Tribunal, de 09-12-2008, proferido nos autos de processo 2618/05.6 TBOVR, tendo resultado em decisões absolutamente opostas, sendo que no referido processo se analisa, em concreto, a excepção de não cumprimento no âmbito do contrato de arrendamento comercial.

II. Trata-se, sucintamente, de saber se é lícita a invocação da excepção de não cumprimento se não existir a privação do gozo da coisa, antes sim constrangimentos na sua utilização mas que em nada impediram o exercício da actividade, e consequentemente, se podia a Recorrente resolver o contrato, como o douto Acórdão fundamento advoga.

III. Importa, para a resolução da questão, atender por um lado, a diligência do Recorrente, enquanto proprietário do imóvel e, por outro, que o incumprimento da Ré antecede a invocação da excepção de não cumprimento.

IV. Dos factos provados resulta que, quando a Recorrente assumiu a posição contratual da SIMO, já o imóvel padecia dos vícios e defeitos descritos nos factos provados, sendo certo que o imóvel havia sido dado de locação financeira à sociedade SIMO, que estava obrigada a proceder à manutenção e conservação do imóvel nos termos do n.º 2 da cl. 5.ª do Contrato de Locação Financeira, cujo regime jurídico é imperativo pois decorre da lei, como se sabe – DL n.º 149/95 de 24 de Junho. E a locatária nada fez, não conservou minimamente o imóvel, deixando a estrutura degradar-se, acabando pelo problema ser “empurrado” para o Banco.

V. Resulta também provado que a Recorrente fez, desde logo, manutenções correctivas e lançou concurso para reparação da cobertura, sendo que as obras se iniciaram logo que foi possível.

VI. Pelo que, a partir da tomada de posse, a Recorrente manifestou sempre interesse em resolver as várias situações, deslocando-se ao local e mantendo contactos com a Ré e a empresa de manutenção, o que revela zelo e diligência no sentido de assumir as suas responsabilidades, pelo que a Recorrente sempre agiu (e age) como proprietária diligente.

VII. Por outro lado, importa realçar que, ainda que com algumas limitações, os cinemas funcionaram sempre,) sendo certo que o incumprimento é anterior à invocação da excepção de não cumprimento e até à indicação dos vícios do local.

VIII. Não menos importante, salienta-se à data de propositura da acção estavam em dívida €147.600,00 de rendas vencidas e não pagas.

IX. O acordo celebrado entre as partes configura um contrato atípico ou inominado de cedência temporária do direito à utilização de loja em centro comercial, sendo aplicável o regime resultante das respectivas cláusulas, bem como ao regime legal geral dos contratos e, se necessário (subsidiariamente), à disciplina de figuras contratuais próximas, como o são, em certas vertentes, o contrato de arrendamento urbano e o de prestação de serviço.

X. Ora, no Acórdão agora em crise entendeu-se que não existia fundamento legal ou convencional para o contrato na medida em que os vícios existentes no Centro Comercial, não tendo levado ao seu encerramento, condicionaram negativamente a sua actividade e causaram prejuízos, considerando-se, inexplicavelmente, que perante o incumprimento da Recorrente a Ré legitimamente deixou de pagar a renda, atitude que é “proporcionada, equilibrada, ou ao menos, está ínsita em limites admissíveis”. E acrescenta, “nunca estariam provadas, a patente injustiça, iniquidade e ofensa dos referidos limites axiológicos.”

XI. Em sentido contrário, no Acórdão fundamento, e bem, considerou-se que não tendo os vícios não determinado que a actividade tivesse deixado de aí ser exercida ou tivesse sofrido uma significativa diminuição, pelo que “o arrendatário apenas poderia invocar a “exceptio” pela privação parcial do gozo do prédio, imputável ao senhorio, na forma de suspensão parcial do pagamento da renda (…)”, concluindo que “o réu deixou de satisfazer na totalidade a renda devida quando o máximo a que eventualmente teria direito seria, em função de tudo o que antecede, suspender o respectivo pagamento em medida proporcionada à privação parcial do gozo, a conclusão a extrair não pode ser outra senão a de que incorreu em mora, com as inerentes consequências, correctamente decretadas pelas instâncias (resolução do contrato, entrega do arrendado, devoluto, à autora, e condenação no pagamento das rendas vencidas e vincendas).”

XII. Situação que em tudo se assemelha ao caso sub judice já que os cinemas estiveram sempre em funcionamento não podendo a Ré, legitimamente, recusar o pagamento das rendas, na sua totalidade, como fez; Tendo-o feito, estava a Recorrente legitimada a resolver o contrato.

XIII. Quanto muito, e acaso se julgue provado o incumprimento parcial da Recorrente, o que não se concede, poderia o valor das rendas ser reduzido não podendo a Ré incumprir a sua prestação.

XIV. Conforme resulta dos factos provados, a Ré apenas pagou as rendas vencidas de Dezembro de 2014 a Junho de 2015, em duas prestações em Julho e Agosto de 2015 (ponto 9 dos factos provados).

XV. Por outro lado, a Ré não procedeu ao pagamento das rendas de Julho, Agosto e Setembro de 2015 no prazo para o efeito, sendo que apenas veio a liquidar tais rendas, em singelo, em Janeiro de 2016, facto 48 dado como provado.

XVI. Deste modo, a Recorrente tem o direito de resolver o contrato, nos termos dos arts.432.º e ss. do C. Civ., e pelo contrato, conforme dispõem as cláusulas vigésima, n.º 4, al. a) e g) do contrato de utilização de espaço em centro comercial, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo.

XVII. Apesar de o contrato celebrado de utilização de espaço em centro comercial ser um contrato atípico, muitas vezes torna-se necessário o intérprete e o aplicador do direito socorrer-se, além do regime legal geral dos contratos, da disciplina de figuras contratuais próximas, como o são, o contrato de arrendamento urbano.

XVIII. Ora, dispõe o n.º 3 do art. 1084.º C. Civ. que se a resolução pelo senhorio se fundar em falta de pagamento da renda (…), o arrendatário pode pôr fim à mora no prazo de um mês, sendo que esta faculdade pode ocorrer uma única vez por cada contrato, limite que o legislador impôs, no n.º 4 do citado preceito.

XIX. Pese embora o disposto no contrato de utilização de espaço em centro comercial, mais concretamente nos considerandos, no ponto I, al. f), a vontade das partes se concentrou em questões estranhas à que agora se discute, levando a crer que o contrato, na parte da resolução contratual por falta de pagamento das rendas, se pode socorrer de outras figuras contratuais próximas.

XX. Conforme sempre defendeu, esta é a interpretação que melhor resolve os interesses antagónicos em confronto, que melhor exprime a ordenação social e que apresenta maior equidade.

XXI. Caso contrário, chegaríamos ao absurdo de que a Ré poderia incumprir a sua obrigação todos os meses, e a Recorrente teria que interpelar a Ré todos os meses, concedendo sempre um prazo de 30 dias para que aquela, querendo, viesse regularizar o incumprimento, o que nos parece atentatório da boa fé, do saudável equilíbrio que deve existir entre as partes, do princípio da confiança e do correcto comércio jurídico.

XXII. Ainda que assim não se entenda sempre se diga que a resolução contratual sempre operaria pois na carta enviada a 10.11.2015 a resolver o contrato, a Recorrente concedeu um prazo de 30 dias à Ré para pagar as rendas em atraso, o que à data da propositura da acção não tinha sucedido.

XXIII. Consequentemente, o Banco perdeu a confiança na Ré, essencial no comércio jurídico, e considera o contrato definitivamente não cumprido, nos termos do n.º 1 do art. 808.º do C. Civ., uma vez que a Ré não pagou as rendas em dívida no prazo de 30 dias concedido na carta expedida em 10/11/2015.

XXIV. A mesma lógica pode ser usada com base no contrato, uma vez que o contrato de utilização de espaço em centro comercial refere que a contratante não faltosa deve, por carta registada, notificar a contratante inadimplente para que a mesma, no prazo máximo de 30 dias a contar da receção proceda à regularização do inadimplemento – cfr. cláusula 18.ª, n.º 2, o que também não sucedeu.

XXV. Assim, e tal como se conclui no Acórdão fundamento, deverá entender-se que a Ré incorreu em mora, com as inerentes consequências, mormente, a possibilidade da Recorrente de, licitamente, resolver o contrato.

XXVI. No que respeita à excepção de não cumprimento, a posição assumida pelo Tribunal a quo contraria a jurisprudência firmada no Acórdão fundamento (ainda que, no âmbito do contrato de arrendamento).

XXVII. É que não há qualquer incumprimento das obrigações por parte da Recorrente, quer na manutenção corrente do edifício, quer na realização de obras de reparação da cobertura.

XXVIII. Reforça-se que a Ré sempre manteve o cinema a operar, verificando-se pela prova pericial que as oscilações de clientela, com a excepção do ano de 2014 (momento em que a Autora não era parte no contrato de utilização) correspondem grosso modo às flutuações do mercado nacional, havendo mesmo um incremento de clientela.

XXIX. Porém, e apesar dos factos provados, o Tribunal a quo entendeu que a Recorrente não actuou de forma atempada incumprindo ainda que parcialmente a sua prestação razão pela qual decidiu ser lícito à Ré invocar a excepção de não cumprimento do contrato.

XXX. Posição de que se veemente discorda já que a excepção de não cumprimento do contrato é invocável sempre que, existindo um nexo de causalidade ou de correspectividade entre as prestações, ocorra um desequilíbrio, injustificado e contrário à boa-fé, entre as prestações a cargo das partes contraentes, configurando-se a exceptio como um meio de repôr o dito equilíbrio (sinalagma) contratual.

XXXI. O que manifestamente não ocorre in casu na tendo em conta que não houve privação do gozo da coisa, antes sim (e sem eufemismos) constrangimentos na sua utilização, mas que em nada impediram o exercício da actividade.

XXXII. Por tudo o quanto se alegou no presente recurso, e atendendo à jurisprudência firmada, nomeadamente, no Acórdão fundamento, não se mostra justificada a suspensão da obrigação de pagamento integral da renda.

XXXIII. Consequentemente só se poderá concluir que, havendo mora, tinha a Recorrente todo o direito de resolver o contrato, uma vez que a única parte que estava a incumprir, grave e reiteradamente era a Ré.

XXXIV. Por fim, no que respeita à compensação dos putativos prejuízos sofridos pela Ré, insurge-se a Recorrente contra a condenação vertida na sentença por tudo o quanto já ficou exposto.

XXXV. Na verdade, e atentos os factos provados, e o teor da perícia realizada, conteúdo que o Tribunal a quo preferiu ignorar, a receita que a Ré perdeu decorre da oscilação de clientela e está em perfeita consonância com oscilação do mercado nacional.

XXXVI. Além do mais, resulta que nos anos económicos de 2015 e 2016 a clientela subiu, como demonstram os quadros do relatório.

XXXVII. Assim sendo, além de injusta, é falsa, a conclusão a que chega o Tribunal a quo de que a Ré sofreu danos pelo “incumprimento” das responsabilidades da Recorrente, devendo por isso, ser absolvida do pedido.

XXXVIII. Acresce que, entende a Recorrente que a Ré age em abuso de direito porquanto o gerente da Ré o Sr. AA, era, também administrador da sociedade SIMO – conforme documentos 10 e 11 juntos com a Réplica.

XXXIX. Tendo em conta que a Ré invoca vícios e defeitos do imóvel que, conforme resulta provado, foram causados e deixados pela locatária, ou seja, pela mesma pessoa singular, não pode deixar de se considerar censurável o comportamento da Ré que consubstancia, abuso de direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

XL. Para Manuel de Andrade, in Teoria Geral das Obrigações, Almedina, 3ª edição, págs. 63-64, “há abuso do direito quando o direito, legitimo (razoável) em princípio, é exercido, em determinado caso, de maneira a constituir clamorosa ofensa do sentimento jurídico dominante; e a consequência é a de o titular do direito ser tratado como se não tivesse tal direito ou a de contra ele se admitir um direito de indemnização baseado em facto ilícito extracontratual”.

XLI. Na verdade, foi a atitude e incumprimento de obrigações a que a SIMO, administrada pelo também gerente da Ré que originou a situação de completo desleixo quanto à manutenção do imóvel, situação contra a qual se insurge perante a Recorrente.

XLII. Por outro lado, muito bem sabia a Ré, e resultou provado nos Autos, que a Recorrente tudo fez para obviar aos defeitos do imóvel, defeitos esses que já existiam ao tempo da cessão da posição contratual.

XLIII. Em consequência, é ilegítimo o exercício do correspondente direito, uma vez que tal exercício excede manifestamente os limites impostos pela boa fé, não merecendo, por isso, a tutela do Direito.

XLIV. Assim, a entender-se que a Recorrente incumpriu as obrigações do contrato, perante a abusiva conduta da Ré, deve considerar-se ilícita a invocação da excepção de não cumprimento.

XLV. E bem assim, a condenação da Recorrente no pedido reconvencional, ainda que tenha procedido apenas parcialmente, premeia o comportamento da Ré que, aos olhos do sentimento jurídico dominante na sociedade, é clamorosamente ofensivo da justiça.

XLVI. O Acórdão recorrido porque não aplicou correctamente o direito aos factos dados como provados, violou o disposto nos arts. 405.º, 436.º, 1084.º, 808.º, 428.º, 334.º todos do C.Civ. e, de igual forma, violou o n.º 2 do art. 9.º do mesmo diploma, já que as exigências interpretativas plasmadas na fundamentação não têm o mínimo de correspondência nas normas putativamente violadas.

XLVII. Atento o supra exposto, deve este tribunal concluir - tal como concluiu o Acórdão fundamento – que não é possível invocar a excepção de não cumprimento quando o local se mantém em funcionamento no caso em que o proprietário toma as diligências necessárias à eliminação dos constrangimentos de utilização, procedendo à sua reparação, estando legitimado, perante a mora, a resolver o contrato».

Termos em que requer seja revogado o acórdão recorrido.

9. A ré respondeu, pugnando pela improcedência do recurso, com a consequente manutenção do acórdão recorrido.


10. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.


***


II. Delimitação do objeto do recurso


Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação do recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do C. P. Civil, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa[1].


Assim, a esta luz, as questões a decidir consistem em saber se:


1ª- à ré é lícito  invocar a exceção de não cumprimento do contrato;


2ª- a conduta da ré integra abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium;


3ª- existe fundamento para condenação da autora no pagamento dos prejuízos sofridos pela ré.


***



III. Fundamentação


As instâncias deram como provados os seguintes factos:


1. O Autor é dono e legítimo proprietário do prédio urbano sito no …, composto por edifício de seis pisos com espaços para estacionamento e circulação, 35 lojas para comércio e um espaço destinado a cinemas e zonas de apoio, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º …e inscrito na respetiva matriz sob o art. …-P [1.º P.I.].

2. Por documento particular outorgado em 21 de dezembro de 2006, foi celebrado entre o Autor e a Sociedade Comercial SIMO – Sociedade Imobiliária de Cinemas, S.A. – doravante apenas SIMO – (com sede na Rua …, n.º …, …º piso, Edifício …, matriculada na Conservatória do Registo Comercial de …, com o n.º único de matrícula e de identificação fiscal 50…), respetivamente Locador/Proprietário e Locatário, um contrato de locação financeira imobiliária a que foi dado o n.º … [2.º P.I.].

3. Por documento particular outorgado em 2 de novembro de 2006, e aditado em 1 de junho de 2012, foi celebrado entre a SIMO, então proprietária, e a Ré New Lineo Cinemas de Portugal, Ld.ª – doravante apenas New Lineo – um contrato de utilização de espaço em centro comercial, onde ficaram reguladas as condições que permitiam à Ré a utilização e consequente exploração do espaço destinado a cinema inserido no prédio melhor descrito no art. 1.º, entre outras, com as seguintes cláusulas [3.º e 4.º P.I.]:

«CLÁUSULA DÉCIMA OITAVA (Obrigações das Partes)

1- São obrigações da “SIMO”:

a) - Assegurar a gestão e funcionamento do CENTRO nos termos das disposições legais e regulamentares aplicáveis de molde a evitar o respectivo encerramento por determinação administrativa ou judicial, bem como do Regulamento que junta como Anexo II ao presente contrato e dele ficará fazendo parte integrante.

b) - Garantir a manutenção do CENTRO, bem como a sua segurança, limpeza e ventilação, podendo contratar terceiros para a prestação dos serviços acima descritos, não sendo responsável pelo seu modo de execução ou por eventuais interrupções dos serviços prestados, mantendo em bom estado de conservação e procedendo às reparações com a maior brevidade possível a contar do evento que lhes der origem, as inerentes infraestruturas, tais como sanitários, corredores, elevadores, escadas, mecânicas e não mecânicas e demais equipamentos especiais e, outrossim, a reparar imediatamente e manter em bom estado de conservação e funcionamento o sistema de ar condicionado do CENTRO.

c) - Manter a segurança de pessoas e bens do CENTRO, assim como assegurar o funcionamento e manutenção dos sistemas de climatização, abastecimento de energia eléctrica e de água do CENTRO, podendo contratar terceiros para a prestação dos serviços acima descritos, não sendo responsável pelo seu modo de execução ou por eventuais interrupções dos serviços prestados até ao encerramento diário do CENTRO.

(…).

CLÁUSULA DÉCIMA NONA (Suspensão do Contrato)

1 - Na ocorrência de qualquer sinistro que impeça o exercício da actividade pela “LOJISTA”, em qualquer dos espaços objecto do presente Contrato, fica expressamente acordado o seguinte:

a) A “SIMO” obriga-se a repor as obras de base e infraestruturas nos termos do Projecto inicialmente apresentado pela “Lojista” e provado pela “SIMO” (…).

b) (…).

2 - Enquanto a “LOJISTA”, pelo indicado motivo, se encontrar impedida de, total ou parcialmente, exercer a respectiva actividade, considera-se suspensa total ou parcialmente a vigência do presente contrato até que se concluam as obras de restauro e recuperação integral do espaço afectado, sem prejuízo do disposto nos pontos anteriores.

3 - (…).

CLÁUSULA VIGÉSIMA (Resolução e Indemnizações) 4- (…)

5 - Em caso de incumprimento grave e reiterado das obrigações emergentes do presente contrato, a contratante não faltosa deverá, por carta registada com aviso de recepção, notificar o contratante inadimplente para que a mesma, no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da respectiva recepção, proceda à regularização do seu inadimplemento.

6 - Sem prejuízo do disposto na cláusula 4.ª e decorrido que seja o prazo indicado no n.º 1 que antecede sem que o incumprimento tenha sido devidamente sanado pelo contratante inadimplente, a contratante não faltosa terá o direito de resolver, com justa causa e com produção imediata dos respectivos efeitos extintivos, o presente Contrato, por via de carta registada com aviso de recepção a expedir com essa finalidade, bem como a exigir da contratante faltosa o pagamento de indemnização por todos os lucros cessantes e danos emergentes que efectivamente vier a sofrer por via desse incumprimento.

7 - Sem prejuízo da aplicação de outras sanções ou soluções resolutivas previstas no presente contrato, a “SIMO” poderá resolver o presente contrato, caso a “LOJISTA” após a recepção por carta registada com aviso de recepção, não proceda à regularização, no prazo máximo de 30 (trinta) dias, a contar da respectiva recepção, de alguma das seguintes situações:

a) O não cumprimento de qualquer obrigação pecuniária prevista no presente contrato, nos prazos nele estabelecido.

b) (…) c) (…) d) (…) e) (…) f) (…)

g) Em termos genéricos, o incumprimento ou cumprimento defeituoso de qualquer obrigação que para o “LOJISTA” resulte do presente contrato.

8 - (…)».

4. Em 28 de novembro de 2014, por documento particular, o Autor e a SIMO acordaram na revogação do contrato de locação financeira descrito no art. 2.º da presente peça processual, com a consequente entrega ao Banco do imóvel que constituía o seu objecto [5.º P.I.].

5. Ainda em 28 novembro de 2014, por acordo de cessão da posição de locador no contrato de utilização de espaço em centro comercial celebrado em 02/11/2006 e alterado em 01/06/2012, a SIMO cedeu gratuitamente a sua posição contratual de Locador a favor do Banco Autor, destacando-se, entre outras, as seguintes alterações na cláusula 8.ª, n.º 1, alíneas a), b), c), d), f), g) e i): “… O BCP apenas se encontra obrigado a cumprir os procedimentos, acções e diligências que actualmente a SIMO assegura, para garantir os serviços mínimos” [6.º P.I.].

6. Tal acordo mereceu a aceitação e não oposição da Ré [7.º P.I.].

7. O Banco Autor assumiu os direitos e obrigações decorrentes do referido contrato de utilização de espaço em centro comercial [8.º P.I.].

8. Entre os deveres da Ré encontra-se o de «Pagar as prestações pecuniárias de cada mês nos prazos constantes das cláusulas décima e décima primeira e de preencher diligentemente os relatórios padronizados para efeitos de apuramento da facturação mensal do espaço ora cedido» - conforme resulta da cláusula décima oitava, n.º 3, al. c) do contrato de utilização de espaço em centro comercial [9.º P.I.].

9. Por falta de pagamento, o Autor enviou carta registada com aviso de receção em 9 de junho de 2015 a interpelar a Ré para o pagamento das rendas em dívida referentes ao período entre dezembro de 2014 e junho de 2015, totalizando €86.100,00 (oitenta e seis mil e cem euros) [10.º P.I.].

10. Neste seguimento, vieram as partes a acordar o pagamento das rendas supra referidas em duas prestações [11.º P.I.].

11. Tendo vindo a ser efetivamente liquidadas [12.º P.I.].

12. Nesta sequência, a Ré, através de carta datada de 29/07/2015, comunicou aos advogados do Autor essencialmente que o incumprimento em causa ficou sanado no prazo de 30 dias e por isso teria ficado precludido o direito à resolução do contrato [8.º e 9.º Cont.].

13. A Ré não procedeu ao pagamento das rendas de julho, agosto e setembro de 2015 no prazo para o efeito [13.º P.I.].

14. Entre 22 de Agosto e 31 de Outubro de 2015, a Ré comunicou ao Autor as seguintes situações em que se encontrava o imóvel em causa:

a) Por comunicação de 22/08/2015:

i) escadas rolantes de acesso das garagens ao piso zero fora de serviço;

ii) escadas rolantes descendente do piso 0 para os cinemas fora de serviço;

iii) cobertura do edifício com isolamento deficiente;

iv) elevador de acesso das garagens ao piso 0 desactivado;

v) pedra de cobertura da fachada solta na rampa para acesso de pessoas com mobilidade reduzida.

b) Por comunicação de 09/09/2015:

i) falta de iluminação existente no piso 0 do edifício ;

ii) abundante infiltração de águas pluviais pela cobertura do edifício, com projecção das mesmas sobre as escadas rolantes de acesso às garagens, o que motivou a queda de uma utente do Complexo de Cinemas.

c) Por comunicação de 18/09/2015:

i) falta de iluminação no piso 0;

ii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos.

d) Por comunicação de 26/09/2015:

i) falta de iluminação no piso 0;

ii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos.

e) Por comunicação de 09/10/2015:

i) falta de iluminação no piso 0;

ii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento;

iii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos

f) Por comunicação de 16/10/2015:

i) queda de águas pluviais da cobertura do edifico sobre as escadas rolantes, que ficaram fora de serviço, com um elevador também desactivado;

ii) falta de iluminação do piso 0;

iii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento;

iv) falta de reforço de limpeza do piso 0 para remoção de águas pluviais acumuladas, com evidente risco para os utentes do Complexo de Cinemas

g) Por comunicação de 31/10/2015:

i) queda de águas pluviais da cobertura do edifico sobre as escadas rolantes, que ficaram fora de serviço, com um elevador também desactivado;

ii) falta de iluminação do piso 0;

iii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento [15.º Cont.].

14 – A - As escadas rolantes já estavam a funcionar em outubro de 2015. [ Aditado pelo Tribunal da Relação]

15. Por carta datada de 03/11/2015, a Ré comunicou essencialmente ao Autor que as apontadas situações causaram um elevado impacto negativo no funcionamento do Complexo de Cinemas, afectando a respectiva imagem comercial junto dos utentes, com a correspondente redução na afluência destes últimos ao estabelecimento, que semelhante situação motivou a suspensão pela Ré do pagamento das prestações pecuniárias mensais devidas pela cessão da utilização do espaço afecto ao Complexo de Cinemas [16.º e 17.º Cont.].

16. Nessa missiva, a Ré invocou um decréscimo na quota de mercado do complexo de cinemas de … de 40% para uns meros 30%, como consequência do deficiente estado de conservação do edifício onde o mesmo está instalado [18.º Cont.].

17. Através dessa carta, a Ré estimou que a conclusão dos trabalhos de reparação então em curso pelo Autor demorassem mais 3 meses, período temporal esse durante o qual os prejuízos do Complexo de Cinemas continuariam a ocorrer e que seriam equivalentes a 3 meses de rendas, quantia essa com a qual entendeu dever ser compensada pelo Autor, pelo que se absteria de pagar a esse título as prestações referentes aos meses de Julho a Setembro de 2015 [19.º e 20.º Cont.].

18. Através dessa mesma carta mais solicitou a Ré ao Autor que procedesse, na maior brevidade possível, à conclusão dos trabalhos de eliminação dos referidos vícios e defeitos [21.º Cont.].

18-A -Em virtude da precipitação de águas pluviais provenientes da cobertura do edifício em fase de reparação em finais de 2015, o piso 0 do imóvel empoçou-se e de onde se verificou repasse das ditas águas para o piso -1 ocupado pelo complexo de cinemas, onde penetraram na sala nº 4, danificando o pladur de revestimento do tecto, cerca de 30 m2 de alcatifa de revestimento de paredes, cerca de 150m2 de alcatifa de revestimento do piso e o revestimento várias cadeiras, bem como danificou o quadro eléctrico do sistema, que foram substituídos e reparados. [ Aditado pelo Tribunal da Relação]

19. Em 10 de novembro de 2015 o Autor dirigiu à Ré carta registada com aviso de receção a resolver o contrato de utilização de espaço em centro comercial, onde consta, para além do mais, o seguinte:

Assunto: Resolução do contrato de utilização de espaço em centro comercial.

O Banco Comercial Português, S.A., considera resolvido o contrato de utilização de espaço comercial outorgado em 02 de Novembro de 2006 e fundamenta tal resolução por incumprimento do dever do pagamento de rendas, nos termos do art. 1083.º, n.º 1 e n.º 3 e 1084.º, n.º 2, do Código Civil e art. 9.º, n.º 7, al. c) da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, com a redacção dada pela Lei n.º 79/2014, de 19 de Dezembro (Novo Regime do Arrendamento Urbano), bem como das cláusulas 18.ª, n.º 3, al. c) e 20.ª, n.º 4, al. a) e g).

Por força da resolução contratual operada são V.Exas. devedores das seguintes quantias: rendas vencidas e não pagas relativas às emitidas em 06/07/2015, 07/08/2015 e 04/09/2015, com vencimento respectivamente a 14/08/2015, 18/09/2015 e 15/10/2015 (…) e €5.000,00 a título de sanção pecuniária mensal correspondente a 50% do valor da remuneração fixa mensal nos termos da cláusula 22.ª, n.º 2.

Nestes termos e por força da resolução operada, interpelamos V.Exa. para no prazo máximo de 30 dias a contar da recepção da presente carta efectuarem o pagamento das quantias supra, bem como para procederem à entrega do imóvel locado, devoluto de pessoas e bens (…) ao Banco Comercial Português, S.A. (…) [14.º P.I.].

20. Por carta de 23 de novembro de 2015 veio a Ré arguir a exceção de não cumprimento do contrato, nos termos do art. 428.º do Código Civil, invocando o direito de se recusar a pagar as rendas, bem como a recusar o reconhecimento do direito do Autor a resolver o contrato [17.º P.I.].

21. Para o efeito, argumenta a Ré que o imóvel em causa padece de vários vícios e defeitos de conservação que imputam «directa e culposamente» ao Autor [18.º P.I.].

22. A Ré queixou-se de anomalias existentes na cobertura do edifício, nas escadas rolantes e ainda na iluminação inexistente no piso zero e da iluminação deficiente no piso -1 de estacionamento [19.º P.I.].

23. O Autor tem vindo a enveredar todos os esforços para resolver os vícios e defeitos deixados pela SIMO [27.º P.I.].

24. O Autor iniciou obras para a reparação da cobertura, problema deixado pelos anteriores proprietários [28.º P.I.].

25. Na primeira vistoria efetuada pelo Banco ao imóvel, em 14 de novembro de 2014, data anterior à tomada de posse efetiva do imóvel pelo banco, verificou-se que existiam vidros partidos na cobertura e que esta estava parcialmente coberta por plásticos de modo evitar infiltrações de águas pluviais para o interior do imóvel [29.º P.I.].

26. Nas áreas comuns do centro comercial, foram colocados baldes para recolher as águas pluviais e assim minimizar os efeitos das infiltrações no pavimento [30.º P.I.].

27. Posteriormente, verificou-se que na cobertura que os materiais existentes entre o vidro e as caixas de alumínio que garantem a estanquicidade da cobertura (vedantes, silicones…) encontravam-se em estado de degradação evidente [31.º P.I.].

28. Em setembro de 2015 foi iniciada a reabilitação da cobertura do imóvel [32.º P.I.].

29. Em 22/11/2015 a entrada Sul do edifício dos autos teve de ser fechada por várias vezes, dado que chovia copiosamente e não se encontravam, assim, reunidas as condições mínimas de segurança para que os clientes do Complexo de Cinemas aí acedessem pela respectiva entrada principal [50.º Cont.].

30. Com o consequente grande desconforto para os mesmos e desprestigio para aquele recinto público de espectáculos [51.º Cont.].

31. Semelhante situação sucedeu porque a empresa contratada pelo A. para efectuar os trabalhos de reparação da cobertura do edifício dos autos não assegurou a defesa desse elemento estrutural contra chuvas e consequentes infiltrações de águas pluviais [52.º Cont.].

32. Para remover estas últimas, a Ré teve de reforçar os serviços de limpeza no piso 0 durante cerca de 2 horas suplementares [53.º Cont.].

33. Desta vicissitude foi dado logo conhecimento à “Sultanato do Al Garb”, empresa contratada pelo A. para assegurar a gestão do edifício [54.º Cont.].

34. A Ré deu formalmente conhecimento ao A. do ocorrido, através de carta datada de 15/12/2015, tendo, então, reiterado o pedido de adopção de medidas mais eficazes para impedir a descrita situação [55.º Cont.].

35. Entre 12 de Novembro e 21 de Dezembro de 2015 a Ré comunicou ao A. que as obras de reparação da cobertura arrastavam-se sem resultados práticos em situações de ocorrência de precipitação pluvial, embora o silicone já estivesse a ser aplicado na zona mais crítica, a iluminação do piso -1 e das saídas de emergência continuava deficiente, um dos 3 comandos de activação das clarabóias de desenfumagem não funcionava, uma escada rolante estava fora de serviço e que a caleira existente por cima da entrada principal carecia de urgente reparação, dada a enorme quantidade águas pluviais que por ali caíam [56.º Cont.].

36. Em 21/12/2015 a “Sultanato do Al Garb” informou a Ré que todas essas suscitadas questões estavam a aguardar aprovação por parte do A., motivo pelo qual os correspondentes trabalhos de reparação não se tinham iniciado [57.º Cont.].

37. Em 30/12/2015 a Ré informou o A. que continuava a cair enorme quantidade de águas pluviais pela entrada principal do edifício provenientes do deficiente escoamento da cobertura, dado que a respectiva caleira estava obstruída ou tinha falta de capacidade de escoamento, fazendo escorrer águas pelos vidros da fachada, com a consequente acumulação nos tapetes interiores [58.º Cont.].

38. O que suscitou inúmeras reclamações por banda dos clientes do Complexo de Cinemas sobre o perigo de escorregamento dos mesmos que a referida acumulação de águas representava [59.º Cont.].

39. Em 14 e 21 de Janeiro de 2016 a Ré comunicou ao A. que ainda ocorriam as seguintes deficiências e vícios de conservação do imóvel dos autos [60.º Cont.]:

a) No piso -1 de estacionamento existiam várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com deficiências nos respectivos arrancadores;

b) Deficiente iluminação das saídas de emergência;

c) Avaria de um dos comandos das claraboias de desenfumagem, revelando-se necessário proceder à abertura desta última, a fim de serem convenientemente isoladas;

d) Infiltrações de águas pluviais decorrentes das caleiras existentes por cima da entrada principal Sul, que escoavam pela fachada de vidro do edifício e que se acumulam nos tapetes, inundando o piso 0;

e) Infiltrações de águas pluviais pela cobertura do edifício que se acumulavam nas lojas devolutas do piso 0 e daí se infiltravam pela respectiva laje, inundando o “Coffee Bar” de apoio às Salas de Cinema;

f) Infiltrações de águas pluviais pela cobertura do edifício, que se acumulavam no local destinado a Praça de Restauração sito no piso 0 e de onde se infiltravam, por seu turno, afectando o recinto técnico de projecções dos filmes e a sala de cinema nº 4, cujo tecto de pladur estava então a apodrecer e a precipitar a queda de detritos sobre as cadeiras ali existentes e alcatifas de recobrimento do piso, que se iam progressivamente deteriorando;

g) Infiltrações de águas pluviais pela “Praça das Esplanadas” exterior, situada no lado Norte do edifício, que causava, por seu turno, infiltrações no corredor da saída de emergência (porta exterior nº 6) do Complexo de Cinemas – docs. nºs 15 e 16 –

40. Através da carta de 21/01/2016 a Ré solicitou ao A. que, na maior brevidade possível, procedesse à reparação das denunciadas anomalias, que estavam a causar graves dificuldades à exploração do Complexo de Cinemas, com a consequente produção de danos emergentes e lucros cessantes, que seriam contabilizados e imputados ao ora demandante [61.º Cont.].

41. Entre 3 de Abril e 12 de Maio de 2016 a Ré comunicou ao A. que os tapetes interiores da entrada sul do edifício tinham que ser urgentemente repostos, que existia uma infiltração de águas pluviais no corredor da saída de emergência, que carecia de ser eliminada urgentemente, que se impunha a correcção da iluminação de emergência e que as fechaduras das portas de vidro dos lados Norte e Sul careciam de reforço, atento a sua vulnerabilidade [62.º Cont.].

42. Ao que o “Sultanato do Al Garb” informou que esses assuntos se encontravam em análise e em curso, sem que em meados de Maio desse ano tivessem sido resolvidos [63.º Cont.].

43. Por carta de 07/06/2016 o A., sem responder aos denunciados vícios e defeitos de conservação do edifício anteriormente comunicados pela Ré, interpelou-a para que a mesma procedesse ao pagamento das rendas vencidas de Outubro a Dezembro de 2015 e de Janeiro a Maio de 2016, com acréscimo de metade do seu valor a título de sanção pecuniária, tendo-lhe relembrado que havia resolvido o contrato dos autos, pelo que também solicitou que o espaço ocupado pelo Complexo de Cinemas fosse devolvido no prazo de 8 dias, devoluto de pessoas e bens, sob pena de aplicação da sanção contratualmente prevista para esse efeito de incumprimento [64.º Cont.].

44. Através de carta datada de 29/06/2016 a Ré comunicou ao A. que discordava da posição pelo mesmo assumida na referida missiva e informou-o de que ainda se encontravam pendentes de reparação as seguintes anomalias [65.º Cont.]:

a) Dois candeeiros exteriores inactivos;

b) Logotipo exterior com a respectiva película muito queimada pelos elementos atmosféricos e com iluminação muito deficiente;

c) Queda de pladur do tecto do “food court”, o qual tinha, então, uma má aparência geral;

d) Motor do gradão de estacionamento com frequentes falhas de funcionamento, que obrigavam ao seu acionamento manual.

45. Em 15/09/2016 a Ré comunicou à “Sultanato do Al Garb” que as duas portas exteriores da saída de emergência viradas para o Supermercado “Minipreço” encontravam-se com o trinco aberto, podendo ser accionadas do exterior, bastando para o efeito manipular o respectivo mecanismo, pelo que tiveram que ser pela ora demandada reforçadas com correntes pelo interior, situação essa que se não poderia manter, atenta a função a que se destinavam [66.º Cont.].

46. Em 18/10/2016 a Ré comunicou ao “Sultanato do Al Garb” que alguns pontos do interior do edifício dos autos apresentavam uma sensível degradação, bastante visível aos clientes do Complexo de Cinemas e que o passeio do lado exterior no lado Sul/Poente do edifício apresentava um piso muito irregular e dotado de buracos causados pelo aluimento de terras, um dos quais situado junto ao contentor do lixo, no local onde os veículos de recolha desses resíduos efectuam a manobra, existindo o risco de afundamento do pavimento [67.º Cont.].

47. Ao que aquela gestora do edifício respondeu em 20/10/2016 que as propostas de reparação estavam em apreciação pelo ora A. [68.º Cont.].

47-A – Quando o Autor assumiu a posição contratual da SIMO, já o imóvel padecia dos vícios e defeitos acima descritos nos factos provados [22.º P.I.]. [ dada como provado pelo  Tribunal da Relação]

48. A Ré veio liquidar, em singelo, as rendas em atraso de julho, agosto e setembro de 2015, no dia 8 de janeiro de 2016, num total de €36.900,00 [36.º P.I.].

49. Em 24/08/2016 a Ré pagou ao A. as rendas referentes aos meses de Outubro e Novembro de 2015 no valor de € 24.600,00 [72.º Cont.].

50. Cujas facturas, por não terem sido pelo demandante anuladas, ainda continuaram validamente em poder daquela [73.º Cont.].

51. Encontram-se actualmente pendentes de pagamento as rendas respeitantes aos meses de Dezembro de 2015 a Novembro de 2016, num total de €147.600,00, com IVA incluído, reportados ao período decorrente de Outubro de 2015 a Novembro de 2016 [74.º Cont.].

52. Por via de carta datada de 22/02/2016, o A., por reporte à comunicação da Ré datada de 08/02/2016, através da qual a mesma lhe havia solicitado a emissão de 2ª via da factura referente ao mês de Janeiro de 2016, informou-a de que não era possível atender ao solicitado, porque o contrato dos autos havia sido resolvido em 10/11/2015 [78.º Cont.].

53. Através dessa missiva mais o A. remeteu à Ré duas notas de crédito no valor de € 24.600,00, com IVA incluído, respeitante às rendas de Dezembro de 2015 e de Janeiro de 2016 [79.º Cont.].

54. Por carta de 29/06/2016 a Ré comunicou ao A. que lhe não havia pago mais rendas, precisamente por este último a tal se ter oposto, através da recusa de emissão de mais nenhuma factura, com a anulação das referentes aos meses de Dezembro de 2015 e de Janeiro de 2016, através de notas de crédito [80.º Cont.].

55. Quando em 02/11/2006 a SIMO celebrou com a Ré o contrato de cessão de espaço em centro comercial, o edifício “sub-judice” encontrava-se acabado de construir e a estrear, pelo que estava em óptimas condições de conservação e funcionamento [120.º Cont.].

56. Nos exercícios económicos de 2015 a 2016 o complexo de cinemas da Ré perdeu uma quota de mercado correspondente a uma facturação/receita bruta não obtida e perdida de €24.050,02, correspondente ao valor líquido de receita não realizada e perdida de €14.430,02 [204.º a 235.º Reconvenção].

57. Em consequência das inundações acima descritas, a Ré viu-se forçada a desviar das suas normais atribuições de cinema funcionários seus e a alocá-los a essa tarefa específica de limpeza, o que representou um dispêndio de €1.075,45 [236.º a 239.º Reconvenção].



*


Factos não provados:


b) Que os problemas nas escadas rolantes, também deixados pelos anteriores proprietários, foram solucionados, tendo o seu funcionamento sido aprovado pelas inspecções de 11 e 12 de novembro de 2015 [33.º P.I.].

c) Que foram ainda corrigidos pelo Autor os problemas com a iluminação [34.º P.I.].

d) Que o incumprimento da Ré é anterior às reclamações, uma vez que os mesmos apenas foram comunicados pela supra mencionada carta datada de 3 de novembro de 2015 [35.º P.I.].

e) Que nos exercícios económicos de 2015 a 2016 o complexo de cinemas da Ré perdeu uma quota de mercado correspondente a uma facturação/receita bruta não obtida e perdida de €66.374,00, correspondente ao valor líquido de receita não realizada e perdida de €38.824,40 [204.º a 235.º Reconvenção].

f) Que a tarefa específica de limpeza feita pelos funcionários da Ré, acima referida nos factos provados, representou um dispêndio de € 1.370,00 [236.º a 239.º Reconvenção].

g) Que a Ré teve que suportar um custo global no valor de € 8.131,00 nas reparações de todas as danificações de materiais de revestimento e de equipamentos [248.º Reconvenção].



***



3.2. Fundamentação de direito


3.2.1. Conforme já se deixou dito, o objeto do presente recurso prende-se, essencialmente, com a questão de saber se à ré é lícito invocar a exceção de não cumprimento do contrato, nos termos do art. 428º do C. Civil, em ordem a justificar a suspensão do pagamento das prestações pecuniárias relativas aos meses de julho, agosto e setembro de 2015 e a evitar que a resolução do contrato declarada pelo autor com fundamento na falta de pagamento destas mesmas prestações produza efeito.


Posto que a exceção de não cumprimento constitui um meio de assegurar o respeito pelo princípio do cumprimento simultâneo das obrigações sinalagmáticas que releva no âmbito das obrigações duradoras, evidente se torna que a resposta a dar à questão supra enunciada depende do tipo de contrato vigente entre as partes, pelo que a tarefa que se nos impõe é, desde logo, definir a natureza jurídica do contrato em causa por forma a estabelecer quais as obrigações que dele dimanam para o autor e para a ré e, consequentemente, averiguar se, no caso dos autos, houve falta de integral cumprimento, incumprimento parcial ou cumprimento defeituoso (exceptio non rite adimpleti contractus) por parte do autor.

E consabido que no nosso sistema jurídico vigora o princípio da liberdade contratual, consagrado no art. 405º, do C. Civil, nos termos do qual, dentro dos limites da lei, as partes têm a faculdade de fixar livremente o conteúdo dos contratos, celebrar contratos diferentes dos previstos neste código ou incluir nestes as cláusulas que lhes aprouver, podendo as partes reunir no mesmo contrato regras de dois ou mais negócios, total ou parcialmente regulados na lei, e que, para efeitos de qualificação jurídica de um contrato, não basta o nomen dado pelas partes, vejamos, então, se a factualidade apurada e o teor das cláusulas contratuais estipuladas pelos contraentes, analisadas à luz do disposto nos arts. 236º e 238º, ambos do C. Civil,  permitem definir o contrato celebrado entre as partes como sendo um contrato atípico ou inominado de “ Utilização de Espaço em Centro Comercial ” .

A este respeito está provado que, através do documento escrito, datado de 2 de novembro de 2006 (junto a fls. 35 a 49 dos autos) e do respetivo aditamento datado de 1 de junho de 2012 (junto a fls. 50 dos autos), a Simo – Sociedade Imobiliária de Cinemas, S.A. e a é New Lineo Cinemas de Portugal, Ldª declararam celebrar um contrato que denominaram de “ contrato de utilização de espaço em centro comercial ” e aceitar que o mesmo fica submetido aos seguintes considerandos e cláusulas:    

« I) Considerandos

(…)

c) as contratantes livremente adoptam o conceito e “Centro Comercial”, como  sendo um estabelecimento comercial dotado de clientela própria e integrado por um conjunto de lojas e espaços comerciais (…) , dotado de infraestruturas e acesso e estacionamento comuns, gerido sob uma administração própria que, adoptando técnicas específicas deste tipo de estabelecimento, procura assegurar o seu funcionamento comum como um todo harmónico, subordinado a adequadas normas de convivência, manutenção, promoção e desenvolvimento, e que tem por objectivo conferir ao consumidor condições de segurança, conforto e estímulo que lhe facilitem a escolha e aquisição, proporcionando, por outro lado, ao logista a potencialização da sua aptidão para gerar lucros no âmbito do seu específico ramo de comércio;

d) As contratantes perfilham este conceito e entendem não se encontrar ainda disciplinado na lei um contrato típico, devidamente adequado às contingências próprias da utilização de espaço em centro comercial;

e) Em consequência, as contratantes pretendem, no âmbito da liberdade contratual legalmente consagrada, celebrar um contrato atípico que aqui qualificam de Utilização de Espaço em Centro Comercial, contrato este que as partes, embora reconhecendo que reúne elementos de vários contratos, entendem não se subsumir a qualquer dos tipos legais;

f) Por isso, as contratantes desde já afastam a qualificação deste contrato como arrendamento ou sub arrendamento, por considerarem que este tipo legal de contrato constitui uma figura na qual não se podem integrar grande parte dos elementos próprios da utilização de um espaço integrado em Centro comercial e que aqui pretendem consagrar, nomeadamente a forma de remuneração, a selectividade, a disciplina comum de funcionamento ou a prestação de serviços inerentes à respetiva administração.

(…)».

Na cláusula 6ª deste contrato estabeleceram as partes outorgantes que: « (…) a “Simo”, no exercício dos direitos e poderes que lhe advém da propriedade do imóvel,  faculta à “Logista” a utilização (…) dos espaços destinados a salas de Cinema , unidade “AO” do Centro e respetivos anexos e zonas técnicas  (…)», mediante a retribuição mensal estipulada na cláusula 10ª e a pagar, nos termos do nº 6 desta mesma cláusula « 30 dias após a recepção das correspondentes facturas».

E, na cláusula décima oitava, estabeleceram:

« 1. São obrigações da “SIMO”:

a) - Assegurar a gestão e funcionamento do CENTRO nos termos das disposições legais e regulamentares aplicáveis de molde a evitar o respectivo encerramento por determinação administrativa ou judicial, bem como do Regulamento que junta como Anexo II ao presente contrato e dele ficará fazendo parte integrante.

b) - Garantir a manutenção do CENTRO, bem como a sua segurança, limpeza e ventilação, podendo contratar terceiros para a prestação dos serviços acima descritos, não sendo responsável pelo seu modo de execução ou por eventuais interrupções dos serviços prestados, mantendo em bom estado de conservação e procedendo às reparações com a maior brevidade possível a contar do evento que lhes der origem, as inerentes infraestruturas, tais como sanitários, corredores, elevadores, escadas, mecânicas e não mecânicas e demais equipamentos especiais e, outrossim, a reparar imediatamente e manter em bom estado de conservação e funcionamento o sistema de ar condicionado do CENTRO.

c) - Manter a segurança de pessoas e bens do CENTRO, assim como assegurar o funcionamento e manutenção dos sistemas de climatização, abastecimento de energia eléctrica e de água do CENTRO, podendo contratar terceiros para a prestação dos serviços acima descritos, não sendo responsável pelo seu modo de execução ou por eventuais interrupções dos serviços prestados até ao encerramento diário do CENTRO.

(…).

g) - Manter, durante o período de vigência contratual, perfeitamente operacionais e utilizáveis, os lugares de parqueamento automóvel do Centro. 

(…) .

2. (…)

3. São obrigações da “Logista”:

« (…)

 c) Pagar as prestações pecuniárias de cada mês nos prazos …

(…)»


Daqui decorre, com bastante clareza, ter sido vontade das partes contratantes celebrar um contrato com uma função económico-social diversa da dos típicos contratos de arrendamento para o exercício do comércio, de cessão de exploração de estabelecimento comercial e de prestação de serviços e com uma causa negotii” muito específica, ou seja, a utilização e consequente exploração de um espaço destinado a cinema e integrado num“ centro comercial”, enquanto conjunto organizado de uma multiplicidade de espaços e estabelecimentos comerciais que, ainda que autonomamente explorados, estão subordinados a uma atuação integrada no todo organizado e à respetiva administração, por forma a, por um lado, assegurar uma cooperação contínua entre os lojistas e a entidade administradora do Centro, indispensável ao sucesso do empreendimento. E, por um lado, conferir ao consumidor condições de segurança, conforto e estímulo que lhe facilitem a escolha e a aquisição de bens e, por outro lado, proporcionar aos lojistas a potencialização da sua aptidão para gerar lucros no âmbito do seu específico ramo de comércio.

Há, assim, uma relação entre as várias lojas que integram o Centro não só entre si - e que funciona como condição ou fundamento dogmático da relevância dessa integração - ,como verticalmente de cada uma delas com a entidade administradora do Centro, sendo que esta relação com o Centro, enquanto individualidade que se sobrepõe à individualidade das várias unidades que o integram, não pode deixar de influenciar e de modelar o regime de cada contrato celebrado entre o gestor/administrador do Centro e o lojista [2].

Estamos, pois, perante um contrato, que, quanto à sua natureza jurídica, não se reduz a um simples contrato de arrendamento, de carácter vinculístico e regulado por disposições imperativas, uma vez que o espaço cedido, embora explorado individualmente, integra-se num todo organizado.

Não consiste num contrato de cessão de exploração de estabelecimento comercial, na medida em que os lojistas não querem adquirir e explorar um estabelecimento comercial já existente e a funcionar, querendo, antes, instalar o seu.

E também não se configura como um contrato misto de arrendamento e prestação de serviços, pois, apesar da entidade gestora do Centro ficar obrigada a assegurar o gozo do estabelecimento e a prestar uma série de serviços essenciais, tais serviços  respeitam  não só ao rendimento de cada uma das lojas, como aos bens de utilidade comum ou ao funcionamento de serviços de interesse comum, possibilitando, deste modo, a utilização de cada um desses espaços com os benefícios próprios do Centro Comercial.  

Daí que, ante a realidade fáctica fixada pelas instâncias, seja de concluir que estamos, efetivamente, perante um contrato que tem por objeto a cedência de um espaço integrado num centro comercial e na prestação de um conjunto de serviços que possibilitam a utilização desse espaço com os benefícios próprios do centro comercial, mediante o pagamento de determinada contrapartida, pelo que, na linha do entendimento já consolidado da doutrina[3] e da jurisprudência[4], não vemos razão para nos afastarmos da qualificação jurídica dada pelas partes e pelas instâncias ao contrato em causa como sendo um contrato atípico ou inominado de “Utilização de Espaço em Centro Comercial”, que, tal como decorre do citado art. 405º, rege-se, sucessivamente, pelas suas próprias cláusulas, pelas disposições gerais e normas da figura típica mais próxima.

E porque, através do acordo escrito denominado “Acordo de Cessão da Posição de Locador no Contrato de Utilização de Espaço em Centro Comercial celebrado em 02/11/2006 e alterado em 01/06/2012”, celebrado, em 28 de novembro de 2014, entre  o Banco Comercial Português, S.A, a Simo – Sociedade Imobiliária de Cinemas, S.A.  e a ré New Lineo Cinemas de Portugal, Ldª, a SIMO cedeu gratuitamente a sua posição contratual de locador no supra mencionado “ Contrato  de  Utilização de Espaço em Centro Comercial”, a favor do  banco, ora autor, dúvidas não restam de que  este assumiu também, por esta via, os direitos e as obrigações decorrentes daquele primeiro contrato, ficando, contudo, estabelecido entre o   Banco Comercial Português, S.A e a ré New Lineo Cinemas de Portugal, Ldª que as obrigações contantes da  cláusula  décima oitava, número 1, alíneas a), b), c) e g) do referido “ Contrato de Utilização de Espaço em Centro Comercial ”,  são acrescentadas nos  seguintes termos:  « (…) O BCP apenas se encontra obrigado a cumprir os procedimentos, ações e diligências  que atualmente a SIMO assegura, para garantir os serviços mínimos» e ainda, no que respeita  à alínea g), que tais serviços mínimos valem « apenas quanto ao piso -1».

Por outro lado, avulta destes dois referidos contratos um vínculo de reciprocidade ou interdependência (sinalagma) entre a obrigação do banco autor de garantir a cedência do gozo do espaço destinado a cinema integrado no Centro Comercial e de prestar um conjunto de serviços e a obrigação do pagamento da correspondente contrapartida pecuniária por parte da ré.

Com efeito, no nº 2 da cláusula décima oitava do referido contrato de “ Utilização de Espaço em Centro Comercial ”, ficou estipulado que « O fornecimento dos serviços acima descritos será efectuado dentro dos parâmetros definidos no Regulamento de Funcionamento e Utilização do Centro e poderá ser de imediato interrompido caso a “Lojista” não efectue atempadamente os pagamentos correspondentes a que se obriga nos termos do presente contrato ».

Na cláusula décima nona (Suspensão do Contrato) do mesmo contrato, ficou estabelecido que:

« 1 - Na ocorrência de qualquer sinistro que impeça o exercício da actividade pela “LOJISTA”, em qualquer dos espaços objecto do presente Contrato, fica expressamente acordado o seguinte:

a) A “SIMO” obriga-se a repor as obras de base e infraestruturas nos termos do Projecto inicialmente apresentado pela “Lojista” e provado pela “SIMO” (…).

b) (…).

2 - Enquanto a “LOJISTA”, pelo indicado motivo, se encontrar impedida de, total ou parcialmente, exercer a respectiva actividade, considera-se suspensa total ou parcialmente a vigência do presente contrato até que se concluam as obras de restauro e recuperação integral do espaço afectado, sem prejuízo do disposto nos pontos anteriores.

3 - (…) ».

Perante este quadro factual, vejamos, então, se foi legítima a invocação pela ré da exceção de não cumprimento do contrato prevista no art. 428º do C. Civil para justificar a suspensão do pagamento das prestações pecuniárias referentes aos meses de julho, agosto e setembro de 2015.

Dispõe o nº 1 do citado artigo que «Se nos contratos bilaterais não houver prazos diferentes para o cumprimento das prestações, cada um dos contraentes tem a faculdade de recusar a sua prestação enquanto o outro não efetuar a que lhe cabe ou não oferecer o seu cumprimento simultâneo».

Como ensinam Pires de Lima e Antunes Varela[5], a exceptio non adimplente contractus não funciona como uma sanção, mas apenas como um processo lógico de assegurar, mediante o cumprimento simultâneo, o equilíbrio em que assenta o esquema do contrato bilateral.

Trata-se, no dizer de Calvão da Silva[6], de uma exceção que, não é de conhecimento oficioso, carecendo de ser invocada pelo demandado a quem se exija o cumprimento.

E trata-se, outrossim, de uma exceção de direito material, porque corolário do sinalagma funcional que a funda e legitima: «o excipiens não nega o direito do autor ao cumprimento nem enjeita o dever de cumprir a prestação; pretende tão só um efeito dilatório, o de realizar a sua prestação no momento (ulterior) em que receba a contraprestação a que tem direito e (contra) direito ao cumprimento simultâneo…».

É de admitir essa exceptio sempre que, existindo um nexo de correspondência ou de reciprocidade entre as obrigações que, no âmbito dos contratos bilaterais, emergem para ambas as partes, ocorra um desequilíbrio injustificado e contrário às regras da boa fé, consagradas nos artigos 227º e 762º, nº 2, do C. Civil, configurando-se a exceptio como um meio de repor o equilíbrio contratual entre as prestações das partes[7]

E, conforme vem sendo posição unânime da doutrina e da jurisprudência, este desequilíbrio contratual vale tanto para o caso de falta integral do cumprimento (incumprimento temporário), como para o de cumprimento parcial ou defeituoso[8], dependendo a procedência da exceptio, neste último caso, da demonstração pelo excipiens de que os efeitos da prestação realizada prejudicam, de forma relevante ou significativa, a satisfação do interesse visado no contrato[9].

De realçar ainda, como refere João Abrantes[10], que a exceptio non adimplente contractus só tem fundamento legal nas hipóteses de mora (incumprimento temporário) ou cumprimento defeituoso pelo devedor, mas já não se o devedor incorrer em situação de incumprimento definitivo, seja resultante da impossibilidade da realização da prestação (fortuita ou imputável ao devedor - art. 801º, nº1 do C. Civil), da recusa inequívoca e perentória do devedor ao cumprimento ou da perda do interesse objetivo do credor na prestação em falta por via do retardamento (art. 808º, nºs 1 e 2, do C. Civil), casos em que a exceção já não pode surtir efeito útil. 

Na expressão deste mesmo autor, a invocação da exceção de não cumprimento supõe a existência  de uma tripla relação entre o incumprimento (mora; incumprimento defeituoso) do outro contraente e a recusa de cumprir por parte do devedor/excipiens: relação de sucessão, de causalidade e de proporcionalidade entre uma e outra.

« Segundo a dita relação de sucessão, não poderá recusar a sua prestação, invocando a exceptio, o contraente que se encontre, ele próprio, numa situação de incumprimento/mora; a recusa de cumprir do excipiens deve ser posterior à inexecução da obrigação da contraparte, deve seguir-se-lhe e não precedê-la.

Por sua vez, segundo aquela relação de causalidade, a exceptio supõe a existência de um nexo de interdependência causal entre o incumprimento da outra parte e a suspensão da prestação pelo excipiens, ou seja, a exceptio deve ser alegada tendo em vista compelir à execução da obrigação correspectiva por parte do outro contraente; se o comportamento objectivamente manifestado pelo excipens indicia não ser esse (…) efectivamente o motivo da sua recusa em prestar, a dita excepção será ilegítima e não poderá , assim, proceder.

Finalmente, por força do princípio da equivalência ou proporcionalidade, a recusa do excipiens deve ser equivalente ou proporcionada à inexecução da contraparte que reclama o cumprimento, de modo que, se a falta desta não assumir relevância no contexto da utilidade económica da prestação, o recurso à exceptio poderá também ser ilegítima».

Vale tudo isto por dizer, ainda segundo o referido autor[11], que «são pressupostos da excepção de não cumprimento: existência de um contrato bilateral; não cumprimento ou não oferecimento do cumprimento simultâneo da contraprestação; não contrariedade à boa -fé». 

De esclarecer, constituir entendimento consolidado na doutrina e na jurisprudência, que, mesmo existindo prazos diferentes para o cumprimento das obrigações, o contraente obrigado a cumprir em segundo lugar pode ainda invocar a exceptio se o contraente obrigado a cumprir em primeiro lugar o não fizer ou o fizer de forma imperfeita[12]

É que, como já ensinava Vaz Serra[13], a fórmula legal do citado art. 428º, nº1 «pois o que a excepção supõe é que um dos contraentes  não esteja obrigado, pela lei ou pelo contrato, a cumprir a sua obrigação antes do outro; se não o estiver pode ele, sendo-lhe exigida a prestação, recusá-la, enquanto não for efetuada a contraprestação. Por conseguinte, a excepção pode ser oposta ainda que haja vencimentos diferentes …. apenas não podendo ser oposta pelo contraente que devia cumprir  primeiro….».

De sublinhar, todavia, que situações excecionais existem em que, de harmonia com o disposto no art. 429º do C. Civil, o próprio contraente obrigado a cumprir em primeiro lugar, tem a faculdade de recusar o cumprimento da respetiva prestação enquanto o outro não efetuar a sua prestação ou não der garantias de cumprimento, se, posteriormente ao contrato, se verificar alguma das circunstâncias enunciadas no art. 780º, nº1, do C. Civil e que importam a perda do benefício do prazo, ou seja, se o obrigado a cumprir em último lugar se tornar insolvente, mesmo que não judicialmente declarado, se diminuírem , por facto que lhe seja imputável, as garantias do crédito ou não forem prestadas as garantias convencionadas.

De referir, finalmente, que assentando a configuração dos contratos sinalagmáticos na relação de interdependência entre as obrigações que deles reciprocamente emergem para ambas as partes, impondo a justiça comutativa que o devedor de cada uma dessas obrigações só possa ser compelido a executá-la se o devedor da outra também cumprir, é bom de ver que nas relações obrigacionais complexas a exceptio abrange apenas as obrigações principais, que diretamente prosseguem o interesse do credor, e não já as obrigações secundárias, que são meramente instrumentais em relação àquelas e que têm objeto acessório ou complementar em relação à estrutura do contrato e ao escopo fundamental prosseguido pelas relações obrigacionais dele derivadas.

Ora, neste contexto, provou-se que a ré não procedeu ao pagamento das rendas de julho, agosto e setembro de 2015 no prazo estabelecido para o efeito e que comunicou ao autor as seguintes situações em que se encontrava o imóvel em causa:

« a) Em 22/08/2015: i) escadas rolantes de acesso das garagens ao piso zero fora de serviço; ii) escadas rolantes descendente do piso 0 para os cinemas fora de serviço; iii) cobertura do edifício com isolamento deficiente; iv) elevador de acesso das garagens ao piso 0 desactivado; v) pedra de cobertura da fachada solta na rampa para acesso de pessoas com mobilidade reduzida.

b) Em 09/09/2015: i) falta de iluminação existente no piso 0 do edifício; ii) abundante infiltração de águas pluviais pela cobertura do edifício, com projecção das mesmas sobre as escadas rolantes de acesso às garagens, o que motivou a queda de uma utente do Complexo de Cinemas.

c) Em 18/09/2015: i) falta de iluminação no piso 0; ii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos.

d) Em 26/09/2015: i) falta de iluminação no piso 0; ii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos.

e) Em 09/10/2015: i) falta de iluminação no piso 0; ii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento; iii) falta de reforço de limpeza no piso 0 aos Sábados e Domingos

f) Em 16/10/2015: i) queda de águas pluviais da cobertura do edifico sobre as escadas rolantes, que ficaram fora de serviço, com um elevador também desactivado; ii) falta de iluminação do piso 0; iii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento; iv) falta de reforço de limpeza do piso 0 para remoção de águas pluviais acumuladas, com evidente risco para os utentes do Complexo de Cinemas

g) Em 31/10/2015: i) queda de águas pluviais da cobertura do edifico sobre as escadas rolantes, que ficaram fora de serviço, com um elevador também desactivado; ii) falta de iluminação do piso 0; iii) várias lâmpadas fluorescentes fundidas e outras com problemas de arrancador no piso -1 de estacionamento.

Mais se provou que, quando o banco autor, em 28 de novembro de 2014, assumiu a posição contratual da Simo, o imóvel já padecia destes vícios e defeitos e que, na primeira vistoria ao imóvel por ele efetuada em 14 de novembro de 2014, data anterior à sua tomada de posse efetiva do imóvel, o mesmo verificou que existiam vidros partidos na cobertura e que esta estava parcialmente coberta por plásticos de modo a evitar infiltrações de águas pluviais para o interior do imóvel .

E se é certo ter o autor, por via do referido contrato de cessão da posição contratual, acordado com a ré que ficava apenas obrigado a “garantir os serviços mínimos” , sem terem, porém, densificado este conceito, certo é também que, no que concerne às  obrigações constantes da  cláusula  décima oitava, número 1, alíneas b) e c) (únicas que aqui interessam analisar), não podemos deixar de concluir, por um lado, que a obrigação assumida pelo autor de, respetivamente  « garantir a manutenção do Centro, bem como a sua segurança, limpeza e ventilação (…) mantendo em bom estado de conservação e procedendo às reparações com a maior brevidade possível a contar do evento que lhes der origem, as inerentes infraestruturas, tais como sanitários, corredores, elevadores, escadas, mecânicas e não mecânicas e demais equipamentos especiais e, outrossim, a reparar imediatamente e manter em bom estado de conservação e funcionamento o sistema de ar condicionado do CENTRO » e de «Manter a segurança de pessoas e bens do CENTRO, assim como assegurar o funcionamento e manutenção dos sistemas de climatização, abastecimento de energia eléctrica e de água do CENTRO (…) »  não revestem a natureza de meros deveres acessórios da obrigação principal, fazendo, antes, parte  desta obrigação principal, na medida em que tais serviços constituem e integram o cerne da prestação principal do autor.

Isto porque, conforme já se deixou dito, o contrato celebrado não foi de mero arrendamento, mas de cedência da utilização de um espaço destinado a cinema e integrado num “centro comercial”, organizado e valorizado por estes mesmos serviços, o que tudo significa, tal como se afirma no Acórdão do STJ, de 07.11.2002 (processo 03B673)[14], que «a renda a pagar pela ré não era devida pela simples cedência do espaço, mas sim pela cedência de um espaço especial, capaz de atrair clientela e proporcionar maiores lucros, por se encontrar integrado no referido todo organizado, beneficiando dos identificados serviços».

Ora, ainda que a factualidade dada como provada não nos permita conhecer a data em que o autor deu início aos trabalhos de reparação de todos os vícios e defeitos denunciados pela ré, sabendo apenas que, em setembro de 2015, foi iniciada a reabilitação da cobertura do imóvel (cfr. nº 28 dos factos provados) e que, em outubro de 2015, as escadas rolantes já estavam a funcionar (cfr. nº 14 dos factos dados como provados), a verdade é que, no dia 31 de outubro de 2015, ainda ocorria a queda de águas pluviais da cobertura do edifício (cfr. nº 13, al. d) dos factos provados), situação que continuou a verificar-se até janeiro de 2016 e que suscitou inúmeras reclamações por parte dos clientes do Complexo de Cinema, (cfr. nºs 29, 34, 35, 36, 37, 38 e 39 dos factos provados) e que persistiu, pelo menos, até maio de 2016 (cfr. factos provados nºs 41 e 42). 

E tudo isto não obstante a ré ter informado o autor, entre 12 de novembro e 21 de dezembro de 2015, que as obras de reparação da cobertura arrastavam-se sem resultados práticos em situações de ocorrência de precipitação pluvial, embora o silicone já estivesse a ser aplicado na zona mais crítica e, por cartas datadas de 03.11.2015 e de 21.01.2016, ter solicitado ao autor que procedesse, com a maior brevidade possível, à reparação das denunciadas anomalias, (cfr. factos provados nºs 18, 35 a 40 ).

Quer isto dizer que o autor cumpriu parcial ou defeituosamente as obrigações para ele decorrentes da cláusula décima oitava, nº1, als. b) [Garantir a manutenção do CENTRO, bem como a sua segurança, limpeza (…), mantendo em bom estado de conservação e procedendo às reparações com a maior brevidade possível, as inerentes infraestruturas] do referido contrato de “Utilização de Espaço em Centro Comercial ”, porquanto, não obstante saber da ocorrência de infiltrações de águas pluviais para o interior do imóvel e através da respetiva cobertura e de ter iniciado a reabilitação desta em setembro de 2015, não tomou as medidas mais eficazes nem procedeu “ com a maior brevidade” por forma a debelá-las antes da chegada das chuvas do outono-inverno, pelo que em virtude da precipitação de águas pluviais provenientes da cobertura do edifício, em fase de reparação em finais de 2015, o piso 0 do imóvel empoçou e as ditas águas repassaram para o piso-1, ocupado pelo complexo de cinemas, onde penetraram na sala  nº4, danificando o pladur de revestimento do teto, cerca de 30 m2 de alcatifa de revestimento de paredes, cerca de 150 m2 de alcatifa de revestimento do piso, o revestimento de várias cadeiras e o quadro elétrico do sistema (cfr. nºs 34, 36 e 18-A dos  factos provados).

Ainda por causa das referidas infiltrações, em 22.11.2015, a entrada sul do edifício em causa teve de ser fechada por várias vezes, pois tendo chovido copiosamente não se encontravam reunidas as condições mínimas de segurança para que os clientes do Complexo de Cinemas aí acedessem pela respetiva entrada principal, com o consequente desconforto para os mesmos e desprestígio para aquele recinto público de espetáculos ( cfr. nºs 29 e 30 dos factos provados).

E tudo isto afetou a imagem comercial do referido Complexo de Cinemas, encontrando, por isso, justificação, à luz do disposto no art. 428º do C. Civil, a atitude da ré, quer no sentido de comunicar ao autor, por carta de 03.11.2015, que, estimava que a conclusão dos trabalhos de reparação então em curso pelo Autor demorassem mais 3 meses, período temporal esse durante o qual os prejuízos do Complexo de Cinemas continuariam a ocorrer e que seriam equivalentes a 3 meses de rendas, pelo que se absteria de pagar a esse título as prestações referentes aos meses de Julho a Setembro de 2015, quer no sentido de, por carta de 23 de novembro de 2015, arguir a exceção de não cumprimento do contrato, nos termos do art. 428.º do Código Civil, invocando o direito de se recusar a pagar as ditas prestações, bem como a recusar o reconhecimento do direito do Autor a resolver o contrato (cfr. factos dados como provados nos nºs 17 e 20).

Com efeito, em dezembro de 2015, continuou a cair enorme quantidade de águas pluviais pela entrada principal do edifício provenientes do deficiente escoamento da cobertura, o que suscitou inúmeras reclamações por parte dos clientes do Complexo de Cinema, sobre o perigo de escorregamento dos mesmos que a acumulação de águas representava (cfr. nºs 37 e 38 dos factos provados).

Em janeiro de 2016, ocorriam ainda infiltrações de águas pluviais decorrentes das caleiras existentes por cima da entrada principal Sul, que escoavam pela fachada de vidro do edifício e que se acumulam nos tapetes, inundando o piso 0; infiltrações de águas pluviais pela cobertura do edifício que se acumulavam nas lojas devolutas do piso 0 e daí se infiltravam pela respectiva laje, inundando o “Coffee Bar” de apoio às Salas de Cinema; infiltrações de águas pluviais pela cobertura do edifício, que se acumulavam no local destinado a Praça de Restauração sito no piso 0 e de onde se infiltravam, por seu turno, afetando o recinto técnico de projeções dos filmes e a sala de cinema nº 4, cujo teto de pladur estava então a apodrecer e a precipitar a queda de detritos sobre as cadeiras ali existentes e alcatifas de recobrimento do piso, que se iam progressivamente deteriorando e infiltrações de águas pluviais pela “Praça das Esplanadas” exterior, situada no lado Norte do edifício, que causava, por seu turno, infiltrações no corredor da saída de emergência (porta exterior nº 6) do Complexo de Cinemas (cfr. nº 39 dos factos provados).

Em abril-maio de 2016 ainda existia uma infiltração de águas pluviais no corredor da saída de emergência (cfr. nº 41 dos factos provados).

E nem se diga, como o faz o autor/recorrente, que, no caso dos autos, existe um desequilíbrio injustificado e contrário à boa fé entre o cumprimento defeituoso da obrigação do autor de efetuar as ditas obras de reparação e a recusa da ré em pagar as prestações pecuniárias referentes aos meses de julho, agosto e setembro de 2015, na medida em que, não tendo esta  ficado privada do gozo dos estabelecimentos que integram o referido Complexo de Cinemas, havendo apenas constrangimentos na sua utilização, que em nada a impediram de exercer a sua  atividade, sobre a ré impendia a obrigação de pagar a renda, ou quando muito, suspender o respetivo pagamento em medida proporcionada à privação parcial do gozo, tal como decidiu o Acórdão do STJ, de 09.12.2008 ( processo 08A332)[15].

É que diferentemente do caso apreciado e decidido neste último acórdão – em que estava em causa um contrato de arrendamento comercial, sendo a renda a pagar pela locatária devida pela simples cedência do espaço em causa - no caso dos autos, as prestações mensais a pagar pela ré são devidas pela cedência da utilização de um “ espaço em centro comercial ”, capaz de atrair clientela e proporcionar maiores lucros, por se encontrar integrado no referido todo organizado e valorizado por todo um conjunto de serviços logísticos indispensáveis ao funcionamento do centro comercial, tais como garantir a segurança, limpeza e ventilação, manter as inerentes infraestruturas em bom estado de conservação e proceder às reparações.

Ou seja, tal como já se deixou dito, estamos perante um contrato de utilização de espaço em centro comercial, em que a obrigação principal assumida pelo autor, não se esgota na mera cedência do gozo do espaço em si, abrangendo todo este conjunto de serviços.

E demonstrado que ficou que o autor cumpriu defeituosamente esta sua obrigação e desse modo prejudicou a imagem comercial do Complexo de Cinemas, afetando a satisfação do interesse da ré visado com a celebração do contrato em causa, tal como decidiu o Acórdão do STJ, de 03.04.2003 ( processo 03B673)[16], consideramos, à luz das regras da boa fé  contidas no art. 762º, nº 2 do C. Civil e numa perspetiva de equilíbrio contratual e de proporcionalidade,  ser lícito à ré invocar a exceção de não cumprimento do contrato, nos termos do art. 428º, do C. Civil e suspender o pagamento das rendas de julho, agosto e setembro de 2015 enquanto perdurassem as denunciadas infiltrações.

De realçar que a ré procedeu ao pagamento destas rendas em 8 janeiro de 2016, data em que ainda se verificavam infiltrações de águas pluviais pela cobertura do edifício, carecendo, por isso, de fundamento legal a resolução do contrato de utilização de espaço em centro comercial levada a cabo pelo autor, por carta datada de 10 de novembro de 2015, com base na falta de pagamento dessas mesmas rendas (cfr. factos dados como provados nos nºs 39, 40, 48 e 19). 

Mas, a ineficácia desta resolução impõe-se ainda por força do estabelecido nos nºs 5, 6 e 7 na cláusula 20ª do referido contrato, segundo o qual o autor só poderia resolver o contrato com base na falta de pagamento «de qualquer obrigação pecuniária prevista no presente contrato, nos prazos nele estabelecido» depois do mesmo notificar a ré, por carta registada com aviso de receção, para que a mesma «no prazo máximo de 30 (trinta) dias a contar da respectiva recepção, proceda à regularização do seu inadimplemento», sendo certo não resultar da factualidade apurada que o haja feito.


Daí nenhuma censura merecer, neste conspecto, o acórdão recorrido.



*



3.2.2. Mas sustenta o autor/recorrente que mesmo que assim seja, a invocação pela ré da exceção de não cumprimento do contrato integra abuso de direito na modalidade de venire contra factum proprium, tendo em conta que o seu gerente foi também o administrador da sociedade SIMO, anterior locatária, e que a ré invoca vícios e defeitos do imóvel decorrentes do incumprimento da obrigação de garantir a manutenção do imóvel por parte da SIMO e da atitude de desleixo daquele administrador.  


Vejamos.

A proibição do " venire contra factum proprium", ou do comportamento contraditório enquadra-se na figura do abuso de direito prevista no art. 334°, do C. Civil.

Trata-se de uma aplicação do princípio da proteção da confiança, que, na expressão de Baptista Machado[17], tem como ponto de partida «uma anterior conduta de um sujeito jurídico que, objectivamente considerada, é de molde a despertar noutrem a convicção de que ele também, no futuro, se comportará, coerentemente, de determinada maneira» [18].

E, quer a doutrina[19], quer a jurisprudência[20] aceitam serem pressupostos do abuso de direito, na invocada modalidade do venire contra factum proprium:

i) a existência de um comportamento anterior do agente (o factum proprium) que seja susceptível de fundar uma situação objectiva de confiança;

ii) que, quer a conduta anterior (factum proprium), quer a atual (em contradição com aquela) sejam imputáveis ao agente;

iii) que a pessoa atingida com o comportamento contraditório esteja de boa fé, ou seja, que tenha confiado na situação criada pelo ato anterior, ignorando sem culpa a eventual intenção contrária do agente;

iv) que haja um “investimento de confiança”,traduzido no facto de o confiante ter desenvolvido uma atividade com base no factum proprium, de modo tal que a destruição dessa atividade pela conduta posterior, contraditória, do agente (o venire) traduzam uma injustiça clara, evidente;

v) que o referido “investimento de confiança” seja causado por uma confiança subjetiva objetivamente fundada; terá que existir, por conseguinte, causalidade entre, por um lado, a situação objetiva de confiança e a confiança da contraparte, e, por outro, entre esta e a “disposição” ou “investimento” levado a cabo que deu origem ao dano.

E, dentro desta linha de orientação, sublinham a necessidade de todos estes pressupostos serem «globalmente ponderados, em concreto, para se averiguar se existe efectivamente uma “necessidade ético-jurídica” de impedir a conduta contraditória, designadamente, por não se poder evitar ou remover de outra forma o prejuízo do confiante, e por a situação conflituar com as exigências de conduta de uma contraparte leal, correcta e honesta – com os ditames da boa fé em sentido objectivo »[21].

Ora, a verdade é que no caso concreto dos autos, não se verifica nenhum dos pressupostos acima referidos, sendo certo que, ante a factualidade dada como provada, a simples circunstância do gerente da ré ter sido o administrador da SIMO, anterior locadora/proprietária do edifício não assume qualquer relevo, no sentido de impor à ré, à luz dos ditames da boa fé, o dever de abster-se de invocar a exceção de não cumprimento do contrato, nos termos do art. 428º do C. Civil, em ordem a justificar a suspensão do pagamento das prestações pecuniárias devidas como contrapartida da cedência do gozo do Complexo de Cinemas integrado em centro comercial até que fossem eliminadas as infiltrações de água. 


Improcedem, por isso, as razões invocadas pelo autor.


*


3.2.3. Finalmente, no que respeita à compensação dos prejuízos sofridos pela ré, defende a recorrente inexistir fundamento para a sua condenação no pagamento desses prejuízos.


A este propósito, decidiu a sentença proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, confirmada pelo Tribunal da Relação, que, estando provado que «Nos exercícios económicos de 2015 a 2016 o complexo de cinemas da Ré perdeu uma quota de mercado correspondente a uma facturação/receita bruta não obtida e perdida de €24.050,02, correspondente ao valor líquido de receita não realizada e perdida de €14.430,02 » e que «Em consequência das inundações acima descritas, a Ré viu-se forçada a desviar das suas normais atribuições de cinema funcionários seus e a alocá-los a essa tarefa específica de limpeza, o que representou um dispêndio de €1.075,45», «Deste modo, ficou provado que efectivamente a Ré perdeu receita líquida e teve de suportar despesas em consequência das supra apontadas anomalias, no entanto, ao invés da invocada quantia de €47.955,40 que a Ré invocou, apenas se provou que tais danos emergentes e lucros cessantes alcançam a quantia global de €15.505,47 (= €14.430,02 + €1.075,45) que a Ré tem direito de exigir da Autora».

E, com base nesta fundamentação, «condenou o Autor BANCO COMERCIAL PORTUGUÊS, S.A., SOCIEDADE ABERTA, a reconhecer que deve à Ré NEW LINEO CINEMAS DE PORTUGAL, LDA., a quantia de €15.505,47 (quinze mil, quinhentos e cinco euros e quarenta e sete cêntimos), e a reconhecer o direito da Ré ver compensada tal quantia sobre o crédito do Autor acima reconhecido».


Contra este entendimento insurge-se a recorrente, argumentando que, atentos os factos dados como provados e teor da perícia realizada, a receita que a ré perdeu decorre da oscilação de clientela e está em perfeita consonância com oscilação do mercado nacional, sendo, por isso, incorreta a conclusão a que chega o Tribunal a quo de que a Ré sofreu danos pelo “incumprimento” das responsabilidades da Recorrente.


Ora, ainda que não caiba nas funções deste Supremo Tribunal sindicar o juízo valorativo feito pelas instâncias sobre a perícia realizada, a verdade é que não podemos deixar de reconhecer assistir razão à recorrente ao afirmar que a matéria de facto dada como provada no nº 56, só por si, não permite estabelecer o nexo de causalidade adequada entre a perda de receitas da ré no montante de € 14.430,02 e o “incumprimento defeituoso” da obrigação a que a recorrente estava vinculada.

E isto apesar de resultar também dos factos dados como provados nos nºs 15, 16 e 40 ter a ré, por carta datada de 03.11.2015, comunicado ao autor que «as apontadas situações causaram um elevado impacto negativo no funcionamento do Complexo de Cinemas, afetando a respetiva imagem comercial junto dos utentes, com a correspondente redução na afluência daqueles estabelecimentos e consequente decréscimo na quota de mercado de 40% para 30%, como consequência do deficiente estado de conservação do edifício onde o mesmo está instalado» e, através da carta de 21.01.2016, que as referidas anomalias «estavam a causar graves dificuldades à exploração do Complexo de Cinemas, com a consequente produção de danos emergentes e lucros cessantes», pois que impendia sobre a ré o ónus de provar que tais danos resultaram da inobservância, pelo banco autor, do dever de realizar, com a maior brevidade possível as obras de restauro e recuperação em causa. 


Procedem, por isso, parcialmente as razões invocadas pela recorrente, impondo-se a sua absolvição, nesta parte, do pedido reconvencional.


***


IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em julgar parcialmente procedente a revista e, consequentemente, altera-se o acórdão recorrido, na parte respeitante ao pedido reconvencional, condenando-se o Banco Comercial Português, S.A. a pagar à ré New Lineo Cinemas de Portugal, Ldª a quantia de €1.075,45 (mil e setenta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos), confirmando-se, em tudo o mais, o acórdão recorrido.

As custas devidas pela ação e recursos, ficam a cargo da recorrente e da recorrida, na proporção do vencimento.

  


***



Supremo Tribunal de Justiça, 10 de setembro de 2020


Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade da Exmª  Senhora Conselheira  Catarina Serra e do Exmº Senhor Conselheiro Bernardo Domingos, que compõem este Coletivo.

Maria Rosa Oliveira Tching (Relatora)

Catarina Serra

           

José Manuel Bernardo Domingos

_____________

[1] Vide Acórdãos do STJ de 21-10-93 e de 12-1-95, in CJ. STJ, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19, respetivamente.

[2] Neste sentido, Rui Pinto Duarte, in “Tipicidade e Atipicidade dos Contratos”, págs. 167 e 168.

[3] Neste sentido, Ana Isabel Afonso, in “ Contrato de Utilização de Loja em Centro Comercial”, Direito e Justiça, 2005, Vol. II, pág. 50;

[4]  Cfr, entre outros, Acórdãos do STJ, de 20.02.1997 (processo nº 481/96); de 18.03.1997 (processo nº 765/96); de 14.10.1997 (processo nº 546/97); de 27.10.1998 (processo nº 834/98); de 11.04.2002 (processo nº 862/02); de 06.05.2003 (processo nº 995/03); de 10.05.2005 (processo nº 198/05); de 23.01.2007 (processo nº 4201/06); de 17.04.2007 (processo nº 418/07); de 14.06.2007 (processo nº 1754/2007) de 05.07.2007 (processo nº 2107/07); de 13.09.20007 (processo nº 1857/07); 13.12.2007 (processo nº 4157/07); de 04.05.2008 (processo nº 289/2000); de 15.05.2008 (processo nº 646/08); de 17.08.2008 (processo nº 1700/08); de 13.11.2008 (processo nº 3318/08); de 30.06.2009 (processo nº 1398/03); de 27.10.2009 (processo nº 1464/05.1TVLSB.S1); 17.12.2009 (processo nº 6355/05.3TVLSB.S1); de 01.07.2010 (processo nº 4477/05.0TVLSB.L1.S1); 07.07.2010 (processo nº 3345/05); de 27.01.2011 (processo nº 2445/05.0TJVNF.P1.S1); de 14.03.2013 (processo nº 145/09.1TVPRT.L1.S1); de 20.05.2015 (processo nº 6427/09.5TVLSB:l1.S1); de 19.11.2015 (processo nº 884/12.0TVLSB.L1.S1); de 19.05.2016 (processo nº 2277/10.4TVLSB.L1.S1) ), todos acessíveis in ww.dgsi/stj.pt.   

[5] In “Código Civil Anotado”, Vol. I, pág. 406.

[6] In “ Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, pág. 334.

[7] Cfr. Antunes Varela, in “ Das Obrigações em Geral”, Vol. I, Almedina, 6ª ed., págs. 362 a 365 e Calvão da Silva, in “ Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, Coimbra, 1987, pág. 329 e 330.

[8] Ou seja, quando a prestação efetuada não tem requisitos idóneos a fazê-la coincidir com o conteúdo obrigacional tal como este resulta do contrato e do princípio geral da correção e da boa fé, podendo o defeito ser quantitativo ou qualitativo. Cfr. Batista Machado, in, “Obra Dispersa”, Vol. I, pág. 169.

[9] Cfr. Antunes Varela, in “ Das Obrigações em Geral”, Vol. I, Almedina, 6ª ed., pág. 364; Menezes Leitão, in “ Direito das Obrigações”, Vol. II, Almedina, 6ª ed., pág. 264; Menezes Cordeiro, in, anotação ao Acórdão do STJ, de 31.01.80, ROA, ano 41º , nº1, págs. 150 e segs; João Abrantes, in “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português”, Almedina, 1986, pág. 110 e segs e, entre outros, os Acórdãos do STJ, de 27.05.2008 (processo nº 08A1461); de 16.06.2015 (processo nº 3309/08.1TJVNF.G1.S1); de 17.11.2015 (processo nº 2545/12.8TCFUN.L1.S1), todos acessíveis in ww.dgsi/stj.pt. 

[10] In “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português”, Almedina, 1986, pág. 86.

[11] In “A Excepção de Não Cumprimento do Contrato no Direito Civil Português”, Almedina, 1986, págs. 39 e segs.

[12] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Vol. I, pág. 405: Menezes Leitão, in “ Direito das Obrigações”, Vol. II, Almedina, 6ª ed., pág. 263; Calvão da Silva, in “ Cumprimento e Sanção Pecuniária Compulsória”, Coimbra, 1987, pág. 331 e 332; Almeida e Costa, in, “ Direito das Obrigações”, Almedina, 11ª ed., págs. 364 e 365.

[13] RLJ, Ano 105º, pág. 238.

[14] Acessível in ww.dgsi/stj.pt.

[15] Acessível in wwwdgsi/stj.pt

[16] Acessível in wwdgsi/stj.pt

[17] Cfr. o estudo Tutela da confiança e “venire contra factum proprium”, in “Obra Dispersa”, vol. I, pág. 415 e ss.

[18] In “Obra Dispersa”, vol. I, pág. 415 e ss.

[19] Cfr, entre outros, Menezes Cordeiro, in Da Boa Fé no Direito Civil”, 1984, pág. 752 e segs.

[20] Conforme se vê, entre muitos outros, dos Acórdãos do STJ, de 12.11.2013 (processo nº 1464/11.2TBGRD-A.C1.S1) e de 19.11.2015 (processo nº 884/12.0TVLSB.L1.S1), ambos acessíveis in www.dgsi/stj.pt.

[21] Cfr. citados Acórdãos do STJ, de 12.11.2013 (processo nº 1464/11.2TBGRD-A.C1.S1) e de 19.11.2015 (processo nº 884/12.0TVLSB.L1.S1).