Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ANTÓNIO MAGALHÃES | ||
Descritores: | COMPETÊNCIA INTERNACIONAL REGULAMENTO (UE) 1215/2012 PACTO ATRIBUTIVO DE JURISDIÇÃO PEDIDO CAUSA DE PEDIR CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL CONTRATO DE COMPRA E VENDA RESOLUÇÃO DO NEGÓCIO QUALIFICAÇÃO JURÍDICA | ||
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Data do Acordão: | 12/17/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDER EM PARTE A REVISTA | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I - A competência internacional deve ser aferida em função do pedido e da causa de pedir. II - Se os factos jurídicos que constituem a causa de pedir não configuram um contrato de cessão da posição de contratual entre uma sociedade francesa e outra portuguesa, sucessivamente contratantes com a autora, sociedade portuguesa, nem a sociedade portuguesa compradora (que celebrou um contrato de compra e venda verbal com a autora) nem a autora ficam vinculadas ao pacto de atribuição da jurisdição francesa que a autora (sociedade portuguesa), relativamente ao primeiro contrato, tinha convencionado (por escrito) com a sociedade francesa. III - Se a primeira sociedade comercial francesa deve (deveria, se não tivesse havido, entretanto, em relação a ela, desistência), ser demandada no tribunal francês convencionado no pacto atributivo de jurisdição, nos termos do art. 25.º do Regulamento (UE) n.º 1215/2012 já a sociedade portuguesa deve ser demandada pela autora nos tribunais portugueses nos termos do art. 4.º do referido diploma. | ||
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Decisão Texto Integral: | Revista n. º12223/16.6T8PRT.P1.S1
Acordam na 1.ª Secção Cível do Supremo Tribunal de Justiça: * A sociedade M. Sousa Torres - Agro, Lª, com sede em Portugal, intentou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra a) – Portprimland, S.A., também com sede em Portugal; e b) – Primland e c) – Sofruileg, ambas com sede em ……, pedindo: a) – Que sejam declaradas nulas todas as arguidas cláusulas, do contrato de sublicenciamento, celebrado entre a Ré Sofruileg e a Autora; b) – Que todas as Rés sejam condenadas a verem resolvidos os seus contratos celebrados com a autora por incumprimento que lhes é imputável. E c)- Que a Ré Portprimland - e, solidariamente com esta, as restantes Rés – sejam condenadas a pagarem à Autora, indemnização a liquidar em execução de sentença, pela diferença em falta, do preço devido, pela campanha de 2015, acrescida de juros à taxa legal, os vencidos e os vincendos desde a citação. A Autora viria ainda em articulado superveniente, ampliar o pedido de indemnização deduzido, alegando a verificação de novos danos, por factos cometidos pelas ré no Verão de 2018, decorrentes ainda da resolução dos contratos em apreço. Nesse articulado superveniente, a Autora termina por ampliar o pedido indemnizatório inicialmente deduzido, nos seguintes termos: As rés SOFRUILEG, PRIM’LAND e PORTPRIMLAND, S.A. deduziram contestação suscitando como questão prévia a falta de competência internacional do tribunal recorrido. Aproveitando o articulado de réplica que só a reconvenção deduzida pelas rés justificava, a Autora veio responder à exceção invocada sustentando que o objeto da ação seria apenas o contrato celebrado com a Ré Portprimland e respetivo incumprimento, e que nesse contrato não existia pacto atributivo da competência – que teria de obedecer a forma escrita. A exceção assim suscitada viria a ser decidida em sede de audiência prévia por despacho no qual se julgou o tribunal absolutamente incompetente, em razão da competência internacional, sendo em consequência as RR absolvidas da instância. Não conformada com o decidido recorreu a autora, mas os Juízes da Relação acordaram em julgar improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida. Cumpre decidir. Os factos a atender são os que constam das ocorrências processuais relatadas e ainda: 1. O teor da petição da acção, que se reproduz: “ (…) M. Sousa Torres - Agro, Lª, sociedade. com sede na Rua …… – vem propor contra: a) – Portprimland,S A, com, sede na Rua …….; b) – Primland sociedade anónima, com sede social em ……. - c) – Sofruileg, sociedade anónima, com sede social em ……… - - ação declarativa de condenação, com processo comum - com os seguintes fundamentos I De facto 1 A Ré Sofruileg é declarada subconcessionária da licença de exploração exclusiva dos certificados de obtenções vegetais, no território europeu, com vista à reprodução, distribuição, comercialização e venda de plantas (também designadas de enxertos) de kiwi …….., incluindo as variedades B....... e C......., aos produtores agrícolas. Assim como da licença não exclusiva dos mesmos certificados, com vista ao marketing e venda dos frutos provenientes desses enxertos, produzidos pelos sublicenciados produtores, sob a marca D........ (Docs 1 e 1-A) 2 Em 7/1/2013, em ……, a Autora, enquanto produtora, com exploração agrícola situada nessa freguesia, celebrou com a Ré Sofruileg, contrato de tal sublicenciamento - nos termos constantes do documento que se junta, que aqui se dá como reproduzido. (Doc. 1) Tendo a Autora ficado obrigada a vender os frutos a operadores comerciais, sublicenciados pela Sofruileg, no caso, a Primland e depois, a Portprimland. – Assim – 3 a)-Em cumprimento deste contrato com a Sofruileg - em 15/5/2013, em ….., a Autora celebrou, com a Ré Primland, o contrato de fornecimento dos frutos, das variedades B....... e C……., da sua produção - nos precisos termos constantes do documento que se junta, que aqui se dá como reproduzido. (Doc 2) b)- E, em Agosto de 2015, por contrato na forma verbal, a Autora vendeu à 1ª Ré, Portprimland, 15.275 Kg.de fruta kiwi, das mesmas variedades, da campanha de 2015, que entregou e foi por esta recebida, nas instalações que esta disponibilizou, em ……, concelho de ……... 4 Tal venda e entrega foi feita no âmbito da execução continuada do contrato, celebrado com a Ré Primland, referido em 3-a), - de fornecimento exclusivo dessa fruta a produzir pela Autora, por imposição do contrato, com a sociedade Sofruileg, a que a Autora aderiu. (artigo 2, deste articulado) (No artigo 2º do referido contrato-Doc 1) - Com efeito, 5 Na cidade do ……, o senhor EE. comunicou à Autora que os direitos de comercialização da Ré Primland, referidos em 3-a), da fruta dos agricultores portugueses, iriam passar a ser exercidos por uma entidade que viria a ser a Ré Portprimland – à qual foram cedidos pela Ré Primland, autorizada pela Sofruileg. Tal aconteceu em vésperas da colheita de 2015, quando os produtores já não dispunham de tempo para eventual alternativa. 6 Cessão que a Ré Sofruileg voltou a confirmar, por carta de 3/12/2015 - com instrução para que os royaltis, com ela convencionados, fossem entregues à Ré Portprimland, por dedução do preço da fruta, devido por esta Ré. (Doc 3) O mesmo aconteceu com mais de uma dezena de agricultores do Norte do Pais, que com ela tinham contratado. 7 Todas as Rés pertencem ao grupo F......, cooperativa de agricultores ……, como tal impossibilitada de fazer, por si, a exploração dos referidos direitos, que alegadamente detinha, por isso tendo-os cedido à Ré Sofruileg, que constituíra. 8 O Sr. EE. é diretor geral da Sofruileg e da Primland, e administrador da Portprimland, Todas as Rés têm a direção constituída pelas mesmas pessoas físicas. Sendo a Primland a dona da Portprimland. (Doc 4) 9 Tal unicidade de direções e administração era desconhecida da Autora, a quem foi ocultada, à data do contrato com a Ré Sofruileg. 10 A F...... havia constituído também a Ré Primland, cujo fim único é a comercialização dos mesmos frutos, referida em 1, e outros frutos. O que, aliado à ocultada unicidade de direções das Rés, - facilita que tirem proveito da clausula da desoneração da Sofruileg, de todo o incumprimento das obrigações decorrentes da venda dos frutos, pelos agricultores, - que esta Ré incluiu no contrato que apresentou para adesão dos produtores – como alegado em 13. 11 A Ré Sofruileg convenceu a Autora, como a todos os agricultores portugueses, da excelência das referidas variedades, cujas plantas lhe vendeu, cobrando-lhe o preço, integralmente pago. 12 A Ré Sofruileg reservou-se o direito exclusivo de escolha dos exclusivos comercializadores dessa fruta, a vender pelos produtores, a Primland e à sucessora Portprimland, sob a marca D........ (artigo 2-3.2.2, do respetivo contrato – Doc 1). Aos agricultores descontentes, a Ré Sofruileg admite que escolham outro operador comercial, na condição de ser seu sublicenciado – e sempre sob reserva de não ser por ela aceite. (Doc 1 - artigo 2.3.2.6) Cláusulas cuja invalidade se argui. Além disso, 13 No contrato que celebrou com a Autora, a mesma Ré Sofruileg clausulou a sua desoneração de toda a responsabilidade por toda a violação contratual desses seus sublicenciados operadores comerciais. (artigo 2.5, do mesmo contrato - Doc 1). Cláusula cuja invalidade se argui. Assim 14 Os mesmos que, tendo engodado os agricultores com risonhas espectativas. os deixam, depois, indefesos perante eles mesmos que lhes lançaram o isco. E ainda com a obrigação de pagar à Sofruileg, uma taxa anual, com elevado mínimo fixo, de 0,30 €/kg, pela fruta entregue, ainda que a sua mesma administração possa decidir que não lhes seja devidamente paga. (clausula 2.8.2, do contrato – Doc 1). Cláusula cuja invalidade se argui. 15 O contrato de sublicenciamento, que a Sofruileg apresentou à adesão da Autora, - como aos agricultores portugueses com quem contratou - é um longo cortejo de obrigações destes, para com a Sofruileg, sem correspetivo, em direitos destes, por incumprimento dela, alegada licenciada. Desresponsabiliza-se, mesmo, por todos os danos causados à Autora, ainda que não venha a confirmar-se como real detentora dos direitos de exploração da marca. (clausula 2.9 – Doc 1). Cláusulas cuja invalidade se argui. O que é revelador de dolo da Sofruileg, na formação do contrato. 16 Desde os preliminares do referido contrato de fornecimento exclusivo, celebrado com a Ré Primland - ficou estabelecida a paridade de preços a praticar em todo o território da UE, sem qualquer discriminação entre os produtores, Paridade de preços, que teve como corolário o acerto anual das faturas, prevendo-se um sold de prix . previsto na cláusula 8. Porquanto - 17 Como no contrato se explica, o exato preço, ditado pelo mercado, sendo para todos, também só pode ser conhecido, depois da comprada fruta ao produtor. (clausula 8, último parágrafo, do contrato com a Primland – Doc 2) Mais propriamente – depois de concluída a comercialização de toda a fruta. 18 As Rés consideravam a fruta do pomar da autora de ótima qualidade, tal como a dos produtores da zona – e bastante melhor que a dos pomares …….. Pomares portugueses que bem conheciam, porque os visitavam com frequência. 19 Porque eram poucos, os frutos de menor qualidade (classe standard), -repetindo a sua boa experiência de 2014, o senhor EE., comum representante das Rés, entendeu que não se justificava que os frutos fossem manuseados e pesados um a um – com desproporcionado aumento do custódia mão de obra do embalamento, que duplicaria. A delicadeza da pele destes frutos não permitia a calibragem em máquinas. Por isso - 20 Quanto ao preço a pagar nesse ano - em 30 de Junho de 2015, o senhor EE. informou todos que, como no ano antecedente, não iria ser feita diferenciação dos frutos que aparecessem com menos qualidade (fruta standard), E ainda 21 Que o preço iria ser, pelo menos, o mesmo, que foi acordado na campanha de 2014 - de 4,00€/kg. Nestes frutos, é maior a previsibilidade dos preços, em vésperas da colheita – porque a comercialização concluir-se-ia até Novembro. 22 Desde a primeira campanha, a Primland e agora a Portprimland não cumprem o contrato celebrado, de compra e venda da fruta à Autora, assim como aos agricultores portugueses, no que respeita ao acordado preço da fruta. 23 Na primeira campanha, de 2014, como justificação para não pagar a fruta, aos produtores portugueses, ao preço acordado, a Primland usou do estratagema de apresentar, a todos, elevada percentagem de deterioração, após a receção da fruta. Percentagem, que, no caso da Autora foi de 61 %. (Doc 5) O que não é contratualmente possível – porque, com a entrega da fruta, o risco transferiu-se para o comprador. (clausula 7ª) 24 Em 2015, o método foi outro: o da constituição da Portprimland, para atuar em Portugal - facilitando-lhes a discriminação da Autora, como a dos produtores portugueses, e afastarem a acordada paridade de preços, alegada em 16. (Doc 4) 25 Depois de recebida dos produtores, toda a fruta da campanha de 2015, pela Ré Portprimland foi indicado à Autora o preço final a faturar. Verificando a Autora e os outros produtores portugueses que não estava a ser respeitada a acordada paridade. Com efeito, 26 A Ré Portprimland indicou à Autora, para faturação, tal como aos outros produtores, o preço final, a ser-lhe pago, de 2,82€ kg, representando 29,5% abaixo dos 4€ /kg, que, pelo menos, foram pagos aos agricultores ……. (Doc 6) Constituída a Portprimland - toda a fruta recebida pela compradora. foi por ela mandada faturar. Do que protesta juntar documento. 27 Tendo os produtores reclamado, a Ré Portprimland declarou a todos que, sendo ela uma nova sociedade, nada tinha a ver com os contratos celebrados com a Primland. 28 Foi então que se acentuaram os problemas, no relacionamento dos produtores portugueses, com as Rés. 29 Ameaçados de não terem ninguém, que lhes comprasse a fruta, um largo número de agricultores de menores posses, e vultuosos investimentos, viram-se forçados a anuir à vontade dos comuns representantes das Rés - assinando, com a Portprimland, contratos escritos, revogando os que haviam celebrado com a Ré Primland, em que se previa a paridade de preços. (artigo 16, deste articulado) 30 Interpeladas pelos produtores, por causa desta discriminação, as repetidas respostas dadas pelas Rés, têm sido evasivas. Situação a que a Sofruileg se mostra indiferente, invocando a referida clausula de irresponsabilidade. Tendo passado a sugerir outros sublicenciados da mesma Sofruileg – que esta sempre pode condicionar. 31 A Sofruileg condicionou, ao seu acordo, a resolução do contrato, pelo produtor. (Doc 1 – Clausula 2-10-4) 32 No referido contrato, que a Sofruileg submeteu à adesão da autora, como à de todos os produtores, ficou clausulado: - “ …na expiração do contrato, seja qual for o motivo … o produtor obriga-se .. a proceder, a expensas suas, à destruição dos enxertos (Doc 1 – clausula 2.10.5 – antepenúltimo parágrafo). Cláusula cuja invalidade se argui. 33 A Autora comprou os enxertos, à Sofruileg, cujo elevado preço pagou. Tendo ficado clausulada a reserva de propriedade, até ao pagamento do preço. (clausula 1-4 - Doc 1). II Resolução dos contratos 34 Por reiterado incumprimento dos contratos, (artigos 12 e seguintes) - a Autora declarou às Rés Portprimland e a Primland, que considera resolvidos os contratos com as referidas Rés. E à Ré Sofruileg, o contrato de sublicenciamento, com ela celebrado. (Doc 7) 35 A Autora só poderá enviar, à Ré Portprimland, a fatura da diferença devida, depois de cumprida, pelas Rés, operadoras comerciais, a obrigação de fornecer aos produtores, os elementos detidos por ambas - que, solicitados, não lhes têm sido enviados. III De jure 36 Da transferência do direito de propriedade 36.1 O regime da posse, propriedade e demais direitos reais sobre coisa determinada é definido pela lei do Estado em cujo território as coisas se encontrem situadas. (artigo 46º nº 1 do CC português.) 36.2 A constituição ou transferência dos direitos reais dá-se por mero efeito do contrato. (artigo 408º nº 1 do CC.) Pago o preço pela Autora, caducou a clausulada reserva de propriedade. 36.3 Ofendendo o direito de propriedade da Autora - a clausula referida em 32 viola lei imperativa e é nula. (artigos 1305º e 294º do CC). Nulidade que se argui. 37 Da liberdade contratual 37.1 Tendo imposto, à Autora, as Rés, Primland e Portprimland, como suas sublicenciadas para a comercialização e venda da fruta a produzir- a Ré Sofruileg 37.2 E, tendo ainda imposto, aos produtores, a constituenda Portprimland, quando nem tempo mínimo suficiente, lhes restava para negociação de alguma eventual alternativa, - e ainda sujeita a recusa da Ré Sofruileg – foram violadas as normas comunitárias e de direito ….. e português, que garantem a livre concorrência. 37.3 É violado o princípio da liberdade contratual, na escolha do outro contraente,1 ou seja, um comprador que melhor preço possa oferecer ao produtor, na venda da fruta. (artigo 405º nº 1 do CC português.) Argui-se a nulidade das clausulas em 38 Da boa fé 38.1 Agravando a sua clausulada desresponsabilização - a Ré Sofruileg agiu com dolo essencial. ocultando à Autora, no momento do contrato desta com a Sofruileg, que eram os mesmos os administradores de todas as Rés. E a Portprimland ainda nem existia. Razão porque é nula a clausulado artigo 2.5do contrato com a Sofruileg. (artigos 253º e 254º do CC português, e 1109º, 1110º e 1134º do CC …..) 38.2 Tudo isto é revelador de dolo da Sofruileg, na formação do contrato. E contraria o princípio da boa fé contratual, comum às leis …. e portuguesa, constituindo fundamento de nulidade daquela clausula – que se argui. (artigos 227º nº 1, 253º e 254º do CC português, e 1134º do CC ……..) 39 Do violado sinalagma 39.1 Foi clausulada a absoluta desresponsabilização da Sofruileg, por todos os danos que lhe sejam imputáveis, resultantes de incumprimento de obrigações desta - que são a própria causa e sinalagma das assumidas pela Autora. 1 - Pires de Lima e Antunes Varela – in Código Civil anotado, nota 2 ao artigo 405º nº 1 do CC português E mesmo os danos resultantes da sua não confirmação como a real detentora dos direitos de exploração da marca D....... Ora 39.2 Tal desresponsabilização constitui ilícita violação do sinalagma, essencial no objeto dos contratos bilaterais. (artigo 1102º do CC …...) Na lei portuguesa, tal violação do essencial sinalagma, torna o objeto do negócio contrário à lei, ferindo-o de nulidade. (artigo 280º nº 1 do CC) E é violado também o artigo 18º c) do Decreto-Lei nº 446/85, de 25/10. Razão porque fica sem justificação a cláusula do artigo 2.8.2 do contrato da Sofruileg, prevendo perpetuados Royaltis até que ela aceite pôr fim ao contrato (Clausula 2-10-4 Doc1) – o que a vicia de nulidade, que se argui. 39.3 A Ré Sofruileg é solidariamente responsável pelo cumprimento da obrigação do pagamento do preço da venda da fruta. – vista a nulidade das cláusulas arguida em 37 a 39, deste articulado. 40 Do direito de resolução 40.1 O incumprimento é fundamento de resolução dos contratos e correspondente indemnização. (artigos 1146º e 1147º do CC …… e 801º nº 2 do CC português). 40.2 Condicionado a acordo da Ré Sofruileg, o direito de resolução do contrato, pelo produtor (clausula referida em 31) – tal direito fica limitado, violando-se a alª f) do mesmo artigo 18º, do citado Decreto-Lei nº 446/85, de 25/10. Nulidade que se argui. 41 Cessão da posição contratual Cedida a posição contratual da Primland, à Portprimaland, esta ficou obrigada para com a Autora, nos mesmos termos do contrato celebrado com aquela. (artigos 424º e 427º do CC português.) 42 Normas violadas Os contratos, em referência, violam os preceitos citados – e os demais do douto suprimento de V. Exª (artigo 5ª do CPC) IV Competência do Tribunal O Tribunal tem competência territorial. (artigos 71º nº 1 e 80º nº 1 do CPC) E é internacionalmente competente. (artigo 62º do CPC). DEVE a ação ser julgada procedente. a) - E - declaradas nulas todas as arguidas clausulas, do contrato de sublicenciamento, da Ré Sofruileg, com a Autora (Doc 1) - as Rés condenadas: b) - Todas as Rés, a verem resolvidos os seus contratos, por incumprimento que lhes é imputável – entre eles, o de sublicenciamento, celebrado com a Ré Sofruileg. E c)- A Ré Portprimland - e, solidariamente com esta, as restantes Rés – condenadas a pagarem à Autora, indemnização a liquidar em execução de sentença, pela diferença em falta, do preço devido, pela campanha de 2015, acrescida de juros à taxa legal, os vencidos e os vincendos desde a citação. REQUER que as Rés sejam citadas, nas suas sedes, em pessoa que nelas as represente, por carta registada com aviso de receção, com a cominação de, na falta de contestação, ou impugnação especificada, serem os fatos havidos como provados. Prova: (…) “ 2. No contrato celebrado entre a Autora e a Ré Sofruileg, no artigo 2-20 sob a epígrafe-Atribuição da Jurisdição- ficou acordado, expressamente e por escrito, que “em caso de litígio e após frustrada a tentativa de encontrar uma solução amigável, todas as disputas que o presente Contrato e seus anexos possam desencadear, especialmente quanto à sua validade, sua interpretação, execução ou cessação, serão submetidas ao Tribunal de Grande Instância de …… (…….).” 3. Por seu turno, no contrato celebrado entre a Autora e a Ré Primland, no artigo 17 sob a epígrafe-Atribuição da Jurisdição- ficou acordado, expressamente e por escrito, que “em caso de litígio e após tentativa frustrada de encontrar uma solução amigável, todos os litígios que sejam consequência deste contrato ou dos seus anexos serão submetidos ao Tribunal de Comércio de …… (…….).” Perante a análise dos contratos celebrados entre a autora e Ré Primland (sociedade ……) e entre ela e a Ré Sofruileg (sociedade ……) notou, justamente, a 1ª instância que ficou expressamente acordado um pacto atributivo de competência em ambos os casos, a tribunais ……, nos termos do art. 25 do Regulamento (CE) n.º 1215/2012. E embora tenha constatado a inexistência de contrato escrito entre a autora e a Portprimland, concluiu que, tendo a autora alegado a cessão da posição contratual da Ré Primland à Ré Portprimland autorizada pela Ré Sofruileg (art. 5, 6, e 41) e tendo sido com base nessa cessão que pediu a condenação solidária da Ré Portprimland, já que com esta Ré nenhum contrato havia celebrado, alegando expressamente que “cedida a posição contratual da Primland à Portprimland esta ficou obrigada para com a Autora, nos mesmos termos do contrato celebrado com aquela (arts. 424º e 427º do CC português)” a cláusula atributiva de jurisdição entre a autora e a ré Primland também vinculava a autora relativamente à Portprimland Tribunal de Comércio de … em ……..). E assim terminou, na sentença, por considerar o tribunal português absolutamente incompetente em razão da competência internacional absolvendo-se as rés da instância. Recorreu a autora a Relação que elegeu como questões decidendas as seguintes:” I - Saber se presente ação tem como causa de pedir apenas o incumprimento do contrato celebrado com a Ré Portprimland do qual não consta qualquer convenção atributiva de jurisdição, em consequência do que não teria aplicação o disposto no artigo 25.º, n.º 1, do Regulamento nº 1215/2012, e o tribunal seria internacionalmente competente; II – inconstitucionalidade do art.º 25.º do Regulamento (CE) n.º 1215/2012 por ofensa dos artigos 13º e 20.º nºs 1, 4 e 5 da CRP.” Entendeu, porém, a Relação que o tribunal, ao pronunciar-se sobre a verificação dos pressupostos processuais não tem de exercer qualquer análise crítica da qualificação jurídica feita pela autora. Analisados os pedidos e as causas de pedir, concluiu também que não era verdade que só o contrato o contrato de compra e venda dos frutos, celebrado com a Ré Portprimland – fosse o visado pelo pedido de resolução (CLS 6ª), nem que o único contrato abrangido na pedida resolução fosse o celebrado com a Portprimland (CLS 7ª), ou que não tivesse sido pedida a extinção dos contratos celebrados com as Rés Sofruileg e Primland (13ª) ou ainda que em relação a estas Rés Sofruileg e Primland, a comunicação haja sido a da exceptio non aedimpleti contractus (CLS 8ª). Enunciou, ainda, os fundamentos ou causa de pedir que suportam os pedidos deduzidos, tal como eles são alegados pela autora, os seguintes: a invalidade das cláusulas do contrato celebrado com a Ré Sofruileg pela quais esta se reservou o direito exclusivo de escolha dos exclusivos comercializadores da fruta a produzir pela Autora, sujeitando a escolha de outro operador comercial, à condição de ser seu sublicenciado, e sempre sob reserva de ser por ela aceite; a invalidade da cláusula pela qual a Ré Sofruileg se desonera de toda a responsabilidade por qualquer violação contratual desses seus sublicenciados operadores comerciais; a invalidade da cláusula pela qual a ré Sofruileg, impõe o pagamento de uma taxa anual, com elevado mínimo fixo, de 0,30 €/kg, pela fruta entregue, ainda que a sua mesma administração possa decidir que não lhes seja devidamente paga; a invalidade da cláusula do contrato celebrado com a Ré Sofruileg nos termos da qual “ …na expiração do contrato, seja qual for o motivo … o produtor se obriga a proceder, a expensas suas, à destruição dos enxertos; dolo na formação do contrato por parte da Sofruileg, por ter ocultada à autora, aquando da celebração do contrato, que todas as Rés tinham a direção constituída pelas mesmas pessoas físicas, e que a Primland era, à data do contrato com a Ré Sofruileg, a dona da Portprimland; o incumprimento pelas rés Primland e agora a Portprimland do contrato celebrado por aquela com a autora no que respeita ao acordado preço da fruta, em violação do princípio da paridade de preços que decorria da cláusula 8 do referido contrato; considerou que, e de acordo com o que é alegado pela autora na sua petição inicial, o contrato de venda verbal celebrado com a ré Portprimland mais não é do que execução continuada do contrato, celebrado com a Ré Primland, uma vez que os direitos de comercialização desta Ré Primland, decorrentes do contrato celebrado entre ela e a Autora, haviam sido cedidos à Ré Portprimland com a aquiescência da ré Sofruileg, sendo que a venda feita à Ré Portprimland não é assim configurada como um contrato autónomo, mas como execução continuada do contrato celebrado com a ré Primland, cuja posição contratual esta havia cedido à Ré Portprimland; e que o litígio que emerge do alegado nos autos tem a sua origem na relação contratual estabelecida entre a autora e as rés a partir da celebração de dois contratos – o celebrado com a ré Sofruileg e o celebrado com a Ré Primland. E assim a Relação concluiu pela competência convencional relativamente a todos os contratos; e pela constitucionalidade do art. 25º doo Regulamento (CE) n.º 1215/20., com o entendimento nela expresso de que existindo no contrato, objeto do litígio, um pacto atributivo de competência, por força do referido art.º 25.º, não se cuidará de aferir do lugar onde foi ou deva ser cumprida a obrigação em questão, devendo antes respeitar-se a competência exclusiva atribuída ao tribunal do Estado-Membro mencionado nesse pacto. É certo que a autora alegou no art. 5 da petição: “Na cidade do …, o senhor EE. comunicou à Autora que os direitos de comercialização da Ré Primland, referidos em 3-a), da fruta dos agricultores portugueses, iriam passar a ser exercidos por uma entidade que viria a ser a Ré Portprimland – à qual foram cedidos pela Ré Primland, autorizada pela Sofruileg. Tal aconteceu em vésperas da colheita de 2015, quando os produtores já não dispunham de tempo para eventual alternativa.”; e que alegou no art. 6: “cessão que a Ré Sofruileg voltou a confirmar, por carta de 3/12/2015 - com instrução para que os royalties, com ela convencionados, fossem entregues à Ré Portprimland, por dedução do preço da fruta, devido por esta Ré. (Doc 3).O mesmo aconteceu com mais de uma dezena de agricultores do Norte do Pais, que com ela tinham contratado.” Porém, se bem se repara, não existem (não foram alegados) os factos jurídicos necessários que permitam configurar a existência de um contrato de cessão da posição contratual celebrado entre a Primland e a Portprimland (apesar de a autora assim o configurar de direito no art. 41 da petição). O que se verifica nos autos apenas é que a primeira sociedade constituiu a segunda para os mesmos objectivos de operadora comercial sublicenciada pela ré Sofruileg. Do alegado e dos documentos não resulta, assim, que tenha havido qualquer cessão da posição contratual escrita da Primland para a Portprimland nos termos dos art. 424º a 427º do Código Civil (com o consentimento da autora), relativamente ao contrato verbal referido no art. 3º, al. b), da petição, celebrado em Agosto de 2015 (directamente com a Portprimland). Donde, não havendo pacto atributivo de jurisdição aos tribunais ….. no contrato, aliás, verbal, celebrado entre a autora e a Portprimland, verifica-se que o tribunal português é internacionalmente competente, para conhecer dos litígios emergentes desse contrato nos termos do art. 4 do Regulamento (CE) n.º 1215/2012, de acordo com o qual a acção deve ser proposta nos tribunais do País onde se encontra domiciliada a pessoa demandada, a não ser que, segundo o art. 5º, outras regras especiais ou exclusivas resultem do mesmo diploma (especialmente as constantes do artigo 7.º) Fica prejudicada a apreciação da inconstitucionalidade do art. 5º nº 3 do CPC, que não foi neste acórdão interpretado no sentido de que não compete ao tribunal fazer a qualificação jurídica dos factos, que constituem a alegada causa de pedir, no julgamento do pressuposto processual da competência absoluta do tribunal, *
Lisboa, 17 de Dezembro de 2020 O relator António Magalhães (Nos termos do art. 15º-A do DL nº 10-A/2020 de 13.3., atesto o voto de conformidade dos Srs. Juízes Conselheiros Adjuntos Dr. Jorge Dias e Dr.ª Maria Clara Sottomayor, que não puderam assinar). |