Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
Relator: | GONÇALVES ROCHA | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO A TERMO CERTO MOTIVO JUSTIFICATIVO CATEGORIA PROFISSIONAL ALTERAÇÃO DE FUNÇÕES BAIXA DE CATEGORIA ILICITUDE ISENÇÃO DE HORÁRIO DE TRABALHO | ||
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Data do Acordão: | 02/24/2015 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADAS | ||
Área Temática: | DIREITO DO TRABALHO - CONTRATO DE TRABALHO - DIREITOS, DEVERES E GARANTIAS DAS PARTES - CONTRATO DE TRABALHO A TERMO RESOLUTIVO - CESSAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO / DESPEDIMENTO POR INICIATIVA DO EMPREGADOR / ILICITUDE DO DESPEDIMENTO. | ||
Doutrina: | - Júlio Gomes, Direito do Trabalho, Vol. I, Coimbra Editora, p. 599. - Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, p. 669. - Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 13.ª Edição, p. 319. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DO TRABALHO (CT) / 2009: - ARTIGOS 129º, Nº 1, ALÍNEA D), 140.º, N.ºS 1, 2, 4, 5, 141.º, N.º 1, ALÍNEA E), E N.º 3, 147.º, N.º 1, AL. C) E N.º 3, 381.º, ALÍNEA C). CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 53.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 22/04/2009, PROCESSO N.º 08S3879, CONSULTÁVEL EM WWW.DGSI.PT, -DE 23/9/2009, PROCESSO N.º 3843/08, CONSULTÁVEL EM WWW.STJ.PT . -DE 14/4/2010, PROCESSO N.º 977/06.2TTCBR.C1.S1 E DE 2/12/2013, PROCESSO N.º 273/12.6T4AVR.C1.S1. | ||
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Sumário : |
I- Devendo o contrato a termo constar de documento escrito, a indicação do motivo justificativo da sua celebração constitui uma formalidade “ad substantiam”, pelo que a sua insuficiência não pode ser suprida por outros meios de prova. II- Ocorre a invalidade do termo se o documento escrito se limita a dizer que o contrato é celebrado «considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f), do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (termo certo) (…)». III- Entre as medidas de protecção legal da categoria profissional conta-se a sua irreversibilidade, procurando a lei restringir as possibilidades da sua regressão e de alteração in pejus do estatuto profissional do trabalhador, constituindo por isso, garantia deste a preservação da categoria para que foi contratado ou a que foi promovido. IV- O princípio da irredutibilidade da retribuição consagrado no artigo 129º, nº 1, alínea d) do Código do Trabalho/2009, não é impeditivo da supressão de certas atribuições patrimoniais conexas com condições específicas do modo de prestação de trabalho, e quando essas condições específicas deixem de existir. V- Por isso, tendo sido revogado o acordo de isenção de horário de trabalho, e tendo este deixado de trabalhar na situação de isento, cessa o pagamento do respectivo subsídio que a empregadora vinha pagando ao trabalhador. | ||
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Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
1--- AA, residente nas …, intentou uma acção com processo comum, emergente de contrato de trabalho, contra BB – …, LDA., com sede em Lisboa, pedindo que: - Seja a R. condenada a pagar-lhe uma indemnização calculada nos termos do art. 391.º do Código do Trabalho, no montante de, pelo menos, € 8.316,75, em consequência da nulidade dos termos resolutivos apostos nos contratos de trabalho; - Seja a R. condenada a pagar-lhe a quantia global de € 31.797,65, a título de créditos laborais vencidos (diferenças salariais, proporcionais de férias e do subsídio de Natal relativos a 2012, parte da retribuição de Março de 2012 e juros de mora vencidos), tudo acrescido de juros de mora vincendos, até integral pagamento. Alegou para tanto que celebrou com a R dois contratos cujo termo resolutivo é nulo, pelo que a cessação da sua colaboração à R no termo do prazo, operada por iniciativa desta, equivale ao seu despedimento. Alegou ainda que a R procedeu ao abaixamento da sua categoria profissional e da retribuição respectiva, e deixou de lhe pagar o subsídio de isenção de horário que vinha pagando, devendo por isso, ser condenada nas consequências do despedimento ilícito a que procedeu e no pagamento das diferenças salariais existentes. Procedeu-se à realização de audiência de partes, e não tendo sido possível obter a sua conciliação, veio a R contestar, sustentando que as funções desempenhadas pelo A, na vigência do segundo contrato de trabalho, são distintas e menos abrangentes que as desempenhadas pelo mesmo durante a vigência do primeiro contrato, daí resultando a redução do respectivo estatuto salarial; que o termo aposto nos contratos é válido e legal, pelo que é válida a cessação dos contratos por caducidade por si invocada; por isso, apenas reconhece ser-lhe devida a quantia de € 2.457,53 (relativa à retribuição de Março de 2012, férias não gozadas, proporcionais de subsídios de férias e de Natal e compensação legal pela caducidade do contrato), que colocou à disposição do A e que este se recusou a receber. Foi proferido despacho saneador, dispensando-se a fixação dos factos assentes e a organização da base instrutória. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento, e seguidamente, foi proferida sentença que terminou com o seguinte dispositivo: «Em face do exposto, julgo a presente acção parcialmente procedente e provada e, consequentemente: a) Declaro a nulidade do termo aposto no contrato de trabalho celebrado entre as partes em 01/09/2010; e, em consequência, b) Declaro a nulidade do contrato celebrado com data de 01/03/2011, e, bem assim, a nulidade do termo nele aposto e da cláusula de redução salarial dele constante e, em consequência, c) Declaro a ilicitude do despedimento do Autor por parte da Ré “BB – …, Lda”, ocorrido em 02/03/2012. E, consequentemente, d) Condeno a ré “BB – …, Lda” a pagar ao A. AA: d.1) a quantia global de € 18.721,50 (dezoito mil, setecentos e vinte e um euros e cinquenta cêntimos), a título de créditos laborais vencidos, acrescida de juros de mora vencidos desde 02/03/2012, e vincendos, até integral pagamento, contados à taxa anual de 4%; d.2) a quantia de € 6.816,75 (seis mil, oitocentos e dezasseis euros e setenta e cinco cêntimos) , a título de indemnização pelo despedimento em substituição da reintegração, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação, e vincendos, até integral pagamento, contados à taxa anual de 4%; d.3) as retribuições vencidas desde 17/04/2012 (deduzidos os montantes entretanto recebidos a título de subsídio de desemprego), acrescidas de juros de mora vencidos desde a citação ou, se posterior, da respectiva data de vencimento, e vincendos, até integral pagamento, contados à taxa anual de 4%; d.4) as retribuições vincendas (deduzidos os montantes recebidos a título de subsídio de desemprego), até ao trânsito em julgado da presente sentença, acrescidas de juros de mora até integral pagamento, contados à taxa anual de 4%. Custas a cargo de A. e Ré, na proporção do decaimento, que fixo em 1/5 e 4/5, respectivamente.» A R., inconformada, interpôs recurso de apelação desta sentença, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa acordado em julgar o recurso parcialmente procedente, absolvendo-a do pagamento das quantias peticionadas a título de retribuição por isenção de horário de trabalho, e confirmando no mais a sentença recorrida, com custas pelo A. e pela R. na proporção do respectivo decaimento. Irresignada, recorreu a R de revista, tendo rematado a sua alegação com as seguintes conclusões: “1) O douto Acórdão recorrido fez uma errada interpretação e aplicação das normas de direito aplicáveis - art.º 147º, n.º 1, al. c); art.º 143º, nº1; e art.º 119º do Código do Trabalho; 2) No que diz respeito à justificação do termo do contrato de trabalho, está dado como provado (cfr. n.o2 dos factos provados) que o A e a Recorrente declararam conhecer e concordar que o motivo pelo qual foi celebrado o contrato de trabalho de 01.09.2010, nos moldes ali acordados, foi uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa. 3) Sabia, assim o A. qual o motivo se justificava no facto de a Recorrente o ter contratado para prestar funções correspondentes às de Director de Logística. 4) O contrato de trabalho com termo celebrado com data de 1.09.2010 deve ser considerado válido, tendo o seu termo ocorrido em 28.02.2011, o qual não foi renovado, em face do teor da carta datada de 11.02.2011 remetida pela Recorrente ao Recorrido. 5) Com data de 02.03.2011, o A. e a Recorrente celebraram um novo contrato de trabalho, nos termos do qual o trabalhador aceitou expressamente uma nova função e categoria profissional e uma nova remuneração. 6) Também quanto a este novo contrato a termo, celebrado pelo prazo de 12 meses, (cfr. n.o 8 dos Factos provados), contém na sua cl.ª 6ª idêntica menção à do contrato celebrado em 01.09.2010, isto é, que os contraentes declararam conhecer e concordar que o motivo pelo qual foi celebrado o contrato de trabalho, nos moldes ali acordados, é uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa, resultante da sua internacionalização e desenvolvimento de negócios com Angola e, assim, em crescimento na área de trading. 7) Aliás, o A. ficou entusiasmado com este projecto da Recorrente, tendo expressamente escrito no email de 11 de Fevereiro de 2011, que enviou à gerente da Ré, (Doc. n.º 8 da Contestação) que " ... gostaria de continuar neste projecto e ajudar com a minha experiência no crescimento da Prime Trading." - Cfr. n. ° 4 dos factos provados e doc. fls.165. 8) O A. sabia, pois, bem quais os motivos da sua contratação a termo, as suas funções e os objectivos, tendo-a aceite. 9) Pelo que entende, assim, a Recorrente que não se verifica, no caso dos autos, nulidade do termo dos contratos referidos nos autos. 10) Por outro lado, quanto à alteração da situação laboral do A. perante a Recorrente a partir de 2.03.2011, ela resultou de um novo contrato que expressou as alterações de suas funções e categoria profissional, com um novo salário mensal, correspondente àquelas novas funções, que o A. expressamente aceitou. 11) Cabe às partes determinar por acordo a actividade para que o trabalhador é contratado - art.º 115.° n.º 1 do C. Trabalho. 12) Não houve, assim, redução ilícita do salário e da categoria do Autor, dado que, por escrito, acordou com a entidade patronal a nova categoria e a nova remuneração mensal, não sendo aplicável ao caso dos autos o disposto no art.° 119.° do C.T.. 13) Deve, assim, ser julgado procedente o presente recurso de revista, anulando-se o acórdão recorrido na parte objecto do presente recurso, e, em consequência, revogando-se a sentença da 1ª instância, na parte decisória em que declarou a ilicitude do despedimento do Autor e condenou a R no consequente pagamento de créditos laborais.” O A não contra-alegou. E recorreu também o A, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões: “1) O teor do segundo contrato tinha como intuito a violação das garantias contratuais e legais do trabalhador, pelo que é um acto que violou as regras da boa-fé. 2) O Acórdão praticou um erro de julgamento ou de interpretação, ao considerá-lo um acto válido, para os termos do artº 218º do CT, e violou os artº 102° e 122°, nº2, parte final, do CT, na parte que se considera que na negociação de um contrato, deve proceder-se de acordo com as regras da boa-fé, e que ao acto modificativo de um contrato, aplicam-se as regras sobre a nulidade de contrato de trabalho, "que não afecte as garantias do trabalhador", que já se viu não ser o caso, pois que estas foram violadas. 3) Assim o 2º contrato foi elaborado, com um claro objectivo de fraude à lei, (artºs 280º, nº1 e ss do Código Civil), a qual foi consumada. 4) Pois que da matéria provada devia ter-se concluído que a entidade patronal agiu de má-fé pretendendo dessa forma ilícita e dolosa contornar uma proibição legal, violando assim as garantias contratuais e legais do trabalhador. E reduzindo a categoria e remuneração ao mesmo, em violação dos art.°s 102º, 119°. 120º, nº4, 122º, nº 2, parte final, art.º123°, nº 4, 126º e 129º, nº 1, d) e e) e 218° do CT, o que efectivamente conseguiu. 5) Visto que reduziu a categoria profissional e o vencimento. 6) E manteve-se sem pagar o trabalho fora do horário normal, antes e depois do 2° contrato, conforme até aí era a sua prática, pois que havia isenção de horário de trabalho, fixada individualmente, que não foi alterada por um acordo de vontades válido. 7) Aliás provou-se que a R actuou assim de forma conforme à prática de uma efectiva isenção de horário, antes e depois desse 2° contrato. 8) A declaração do trabalhador, no segundo contrato, foi obtida com utilização de coacção, com ameaças de um despedimento ilícito, imediato, caso este não a assinasse, facto que integra a modalidade de coacção moral. 9) O despedimento ilícito é um mal grave, para os efeitos do art.º 255º, n.º1 e art.º256º do CC, pelo que a declaração do A., que foi obtida por coacção moral, viciou a sua vontade, sendo assim nula, conforme decidiu a 1ª instância. 10) Motivo pelo qual a declaração desse contrato é nula, e não poderá ser valorada como uma revogação válida da isenção de horário de trabalho, ao abrigo do artº218º do CT. 11) Consequentemente, de acordo com a matéria de facto assente, deveria o acórdão ter concluído, inclusive por via das presunções judiciais, tal como consta da sentença de 1ª instância, que o acto do 2° contrato, era nulo, por ser uma prática de fraude à lei, contrária a princípios de ordem pública.” Pede-se assim a revogação do acórdão nesta parte, repristinando-se a sentença da 1ª instância nesta matéria. A R contra-alegou, concluindo que: “Deve ser negado provimento ao recurso de revista interposto pelo Autor AA, porquanto: 1) O douto Acórdão em revista deve ser mantido na parte impugnada pelo Autor recorrente AA - isenção de horário de trabalho - negando-se provimento ao recurso interposto pela Apelante, já que fez uma correcta interpretação e subsunção dos factos provados ao direito aplicável; 2) Da matéria de facto dada como provada não resulta que o 2º contrato (2.03.2011) tenha sido celebrado sob coação moral e com ameaças, conforme alega o recorrente; 3) Do mesmo modo, não se encontra provado pela matéria de facto que a entidade patronal, a Recorrida, tivesse agido de má fé, sendo que o S.T.J. não poderá modificar a matéria de facto, como pretende o recorrente no ponto 4º das conclusões, quando ali alega que da matéria de facto devia ter-se concluído que a entidade patronal agiu de má-fé; 4) A temporalidade da isenção de horário de trabalho acordada entre o recorrente e a recorrida resulta do prazo do contrato de trabalho datado de 1 de Setembro de 2011, que foi revogado; 5) A aceitação das condições do contrato de trabalho datado de 2.03.2011 foi livre e consciente pelo trabalhador e não sob coação moral, como resulta da matéria provada sob o nº 4 dos Factos Provados - Algumas horas depois, o A. enviou à referida gerente um mail a aceitar continuar na R. nos termos dessa proposta (cfr. doc de fls. 165); 6) A isenção de horário de trabalho é, pela sua natureza e por força da lei, desenvolvimento transitório da relação contratual de trabalho, que retira à remuneração especial da isenção de horário, o carácter de regularidade ou de habitualidade; 7) O regime da isenção de horário de trabalho é, pois, por natureza, transitório e reversível, podendo a entidade patronal pôr-lhe termo, quando nisso já não convier; 8) No caso dos autos, a revogação da isenção de horário de trabalho foi tácita, resultando do documento escrito assinado em 2.03.2011 pelas partes, como também, do facto de o recorrente (trabalhador) ter aceite as novas funções (n.º 4 dos Factos Provados), e, ainda, de a gerência da Recorrida ter entendido que o recorrente não tinha capacidade para o exercício simultâneo das funções das duas áreas em tempo útil (nº 26 dos Factos Provados); 9) Terminando tal regime de isenção, o trabalhador perderá o direito à remuneração especial correspondente, sem que tal perda possa ser considerada como uma baixa de retribuição; 10) A Recorrida não violou, pois, qualquer dispositivo normativo, pelo que o Recorrente não tem direito a ver integrado na sua remuneração mensal a remuneração especial que recebia a título de isenção de trabalho, não constituindo o respectivo recebimento no decurso do contrato datado de 1.09.2010 qualquer direito adquirido a tal retribuição especial.” Pede assim que seja julgado improcedente o recurso de revista instaurado pelo Autor, mantendo-se o acórdão recorrido na parte objecto desse recurso. Subidos os autos a este Supremo Tribunal e admitidas as duas revistas pelo relator, emitiu o Senhor Procurador-Geral Adjunto parecer, nos termos do artigo 87º/3 do CPT, tendo concluído pela improcedência de ambas as revistas. Não tendo havido qualquer reacção das partes a tal parecer, cumpre decidir. 2---- Para tanto, temos de atender aos seguintes factos: 1 - A R. é uma sociedade comercial que se dedica ao comércio de variados produtos, importação e exportação e prestação de serviços. 2 - O A. foi admitido em 1 de Setembro de 2010, para trabalhar sob a autoridade, direcção e fiscalização da R., para exercer as funções correspondentes a Director de Logística, e auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 2.272,25, acrescida de subsídio de refeição no valor de € 10,00 por cada dia de trabalho prestado e da quantia mensal de € 500,00 a título de isenção de horário de trabalho, numa carga horária de 40 horas semanais, com dois dias de descanso semanal, por contrato de trabalho a termo certo, cuja cópia consta de fls. 150 a 153 – e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais –, constando do preâmbulo do mesmo, como justificação da aposição do termo de seis meses (até 01/03/2011) «considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f), do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (termo certo) (…)» e, na cláusula 6.ª do contrato: «Os contraentes declaram conhecer e concordar que o motivo pelo qual é celebrado o presente contrato, nos moldes ora acordados, é uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa». 3 – Em 11/02/2011, o A. foi chamado pela gerente da R, CC, a qual lhe comunicou a intenção da R. de fazer cessar na data do termo (01/03/2011) o contrato de trabalho celebrado com o A., podendo em alternativa o mesmo manter-se ao serviço, mas com outras funções. 4 – Algumas horas depois, o A. enviou à referida gerente um mail a aceitar continuar na R. nos termos dessa proposta (cfr. doc. de fls. 165). 5 – Em 14/02/2011, o A. recebeu uma carta registada datada de 11/02/2011, da R. entidade patronal, com o seguinte teor: “Lisboa, 11 de Fevereiro de 2011 Carta Registada c/ av. recepção Assunto: Rescisão do Contrato de Trabalho Exmos. Sr. AA, Serve a presente para comunicar a V.ª Exa. a Rescisão do Contrato de Trabalho celebrado com V. Ex.ª no passado dia 01 de Setembro de 2010. Melhores cumprimentos CC A Gerência” 6 – No exercício das suas funções de Director de Logística, o A. planeava, controlava e avaliava a eficiência dos meios de transportes utilizados pela empresa, baseando-se na disponibilidade de recursos físicos, materiais, financeiros e humanos e, designadamente, tinha a seu cargo: a) Contacto com fornecedores e armazéns para coordenação de embarque das mercadorias; b) Contacto com os transitários para reserva de navios e contentores; c) Coordenação das inspecções das mercadorias; d) Verificação de mercadorias, assistência e coordenação do enchimento das mesmas em contentor no Porto de Leixões e em Lisboa, mesmo fora do horário de funcionamento do escritório da R.; e) Tratamento da facturação aos clientes. 7 – O A. desempenhava também funções de “procurement” (aprovisionamento, aquisições) na área comercial, efectuando a recepção de encomendas dos clientes, efectuando diversos pedidos de cotações, tanto para serviços como para mercadorias, e negociando as compras em diversas áreas (produtos), tanto no mercado nacional como internacional. 8 – Com data de 02/03/2011, o A. e a gerente da R., nessa qualidade, celebraram o contrato individual de trabalho a termo resolutivo, com termo a 1 de Fevereiro de 2012, cuja cópia consta de fls. 166 a 69 – e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais –, mediante o qual a R. admitia o A. como “Responsável pela Área de Logística (chefe de serviços)”, auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 1.500,00, acrescida de € 6,41 a título de subsídio de refeição por cada dia de trabalho efectivamente prestado, constando do preâmbulo do mesmo, como justificação da aposição do termo (até 01/02/2012) «considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f) do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (termo certo) (…)» e, na cláusula 6.ª do contrato: «Os contraentes declaram conhecer e concordar que o motivo pelo qual é celebrado o presente contrato, nos moldes ora acordados, é uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa». 9 – Com data de 26 de Dezembro de 2011, o A. e a gerente da R., nessa qualidade, assinaram a declaração junta a fls. 170 – e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais –, mediante a qual corrigem o termo do contrato de trabalho referido em 8 para 1 de Março de 2012. 10 – Após a assinatura do contrato de trabalho referido em 9, o A. manteve integralmente todas as funções da área de logística, descritas em 6, tendo deixado de exercer parte das funções de “procurement” (aprovisionamento, aquisições) que acumulava da área comercial, referidas em 7, as quais passaram a ser da competência do Director de P…, D… D…, admitido pela R. em Janeiro de 2011, com excepção da gama dos produtos do mercado Farmacêutico, que se mantiveram integralmente a cargo do A. 11 – Pelo menos até 30/09/2011, a R. continuou a inscrever nos recibos de retribuição do A a categoria profissional de “Director de Logística”. 12 – Desde 01/09/2010 até 01/03/2012, o A. exerceu, de forma ininterrupta, as funções de director de logística, com o conteúdo funcional referido em 6 e 10, deslocando-se, quando necessário, aos portos de Leixões e de Lisboa para verificação dos contentores para além do horário de trabalho do escritório; e reportou sempre de forma directa à gerência da R. 13 – A partir do mês de Março de 2011, a retribuição do A. passou a ser a indicada no ponto n.º 8. 14 – Nos meses de Setembro e Outubro de 2011, a R. efectuou descontos nos vencimentos do A. desses meses, pelo facto de o A. não ter entrado no serviço às 9:00, mas nunca pagou ao A. qualquer quantia a título de trabalho suplementar, tendo o A. alertado o director financeiro da R., por correio electrónico, para esse facto, de modo a que, pelo menos, compensassem as horas de atrasos com o tempo em que o A. trabalhava até mais tarde, o que a R. nunca fez (cfr. docs. de fls. 94 e 95, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais). 15 – No dia 13 de Janeiro de 2012, a gerente da R. chamou o A. e disse-lhe que a empresa rescindia naquela mesma data o contrato de trabalho com o mesmo, dando-‑lhe a assinar uma carta – que foi posteriormente enviada via postal registada com a/r em Fevereiro de 2012, cuja cópia consta a fls. 192 –, carta essa que o A. assinou referindo «tomei conhecimento em 13/01/2012» e com o seguinte teor: “Exmo. Sr. AA, (…), Lisboa, 13 de Janeiro de 2012 Assunto: Rescisão do Contrato de Trabalho Exmo. Sr., Reportando-nos ao contrato de trabalho celebrado entre a BB, Lda e a sua pessoa no dia 02 de Março de 2011, serve a presente para comunicar a V. Exa. a Rescisão do mesmo. Sem outro assunto de momento, CC A Gerência” 16 – Nesse mesmo dia 13/01/2012, a gerente da R. pediu ao A. para lhe entregar imediatamente todos os instrumentos de trabalho na sua posse – telemóvel, computador e documentação –, o que o A. fez de imediato, tendo assinado o termo de entrega de fls. 110, cujo teor aqui se dá por reproduzido. 17 - Nesse momento, a gerente da R. assinou a declaração de fls. 109, com o seguinte teor: «comunica-se a V. Exª que entra de férias a partir de 17/01/2012, pelo período de 31 dias, pelo que está dispensado de comparecer ao trabalho no dia 16-01-2012.» 18 – Logo no dia 13/01/2012, a gerência indicou ao A. que iriam pagar-lhe os vencimentos dos meses de Janeiro e de Fevereiro, no fim dos respectivos meses, o que aconteceu. 19 – Em Fevereiro de 2012, a R. contratou DD para exercer funções de técnico de logística, auferindo uma retribuição inicial no montante de € 750,00, e estando o mesmo subordinado directamente ao Director da R, D…D…. 20 – No dia 5 de Março de 2012, o A. deslocou-se às instalações da R. para receber os valores que lhe eram devidos e o vencimento de Março, onde foi recebido pelo Sr. EE, director financeiro da mesma, o qual lhe exibiu um recibo – tendo-‑se recusado a entregar-lhe uma cópia do mesmo ou a permitir que tirasse uma fotografia, por ordens expressas da gerência da R. nesse sentido – e indicou que era intenção da empresa pagar-lhe o valor de € 2.457,53, o qual só lhe seria entregue se o A. assinasse um recibo de quitação, exonerando a R. da exigência do pagamento de quaisquer outras dívidas. 21 – O A. não aceitou o recebimento da quantia referida contra a assinatura do recibo exigido, por considerar que lhe era devida quantia superior. 22 – Em 11/01/2011, a gerência da R. realizou com o A. e D... D... uma reunião, no âmbito da qual procedeu às alterações de funções do A., nos termos referidos em 10 (cfr. doc. de fls. 162 a 164, cujo teor se dá por reproduzido). 23 – Entre o A. e a R. foi trocada a correspondência electrónica constante de fls. 171, 174 a 185 e 188 a 190, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais. 24 - No dia 17/12/2010, o A. entrou de férias até ao dia 02/01/2011, e, a pedido da gerência da R., elaborou uma lista de assuntos pendentes, conforme mail de 17/12/2010 (doc. de fls. 160/161). 25 – A gerência da R. constatou, pela lista de assuntos pendentes, que o A. prorrogara a resolução de diversos assuntos a seu cargo para Janeiro, por alegada falta de tempo. 26 – A gerência da R. entendeu que o A. não tinha capacidade para o exercício simultâneo das funções das duas áreas em tempo útil e decidiu proceder ao seu desdobramento nos termos mencionados no ponto 10, do que lhe foi dado conhecimento na reunião referida no ponto 22. 3---- E conhecendo: Quanto à revista da R: Esta coloca duas questões à apreciação deste Tribunal: a) validade do termo aposto nos contratos; b) licitude das alterações de funções e da retribuição do A. a partir de 2 de Março de 2011. Vejamos então cada uma delas. 3.1--- O A começou a trabalhar para a R em 1 de Setembro de 2010, através dum contrato de trabalho a termo certo que terminaria em 1/3/2011, fazendo as partes constar do mesmo, como justificação da aposição do termo de seis meses, o seguinte motivo: «Considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f), do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (termo certo) (…)» E na cláusula 6.ª do disseram ainda que: «Os contraentes declaram conhecer e concordar que o motivo pelo qual é celebrado o presente contrato, nos moldes ora acordados, é uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa». E tendo este contrato cessado em 1/3/2012, em 02/03/2011, o A. e a R. celebraram um novo contrato de trabalho a termo resolutivo, com termo a 1 de Fevereiro de 2012, mais tarde transferido por acordo para 1/3/2012, fazendo constar como justificação da aposição do termo que: «Considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f) do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (termo certo) (…)» Na cláusula 6.ª do contrato escreveram ainda que «Os contraentes declaram conhecer e concordar que o motivo pelo qual é celebrado o presente contrato, nos moldes ora acordados, é uma situação de acréscimo extraordinário da actividade da empresa». Tendo este último contrato cessado em 1/3/2012, por iniciativa da R, sustenta o A ter sido vítima dum despedimento ilícito, por falta do respectivo procedimento, em virtude do termo aposto em qualquer daqueles contratos ser nulo. Tendo as instâncias convergido no sentido da pretendida nulidade do termo, questiona a R a bondade deste juízo, pugnando pela licitude da cessação do contrato. Mas sem razão, adiantamos desde já. Efectivamente, com o advento do DL nº 372-A/75, de 14 de Julho, que veio proibir os despedimentos sem justa causa, as empresas começaram a socorrer-se da contratação a prazo prevista na LCT que admitia tal contratação sem quaisquer limitações, desde que o contrato constasse de documento escrito, conforme impunha o artigo 10º. Para travar esta fuga indiscriminada para a contratação a prazo, o DL nº 781/76 de 28/X tentou impor-lhe algumas restrições, embora estas intenções do legislador não tivessem obtido êxito, pois no domínio da sua vigência este tipo de contratação atingiu níveis quase escandalosos, por permitir a contratação temporária sem grandes limitações. Esta situação foi profundamente alterada com o DL nº 64-A/89 de 27/2, que partindo duma concepção substancialmente diferente daquela em que se fundara o legislador de 1976, quis restringir a contratação a termo a situações rigorosamente tipificadas, por forma a adequar o novo regime aos imperativos constitucionais de segurança no emprego consagrados no art. 53º da CRP. Assim, a contratação a termo passou a ter carácter excepcional, visando permitir que as empresas se adaptassem às flutuações do mercado e criar condições para uma maior absorção de volume de emprego, por forma a favorecer grupos socialmente mais vulneráveis que desta forma teriam acesso ao trabalho, embora com carácter temporário. Nesta linha, e escorado no já mencionado princípio constitucional da segurança no emprego, que impõe que a regra seja a contratação por tempo indeterminado, o DL nº 64-A/89, de 27/2, apenas admitia a celebração de contratos a termo em situações excepcionais de satisfação de necessidades de carácter precário ou sazonal, expressamente tipificadas no artigo 41, nº 1, e impondo o seu nº 2 que a celebração de contratos a termo fora destes condicionalismos importaria a nulidade do termo. E para se permitir um verdadeiro controlo destas contratações e se poder averiguar se as razões invocadas pela entidade empregadora correspondiam à realidade, impunha-se que o contrato fosse reduzido a escrito, devendo conter a indicação do motivo justificativo da sua celebração por forma a mencionar-se as circunstâncias e factos concretos que haviam determinado esta contratação, conforme resultava dos artigos 42º, nº 1, alínea e) deste diploma e do 3º da Lei 38/96 de 31/8. O Código do Trabalho aprovado pela Lei 99/2003 de 27 de Agosto e que entrou em vigor em 1 de Dezembro de 2003, acolheu também estas orientações, tendo introduzido porém, algumas alterações. Assim e contrariamente ao regime da LCCT, que se limitava a indicar as situações em que era permitida a contratação a termo, o artigo 129º, nº1 daquele CT começava por estatuir que o contrato de trabalho a termo só podia ser celebrado para a satisfação de necessidades temporárias da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades, constando do nº 2 o elenco, meramente exemplificativo, das situações que justificavam a contratação a termo. Por outro lado e quanto às formalidades do contrato, tinha este de ser escrito, conforme advinha do artigo 127º, impondo-se que dele constasse, para além doutras menções, a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, conforme impunha a alínea e) do nº 1 do artigo 131º. Além disso, a indicação do motivo justificativo da aposição do termo devia ser feita pela menção expressa dos factos que o integravam, por forma a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, (conforme resultava do nº 3 do supracitado preceito), considerando-se sem termo o contrato em que falte a redução a escrito, bem como aquele em que se omitam ou sejam insuficientes as referências exigidas naquela alínea e) do nº 1. Quanto ao CT de 2009, o legislador optou por seguir a técnica legislativa do CT/2003, começando por estabelecer no nº 1 do artigo 140º que o contrato de trabalho a termo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade, constando também do nº 2 o elenco, meramente exemplificativo, das situações que justificam a contratação a termo, considerando-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa as seguintes: a) substituição directa ou indirecta de trabalhador ausente ou que, por qualquer motivo, se encontre temporariamente impedido de trabalhar; b) substituição directa ou indirecta de trabalhador em relação ao qual esteja pendente em juízo acção de apreciação da licitude do despedimento; c) substituição directa ou indirecta de trabalhador em situação de licença sem retribuição; d) substituição de trabalhador a tempo completo que passe a prestar trabalho a tempo parcial por período determinado; e) actividade sazonal ou outra cujo ciclo anual de produção apresente irregularidades decorrentes da natureza estrutural do respectivo mercado, incluindo o abastecimento de matéria-prima; f) acréscimo excepcional de actividade da empresa; g) execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro; h) execução de obra, projecto ou outra actividade definida e temporária, incluindo a execução, direcção e fiscalização de trabalhos de construção civil, obras públicas, montagens e reparações industriais, em regime de empreitada ou em administração directa, bem como os respectivos projectos e outra actividades complementar de controlo e acompanhamento. Para além das situações previstas no n.º 1 do artigo 140.º e exemplificadas nas alíneas do seu n.º 2, o artigo 140.º admite ainda a celebração de um contrato a termo nos seguintes casos, conforme resulta do seu nº 4: a) lançamento de uma nova actividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores; b) contratação de trabalhador à procura de primeiro emprego, em situação de desemprego de longa duração ou noutra prevista em legislação especial de política de emprego. E no respeitante às formalidades do contrato, manteve-se a obrigatoriedade da sua redução a escrito, devendo constar do documento a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, que deve ser feita com a menção expressa dos factos que o integram, por forma a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, conforme estabelece o artigo 141º, nº 1, alínea e), e nº 3. Com este requisito visa-se, um duplo objectivo: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a hipótese legal ao abrigo da qual se contratou, por um lado; por outro, a averiguação acerca da realidade e adequação da justificação invocada face à duração estipulada, porquanto o contrato a termo – nas palavras de Monteiro Fernandes[1] – …só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem. Por isso, ocorre a invalidade do termo se o documento escrito omite ou transcreve de forma insuficiente as referências respeitantes ao termo e ao seu motivo justificativo, face à prescrição do artigo 147º, nº 1, alínea c). Assim, e conforme se decidiu no acórdão deste Supremo Tribunal de 22/04/2009, processo nº 08S3879, consultável em www.dgsi.pt, a indicação do motivo justificativo da celebração de contrato de trabalho a termo constitui uma formalidade “ad substantiam”, tendo que integrar, forçosamente, o texto do contrato, pelo que a insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova.[2] Donde ser de concluir que as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº 2 do art. 140º do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, por forma permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal e que é real a justificação invocada e adequada à duração convencionada para o contrato. Por outro lado, tal indicação deve ser feita de forma suficientemente circunstanciada para permitir o controlo da existência da necessidade temporária invocada pela empresa no contrato, possibilitando também, quanto àquelas necessidades temporárias, que se comprove que o contrato a termo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades[3], cabendo ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, conforme prescreve o n.º 5 do mencionado artigo 140.º. Postas estas considerações, vejamos então o caso presente. 3.2--- Importa decidir se os contratos que foram celebrados satisfazem os requisitos estabelecidos no nº 3 do artigo 141º do CT quanto à indicação do motivo justificativo do termo estipulado. Ora, quanto ao contrato celebrado em 1 de Setembro de 2010, escreveu-se no seu preâmbulo, como justificação da aposição do termo de seis meses, o seguinte: “considerando que nos termos do disposto no nº 2 alínea f) do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo.” Atentos os termos utilizados no contrato é manifesto que não se satisfaz minimamente os requisitos formais exigidos pelo nº 3 do artigo 141º do CT, pois as partes limitam-se a uma mera reprodução da fórmula legal, em termos de tal modo vagos que não permitem aquilatar minimamente da realidade que justificava a contratação do A. Efectivamente, não é possível percepcionar os exactos contornos de tal realidade, porquanto não está concretizado em que se traduzia o invocado acréscimo excepcional ou extraordinário da actividade da empresa, nem qual a conexão do mesmo com a contratação do A pelo prazo de seis meses. E o mesmo se tem de dizer do contrato que foi celebrado em 02/03/2011, e que vigorou até 1/3/2012, em cujo contrato se escreveu como justificação do termo: “considerando que nos termos do disposto no nº 2, alínea f), do artº 140º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei 7/2009, de 12 de Fevereiro, a factualidade consubstancia o acréscimo excepcional de actividade da empresa, que legitima a celebração do presente contrato a termo resolutivo (…).” Sendo manifesta a insuficiência da justificação da contratação a termo utilizada pela recorrente, temos de considerar que vigorou um contrato de trabalho por tempo indeterminado desde o início da colaboração do A, conforme determina o art. 147.º, n.º 1, al. c) e n.º 3, do CT, pelo que a sua antiguidade se reporta à data do início da prestação de trabalho, ou seja, 1 de Setembro de 2010. Contrapõe a recorrente que o A conhecia os motivos que determinaram a sua contratação a termo, tanto mais que concordou com eles, conforme consta dos respectivos contratos, mas esta argumentação improcede. Na verdade, e como já se disse, a indicação do motivo justificativo da celebração dos contratos de trabalho a termo constitui uma formalidade “ad substantiam”, tendo que integrar forçosamente o texto do documento que o titula. Por isso, a omissão ou insuficiência de tal justificação não pode ser suprida por outros meios de prova. E consequentemente, a denúncia do contrato por caducidade operada pela R. equivale a um despedimento, que se tem de considerar ilícito por inexistência do respectivo procedimento, conforme fulmina o artigo 381º, alínea c) do Código do Trabalho. Pelo exposto, improcede esta primeira questão. 3.3---- Cumpre agora apreciar se foram lícitas as alterações de funções e o abaixamento da retribuição do A. a partir de 2 de Março de 2011. Sobre esta matéria diz-se no acórdão recorrido: “Estabelece o art. 129.º, n.º 1, als. d) e e) do Código do Trabalho que é proibido ao empregador: - diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos neste Código ou em instrumento de regulamentação colectiva do Trabalho; - mudar o trabalhador para categoria inferior, salvo nos casos previstos neste Código. Por seu turno, diz o art. 115.º, n.º 1 que cabe às partes determinar por acordo a actividade para que o trabalhador é contratado, esclarecendo o art. 118.º, n.º 1 que o trabalhador deve, em princípio, exercer funções correspondentes à actividade para que se encontra contratado, devendo o empregador atribuir-lhe, no âmbito da referida actividade, as funções mais adequadas às suas aptidões e qualificação profissional. Em conformidade, dispõe o art. 119.º que a mudança do trabalhador para categoria inferior àquela para que se encontra contratado pode ter lugar mediante acordo, com fundamento em necessidade premente da empresa ou do trabalhador, devendo ser autorizada pelo serviço com competência inspectiva do ministério responsável pela área laboral no caso de determinar diminuição da retribuição. Como refere António Monteiro Fernandes (Direito do Trabalho, Almedina, 16.ª edição, p. 168), “[a] categoria constitui um fundamental meio de determinação de direitos e garantias do trabalhador – ou, noutros termos, de caracterização do seu estatuto profissional na empresa. É ela que define o posicionamento do trabalhador na hierarquia salarial, é ela que o situa no sistema de carreiras profissionais, é também ela que funciona como referencial para se saber o que pode e o que não pode a entidade empregadora exigir ao trabalhador.” (…) A categoria, precisamente por, de algum modo, reflectir a posição contratual do trabalhador (além de sinalizar o seu estatuto socioprofissional), é objecto de certa protecção legal e convencional. Assim, e por via de regra, o dador de trabalho não pode «baixar a categoria do trabalhador» (art. 129.º/1-e)), a não ser que este aceite e haja autorização da inspecção do trabalho – mas, mesmo assim, só quando a baixa «seja imposta por necessidades prementes da empresa ou por estrita necessidade do trabalhador» (art. 119.º). Consagra assim a nossa lei o princípio da «irreversibilidade da carreira» no âmbito da empresa. No seu significado autónomo – isto é, encarado à margem do princípio da irredutibilidade do salário (art. 129.º/1-d)) que com ele se relaciona estreitamente –, traduz-se num meio de protecção da profissionalidade como valor inerente à pessoa do trabalhador.” Ora, no caso em apreço, provou-se que o A. foi admitido em 1 de Setembro de 2010, para exercer as funções correspondentes a Director de Logística, auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 2.272,25, acrescida de subsídio de refeição no valor de € 10,00 por cada dia de trabalho prestado e da quantia mensal de € 500,00 a título de isenção de horário de trabalho. Mais se provou que, no exercício das suas funções de Director de Logística, o A. planeava, controlava e avaliava a eficiência dos meios de transportes utilizados pela empresa, baseando-se na disponibilidade de recursos físicos, materiais, financeiros e humanos e, designadamente, tinha a seu cargo: a) Contacto com fornecedores e armazéns para coordenação de embarque das mercadorias; b) Contacto com os transitários para reserva de navios e contentores; c) Coordenação das inspecções das mercadorias; d) Verificação de mercadorias, assistência e coordenação do enchimento das mesmas em contentor no Porto de Leixões e em Lisboa, mesmo fora do horário de funcionamento do escritório da R; e) Tratamento da facturação aos clientes. E, ainda, que desempenhava também funções de “procurement” (aprovisionamento, aquisições) na área comercial, efectuando a recepção de encomendas dos clientes, efectuando diversos pedidos de cotações, tanto para serviços como para mercadorias, e negociando as compras em diversas áreas (produtos), tanto no mercado nacional como internacional. Por outro lado, provou-se que, com data de 2 de Março de 2011, o A e a gerente da R., nessa qualidade, celebraram novo contrato individual de trabalho a termo resolutivo, com termo a 1 de Fevereiro de 2012 – irrelevante para tal efeito, como se viu –, em que acordaram igualmente a atribuição ao A. da categoria de “Responsável pela Área de Logística (chefe de serviços)”, auferindo a retribuição mensal ilíquida de € 1.500,00, acrescida de € 6,41 a título de subsídio de refeição por cada dia de trabalho. Mais se provou que, a partir de então, o A. manteve integralmente todas as funções da área de logística, acima descritas, tendo deixado de exercer parte das funções de “procurement” (aprovisionamento, aquisições) que acumulava da área comercial, supra referidas, as quais passaram a ser da competência do Director de Procurement, D… D…, admitido pela R. em Janeiro de 2011, com excepção da gama dos produtos do mercado Farmacêutico, que se mantiveram integralmente a cargo do A.. Conclui-se, assim, que foi celebrado um acordo de abaixamento da categoria profissional do A., implicando a diminuição da retribuição, sem que tivesse sido obtida autorização da Autoridade para as Condições de Trabalho, e, de qualquer modo, sem que esteja suficientemente justificada a necessidade premente da empresa ou do trabalhador. Com efeito, apenas se provou que, no dia 17/12/2010, o A. tinha uma lista de assuntos pendentes em que prorrogara a resolução de diversos assuntos a seu cargo para Janeiro, e que, relativamente a tal situação, alegou falta de tempo e a R., por seu turno, entendeu que aquele não tinha capacidade para o exercício simultâneo das funções das duas áreas em tempo útil, não tendo, porém, se provado se alguma das versões e qual correspondia à realidade. Assim, é nulo o abaixamento de categoria com diminuição de retribuição, por falta de autorização da Autoridade para as Condições de Trabalho e de justificação da necessidade subjacente (art. 294.º do Código Civil).” Também sufragamos este juízo decisório da Relação e a respectiva fundamentação. Efectivamente, estando-se perante dois contratos a termo, cujas cláusulas acessórias foram consideradas ilegais, a antiguidade do trabalhador conta-se desde o início da prestação de trabalho, conforme determina o artigo 147º, nº 3 do CT. Tratando-se portanto dum único contrato que vigorou entre as partes, era manifestamente vedado à R baixar a categoria profissional do A, conforme determina o artigo 129º, alínea e) do mesmo diploma. Por isso, tendo-lhe a R, desde o início da prestação de trabalho, reconhecido a categoria de “Director de Logística”, não podia com a celebração do 2º contrato a termo resolutivo ilegal, impor-lhe outra categoria inferior. Na verdade, a categoria profissional é vinculativa para a entidade patronal, pois, exprimindo a posição contratual do trabalhador e reflectindo-se no seu estatuto sócio-‑profissional, é por isso objecto da mencionada protecção legal da irreversibilidade, garantindo direitos mínimos quanto a remuneração, tempo de trabalho, carreira, etc. A este respeito escreve de Menezes Cordeiro, in “Manual de Direito do Trabalho”, a págs. 669: “Assim, da categoria em direito do trabalho, pode dizer-se que ela obedece aos princípios de efectividade da irreversibilidade e do reconhecimento. A efectividade recorda que no domínio da categoria-função, relevam as funções substancialmente pré figuradas e não as meras designações exteriores; a irreversibilidade explica que, uma vez alcançada certa categoria, o trabalhador não pode, dela, ser retirado ou despromovido…”. Efectivamente, como ensina Pedro Romano Martinez (Direito do Trabalho, Almedina, 6.ª edição, p. 512), “[o] subsídio de isenção de horário de trabalho (art. 265.º do CT), por se encontrar dependente deste regime, será retirado quando terminar a situação de isenção; constituindo, pois, uma vantagem reversível. Cessando a isenção de horário, o trabalhador perde o direito ao suplemento retributivo, mas importa saber se, como a isenção é estabelecida por acordo, pode cessar por vontade do empregador, sempre que deixa de se justificar tal regime. Ajusta-se, normalmente, a isenção atendendo a situações temporárias ou durante um período estipulado, mas se assim não for, na dúvida, deve dar-se prevalência ao acordo das partes, que só pode ser alterado por mútuo consenso.” No caso em apreço, como se disse, não só a temporalidade da sujeição ao regime de isenção de horário de trabalho resulta do prazo acordado por escrito em 1 de Setembro de 2010, como da tácita revogação operada por idêntico meio em 2 de Março de 2011.” E nesta linha, entendeu-se que não lhe era devido o pagamento do subsídio de isenção de horário de trabalho a partir desta data. Também aderimos a esta posição. Na verdade, o subsídio de isenção de horário de trabalho, pese embora tenha carácter de retribuição, não está abrangido pelo princípio da irredutibilidade próprio desta, pois corresponde à contrapartida do modo específico de execução do trabalho e como tal está absolutamente dependente do exercício de funções no regime de isenção de horário de trabalho, regime que tem a ver directamente com a submissão do trabalhador a um específico esquema temporal de prestação laboral, sendo a sua remuneração apenas devida enquanto perdurar a situação em que assenta o seu fundamento. Assim, o princípio da irredutibilidade da retribuição consagrado no artigo 129º, nº 1, alínea d) do Código do Trabalho de 2009, não é impeditivo da supressão de certas atribuições patrimoniais conexas com condições específicas do modo de prestação de trabalho, e quando essas condições específicas deixem de existir, como se decidiu no acórdão desta Secção Social de 23/9/2009, recurso nº 3843/08, consultável em www, stj.pt. No caso presente, embora esta forma de prestação do trabalho conste do primeiro contrato que foi celebrado, deixou de existir com a celebração do 2º. E nada impedia a R de assim proceder, pois se é certo que o trabalhador deixou de ter direito ao suplemento remuneratório que lhe correspondia, podia reclamar o pagamento de trabalho suplementar que tivesse prestado a partir daí, desde que alegasse e provasse os pressupostos factuais da sua prestação, o que, porém, não fez. Por isso, deixando este direito de constar do documento escrito que foi exarado com a celebração do segundo contrato a termo, temos de concluir pela revogação tácita do acordo que nesse sentido vigorara durante o primeiro contrato. Contrapõe o A que a sua declaração no segundo contrato foi obtida com ameaças de um despedimento ilícito, imediato, caso este não a assinasse, facto que integra a modalidade de coacção moral. No entanto, a matéria de facto apurada não permite concluir, por falta de factos nesse sentido, pela existência da invocada coacção, prova que competia ao recorrente. Conclui-se assim do exposto que bem decidiu a Relação quanto à matéria da revista do A. 5---- Termos em que se acorda nesta Secção Social em negar as revistas, com a consequente confirmação do acórdão recorrido.
As custas de cada um dos recursos de revista interpostos serão a cargo dos respectivos recorrentes.
Anexa-se sumário do acórdão.
Lisboa, 24 de Fevereiro de 2015
Gonçalves Rocha (Relator)
Leones Dantas
Melo Lima
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