Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
30738/21.2T8LSB.L1.S2
Nº Convencional: 4.ª SECÇÃO
Relator: RAMALHO PINTO
Descritores: REVISTA EXCECIONAL
RELEVÂNCIA JURÍDICA
Data do Acordão: 06/19/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA EXCEPCIONAL
Decisão: NÃO ADMITIDA A REVISTA EXCECIONAL.
Sumário :

Não há lugar à intervenção do Supremo Tribunal de Justiça para os efeitos das alíneas a) e b) do nº 1 do artº 672º do CPC quando as questões levantadas pelo recorrente não encontram qualquer suporte nos factos dados como provados.

Decisão Texto Integral:


Processo 30738/21.2T8LSB.L1.S2


Revista Excepcional


158/24


Acordam na Formação a que se refere o nº 3 do artigo 672.º do Código de Processo Civil da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


AA intentou acção declarativa de condenação contra Topocampo – Serviços de Topografia e Trabalhos de Campo, Ldª e BB, peticionando a final o seguinte:


Nestes termos e nos mais de direito que V. Exa, doutamente suprirá, deve a presente acção ser julgada procedente por provada, e em consequência serem os RR. condenados solidariamente no pagamento ao A. das seguintes quantias:


A) salário + subsídio de alimentação de 19 a 31 de Outubro de 2020 = 13 dias = €668,30 + € 6,41 x 10 dias úteis = € 64,10 totalizando € 732,40;


- salário + subsídio e alimentação de Novembro de 2020 = € 1542,22 + 21 dias úteis x € 6,41 totalizando € 1.676,83;


- salário + subsídio e alimentação de Dezembro de 2020 = € 1542,22 + 21 dias úteis x € 6,41 totalizando € 1.676,83;


- salário de Janeiro de 2021 = € 205,42;


- Subsídio de Natal de 2020 € 1.542,22;


- Subsídio de férias vencidas e não gozadas € 1.542,22


- Férias vencidas e não gozadas € 1.542,22


- Crédito de horas de formação nunca gozado ao longo de todo o tempo de trabalho (artigos 131.º e 134.º do Código do Trabalho): 35 horas x por cada ano de trabalho (29 anos) = 1015 horas x € 9,63/ hora = € 9.774,45.


B) Compensação por cessação justificada da relação laboral (artigos 394.º e 396.º do Código do Trabalho) € 1.542,22 x 29 anos de trabalho = € 44.724,38.


C) € 4.022,26 relativos a reembolso de despesas suportadas pelo A. quando em prestação de trabalho deslocado por conta e em benefício dos RR.;


D) € 7.500,00 a título de indemnização por danos morais.


Às quantias A) B) e C) acrescem juros de mora à taxa de juros aplicável supletivamente às obrigações civis que é de 4% ao ano contados a partir de 12 de Janeiro de 2021, data em que os RR. receberam interpelação para pagamento e que se computam em € 2.432,43.


À quantia indicada e D) serão devidos juros de mora desde a data da citação.


Sobre todas as quantias A) a D) serão ainda devidos de juros de mora vincendos até integral pagamento, à taxa de juros aplicável supletivamente às obrigações civis que é de 4% ao ano.”.


Citados, os Réus contestaram e deduziram reconvenção, requerendo a condenação do Autor a pagar a quantia de € 2.628,33 por incumprimento de pré-aviso.


Por sentença de 13.04.2023, o Tribunal de 1ª instância decidiu o seguinte:


Decisão


1. Nos termos e fundamentos expostos e atentas as disposições legais citadas, julga-se a acção principal parcialmente procedente e, em consequência decide-se:


1. Condenar a ré Topocampo – Serviços de Topografia e Trabalhos de Campo, Lda. a pagar ao autor AA, as seguintes quantias:


i. € 321,28 (trezentos e vinte e um euros e vinte e oito cêntimos) a título de subsídio de Natal proporcional do ano de 2020.


ii. € 411,25 (quatrocentos e onze euros e vinte e cinco cêntimos) de férias vencidas e não gozadas e respectivo subsídio de férias do ano de 2020.


iii. € 2.753,74 (dois mil, setecentos e cinquenta e três euros e setenta e quatro cêntimos) a título de formação profissional dos anos de 2004, 2005, 2006, 2007, 2008, 2016, 2017, 2018, 2019 e 2020.


iv. Juros de mora à taxa legal sobre as quantias acima referidas, actualmente fixada em 4%, desde a data de vencimento até integral e efectivo pagamento.


2. Condenar os réus solidariamente Topocampo – Serviços de Topografia e Trabalhos de Campo, Lda. e BB a pagar ao autor AA, a quantia de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros) a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde a data da sentença até integral e efectivo pagamento.


3. Julgar procedente a acção reconvencional e, em consequência, decide-se:


i. Condenar o autor/reconvindo AA a pagar à ré Topocampo – Serviços de Topografia e Trabalhos de Campo, Lda., a quantia de € 2.628,33 (dois mil, seiscentos e vinte e oito euros e trinta e três cêntimos), por falta de aviso prévio na comunicação de resolução do contrato, acrescida de juros de mora à taxa legal, fixada actualmente em 4%, desde a data da citação até integral e efectivo pagamento.”.


O Autor interpôs recurso de apelação e os Réus interpuseram recurso subordinado.


Por acórdão de 24.01.2024, o Tribunal da Relação decidiu o seguinte:


Em face do exposto, decide-se julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo autor (AA) e totalmente improcedente o recurso subordinado interposto pelos reconvintes (Topocampo – Serviços de Topografia e Trabalhos de Campo, Ldª e BB), tudo nos termos sobreditos e nesta conformidade:


I – Determina-se a correcção do erro de escrita, por forma a que, doravante, na página 4 da sentença recorrida, antes da enumeração dos factos com os itens 1 a 143, conste o vocábulo “…provaram-se… “;


II – Determina-se a sanação da omissão de escrita, por forma a que, doravante, no último parágrafo da página 41 da sentença recorrida, entre os vocábulos “..instrumentos..” e “..desestabilizar” do item 134 dos factos provados, se entrelinhem os dizeres: «… de trabalho ou atribuir quaisquer tarefas, corporiza assédio moral, com intuito claro de me…»;


III – Determina-se a eliminação do item 4 dos factos não provados e aditando-se aos factos provados o seguinte item nº 128-A com a seguinte redacção:


« 128-A – Por volta de Outubro de 2020, a ACT tentou contactar os réus, mas sem êxito »;


IV – Determina-se a eliminação do item 8 dos factos não provados e que o item 23 dos factos provados passe a ter a seguinte redacção: « 23 - Em data não concretamente apurada mas no ano de 2019, o autor (juntamente com um trabalhador da S......) foi por um dia inteiro colocado a levantar e a colocar, repetidamente, uma tampa de esgoto em frente ao local de trabalho, por ordem do 2º réu, referindo este que era um “treino” para alegadamente cronometrar o tempo mínimo de execução da alegada tarefa »;


V – No mais, confirmando-se a douta sentença recorrida.”.


No dia 06.02.2024, o Autor apresentou um requerimento dirigido ao Tribunal da Relação, arguindo nulidades e inconstitucionalidades do acórdão.


No dia 29.02.2024 o Autor veio interpor recurso de revista excepcional, arguindo igualmente nulidades. Foram apresentadas contra-alegações.


Em 6.03.2024 foi proferido acórdão considerando improcedentes as nulidades invocadas.


x


O processo foi distribuído a esta Formação, para se indagar se estão preenchidos os pressupostos para a admissibilidade da revista excepcional referidos nas alíneas a) e b) do nº 1 do artº 672º do Código de Processo Civil.


O Autor invocou nas conclusões, com vista a essa admissibilidade, o seguinte:


a) O douto acórdão recorrido veio corrigir a douta sentença proferida em sede de 1.ª instância, determinando a grande maioria dos factos como factos efectivamente provados e ampliando outros com relevância para a decisão final.


b) Manteve a condenação dos Recorridos (entidade empregadora e o seu sócio gerente) por assédio moral que moveram sobre o Recorrente durante mais de 12 anos no pagamento de indemnização.


c) Manteve também a condenação do Recorrente a pagar à 1.ª Recorrida o valor correspondente à falta do cumprimento de pré-aviso para despedimento, porquanto, entendeu que e de forma amplamente contraditória com os factos considerados provados, que não se verificou justa causa para a resolução do contrato de trabalho por iniciativa do trabalhador, ora Recorrente, com todas as consequências legais.


d) Concluiu erradamente que o trabalhador se terá colocado ele próprio numa situação de indisponibilidade para o trabalho quando a factualidade assente aponta em sentido diametralmente inverso, razão pela qual conduz à inconformidade da decisão determinando o Recorrente ao presente recurso que se entende apenas poder ser de revista excepcional.


e) A lei processual prevê a admissibilidade da revista excepcional dependendo da verificação dos pressupostos enunciados nas várias alíneas do n.º 1 do art. 672.º do CPC, bem como do preenchimento dos requisitos gerais de recorribilidade exigidos pelo artigo 629.º, n.º 1, também do CPC, que se entendem preenchidos, desde logo os requisitos da alçada e da sucumbência.


f) Determina o disposto no n.º 1 do artigo 672.º do CPC que: “1 – Excepcionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando:


a) Esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;


b) Estejam em causa interesses de particular relevância social;


g) Conclui-se que o presente recurso de revista excepcional aborda questões que preenchem ambos os requisitos legais previstos na lei, razão pela qual se entender dever ser admitido.


h) No douto acórdão aqui recorrido, foi decidido com base nos factos considerados provados que os Recorridos não incumpriram nenhum dever laboral, designadamente o dever de ocupação efectiva do trabalhador, ora Recorrente e nesse sentido, que este não poderia fazer cessar o contrato de trabalho que o vinculava à Recorrida com justa causa, pois se tinha colocado “teimosamente” em situação de indisponibilidade para prestar trabalho.


i) Na página 57 da douta decisão recorrida, em que está patente sumário, é referido que “III – O autor que se coloca a si próprio numa situação de inactividade, não prestando qualquer trabalho em proveito da empregadora e nem sequer estando disponível para o fazer nos termos legítimos determinados por esta, podendo e devendo faze-lo, não tem fundamento para lhe imputar falta de ocupação efectiva.”


j) Contudo, de todos os factos provados (1 a 143), páginas 7 a 15 da decisão recorrida, resulta sumária e ostensivamente o seguinte:


I. O Recorrente comunicou aos Recorridos, após um longo período de baixa médica (1 ano), estando ausente do serviço, que pretendia regressar ao trabalho no dia 19 de Outubro de 2020;


II. Fê-lo por chamada telefónica e por subsequente SMS, já que durante a chamada telefónica o Recorrido BB lhe ter dito que “ele não vinha trabalhar quando queria” e pretendeu assegurar-se que a comunicação era efectuada por meio escrito;


III. O Recorrente recebeu de facto um SMS de um número desconhecido em resposta ao seu SMS, que não era proveniente de nenhum dos Recorridos, referindo que deveria deslocar-se para ... às 9h30, ponto de encontro ...;


IV. O Recorrente estranhou tal SMS pois que não podia receber ordens de outros que não dos Recorridos e não conhecia nenhum trabalho pendente em ..., bem como a sua hora de entrada era pelas 8h00 e não pelas 9h30, pelo que de imediato questionou, também por SMS remetido ao Recorrido BB, onde deveria recolher instrumentos de trabalho e como se deslocaria, uma vez que por norma, recolhia os instrumentos de trabalho junto à sede da Recorrida Topocampo, Lda, seu local habitual de trabalho, compostos de baldes, picaretas, enxada, pinos de localização, sistema de GPS e vara vertical de localização, bem como viatura correspondente usada para transporte e também ali seria onde recolheria instruções sobre tarefas concretas a executar, o que se afigurava essencial pois estava há 1 ano ausente do serviço por razões médicas.


V. Apesar do Recorrente ter pedido esclarecimentos (docs. 293 e 294 juntos com a PI) nenhuma resposta recebeu patente, pelo que informou que iria apresentar-se junto à sede da empresa o que fez, sendo ali o seu local de trabalho habitual e era dali que partia para campo já devidamente instruído com tarefas concretas a desempenhar, implicando as mesmas planificação prévia;


VI. No dia 19 de Outubro de 2020, apresentando-se para trabalhar o Recorrente encontrou a sede da empresa encerrada e que assim se manteve até 4 de Janeiro de 2021, data em que foi forçado a fazer cessar a relação laboral existente;


VII. Conforme facto 129 considerado provado, o Recorrente através do seu mandatário, remeteu correspondência registada em 20 de Outubro de 2020 aos Recorridos, solicitando a disponibilização de instrumentos de trabalho bem como “instruções e indicação de tarefas concretas” e que estes receberam em 28 de Outubro de 2020.


VIII. Conforme facto 130 considerado provado, foi remetida correspondência adicional aos Recorridos, invocando e pedindo a atribuição de tarefas concretas;


IX. Apesar de instados a tal, os Recorridos, nunca atribuíram ou indicaram tarefas concretas a efetuar ao Recorrente mantendo-se este junto ao local habitual de trabalho (sede da empresa) mantido intencionalmente encerrado pelos Recorridos, sem qualquer justificação.


X. O Recorrente manteve constante comunicação com os Recorridos, solicitando sempre instrumentos e trabalho para executar, enquanto se mantinha junto à sede da empresa.


XI. A sede da empresa foi mantida encerrada, sem qualquer justificação, enquanto o trabalhador ora Recorrente ali se manteve.


k) Conclui-se que tais factos contrariam, ampla e clamorosamente, a conclusão patente da douta decisão recorrida de que o Recorrente (e parafraseando a decisão ora recorrida) “se colocou na indisponibilidade para trabalhar”!


l) A decisão recorrida coloca em causa o próprio conceito jurídico de dever / direito à ocupação efectiva, no sentido em que descreve e qualifica condutas do trabalhador e do empregador que sendo seguidas por um qualquer trabalhador ou empregador, sejam ou não consistentes com o dever / direito à ocupação efectiva, que corresponde a uma garantia dos trabalhadores, um verdadeiro direito com proteção legal e constitucional, designadamente, artigo 129.º n.º 1 b) do Código do Trabalho e artigos 58.º e 59.º da Constituição de República Portuguesa.


m) Partindo do caso concreto mas, transpondo-o para uma situação em que estejam em causa uma qualquer empregadora e um qualquer trabalhador médio, se uma entidade empregadora recebe diversos pedidos de atribuição de tarefas por parte do trabalhador, e aquela nunca lhe responde indicando-lhe tarefas concretas se se impunha, de acordo com o princípio da boa fé e demais normas legais aplicáveis, conduta diversa, designadamente que informasse e elucidasse o trabalhador das tarefas a executar.


n) A tese propugnada na douta decisão recorrida dá cobertura, no modesto entendimento do Recorrente, a uma conduta de uma qualquer entidade empregadora como não sendo injustificadamente obstaculizadora da prestação efectiva de trabalho pelo trabalhador quando este se apresenta no seu local habitual de trabalho, solicita regularmente escrito registado e diversas SMS a atribuição de tarefas concretas e a entidade empregadora ignora os pedidos do trabalhador nunca lhe atribuindo qualquer tarefa e até fechando e mantendo fechada a sede da empresa, local de trabalho habitual, sabendo que o trabalhador ali se encontra diariamente durante mais de 2 meses e meio!


o) Conclui-se que decisão recorrida possui traços relevantes de ineditismo e que é susceptível de conduzir a uma alteração substancial e relevante do que deve entender-se como direito à ocupação efectiva e consequentemente, no caso de ser violado, quais as consequências respectivas, o que por si só justifica o presente recurso e a justa intervenção do Supremo Tribunal de Justiça por via de revista excecional.


p) A douta tese propugnada pela decisão recorrida padece de vício intrínseco, que conduz à sua nulidade por contrariar a lei em vigor, pois que dos factos provados não se pode concluir o que concluiu e decidiu, colocando em causa o conceito jurídico de dever de ocupação efectiva que se entende já bastante detalhado na jurisprudência, incluindo na jurisprudência do STJ.


q) A lei e bem assim as decisões judiciais que a aplicam destinam-se e devem contribuir para a modelação de comportamentos dos seus destinatários.


r) Desta forma a decisão, que influi directamente na vida do Recorrente, não deixa de ter repercussões sociais que transcendem amplamente o caso concreto.


s) Conclui-se que por via do presente recurso de revista excepcional e resolução das questões concretas enunciadas, se permitirá, uma melhor aplicação do direito, conforme imposto pelo n.º 3 do artigo 671.º e da alínea a) do n.º 1 do artigo 672.º ambos do CPC, contribuindo para uma mais precisa densificação dos conceitos de dever de ocupação efectiva e do que se pode entender como violação do mesmo e consequências jurídicas correspondentes, o que manifestamente possui relevância jurídica e social pelo grande impacto que tais conceitos têm na delimitação das condutas quer dos trabalhadores quer dos empregadores na generalidade.


t) As questões suscitadas apresentam um carácter paradigmático e exemplar transponível para outras situações, sendo controversas ou até inéditas, reclamando uma reflexão mais alargada que, no caso em apreço e atendendo à factualidade provada e já assente.


u) Se a comunicação entre um trabalhador e o seu empregador inexiste ou é equivoca colocando dúvidas ao trabalhador quanto ao local onde as tarefas serão executadas, instrumentos de trabalho a serem usados e quando nenhuma tarefa é efetivamente atribuída ao trabalhador o empregador não age de acordo com o princípio da boa fé e coloca manifestamente em causa o direito do trabalhador à ocupação efectiva.


v) Sabendo a entidade empregadora que um trabalhador se encontra junto à sede da empresa, correspondente ao seu local de trabalho habitual, por este a ter informado previamente, e onde recolhe por norma os seus instrumentos de trabalho e que questiona a mesma, pedindo-lhe por instrumentos de trabalho e indicação de tarefas concretas e a entidade empregadora não lhe responde, não indicando tarefas concretas ou localizando sequer os instrumentos de trabalho, tal configura um comportamento “injustificadamente obstativo à prestação efectiva de trabalho” e consequente violação dos deveres informação, cooperação, de esclarecimento e de lealdade patentes do artigo 126.º, do dever de respeito e de urbanidade da alínea a) do n.º 1 artigo 127.º e do dever de ocupação efectiva patente da alínea b) do n.º 1 do artigo 129.º, todos do Código do Trabalho.


w) Quando a entidade patronal decide unilateralmente manter as suas instalações encerradas (sede e local de trabalho habitual) durantes pelo menos 2 meses e meio, sabendo que o único trabalhador disponível para trabalhar ali aguarda por instrumentos de trabalho e atribuição concreta de tarefas, sem qualquer outra justificação, corporiza lock-out nos termos do n.º 1 do artigo 544.º do Código do Trabalho, conduta proibida por lei, e determina a violação das garantias dos trabalhadores, designadamente, do direito à ocupação efectiva traduzida no dever dos empregadores em não obstaculizarem injustificadamente a efectiva prestação de trabalho, conforme alínea b) do n.º 1 do artigo 129.º do Código do Trabalho.


x) Em face da matéria de facto considerada provada, conforme sumariamente acima referido, um trabalhador médio, na linha do conceito de homem médio e de diligência média, após pretender regressar ao trabalho no seguimento de baixa médica prolongada, resultante de assédio moral preconizado precisamente pela sua entidade empregadora e sócio gerente e que determinou, inclusivamente, a condenação judicial destes a pagar indemnização ao trabalhador, e se encontrar por cerca de 2 meses e meio a pedir à sua entidade empregadora por instrumentos de trabalho e atribuição de tarefas concretas sem nunca as receber e sem receber qualquer retribuição, tem o direito a fazer cessar justificadamente o contrato de trabalho nos termos do disposto no artigo 394.º n.º 1 e 2 alíneas a), b) e f) do Código do Trabalho, por violação ao direito da ocupação efetiva, assédio moral e falta de pagamento de retribuição.


y) De uma forma menos substantiva no que ao direito diz respeito, mas igualmente relevante para além do caso concreto, uma decisão judicial não pode desconsiderar factos provados de tal forma que contraria uma normal análise, decorrente de um linear silogismo judiciário cujo exercício se exige nas decisões judiciais, de forma que cause alarme social, como se entende ser o caso em apreço.


z) A ordem jurídica e os princípios de acesso ao direito e à justa composição dos litígios não podem admitir que numa decisão judicial se fundamente e seja mantida com base em factos inexistentes como é o caso nos autos, verificando-se contradição expressa e evidente, patente de páginas 37, parágrafo 5.º com página 38.º, parágrafo 3.º do douto Acórdão recorrido com influência manifesta na decisão final, pois é referido na douta decisão que o trabalhador em 19 de Outubro de 2020 estaria na posse dos instrumentos de trabalho, mas na página imediatamente anterior, parágrafos antes, é confirmado pela mesma decisão, que tais equipamentos e instrumentos de trabalho foram devolvidos pelo trabalhador à entidade empregadora em 25 de Novembro de 2019, praticamente 1 ano antes, gerando nulidade já arguida em sede de reclamação, factos esses claramente patentes no elenco de factos considerados provados, constituindo em nulidade que expressamente se invoca.


aa)Estamos perante questões por via das quais se enuncia, em bom rigor, que a decisão recorrida coloca em causa normas, institutos jurídicos e princípios, que assumem uma importante relevância jurídica e social, designadamente:


- Deveres da boa fé resultantes do contrato de trabalho (artigo 126.º CT e n.º 2 do artigo 762.º do CC),


- Dever de respeito e de urbanidade da alínea a) do n.º 1 artigo 127.º CT,


- Deveres de diligência do sócio gerente (artigo 64.º CSC);


- Direito à ocupação efectiva do trabalhador (alínea b) do n.º 1 do artigo 129.º CT e n.º 1 do artigo 58.º e alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º CRP);


- Falta de pagamento de retribuição ao trabalhador;


- Assédio moral (artigo 29.º do CT);


- Direitos de personalidade e fundamentais de um trabalhador (n.º 4 do artigo 57.º, n.º 1 do artigo 58.º e alínea b) do n.º 1 do artigo 59.º CRP);


- Lock-out ( n.º 4 do artigo 57.º CRP e artigo 544.º CT);


- Justa causa para resolução do contrato de trabalho (artigos 394.º e 395.º do CT),


bb) Em virtude dos factos considerados provados, verifica-se que os Recorridos violaram deveres da boa fé resultantes do contrato de trabalho, lock-out, direito à ocupação efectiva do trabalhador, direitos de personalidade e direitos fundamentais do trabalhador de uma forma que se podem replicar em relação a todos os demais trabalhadores se se mantiver a decisão ora recorrida.


cc) A decisão patente do douto acórdão aqui recorrido, com muito respeito pelo mesmo, viola ou desconsidera as normas, institutos e princípios acima mencionados e futura decisão semelhante violaria os mesmos preceitos, pelo que é necessário que as sobreditas questões sejam apreciadas em sede de revista excepcional para uma melhor aplicação do direito.


dd) Conclui-se que decisão recorrida que padece de inconformidades que determinam uma delimitação com traços de ineditismo e até contrária ao que qualquer homem médio pode entender quanto ao conceito jurídico da violação do direito à ocupação efectiva, assédio moral e suas consequências legais, que não só causam alarme social como se mostram suscetíveis de convocar problemáticas jurídicas futuras justificando a necessidade de justa decisão pela via da intervenção do Supremo Tribunal de Justiça.


ee) Da matéria de facto provada, resulta que o Recorrente não se colocou em situação de indisponibilidade para trabalhar e que tinha fundamentos para resolver o contrato de trabalho com justa causa nos termos das alíneas a), b), d) e f) do n.º 2 do artigo 394.º do CT.


ff) Por seu turno, considerando a decisão recorrida como comportamento lícito e não violadora de nenhum dever do contrato de trabalho ou legalmente previsto, a entidade empregadora que mantenha as suas instalações encerradas durante mais de dois meses consecutivos, que não pague a retribuição ao trabalhador, não responda e ignore o trabalhador durante mais de dois meses e não lhe atribua tarefas concretas para executar, apesar deste lho solicitar consecutivamente, até por escrito e por conseguinte se manter disponível para o trabalho, é algo que ofende uma normal percepção do homem médio e é susceptível de ser conduta repetida por outros empregadores não só gerando conflitos laborais como sobretudo injustiça e desnorte social e laboral.


gg) Pelas razões acima expressas e questões colocadas emconcreto, justifica-se a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça, de modo a assegurar uma melhor aplicação do direito, por via da resolução das questões jurídicas acima mencionadas, assumido estas um relevo indiscutível para qualquer trabalhador e caracter de excepcionalidade, as quais só por via de revista excepcional poderão agora ser apreciadas.


hh) O conceito de interesse de particular de relevância social patente do disposto no art. 672.º 1, b) do CPC), afigura-se bastante amplo, impõe a necessidade de aferir se os factos assentes a consequente decisão colide com valores sócio-culturais dominantes causando alarme social e gera inquietação e desconfiança, obstando à tranquilidade da sociedade em geral.


ii) Decisões judiciais cujo objecto seja conexo com a apreciação de condutas inerentes a deveres da boa fé resultantes do contrato de trabalho, deveres de diligência do sócio gerente, local de trabalho, direito à ocupação efectiva do trabalhador, falta de pagamento de retribuição ao trabalhador, assédio moral, direitos de personalidade do trabalhador, lock-out, direitos fundamentais do trabalhador e a justa causa para resolução do contrato de trabalho, são situações em que se verificam interesses de particular relevância social, sendo estruturantes de uma sociedade assente nas relações laborais e do que as mesmas representam para o sustento dos indivíduos e a manutenção ordeira e justamente composta de uma sociedade e consequentemente, de um Estado que se pretende de Direito.


jj) Assume um grande impacto e relevância social, num país, que desde de que é um Estado Direito de Democrático, considera fundamental a proteção do trabalho e dos direitos do trabalhador, que considera o trabalhador é a parte mais fraca numa relação laboral, que considera e protege constitucionalmente direitos dos trabalhadores como direitos fundamentais, que trabalhador tem direito ao trabalho, à retribuição, ao respeito e dignidade e onde são frequentes situações de assédio moral no trabalho, violação do direito a ocupação efetiva, falta de pagamento de salários e de resoluções do contrato de trabalho, com as consequências nefastas que dai advêm.


kk) Direitos esses que foram negados pela decisão ora recorrida ao colocar de parte a matéria de facto provada.


ll) A própria decisão ora recorrida faz constar como facto provado que:“Desde o dia 19/10/2020 até, pelo menos, ao dia 31/12/2020 [contrariando a sobredita comunicação sobre o local de trabalho] o autor apresentou-se para trabalhar nas instalações/sede da ré, sitas na Rua ..., as quais estavam encerradas, tendo o autor ficado à porta da mesma, sem prestar trabalho durante esse período;”


mm) Contudo, ignora a factualidade, pois que o trabalhador Recorrente não contrariou qualquer comunicação sobre local de trabalho, antes questionou a entidade empregadora sobre meios e trabalho a executar o que não lhe foi respondido ou elucidado, razão pela qual e como habitualmente fazia, antes do seu período de baixa médica, se apresentou no seu local de trabalho para levantar instrumentos de trabalho e recolher instruções e tarefas concretas a desempenhar.


nn) A execução das funções de topógrafo, exigem planificação prévia e análise de projecto que se esteja a executar, o que não era nem é compatível com o ir para uma determinada localidade sem nenhum conhecimento da mesma.


oo) A imposição de um trabalhador se deslocar para uma localização sem instrumentos de trabalho e sem qualquer indicação de tarefas pedindo o trabalhador clarificação à entidade empregadora que nunca recebe não se afigura compatível com qualquer atuação de boa-fé, princípio patente do disposto no artigo 126.º do Código do Trabalho.


pp) A douta decisão recorrida não podia ter concluído que o trabalhador se colocou em situação de indisponibilidade para trabalhar, e não só colide como ofende os valores sócio-culturais dominantes, nomeadamente direitos constitucionalmente consagrados, direitos de personalidade e direitos dos trabalhadores, deveres do empregador, e não pode deixar de suscitar alarme social, determinante de profundos sentimentos de inquietação, minando a tranquilidade da generalidade das pessoas.


qq) É alarmante para a tranquilidade da sociedade actual e colide com valores comunitários uma decisão judicial que considere que uma entidade empregadora possa fechar a sua sede por mais de dois meses consecutivos, não disponibilizar instrumentos de trabalho e tarefas concretas a um trabalhador que lhos pede consistentemente, não pagar qualquer retribuição ao trabalhador, praticar assédio moral sobre o trabalhador e se considere que não violou nenhum dever do contrato de trabalho.


rr) Uma decisão como é a recorrida, com o devido respeito, descredibiliza institutos jurídicos e princípios basilares do direito do trabalho, impondo-se a sua revogação a bem do Direito e da Justiça!


x


Cumpre apreciar e decidir:


A revista excepcional é um verdadeiro recurso de revista concebido para as situações em que ocorra uma situação de dupla conforme, nos termos do artigo 671º, nº 3, do Código de Processo Civil.


A admissão do recurso de revista, pela via da revista excepcional, não tem por fim a resolução do litígio entre as partes, visando antes salvaguardar a estabilidade do sistema jurídico globalmente considerado e a normalidade do processo de aplicação do Direito.


De outra banda, a revista excepcional, como o seu próprio nome indica, deve ser isso mesmo- excepcional .


O Recorrente invoca como fundamento da admissão do recurso o disposto nas alíneas a) e b) do nº 1 do artigo 672º do Código de Processo Civil, que referem o seguinte:


“1 - Excecionalmente, cabe recurso de revista do acórdão da Relação referido no n.º 3 do artigo anterior quando:


a) Esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito;


b) Estejam em causa interesses de particular relevância social”.


Nas palavras do acórdão de 27/909/2023, proc. 3604/22.7T8VNF.G1.S2 reclamam a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça as questões “cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”, como tal se devendo entender, designadamente, as seguintes:


- “Questões que motivam debate doutrinário e jurisprudencial e que tenham uma dimensão paradigmática para casos futuros, onde a resposta a dar pelo Supremo Tribunal de Justiça possa ser utilizada como um referente.” (Ac. do STJ de 06-05-2020, Proc. n.º 1261/17.1T8VCT.G1.S1, 4.ª Secção).


– Quando “existam divergências na doutrina e na jurisprudência sobre a questão ou questões em causa, ou ainda quando o tema se encontre eivado de especial complexidade ou novidade” (Acs. do STJ de 29-09-2021, P. n.º 681/15.0T8AVR.P1.S2, de 06-10-2021, P. n.º 12977/16.0T8SNT.L1.S2, e de 13-10-2021, P. n.º 5837/19.4T8GMR.G1.S2).


– “Questões que obtenham na Jurisprudência ou na Doutrina respostas divergentes ou que emanem de legislação que suscite problemas de interpretação, nos casos em que o intérprete e aplicador se defronte com lacunas legais, e/ou, de igual modo, com o elevado grau de dificuldade das operações exegéticas envolvidas, em todo o caso, em todas as situações em que uma intervenção do STJ possa contribuir para a segurança e certeza do direito.” (Ac. do STJ de 06-10-2021. P. n.º 474/08.1TYVNG-C.P1.S2).


“Questões que obtenham na jurisprudência ou na doutrina respostas divergentes ou que emanem de legislação com elevado grau de dificuldade das operações exegéticas envolvidas, suscetíveis, em qualquer caso, de conduzir a decisões contraditórias ou de obstar à relativa previsibilidade da interpretação com que se pode confiar por parte dos tribunais.” (Ac. do STJ de 22-09-2021, P. n.º 7459/16.2T8LSB.L1.L1.S2).


– Questão “controversa, por debatida na doutrina, ou inédita, por nunca apreciada, mas que seja importante, para propiciar uma melhor aplicação do direito, estando em causa questionar um relevante segmento de determinada área jurídica” (Ac. do STJ de 13-10-2009, P. 413/08.0TYVNG.P1.S1).


- “Questão de manifesta dificuldade e complexidade, cuja solução jurídica reclame aturado estudo e reflexão, ou porque se trata de questão que suscita divergências a nível doutrinal, sendo conveniente a intervenção do Supremo para orientar os tribunais inferiores, ou porque se trata de questão nova, que à partida se revela suscetível de provocar divergências, por força da sua novidade e originalidade, que obrigam a operações exegéticas de elevado grau de dificuldade, suscetíveis de conduzir a decisões contraditórias, justificando igualmente a sua apreciação pelo STJ para evitar ou minorar as contradições que sobre ela possam surgir.” (Ac. do STJ de 02.02.2010, P. 3401/08.2TBCSC.L1.S1).


No que concerne à excepção à regra da irrecorribilidade em situações de dupla conforme, a que se refere o disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 672º do Código de Processo Civil, Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís F. P. Sousa (CPC Anotado, Almedina Vol. I, 2018), referem que “Na segunda exceção, por estarem em causa interesses de particular relevo social, serão de incluir ações cujo objeto respeite, designadamente, a interesses importantes da comunidade, à estrutura familiar, aos direitos dos consumidores, ao ambiente, à ecologia, à qualidade de vida, à saúde ou ao património histórico e cultural, valores que naturalmente se sobrepõem também ao mero interesse subjetivo da parte da admissibilidade do terceiro grau de jurisdição”.


No acórdão recorrido, e conforme consta nomeadamente do seu sumário, considerou-se que “O autor que se coloca a si próprio numa situação de inactividade, não prestando qualquer trabalho em proveito da empregadora e nem sequer estando disponível para o fazer nos termos legítimos determinados por esta, podendo e devendo fazê-lo, não tem fundamento para lhe imputar falta de ocupação efectiva”.


O Recorrente identifica, nas conclusões m), n) e o) do seu recurso, questões que, no seu entender, justificam a intervenção deste STJ em sede de revista excepcional:


“m) Partindo do caso concreto mas, transpondo-o para uma situação em que estejam em causa uma qualquer empregadora e um qualquer trabalhador médio, se uma entidade empregadora recebe diversos pedidos de atribuição de tarefas por parte do trabalhador, e aquela nunca lhe responde indicando-lhe tarefas concretas se se impunha, de acordo com o princípio da boa fé e demais normas legais aplicáveis, conduta diversa, designadamente que informasse e elucidasse o trabalhador das tarefas a executar.


n) A tese propugnada na douta decisão recorrida dá cobertura, no modesto entendimento do Recorrente, a uma conduta de uma qualquer entidade empregadora como não sendo injustificadamente obstaculizadora da prestação efectiva de trabalho pelo trabalhador quando este se apresenta no seu local habitual de trabalho, solicita regularmente escrito registado e diversas SMS a atribuição de tarefas concretas e a entidade empregadora ignora os pedidos do trabalhador nunca lhe atribuindo qualquer tarefa e até fechando e mantendo fechada a sede da empresa, local de trabalho habitual, sabendo que o trabalhador ali se encontra diariamente durante mais de 2 meses e meio!


o) Conclui-se que decisão recorrida possui traços relevantes de ineditismo e que é susceptível de conduzir a uma alteração substancial e relevante do que deve entender-se como direito à ocupação efectiva e consequentemente, no caso de ser violado, quais as consequências respectivas, o que por si só justifica o presente recurso e a justa intervenção do Supremo Tribunal de Justiça por via de revista excecional”.


Tendo também e essencialmente em conta que a problemática do direito à ocupação efectiva tem sido objecto de abundante tratamento doutrinal e jurisprudencial, é decisivo que, por um lado, o Recorrente na grande parte das conclusões do seu recurso limita-se a manifestar a sua discordância quanto à qualificação jurídica dos factos efectuada pelo acórdão recorrido e, por outro, as questões propostas pelo mesmo Recorrente não encontram qualquer suporte nos factos dados como provados.


Como acertadamente e elencando o essencial desses factos se diz no acórdão recorrido:


Antes de findar a baixa médica [em que o autor estivera desde 20/9/2019 a 16/10/2020], mais concretamente, no dia 15/10/2020 o autor comunicou (por sms) ao réu a intenção de retomar o trabalho (como topógrafo) no dia 19/10/2020 (2ª feira);


Mas [contrariamente ao alegado na carta resolutória], apurou-se que o autor recebeu (por sms), no dia 16/10/2020, uma comunicação dirigida a si, informando-o que o local de trabalho era em ..., às 9 horas do dia 19/10/2020 e o ponto de encontro na respectiva ... e sem que lhe tivesse comunicado mais nada em contrário. Aliás (por sms em 23/10/2020) foi-lhe reiterado tal local de trabalho e dada conta da sua desobediência reiterada em comparecer no indicado local trabalho onde se encontravam os seus instrumentos de trabalho;


Desde o dia 19/10/2020 até, pelo menos, ao dia 31/12/2020 [contrariando a sobredita comunicação sobre o local de trabalho] o autor apresentou-se para trabalhar nas instalações/sede da ré, sitas na Rua ..., as quais estavam encerradas, tendo o autor ficado à porta da mesma, sem prestar trabalho durante esse período;


Durante esse período, o autor enviou ao réu vários sms (mais concretamente dois por cada dia útil, perfazendo 85 sms´s), nomeadamente, dando-lhe conta que ali tinha permanecido nesses termos e que aguardava que lhe fosse distribuído trabalho e meios para o fazer; Para além de duas missivas enviadas aos réus, em 20/10/2020 e 23/10/2020 e que foram recepcionadas; Para além de a ACT ter constatado, por volta de Outubro de 2020, que o autor estava à porta da encerrada sede da ré e tentado, sem êxito, contactar os réus;


Sendo que o autor tinha na sua posse a viatura profissional da ré e equipamentos de trabalho desta e os quais se mantiveram na posse deste antes da baixa médica até ao dia 25/11/2019 (data em que foram devolvidos, através de uma funcionária da ré se deslocou à residência do autor).


Ora, em face deste quadro factual apurado [e contrariamente ao alegado pelo autor na sua carta resolutória], não se pode considerar que foi por indicação ou ordem da ré e/ou do réu que o autor (trabalhador) se manteve à porta da sede da ré (empregadora), sem exercer funções durante todo aquele hiato temporal e sem receber retribuição”.


Daí que não seja de admitir a revista excepcional ao abrigo da al. a) do nº 1 do artº 672º do CPC.


As mesmas considerações valem para considerar como não preenchida desde logo a hipótese do al. b) desse nº 1 do artº 672º.


E mesmo que assim não fosse, certamente não estaríamos perante “aspetos fulcrais para a vida em sociedade” (Ac. do STJ de 13.04.2021, P. 1677/20.6T8PTM-A.E1.S2) ou uma situação em que “exista um interesse comunitário significativo que transcenda a dimensão inter partes (Ac. do STJ de 29.09.2021, P. n.º 686/18.0T8PTG-A.E1.S2), sendo certo que nesta matéria “não basta o mero interesse subjetivo do recorrente” (Ac. do STJ de 11.05.2021, P. 3690/19.7T8VNG.P1.S2).


x


Decisão:


Pelo exposto, acorda-se em não admitir a revista excepcional, interposta pelo Autor / recorrente, do acórdão do Tribunal da Relação.


Custas pelo Recorrente.


Lisboa, 19/06/2024


Ramalho Pinto (Relator)


Júlio Gomes


Mário Belo Morgado





Sumário (da responsabilidade do Relator).