Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00027287 | ||
Relator: | MIRANDA GUSMÃO | ||
Descritores: | CHAMAMENTO À AUTORIA REQUISITOS DIREITO DE REGRESSO RELAÇÃO JURÍDICA CONEXÃO PESSOA COLECTIVA RESPONSABILIDADE CIVIL AGENTE MANDATÁRIO ACTO ILÍCITO NEXO DE CAUSALIDADE MATÉRIA DE FACTO | ||
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Nº do Documento: | SJ199505030868752 | ||
Data do Acordão: | 05/03/1995 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | BMJ N447 ANO1995 PAG431 | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 8915 | ||
Data: | 06/09/1994 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
Área Temática: | DIR PROC CIV. DIR CIV - DIR RESP CIV. | ||
Legislação Nacional: | CPC67 ARTIGO 325 N1. CCIV66 ARTIGO 500. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1979/06/28 IN BMJ N288 PAG360. ACÓRDÃO STJ DE 1980/03/10 IN BMJ N295 PAG299. ACÓRDÃO STJ DE 1983/04/28 IN BMJ N326 PAG419. ACÓRDÃO STJ PROC86483 DE 1995/02/23. | ||
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Sumário : | I - O chamamento à autoria pressupõe a verificação simultânea de dois requisitos: um, a conexão do direito invocado pelo Réu com a relação jurídica controvertida, pela qual o chamado possa ser responsabilizado em acção de regresso, pelos danos que cause a perda da demanda; outro, que o direito de regresso promane de qualquer facto legal ou contratual, mesmo ilícito, que envolva responsabilidade. II - A conexão do direito de regresso ou indemnização há-de surgir da própria existência e concreta configuração jurídica da relação controvertida. III - A responsabilidade civil da pessoa colectiva pelos actos dos seus representantes, mandatários ou agentes só existe quando os actos tenham, com as funções destes, uma conexão adequada. IV - Constitui matéria de facto o nexo de causalidade entre os actos ilícitos praticados pelos representantes, mandatários ou agentes da pessoa colectiva e as funções dos mesmos. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. A intentou acção de condenação contra B, pedindo a sua condenação no pagamento da indemnização de 20000000 escudos, a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, acrescida de juros à taxa legal desde a data da citação, bem como na quantia a liquidar em execução de sentença relativamente aos danos sofridos pelo autor e ainda não quantificáveis, decorrentes do descrito comportamento do Réu - Alega para tanto, e em síntese, que o Autor e o Réu tomaram posse dos cargos, respectivamente, de vice-presidente e de presidente do Sporting Clube de Portugal. - Porém o Réu, cedo, entrou em conflito com o autor, multiplicando-se em declarações públicas difamatórias e injúrias do bom nome e consideração deste, as quais foram prevalentemente efectuadas em conferências de imprensa e repetidamente publicitadas, designadamente através da rádio e da televisão. Tais imputações afectaram gravemente o Autor na sua vida pessoal, social e de negócios, causando-lhe prejuízos patrimoniais e não patrimoniais. - No prazo da contestação o Réu deduziu um incidente de chamamento à autoria do Sporting Clube de Portugal, alegando em síntese que o Autor fundamenta a presente acção em pretensos factos alegadamente praticados pelo Réu na sua qualidade de Presidente da Direcção do referido Clube. Ora, para a hipótese de o autor vir a obter vencimento na presente acção, então o Réu terá, no todo ou em parte, direito de regresso contra o Sporting Clube de Portugal, entidade em nome e representação de quem actua no exercício das funções de Presidente da respectiva Direcção. E para não ter de provar em eventual futura acção de indemnização que empregou nesta demandada todos os esforços para evitar a condenação o Réu pretende chamar o Sporting Clube de Portugal à autoria, existindo fundamento sério para o presente chamamento, não sendo intenção do Réu tornar mais difícil a posição do autor. - Notificado o chamamento ao autor, este opôs-se porquanto a requerida intervenção no processo do Sporting Clube de Portugal carece de fundamento sério e tem como exclusiva intencionalidade tornar mais difícil a posição do autor no processo. Por douto despacho de 7 de Janeiro de 1994 foi indeferido o pedido de chamamento à autoria do Sporting Clube de Portugal. - O Réu agravou. A Relação de Lisboa, por acórdão de 9 de Junho de 1994, negou provimento ao recurso. - O Réu agrava para este Supremo Tribunal, formulando as seguintes conclusões: 1) Atendendo à alegada situação de facto invocada pelo ora agravado e complementada pelo ora agravante no seu requerimento de chamamento à autoria do Sporting Clube de Portugal, justificava-se plenamente que este incidente fosse definido. 2) As afirmações produzidas pelo ora agravante foram-no não só por ocasião mas também por causa e no pleno exercício das suas funções de Presidente da Direcção do Sporting Clube de Portugal, em nome e representação de quem o ora agravante actuou, em defesa a ataques anteriores contra ele, nessa qualidade, proferidos pelo ora agravado e com o intuito de prestar à massa associativa e aos colaboradores do Clube os esclarecimentos pretendidos, mantendo assim a união no seio da família sportinguista. 3) De outro modo, nunca teriam sido proferidas tais afirmações, pois a questão subjacente nem sequer era pessoal, nem tão pouco os órgãos de comunicação social as quereriam veicular, como resulta de uma simples leitura da douta p.i. 4) No caso, impossível, de vir a ser condenado o ora agravante teria, assim, no todo ou em parte, consoante viesse a ser apurado em eventual futura acção, direito de regresso contra o Sporting Clube de Portugal, de acordo com o disposto nos artigos 165 e 500 do Código Civil. 5) Por outro lado, em caso algum (quer o chamado declarasse não aceitar a autoria, quer a aceitasse) a posição do ora agravado no processo tornar-se-ia mais difícil do que já é, tanto mais que não é legítimo deduzir que o ora agravante viesse a requerer a sua exclusão da causa. 6) Mas, mesmo que isso viesse a acontecer, tal não foi, nem é, a intenção do ora agravante, além do que, reconhecidamente, o incidente não carece de fundamento sério o que tudo seria exigido pelo n. 2 do artigo 326 do Código de Processo Civil para efeitos do seu indeferimento. 7) Assim sendo, o referido chamamento não podia nem devia ter sido indeferido. 8) Tendo-o sido, foi violado o disposto nos artigos 156 e 500 do Código Civil e nos artigos 325 e 326 ns. 2 e 3, do Código de Processo Civil. 9) Motivo porque se impõe a revogação desse douto despacho, com o consequente deferimento do requerido chamamento à autoria. 2. O agravado apresentou contra-alegações onde salienta que: 1) Carece o incidente de chamamento à autoria de fundamento sério, porque visa, exclusivamente, tornar mais difícil a posição do agravado Autor na acção, no desenrolar desta. 2) Face ao que foi dito e os autos patenteiam o agravante não actuou, ao dirigir os insultos que dirigiu ao agravado, no exercício das suas funções de presidente da Direcção do Sporting, mas, claramente, em veste própria, e dando vasão a uma conflitualidade pessoal. 3) Como ponderam, motivadamente, as instâncias, não se insere no âmbito da competência de um membro do órgão colegial de gestão do Clube, insultar, avulsamente, um outro membro desse órgão, sem que nenhum virtual interesse do Clube com isso possa aproveitar. 4) Não há qualquer conexão possível entre a situação criada pelo agravante, e que esteve na génese da acção, e as suas atribuições funcionais. 5) Está, pois, preenchida a previsão do n. 2 do artigo 326 do Código de Processo Civil não tendo sido violada pelas instâncias qualquer norma de direito substantivo. Corridos os vistos, cumpre decidir. II Elementos a tomar em conta: - A Relação destacou da petição inicial, com vista a surpreender a causa de pedir da presente acção, a seguinte matéria factual: 1) o autor imputa ao Réu factos ofensivos da sua honra em conferências de imprensa e repetidamente publicitadas, designadamente através da rádio e da televisão, numa altura em que aquele era vice-presidente e este presidente do Sporting Clube de Portugal. 2) O Réu tinha dito na R.T.P., para além do mais, que: "o autor revelava antisportinguismo; está desequilibrado; está a dizer mentiras; revela incompetência; queria destruir a equipa de futebol e as amadoras; não é esclarecido nem tem competência; não tem feito nada na vida; não paga, guarda para si; é antisportinguista. 3) O Réu disse aos órgãos de comunicação social que: "O autor é um engenheiro de aviário, nem para moço de recados servia; que o meu motorista é, de longe, mais competente e, como é óbvio, nunca iria prestar serviços ao Vitória de Guimarães. 4) Estas e outras informações que Autor imputou ao Réu afectaram-lhe gravemente a sua vida pessoal, social e de negócios causando-lhe prejuízos patrimoniais e não patrimoniais. III Questões a apreciar no presente recurso. A apreciação e a decisão do presente recurso, delimitado pelas conclusões das alegações, passa, fundamentalmente, pela análise de duas questões: a primeira, se o requerido chamamento não podia nem devia ter sido indeferido; a segunda, se carece de fundamento sério o chamamento à autoria do Sporting Clube de Portugal. A primeira questão desdobra-se em duas subquestões: a primeira, termos em que o direito de regresso invocado pelo Réu determina a aplicabilidade do n. 1 do artigo 325, do Código de Processo Civil; a segunda, se o direito de regresso invocado pelo Réu promana de responsabilidade civil do Sporting Clube de Portugal pelos factos ilícitos imputados pelo autor ao Réu. - a segunda questão ficará prejudicada na sua apreciação caso a primeira (através das duas subquestões) sofra resposta negativa. Na verdade, a terceira questão pressupõe que o chamamento à autoria possa ser admitido, sendo certo que essa possibilidade dependerá da verificação de dois pressupostos: um, a conexão do direito invocado pelo Réu com a relação jurídica controvertida, pela qual o chamado possa ser responsabilizado, em acção de regresso, pelos danos que lhe causa a perda da demanda; outro, que o direito de regresso promane de qualquer facto legal ou contratual, mesmo ilícito, que envolva responsabilidade (conforme Jurisprudência deste Supremo Tribunal - Acórdão de 28 de Abril de 1983, no Boletim do Ministério da Justiça n. 326, página 419). A resposta negativa às duas subquestões terá o significado da não verificação dos referenciados pressupostos. Abordemos tais questões. IV Termos em que o direito de regresso invocado pelo Réu determina a aplicabilidade do n. 1 do artigo 325, do Código de Processo Civil. 1. O artigo 325 n. 1 do Código de Processo Civil prescreve que o Réu que tenha acção de regresso contra terceiro para ser indemnizado do prejuízo que lhe cause a perda da demanda pode chamá-lo à demanda. - Trata-se de um incidente suscitado pelo Réu que pretende trazer ao processo o titular de uma relação jurídica conexa com a relação material controvertida - a que tem por conteúdo o direito de regresso dele Réu contra o terceiro - chamado pelos danos decorrentes da sucumbência da lide. A própria terminologia empregue na norma transcrita indicia a necessidade de uma conexão da relação controvertida com o "direito de regresso" que o Réu se arroga sobre o chamado: prejuízo e subsequente direito de regresso têm de ser causados pela perda da demanda - isto é, têm de derivar da condenação do Réu face à pretensão do autor - não podendo, portanto, emergir de qualquer outro facto. A própria existência do direito de regresso ou indemnização deverá, portanto, ser afectada pela discussão da causa, sendo elemento essencial à responsabilidade do chamado perante o Réu a própria responsabilidade deste com o autor. Por outras palavras, a conexão do direito de regresso ou indemnização há-de surgir da própria existência e concreta configuração jurídica da relação controvertida. Faltando esta conexão, quando a relação controvertida e o direito de regresso forem relações jurídicas e autónomas, baseadas em factos constitutivos essencialmente diversos (ou seja, sem qualquer nexo de dependência entre si), não será de admitir o chamamento. São estes os ensinamentos colhidos quer na doutrina (A. dos Reis, Código de Processo Civil anotado volume I, página 435; Lopes rego, chamamento à autoria, Revista do Ministério Público, ano 4, volume 14, páginas 79, 80 e 83) quer na jurisprudência deste Supremo Tribunal (acórdãos de 28 de Junho de 1979 - B.M.J. n. 288, página 360 - e de 10 de Março de 1980 - B.M.J. n. 295, página 299). Verificado o requisito de conexão da relação controvertida com o "direito de regresso" que o Réu se arroga sobre o chamado, nos termos expostos, o chamamento à autoria será de admitir logo que o direito de regresso tenha emergido da lei, de negócio jurídico ou de facto ilícito gerador de responsabilidade civil (acórdão de 28 de Abril de 1983 - Boletim do Ministério da Justiça n. 326, página 419). 2. Expostas estas considerações apliquemo-las ao caso "sub-judice". Através da petição inicial verifica-se que o Autor formula o pedido de condenação do Réu ao pagamento de indemnização invocando como fundamento (causa de pedir) que o Réu proferiu factos ofensivos da sua honra em conferências de imprensa e repetidamente publicitadas, designadamente através da rádio e da televisão, numa altura era (ele autor) vice-presidente e este presidente do Sporting Clube de Portugal (cfr. facto referido em 1), parágrafo II do presente acórdão). - Perante a concreta configuração jurídica da relação controvertida (Autor ter direito a indemnização por danos causados pelo Réu por factos ilícitos por este praticados numa altura em que era Presidente do Sporting Clube de Portugal, surge a questão de saber se aquela relação se apresenta como condicionante ou prejudicial à existência do direito de restituição ou indemnização do Réu contra o Sporting Clube de Portugal, ou seja, se a conexão do direito de regresso surge da relação controvertida, tal como vem sendo configurada na petição inicial. A resposta depende da apreciação da segunda subquestão, na medida em que a existência de "conexão" pressupõe a existência do próprio "direito de regresso". V Se o direito de regresso invocado pelo Réu promana de responsabilidade civil do Sporting Clube de Portugal pelos factos ilícitos imputados pelo autor ao Réu. 1. Posição da Relação e do recorrente: 1a) A Relação de Lisboa decidiu não ser admissível o chamamento à autoria do Sporting Clube de Portugal por não se verificar responsabilidade extracontratual desse clube pelas injúrias proferidas pelo Réu, na medida em que embora praticadas numa ocasião em que este exercia funções de presidente da Direcção desse Clube, jamais se pode entender que tenham sido proferidas por causa do exercício das suas funções. 1b) O recorrente discorda da decisão da Relação por entender que, por um lado, é demasiado limitativo dizer-se que uma pessoas colectiva não foi criada para difamar ou injuriar alguém e, que, portanto, não cabe nas competências do seu representante fazer este tipo de afirmações. Por outro lado as declarações proferidas pelo ora agravante foram no exercício das suas funções de Presidente da Direcção do Sporting Clube de Portugal: não fosse a necessidade de responder aos pedidos de esclarecimento da massa associativa, não teria respondido ao ora agravado e, muito menos, teria sido abordado pelos órgãos de comunicação social para veicular por essa forma as suas respostas. Que dizer? 2. O artigo 165 do Código Civil, referindo-se à responsabilidade civil da pessoa colectiva para com terceiros pelos actos ou omissões dos seus representantes, agentes ou mandatários, consagra a doutrina que a pessoa colectiva é havida como comitente e estes como comissários para o efeito da aplicação do disposto no artigo 500. - Nos termos do artigo 500 do Código Civil para que haja responsabilidade civil do comitente necessário se torna a verificação simultânea de três pressupostos: vínculo entre comitente e comissário, prática de facto ilícito no exercício da função e responsabilidade do comissário. - Em causa está tão somente o alcance do segundo pressuposto. 3. A responsabilidade do comitente, diz o n. 2 do artigo 500: só existe se o facto danoso for praticado pelo comissário... no exercício da função que lhe foi confiada - não importando que intencionalmente ou contra as instruções daquele. - Face a esta norma, quando pode o acto ser considerado praticado no exercício das suas funções? - E a questão põe-se na medida em que o comissário pode praticar factos que, muito embora não representem, quando considerados isoladamente, o desempenho directo das funções que lhe foram confiadas, todavia se conexionam com elas. - Saber qual o grau de conexão necessário para responsabilizar o comitente é problema que tem dado origem a dificuldades. - A fórmula restritiva adoptada na lei significa que, por um lado, afastada está a orientação de que o comitente só responderia quando o comissário, no desempenho das suas funções, obedecesse rigorosamente às instruções que lhe foram dadas (a responsabilidade mantém-se ainda que o acto seja praticado intencionalmente contra as instruções), por outro lado, afastada está também a orientação de que o comitente seria responsável por todos os actos do comissário que tenham com as suas funções alguma conexão, ainda que meramente ocasional. "Com a formula restritiva adoptada, a lei quis afastar da responsabilidade do comitente os actos que apenas têm um nexo temporal ou local com a comissão" (Antunes Varela, Das obrigações em geral, volume I, 6. edição, página 611). - A orientação preferível consistirá em responsabilizar o comitente pelos factos ilícitos do comissário que tenham com as funções deste uma conexão adequada. Por outras palavras, deverá entender-se que um facto ilícito foi praticado no exercício da função confiada ao comissário quando, quer pela natureza dos actos de que foi incumbido, quer dos instrumentos ou objectos que lhe foram confiados, ele se encontra numa posição especialmente adequada à prática de tal facto (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, volume I, 4. edição, página 508). - Era esta a orientação defendida por Manuel Andrade face ao Código de Seabra (Teria Geral da Relação Jurídica, volume I, 1960, página 151) e também adoptada por Mota Pinto quando escreve: "o órgão ou agente deve ter procedido em tal veste ou qualidade ou ter actuado por causa das suas funções, e não apenas por ocasião delas e que baste que o acto integre no quadro geral da respectiva competência. - "Assim, se um órgão de uma pessoa colectiva pratica um acto ilícito na conclusão de um negócio para o ente colectivo..., mas não já se aproveita para furtar um objecto à contraparte ou se a injuria ou se fumando, por descuido, provoca um incêndio" (Teoria Geral do Direito Civil, 1980, páginas 207 e 208). - E na mesma orientação se coloca Heinrich Ewald Horster quando diz: "Parece que será de responsabilizar a pessoa colectiva pelos actos dos seus representantes, mandatários ou agentes que, da perspectiva do lesado, tenham com as funções destes uma conexão adequada, uma vez que foi a pessoa colectiva quem os escolheu..." (a Parte Geral do Código Civil Português, 1992, página 395). - Concluimos, secundando os ensinamentos de Pires de Lima e Antunes Varela: "Trata-se, afinal, de aplicar, também aqui, num problema de responsabilidade pelo risco, a teoria da causalidade adequada, sempre que as funções do comissário, segundo um critério de experiência, favoreçam ou aumentam o perigo de verificação de certo dano, deverá o comitente arcar com a respectiva responsabilidade" (obra citada, página 509). 4. Perante as considerações expostas, em conjugação com a materia factual fixada pela Relação, com vista à caracterização jurídica da relação controvertida, haverá que avançar que não existe o direito de regresso invocado pelo Réu, na medida em que o chamado - Sporting Clube de Portugal - não tem qualquer responsabilidade civil pelos factos ilícitos imputados pelo Autor ao Réu. - Face à matéria factual fixada pela Relação a caracterizar a relação contravertida há que reconhecer que os factos ilícitos imputados pelo autor ao Réu não foram praticados quer no exercício das suas funções de presidente de direcção do Sporting Clube de Portugal quer por causa das suas funções, sendo certo que o nexo de causalidade entre os factos ilícitos e as funções do Réu constitui matéria de facto por não envolver interpretação de norma jurídica, como é o caso do nexo de causalidade entre o facto ilícito e o dano na responsabilidade civil por facto ilícito, conforme jurisprudência recente deste Supremo Tribunal (Acórdão de 23 de Fevereiro de 1995 - Revista n. 86483, 2. secção - não publicados - e acórdãos no mesmo citados, também não publicados). - O nexo de causalidade entre os factos ilícitos que o Autor imputa ao Réu e as funções deste não foi dado como provado pelo Tribunal da Relação, de sorte que, como matéria de facto que é, não pode ser objecto de recurso para este Supremo Tribunal. - É, pois, definitiva a decisão que sobre ele proferiu a Relação, não podendo este Supremo Tribunal concluir, em contrário, pela existência de tal nexo. 5. E não existindo, como não existe, o direito de regresso invocado pelo Réu, afastada fica a aplicabilidade do n. 1 do artigo 325, Código de Processo Civil, mercê da inverificação de um dos pressupostos para a admissibilidade do incidente do chamamento à autoria, precisamente a conexão do direito invocado pelo Réu com a relação jurídica controvertida pela qual o chamado Sporting Clube de Portugal possa ser responsabilizado, por acção de regresso, pelos danos que àquele cause a perda da demanda. VI Conclusão: Do exposto, poderá extrair-se que: 1) O chamamento à autoria pressupõe a verificação simultânea de dois requisitos: um, a conexão do direito invocado pelo Réu com a relação jurídica controvertida, pela qual o chamado possa ser responsabilizado, em acção de regresso, pelos danos que lhe cause a perda da demanda; outro, que o direito de regresso promane de qualquer facto legal ou contratual, mesmo ilícito, envolva responsabilidade. 2) A conexão do direito de regresso ou indemnização há-de surgir da própria existência e concreta configuração jurídica da relação controvertida. 3) A responsabilidade civil da pessoa colectiva pelos actos dos seus representantes, mandatários ou agentes só existe quando os actos tenham com as funções destes uma conexão adequada. 4) Constitui matéria de facto o nexo de causalidade entre os actos ilícitos praticados pelos representantes, mandatários ou agentes de pessoa colectiva e as funções dos mesmos. Face a tais conclusões, em conjugação com a matéria factual fixada, poderá precisar-se que: 1) o chamamento á autoria do Sporting Clube de Portugal não foi nem deve ser admitido por não se verificarem os dois requisitos da sua admissibilidade: os indicados na primeira conclusão; 2) o acórdão recorrido não merece censura por ter observado o afirmado em 1). Termos em que se nega provimento ao recurso, assim, confirma-se o acórdão recorrido. Custas pelo agravante. Lisboa, 3 de Maio de 1995. Miranda Gusmão, Araújo Ribeiro, Raúl Mateus. Decisões impugnadas: I- Despacho de 7 de Janeiro de 1994 do 10. Juízo Cível - 3. Secção de Lisboa; II- Acórdão de 9 de Junho de 1994 da Relação de Lisboa. |