Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
553/19.0T8LRA.C1.S1
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: ROSA TCHING
Descritores: REAPRECIAÇÃO DA PROVA
DOCUMENTO PARTICULAR
ÓNUS DA PROVA
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
JUROS DE MORA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DUPLA CONFORME
FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE
MATÉRIA DE FACTO
Data do Acordão: 01/12/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADAS
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :
I. As faturas, enquanto documentos particulares gozam, nos termos do disposto no artigo 376º, nº 1, do Código Civil, de força probatória plena quanto à materialidade das declarações atribuídas ao seu autor, se apresentados contra este. Se é o autor dos documentos a utilizá-los ficam sujeitos à livre apreciação do Tribunal, cabendo-lhe produzir livremente prova sobre a exatidão do respetivo conteúdo.

II. Não cabe nas funções do Supremo Tribunal de Justiça, enquanto tribunal de revista, sindicar a valoração da prova feita pelo Tribunal da Relação, segundo o critério da sua livre e prudente convicção.

Decisão Texto Integral:
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ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

2ª SECÇÃO CÍVEL




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I. Relatório


I. Plásticos Futura, Ldª., instaurou contra Prowder Labs, S.A., atualmente Prozis Foods, S.A., ação declarativa, de condenação, com processo comum, pedindo a condenação da ré a:

1. reconhecer que celebrou com a autora os contratos de fornecimento a que se aludem nos artigos 27.º a 65.º desta Petição Inicial e que os mesmos têm vindo a ser renovados, encontrando-se em vigor;

2. cumprir os contratos de fornecimento a que se aludem nos artigos 27.º a 65.º da petição inicial, encomendando as quantidades mínimas acordadas para cada um dos produtos, até ao terminus dos contratos;

3. pagar à autora as faturas emitidas e que se vencerem na presente ação, bem como aquelas que venham ainda a ser emitidas em cumprimento dos contratos de fornecimento em causa nestes autos, cujo montante, por não ser ainda determinável, se relega para execução de sentença, acrescidas dos respetivos juros de mora, calculadas às sucessivas taxas legais aplicáveis, desde a data de vencimento das mesmas até integral e efetivo pagamento.

4. pagar à autora a quantia de € 135.936,702 (cento e trinta e cinco mil novecentos e trinta e seis euros e setenta cêntimos) referente a faturas vencidas, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais aplicáveis, contados desde a data de vencimento das mesmas até integral e efetivo pagamento;

5. pagar à Autora a quantia de € 1.231.071,92 (um milhão duzentos e trinta e um mil e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), a título de responsabilidade contratual, melhor discriminada nos artigos 123.º a 165.º da petição inicial, quantia essa calculada à data de 1 Fevereiro de 2019, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais aplicáveis, contados desde a data da interpelação formal da autora à ré, em 2 de novembro de 2018, até integral e efetivo pagamento.

6. Subsidiariamente, para o caso de improceder o pedido deduzido em 5), ser a ré condenada a pagar à autora a quantia de € 1.231.071,92 (um milhão duzentos e trinta e um mil e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), a título de responsabilidade précontratual, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais aplicáveis, contados desde a data da interpelação formal da autora à ré, em 2 de novembro de 2018, até integral e efetivo pagamento.

Alegou, para tanto e em síntese, que acordou com a ré vários contratos de fornecimento de produtos, por períodos de 2 anos, renováveis e que obrigavam ao consumo de quantidades mínimas; que a ré não cumpriu os contatos, porquanto consumiu anualmente quantidades inferiores às que se tinha obrigado, e que este incumprimento causou-lhe danos, designadamente no que concerne ao investimento que teve de efetuar para cumprimento do contrato.


2. A ré contestou, sustentando que os contratos não tinham prazos de validade, não estava prevista qualquer renovação nem a obrigação de consumos mínimos, que o investimento efetuado pela autora não lhe pode ser imputado e que nada deve à autora.


3. Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento, após o que foi proferida sentença que julgou a ação totalmente improcedente e absolveu a ré de todos os pedidos contra si formulados.


4. Inconformada com esta decisão, dela apelou a autora para o Tribunal da Relação ... que, por acórdão proferido em 20 de abril de 2021, julgou o recurso parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 135.936,70, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais dos juros comerciais aplicáveis, contados desde a citação e até integral e efetivo pagamento.


5. Inconformada com esta decisão, a ré dela interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

«1 – O douto acórdão recorrido violou e aplicou erradamente normas de direito processual e violou normas de direito substantivo, razão pela é interposto o presente recurso de revista.

2 – O raciocínio e o iter lógico constantes da fundamentação da decisão que julgou parcialmente provado o facto 2.13. violou normas de direito processual e de direito substantivo.

3 – A decisão em crise faz depender a boa e legítima autoria e veracidade das facturas apresentadas pela autora – sem exigência probatória desmedida e exacerbada – da verificação necessária e cumulativa de duas condições: 1.ª a parte que impugna não ser concreta e convincente na impugnação dos documentos; 2.ª os restantes elementos que rodeiam o caso indicarem/indiciarem suficientemente tal boa e legítima autoria e veracidade.

4 – O douto acórdão estabelece os pressupostos de cuja verificação depende o julgamento como boa e legítima a autoria e veracidade das facturas, pelo que, em obediência às regras da lógica, a não verificação de pelo menos uma condição ou a sua impossibilidade legal ou jurídica impede pois que não se possa extrair aquela conclusão

5 – Na contestação, a ré impugnou a existência da dívida alegada pela autora e impugnou o valor probatório dos documentos (facturas) que visavam demonstrar o direito da demandante.

6 – A análise da evolução do ónus de impugnação, ao longo dos sucessivos Códigos de Processo Civil e das suas reformas, revela que, pelo menos desde a reforma operada pelo Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, a negação, refutação ou negação de um facto passou a ser suficiente para garantir a eficácia do cumprimento do ónus de impugnação.

7 – Resulta da contestação que a ré tomou efectivamente uma posição perante os factos que constituem a causa de pedir – e concretamente perante os que constituíam a causa de pedir do valor de € 192.290,13, a título de facturas vencidas e não pagas. E fê-lo negando-os expressamente. Desta forma cumpriu o ónus de impugnação tal como previsto no artigo 574.º, n.º 1 do CPC.

8 – O legislador não estabeleceu graus de impugnação; a ré não tinha de ser "concreta" e "convincente" na sua impugnação. Se assim fosse, então o legislador teria criado graus de concretude e de persuasão para o cumprimento cabal do ónus de impugnação. O que não fez.

9 – A exigência de uma impugnação concreta e convincente – decorrente da 1.ª condição – viola flagrantemente o disposto na norma do artigo 574.º, n.º 1 do CPC.

10 – Donde se conclui que não se pode extrair uma conclusão juridicamente válida – como pretende o douto acórdão recorrido – quando uma das premissas ou pressupostos essenciais de que depende aquela é violadora de uma norma jurídica.

11 – E tratando-se de condições cumulativas e necessárias, a violação do artigo 574.º, n.º 1 do CPC ínsita à primeira premissa, torna de forma irrefragável juridicamente inválida qualquer conclusão derivada de tais premissas.

12 – A ré impugnou as facturas juntas aos autos pela autora; considerando que as facturas não são da sua lavra, então cabia à autora fazer prova da sua veracidade – cfr. artigo 374.º, n.º 2 do CC.

13 – Não impende sobre a ora recorrente a obrigação de cumprir um determinado grau de concretude ou convencimento no que se refere à impugnação da veracidade dos documentos. Impugnada a veracidade do documento, o artigo 374.º, n.º 3 in fine do CC, é claro: cabe à parte que o apresentar a prova da sua veracidade.

14 – A decisão recorrida estabelece um critério – espúrio ao artigo 374.º, n.º 2 do CC – o qual não verificado permite concluir pela boa e legítima autoria dos documentos, caso os restantes elementos que rodeiam o caso indiciarem tais qualidades.

15 – Não é juridicamente admissível – sob pena de se violar o artigo 374.º, n.º 2 do CC – que o julgador imponha ao impugnante um ónus superior ao que a lei estabelece.

16 – O douto acórdão conclui que pelo menos até 31.01.2019 faz todo o sentido admitir como boa a autoria e legitimidade das facturas, no sentido de que estas foram emitidas pela autora na sequência do anuído com a ré relativamente aos produtos nelas constantes e pelo respectivo preço.

17 – Pois se assim não fosse, isto é, se as facturas tivessem sido emitidas sem a anuência da ré relativamente aos produtos nelas constantes e pelo respectivo preço, então: "(…) a ré poderia e deveria alegar e provar o seu contrário ou factos que infirmassem o seu teor. Ou seja: que as faturas eram falsas no sentido de que não correspondiam a produtos por ele encomendados e desejados, ou que os produtos nelas constantes e respetivo preço não correspondiam ao acordado, ou que, não obstante nas faturas constar que os produtos ficaram à sua disposição, ela efetivamente não os recebeu. Mas não provou, nem sequer alegou, tais factos." – cfr. acórdão recorrido.

18 – Tendo a autora invocado o direito a receber o preço, cabia-lhe o ónus da prova quanto aos termos do acordo entre si e a ré, concretamente o preço, quantidades, natureza do produto, prazos de fornecimento.

19 – A autora invocou um direito; a ré impugnou os factos que constituíam a causa de pedir de tal direito. A autora apresentou facturas para demonstrar o seu direito; a ré impugnou a veracidade de tais documentos.

20 – O entendimento segundo o qual a ré teria de demonstrar que as facturas eram falsas no sentido de que não correspondiam a produtos por si encomendados e desejados; ou alegar e provar que os produtos constantes das facturas e respectivo preço não correspondiam ao acordado; ou ainda que não obstante nas facturas constar que os produtos ficaram à sua disposição, ela efectivamente não os recebeu, é de todo incompatível com o ónus da prova que incidia sobre… a autora.

21 – A ré não invocou qualquer excepção – nenhuma – e nessa exacta medida não lhe competia a prova de qualquer facto, tal como exigido pelo n.º 2 do artigo 342.º do CC.

22 – O douto acórdão recorrido violou ou aplicou erradamente o artigo 574.º, n.º 1 e 2 do CPC, bem como violou o artigo 342.º, n.º 1 e 374.º, n.º 2 do CC.

Termos em que deve a presente revista ser julgada procedente e em consequência revogada a decisão recorrida na parte em que condena a ré a pagar à autora a quantia de € 135.936,70 (cento e trinta e cinco mil, novecentos e trinta e seis euros e setenta cêntimos) acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais dos juros comerciais aplicáveis, contados desde a citação e até integral e efectivo pagamento».


6. A autora respondeu, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem:

«1. A lei continua a estabelecer um ónus de impugnação, tanto assim é que o n.º 1 do artigo 574.º do CPC estabelece, de forma clara e inequívoca, o seguinte: “ao contestar, deve o Réu tomar posição definida perante os factos que constituem a causa de pedir invocada pelo autor.” Sendo que esta é a regra basilar do ónus de impugnação.

2. A Ré, na sua contestação, limitou-se a impugnar, tabelar e genericamente, os factos aduzidos pela autora, vg. a existência de dívida decorrente de alegados fornecimentos não pagos, e, bem assim e no que ora aqui releva, o valor probatório dos documentos por ela apresentados, rectius os atinentes a tal dívida.

3. Esta impugnação tabelar e genérica no concernente aos documentos apresentados é uma postura cómoda que a lei concede ao demandado e que passa para o apresentante do documento o ónus da prova da sua autoria e veracidade – artº 374º nº 2 do CC. Porém, se a parte não é concreta e convincente na sua impugnação, e os restantes elementos que rodeiam o caso indicarem/indiciarem suficientemente tal boa e legítima autoria e esta veracidade, elas são de conceder sem exigência probatória desmedida e exacerbada.

É o caso dos autos.”

4. Face ao teor da contestação da Ré e ao método das presunções, a que alude o artigo 349.º do CC, é manifesto que os Venerandos Desembargadores perfilharam um entendimento correto, relativamente às questões por aquela suscitadas em sede de recurso.

5. Na contestação, a Ré não põe em causa, nem as faturas, nemos valores constantes das mesmas, nem a receção das mercadorias em causa, limitando-se a negar até à exaustão a existência de quantidades mínimas anuais acordadas e, por conseguinte, os prejuízos peticionados a esse respeito.

6. Na sua contestação, a Ré nada diz acerca das faturas peticionadas e devidas, respeitantes aos fornecimentos efetuados pela Autora a seu pedido!

7. A Ré não põe em causa as faturas, nomeadamente a sua autenticidade, nem sequer que encomendou os produtos constantes das faturas e que os mesmos lhe foram entregues.

8. No que respeita às faturas vencidas após a instauração da ação, que fundamentaram a ampliação do pedido, admitida na primeira sessão de audiência de discussão e julgamento, a Ré pronunciou-se sobre as mesmas genericamente, por requerimento de 26 de janeiro de 2020, não pondo em causa a sua veracidade, o seu valor e os respetivos fornecimentos, tendo usufruído fiscalmente das mesmas.

9. Face aos factos provados sob os n.º s 39 e 40 - “39. A autora forneceu a ré pelo menos até 31.01.2019; 40. A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €135.936,70.” - a Ré não pode agora, a pretexto de uma suposta “violação de normas de direito processual e de direito substantivo” pretender a reapreciação da matéria de facto.

10. O artigo 342.º do CC não foi violado nos termos sustentados pela Ré. Efetivamente, a Autora provou os factos constitutivos do seu direito, conforme resulta da matéria de facto dado como provada. Diferentemente, a Ré não provou factos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito invocado, como também resulta da matéria de facto dado como provado.

11. A ausência de prova pela Ré de tais factos tem o mesmo efeito que teria a sua não alegação, isto é, tudo se passa como se esses factos não existissem nos termos alegados.

12. Como a Autora alegou nas suas alegações de revista é manifesto que a Ré não cumpriu o que acordou, quer porque não pagou as faturas emitidas referentes a fornecimentos efetuados, quer porque não cumpriu as quantidades mínimas anuais a que se obrigou.

13. Em meados de 2014, a Autora foi contactada pela Ré para a produção de frascos em PET para a venda dos seus produtos, nomeadamente suplementos alimentares (facto provado 2). Tendo a Ré informou que era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET (facto provado 4). Sendo que desde o início das negociações, em meados de 2014, que a fixação de quantidades mínimas anuais de compra por parte da Ré e a celebração de um contrato de fornecimento duradouro foi uma condição sine qua non da decisão da Autora de contratar, até porque, teria de realizar avultados investimentos, como efetivamente realizou (facto provados 8 e 36).

14. As negociações demoraram vários meses e culminaram com a apresentação de uma proposta pela Autora, descrita no facto provado 6, em 20 de novembro de 2014Se, como vimos, a proposta que consta dos factos provados (!!!), por diversas vezes, menciona “quantidades mínimas de produção” e “total anual”, como podem os Venerandos Desembargadores terem entendido, no seu douto acórdão, que não se provou que “a autora[1] estivesse obrigada à aquisição de quantidades anuais”? Face ao teor do facto 6, resulta até do senso comum, que a proposta foi apresentada tendo em conta as quantidades anuais obrigatórias (e já não as previstas), bem como a duração do contrato.

15. A proposta apresentada pela Autora que foi enviada por email, em 20 de novembro de 2014:

1. Frascos 4 L em preto e branco, com tampas cinza ou preto e opérculos:

a. Preço do frasco: € 730/mil unidade; Preço da tampa: € 156/mil

unidade; Preço do opérculo: não incluído;

b. Moldes: adiantamento de€8.000,00, comogarantia,100% recuperável aquando do consumo das 400.000 unidades. Pelo que em cada fatura seria deduzida a quantia de 20.000 unidades até à recuperação total da quantia de € 8.000,00;

c. Quantidades mínimas de produção (provadas no facto provado 6) i. 31.200 unidades (estimado 72 paletes);

ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto;

iii. Mínimo de 5.000 unidades em cor branco

- Total anual de produção/compras para os rascos: 200.000 unidades.

- Duração inicial do contrato: 2 anos. Efetivamente, se o adiantamento da Ré, para o arranque do projeto, seria recuperável com o consumo pela Ré de 400.000unidades e se o total anual de produção é de 200.000unidades, conclui-se que a duração inicial do contrato seria de 2 anos (200.000 unidades/ano, de forma a perfazer as 400.000 unidades).

16. A proposta foi aceite pela Ré em 24 de novembro de 2014, que a assinou e carimbou, com a menção “Aceite 24.11.2014”. Vide facto provado 7. Sendo que a Ré enviou a proposta, por si aceite, por email enviado em 25 de novembro de 2014, com o anexo que intitulou “CONTRATO FUTURA.” (sublinhado e bold nosso). Vide facto provado 7.

17. A relação comercial entre Autora e Ré decorria com normalidade, estando esta muito satisfeita com a prestação daquela. Tanto assim é que após a celebração do contrato de fornecimento supramencionado, a Ré propôs à Autora a celebração de novos contratos de fornecimento tendo por objeto o fornecimento de outros produtos, designadamente frascos de 4 Litros “...”, frascos de 7 Litros “...”, colheres doseadoras de 10 gramas e colheres “...”, bem frascos em vermelho, translúcidos/transparentes.

Sendo que tal facto criou ainda mais perspetivas acerca da duração da relação comercial que a própria Ré definia como sendo uma parceria. Vide factos provados 3 e 11.

18. Como resulta, e bem, do acórdão recorrido, a Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de € 135.936,70, decorrente de faturas referentes a fornecimentos ocorridos entre setembro a dezembro 2018. Todavia, a Autora apresentou nestes autos um requerimento para a retificação de erros materiais constantes do douto acórdão recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 614.º do Código do Processo Civil, através do qual se requereu que a condenação da Ré abrangesse também o pagamento das faturas relativas a fornecimentos efetuados entre Janeiro a Março 2019, no valor de € 57.420,06 (cinquenta e sete mil quatrocentos e vinte euros e seis cêntimos) correspondente às várias encomendas por si apresentadas, a que a Autora deu cumprimento, produzindo e entregando os produtos respetivos, nesse período temporal, sem qualquer reclamação da Recorrida, no total de € 192.290,13.

19. O artigo 762.º do CC não se mostra violado nos termos sustentados pela Ré. Efetivamente, como resulta dos factos provados 4 a 7, 11 a 15, 17 a 21, é absolutamente inequívoco que Autora e Ré estabeleceram quantidades anuais para os produtos objeto dos contratos de fornecimento celebrados, com exceção dos frascos vermelhos translúcidos/transparentes. Tanto assim é que a proposta que consta dos factos provados, mencionada, por diversas vezes, “quantidades mínimas de produção” e “total anual”, conforme facto provado 6, alínea c.

20. Além disso, dos factos provados sob os n.º s 28 a 35, resulta claramente que a Ré não cumpriu o acordado no que se refere à compra das quantidades mínimas anuais que acordou com a Autora.

21. Considerando as quantidades anuais acordadas e as que foram efetivamente encomendadas e fornecidas, constata-se que aquando da propositura da ação, em fevereiro de 2019, estava em falta a quantia total de € 1.823.126,98 (um milhão oitocentos e vinte e três mil cento e vinte seis euros e noventa e oito cêntimos).

Sendo que margem líquida que a Autora teria, ou seja, retirando custos como transporte, matéria prima, cartão, paletes, sacos, entre outros, seria de € 1.231.071,92 (um milhão duzentos e trinta e um mil e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos).

22. O artigo 879.º do CC não se mostra violado nos termos invocados pela Ré, desde logo, tendo em conta os factos provados 39 e 40 constantes do douto acórdão.

23. Ficou provado que a Autora cumpriu a obrigação de fornecer e/ou entregar os produtos. Tal como ficou provado que a Ré não pagou, pelo menos, a quantia de € 135.936,70.

Termos em que deve o recurso interposto pela Ré ser julgado totalmente improcedente».


7. Inconformada com esta decisão, na parte em que julgou improcedentes os pedidos de condenação da ré no pagamento de indemnização, a autora dela interpôs recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:

«1. O acórdão viola os artigos 227.º, 236.º a 239.º, 280.º, 282.º, 342.º, 334.º e 428.º do Código Civil, 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, o artigo 230.º do Código Comercial e o Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio.

2. Em meados de 2014, a Autora foi contactada pela Ré para a produção de frascos em PET para a venda dos seus produtos, nomeadamente suplementos alimentares (facto provado 2). Tendo a Ré informou que era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET (facto provado 4). Sendo que desde o início das negociações, em meados de 2014, que a fixação de quantidades mínimas anuais de compra por parte da Ré e a celebração de um contrato de fornecimento duradouro foi uma condição sine qua non da decisão da Autora de contratar, até porque, teria de realizar avultados investimentos, como efetivamente realizou (facto provados 8 e 36).

3. As negociações demoraram vários meses e culminaram com a apresentação de uma proposta pela Autora, descrita no facto provado 6, em 20 de novembro de 2014, a saber:

4. Como consta do facto provado 6 - que com o devido respeito não foi devidamente interpretado pelos Juízes Desembargadores - a proposta apresentada pela Autora previa quantidades mínimas obrigatórias anuais para cada um dos produtos, a saber:

a) Frascos 4 L em preto e branco, com tampas cinza ou preto:

- Preço do frasco e da tampa;

- a Ré teria de proceder a um adiantamento de € 8.000,00, para a Autora iniciar o projeto, para assim dar cumprimento ao contrato de fornecimento, nomeadamente das quantidades;

- O adiantamento da Ré seria recuperável aquando do consumo de 400.000 unidades;

- Quantidades mínimas por produção para os frascos: i. 31.200 unidades (estimado 72 paletes); ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto; iii. Mínimo de 5.000 unidades em cor branco

- Total anual de produção/compras para os frascos: 200.000 unidades.

- Duração inicial do contrato: 2 anos. Efetivamente, se adiantamento da Ré para o arranque do projeto seria recuperável com o consumo pela Ré de 400.000 unidades e se o total de produção anual de produção é de 200.000 unidades, conclui-se que a duração inicial do contrato seria de 2 anos (200.000 unidades/ano, de forma a perfazer as 400.000 unidades).

b) Frascos de 6 L em preto e branco, com tampas em preto ou cinza:

- Preço do frasco e da tampa;

- a Ré teria de proceder a um adiantamento de € 4.180,00, para a Autora iniciar o projeto, para assim dar cumprimento ao contrato de fornecimento, nomeadamente das quantidades;

- o adiantamento da Ré seria recuperável aquando do consumo de 220.000 unidades;

- Quantidades mínimas por produção para os frascos: i. 20.000 unidades (estimado 100 paletes); ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto; iii. Mínimo de 5.000 unidades em cor branco.

- Total anual de produção/compras para os frascos: 110.000 unidades.

- duração inicial do contrato: 2 anos. Efetivamente, se o adiantamento da Ré para o arranque do projeto seria recuperável com o consumo pela Ré de 220.000 unidades e se o total de produção anual de produção é de 110.000 unidades, conclui-se que a duração inicial o contrato de seria de 2 anos (110.000 unidades/ano, de forma a perfazer as 220.000 unidades).

c) Frascos de 8 L em preto e branco, com tampas em preto ou cinza: - Preço do frasco e da tampa;

- a Ré teria de proceder a um adiantamento de € 9.900,00, para a Autora iniciar o projeto, para assim dar cumprimento ao contrato de fornecimento, nomeadamente das quantidades;

- o adiantamento da Ré seria recuperável aquando do consumo de 330.000 unidades;

- Quantidades mínimas por produção para os frascos: i. 27.500 unidades (estimado 130 paletes); ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto.

- Total anual de produção/compras para os frascos: 165.000 unidades.

- duração inicial do contrato: 2 anos. Efetivamente, se o adiantamento da Ré para o arranque do projeto seria recuperável com o consumo pela Ré de 330.000 unidades e se o total de produção anual de produção é de 165.000 unidades, conclui-se que a duração inicial do contrato seria de 2 anos (165.000 unidades/ano, de forma a perfazer as 330.000 unidades).

5. Se, como vimos, a proposta que consta dos factos provados (!!!), por diversas vezes, menciona “quantidades mínimas de produção” e “total anual”, como podem os Venerandos Desembargadores terem entendido, no seu douto acórdão, que não se provou que “a autora[2]estivesse obrigada à aquisição de quantidades anuais”? Face ao teor do facto 6, resulta até do senso comum, que a proposta foi apresentada tendo em conta as quantidades anuais obrigatórias (e já não as previstas), bem como a duração do contrato.

6. A proposta foi aceite pela Ré em 24 de novembro de 2014, que a assinou e carimbou, com a menção “Aceite 24.11.2014”. Vide facto provado 7.

7. Sendo que a Ré enviou a proposta, por si aceite, por email enviado em 25 de novembro de 2014, com o anexo que intitulou “CONTRATO FUTURA.” (sublinhado e bold nosso). Vide facto provado 7.

8. A relação comercial entre Autora e Ré decorria com normalidade, estando esta muito satisfeita com a prestação daquela. Tanto assim é que após a celebração do contrato de fornecimento supramencionado, a Ré propôs à Autora a celebração de novos contratos de fornecimento tendo por objeto o fornecimento de outros produtos, designadamente frascos de 4 Litros “...”, frascos de 7 Litros “...”, colheres doseadoras de 10 gramas e colheres “...”, bem frascos em vermelho, translúcidos/transparentes. Sendo que tal facto criou ainda mais perspetivas acerca da duração da relação comercial que a própria Ré definia como sendo uma parceria. Vide factos provados 3 e 11.

9. Como resulta, e bem, do acórdão recorrido, a Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de € 135.936,70, decorrente de faturas referentes a fornecimentos ocorridos entre setembro a dezembro 2018. Todavia, a Autora apresentou nestes autos um requerimento para a retificação de erros materiais constantes do douto acórdão recorrido, ao abrigo do disposto no artigo 614.º do Código do Processo Civil, através do qual se requereu que a condenação da Ré abrangesse também o pagamento das faturas relativas a fornecimentos efetuados entre Janeiro a Março 2019, no valor de € 57.420,06 (cinquenta e sete mil quatrocentos e vinte euros e seis cêntimos) correspondente às várias encomendas por si apresentadas, a que a Autora deu cumprimento, produzindo e entregando os produtos respetivos, nesse período temporal, sem qualquer reclamação da Recorrida.

10. Estas últimas faturas não foram juntas aquando da Petição Inicial, uma vez que os fornecimentos ocorreram em data posterior, a saber:

- Fatura nº ...00 (documento 3), emitida em 13 de fevereiro de 2019, no valor de € 22.040,65, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 24 de janeiro de 2019, entregue em 13 de fevereiro de 2019 (no dia anterior ao da instauração da ação) através das guias de remessa n.º s ... e ... de 13-2-2019;

- Fatura nº ...04 (documento 4), emitida em 13 de fevereiro de 2019, no valor de € 4.602,29, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 24 de janeiro de 2019, entregue em 13 de fevereiro de 2019 (no dia anterior ao da instauração da ação) através da guia de remessa n.º ... de 13-2-2019;

- Fatura nº ...06 (documento 5), emitida em 14 de fevereiro de 2019, no valor de € 6.466,38, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 24 de janeiro de 2019, entregue em 14 de fevereiro de 2019 (dia da instauração da ação) através da guia de remessa n.º ... de 14-2-2019;

- Fatura nº ...09 (documento 2), emitida em 14 de fevereiro de 2019, no valor de € 5.020,44, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 24 de janeiro de 2019, entregue em 14 de fevereiro de 2019 (no dia da instauração da ação) através da guia de remessa n.º ... de 14-2-2019;    

- Fatura nº ...10 (documento 6), emitida em 15 de fevereiro de 2019, no valor de € 6.489,05, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 24 de janeiro de 2019, entregue em 15 de fevereiro de 2019 (no dia seguinte ao da instauração da ação) através da guia de remessa n.º ... de 15-2-2019;

- Fatura nº ...15 (documento 7), emitida em 18 de fevereiro de 2019, no valor de € 5.625,01, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a encomendas da Recorrida de 24 e 30 de janeiro de 2019, entregue em 18 de fevereiro de 2019 através da guia de remessa n.º ... de 18-2-2019;

- Fatura nº ...215 (documento 8), emitida em 28 de março de 2019, no valor de € 6.695,14, que, conforme consta do seu descritivo corresponde a uma encomenda da Recorrida de 19 de março de 2019 (após a citação para contestar a ação, que foi concretizada em 18 de fevereiro de 2019, conforme aviso de receção que consta destes autos), entregue em 28 de março de 2019 (após a entrada em juízo da contestação) através da guia de remessa n.º ... de 28-3-2019.

11. A ampliação do pedido foi admitida na primeira sessão de audiência de discussão e julgamento, como consta da respetiva gravação.

12. Perante tudo o que vai dito concluímos que o douto acórdão contém uma inexatidão ou lapso manifesto ao não condenar a Recorrida no pagamento da quantia de € 57.420,06 (cinquenta e sete mil quatrocentos e vinte euros e seis cêntimos), correspondente às encomendas que efetuou entre janeiro e março de 2019, a que a Recorrente deu cumprimento, produzindo e entregando os produtos respetivos, nesse período temporal, sem qualquer reclamação da Recorrida.

13. Quanto aos juros de mora, seja relativamente às faturas em cujo pagamento a Ré já foi condenada, seja relativamente às demais, acima indicadas, deverão ser calculados a partir da data de vencimento e cada uma delas e não a partir da data da citação.

14. O Decreto-Lei n.º 62/2013, de 10 de maio dispõe no n.º 2 do artigo 4.º, com epígrafe “transações entre empresas” o seguinte: “em caso de atraso de pagamento, o credor tem direito a juros de mora, sem necessidade de interpelação, a contar do dia subsequente à data de vencimento, ou do termo do prazo de pagamento, estipulados no contrato.” Sendo que este diploma legal é aplicável ao caso em apreço atento o disposto no seu artigo 2.º, de acordo com o qual “este diploma aplica-se a todos os pagamentos efetuados como remuneração de transações comerciais.” E, além disso, o artigo 3.º, alínea b) do diploma legal em análise, define transação comercial como sendo “uma transação entre empresas ou entre empresas e entidades públicas destinada ao fornecimento de bens ou à prestação de serviços contra remuneração”.

15. Em transações entre comerciantes/empresas, há uma regra supletiva legal, “especial”, que é a de que, nada dizendo o contrato, a obrigação de pagar o preço se vence automaticamente, sem necessidade de interpelação, passados 30 dias; não valendo a regra geral do artigo 805.º/1do CC, segundo a qual, nada dizendo o contrato, a obrigação de pagar o preço só se vence após a interpelação do credor.

16. Assim, os juros são devidos desde data de vencimento das faturas (que na sua maioria tem como prazo de vencimento de 30 dias). E, na pior das hipóteses, isto é, nas faturas que preveem o pronto pagamento, deve aplicar-se a referida regra supletiva legal “especial”, isto é, a obrigação de pagar o preço vence-se automaticamente, sem necessidade de interpelação, passados 30 dias.

17. Se confrontarmos as quantidades mínimas anuais a que a Ré se comprometeu a encomendar à Autora (constantes dos factos provados s 6, 7, 11, 12, 17, 19 e 23) com as quantidades que aquela efetivamente encomendou (constantes dos factos provados 28 a 35) é manifesto o incumprimento da Ré, que se cifra na quantia de € 2.385.949,00 (dois milhões trezentos e oitenta e cinco mil novecentos e quarenta e nove euros), a que corresponde a quantia líquida de € 1.231.071,92. Caso assim não se entenda,

18. Contudo se, não obstante o exposto, o tribunal considerar que não há elementos para fixar o objeto e a quantidade, deverá condenar a Ré na quantia que vier a ser liquidada, ao abrigo de faculdade prevista no artigo 609.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.    

19. Mesmo que se entenda que os contratos não são renováveis, deve a Ré, pelo menos, ser condenada a cumprir as quantidades previstas no prazo inicial dos mesmos, uma vez, nem estas foram cumpridas.

20. Como os próprios Juízes Desembargadores admitiram no douto acórdão recorrido, as partes celebraram um contrato de fornecimento, aliás, vários contratos de fornecimento, através dos quais acordaram que o fornecedor (Autora) realizaria futuras entregas de certos produtos e quantidades, durante um período determinado, mediante contraprestação pecuniária.

21. De meados de 2014 até 20 de novembro de 2014 - factos provados 2 a 6 -, ou seja, desde o início das negociações até ao envio da proposta pela Autora à Ré, as partes negociaram os contratos de fornecimento, ou seja, o objeto, as quantidades, a duração. Ou seja, nesse lapso temporal, estávamos na fase pré-negocial, na qual as partes devem agir de boa-fé, como impõe o artigo 227.º do Código Civil.

22. A Ré, ainda antes de celebrar qualquer contrato de fornecimento, informou a Autora que “era uma empresa em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceira com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET.” [3]  O que significa que criou na Autora a legítima expetativa que teriam uma relação comercial duradoura, daí ter referido que pretendia “desenvolver uma parceria”. E daí terem acordado que o contrato teria a duração de, pelo menos, dois anos, renovável. Tanto é que a Autora forneceu a Ré desde 11 de novembro de 2015 - facto provado 24 - até “pelo menos, 31 janeiro de 2019” - facto provado 39.

23. O facto de os fornecimentos terem perdurado durante tantos anos, como os próprios Juízes Desembargadores reconhecem, demonstra inequivocamente que a intenção das partes, isto é, a sua vontade aquando da celebração dos contratos de fornecimento era que os mesmos fossem duradouros.

24. Os contratos foram celebrados por dois anos, renováveis, por iguais períodos, tanto é que ainda hoje se mantêm em vigor, já que nenhuma das partes o denunciou. A prova inequívoca que os contratos são renováveis é o facto de ao longos dos vários anos, em concreto desde 24 de novembro de 2014 - data em que a Ré aceitou o contrato, conforme facto provado 7 - até março de 2019, ou seja, após a instauração da ação, a Ré continuou a colocar encomendas à Autora que, por sua vez, as continuou a satisfazer. Aliás, na pior das hipóteses, pode entender-se que a Autora forneceu a Ré até, pelo menos, 31 de janeiro de 2019, como consta do facto provado 39.

25. Face a todas as circunstâncias a que aludimos nas conclusões anteriores, concluímos que o declaratário normal, colocado na situação da Autora, entenderia que os contratos estipulavam quantidades mínimas anuais obrigatórios e que teria a duração de dois anos. Vide artigo 236.º do Código Civil.

26. Como vimos, a proposta que consta do facto provado 4, refere, por diversas vezes, “quantidades mínimas por produção” e “total anual”.

27. Considerado que: foi Autora que, em meados de 2014, contactou a Ré para a produção de frascos em PET (Politereftalato de etileno) para a venda dos seus produtos, nomeadamente suplementos alimentares (Facto provado 2); foi a Ré que informou que era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET (Facto provado 3); foi a Ré que teve a iniciativa, em 7 de julho de 2014, de enviar um email à Autora no qual informou os consumos mínimos previstos de todos os produtos (facto provado 4); a Ré, em 24 de novembro de 2014, aceitou a proposta que lhe tinha sido enviada pela Autora em 20 de novembro de 2014, na qual, como explicitámos supra, previa quantidades anuais obrigatórias em relação a todos os produtos, daí as menções a “quantidades mínimas por produção”, “total anual”; se o teor da proposta - facto provado 6 - é absolutamente claro no que respeita às quantidades mínimas de produção, ao total anual e à duração (atenta a referência à recuperação do adiantamento do valor dos moldes), como se demonstrou na conclusão 4supra; se a Ré a assinou e carimbou tal proposta com a menção “Aceite 24.11.2014”, proposta essa que enviou para a Autora, por email, com a proposta que aceitou em anexo e que intitulou “contrato Futura.” (facto provado7)

E,

Considerando que: a Autora, após o contrato a que se alude supra, iniciou a compra de algumas máquinas/equipamentos, a produção dos moldes e a compra dos opérculos e levou a cabo investimentos em maquinaria, moldes, pessoal e trabalho especializado em valor concretamente não apurado, mas não superior a € 1.000.000,00 (factos provados 8 e 36), Conclui-se que, o homem normal, medianamente sagaz, diligente e prudente, tendo em conta a conduta da Ré descrita nas conclusões anteriores, as circunstâncias que antecederam a celebração do contrato de fornecimento e o próprio teor do contrato, concluiria sempre que o contrato previa quantidades mínimas obrigatórias, de produção e anuais, e não previstas ou estimadas, como sustenta a Ré. De outro modo, a Autora não faria investimentos tão avultados, com fez. É do senso comum.

28. Ao considerar que não foram acordadas quantidades mínimas obrigatórias, de produção e anuais, os Venerandos Desembargadores procederam à errada aplicação dos critérios da interpretação do negócio jurídico constantes dos artigos 236.º e seguintes do Código Civil.

29. Para a interpretação de negócios jurídicos, como é o caso dos contratos de fornecimento em causa nestes autos, tem de proceder-se a uma cuidada, e detalhada análise do teor dos mesmos (factos provados 6, 11, 12, 14, 17, 19 e 23), sem prejuízo de atentar nas negociações pré-negociais que culminaram com a celebração dos contratos, nomeadamente nas seguintes: foi a Ré que, no exercício da sua atividade comercial, em meados de 2014, contactou a Autora para a produção de frascos em PET (Politereftalato de etileno) para a venda dos seus produtos, nomeadamente suplementos alimentares (facto provado 2); a Ré informou a Autora que “era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET.” (facto provado 3); foi a Ré que enviou um email à Autora com os consumos mínimos dos produtos. (facto provado 4); foi nesse seguimento, que, em novembro de 2014, a Autora enviou uma proposta para a Ré, para os diversos tipos de frascos que lhe foram solicitados, bem como para as respetivas tampas e opérculos, prevendo detalhada e discriminadamente em relação a cada um dos produtos (frascos) as “quantidades mínimas de produção” e a “quantidade anual” (facto provado 6).

30. O acórdão viola igualmente o artigo 237.º do Código Civil, porquanto a solução preconizada não conduz, de todo, ao maior equilíbrio das prestações. Aliás, constitui uma flagrante injustiça, porque do mesmo decorre que a Autora só tem deveres (de valor avultado, no caso dos investimentos) e ao invés a Ré só tem direitos.

31. O acórdão viola o artigo 239.º do Código Civil, segundo o qual, na falta de disposição especial, a declaração negocial deve ser interpretada de acordo com a vontade que as partes teriam tido se tivessem previsto o ponto omisso, ou de acordo com os ditames da boa fé, quando outra seja a solução por ela imposta.

32. Apesar do contrato de fornecimento ser bilateral, ou seja, prever direitos e deveres para ambas as partes, certo é que os Venerandos Desembargadores entendem que os contratos de fornecimento em causa nestes autos são, na verdade, unilaterais, já que a Ré tem só direitos, enquanto a Autora tem só deveres.

33. Se acolhermos o entendimento sustentado pela Ré e pelos Venerandos Desembargadores, estaremos perante um negócio unilateral, ofensivo da boa-fé e dos bons costumes e, no limite, usurário. Vide artigos 280.º e 282.º do Código Civil.

34. É também manifesto que a Ré, agiu de má-fé, nomeadamente nos preliminares da celebração do contrato, sendo a sua conduta geradora da obrigação de indemnizar a Autora a título de responsabilidade pré- contratual, nos termos do disposto no artigo 227.º do Código Civil.          

35. Por força dos contratos de fornecimento celebrados, foram criadas, no fornecedor, pela contraparte, fortes e legítimas expectativas de celebrar, no futuro, um número indeterminado de contratos de execução (compra e venda). Pelo que a inesperada falta de encomendas, confere ao primeiro o direito a indemnização pelo dano da confiança, correspondente ao interesse contratual negativo.

36. É notório que a Ré, agiu de má-fé, sendo a sua conduta geradora da obrigação de indemnizar a Autora a título de responsabilidade contratual. Sendo certo que a sua culpa se presume, atendendo ao disposto no artigo 799.º do Código Civil.

Termos em que deve ser revogada o douto acórdão na parte em que julgou improcedentes os pedidos 1, 2, 3, 5 e 6, devendo a ação ser julgada totalmente procedente.».


8. A ré respondeu, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões que se transcrevem:

«1 – O recurso de revista interposto pela autora não é admissível por ser manifesto que com a douta decisão proferida pelo Tribunal da Relação ocorreu a verificação do princípio da dupla conforme previsto no artigo 671.º, n.º 3 do CPC.

2 – Com a excepção dos casos em que o recurso é sempre admissível (artigo 692.º, n.º 2, alíneas a) a d)); ou em que a lei admita um recurso de revista excepcional (alíneas a) a c) do artigo 672.º, n.º 1), vigora o princípio da dupla conforme.

3 – De acordo com o aludido princípio não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância.

4 – Sempre que o apelante obtenha uma procedência parcial do recurso na Relação, isto é, sempre que a Relação pronuncie uma decisão que é mais favorável – tanto no aspecto quantitativo como no aspecto qualitativo – para esse recorrente do que a decisão recorrida proferida pela 1.ª instância, está-se perante duas decisões “conformes” que impedem que essa parte possa interpor recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça – cfr. MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA, “"Dupla conforme": critério e âmbito da conformidade”, in Cadernos de Direito Privado, n.º 21, Janeiro/Março de 2008, pág. 24.

5 – A autora interpôs recurso nos termos do disposto no artigo 671.º, n.º 1 do CPC; não fundamentou a sua revista em nenhum dos casos em que o recurso é sempre admissível – artigo 629.º, n.º 2, alíneas a) a d). Nem interpôs recurso de revista excepcional. Assim sendo, o recurso de revista da autora só será admissível se não se verificar a dupla conforme.

6 – A decisão de 1.ª instância julgou a acção instaurada pela autora totalmente improcedente e absolveu a ré de todos os pedidos contra si formulados.

7 – Daquela, interpôs a autora recurso de apelação tendo, em consequência, a Relação proferido acórdão em que julgou o recurso parcialmente procedente e condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 135.936,70, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais dos juros comerciais aplicáveis, contados desde a citação e até integral e efectivo pagamento.

8 – Daqui resulta, por aplicação do disposto no artigo 671.º, n.º 3 do CPC e na esteira dos ensinamentos do Professor Miguel Teixeira de Sousa, no estudo citado, que estamos perante uma decisão “conforme” do tribunal da Relação, que constitui assim uma dupla conforme.

9 – Pelo que o recurso de revista interposto pela autora é inadmissível por se verificar uma situação de dupla conforme, não devendo o mesmo ser admitido.

Sem prescindir

10 – As alegações de revista da autora constituem uma repetição do que esta alegara na petição inicial e no recurso de apelação: a recorrente, uma e outra vez, insiste em querer ver provados factos – quantidades mínimas obrigatórias, renovações contratuais, indemnizações – que já foram julgados em primeira instância e reapreciados pela Relação.

11 – E de caminho pretende a autora uma segunda instância de recurso da matéria de facto em sede de revista – o que só seria admissível nos estreitíssimos limites do artigo 674.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC, o qual não invoca.

12 – Com efeito, a recorrente reinterpreta os factos julgados provados, oferecendo somente uma interpretação alternativa, olvidando o escrutínio que a 1.ª instância e a Relação realizaram sobre os mesmos; e olvidando que um possível erro – que não existe – na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objecto de recurso de revista.

13 – Por outro lado, em momento algum a autora invoca a 2.ª parte do artigo 674.º, n.º 3 do CPC, defendendo existir a ofensa de uma disposição expressa de lei que exige certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova.

14 – O recurso a que ora se responde, estabelece ab initio o direito aplicável; após reinterpreta os factos para que estes se subsumam à previsão das normas que a autora entende serem as aplicáveis, concluindo com obviedade: que a Relação ao não ter aplicado o mesmo direito que a autora – precisamente porque fixou a matéria de facto após a apreciação crítica e ponderada da prova e só após aplicou o Direito – violou a lei substantiva e processual.

15 – É uma fórmula infalível para obter provimento em qualquer recurso de revista – lamentavelmente à custa da inversão do silogismo judiciário e das regras da lógica formal.

16 – As conclusões vertidas sob os números 2 a 8, 17, 19 a 24, correspondem a reinterpretações alternativas, e meramente opinativas, dos factos provados que a autora menciona ao longo do recurso – desconsiderando o labor de apreciação da prova produzida em sede de julgamento por parte da 1.ª instância e da Relação.

17 – Alega a recorrente que o douto acórdão da Relação contém uma inexactidão ou lapso manifesto ao não condenar a ré no pagamento da quantia de € 57.420,06.

18 – Aquele acórdão apreciou a pretensão da autora, concluindo que não há prova bastante para julgar provado que após 31-01-2019 os alegados fornecimentos da recorrente tiveram a anuência da ré.

19 – O itinerário decisório – que se transcreve na resposta – é claro e inteligível; e a decisão a conclusão lógica daquele percurso. Não existe, pois, qualquer inexactidão, omissão ou lapso manifesto no douto acórdão.

20 – A autora alega que o cálculo de juros de mora das facturas que a ré foi condenada a pagar, na sequência do acórdão da Relação, deve ocorrer a partir da data de vencimento de cada uma delas e não a partir da citação – fundando a sua pretensão no artigo 4.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 62/2013 de 10 de Maio.

21 – As alíneas a) a d) do n.º 2, do artigo 4.º daquele diploma estabelecem soluções para o início da contagem dos juros de mora, todavia, para que estas sejam aplicáveis é necessário que se prove os requisitos específicos de cada uma delas.

22 – Sucede que não existe prova de qualquer dos factos de que depende a aplicação das alíneas a) a d), pelo que o único momento que servirá como início para a contagem dos juros de mora, é pois o da citação da ré – como, aliás, decidiu a Relação.

23 – Posto que o recurso de revista sobre a matéria de facto não é admissível fora das limitadas hipóteses do artigo 674.º, n.º 3, 2.ª parte, do CPC, a recorrente invoca em seu auxílio a putativa violação de uma norma de processo civil – a saber: o artigo 609.º, n.º 2 do CPC.

24 – Ao contrário do que alega a recorrente, o ponto não é o da existência ou inexistência de elementos para fixar o objecto e a quantidade em que a ré alegadamente deve ser condenada, mas antes que perante toda a prova produzida a 1.ª instância e a Relação não julgaram provados quaisquer factos que permitissem concluir pela existência da responsabilidade contratual ou extracontratual da ré.

25 – A autora invoca ainda a alegada violação dos artigos 236.º a 239.º do CC aquando da apreciação da prova por parte da Relação.

26 – O recurso a tais normas implica a existência de uma dificuldade interpretativa, falta de clareza ou obscuridade, das declarações negociais das partes. O que manifestamente não ocorre, como, aliás, resulta do douto acórdão da Relação no segmento em que se pronuncia sobre os factos não provados 2.1. a 2.4 e 2.5 e 2.6. – que se cita na resposta.

27 – Por último, a recorrente alega ainda que o douto acórdão da Relação violou os artigos 280.º, 282.º e 227.º do CC.

28 – Tal alegação surge como se nem a 1.ª instância nem a Relação se tivessem detido, de modo escrupuloso, sobre a prova produzida e sobre o Direito aplicável, concluindo, ambas, que não há qualquer prova que sustente o pedido da autora.

29 – Não consta dos autos, nem poderia constar, quaisquer factos julgados provados que se possam subsumir às normas dos artigos 280.º, 282.º e 227.º do CC que a recorrente alega terem sido violadas.

30 – Pelo que, deverá o recurso de revista interposto pela autora ser julgado totalmente improcedente.

Termos em que não deve ser admitido o recurso de revista interposto pela autora;

Sem prescindir

- deve o recurso ser julgado totalmente improcedente».


9. Após os vistos, cumpre apreciar e decidir.



***



II. Questão prévia da admissibilidade do recurso de revista

Sustenta a ré a inadmissibilidade do recurso de revista interposto pela autora por ser manifesta a ocorrência de dupla conforme prevista no art. 671º, nº 3, do CPC, já que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação foi mais favorável à autora do que a decisão da 1ª Instância.

Mas, em nosso entender, não lhe assiste qualquer razão.

É que  se é certo ser o acórdão recorrido  mais favorável à autora, na medida em que revogou a sentença recorrida que  havia absolvido a ré  de todos os pedidos  contra si formulados e condenou a ré a pagar à autora a quantia de € 135.936,70, acrescida de juros de mora, às sucessivas taxas legais dos juros comerciais aplicáveis, contados desde a citação e até integral e efetivo pagamento, certo é também que esta condenação resultou da circunstância de o Tribunal da Relação ter alterado a decisão do Tribunal de 1ª Instância   sobre a matéria de facto, dando como provados os factos considerados não provados pelo Tribunal de 1ª Instância no ponto 2.13[4] e aditado a factualidade descrita no nº 40[5] dos factos dados como provados.

Estamos, assim, perante uma modificação essencial da matéria de facto provada ou não provada, que implicou uma modificação essencial da motivação jurídica, o que tanto basta para descaracterizar a dupla conformidade das duas decisões, nos termos e para os efeitos do n.º 3 do artigo 671.º do CPC.

Daí nenhum obstáculo existir à admissibilidade do presente recurso de revista, nos termos do art. 671, nº 1, do CPC, pelo que improcede a questão prévia suscitada pela ré.



***



III. Delimitação do objeto do recurso


Como é sabido, o objeto do recurso determina-se pelas conclusões da alegação dos recorrentes, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do C. P. Civil, só se devendo tomar conhecimento das questões que tenham sido suscitadas nas alegações e levadas às conclusões, a não ser que ocorra questão de apreciação oficiosa[6].


Assim, a esta luz, as questões a decidir consistem em saber:

A- Quanto ao recurso da ré, se o Tribunal da Relação violou as normas contidas no art. 574º, nº 1 e 2, do CPC e nos arts. 342º, nº 1 e 374º, nº 2, ambos do C. Civil.

B - Relativamente ao recurso da autora, se:

1ª- devem proceder os pedidos formulados pela autora sob os nºs 1, 2, 3, 5 e 6 da petição inicial e se, em consequência da ampliação do pedido, há lugar à condenação da ré no pagamento da quantia de € 57.420,06, correspondente aos fornecimentos efetuados entre janeiro e março de 2019, acrescida de juros legais devidos desde a data de vencimento das respetivas faturas;

2ª - os juros de mora são devidos desde a data de vencimento das respetivas faturas.



***



IV. Fundamentação


3.1. Fundamentação de facto


Factos provados

1. A Autora é uma sociedade comercial que se dedica à indústria de transformação de matérias resinosas plásticas. Por sua vez, a Ré é uma sociedade comercial que se dedica ao embalamento, fabricação e comercialização de suplementos alimentares, produtos naturais e dietéticos e outro tipo de alimentos, os quais são embalados em frascos compostos por um polímero termoplástico designado PET (politereftalato de etileno).

2. No exercício da sua atividade comercial, em meados de 2014, a Autora foi contactada pela Ré para a produção de frascos em PET (Politereftalato de etileno) para a venda dos seus produtos, nomeadamente suplementos alimentares.

3. A Ré informou que era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET.

4. Em 7 de julho de 2014 a Ré enviou um email à Autora no qual informou os consumos mínimos previstos de todos os produtos.

5. A Autora, em 18 de novembro de 2014, enviou as propostas para os diversos tipos de frascos que lhe foram solicitados, ou seja, frascos de 4, 6 e 8 litros, pretos e brancos, opacos, com respetivas tampas cinza e preta, e opérculos.

6. A proposta apresentada pela Autora que foi enviada por email, em 20 de novembro de 2014, consistia no seguinte:

1) Fornecimento de frascos de 4 L em preto e branco, com tampas cinza ou preto e opérculos:

a. Preço do frasco: € 730/mil unidade; Preço da Tampa: € 156/mil unidade; Preço do Operculo: não incluído;

b. Moldes: adiantamento de € 8.000,00, como garantia, 100% recuperável aquando do consumo de 400.000 unidades. Pelo que em cada fatura seria deduzida a quantia de € 20/mil unidades até à recuperação total da quantia de € 8.000,00;

c. Quantidades mínimas de produção:

i. 31.200 unidades (estimado 72 paletes)

ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto;

iii. Mínimo de 5.000 unidades em cor branco

iv. TOTAL ANUAL: 200.000 unidades

d. Com a encomenda a Ré devia informar um plano de entregas para um período máximo de 60 dias.

2) Fornecimento de frascos de 6 L em preto e branco, com tampas em preto ou cinza e opérculos:

a. Preço do frasco: € 1004/mil unidade; Preço da Tampa: € 156/mil unidade; Preço do Operculo: não incluído;

b. Moldes: adiantamento de € 4.180,00, como garantia, 100% recuperável aquando do consumo de 220.000 unidades. Pelo que em cada fatura seria deduzida a quantia de € 19/mil unidades até à recuperação total da quantia de € 4.180,00;

c. Quantidades mínimas de produção:

i. 20.000 unidades (estimado 100 paletes)

ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto;

iii. Mínimo de 5.000 unidades em cor branco

iv. TOTAL ANUAL: 110.000 unidades

d. Com a encomenda a Ré devia informar um plano de entregas para um período máximo de 60 dias.

3) Fornecimento de frascos de 8 L preto e branco, com tampas em preto ou cinza e opérculos:

a. Preço do frasco: € 1024/mil unidade; Preço da Tampa: € 156/mil unidade; Preço do Operculo: não incluído;

b. Moldes: adiantamento de € 9.900,00, como garantia, 100% recuperável aquando do consumo de 330.000 unidades. Pelo que em cada fatura seria deduzida a quantia de € 30/mil unidades até à recuperação total da quantia de € 9.900,00;

c. Quantidades mínimas de produção:

i. 27.500 unidades (estimado 130 paletes)

ii. Mínimo de 10.000 unidades em cor preto;

iii. TOTAL ANUAL: 165.000 unidades

d. Com a encomenda a Ré devia informar um plano de entregas para um período máximo de 60 dias.

7. Esta proposta foi aceite pela Ré em 24 de novembro de 2014, que a assinou e carimbou, com a menção “Aceite 24.11.2014”. Por email enviado em 25 de novembro de 2014, a Ré enviou a proposta, por si aceite, como anexo que intitulou “contrato Futura.”

8. Após o contrato a que se alude supra, a Autora iniciou a compra de algumas máquinas/equipamentos, a produção dos moldes e a compra dos opérculos.

9. A entrega dos produtos pela Autora à Ré sempre foi feita à medida das solicitações desta através das respetivas encomendas, que eram enviadas por email.

10. Inicialmente a rotulagem dos frascos era feito pela Ré. Contudo, eram frequentes os problemas com a rotulagem do frasco na Ré. Por conseguinte, Autora e Ré acordaram que aquela iria suportar a rotulagem dos frascos, sem encargos para Ré, pelo que passaria a proceder à entrega dos mesmos já devidamente rotulados.

A Ré envia à Autora os rótulos necessários para que esta os aplique nos respetivos frascos objeto das notas de encomenda.

11. Após, a Ré propôs à Autora a celebração de novos contratos de fornecimento tendo por objeto o fornecimento de outros produtos, designadamente frascos de 4 Litros “...”, frascos de 7 Litros “...”, colheres doseadoras de 10 gramas e colheres “...”.

Tal como propôs à Autora o fornecimento de frascos em vermelho, translúcidos/transparentes.

12. Em março de 2015, a Ré contatou a Autora para que esta lhe apresentasse uma proposta para o fornecimento de outro produto, designadamente frascos de 4 Litros “...”, tampas “...” e respetivos opérculos, bem como colheres doseadoras de 10 gramas

Em cumprimento das instruções da Ré, a Autora apresentou propostas para o fornecimento dos referidos produtos.

Propostas que foram aceites pela Ré em 9 de junho de 2015. 13. A Autora emitiu duas faturas, a saber:

- fatura n.º ...14, de 27 de março de 2016, referente a “adiantamento para compra de matrizes da tampa ...” “conforme condições de pagamento e fornecimento aprovadas por ambas as partes em 8 de maio de 2015”, no valor de € 4.305,00 (quatro mil trezentos e cinco euros); e,

- fatura n.º ...43, de 18 de agosto de 2016, referente a “investimento em molde de sopro para produção de bottle 4 L ...” “conforme condições de pagamento e fornecimento aprovadas por ambas as partes em 8 de junho de 2015”, no valor de € 7.380,00 (sete mil trezentos e oitenta euros).

14. Em março de 2015, a Ré solicitou à Autora que esta lhe apresentasse uma proposta para o fornecimento de frascos de 7 litros “...”.

A Autora apresentou a proposta de fornecimento solicitada, proposta essa que foi aceite pela Ré em 20 de março de 2015.

15. Tendo a Autora emitido duas faturas, a saber:

- fatura n.º ...54, de 21 de março de 2015, referente a “adiantamento para produção de frasco 7 L ...” “conforme condições de pagamento e fornecimento aprovadas por ambas as partes em 20 de março de 2015.”, no valor de € 8.118,00 (oito mil cento e dezoito euros);

- fatura n.º ...44, de 18 de agosto de 2016, referente a “investimento em molde de sopro para produção de frasco 7 L ...” “conforme condições de pagamento e fornecimento aprovadas por ambas as partes em 20 de março de 2015.”, no valor de € 13.530,00 (treze mil quinhentos e trinta euros).

16. A autora realizou os descontos à ré em cada fornecimento de frascos vermelhos, destinados à recuperação do investimento inicial efectuado pela ré em moldes, nos termos estipulados nos acordos de 24 de Novembro de 2014. O que ocorreu de 22 de Novembro de 2016 até 22 de Outubro de 2018, data em que a autora emite a Factura n.º ...65, através da qual procede à correcção de abatimentos de adiantamentos frasco 4L vermelho e 8L vermelho, no montante global de € 7.231,35 (sete mil, duzentos e trinta e um euros e trinta e cinco cêntimos)

17. Em junho 2015, a Ré solicitou à Autora uma proposta para o fornecimento de colheres doseadoras de 10 gramas.

Em cumprimento do solicitado, a Autora apresentou uma proposta para o fornecimento, proposta essa que foi aceite pela Ré através de email enviado em 30 de junho de 2015.

18. A Autora emitiu duas faturas, a saber:

- fatura n.º ...67, em 11 de junho de 2016, referente a adiantamento para a produção da colher doseadora “conforme condições de fornecimento e pagamento acordadas por ambas as partes em 1/julho/2015”, no valor de € 3.690,00 (três mil seiscentos e noventa euros); e,

- fatura n.º ...115, em 27 de março de 2016, referente a adiantamento para a produção da colher doseadora “conforme condições de fornecimento e pagamento acordadas por ambas as partes em 1/julho/2015”, no valor de € 7.380,00 (sete mil trezentos e oitenta euros).

19. Em março de 2017, a Ré contatou a Autora para que esta lhe apresentasse uma proposta para o fornecimento de colheres denominadas “...”.

Em 9 de maio 2017, a Ré adjudicou à Autora a proposta por esta apresentada para o fornecimento de colheres “...” de 70 ml, estabelecendo como quantidade mínima de produção 18.000 (dezoito mil) unidades.

20. Ficou estabelecido que o preço das colheres era o seguinte:

a. para compras de 18.000 (dezoito mil) unidades (1 palete): € 46/mil unidades;

b. para compras de 36.000 (trinta e seis mil) unidades (2 paletes): € 40/mil unidades;

c. para compras de 72.000 (setenta e duas mil) unidades (4 paletes): € 33/mil unidades; d. para compras de 108.000 (cento e oito mil) unidades (6 paletes): € 30/mil unidades.

e. Moldes: adiantamento de € 9.000,00 (nove mil euros), como garantia, 100% recuperável aquando do consumo de 4.090.910 (quatro milhões noventa mil e novecentas e dez) unidades.

21. A Autora emitiu em 28 de julho de 2017 a fatura n.º ...81, no valor de € 7.380,00 (sete mil trezentos e oitenta euros), correspondente à produção de molde para colher “...”.

22. Em 8 de outubro de 2017, emitiu a fatura n.º ...18, no valor de € 3.690,00, correspondente a adiantamento para produção de molde para colher “...”.

23. Em 20 de outubro de 2016, a Ré solicitou à Autora amostras de frascos vermelhos translúcidos/transparentes, porquanto pretendia iniciar um novo projeto para o qual os mesmos eram necessários.

A Autora teve de fazer o desenvolvimento do novo produto, o que implicou novos moldes, de forma a produzir as amostras, suportando todos os custos daí decorrentes.

A Autora fabricou e enviou as amostras à Ré, que as aceitou, e iniciou as encomendas dos frascos em causa.

O fornecimento deste tipo de frascos teve início em 22 de novembro de 2016, data em que foi emitida a primeira fatura relativa aos mesmos.

A Autora estabeleceu o mesmo preço.

24. O primeiro fornecimento da autora à ré ocorreu em 11 de Novembro de 2015 e respeitou a frascos de 4 litros (pretos e brancos opacos).

25. A autora enviou à ré consecutivas encomendas de frascos “torcidos”, com riscos, convexos, com furos, o que originou, além do mais, a impossibilidade de colocação dos rótulos nas instalações da ré.

26. Após o fornecimento de frascos de 6 litros ocorrido em 2 de Dezembro de 2015, a ré, através do seu colaborador AA, responsável da qualidade, elaborou um relatório de ocorrência onde inventariou as seguintes não conformidades:

i) frascos transparentes;

ii) frascos com perfurações na base; iii) neck [gargalo do frasco] derretido; iv) base furada e deformada;

v) bolhas de ar;

vi) existência de buracos na lateral; vii) diferença na inclinação do frasco

27. A contínua persistência de defeitos nos produtos entregues pela autora motivou o envio de sucessivas comunicações pela ré a relatar pormenorizadamente as anomalias, não conformidades e ocorrências anómalas nos meses de Maio, Junho, Julho, Setembro e Dezembro de 2016, assim como nos meses de Fevereiro, Abril, Maio, Junho, Agosto, Setembro e Outubro de 2017.

28. De 11 de novembro de 2015 a 11 de novembro de 2017, a Autora vendeu à Ré a quantia total de 28.066 (vinte e oito mil e sessenta e seis) de frascos de 4 litros de cor preto/branco.

De 12 de novembro de 2017 até 31 de janeiro de 2019, a Autora nada vendeu à Ré, de frascos de 4 litros de cor preto/branco.

O valor unitário acordado por cada mil unidades era de € 730,00 (setecentos e trinta euros).

29. De 11 de novembro de 2015 a 11 de novembro de 2017, a Autora vendeu à Ré 28.066 (vinte e oito mil e sessenta e seis) Frascos de 6 litros, pretos e brancos (opacos).

De 12 de novembro de 2017 até 11 de novembro de 2018, a Autora vendeu à Ré 7.424 (sete mil quatrocentas e vinte e quatro) unidades,

De 12 de novembro de 2018 até 31 de janeiro de 2019, a Autora nada vendeu à Ré. O valor acordado por cada mil unidades era de € 1.014,00 (mil e catorze euros).

30. De 11 de novembro de 2015 a 11 de novembro de 2017, a Autora vendeu à Ré a quantia total de 27.356 (vinte e sete mil trezentos e cinquenta e seis) de Frascos de 8 litros, pretos e brancos (opacos)

De 12 de novembro de 2017 até 11 de novembro de 2018, a Autora vendeu à Ré 25.206 (vinte cinco mil duzentas e seis) unidades,

De 12 de novembro de 2018 até 31 de janeiro de 2019, a Autora vendeu à Ré 2.030 (duas mil e trinta) unidades.

O valor acordado por cada mil unidades era de € 1.024,00 (mil e vinte e quatro)

31. De 11 de novembro de 2015 a 11 de novembro de 2017, a Autora vendeu à Ré 206.781 (duzentas e seis mil setecentas e oitenta e uma) tampas.

De 12 de novembro de 2017 até 11 de novembro de 2018, a Autora vendeu à Ré 285.293 (duzentas e oitenta e cinco mil duzentos e noventa e três) tampas,

O valor acordado por cada mil unidades era de € 156,00 (cento e cinquenta e seis euros). De 12 de novembro de 2018 até 31 de janeiro de 2019, a Autora nada vendeu à Ré.

32. De 11 de novembro de 2015 a 11 de novembro de 2017, a Autora vendeu à Ré a quantia total de 523.319 (quinhentos e vinte e três mil trezentos e dezanove) opérculos

De 12 de novembro de 2017 até 11 de novembro de 2018, a Autora vendeu à Ré 481.685 opérculos De 12 de novembro de 2018 até 31 de janeiro de 2019, a Autora nada vendeu à Ré,

O valor unitário por cada mil unidades acordado era de € 160,00.

33. A Autora vendeu à Ré a quantia total de 494.414 (quatrocentos e noventa e quatro mil quatrocentas e catorze) unidades de tampas “...”.

O valor acordado por cada mil unidades era de € 200,00 (duzentos euros).

34. A Autora vendeu à Ré a quantia total de 1.150.792 (um milhão cento e cinquenta mil setecentos e noventa e duas) unidades de colheres genéricas e “...”,

O valor acordado por cada mil unidades era de € 29,20 (vinte e nove euros e vinte cêntimos).

35. A Autora vendeu à Ré a quantia total de 43.200 (quarenta e três mil e duzentas) unidades de colheres “...”.

O valor acordado por cada mil unidades era de € 46,00 (quarenta e seis euros).

36. A Autora levou a cabo investimentos em maquinaria, moldes, pessoal e trabalho especializado em valor concretamente não apurado, mas não superior a € 1.000.000,00.

37. Os moldes de pré-formas que a autora comprou no âmbito da parceria comercial com a ré são utilizáveis para o fabrico de frascos de diversos tamanhos que não apenas os que estão em discussão nos autos.

38. Na exposição ..., que decorreu em ... de 25 a 25 de Abril daquele ano, a autora expôs em primeira linha e com grande relevo todos os frascos produzidos para a ré.

E o mesmo sucedeu no ano de 2018, na exposição ... decorrida em ..., nos dias 25 a 28 de Abril, na qual a autora participou exibindo em primeira linha os frascos produzidos para a ré.

No, em 19 de março de 2019 no sítio da internet da autora estão à venda uma diversidade de frascos PET de 3, 4, 6 e 8 litros, todos desenvolvidos no âmbito da parceria comercial com a ré e que agora a autora coloca ao dispor de qualquer cliente.

A autora fabrica os frascos em causa – para outros clientes – destinados à comercialização de azeitonas, bolachas, tremoços, queijos com azeite, comida para cão entre outros.

A autora vende ainda os diferentes frascos através de uma plataforma on-line com o endereço www.....com .

39. A autora forneceu a ré pelo menos até 31.01.2019. [aditado pelo Tribunal da Relação]

40 A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €135.936,70. [alteração feita pelo Tribunal da Relação aos factos dados como não provados pelo Tribunal de 1ª Instância no ponto 2.13 (onde constava que «A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €192.290,13»]



*



Factos considerados não provados pelo Tribunal de 1ª Instância:

«2.1- Não havia nenhuma empresa e/ou entidade em Portugal que produzisse o tipo de frascos em questão em PET, porquanto nenhuma tinha maquinaria e equipamento próprio para o efeito.

2.2- A Ré exigiu que a Autora realizasse os investimentos como condição para celebrar os contratos de fornecimento.

2.3- Não fossem os contratos celebrados com a Ré e a Autora jamais teria comprado máquinas, equipamentos, moldes e contratado mão de obra especializada, para produzir os frascos e demais produtos objeto dos vários contratos de fornecimento celebrados e que estão em causa nestes autos.

2.4- Ao longo do relacionamento comercial com a Ré e de forma a poder cumprir os contratos de fornecimento, a Autora levou a cabo elevados investimentos em maquinaria, moldes, pessoal e trabalho especializado superiores a € 1.800.000,00 (um milhão e oitocentos mil euros).

2.5- Como a Ré sempre soube e sabe, desde o início das negociações que a fixação de quantidades mínimas anuais de compra por parte da Ré e a celebração de um contrato de fornecimento duradouro foi uma condição sine qua non da decisão da Autora de contratar.

2.6- Ao longo das negociações foi sendo sempre referido que a fixação de quantidades mínimas anuais era essencial para ajudar a suportar parte do investimento, nomeadamente os custos da maquinaria, equipamentos e moldes, bem como os custos de desenvolvimento de produto e das equipas especializadas de trabalho.

2.7- Foi ainda acordado que o contrato teria a duração inicial de 2 (dois) anos, prorrogável automaticamente por iguais períodos, caso não fosse denunciado por nenhum dos contraentes.

2.8- Em março de 2015, quando a Ré contatou a Autora para que esta lhe apresentasse uma proposta para o fornecimento de outro produto, designadamente frascos de 4 Litros “...”, tampas “...” e respetivos opérculos, bem como colheres doseadoras de 10 gramas, indicou as seguintes quantidades mínimas anuais:

a) 120.000 (cento e vinte mil) unidades/ano para tampas “...”;

b) 500.000 (quinhentas mil) unidades/ano para colheres doseadoras de 10 gramas; e,

c) 40.000 (quarenta mil) unidades/ano para frascos 4 Litros “...”.

2.10- Em março de 2015, a Ré solicitou à Autora que esta lhe apresentasse uma proposta para o fornecimento de frascos de 7 litros “...”, com a quantidade mínima anual de 80.000 (oitenta mil) unidades.

2.11- Em junho 2015, a Ré solicitou à Autora uma proposta para o fornecimento de colheres doseadoras de 10 gramas, com a quantidade mínima anual de 500.000 (quinhentas mil) unidades.

2.12- Em cumprimento do solicitado, a Autora apresentou uma proposta para o fornecimento da quantidade mínima anual de 500.000 (quinhentas mil) unidades, proposta essa que foi aceite pela Ré através de email enviado em 30 de junho de 2015.

2.13- [eliminado pelo Tribunal da Relação][7].

2.14- A margem líquida que a Autora teria, ou seja, retirando custos como transporte, matéria prima, cartão, paletes, sacos, entre outros, seria de € 1.231.071,92 (um milhão duzentos e trinta e um mil e setenta e um euros e noventa e dois cêntimos), devidamente discriminado no documento anexo, no qual constam detalhadamente os custos de produção, nomeadamente o custo das paletes, custo do transporte, custos com a cor e com o cartão.

2.15- O volume de encomendas por entregar é tal que a Autora teve de arrendar um outro armazém pois já não tinha espaço nas suas instalações.



***



3.2. Fundamentação de direito


3.2.1. Conforme já se deixou dito, o objeto do recurso interposto pela ré prende-se, essencialmente, com a questão de saber se o Tribunal da Relação violou normas de direito processual e de direito substantivo.


Insurge-se a ré  contra a decisão do Tribunal da Relação de condená-la  no pagamento à  autora da quantia de €135.936,70, acrescida de juros de mora, sustentando que, tendo impugnado a veracidade das faturas juntas pela autora, era sobre esta que recaía o ónus de provar, designadamente  que as faturas eram falsas, no sentido de que  não correspondiam a produtos por si encomendados e desejados, que os produtos constantes das faturas e respetivo preço  não correspondiam ao acordado ou ainda que, não obstante  nas faturas constar que os produtos ficaram à  disposição da ré, esta  não os recebeu, pelo que, ao fazer impender sobre a ré o ónus de prova desta factualidade, o acórdão recorrido violou o  disposto no art. 574º, nº 1 e 2, do CPC e nos arts. 342º, nº 1 e 374º, nº 2, ambos do C. Civil.

Ou seja, no fundo, impugna a ré a alteração da decisão sobre a matéria de facto supra descrita no nº 40 [A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €135.936,70], que o Tribunal de 1ª Instância tinha dado como não provada no ponto 2.13 e que o Tribunal da Relação deu como provada, com base na seguinte fundamentação:

«A ré, na sua contestação, limitou-se a impugnar, tabelar e genericamente, os factos aduzidos pela autora, vg. a existência de dívida decorrente de alegados fornecimentos não pagos, e, bem assim e no que ora aqui releva, o valor probatório dos documentos por ela apresentados, rectius os atinentes a tal dívida fls. 104vº.

Esta impugnação tabelar e genérica no concernente aos documentos apresentados é uma postura cómoda que a lei concede ao demandado e que passa para o apresentante do documento o ónus da prova da sua autoria e veracidade – artº 374º nº 2 do CC.

Porém, se a parte não é concreta e convincente na sua impugnação, e os restantes elementos que rodeiam o caso indicarem/indiciarem suficientemente tal boa e legítima autoria e esta veracidade, elas são de conceder sem exigência probatória desmedida e exacerbada.

É o caso dos autos.

Está provado que existiu um relacionamento comercial entre as partes com fornecimento da autora à ré de produtos do jaez dos incluídos nas faturas que aquela juntou aos autos.

Ademais, a autora enviou à ré, em 02.11.2018 uma carta onde já se queixava da falta de pagamento de alguns dos fornecimentos, no valor total de 87.982,19 euros.

E a ré, na sua resposta a tal missiva, não contestou tal dívida, exceto quanto à Factura n.º ...65 no valor de 7.231,35 – cfr. docs. 33, 34 e 37 de fls.80vº e sgs.

Acresce que a ré, no email que enviou à autora em 29.10.2018, admite que continua a receber produtos da autora, queixando-se inclusive que não estão a ser cumpridos os prazos de entrega – doc. fls 74vº e sgs.

Finalmente, na sua contestação a ré admite que manteve a relação comercial com a autora até 31.01.2019 e, inclusive, queixando-se que, próximo desta data, as entregas dos produtos até foram para lá dos prazos!

Logo, e pelo menos até esta data, faz todo o sentido admitir como boa aquela autoria e legitimidade, no sentido de que as faturas foram emitidas pela autora na sequência do anuído com a ré relativamente aos produtos nelas constantes e pelo respetivo preço.

Neste sentido e para esta conclusão, e perante os aludidos factos base, é ainda possível deitar mão do método presuntivo previsto no artº 349º e sgs. do CC.

Se assim não fosse, a ré poderia e deveria alegar e provar o seu contrario ou factos que infirmassem o seu teor.

Ou seja: que as faturas eram falsas no sentido de que não correspondiam a produtos por ele encomendados e desejados, ou que os produtos nelas constantes e respetivo preço não correspondiam ao acordado, ou que, não obstante nas faturas constar que os produtos ficaram à sua disposição, ela efetivamente não os recebeu.

Mas não provou, nem sequer alegou, tais factos.

Por outro lado, o depoimento da testemunha BB foi claro, inequívoco, assertivo e convincente, demonstrando conhecimento do facto - pois que geria as vendas da autora estava par de todas as vicissitudes a elas atinentes - no sentido de que a ré deixou de pagar qualquer fatura vencida a partir de 04.10.2018, sendo que elas se venciam a prazo trinta dias.

Aqui chegados, e provado que tais faturas correspondem a bens que foram desejados e recebidos pela ré, sobre esta impendia o ónus de provar que pagou o respetivo preço.

É que o pagamento, e como exceção perentória que extingue o direito invocado, não se presume.

Assim, versus o expendido na fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, não era à autora credora que incumbia provar o não pagamento, mas antes à ré devedora que cumpria provar o pagamento.

Ora a ré não logrou cumprir tal ónus.

Aliás, e tanto quanto se alcança, a ré, na sua contestação, não alega, adrede, definida e inequivocamente, que pagou tais faturas, pelo que até pode considerar-se que, neste particular - e porque, sendo este um pedido autónomo, não pode concluir-se ter existido impugnação atento o mais dito no conjunto da sua defesa - que existiu confissão – artº 474º nº 1 do CPC.

Por conseguinte, deve dar-se como provado o não pagamento do valor das faturas vencidas a partir de 04.10.2018 e emitidas até 31.01.2018 e que são as juntas pela recorrente com a sua petição inicial, as quais ascendem, pelo menos, ao valor pedido de 135.936,70 euros».

 

Que dizer?


Desde logo que, contrariamente ao afirmado no  acórdão recorrido e ao afirmado pela ré nas suas alegações de recurso de revista, a mesma  não impugnou a autoria nem a veracidade das faturas juntas pela autora, limitando-se, tão somente, no artigo 17º da sua contestação a impugnar « o teor e a virtualidade probatória dos documentos  juntos aos autos pela autora na exacta medida em que contrariem a presente contestação», ou seja, não questiona a prova de que as faturas juntas com a petição inicial provêm da autora, mas a prova de que as declarações nelas constantes correspondem à realidade.

De salientar, a este respeito, que as aludidas faturas, enquanto documentos particulares gozam, nos termos do disposto no art. 376º, nº 1, do C. Civil, de força probatória plena quanto à materialidade das declarações atribuídas ao seu autor, se apresentados contra este. Se é o autor dos documentos a utilizá-los ficam sujeitos à livre apreciação do Tribunal, cabendo-lhe produzir livremente prova sobre a exatidão do respetivo conteúdo.

Mas, à parte este esclarecimento, a verdade é que não se vislumbra que o Tribunal da Relação tenha violado o disposto no art. 574º, nº 1 e 2, do CPC e nos arts. 342º, nº 1 e 374º, nº 2, ambos do C. Civil, pois não há dúvida que, no caso dos autos, o Tribunal da Relação não só  fez impender sobre a autora o ónus de provar a realização dos fornecimentos de bens  à ré, nas quantidades e valores referidos nas ditas faturas, como também, conjugando o  teor das faturas juntas com a petição inicial, com o  depoimento da testemunha BB e com o teor da carta e mail supra referidos, concluiu  que a autora logrou provar que tais faturas correspondem  « a bens que foram desejados e recebidos pela ré ».

E sendo assim, ou seja, tendo o Tribunal da Relação formado a sua convicção sobre esta factualidade com base em meios de prova de livre apreciação (cfr. arts. 366º e 396, ambos do C. Civil) e consabido que, tal como resulta do disposto nos arts. 682.º, n.º 2 e 674º, nº 3, do CPC, nesta matéria,  não compete ao Tribunal de revista sindicar a valoração da prova feita pelo Tribunal da Relação, segundo o critério da sua  livre e prudente convicção, evidente se torna que, ante a falta de prova por parte da ré do pagamento do pagamento  do valor das faturas  referentes a fornecimentos ocorridos entre setembro a  dezembro  de 2018, o acórdão recorrido  não podia deixar de condenar a ré no pagamento da quantia de  €135.936,70, acrescidas dos  respetivos juros.


Termos em que improcede o recurso interposto pela ré.


*


3.2.2.  Relativamente ao recurso da autora, está em causa saber, por um lado, se devem proceder os pedidos formulados pela autora sob os nºs 1, 2, 3, 5 e 6 da petição inicial e se, em consequência da ampliação do pedido, há lugar à condenação da ré no pagamento da quantia de € 57.420,06, correspondente aos fornecimentos efetuados entre janeiro e março de 2019, acrescida de juros legais devidos desde a data de vencimento das respetivas faturas;

E, por outro lado, se os juros de mora relativos ao montante de € 135.936,70, são devidos desde a data de vencimento das respetivas faturas.


3.2.2.1. Quanto à primeira das questões supra enunciadas, sustenta a  autora  que, resultando do factos dados como provados  nos nºs 6 e 7  que a proposta contratual foi apresentada tendo em conta as quantidades anuais obrigatórias, bem como a duração do contrato, e que a ré aceitou esta proposta, não se compreende como é que o Tribunal da Relação manteve a decisão do Tribunal de 1ª Instância de dar como não provada a factualidade constante  dos pontos  2.5[8] e 2.6[9], sendo certo que os factos dados como provados nos nºs 3[10] e 11[11], reforçaram ainda mais as perspetivas da autora  acerca da duração da relação comercial  que a própria ré definia  como sendo uma parceria.

E sendo assim não podem deixar de proceder os pedidos por ela formulados nos nºs 1, 2, 3, 5 e 6 da petição inicial.

Mais argumenta enfermar o acórdão recorrido de erro material ao não condenar a ré no pagamento da quantia de € 57.420,06, correspondente ao valor das faturas nºs …00 (doc. 3), …04 (doc. 4), …06 (doc. 5), …09 (doc. 2), …10 (doc. 6), …15 (doc. 7) e …215 (doc. 8), que  juntou na primeira sessão de audiência de discussão e julgamento  e com base nas quais deduziu ampliação do pedido, que foi admitida, pelo que requer a condenação da ré no pagamento destes montantes. 


Vejamos, então, se lhe assiste razão, tendo em conta, no que concerne à reapreciação da decisão de facto, que incumbe ao Tribunal da Relação formar a seu próprio juízo probatório sobre cada um dos factos julgados em 1.ª instância e objeto de impugnação, de acordo com as provas produzidas constantes dos autos e à luz do critério da sua livre e prudente convicção, nos termos do artigo 607.º, n.º 5, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC, em ordem a verificar a ocorrência de erro de julgamento.

E que, nesta matéria, cabe apenas ao Tribunal de revista ajuizar se o Tribunal da Relação, no desempenho daquela sua função, observou, quer a disciplina processual a que aludem os arts. 640º e 662º, nº 1, quer o método de análise crítica da prova prescrito no art. 607º, nº 4, aplicável por força o disposto no art. 663º, nº 2, todos do CPC, sem imiscuir-se na valoração da prova feita pelo Tribunal da Relação, segundo o critério da sua livre e prudente convicção.

De salientar ainda que não compete ao Tribunal de revista sindicar o erro na livre apreciação das provas, salvo quando, nos termos do artigo 674.º, n.º 3, do CPC, a utilização desse critério de valoração ofenda uma disposição legal expressa que exija espécie de prova diferente para a existência do facto ou que fixe a força probatória de determinado meio de prova, ou ainda quando aquela apreciação ostente juízo de presunção judicial revelador de manifesta ilogicidade.


No caso em apreço, o Tribunal da Relação, na apreciação da impugnação desta mesma factualidade, manteve a decisão do Tribunal de 1ª instância que deu como não provados os factos aludidos nos pontos 2.5 e 2.6 e   estribou-se na seguinte fundamentação:

« Estes factos assumem-se como algo conclusivos, ainda que se admita que a conclusão final se assuma como factual, ou seja, deles se pretende retirar a ilação de que a autora apenas aceitou o contrato e os investimentos que, alega, apenas por causa dele aceitou efetivar, no pressuposto de que a ré se vinculou a um volume mínimo de compras, o qual seria necessário para amortizar tais investimentos e, naturalmente, dar-lhe algum lucro.

A recorrente invoca, para além da prova pessoal com o jaez já aludido – e para a qual valem as observações já supra plasmadas, e, essencialmente relevando a posição totalmente divergente das testemunhas da autora e ré - desde logo o teor dos factos provados nos pontos 6, 12, 14, 17, 19, 20, 23.

Ora deste teor não emana tal conclusão.

Neles, e apenas nalguns, unicamente consta uma referência a quantidades mínimas, normalmente incluída em meras propostas feitas pela autora, algumas das quais nem sequer se provou que tenham sido aceites/adjudicadas pela/à ré.

Finalmente aduz a prova documental dos docs. 3 e 4 juntos com a pi.

Mas destes documentos nada dimana no sentido propugnado, antes pelo contrário.

Na verdade, dos mesmos não consta qualquer referência à obrigação da ré em adquirir quantidades mínimas de produtos, antes neles constando que as quantidades são apenas as previstas.

Ora uma previsão é isso mesmo, passe a verdade de La Palisse.

Ou seja, é apenas uma referência, uma hipótese, uma estimativa de quantidade que, pode, ou não, ser efetivada nos moldes tendencialmente gizados; e que, assim, não vincula ou obriga nos estritos termos simplesmente previstos/aventados.

Aliás, outros documentos existem no processo que contradizem a tese da autora.

É vg., o constante a fls.531, em cujo email, CC, em representação da ré, nega, textualmente, «qualquer acordo (entre as partes) que determine consumos mínimos».


*


Ora, desta fundamentação depreende-se, claramente, que o Tribunal da Relação considerou que, não só a factualidade dada como provado nos presentes autos não   permitia extrair a ilação de que a fixação de quantidades mínimas anuais de compra por parte da ré e a celebração de um contrato de fornecimento duradouro foram condição sine qua non da decisão da autora contratar, como também a prova documental constante de fls. 531 contradiz esta tese da autora.

Assim sendo e porque não se vislumbra  que, na reapreciação dos pontos 2.5 e 2.6  dos factos dados como não provados, o Tribunal a quo tenha infringido qualquer norma legal probatória expressa ou  incorrido em raciocínio manifestamente ilógico, mais não  resta a este  Tribunal de revista  do que acatar os factos fixados pela Relação, nos termos do artigo 682.º, n.º 1 e 2, do CPC, pelo que nenhuma censura merece o acórdão recorrido ao julgar improcedentes os pedidos formulados pela autora nos  nºs 1, 2, 3, 5 e 6 da petição inicial.

E o mesmo vale dizer relativamente à pretensão da autora em obter a condenação da ré no pagamento da quantia de € 57.420,06.

Desde logo porque, contrariamente ao afirmado pela autora, a ausência de condenação da ré no pagamento deste montante nunca configuraria um mero erro material, mas, antes, um erro de julgamento, que, no caso dos autos, nem sequer se verifica.    

É que se é certo  ter a autora, na audiência de discussão e julgamento realizada no dia 16 de janeiro de 2020, requerido, nos termos  do art. 265º, nº 2, do CPC, a  ampliação do seu pedido  inicial de € 135.936,70, para € 192.290,13 , com fundamento  nas faturas  nºs  ...00 (doc. 3), ...04 (doc. 4), ...06 (doc. 5), ...09 (doc. 2), ...10 (doc. 6), ...15 (doc. 7) e ...215 (doc. 8) e ter o Tribunal de 1ª Instância, admitido esta ampliação,  a verdade é que, relativamente a esta matéria, o Tribunal da Relação, ao reapreciar a factualidade constante do ponto 2.13 dos factos dados como não provados pelo Tribunal de 1ª Instância (A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €192.290,13), deu apenas como provado que «A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €135.936,70.» (cfr. factos dados como provados e supra descritos no nº 39), o que tudo significa que considerou não provado a realização dos fornecimentos aludidos naquelas faturas e que segundo constam das mesmas foram «colocadas à disposição do adquirente» em 13,14, 15 e 18 de fevereiro de 2019 e 28 de março, do mesmo ano.

Isto porque, conforme refere o acórdão, na fundamentação à factualidade aditada aos factos provados e supra descrita no nº 40, «(…)  restam dúvidas sobre se, após 31.01.2019, os fornecimentos tiveram a anuência da ré.

Esta não o admite e não é de todo improvável que a autora, no seu alegado pressuposto que o contrato era temporalmente vinculativo e exigia consumos mínimos, tivesse colocado à disposição da demandada produtos contra a sua vontade ou por ela não anuídos. (…)»

Assim sendo e porque, tal como já se deixou dito no ponto 3.2.1, no caso em apreço, é sobre a autora que recai o ónus de provar a realização dos fornecimentos de bens à ré, nas quantidades e valores referidos nas ditas faturas, evidente se torna que não tendo a mesma logrado fazer essa prova, inexiste fundamento para condenar a ré no pagamento da quantia de   € 57.420,06.


Improcede, por isso, quanto a este segmento o recurso interposto pela autora.


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3.2.2.2. Discorda também a autora do acórdão recorrido na parte em que determinou que os juros de mora vencidos sobre o  montante  € 135.936,70  são devidos desde  a  data da citação, defendendo que tais juros deverão ser calculados a partir  da data de vencimento  de cada uma das faturas em cujo pagamento a ré já foi condenada, nos termos do disposto no art. 4º, nº 2, do DL nº 62/2013, de 10 de maio, sendo certo que em transações entre comerciantes /empresas vale a regra supletiva de que, nada dizendo o contrato, a obrigação de pagar o preço  vence-se, sem necessidade de interpelação, passados 30 dias.

Dispõe o nº 2 do citado art. 4.º que «Em caso de atraso de pagamento, o credor tem direito a juros de mora, sem necessidade de interpelação, a contar do dia subsequente à data de vencimento, ou do termo do prazo de pagamento, estipulados no contrato», estabelecendo o seu nº 3 que: «Sempre que do contrato não conste a data ou o prazo de vencimento, são devidos juros de mora após o termo de cada um dos seguintes prazos, os quais se vencem automaticamente sem necessidade de interpelação:

a) 30 dias a contar da data em que o devedor tiver recebido a fatura;

b) 30 dias após a data de receção efetiva dos bens ou da prestação dos serviços quando a data de receção da fatura seja incerta;

c) 30 dias após a data de receção efetiva dos bens ou da prestação dos serviços, quando o devedor receba a fatura antes do fornecimento dos bens ou da prestação dos serviços;

d) 30 dias após a data de aceitação ou verificação, quando esteja previsto, na lei ou no contrato, um processo mediante o qual deva ser determinada a conformidade dos bens ou serviços e o devedor receba a fatura em data anterior ou na data de aceitação ou verificação».

Ora, a verdade é que, no caso dos autos, nada se provou quanto à data de vencimento das faturas em causa, ao prazo estipulado para o pagamento ou quanto à data da receção das mercadorias, pelo que, contrariamente ao defendido pela autora, vale a regra geral prevista no art. 805º, nº 1, do C. Civil, não merecendo, por isso, qualquer censura o acórdão recorrido ao decidir que os juros de mora em causa são devidos apenas desde a citação.


Daí improceder também, nesta parte, o recurso da autora.



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IV – Decisão

Pelo exposto, acordam os Juízes deste Supremo Tribunal em:

A - Julgar improcedente a revista interposta pela ré, confirmando-se, nesta parte, o acórdão recorrido.

Custas desta revista ficam a cargo a ré.

B - Julgar improcedente a revista interposta pela autora, confirmando-se, nesta parte, o acórdão recorrido.

Custas desta revista ficam a cargo a autora.

Notifique.


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Supremo Tribunal de Justiça, 12 de janeiro de 2021

Maria Rosa Oliveira Tching (relatora)

Catarina Serra

Paulo Rijo Ferreira

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[1] Pensamos que o douto acórdão refere “autora” por lapso, querendo referir-se a ré

[2] Pensamos que o douto acórdão refere “autora” por lapso, querendo referir-se a ré

[3] Facto provado 3
[4] «A Ré não pagou à Autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de €135.936,70».
[5]   «A autora forneceu a ré pelo menos até 31.01.2019».
[6] Vide Acórdãos do STJ de 21-10-93 e de 12-1-95, in CJ. STJ, Ano I, tomo 3, pág. 84 e Ano III, tomo 1, pág. 19, respetivamente.
[7] O Tribunal de 1ª Instância tinha dado como não provado que «A Ré não pagou  à autora, a título de faturas emitidas e vencidas, a quantia de € 192,290,13»
[8] «a fixação de quantidades mínimas anuais de compra por parte da Ré e a celebração de um contrato de fornecimento duradouro foi uma condição sine qua non da decisão da Autora de contratar».
[9] «Ao longo das negociações foi sendo sempre referido que a fixação de quantidades mínimas anuais era essencial para ajudar a suportar parte do investimento, nomeadamente os custos da maquinaria, equipamentos e moldes, bem como os custos de desenvolvimento de produto e das equipas especializadas de trabalho».
[10] «A Ré informou que era uma empresa que estava em fase de grande crescimento e expansão e, por isso, queria desenvolver uma parceria com um fornecedor português capaz de produzir frascos em PET»
[11] «Após, a Ré propôs à Autora a celebração de novos contratos de fornecimento tendo por objeto o fornecimento de outros produtos, designadamente frascos de 4 Litros “…”, frascos de 7 Litros “…”, colheres doseadoras de 10 gramas e colheres “…”. Tal como propôs à Autora o fornecimento de frascos em vermelho, translúcidos/transparentes».