Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5.ª SECÇÃO | ||
Relator: | AGOSTINHO TORRES | ||
Descritores: | RECURSO PER SALTUM ROUBO AGRAVADO FURTO QUALIFICADO MEDIDA CONCRETA DA PENA PENA PARCELAR PENA ÚNICA IMPROCEDÊNCIA | ||
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Data do Acordão: | 09/26/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário : |
I. Tendo sido o arguido condenado nos autos pela prática de um crime de roubo qualificado, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 14), na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 15), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses. E, em cúmulo jurídico, na pena única de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de prisão. E, II. Tendo o arguido sofrido já várias condenações por crimes homólogos (roubos e furtos qualificados) só a reclusão lhe parece ter colocado um limite, ao vir a ser condenado entretanto em pena de prisão de 4 anos e dois meses, que cumpre entretanto, por crime de roubo tentado e posse de arma proibida cometido já posteriormente aos factos a que os presentes autos respeitam. III. Tomando em consideração o comportamento anómico do arguido, sendo em parte recidivante como evidenciam algumas das condenações sofridas, estando fundamentalmente na origem a sua adição ao consumo de estupefacientes, para cuja resolução já teve oportunidade de conseguimento, porém sem eficácia, a formação das penas parcelares fixadas bem perto dos mínimos legais é inalterável com maior redução, mesmo em resultado da ponderação da sua condição pessoal e comportamento confessórios. Uma diminuição dos limites seria inadmissível e sem justificação, pois tal constituiria uma passar de esponja desculpabilizante do seu comportamento e um sinal negativo de brandura, quer para si, para futuro, quer para a comunidade. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam em Conferência na 5ª Secção criminal do Supremo Tribunal de Justiça I-RELATÓRIO 1.1. Nos presentes autos, por acórdão de 21 de Março de 2024, do Tribunal colectivo do Juízo Central Criminal de ... - ... 5 o arguido AA, foi condenado pela prática, em autoria material e concurso efectivo: [(…) 1. Pela prática de um crime de roubo qualificado, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão. 2. Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 14), na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão; 3. Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 15), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses. 4. Em cúmulo jurídico, condenar o arguido na pena única de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de prisão. 5. Aplicar ao arguido AA o perdão de 1 (um) ano de prisão, sob as condições resolutivas previstas no artigo 8.º, n.ºs 1 a 3 da Lei n.º 38-A/2023, de 02-08. 6. (…) 7. Declarar perdido a favor do Estado o valor de € 901,00 (novecentos e um euros), condenando-se o arguido no pagamento da referida quantia, bem como todos os objetos apreendidos à ordem dos autos pertencentes ao arguido e que tenham servido para a prática do crime.] 1.2. Inconformado com o aludido acórdão, veio o arguido interpor recurso, directamente para este Supremo Tribunal de Justiça, insurgindo-se contra a medida concreta de cada uma das penas de prisão que, no seu entender, deveriam ser diminuídas e, consequentemente, a respectiva pena única. Formulou as seguintes conclusões da motivação de recurso: [(,,,) 1. O Recorrente entende verificar-se uma incorreta valoração da prova constante nos presentes autos e produzida em julgamento, a qual impunha, na sua modesta opinião, uma decisão diversa da recorrida. 2. Não se pode aceitar que as exigências de prevenção e a perigosidade eventualmente atribuídas ao Recorrente demandem sanções tão severas, 3. Afigurando-se o quantum das penas de prisão aplicadas em concreto, desajustadas e desproporcionais. 4. Na verdade, em momento algum ficou demonstrado nos autos que o Recorrente tem uma personalidade contrária à lei que justifique a aplicação de uma sanção tão severa. 5. Não se revelando, pois então, especialmente acentuadas as necessidades de prevenção especial. 6. Circunstâncias referidas que, conforme considerado anteriormente, não foram tomadas em consideração na decisão proferida pelos Meritíssimos Juízes. 7. O Tribunal a quo, na determinação da medida concreta da pena, não atendeu devidamente aos factos infra mencionados: a) A confissão integral e sem reservas dos factos constante da acusação por parte do arguido, assim como o arrependimento verbalizado por este. b) As condições económicas e sociais do arguido. c) O facto de o arguido integrar programa terapêutico dinamizado pelo ..., em contexto prisional, bem como ter demonstrado adequadas capacidades de análise crítica quanto ao seu percurso de vida. d) O arguido ser capaz de identificar a ilicitude, gravidade e impacto da conduta criminal passada. e) O presente processo estar inserido no período temporal de desorganização pessoal, precipitada pela recaída no consumo de produtos estupefacientes, inatividade laboral e maior fragilidade dos laços familiares. f) O arguido ser capaz de reconhecer a importância da abstinência do consumo de produtos estupefacientes como fator fundamental para o seu processo de mudança. g) O arguido ter demonstrado adesão aos planos de reinserção social que contêm ações direcionadas para a manutenção do tratamento à problemática aditiva a estupefacientes, manutenção de hábitos de trabalho e promoção de maior autocrítica quanto à ilicitude e gravidade do comportamento criminal passado. h) O arguido ter manifestado a intenção de pedir desculpa às ofendidas, o que fez em audiência de modo sincero. i) O comportamento correto do arguido em audiência, tendo manifestado essa vontade e concretizado pedidos de desculpa à assistente BB e à ofendida CC. j) O facto de o arguido, no EP em que se encontra recluído, ter assumido uma conduta adequada às regras e funcionamento, sem procedimentos disciplinares. l) Beneficiar de apoio por parte da progenitora (46 anos de idade) e dos irmãos, que o visitam e manifestam disponibilidade para futuro acolhimento e suporte. m) O arguido encontra-se a estudar no Estabelecimento Prisional, a fim de concluir o 12.º ano de escolaridade, e também a trabalhar, integrando a oficina de etiquetas. 8. O Tribunal a quo, no que tange à determinação da medida concreta da pena, ao não ter atendido e sopesado devidamente os factos enunciados no parágrafo anterior, desrespeitou os princípios gerais respetivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos fatores de medida da pena. 9. Outrossim, sendo o Recorrente uma pessoa que se libertou do vício do consumo de drogas, a aplicação de uma pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução, é já por si só suficientemente dissuasiva de qualquer reiteração. 10. A sanção satisfará largamente, de acordo com o estatuído pelo artigo 69.º, n.º 1, alínea a), do Código Penal, 11. Sendo, desta forma, atendidos e considerados a personalidade do recorrente, as consequências do seu ato, o grau de ilicitude e de culpa e a sua situação económica. 12. Entende, por isso, terem sido violadas, pela douta decisão de que ora se recorre, as normas previstas nos artigos 40.º, 71.º n.º 1 e 2, 77, n.º 1, 50.º n.º 1, 210.º, n.º 2, alínea b), ex vi do artigo 204.º, n.º 2, alínea f), 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, artigos 124.º e 127.º do Código de Processo Penal e artigos 18.º n.º 2 e 27.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. Se as normas violadas fossem corretamente interpretadas, a medida da pena seria uma pena concreta de 1 (um) ano e 3 (três) meses de prisão relativamente ao crime de roubo qualificado, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.º 2, alínea b), ex vi do artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal; e uma pena concreta de 1 (um) ano de prisão (facto 14) e 1 (um) ano e 1 (um) mês de prisão (facto 15), no que concerne à pratica de 2 crimes de furto qualificado, previsto e punido pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e) do Código Penal, das seguintes penas concretas. Deve o douto acórdão recorrido ser revogado e substituído por outra decisão que, fazendo bom uso e correta interpretação da prova obtida, da lei e dos princípios jurídicos, condene nas aludidas penas. E em sede de cúmulo jurídico das penas de prisão aplicadas ao arguido, aplicar ao mesmo uma pena única de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de prisão, suspensa na sua execução. 1.3. Respondeu ao recurso o MPº- dizendo em síntese: “(…) no caso vertente o arguido foi condenado por 3 ilícitos criminais, sendo que um deles atingiu igualmente bens jurídicos eminentemente pessoais, e o contexto em que os mesmos ocorreram era diverso. E, não obstante, o hiato temporal ser limitado, o certo é que integrado com o respectivo certificado criminal, estaremos perante uma tendência criminosa, e tal foi ponderado na pena única, assim como os demais factores anteriormente considerados nas penas parcelares. E ante o exposto, quer as penas parcelares, quer a pena única aplicada ao arguido pelo Tribunal a quo de 5 anos e 3 meses de prisão parecem-nos correctas e ajustadas ao vertente caso concreto, e por isso merecem a nossa total concordância. Nestes termos, e nos mais de direito que vossas Excelências doutamente suprirão, deve o douto acórdão recorrido ser mantido na íntegra” 1.4 -A Factualidade relevante constante da Decisão recorrida foi a seguinte: [(…) “Com interesse para a boa decisão da causa, resultaram provados os seguintes factos: Da acusação: 1. No dia ... de ... de 2021, cerca das 16 horas, o arguido AA dirigiu-se ao estabelecimento comercial denominado “...” (sociedade ...”), situado na ..., com o intuito de, mediante o uso de violência e de arma branca, apropriar-se de quantias monetárias e bens que ali se encontrassem. 2. Assim, ali chegado, o arguido pediu à ofendida BB, funcionária da pastelaria, que lhe servisse um café, pedido este que a mesma satisfez, e que o mesmo consumiu ao balcão retirando, para o efeito, a máscara cirúrgica que usava no rosto. 3. De seguida, enquanto a ofendida varria o chão no espaço interior do balcão, o arguido voltou a colocar a máscara cirúrgica, deslocou-se para junto da mesma, empunhou um canivete com a mão direita e agarrou o braço direito da ofendida, empurrando-a até ao local onde se encontrava a caixa registadora, ao mesmo tempo que lhe dizia “abre o caixa, abre o caixa”. 4. Acto contínuo, o arguido colocou o seu braço em redor do tronco da ofendida, apertando-a e continuando a conduzi-la na direcção da caixa registradora. 5. Nesse momento, ordenou-lhe que abrisse a referida caixa, ao que a ofendida acedeu, tendo o arguido dali retirado a quantia de 200 € (duzentos euros), em numerário, e colocado tal quantia na bolsa que trazia a tiracolo. 6. Nesse local, junto ao balcão, o arguido apropriou-se, ainda, de um telemóvel de marca “...”, de valor estimado em 150 € (cento e cinquenta euros), propriedade do estabelecimento comercial. 7. Após, o arguido, mantendo a ofendida imobilizada entre o seu corpo e o balcão, retirou de uma estante diversos bilhetes da Lotaria Instantânea (“raspadinhas”), no valor total de 200 € (duzentos euros), ao mesmo tempo que dizia “E as raspadinhas? Só tens estas raspadinhas?”, “tens mais dinheiro guardado”. 8. E, de imediato, o arguido ordenou à ofendida que abrisse um saco de papel, onde colocou as referidas “raspadinhas”, e levou a mesma para outra divisão da pastelaria, perguntando-lhe “onde é que tens a tua carteira?”. 9. Receosa pela sua vida e integridade física, a ofendida pegou na quantia que tinha na carteira – 10 € (dez euros) e entregou-a ao arguido, o qual ainda se apropriou de um telemóvel de marca “Samsung”, modelo Galaxy A31, de cor cinza, no valor de 249,99 € (duzentos e quarenta e nove euros e noventa e nove cêntimos), pertencente à mesma. 10. Já na posse das quantias monetárias, das “raspadinhas” e dos telemóveis, o arguido encostou a ofendida à porta daquela divisão da pastelaria e disse-lhe “não digas a ninguém que eu estive aqui”, “eu sei os teus passos e vou atrás de ti”, “contas até 50 e depois é que sais, ouviste”. 11. Ao proceder conforme descrito, o arguido apoderou-se e fez suas as referidas quantias monetárias, as “raspadinhas” e os telemóveis, integrando-os na sua esfera patrimonial, em prejuízo dos seus legítimos proprietários e em seu único e exclusivo proveito. 12. O arguido quis constranger a ofendida para que esta lhe entregasse o dinheiro, as “raspadinhas” e os telemóveis, usando para o efeito de um canivete e da sua força física, intimidando-a e coarctando à mesma qualquer possibilidade de resistir, o que logrou. 13. O arguido sabia que não podia retirar as quantias monetárias e os bens pertencentes à ofendida e ao estabelecimento comercial, sem a sua autorização e contra a sua vontade, usando de uma arma branca e de força física para o efeito, mas, não obstante tal cognição, agiu do modo acima descrito, bem sabendo que fazia suas as quantias e os bens acima descritos, os quais não lhes pertenciam e que os integrava no seu património, por actos contrários à vontade dos respectivos donos e em prejuízo destes. * INQUÉRITO Nº 374/21.0... PABCL (APENSO A) / INQUÉRITO Nº 375/21.8... PABCL (APENSO B): 14. Entre as 12h30m e as 14h30m, do dia ... de ... de 2021, o arguido AA dirigiu-se à loja nº 11, do ..., situada na ... António Barroso, em ..., explorada por CC, partiu o vidro da montra, entrando por esse meio para o seu interior, de onde retirou e levou consigo a quantia de 125 € (cento e vinte e cinco euros), em numerário. 15. De seguida, o arguido dirigiu-se para o salão de estética denominado “DD” (loja J), situado no mesmo centro comercial e explorado por DD, partiu o vidro da porta, entrando por esse meio para o seu interior, de onde retirou e levou consigo a quantia de 226 € (duzentos e vinte e seis euros), em numerário. 16. Agiu assim o arguido com a intenção concretizada de se apropriar de quantias monetárias que sabia não lhe pertencerem, bem como sabia que, para o conseguir, entrava no interior de estabelecimentos comerciais, através de arrombamento, contra a vontade dos seus proprietários/arrendatários e causando-lhes prejuízo, o que quis e logrou. 17. Em todas as situações supra descritas, o arguido agiu livre e deliberadamente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei penal. 18. O arguido confessou integralmente os factos e verbalizou arrependimento. Condenações anteriores do arguido: 19. O arguido regista averbadas no seu certificado de registo criminal as seguintes condenações: i. No processo sumário n.º 1196/18.0..., do ... – ... 1, por sentença de ........2018, transitada em julgado a ........2019, foi o arguido condenado pela prática, em ........2018, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 60 dias de multa, à taxa diária de €6,00, declarada extinta pelo cumprimento, por decisão de ........2019. ii. No processo abreviado n.º 279/21.4..., do ... – ... 2, por sentença de ........2021, transitada em julgado a ........2021, foi o arguido condenado pela prática, em ........2021, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 180 dias de multa, à taxa diária de €7,00, entretanto declarada extinta pelo cumprimento de 51 dias de prisão subsidiária. iii. No processo comum coletivo n.º 354/21.5..., do Juízo Central Criminal de ... – ... 3, por acórdão de ........2022, transitado em julgado a ........2023, foi o arguido condenado pela prática, em ........2021, ........2021, ........2021, ........2021 e ........2021, 01...., de três crimes de roubo, na forma tentada, ps. e ps. pelos artigos 210.º, n.º1, 22.º, 23.º e 14.º, do Código Penal, cinco crimes de roubo, na forma consumada, ps. e ps. pelos artigos 210.º, n.º1 e 14.º, do Código Penal, um crime de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º1, 204.º, n.º2, alínea e), 202.º, alínea d) e 14.º, do Código Penal, e um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º1, 204.º, n.º1, alínea f), 22.º, 23.º e 14.º, do Código Penal, na pena única de 5 anos de prisão, suspensa na sua execução por igual período, sujeita a regime de prova e à realização pelo arguido de tratamento médico à patologia aditiva de que padeça, nomeadamente na área da toxicodependência. iv. No processo abreviado n.º 775/21.3..., do ... – ... 1, por sentença de ........2022, transitada em julgado a ........2022, foi o arguido condenado pela prática, em ........2021, de um crime de condução sem habilitação legal, p. e p. pelo artigo 3.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 2/98, de 03.01, na pena de 6 meses de prisão, substituída por 180 dias de multa, à taxa diária de € 6,00. A referida pena de multa foi entretanto revogada e declarada perdoada atendendo à idade do arguido. v. No processo comum singular n.º 347/22.5..., do Juízo Local Criminal do Porto – ... 8, por sentença de ........2023, transitada em julgado a ........2023, foi o arguido condenado pela prática, em ........2022, de um crime de tráfico de menor gravidade, p. e p. pelo artigo 25.º do Decreto-lei n.º 15/93, de 22.01, na pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período e sujeita a regime de prova. vi. No processo comum coletivo n.º 3677/22.2..., do Juízo Central Criminal de ... – ... 4, por acórdão de ........2023, transitado em julgado a ........2023, foi o arguido condenado pela prática, em ........2022, de um crime de roubo, na forma tentada, e um crime de detenção de arma proibida, na pena única de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão efetiva e ainda na pena acessória de interdição de detenção, uso e porte de armas, pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses. * Condições económicas e sociais do arguido: 20. À data dos factos, AA residia, temporariamente, com o progenitor, em .... 21. A dinâmica relacional com este era negativamente influenciada pelos hábitos de ingestão de bebidas alcoólicas por parte do pai, pelo que este não funcionava como figura de suporte consistente. AA mantinha contactos com a progenitora e tinha uma relação de namoro, mas cujo apoio parecia declinar. 22. A relação entre os progenitores do arguido terminou há cerca de quinze anos, resultado de uma dinâmica familiar disfuncional e conflituosa. Desde a separação que o arguido permaneceu com a progenitora e os quatro irmãos, à exceção do período dos factos. 23. Em ..., AA foi preso preventivamente, situação que manteve até ..., quando foi condenado numa pena de prisão, suspensa na sua execução, com regime de prova. 24. Restituído à liberdade, o arguido regressou ao agregado materno, onde também viviam os irmãos. 25. Residiam em apartamento arrendado, em ..., numa dinâmica familiar descrita como afetiva e solidária. Manteve este enquadramento familiar e habitacional até ... do mesmo ano, quando foi novamente privado da liberdade. Atualmente, AA cumpre pena de prisão no ..., em regime comum e sem benefício de medidas de flexibilização do cumprimento da pena. 26. Assume uma conduta adequada às regras e funcionamento, sem procedimentos disciplinares. 27. Beneficia de apoio por parte da progenitora (46 anos de idade) e dos irmãos, que o visitam e manifestam disponibilidade para futuro acolhimento e suporte. 28. Em termos profissionais, salienta-se que, à data dos factos, AA encontrava-se inativo, depois de experiências laborais como operário da construção civil (aplicador de gesso cartonado) e operário em empresa têxtil, de forma menos regular, desde .... Entre as duas privações de liberdade, em ..., AA trabalhou apenas durante um mês numa tinturaria, numa situação informal. 29. Em contexto prisional, o arguido mostra motivação para o desempenho de ocupação laboral, integrando a oficina de etiquetas. Desde que entrou no ... que iniciou a frequência de curso de educação e formação com vista à obtenção de equivalência do 12º ano. 30. AA habilitou-se com o 9º ano de escolaridade, em curso profissional que frequentou durante uma medida de promoção e proteção de acolhimento residencial no ..., em ..., conjuntamente com um dos irmãos. Iniciou atividade laboral na juventude, de forma informal, na empresa de limpezas onde a mãe trabalhava. Aos vinte anos de idade, iniciou atividade como operário de construção civil e trabalhou, de forma regular, na execução de obras em ... e ..., atividade cujo ritmo abrandou, aquando da pandemia por COVID-19. 31. Financeiramente, e à data dos factos, o arguido subsistia com recurso aos rendimentos próprios e ao apoio de terceiros, salientando-se o apoio por parte do agregado materno. A situação económica daquele agregado é percecionada como humilde, alicerçada no salário da mãe do arguido (como empregada de limpeza), e nos apoios sociais. O irmão mais velho do arguido encontra-se autonomizado, e um dos irmãos menores está atualmente a cumprir medida de acolhimento institucional. 32. À data dos factos, e desde os 18 anos de idade, AA mantinha comportamento de consumo regular de produtos estupefacientes, concretamente heroína e cocaína, cujo padrão de consumo aumentou em .... No período dos factos, a progenitora e a namorada do arguido haviam iniciado diligências junto do ... (consulta descentralizada da toxicodependência em ...), com o objetivo de AA iniciar tratamento, o que não concretizou. 33. Em contexto prisional, o arguido esteve em situação de abstinência com apoio terapêutico do .... Contudo, quando restituído à liberdade, em ..., o arguido recaiu na sua problemática aditiva, tendo obtido nova situação de abstinência apenas quando privado novamente da liberdade. Atualmente, integra programa terapêutico dinamizado pelo ..., em contexto prisional. 34. AA demonstra adequadas capacidades de análise crítica quanto ao seu percurso de vida. É capaz de identificar a ilicitude, gravidade e impacto da conduta criminal passada, embora tenda para o seu enquadramento pela problemática aditiva. 35. O presente processo é inserido no período temporal de desorganização pessoal, precipitada pela recaída no consumo de produtos estupefacientes, inatividade laboral e maior fragilidade dos laços familiares. 36. O arguido é capaz de reconhecer a importância da abstinência do consumo de produtos estupefacientes como fator fundamental para o seu processo de mudança. 37. Atualmente, AA cumpre a primeira pena de prisão efetiva, à ordem do processo 3677/22.2... (...), pela prática de crimes de roubo e detenção de arma proibida. Cumpre, ainda, duas suspensões de execução de pena, com regime de prova, à ordem dos processos 347/22.5... (...) e 354/21.5... (...), cujos términos estão previstos para ...-...-2025 e ...-...-2023, respetivamente. 38. Neste âmbito, os respetivos planos de reinserção social contêm ações direcionadas para a manutenção do tratamento à problemática aditiva a estupefacientes, manutenção de hábitos de trabalho e promoção de maior autocrítica quanto à ilicitude e gravidade do comportamento criminal passado. Até ao momento, tem demonstrado adesão às mesmas. 39. O primeiro contacto com o sistema de justiça ocorreu em ..., aos 24 anos de idade, quando foi condenado pela prática de crime de condução sem habilitação legal, numa pena de multa que cumpriu através da substituição por trabalho a favor da comunidade. Regista outras duas condenações posteriores, pela prática do mesmo tipo de crime, em ..., tendo sido condenado em penas semelhantes. O comportamento criminal escalou para roubo, furto qualificado e tráfico de menor gravidade, em ... e ..., tendo resultado nas condenações em execução atualmente.(…)”. 1.5-Neste Supremo Tribunal o MPº emitiu parecer defendendo a improcedência do recurso, tendo em atenção e, em síntese, o seguinte conjunto de argumentos: “(…) Tendo em conta o âmbito do recurso interposto, o recorrente impugna não só a pena única, mas também as penas parcelares aplicadas aos crimes de roubo agravado e de furto qualificado, pelo que o conhecimento unitário do recurso se impõe nos termos do Ac. FJ n.º 5/2017, de 27–4–2017, publicado no DR de 23–6–2017. No recurso não é posta em causa a qualificação jurídica dos factos, mas apenas o quantum das penas parcelares e única. Porém, ao não estar em causa a qualificação jurídica dos factos, vemos que ao crime de roubo agravado, p.p. pelos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, é aplicável uma moldura penal abstrata de 3 a 15 anos de prisão, razão pela qual é manifestamente inviável a peticionada redução da pena aplicada – na medida de 3 anos e 10 meses de prisão – para apenas 1 ano e 3 meses de prisão, por estar abaixo do limite legal mínimo a considerar. Da mesma forma, quanto aos dois crimes de furto qualificado, ambos p.p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, alínea e), do Código Penal, a pena aplicável tem uma moldura legal abstrata de 2 a 8 anos de prisão, igual razão para se mostrar manifestamente inviável a redução das penas aplicadas – 2 anos e 5 meses de prisão e 2 anos e 6 meses de prisão – para apenas 1 ano e 1 ano de 1 mês de prisão, respetivamente, por também estarem abaixo do mínimo legal a considerar. Isto posto, ressalvada a parte inviável do peticionado por desconexão com as normas, o recorrente pretende tanto a redução da pena de prisão aplicada a cada um dos crimes pelos quais foi condenado, como da pena única Tendo as penas concretas parcelares ficado próximas do mínimo legal previsto para cada tipo de ilícito cometido, encontra–se, porventura, justificação para essa medida nos fatores que depuseram a favor do arguido e que o acórdão sopesou devidamente, entre eles o arrependimento, a confissão, o pedido de desculpa à assistente e ofendida apresentado em julgamento, a conduta adequada no EP, o apoio familiar de que beneficia, a valorização pessoal através do estudo em reclusão, etc. Portanto, não é verdade que o acórdão recorrido não tivesse ponderado devidamente os fatores atenuantes a que o recorrente faz apelo. Afigura–se–nos, assim, que a aplicação das penas de prisão parcelares pela prática dos crimes de roubo agravado e de dois crimes de furto qualificado estão plenamente justificadas, quer pela factualidade criminal que ficou provada, quer pelo limite da culpa (o porquê da punição), que ficou longe de ser atingido ou sequer ultrapassado, quer pela adequação e proporcionalidade das penas parcelares aplicadas, que são aptas à necessária tutela dos bens jurídicos protegidos e a responder proporcionalmente às exigências de prevenção, geral e especial (o para quê da punição), conforme estabelece o artigo 40.º, n.º 1, do Código Penal. Não se vê razão para censurar ou corrigir a medida das penas parcelares aplicadas, pois nem o tribunal recorrido usou de critérios inadequados ou legalmente irrelevantes, nem se vislumbra erro ou insuficiência na escolha dos fatores determinantes da pena, face ao disposto pelo artigo 71.º do Código Penal. Quanto à pena única. No caso, estamos perante um arguido que tem já várias condenações por crimes homólogos, estando o arco temporal respetivo referido a ...–...–2021, ...–...–2021, ...–...–2021, ...–...–2021, ...–...–2021, ...–...15, ...– ... e que, nos presentes autos, em ...–...–2021 e ...–...–2021, respetivamente, cometeu novamente crimes de roubo e de furto qualificado de gravidade elevada – como a caracteriza o acórdão recorrido – o que denota tendência para comportamento delituoso reiterado e persistente em crimes conexos, ao qual só a reclusão parece ter posto termo quando o arguido veio a ser condenado em pena de prisão de 4 anos e dois meses, que cumpre, por crime de roubo tentado e posse de arma proibida cometido em ...–...–2022. Assim, importa sublinhar e ponderar a gravidade dos factos praticados e o respetivo modo de execução; a proximidade temporal entre os factos, mas que não é circunstância atenuante face à elevada ilicitude dos factos; a também elevada intensidade do dolo; as condenações anteriores por factos antecedentes e subsequentes aos destes autos; o comportamento desviante e aditivo como contexto de vida contemporâneo dos factos (registo de abstinência de consumo de estupefacientes apenas quando preso e voltando aos consumos quando em liberdade); a ainda juventude (28 anos de idade), mas que não é de per si circunstância atenuante face ao passado criminal a considerar e ao registo da prática dos primeiros crimes já no início da juventude (...); a atual motivação para atividade formativa em meio prisional e o seu comportamento adequado nesse meio, mas que é o que normalmente se espera e exige a quem está recluso. Assim, o conjunto dos factos e da personalidade do arguido indicam que as exigências de prevenção geral são muito significativas e que as de prevenção especial devem ser intensificadas, importando assim fazer com que o arguido reconheça que sua conduta é condenável pela comunidade onde vive e que precisa ajustar seu comportamento aos valores sociais estabelecidos, moldando a sua personalidade de forma a corresponder às expectativas comunitárias de uma vida organizada e respeitadora dos bens jurídicos penalmente protegidos, e que ainda pode ter prognose positiva. À luz dos factos provados são elevadas as exigências de prevenção, quer geral, por via do alarme social e insegurança associado às condutas em causa, quer especial, por via da ponderação das circunstâncias de vida do arguido, da sua conduta anterior e posterior aos factos, que o levaram a ser novamente condenado, e que sugerem que o concurso de crimes deveria funcionar como agravante na determinação da pena conjunta. O tribunal a quo ponderou o que havia a ponderar e fê–lo até de forma benevolente, aplicando uma pena única de 5 anos e 3 meses de prisão efetiva, que se situa abaixo do primeiro terço do arco da moldura penal aplicável ao concurso de crimes, o que significa que, apesar das considerações acima feitas, o concurso não serviu, efetivamente, como agravante, pelo que a aceitar–se a pretensão genérica do recorrente em ver reduzida também a pena única, seria refletir ainda mais peso às atenuantes gerais ponderadas na pena única concreta aplicada, o que representaria um desequilíbrio manifesto e incompreensível com a devida proteção de bens jurídicos e as necessidades específicas do caso quanto à prevenção especial de ressocialização, enquanto finalidade principal das penas, sendo certo que também a par dela se deve atender à reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade, através do cumprimento efetivo da pena aplicada, que não é excessiva. A gravidade do ilícito global e a personalidade unitária do recorrente, corretamente sopesadas, levam a considerar que a pena única fixada pelo tribunal a quo acaba por ser, ainda que porventura em déficit, uma pena adequada, necessária, proporcional e inteiramente suportada pela medida da sua culpa, pelo que deve ser mantida, por respeito à proibição da reformatio in pejus, pois todos os argumentos esgrimidos pelo recorrente perdem pertinência face a essa concreta pena, por já nos parecerem sobejamente refletidos nela. Por via dessa medida, a manter, não se mostra viável a substituição por suspensão da execução da prisão * Concluindo, tanto as penas parcelares, como a pena única aplicadas respeitam os princípios constitucionais da intervenção mínima, da proporcionalidade das penas e da igualdade, e sobretudo o princípio da culpa, pois a realização da justiça penal num Estado de Direito democrático tanto se alcança na proibição da punição sem culpa ou para além da culpa (nulla poena sine culpa – princípio da proibição do excesso), como se cumpre por meio de uma punição adequada dos culpados, quando necessária for, para salvaguarda do interesse púbico subjacente ao respeito pelo Direito do próprio Estado (…)– princípio da realização do Estado de Direito); ou seja, a adequada proteção de bens jurídicos, enquanto finalidade principal das penas, deve estar alinhada com a reintegração tão rápida quanto possível do arguido em sociedade. Afigura-se-nos, assim que, de forma suficiente, na determinação da medida das penas parcelares e da pena única se refletiu justificação bastante para a correta consideração da culpa e da prevenção como princípios regulativos dessas medidas, e se refletiu sustentação bastante para manter a fidelidade à medida da necessidade de tutela de bens jurídicos face ao caso concreto, segundo os critérios legais. Acompanha-se, deste modo, o sentido das alegações do Ministério Público na 1.ª instância, não se mostrando, a nosso juízo, violados quaisquer preceitos legais.] 1.6. Efectuado exame preliminar e vistos legais foram remetidos os autos à Conferência, cumprindo agora explicitar a deliberação tomada. II- Delimitação das questões a conhecer no âmbito do presente recurso 2.1- Visando permitir e habilitar este Supremo Tribunal a conhecer as razões de discordância da decisão recorrida e tal como tem sido, aliás, posição pacífica da jurisprudência, o âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões, devidamente congruentes, que o(s) recorrente(s) extrai(em) da respectiva motivação, sem prejuízo da ponderação das questões que sejam de conhecimento oficioso. (1) 2.2- Assim, atentas as conclusões formuladas pelo recorrente, as questões a decidir no presente recurso, sem prejuízo das que possam existir de conhecimento oficioso, por ordem de precedência lógica, são: Excessividade e desajustamento das penas (parcelares e unitária), sua redutibilidade e suspensão da respectiva execução 2.3 - O Direito 2.3.1 - A medida das penas parcelares Tal como antes já se mencionou, o arguido foi condenado: 1. Pela prática de um crime de roubo qualificado, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, na pena de 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão. Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 14), na pena de 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão; Pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal (facto 15), na pena de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses. Em cúmulo jurídico, condenar o arguido na pena única de 5 (cinco) anos e 3 (três) meses de prisão. No seu argumentário de defesa, o recorrente convoca as seguintes razões para propor justificar-se uma alteração das penas parcelares e unitária, sendo certo, que não coloca em causa a qualificação jurídica: “O quantum das penas de prisão aplicadas em concreto, desajustadas e desproporcionais pois em momento algum ficou demonstrado nos autos que o Recorrente tem uma personalidade contrária à lei que justifique a aplicação de uma sanção tão severa, não se revelando, pois então, especialmente acentuadas as necessidades de prevenção especial. Não foram tomadas em consideração na decisão proferida os factos infra mencionados: a) A confissão integral e sem reservas dos factos constante da acusação por parte do arguido, assim como o arrependimento verbalizado por este. b) As condições económicas e sociais do arguido. c) O facto de o arguido integrar programa terapêutico dinamizado pelo ..., em contexto prisional, bem como ter demonstrado adequadas capacidades de análise crítica quanto ao seu percurso de vida. d) O arguido ser capaz de identificar a ilicitude, gravidade e impacto da conduta criminal passada. e) O presente processo estar inserido no período temporal de desorganização pessoal, precipitada pela recaída no consumo de produtos estupefacientes, inatividade laboral e maior fragilidade dos laços familiares. f) O arguido ser capaz de reconhecer a importância da abstinência do consumo de produtos estupefacientes como fator fundamental para o seu processo de mudança. g) O arguido ter demonstrado adesão aos planos de reinserção social que contêm ações direcionadas para a manutenção do tratamento à problemática aditiva a estupefacientes, manutenção de hábitos de trabalho e promoção de maior autocrítica quanto à ilicitude e gravidade do comportamento criminal passado. h) O arguido ter manifestado a intenção de pedir desculpa às ofendidas, o que fez em audiência de modo sincero. i) O comportamento correto do arguido em audiência, tendo manifestado essa vontade e concretizado pedidos de desculpa à assistente BB e à ofendida CC. j) O facto de o arguido, no EP em que se encontra recluído, ter assumido uma conduta adequada às regras e funcionamento, sem procedimentos disciplinares. l) Beneficiar de apoio por parte da progenitora (46 anos de idade) e dos irmãos, que o visitam e manifestam disponibilidade para futuro acolhimento e suporte. m) O arguido encontra-se a estudar no Estabelecimento Prisional, a fim de concluir o 12.º ano de escolaridade, e também a trabalhar, integrando a oficina de etiquetas. Assim, considera que o Tribunal a quo, no que tange à determinação da medida concreta da pena, ao não ter atendido e sopesado devidamente os factos enunciados no parágrafo anterior, desrespeitou os princípios gerais respetivos, as operações de determinação impostas por lei, a indicação e consideração dos fatores de medida da pena. Entende o recorrente que o Tribunal a quo deveria ter condenado o recorrente numa pena mais harmoniosa, proporcional e justa face às circunstâncias acima expostas, de acordo com o disposto no artigo 71º do Código Penal, que não deveria ultrapassar a pena única de dois anos e dois meses de prisão, suspensa na sua execução, por se entender que desta forma se realizaria de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, a proteção dos bens jurídicos ofendidos e a reintegração do arguido na sociedade.” Ora, defende o recorrente uma redução das penas parcelares muito abaixo dos mínimos moldurais legais admissíveis para cada tipo de crime. No caso do roubo qualificado o mínimo seria sempre de 3 anos de prisão (factos 1 a 12 da factualidade provada ocorridos a ... de ... de 2021) No caso dos furtos qualificados (factos nº 14 e 15) ocorridos a ... de ... de 2021) a pena mínima seria de 2 anos de prisão. Não invoca sequer fundamento de facto e legal que pudesse constituir circunstância atenuante especial ( artº 72º do CP) que diminua por forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente ou a necessidade da pena. Vejamos o que o tribunal a quo mencionou, na parte relevante, ao determinar a medida das penas. Em sede de motivação de facto o tribunal menciona expressamente ter tido em conta, além de tudo o mais (prova documental e testemunhal), o relatório social e as declarações confessórias do arguido bem como o arrependimento sincero manifestado, Na verdade, refere assim: “(…) Para prova dos factos dados como assentes foram tidas em conta, primordialmente, as declarações confessórias do arguido. Este confirmou, na íntegra, a sua autoria quanto aos factos supra dados como assentes e a sua ocorrência, verbalizando arrependimento pelo sucedido. Ademais, o arguido manifestou a intenção de pedir desculpa às ofendidas, o que fez em audiência de modo sincero. O arguido referiu que à data dos factos consumia cocaína e heroína, e se encontrava a viver com o seu pai. Mais explicou que se apoderou do dinheiro e bens em causa nos autos a fim de financiar a compra de droga. O arguido disse estar muito arrependido, e ainda que se encontra a fazer tratamento às drogas no EP (sendo seguido pelo ...), e que atualmente não toma qualquer medicação para auxiliar na abstinência ao consumo de drogas. As suas declarações confessórias mostraram-se credíveis e sinceras, motivo pelo qual mereceram relevo probatório positivo. Para além disso, as mesmas revelaram-se coerentes com os demais meios de prova constantes dos autos. (…) percorrida toda a prova documental e pericial constante dos autos, conjugada com as declarações confessórias do arguido, concluiu o Tribunal sem margem para dúvidas a autoria por parte do arguido relativamente aos factos dados como assentes. * (…) E, na fundamentação de direito: “(…) crime de roubo em especial: Dispõe, nesta sede, o art. 210.º, n.º 1 e 2 do Cód. Penal, que comete um crime de roubo: «1 - Quem, com ilegítima intenção de apropriação para si ou para outra pessoa, subtrair, ou constranger a que lhe seja entregue, coisa móvel alheia, por meio de violência contra uma pessoa, de ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou pondo-a na impossibilidade de resistir, é punido com pena de prisão de um a oito anos. 2 - A pena é a de prisão de 3 a 15 anos se: a) Qualquer dos agentes produzir perigo para a vida da vítima ou lhe infligir, pelo menos por negligência, ofensa à integridade física grave; ou b) Se verificarem, singular ou cumulativamente, quaisquer requisitos referidos nos n.os 1 e 2 do artigo 204.º, sendo correspondentemente aplicável o disposto no n.º 4 do mesmo artigo.” No caso, é imputada ao arguido a agravação com base no disposto no artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, no qual se dispõe que: “2 - Quem furtar coisa móvel ou animal alheios: (…) f) Trazendo, no momento do crime, arma aparente ou oculta; (…)” Conforme se decidiu no acórdão da Relação do Porto de 11 de Setembro de 2013 (Rel. Dolores Silva e Sousa, in dgsi.pt): “O crime de roubo é um tipo de crime complexo, pluriofensivo, porquanto protege, indubitavelmente, o bem jurídico da propriedade, mas também bens jurídicos pessoais como a vida, integridade física e a liberdade pessoal, de ação e decisão. Do ponto de vista da propriedade, protege-se uma especial relação de facto sobre a coisa, a mera posse ou disponibilidade da fruição das utilidades da coisa com o mínimo de representação jurídica. Quanto à noção de coisa, esclarecem LEAL HENRIQUES E SIMAS SANTOS, a propósito do crime de furto, (in, “Código Penal Anotado”, 2º Volume, p. 619) que a mesma consistirá, para efeitos penais, em “toda a substância corpórea, material, susceptível de apreensão, pertencente a alguém e que tenha um valor qualquer, mas juridicamente relevante”. Esclarece, ainda, o Prof. FARIA COSTA in “Comentário Conimbricense”, que “coisa móvel é toda e qualquer coisa que seja susceptível de ser deslocada espacialmente” e será alheia “toda a coisa que está ligada, por uma relação de interesse, a uma pessoa diferente daquela que pratica a infracção”. Para que se verifique o tipo de crime de roubo, objetivamente, exige-se uma subtração ou constrangimento à entrega de coisa móvel alheia por um dos meios previstos: violência contra uma pessoa, ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física, ou colocação na impossibilidade de resistir, já que se trata de um crime de execução vinculada. Citando o Ac. do STJ, de 5.11.03, Proc. 03P2717, in www.dgsi.pt, “[C]onstranger é, coagir, obrigar, pressionar, afectando a liberdade pessoal do coagido; para fins de preenchimento do tipo legal, o constrangimento reveste a natureza de uma obrigação de "facere" no caso de entrega coisa móvel ou "non facere ", no caso de subtracção da mesma, sujeitando-se o coagido, neste caso, a consentir na apropriação ilegítima da coisa móvel, que passa da sua esfera dominial para a de terceiro, por qualquer dos modos previstos no art.º 210.º, do CP.: violência contra a pessoa, ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física do visado ou colocação na impossibilidade de resistir”. Entre o conseguir coisa móvel alheia e os meios empregues tem, pois, de se verificar um nexo de imputação. A violência empregue pode ser física ou psicológica, desde que seja suficiente, do ponto de vista do homem médio, para determinar a vontade do ofendido à entrega da coisa e superar a sua resistência ou oposição. A este propósito se diz no Ac. TRL 12.7.06, Proc. 5803/2006-3, in www.dgsi.pt: “no crime de roubo a violência não pressupõe que ao ofendido sejam provocadas lesões, podendo nem sequer haver contacto físico, já que o arguido por vezes não chega a ameaçar de uma forma expressa, puxando de pistola ou faca, antes se limita a “mostrar” alguma dessas armas num “aviso” claro de que podem fazer uso delas em qualquer momento (…)”. Apesar da tipificação do constrangimento como elemento incriminador, e pela natureza dos bens jurídicos que visa proteger, o seu exercício pode assumir as mais diversas formas. No sentido de que a compressão coativa não demanda nem pressupõe formas taxativas ou específicas de manifestação, cfr. Ac. STJ 11.4.02, in www.dgsi.pt. Face ao que ficou dito, para que se considere praticado o crime de roubo, basta a utilização de um meio, objetiva e abstratamente idóneo a configurar uma forma de violência sobre a vítima ou a colocá-la na impossibilidade de resistir. Exige-se, por outro lado, a entrada no domínio de facto do agente da infração das utilidades da coisa que estavam anteriormente no sujeito que a detinha. No que se refere ao tipo subjetivo do ilícito, é aceite pela doutrina e jurisprudência o cometimento do crime de roubo sob qualquer modalidade de dolo, ainda que seja necessário que o agente actue com um dolo específico de “ilegítima intenção de apropriação” da coisa para si ou para terceiro, para além do dolo genérico de representar e querer o ato de subtrair ou constranger alguém a entregar-lhe algo, com consciência do seu caráter alheio e de que tal comportamento é ilícito.” * (…) Relativamente à agravação concretamente em causa nestes autos, no que concerne à utilização de arma aparente ou oculta, cumpre analisar como tem entendido a jurisprudência dos nossos tribunais superiores a atuação da mesma. A este propósito, decidiu-se no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça (Proc. n.º 24/22.7PCMTS.P1.S1, in dgsi.pt), de 25-05-2023: “I - O arguido foi condenado por um crime de roubo agravado, em que os bens jurídicos protegidos não são apenas os respeitantes ao património ou à propriedade de coisas móveis ou animais alheios mas também os relativos à liberdade e à segurança individuais, à integridade física e à vida das vítimas lesadas, dado o agente [ou agentes], com o propósito de se apoderar ou obrigar alguém a entregar-lhe as ditas coisas ou animais que não lhe pertencem, fazer uso de violência, de ameaça séria que se traduza em perigo iminente para tais bens pessoais ou de algo que lhe consiga anular a sua capacidade de resistência. II - Não obstante o canivete empunhado pelo arguido possuir apenas uma lâmina de 3 centímetros e não ter, nessa medida e por regra, um potencial letal, seguro é que se mostra apto, pelo menos, a infringir lesões à integridade física das pessoas que sejam agredidas com ele, lesões essas que, apesar de se poderem traduzir em cortes ou feridas pouco profundas em muitas zonas do corpo das vítimas, não excluem situações de maior gravidade [jugular, coração e outras como a artéria femoral, olhos, etc.], sendo certo que bastaria a existência do perigo de o arguido infligir as primeiras para se mostrar preenchida a qualificativa agravante da al. f) do art. 204.º do CP, pois o bem jurídico a que se reconduz a integridade física dos seres humanos é, nesta perspetiva, absoluto, não se desdobrando em graus ou níveis em que é socialmente consentido e tolerado e noutros em que a proibição já é total. (…) III - Impõe-se também olhar aqui ao cenário concreto em que os factos dos autos aconteceram, pois se o roubo em questão visava a apropriação pelos arguidos dos bens que estavam e pertenciam à PAPELARIA [e que, concretamente, se reconduziram a raspadinhas, maços de tabaco e dinheiro], seguro era que aí se encontravam cinco pessoas, sendo duas delas crianças ainda de colo e dois dos adultos sócio-gerente e funcionária do estabelecimento comercial em questão – sendo ambos progenitores de um dos menores referidos - e o outro adulto, cliente da loja e mãe do outro menor, que estava ao seu colo, tendo todos eles sido abordados pelo arguido recorrente, que informou que aquilo era um assalto, ao mesmo que apontava o dito canivete em direção aos dois primeiros adultos e criança, dado esta estar também ao colo da mãe, provocando assim receio em todos, ainda que com maior intensidade sobre os três antes mencionados. IV - Estamos, claramente, perante uma conduta do arguido que, mediante a exibição do referido canivete e a intenção manifestada quanto à sua utilização, em caso de desobediência ou resistência por parte das pessoas visadas, tem de ser configurada como uma «ameaça com perigo iminente para a vida ou para a integridade física» dos aludidos indivíduos, o que agrava o roubo simples do n.º 1 do art. 210.º do CP, nos termos da al. b) do seu n.º 2, por referência à al. f) do n.º 2 do art. 204.º do mesmo diploma legal.” (sublinhados nossos). (cfr., no mesmo sentido o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, Proc. 07P3173, de 10-01-2008, in dgsi.pt). (…) Ora, no caso, atentos os factos provados, dúvidas não subsistem, portanto, de que o tipo objetivo de ilícito se encontra preenchido. Com efeito, verifica-se que o arguido, agarrando a ofendida e empunhando um canivete, retirou da caixa registadora a quantia de € 200,00, apropriou-se, ainda, de um telemóvel de marca “Huawei”, de valor estimado em 150 € (cento e cinquenta euros), propriedade do estabelecimento comercial, de € 200,00 em raspadinhas e de um telemóvel de marca “Samsung”, modelo Galaxy A31, de cor cinza, no valor de € 249,99, apropriando-se de tais bens. Relativamente à circunstância agravante, temos que o arguido utilizou, a fim de constranger a ofendida a entregar-lhe os mencionados objetos, um canivete durante toda a sua atuação. Ora, daqui decorre que, na senda da jurisprudência supra referida, a conduta do arguido preencheu igualmente a circunstância agravante prevista no artigo 210.º, n.º 2, al.b), ex vi do art. 204.º, n.º 2, al. f), assim cometendo um crime de roubo na sua forma agravada. Mais ficou provado que o arguido sabia que a sua conduta era proibida e punível pela lei penal. Por outro lado, a conduta do arguido também é ilícita, porque contrária à ordem jurídica, e culposa, já que nas concretas circunstâncias em que o arguido estava inserido era-lhe exigível a adoção de outra conduta possível e não lesiva dos bens jurídicos tutelados por este tipo de crime, merecendo, nessa medida, a emissão de um juízo de censura penal. Inexistem, ainda, quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou de desculpação. Nesta conformidade, e em face da factualidade que ficou provada, não existem dúvidas de que a conduta do arguido preencheu objetiva e subjetivamente o tipo legal de crime de roubo qualificado, previsto e punido pelos artigos 210.º, n.º 1 e n.º 2, alínea b), com referência ao artigo 204.º, n.º 2, alínea f), do Código Penal, pelo que tal atuação merece um juízo de censura penal. Do crime de furto em especial: (…) Percorridos os referidos factos, conclui-se que a conduta do arguido preenche, em ambas as situações, o elemento objetivo do referido tipo legal de crime. Preenche igualmente a respetiva qualificativa prevista na al. e) do n.º 2 do art. 204.º do CP, já que o arguido entrou na loja nº 11, do ..., situada na ..., em ..., explorada por CC, onde entrou após ter partido o vidro da montra, tendo de lá retirado a quantia de € 125,00. E, por outro lado, o arguido entrou ainda no salão de estética denominado “DD”, situado na ..., em ..., onde entrou após ter partido o vidro da porta, tendo de lá retirado a quantia de € 226,00. Pelo que se conclui pelo preenchimento do tipo de crime de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e), do Código Penal, perfazendo a conduta do arguido a prática de dois crimes dessa natureza. (…) Por fim, a conduta do arguido é, em todos os crimes de furto até agora analisados, também ilícita porque contrária à ordem jurídica, e culposa pois, nas concretas circunstâncias em que estava inserido, era-lhe exigível a adoção de outra conduta possível e não lesiva dos bens jurídicos tutelados por este tipo de crime, merecendo, nessa medida, a emissão de um juízo de censura penal. Conclui-se, assim, que a assinalada conduta do arguido preenche os elementos objetivos e subjetivos dos tipos legais de crime de furto que lhe eram imputados na acusação, não se averiguando, in casu, quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, pelo que a sua atuação merece a emissão de um juízo de censura penal. O tipo de dolo que o arguido preencheu com as suas condutas corresponde ao dolo direto – [cf. art. 14.º, n.º1 do Código Penal: «Age com dolo quem, representando um facto que preenche um tipo de crime, atuar com a intenção de o realizar»]. Corresponde, grosso modo, à intenção criminosa e nele o agente prevê e tem como fim a realização do facto criminoso. O arguido sabia que tal conduta não lhe era permitida e, mesmo assim, quis livremente agir do modo descrito. Por fim, conclui-se igualmente que não existem, in casu, quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou da culpa, pelo que a atuação do arguido merece a emissão de um juízo de censura penal. (…) Após haver enunciado os critérios e regras gerais bem como citado doutrina e jurisprudência na matéria, o acórdão recorrido encontrou as medidas parcelares segundo a fundamentação seguinte: “(…) Em suma: no que respeita à medida concreta da pena, a mesma terá como limite máximo a culpa do agente revelada nos factos por si praticados [cf. art. 40.º, n.º2, do Cód. Penal], e terá de se mostrar adequada a assegurar as exigências de prevenção geral ― que são consideráveis tendo em conta as mais elementares regras de convivência social que afastam este tipo de comportamento, potencialmente geradores de consequências gravíssimas, razão pela qual se impõe a afirmação, de modo urgente e indubitável, da efetividade e da validade das normas que punem tais condutas, através da condenação de quem incorra nas mesmas ―, e especial, nos termos do disposto nos artigos 40.º, n.º1, e 71.º, n.º1, ambos do Cód. Penal. Sendo certo que na determinação da medida da pena ter-se-ão em conta todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente, as enumeradas no art. 71.º, n.º 2 do Cód. Penal. Há assim que ponderar os seguintes factos: Contra o arguido depõem: - A intensidade do dolo do arguido: que reveste a forma de dolo direto, de acordo com o art. 14.º, n.º1 do Cód. Penal, constituindo o grau máximo de censura da conduta por si adotada. – Os motivos que estiveram na determinação dos crimes estão na incapacidade do arguido em respeitar o património alheio. - Os sentimentos manifestados no cometimento do crime – comportamento egoístico e socialmente desajustado. - As exigências de prevenção geral são muito elevadas, dado o crescente aumento destes tipos de delitos e a frequência com que atualmente são praticados ambos os tipos legais de crime (roubo e furto). - A gravidade inerente ao crime de roubo praticado pelo arguido, em que utilizou um canivete para ameaçar a vítima e se apoderar dos seus bens, mantendo a ofendida constrangida durante um período de tempo relevante. - A conduta do arguido em causa nestes autos é de extrema gravidade, tendo praticado três crimes contra o património no período de menos de um mês. - As exigências de prevenção especial são relevantes, pese embora à data da prática dos factos ora em análise o arguido apenas tivesse antecedentes pela prática de três crimes de condução sem habilitação legal. Não obstante, o arguido regista também uma condenação pela prática de três crimes de roubo, na forma tentada, cinco crimes de roubo, na forma consumada, um crime de furto qualificado e um crime de furto qualificado, na forma tentada, no qual foi punido com pena de prisão de 5 anos, suspensa na sua execução, por factos praticados no ano de 2021, portanto em datas muito próximas aos crimes em causa nestes autos. O arguido regista ainda uma condenação pelo crime de tráfico de menor gravidade, por factos praticados em .../.../2022, no qual foi condenado na pena de 2 anos de prisão, suspensa por igual período e sujeita a regime de prova. Por outro lado, o arguido regista também uma condenação pela prática de um crime de roubo, na forma tentada, e um crime de detenção de arma proibida, na pena única de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de prisão efetiva e ainda na pena acessória de interdição de detenção, uso e porte de armas, pelo período de 3 (três) anos e 6 (seis) meses, por factos ocorridos a .../.../2022. Ora, as referidas condenações, pese embora maioritariamente por factos posteriores aos dos presentes autos, relevam grandemente em desfavor do arguido a título de conduta posterior ao crime. - À data dos factos, o arguido residia com o pai e atravessava um período de instabilidade e de consumo de estupefacientes, concretamente heroína e cocaína, cujo padrão de consumo aumentou em 2020. - Em termos profissionais, à data dos factos o arguido encontrava-se inativo, depois de experiências laborais como operário da construção civil (aplicador de gesso cartonado) e operário em empresa têxtil, de forma menos regular, desde 2020. - O arguido esteve em situação de abstinência com apoio terapêutico do .... Contudo, quando restituído à liberdade, em 2022, recaiu na sua problemática aditiva, tendo obtido nova situação de abstinência apenas quando privado novamente da liberdade. * A favor do arguido depõem: - O facto de ter confessado na íntegra os factos que lhe eram imputados e demonstrado arrependimento. - O seu comportamento correto em audiência, tendo manifestado essa vontade e concretizado pedidos de desculpa à assistente BB e à ofendida CC. - No EP em que se encontra recluído o arguido assume uma conduta adequada às regras e funcionamento, sem procedimentos disciplinares. Beneficia de apoio por parte da progenitora (46 anos de idade) e dos irmãos, que o visitam e manifestam disponibilidade para futuro acolhimento e suporte. - O arguido encontra-se a estudar no EP, a fim de concluir o 12º ano de escolaridade, e também a trabalhar, integrando a oficina de etiquetas. * Sopesados estes elementos, considera-se justa, adequada e proporcional a aplicação ao arguido: - Pela prática de um crime de roubo qualificado, p. e p. pelos 210.º, n.º 2, al.b), ex vi do art. 204.º, n.º 2, al. f), de uma pena concreta 3 (três) anos e 10 (dez) meses de prisão; - Pela prática de 2 crimes de furto qualificado, p. e p. pelos artigos 203.º, n.º 1 e 204.º, n.º 2, al. e) do Código Penal, das seguintes penas concretas: - 2 (dois) anos e 5 (cinco) meses de prisão (facto 14); - 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão (facto 15);” Assim, verificamos que no entrecruzar do conjunto dos factos, do comportamento anterior, contemporâneo e posterior do arguido, das intensidades do dolo e da ilicitude e atendendo às exigências de prevenção especial e gerais, não se justificaria minimamente, apesar da confissão do arguido e do arrependimento revelados, uma atenuação especial das penas. Há sinais positivos, reconhece-se, no sentido de o arguido possuir capacidade de mudança. Mas na base do comportamento anómico, sendo em parte recidivante como evidenciam algumas das condenações sofridas, está fundamentalmente a sua adição ao consumo de estupefacientes, para cuja resolução já teve oportunidade de conseguimento, porém sem eficácia. As penas parcelares, sobretudo em resultado da ponderação da sua condição pessoal e comportamento confessórios, foram fixadas bem perto dos mínimos legais. Uma maior diminuição dos limites seria inadmissível e sem justificação, pois tal constituiria uma passar de esponja desculpabilizante do seu comportamento e um sinal negativo de brandura, quer a si, para futuro, que para a comunidade. Assim, tal como na súmula bem equacionada pelo MPº, também diremos, sem reserva, da injustificação da alteração das penas parcelares, uma vez que no caso, estamos perante um arguido que tem já várias condenações por crimes homólogos, estando o arco temporal respetivo referido a 14–3–2021, 13–1–2021, 15–9–2021, 17–9–2021, 20–9–2021, 1–2015, 23–12– 2022 e que, nos presentes autos, em 25–8–2021 e 14–9–2021, respetivamente, cometeu novamente crimes de roubo e de furto qualificado de gravidade elevada – como a caracteriza o acórdão recorrido – o que evidencia já alguma tendência para comportamento ilícito recidivante por crimes conexos: O que, afinal, permite concluir que, agora, só a reclusão lhe parece ter colocado um limite, ao vir a a ser condenado em pena de prisão de 4 anos e dois meses, que cumpre entretanto, por crime de roubo tentado e posse de arma proibida cometido embora em 23–12–2022, já posteriormente aos factos a que os presentes autos respeitam . Acresce ainda, como igualmente muito bem foi salientado, que : “(…) a proximidade temporal entre os factos, não é circunstância atenuante face à elevada ilicitude dos factos; a também elevada intensidade do dolo; as condenações anteriores por factos antecedentes e subsequentes aos destes autos; o comportamento desviante e aditivo como contexto de vida contemporâneo dos factos (registo de abstinência de consumo de estupefacientes apenas quando preso e voltando aos consumos quando em liberdade); a ainda juventude (28 anos de idade), mas que não é de per si circunstância atenuante face ao passado criminal a considerar e ao registo da prática dos primeiros crimes já no início da juventude (2015); a atual motivação para atividade formativa em meio prisional e o seu comportamento adequado nesse meio, mas que é o que normalmente se espera e exige a quem está recluso. (…) o conjunto dos factos e da personalidade do arguido indicam que as exigências de prevenção geral são muito significativas e que as de prevenção especial devem ser intensificadas, importando assim fazer com que o arguido reconheça que sua conduta é condenável pela comunidade onde vive e que precisa ajustar seu comportamento aos valores sociais estabelecidos (…)” Em suma, as penas fixadas respeitam os princípios da intervenção mínima, foram bem ponderadas em função da culpa revelada e do prognóstico de ressocialização, possível mas ainda não suficientemente testado em face da adição à toxicodependência não resolvida, sendo tais penas necessárias para garantia de eficácia e salvaguarda do interesse público subjacente ao respeito pelo Direito do próprio Estado (nulla poena sine culpa – princípio da realização do Estado de Direito). Foi feita a determinação das penas por forma suficiente, ponderada, fundamentada e clara. 2.3.2 - A pena unitária e a medida fixada A pena unitária foi fixada a partir de um mínimo de 3 anos e 10 meses (limite fixado pela pena mais grave como mínimo da moldura para o cúmulo jurídico e 8 anos e 9 meses como limite máximo moldural, na configuração do resultado de uma soma material de todas as penas parcelares – ex vi do artº 77º nº2 do CP). Assim, o arco moldural entre tais limites, de 4 anos e 11 meses de prisão, não foi ultrapassado, apenas tendo sido a pena unitária alcançada por acrescento ao mínimo moldural do concurso, apenas de mais 1 anos e 5 meses, equivalente a cerca de ¼ desse arco moldural. Na ponderação da pena unitária releva sobretudo o seguinte: O art.77.º do Código Penal perfilha o «sistema da pena conjunta», na medida em que a punição do concurso de crimes supõe a discriminação das penas concretas que o integram. Na lição de Figueiredo Dias “Pena conjunta existirá sempre que as molduras penais previstas, ou as penas concretamente determinadas, para cada um dos crimes em concurso sejam depois transformadas ou convertidas, segundo um «princípio de combinação» legal, na moldura penal ou na pena do concurso.”. Dentro deste sistema, é habitual configurar-se um princípio de absorção puro, em que a punição do concurso será constituída simplesmente pela pena mais grave dentre as penas parcelares, e um princípio da exasperação ou agravação, em que “a punição do concurso ocorrerá em função da moldura penal prevista para o crime mais grave, mas devendo a pena concreta ser agravada por força da pluralidade dos crimes (sem que, todavia, possa ultrapassar a soma das penas que concretamente seriam aplicadas aos crimes singulares).”. A doutrina vem entendendo que o modelo de punição do concurso de crimes consagrado no art.77.º do Código Penal, sendo um sistema de pena conjunta, não é construído, porém, de acordo com o princípio de absorção puro, nem com o princípio da exasperação ou agravação, nos termos definidos, mas sim de acordo com um sistema misto, que vem sendo chamado de sistema do cúmulo jurídico.2 Também a jurisprudência segue este caminho, consignando-se, entre outros, no acórdão do S.T.J. de 3 de outubro de 2012, que o modelo de punição do nosso Código Penal é um sistema misto de pena conjunta “erigido não de conformidade com o sistema de absorção pura por aplicação da pena concreta mais grave, nem de acordo com o princípio da exasperação ou agravação, que agrega a si a punição do concurso com a moldura do crime mais grave, agravada pelo concurso de crimes.”3. Doutrina e jurisprudência coincidem em especificar que no cúmulo jurídico, a pena conjunta é definida dentro de uma moldura cujo limite mínimo é a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes e o limite máximo resulta da soma das penas efetivamente aplicadas, emergindo a medida da pena conjunta, não apenas dos factos individualmente considerados, numa visão atomística, mas da imagem global do facto imputado e da personalidade do agente. A pena conjunta do concurso será encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, fornecendo a lei, para além dos critérios gerais de medida da pena contidos no art.71º.º, n.º1, um critério especial estabelecido no art.77.º, nº 1, 2ª parte, ambos do Código Penal.4 Os parâmetros indicados no art.71.º do Código Penal, servem apenas de guia para a operação de fixação da pena conjunta, não podendo ser valorados novamente, sob pena de se infringir o princípio da proibição da dupla valoração, a menos que tais fatores tenham um alcance diferente enquanto referidos à totalidade de crimes.5 Na busca da pena do concurso, explicita Figueiredo Dias, na obra que vimos seguindo, que “Tudo deve passar-se como se o conjunto dos factos fornecesse a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique. Na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade: só no primeiro caso, já não no segundo, será cabido atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta”. E acrescenta que “de grande relevo será também a análise do efeito previsível da pena sobre o comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização).” Como refere ainda, na doutrina, Cristina Líbano Monteiro, com o sistema da pena conjunta, perfilhado neste preceito penal, deve olhar-se para a possível conexão dos factos entre si e para a necessária relação de todo esse bocado de vida criminosa com a personalidade do seu agente.6 As conexões ou ligações fundamentais na avaliação da gravidade da ilicitude global, são as que emergem do tipo e número de crimes, dos bens jurídicos individualmente afetados, da motivação, do modo de execução, das suas consequências e da distância temporal entre os factos, sem esquecer as concretas penas aplicadas aos crimes. Na avaliação da personalidade unitária do agente, referenciada aos factos, deve verificar-se se estes correspondem a uma atuação episódica, acidental ou, pelo contrário, se esta é uma atuação estruturada num comportamento persistente de vida de crime. A pena conjunta do concurso é encontrada em função das exigências gerais de culpa e de prevenção, de acordo com os critérios gerais de medida da pena contidos nos artigos 71.º, n.º1 e 77.º, a que acrescem os do art.77.º, todos do Código Penal. Por outro lado, na operação de aferição sobre o processo de apreciação da escolha e da determinação da medida da pena, em sede de recurso, é consensual que a intervenção do tribunal ad quem tem no essencial uma função de “remédio jurídico”, a ele cabendo identificar incorreções, omissões ou erros evidentes atinentes ao raciocínio hermenêutico incidente nas normas constitucionais, convencionais e legais aplicadas ou mobilizáveis, por parte da instância recorrida. Apenas nesse patamar é legítimo ao tribunal de recurso proceder à alteração do quantum da pena, não podendo interpretar e decidir como se fosse inexistente decisão anteriormente proferida –no caso vertente, a do tribunal de primeira instância. A legitimação da intervenção do tribunal de recurso em termos de modificar, para mais ou para menos, a medida da pena aplicada (no caso, unitária), terá pois de seguir esses parâmetros na sua essência e caracterização enunciadas. Neste sentido, vide os Acs. de 15-11-2006 do STJ, Proc. n.º 2555/06- 3ª e Ac de 11-02-2015: Proc. 591/12.3GBTMR.E1.S1 (citado infra), que relembram a controvérsia sobre os limites de aferição da pena e Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As consequências Jurídicas do Crime, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, § 278, p. 211) Em suma, o olhar hermenêutico e de escrutínio da adequação ou correção da questionada medida da pena em sede de recurso será incontornável sobretudo em caso de manifesta desproporcionalidade (injustiça) ou de violação da racionalidade e das regras da experiência (arbítrio) na configuração e estruturação das operações tidas como necessárias à sua determinação nos parâmetros da lei. Nessas e em função dessas circunstâncias é que se justificará uma intervenção modificadora pelo tribunal ad quem na escolha e a determinação da medida da pena. Comprovada que ficou já a acentuação da persistência e tendência do arguido para a prática de crimes, vg contra pessoas e património, por alguns dos quais cumpre pena de prisão efectiva, cujo sucesso ressocializador dependerá da recuperação do problema de toxicodependência, podemos concluir pela adequada ponderação da pena unitária fixada e pela total ausência de motivos com intensidade bastante para justificação da sua alteração. Posto isto, o recurso improcede. III- DECISÃO 3.1 - Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente. 3.2 - Taxa de justiça de 6 UC a cargo do recorrente nos termos do artºb 513º do CPP e da tabela III do RCP STJ, 26 de Setembro de 2024 (texto elaborado em suporte informático , revisto e rubricado pelo relator – (artº 94º do CPP) Agostinho Torres (relator) Vasques Osório (1º adjunto) Celso Manata (2º adjunto)
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1. Neste sentido, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, 2ª edição, Editorial Verbo, pág. 335; Simas Santos e Leal Henriques, Recursos em Processo Penal, 6ª edição, Edições Rei dos Livros, pág. 103, Ac. do STJ de 28/04/1999, CJ/STJ, 1999, Tomo 2, pág. 196 e Ac. do Pleno do STJ nº 7/95, de 19/10/1995, DR I Série A, de 28/12/1995. 2. Cf. Figueiredo Dias, obra cit. págs. 282 a 284 e Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código Penal, pág. 283 3. Cf. proc. n.º 900/05.1PRLSB.L1.S1, in www.dgsi.pt. 4. Cf. “Direito Penal Português, “As Consequências Jurídicas do Crime”, Editorial Notícias, 1993, pág.290/2. 5. Cf. Figueiredo Dias, obra cit., pág. 292. 6. Cf. “Revista Portuguesa de Ciência Criminal”, Ano 16, n.º1, , pág. 155 a 166 e acórdão do STJ, de 09-01-2008, CJSTJ 2008, tomo 1. |