Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
| Relator: | JORGE LEAL | ||
| Descritores: | RECURSO DE REVISTA RECURSO SUBORDINADO PRAZO INTERPOSIÇÃO DE RECURSO DECISÃO INTERLOCUTÓRIA OPOSIÇÃO DE ACÓRDÃOS INJUNÇÃO CONTRATO DE EMPREITADA AMPLIAÇÃO PEDIDO | ||
| Data do Acordão: | 11/11/2025 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA | ||
| Sumário : | (art.º 663.º n.º 7 do CPC)
I. O acórdão da Relação que, em sede de recurso de apelação, rejeita o recurso subordinado interposto pelo recorrido, é suscetível de revista nos termos do art.º 671.º n.º 1 do CPC. II. É admissível recurso subordinado contra decisão emitida sobre pedido autónomo do pedido julgado pela decisão alvo do recurso principal. III. Proferida decisão intercalar que não admitiu pedido reconvencional e, na mesma data, não admitiu a ampliação do pedido do autor, o autor, notificado da apelação do réu contra a rejeição da reconvenção, pode interpor recurso subordinado contra a não admissão da ampliação do seu pedido. IV. O acórdão da Relação que revogou despacho interlocutório de não admissão de reconvenção, determinando a admissão da reconvenção, só é suscetível de revista nos termos previstos nas alíneas a) e b) do n.º 2 do art.º 671.º do CPC. V. Não existe contradição entre o acórdão recorrido e o acórdão fundamento, em ordem a possibilitar a revista prevista no n.º 2 do art.º 671.º do CPC, se o acórdão recorrido se pronunciou, quanto ao segmento impugnado, acerca da admissibilidade de apelação imediata e autónoma contra um despacho que o tribunal recorrido considerou ser enquadrável na previsão da alínea b) do n.º 1 do art.º 644.º do CPC, isto é, ser subsumível ao conceito de “despacho saneador” e, por isso, suscetível de recurso imediato e, por sua vez, o acórdão fundamento apreciou se a primeira instância, ao proferir a sentença, dera ao litígio um enquadramento jurídico que surpreendera as partes, nomeadamente o autor, não lhes tendo facultado o exercício do contraditório e confrontando-as, assim, com uma decisão surpresa. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam os juízes no Supremo Tribunal de Justiça I. RELATÓRIO 1. Embeiral Steel, Lda. intentou procedimento de injunção contra Moma Tiles S.A., pedindo a notificação desta para lhe pagar a quantia de € 578 157,53 referente a capital em dívida, acrescida de juros vencidos na quantia de € 184 105,08 e vincendos, e ainda as quantias de € 40,00, a título de custos administrativos, e de € 120,00, a título de honorários de advogado, nos termos do art. 7.º do DL n.º 62/2013, de 10 de maio. Para tanto, alegou, em síntese: - celebrou, como empreiteira, com a R., como dona da obra, um contrato de empreitada que teve por objeto a construção de um pavilhão industrial; - no âmbito dos trabalhos adjudicados, emitiu e enviou à ré faturas que identifica referentes a trabalhos executados, as quais foram por si emitidas com base nos autos de medição que foram aprovados pela ré e têm como prazo de vencimento 30 dias contados a partir da data da sua emissão; € - tais faturas perfazem o valor total global de 2 668 157,53, do qual a ré pagou a importância de € 2 090 000,00, encontrando-se, por isso, em falta, o pagamento da quantia de € 578 157,53. 2. A R. deduziu oposição, impugnando que devesse aquela quantia à autora e invocando até ter sobre ela um crédito de € 209 583,00 (resultante da diferença entre o valor pago de € 2 090 000,00 e o custo da obra até ao momento, de € 1 880 417,00). Além disso, naquela mesma peça, deduziu reconvenção, na qual alegou que procedera à resolução do contrato e pediu a condenação da autora a pagar-lhe indemnização em valor global a relegar para execução da sentença mas não inferior a € 617.400,00, a título de atraso reiterado na execução de trabalhos (€ 87 400,00 – artigos 90.º e 91.º), de despesas com trabalhadores por causa de tal atraso (€ 180.000,00 – artigos 92.º a 99.º), de prejuízos decorrentes de atraso no arranque da obra (a liquidar em execução de sentença – artigos 100.º a 103.º) e de lucros cessantes (€ 350 000,00 – artigos 104.º e 105.º). 3. Face à oposição deduzida, os autos foram remetidos a tribunal e passaram a ser tramitados sob a forma de processo comum. 4. A A. apresentou réplica. Nela impugnou o crédito de € 209 583,00 alegado pela R. e a resolução do contrato por esta também invocada, defendendo a invalidade e ineficácia desta, e pugnou ainda pela improcedência da reconvenção deduzida. Além disso, deduziu ampliação do seu pedido inicial nos seguintes termos: “i. Ser decretado o direito da Autora a uma prorrogação do prazo de execução dos trabalhos pelo período acrescido de 12,5 meses; ii. Ser a Ré condenada ao pagamento dos sobrecustos e perdas suportados pela Autora pelo período acrescido em que foi forçada a permanecer em obra, no montante global de € 730,620.32, a que acrescem os juros moratórios contados da data da notificação da Ré; iii. Ser decretada a validade e eficácia do exercício, pela Autora, do direito à excepção de não cumprimento; iv. Ser decretada a validade e eficácia da resolução do contrato operada pela Autora; v. Ser a Ré condenada no pagamento de uma indemnização pelos danos causados à Autora pelo incumprimento culposo do contrato, no valor de € 38.840,00 a título de perda de margem de lucro e de reembolso de despesas, e no valor dos danos morais e patrimoniais causados pela Ré em valor a fixar em liquidação de sentença, todos acrescidos dos juros moratórios contados desde a data da notificação da Ré”. 5. A R., notificada da réplica apresentada e do requerimento de ampliação do pedido nela formulado, veio a 11.5.2023 apresentar articulado em que, designadamente, ampliou o seu pedido reconvencional quanto a lucros cessantes (inicialmente na quantia de € 350.000,00) para a quantia de € 470 000,00 e, na sequência de alegar diversos defeitos de obra (artigos 274.º a 337.º) e quantias concretas atinentes à sua reparação (nos artigos 274.º, 306.º, 308.º e 312.º), pediu ainda a condenação da autora no valor, a liquidar em execução de sentença, das reparações que teria ainda de suportar por causa de tais defeitos e também a condenação da A. a substituir a chapa colocada, por outra que cumprisse os requisitos contratados. 6. A A., na sequência de prorrogação de prazo que lhe foi deferida, por requerimento de 16.6.2023, entre outros pontos, pronunciou-se no sentido da ineptidão do pedido reconvencional e da inadmissibilidade do pedido da sua condenação ao pagamento do valor da reparação dos defeitos deduzido pela ré no articulado que apresentou a 11.5.2023. 7. A 7.10.2023 foram proferidos os seguintes despachos: - sob o ponto I, despacho com o título “Reconvenção”, no qual se termina nos termos seguintes: “Por isso, julgo inepta a reconvenção, por haver incompatibilidade substancial entre os pedidos alegados nos arts. 87.º a 89.º (resolução) e 105.º (dano por a obra não lhe ter sido entregue e estar concluída, não podendo a Ré iniciar a sua laboração, ficando privada de comercializar os produtos cerâmicos que irá fabricar e de obter rendimentos e lucros) ambos da oposição (cf. art. 186.º, n.º 2, al. c), CPC), e, em consequência, absolvo a Autora/Reconvinda da instância reconvencional (cf. arts. 186.º, n.ºs 1 e 2, al. c), e 278.º, n.º 1, al. b), ambos do mesmo Código). Em consequência, admito apenas o pedido de litigância de má-fé da Autora, por este pedido não fazer parte da reconvenção.”; - sob o ponto II, despacho com o título “Despacho de aperfeiçoamento”, no qual, sob os seus n.ºs 1 e 2, se concedeu à autora a possibilidade de, no prazo de 10 dias, requerer ou juntar meios de prova, e à ré a possibilidade de, em igual prazo, completar ou alterar os meios de prova que tenha apresentado ou requerido, e sob o seu n.º 3, invocando-se o disposto no art. 590 n.º 2 b) e n.º 4 do CPC, se convidou a autora a suprir insuficiência de matéria de facto alegada que ali se concretizou; - sob o ponto III, despacho com o título “Admissão da ampliação do pedido formulado pela A.”, no qual, na sequência da fundamentação de direito a que ali se procede, se decidiu: “À vista disso, e tal como acima se concluiu, impõe-se julgar inepto o requerimento de ampliação do pedido, apresentado pela Autora em 31/03/2023, e, em consequência, absolver a Ré da instância; mas apenas da instância criada por aquele requerimento; o que vale por dizer, que se mantém o pedido inicial, de pagamento dos trabalhos executados, a que acrescem os juros moratórios. (…)”; - sob o ponto IV, despacho com o título “Admissão da atualização do pedido reconvencional formulado pela Ré”, no qual se disse o que se passa a referir: - Sob o seu n.º 1, o seguinte: “A atualização do pedido reconvencional relativo à perda a margem e lucros cessantes, nos termos em que essa atualização foi efetuada no art. 270.º do requerimento apresentado pela Ré em 11/05/2023, fica prejudicada em virtude da ineptidão da reconvenção.” - Sob o seu n.º 2, o seguinte: “No que se refere ao pedido de eliminação de defeitos e indemnização das reparações, nos termos alegados nos arts. 274.º a 337.º daquele requerimento (tais como, nas sapatas, no pavimento, nos painéis alveolares, na chapa de revestimento das fachadas, na zona da vidragem, nas pendentes e nas valas, no painel sandwich na cobertura, nas valas e cavaletes, na fundação dos silos, no fosso da tremonha, na zona mais alta da estrutura onde alguns dos elementos estruturais, junto ao alçado tardoz do pavilhão, e na pala do alçado principal, não estão ortogonais, estão desalinhados, na rede de abastecimento de água, nos elementos da estrutura metálica que não está acabada toda na mesma cor, havendo vários elementos que apresentam um acabamento distinto da maioria, uns brilhantes e outros mate, numa viga de fundação e na ETAR), este pedido podia ser cumulado com a resolução do contrato, dado que, como se disse já, a resolução não destrói todos os efeitos do contrato, devendo preserva-se as consequências negociais relacionadas com a parte da obra executada. Só que, aquele pedido, de eliminação dos defeitos, é um pedido autónomo dos pedidos indemnizatórios que haviam sido formulados na reconvenção, ou seja, não é um desenvolvimento nem uma consequência daqueles pedidos (cf. arts. 1221.º, 1222.º e 1223, CC). Por outro lado, tendo a reconvenção sido julgada inepta, a formulação do pedido de eliminação dos defeitos, não tendo ocorrido na oposição, deve ser considerada extemporânea. É o que resulta dos arts. 264.º e 265.º, n.º 2, ambos do CPC).”; - sob o ponto V, despacho com o título “Audiência prévia”, onde se designa data para tal diligência com o objetivo de: “a) tentar a conciliação das partes; b) debater e delimitar o objeto do litígio: (…) c) Proferir, após debate, o despacho previsto no n.º 1 do artigo 596.º; d) Programar os atos a realizar na audiência final; e) Designar dia para a audiência final, observando o disposto no artigo 151.º.” 8. Tais despachos foram notificados às partes por expediente de notificação elaborado nos autos a 9.10.2023. 9. Na sequência de tal notificação, a R., a 16.11.2023, veio interpor recurso do despacho “que julgou inepta a reconvenção por incompatibilidade substancial dos pedidos ali deduzidos, absolvendo por conseguinte a Autora da instância reconvencional”. 10. A A. apresentou contra-alegações e interpôs recurso subordinado quanto ao despacho que julgou inepto o requerimento de ampliação do pedido por si apresentado em 31.3.2023 e que “em consequência” decidiu absolver a ré “da instância criada por aquele requerimento”. 11. Em 25.11.2024 a Relação do Porto proferiu acórdão em que emitiu o seguinte dispositivo: “Pelo exposto, acorda-se no seguinte: - em não conhecer do recurso interposto pela ré na parte respeitante ao despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto IV e seu nº2 (que não admitiu a ampliação quanto aos pedidos de indemnização por despesas com reparação de defeitos e de eliminação de defeitos); - em não conhecer do recurso subordinado interposto pela autora; - em julgar procedente o recurso da ré quanto ao despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto I e, nessa sequência, determinar que o tribunal de primeira instância profira despacho de admissão da reconvenção – a não ser que a tal obste algum outro fundamento que venha a considerar existir –, devendo nessa altura pronunciar-se sobre a ampliação do pedido naquela formulado quanto a lucros cessantes. Custas do recurso da ré por recorrente e recorrida na proporção do respetivo decaimento. Custas do recurso subordinado pela autora”. 12. A A. interpôs recurso de revista contra o aludido acórdão, tendo formulado as seguintes conclusões: “O Tribunal da Relação do Porto, na sequência do Recurso autónomo interposto pela Ré Moma Tiles, aqui Recorrida, e do Recurso Subordinado interposto pela Autora Embeiral Steel, aqui Recorrente, decidiu: “não conhecer do recurso interposto pela ré na parte respeitante ao despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto IV e seu nº2 (que não admitiu a ampliação quanto aos pedidos de indemnização por despesas com reparação de defeitos e de eliminação de defeitos)”; “não conhecer do recurso subordinado interposto pela autora”; “o tribunal de primeira instância profira despacho de admissão da reconvenção – a não ser que a tal obste algum outro fundamento que venha a considerar existir –, -se sobre a ampliação do pedido naquela formulado quanto a lucros cessantes”. 2. Entende a ora Recorrente que, salvo melhor opinião e com o devido respeito, são vários os erros de qualificação jurídica de que enferma aquele Acórdão da Relação do Porto, nos vários segmentos decisórios que o constituem. A. DA ADMISSIBILIDADE PROCESSUAL DO PRESENTE RECURSO DE REVISTA 3. A admissibilidade processual do presente recurso deve ser analisada por referência a cada um dos segmentos decisórios do Douto Acórdão de que se pretende recorrer. A saber: - A decisão de “não conhecer do recurso subordinado interposto pela autora”; e, - A decisão de “julgar procedente o recurso da ré quanto ao despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto I e, nessa sequência, determinar que o tribunal de primeira instância profira despacho de admissão da reconvenção (…)” 4. No que concerne ao segmento decisório do Douto Acórdão que não conheceu do recurso subordinado interposto pela Autora, é incontroverso que tal Decisão se subsume no disposto no n.º 1 do artigo 671.º do CPC, norma nos termos da qual se determina que “cabe revista para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão da Relação, proferido sobre decisão da 1.ª instância, que conheça do mérito da causa ou que ponha termo ao processo, absolvendo da instância o réu ou algum dos réus quanto a pedido ou reconvenção deduzidos”. 5. Para além da previsão legal da sua admissibilidade processual (o n.º 1 do artigo 671.º do CPC supra aludido), estão igualmente preenchidos os pressupostos gerais de admissibilidade de recurso ordinário previstos no n.º 1 do artigo 629.º do CPC, uma vez que: - A causa tem valor superior à alçada do Tribunal de que se recorre (a ação, com o conhecimento oficioso exceções dilatórias de ineptidão no Despacho de 1.ª Instância, passou a ter o valor 762.422,61€, ainda assim manifestamente superior aos 30.000,01€ legalmente exigíveis); - O segmento decisório aqui impugnado (em concreto, o não conhecimento do Recurso Subordinado interposto pela Autora) é desfavorável à Recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal (em concreto, o decaimento é de 736.734,87€, correspondente o valor do requerimento de ampliação do pedido cuja revogação da decisão de ineptidão foi requerida com o Recurso Subordinado). 6. No que diz respeito ao segmento decisório do Douto Acórdão da Relação que julgou parcialmente procedente o Recurso Autónomo interposto pela Ré Moma Tiles, tratando-se de segmento decisório que revoga a Decisão de 1.ª Instância que julgara inepta a reconvenção da Ré, a admissibilidade processual do seu recurso deve ser aferida ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 671.º do CPC, segundo a qual “os acórdãos da Relação que apreciem decisões interlocutórias que recaiam unicamente sobre a relação processual só podem ser objeto de revista quando estejam em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme”. 7. Para a verificação dos requisitos legais expostos na norma supra referida, a Recorrente invoca o Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça datado de 02.05.2024 e proferido no âmbito do Processo n.º 1099/21.1T8AMD.L1.S119 19 Consultável em www.dgsi.pt (adiante junto como Doc. 1), em cujo sumário se decidiu que: “I - O princípio do contraditório impõe que, antes de ser proferida a decisão final, seja facultada às partes a discussão dos fundamentos de direito em que ela vá assentar, sendo decorrência do mesmo a proibição da decisão-surpresa, ou seja, a prolação de decisão baseada em fundamento não previamente considerado pelas partes, ou que, embora pudesse ser previsível, não tenha sido configurado pela parte, sem que estas tivessem obrigação de tal prever. II - A proibição da decisão-surpresa reporta-se, principalmente, às questões suscitadas oficiosamente pelo tribunal, o que quer dizer que o juiz que pretenda basear a sua decisão em questões não suscitadas pelas partes, mas oficiosamente levantadas por si, “ex novo”, seja através de conhecimento do mérito da causa, seja no plano meramente processual, deve, previamente, convidar ambas as partes a sobre elas tomarem posição. III - Só estando dispensado de o fazer, conforme dispõe o nº 3 do art. 3º do CPC, em casos de manifesta desnecessidade. IV - Tendo o autor instaurado acção de petição de herança, pretendendo fazer valer a presunção de propriedade do imóvel decorrente do registo predial do mesmo (art. 7º do CRP), e invocando a Ré excepção de usucapião, entendendo o juiz que, ante os factos apurados, poderá decidir a causa na prespectiva da posse da herança aberta por óbito da mãe da Ré (art. 1268º nº 1 do CC), impõe-se que o juiz ouça previamente as partes em relação a este nova configuração jurídica da defesa, sob pena de, não fazendo, proferir decisão surpresa, o que constitui nulidade, em si susceptível de influir no exame e decisão da causa (art. 195º do CPC). V - Apesar de a nulidade em causa, de não audição prévia das partes (art. 3º nº 3 do CPC) em relação a tal nova configuração jurídica, não ter sido invocada perante o tribunal que a cometeu (nos termos do art. 199º nº 1 do CPC), não fica precludido o direito de a mesma ser invocada no recurso, por via da nulidade da sentença, por excesso de pronúncia (art. 615º nº 1 al. d) do CPC, por o tribunal ter conhecido de objecto diverso do pedido e não configurado pelas partes. VI - Repercutindo-se a nulidade sob escrutínio na sentença e nas instâncias recursivas, em termos (também) subjectivos e fundamentalmente substantivos, não é possível afirmar-se, com plena inteireza, que a Relação, no momento em que decretou a nulidade em causa, se encontrava já na plena disponibilidade dos elementos de facto necessários à prolação da decisão, nos termos do art. 665º nº 1 do CPC”. 8. As exceções dilatórias conhecidas oficiosamente pelo Tribunal de 1.ª Instância no Despacho designado por “Marcação de Audiência Prévia”, não foram suscitadas por qualquer das partes, não foram discutidas na fase dos articulados, nem foram alvo de qualquer contraditório. 9. Paralelamente, o conhecimento oficioso das referidas excepções pelo Tribunal de 1.ª Instância teve como consequência a extinção da instância reconvencional e da instância criada pelo requerimento de ampliação do pedido, e a redução do valor da ação de 2.011.654,47€ para 762.422,61€. 10. Do que decorre que estava o Tribunal de 1.ª Instância irrecusavelmente constituído no dever de ouvir as partes antes de conhecer oficiosamente das exceções dilatórias aqui em questão. 11. Neste sentido, ao qualificar o Despacho de 1.ª Instância como Despacho Saneador (ou como integrante do mesmo) e ao admitir que esse Saneador pudesse ser proferido antes da realização da Audiência Prévia, o Tribunal a quo validou uma decisão que viola directamente o princípio do contraditório consagrado no artigo 3.º do CPC, aceitando, sem o poder fazer, a prolação de uma consequente, e evidente, decisão surpresa. 12. Nesse quadro, o Acórdão aqui em recurso é manifestamente contraditório com o decidido no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça acima invocado que, a esse respeito, veio determinar que, “o juiz que pretenda basear a sua decisão em questões não suscitadas pelas partes, mas oficiosamente levantadas por si, “ex novo”, seja através de conhecimento do mérito da causa, seja no plano meramente processual, deve, previamente, convidar ambas as partes a sobre elas tomarem posição” (realces e sublinhados nossos), estando cabalmente preenchido o primeiro requisito legal disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 671.º do CPC. 13. Atentando ao conteúdo da motivação e decisão do Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça invocado (cfr. Doc. 1), extrai-se que a questão fundamental de direito ali sob apreciação reside na questão de saber se o Julgador, quando pretende decidir sobre uma dada matéria (seja uma Decisão Final, seja uma Decisão Interlocutória) que não tenha sido debatida pelas partes e que estas não pudessem prever – ou seja, uma decisão oficiosamente suscitada “ex novo” pelo Julgador –, está obrigado, à luz do princípio do contraditório (n.º 3 do artigo 3.º do CPC), a ouvir previamente as partes. 14. Tal questão atravessa, inerentemente, o percurso cognoscitivo do Acórdão da Relação aqui em Recurso, no sentido de que, na operação de qualificação do Despacho de 1.ª Instância, aquele Douto Tribunal a quo considerou validamente que a 1ª Instância decidiu oficiosamente, em sede de Saneador, sobre matérias nunca antes suscitadas pelas partes sem antes lhes conceder o exercício do contraditório. 15. Do que resulta que o thema decidendum entre ambos os Acórdãos – o Recorrido e o Acórdão deste Supremo Tribunal – é idêntico e reconduzível à questão de saber se pode o Julgador decidir sobre matérias nunca antes suscitadas sem previamente assegurar o contraditório das partes no processo, incidindo sobre a mesma questão fundamental de direito. 16. De igual modo, ambos os Acórdãos foram proferidos no âmbito da mesma legislação, relevando, acima de tudo, para o que aqui releva, o n.º 3 do artigo 3.º do CPC, o seu alcance jurídico e as consequências decorrentes do mesmo no que diz respeito ao princípio da proibição das Decisões Surpresa. 17. O Acórdão do Supremo Tribunal da Justiça acima invocado, e que o Acórdão do Tribunal a quo contradiz, foi proferido a 02.05.2024, pelo que, não cabendo recurso ordinário daquela decisão e tendo-se esgotado o prazo de reclamação de 10 dias, conclui-se que o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça já transitou em julgado. 18. Por fim, inexiste qualquer Acórdão de Uniformização de Jurisprudência que tenha sufragado a motivação do Acórdão da Relação aqui em recurso, estando cabalmente preenchidos os requisitos legais expostos na alínea b) do n.º2 do artigo 671.º do CPC. Sem prescindir, 19. Ainda que o presente Recurso de Revista não fosse hipoteticamente admissível à luz dos pressupostos normativos consagrados na alínea b) do artigo 671º, nº 2 do CPC – hipótese que se coloca por mera cautela de patrocínio, e sem conceder – o certo é que o presente Recurso de Revista sempre seria admissível por força do disposto na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC conjugado com a alínea a) do n.º 2 do artigo 671.º do mesmo diploma legal. 20. É a doutrina sufragada por diversos Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de que são exemplo o Acórdão de 08.09.2021, proferido no âmbito do Processo n.º 122900/17.2YIPRT-C.E1.S1, de 09-04-2019 (Revista n.º 692/11.5TBVNO.E1.S1), de 12-09-2019 (Revista n.º 587/17.9T8CHV-A.G1-A.S1) e de 01-03-2018 (Revista n.º 3580/14.0T8VIS-A.C1.S1) 21. Para a verificação dos requisitos legais expostos na alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC, a Recorrente invoca o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, datado de 26.09.2023, proferido no âmbito do Processo n.º 15212/21.5T8PRT.P1, um segundo o qual “I – Em obediência ao princípio do contraditório, e excetuados casos de manifesta desnecessidade devidamente justificada, o juiz não deve proferir nenhuma decisão, sobre qualquer questão, processual ou substantiva, de facto ou de direito, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que previamente tenha sido conferida às partes, especialmente àquela contra quem é ela dirigida, a efetiva possibilidade de a discutir, contestar e valorar; II – A decisão-surpresa, baseada em fundamento que não tenha sido previamente considerado pelas partes, é proibida, sendo esta proibição particularmente relevante no que concerne às questões de conhecimento oficioso que as partes não tenham suscitado; III – Ocorre decisão-surpresa se o tribunal, que previamente advertira as partes para a possibilidade de conhecimento da exceção dilatória de coligação ilegal de réus, conhece de uma outra exceção dilatória - a de nulidade de todo o processado decorrente da ineptidão da petição inicial por cumulação de pedidos substancialmente incompatíveis -, sem que quanto a esta tenha dado às partes a possibilidade de se pronunciarem sobre a sua verificação”. 22. O Tribunal Recorrido, ao considerar que o Despacho de 1.ª Instância consubstancia um Despacho Saneador – ou dele integrante – e ao admitir que o mesmo poderia ser proferido antes da realização da Audiência Prévia ali agendada, está a admitir uma clara e evidente Decisão Surpresa e a decorrente violação clara do n.º 3 do artigo 3.º do CPC, entrando em contradição com o Acórdão da Relação invocado (cfr. Doc. 2). 23. Atentando ao conteúdo do Acórdão da Relação invocado (cfr. Doc. 2), extrai-se que a questão fundamental de direito a si inerente reside na questão de saber se o Julgador, pretendendo conhecer de uma exceção dilatória de conhecimento oficioso – que, tanto no Despacho de 1.ª Instância e, consequentemente, no Acórdão Recorrido, como no Acórdão da Relação invocado, consiste na ineptidão com base na incompatibilidade substancial de pedidos - está ou não obrigado à luz do princípio do contraditório (n.º 3 do artigo 3.º do CPC), a ouvir previamente as partes. 24. Tal questão atravessa, inerentemente, o percurso cognitivo do Acórdão da Relação aqui em Recurso, no sentido de que, na operação de qualificar o Despacho de 1.ª Instância, aquele Douto Tribunal deveria ter tido em consideração se o Juiz, no momento em que o proferiu, estaria em condições de conhecer as exceções dilatórias oficiosamente invocadas. 25. Ambos os acórdãos foram proferidos ao abrigo da mesma legislação aplicável que, para o que aqui nos interesse, assenta no n.º 3 do artigo 3.º do CPC. 26. A inadmissibilidade do recurso ordinário do Acórdão da Relação ocorre por motivo estranho à alçada do tribunal, uma vez que, no que ao valor da ação diz respeito, com o conhecimento das exceções dilatórias conhecidas no Despacho de 1.ª Instância, a mesma passou de 2.011.654,47€ para 762.422,61€ (superior aos 30.000,01€ legalmente exigíveis) e o valor de decaimento, relativamente ao segmento decisório que julgou parcialmente procedente o recurso da Recorrente Moma Tiles, é de €512.497,03 (valor da reconvenção) e, por isso, manifestamente superior aos 15.000,01€ legalmente exigíveis. 27. Por fim, não existe nenhum Acórdão de Uniformização de Jurisprudência que permita sustentar o raciocínio inerente ao Acórdão da Relação aqui em recurso, no sentido de que o Tribunal de 1.ª Instância estava em condições de conhecer das exceções dilatórias de ineptidão e, consequentemente, proferir Despacho Saneador, ou despacho dele integrante, antes da realização da audiência prévia. 28. Do que decorre que, na hipótese de se entender que o segmento decisório que julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Ré não é passível de recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 2 do artigo 671.º do CPC – que se equaciona por cautela de patrocínio e mera hipótese de raciocínio –, o mesmo deverá ser admissível ao abrigo da alínea a) do n.º 2 do artigo 671.º do CPC, conjugada com a alínea d) do n.º 2 do artigo 629.º do CPC. B. DO OBJECTO DO RECURSO E MOTIVAÇÃO 29. O presente recurso é interposto: - A título principal, da decisão, constante Acórdão Recorrido, que julgou parcialmente procedente o recurso interposto pela Ré Moma Tiles (aqui Recorrida), por erro na qualificação jurídica do Despacho de 1.ª Instância e consequente violação do princípio do contraditório consagrado no artigo 3º, nº 3 do CPC; - A título subsidiário, da decisão, constante do Acórdão Recorrido, de não conhecimento do recurso subordinado, interposto pela aqui Recorrente, da decisão de 1ª Instância que julgou inepto o requerimento de ampliação do pedido por si apresentado, por erro na qualificação jurídica e violação do n.º 1 do artigo 633.º do CPC. 30. No que ao primeiro segmento decisório diz respeito, entende a Recorrente que o Despacho de 1.ª Instância não poderia ser juridicamente qualificado como um Despacho Saneador, como fez o Tribunal Recorrido. 31. E isto porque: - Designação: o Despacho de 1.ª Instância foi notificado às partes, após a fase dos articulados, sobre a designação de “Marcação Audiência Prévia c/ Marcação Audiência Prévia em 07.10.2023” (ref.ª citius .......64); - Conteúdo: no referido Despacho, o MM.º Juiz do Tribunal de 1.ª Instância, para além de conhecer exceções dilatórias não debatidas na fase dos articulados, também convidou ao aperfeiçoamento da matéria de facto e ainda designou o dia para a realização da Audiência Prévia, com indicação das suas finalidades. - Momento em que foi proferido: o Despacho de 1.ª Instância foi proferido após a fase dos articulados e antes da audiência prévia e o próprio MM.º Juiz do Tribunal de 1.ª Instância, autor do Despacho, referiu-se ao mesmo como Despacho Pré-Saneador (conferir minuto 00:05:35 a 00:06:07 da audiência prévia realizada no dia 19.12.2023. Além disso, 32. O Despacho 1.ª Instância deve ser analisado na sua globalidade (e não segmentariamente, conforme faz o Tribunal Recorrido), sendo que os segmentos decisórios que conduzem à absolvição da instância mais não são do que projetos de decisão que o MM.º Juiz deu conhecimento às partes com o intuito de serem abordadas – e, naturalmente, sujeitas ao contraditório que, no presente caso, era imprescindível – na Audiência Prévia agendada no próprio Despacho. 33. De igual forma, uma valoração jurídica segmentária do Douto Despacho (feita pelo Tribunal da Relação), para além de ser manifestamente lesiva da protecçáo da confiança e da segurança jurídica, não tem qualquer respaldo na lei processual, carecendo completamente de coerência e de sentido – sempre ressalvando, claro, melhor entendimento – que, no mesmo processo, possam coexistir quatro Despachos com valor de Saneador, como parece ser entendimento do Tribunal da Relação, dos quais três foram proferidos antes da Audiência Prévia, e um foi proferido após a realização da mesma (cfr. ref.ª citius .......56). 34. E a pretendida valoração fragmentada do Despacho de 1ª Instância, assente, na Decisão Recorrida, no princípio da adequação formal, resulta, afinal, na sua violação, por estender esse princípio de forma excessiva e desproporcionada, com as consequentes lesões dos princípios da boa gestão processual (artigo 6.º do CPC) e da cooperação (artigo 7.º do CPC). 35. Por tudo, entende a Recorrente que, não sendo o Despacho de 1.ª Instância passível de ser qualificado como Despacho Saneador, deveria ter sido julgado processualmente inadmissível o Recurso interposto pela Recorrida, com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC. Sem prescindir, 36. Na hipótese de proceder o entendimento do Douto Tribunal Recorrido de que o Despacho de 1.ª Instância deva ser qualificado como Despacho Saneador – cenário que se coloca por mera hipótese de raciocínio e cautela de patrocínio –, aquela Decisão é manifestamente nula por consubstanciar uma clara e evidente Decisão Surpresa, pela qual as partes não podiam, de todo, esperar. 37. Carecendo de qualquer sustento legal o entendimento do Douto Tribunal Recorrido de que a lei permite, ao abrigo da adequação formal prevista no artigo 547.º do CPC, que aquele despacho fosse proferido antes da audiência prévia, isto é, antes de ouvidas as partes e exercido o devido contraditório. Sem prescindir e a título subsidiário, 38. Na hipótese de ser dado provimento ao segmento recursivo atrás exposto – revogando-se a Decisão do Tribunal da Relação que qualificou o Despacho de 1.ª Instância como Despacho Saneador e, consequentemente, julgando-se processualmente inadmissível o Recurso Autónomo interposto pela Ré Moma Tiles – perde razão de ser o presente segmento recursivo, uma vez que, naturalmente, decaindo o Recurso Autónomo da Ré Moma Tiles, decairá igualmente o Recurso Subordinado interposto pela Autora Embeiral Steel. 39. No entanto, na hipótese deste Douto Supremo Tribunal de Justiça manter a decisão do Acórdão da Relação que admite o Recurso Autónomo interposto pela Ré Moma Tiles – hipótese que se equaciona por cautela de patrocínio, sem conceder – deverá ser apreciado o presente segmento recursivo, no qual se demonstrará que mal andou o Douto Tribunal da Relação em não conhecer o Recurso Subordinado interposto pela Autora, aqui Recorrente. Com efeito, 40. O segmento decisório do Douto Acórdão da Relação que não conheceu o recurso subordinado da Autora, afigura-se desacertado face aos princípios e às normas aplicáveis, designadamente o n.º 1 do artigo 633.º do CPC. 41. A interpretação que o Tribunal Recorrido faz do Despacho em questão afigura-se incontornavelmente lesiva dos direitos processuais das partes, mormente lesando a sua posição processual no plano da certeza e da segurança jurídica. 42. Não podia o Tribunal a quo qualificar, no plano jurídico-processual, o Despacho de 1.ª Instância de forma fragmentada e atribuir uma valoração processual distinta a cada um dos segmentos em que o reparte – ao fazê-lo admitiu a violação dos princípios da boa gestão processual e da cooperação consagrados, respetivamente, nos artigos 6.º e 7.º do CPC. 43. Se aplicarmos o mesmo raciocínio a que recorreu o Tribunal a quo na fragmentação decisória que faz do Despacho de 1.ª Instância, poder-se-ia afirmar então que: - O ponto I do Despacho de 1.ª Instância consubstanciaria um Despacho Saneador, ou dele integrante; - No Ponto II conteria um Despacho Pré-Saneador/Aperfeiçoamento; - No ponto III, exatamente pelas mesmas razões alegadas pelo Tribunal da Relação por referência ao ponto I, estamos perante um Despacho Saneador, ou dele integrante. - No ponto IV idem; - No ponto V, estamos perante um Despacho de Marcação da Audiência Prévia. 44. Desse entendimento decorreria que, sobre o mesmo documento (cuja designação, recorde-se, é de “Marcação Audiência Prévia c/ Marcação Audiência Prévia em 07.10.2023”) as partes tinham à sua disposição cinco vias de recurso distintas, algumas das quais com diferentes tratamentos e regimes. 45. Isto é, prosseguindo na desconsideração, por ora e para efeitos de mero raciocínio, a questão da qualificação jurídica do Despacho Recorrido, crê-se que uma solução, como a adoptada pelo Tribunal a quo, que fragmenta o conteúdo decisório do Despacho de 1ª Instância, consubstancia a sufragação das visíveis ambiguidade e indeterminação do conteúdo daquele Despacho e, consequentemente, a lesão dos direitos processuais da ora Recorrente. 46. Ainda assim, entendendo o Tribunal Recorrido que o segmento decisório do ponto I do Douto Despacho – que absolve a Autora/Reconvinda da Reconvenção – integra o Despacho Saneador, ter-se-á forçosamente de concluir, salvo melhor opinião, que também a Decisão de absolvição da Ré da instância criada pelo requerimento de ampliação do pedido apresentada pela Autora (ponto III do Despacho de 1.ª Instância) é parte integrante desse mesmo Despacho Saneador. 47. E se assim é, ambas as partes são parcialmente vencidas e parcialmente vencedoras da mesma decisão. 48. Acrescendo que a razão pela qual a Autora foi absolvida da instância reconvencional e a Ré foi absolvida da instância criada pelo requerimento de ampliação do pedido é exatamente a mesma: a ineptidão fundada na incompatibilidade substancial entre o pedido de indemnização com base no interesse contratual positivo e o pedido de resolução contratual. 49. Tendo ambos os segmentos decisórios por base o mesmo entendimento – o da ineptidão por incompatibilidade dos pedidos – e sendo ambos parte integrante da mesma Decisão – o Despacho Saneador, no entendimento do Tribunal Recorrido –, estão integralmente cumpridos os pressupostos legais para a interposição do recurso subordinado. 50. Aliás, se, por referência ao Ponto I do Despacho de 1.ª Instância, o Tribunal Recorrido considerou que “o mesmo, ainda que tenha sido proferido antes da audiência prévia – o que a lei permite por via do art. 547º do CPC (adequação formal), não obstante o seu lugar “normal” seja ser proferido naquela audiência ou até subsequentemente a ela (arts. 591º nº1 d) e 595º nº2 do CPC) –, não deixa de ser considerado integrante do despacho saneador” (realces e sublinhados nossos), o certo é que, por referência ao ponto III do Despacho de 1.ª Instância, o Tribunal Recorrido já considerou, em insanável contradição, estar em causa uma “decisão autónoma”. 51. Assim, sendo absolutamente inegável que da mesma Decisão ambas as partes ficaram vencidas (conforme exige o n.º 1 do artigo 633.º do CPC), e sendo a razão subjacente a esse decaimento exatamente a mesma, deve considerar-se que uma das partes possa recorrer subordinadamente da decisão que lhe é desfavorável em consequência do recurso autónomo interposto pela outra parte, ainda que estejamos perante instâncias distintas. 52. Tal hipótese não só não viola o disposto no artigo 633.º do CPC, como merece total acolhimento pela referida disposição legal. 53. Do que decorre que deveria o Tribunal Recorrido ter apreciado o Recurso Subordinado apresentado pela Autora, aqui Recorrente, e, em consequência, admitir o Requerimento de Ampliação do Pedido apresentado a 31.03.2023 (ref.ª citius ......67). Face a tudo o exposto, 54. Entende a Recorrente que, numa primeira linha, e por tudo o que acima se expôs, deve o Douto Supremo Tribunal de Justiça revogar o segmento decisório do Acórdão da Relação aqui em recurso que julga parcialmente procedente o Recurso Autónomo interposto pela Ré Moma Tiles, com fundamento no facto de o Despacho de 1.ª Instância não ser passível de ser juridicamente qualificado como Despacho Saneador e, consequentemente, a Recorrente dele não puder recorrer ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC. 55. Nesse primeiro cenário, considerando o Douto Tribunal que não é processualmente admissível o Recurso Autónomo interposto pela Ré Moma Tiles, decairá, naturalmente, o Recurso Subordinado interposto pela Autora Embeiral Steel, aqui Recorrente. No entanto, e subsidiariamente, 56. Na hipótese do Douto Tribunal manter o segmento decisório do Acórdão da Relação Recorrido que julga processualmente admissível o Recurso da Ré Moma Tiles – e, neste sentido, mantendo-se a Decisão de que o Despacho de 1.ª Instância, no seu Ponto I, deva ser juridicamente qualificado como Despacho Saneador, ou dele integrante –, deve o Douto Supremo Tribunal de Justiça revogar a decisão de não conhecimento, pela Relação, do recurso subordinado interposto pela Autora Embeiral Steel, aqui Recorrente. 57. Devendo o mesmo ser cabalmente apreciado, por processualmente admissível, e, consequentemente, julgado totalmente procedente com a decorrente admissibilidade do Requerimento de Ampliação do Pedido apresentado pela aqui Recorrente a 31.03.2023 (ref.ª citius ......67). Nestes termos e sempre com o Douto Suprimento de V. Ex.ªs: A) Deve o presente recurso ser julgado totalmente procedente e, em consequência, deve ser cabalmente revogada a Decisão do Tribunal da Relação que julgou processualmente admissível o Recurso interposto pela Ré Moma Tiles, aqui Recorrida, a 16.11.2023 (ref.ª citius ......32); Consequentemente, B) Deve o Recurso interposto pela Ré Moma Tiles, aqui Recorrida, a 16.11.2023 (ref.ª citius ......32) ser julgado processualmente inadmissível e, em consequência, decair o Recurso Subordinado interposto pela Autora, aqui Recorrente, a 21.12.2023 (ref.ª citius ......39). Subsidiariamente e no caso de assim não se entender, C) Na hipótese do Douto Supremo Tribunal manter o entendimento do Tribunal Recorrido de que o Recurso interposto pela Recorrida a 16.01.2023 é processualmente admissível, deverá ser revogada a Decisão do Tribunal Recorrido de não apreciação do Recurso Subordinado apresentado pela Recorrente a 21.12.2023 (ref.ª citius ......39). Consequentemente, D) Deverá esse Recurso Subordinado ser julgado processualmente admissível e materialmente procedente e, em consequência, ser integralmente admitido o Requerimento de Ampliação do Pedido apresentado pela Recorrente a 21.12.2023 (ref.ª citius ......39)”. 13. A R. contra-alegou, rematando com as seguintes conclusões: “1.ª A revista não pode ser admitida no que concerne ao não conhecimento do objeto do recurso subordinado pela Relação, por não estarem verificados os pressupostos do n.º 1 do artigo 671.º do CPC, pois o acórdão da Relação não conheceu do mérito da causa nem pôs termo ao processo, nomeadamente absolvendo da instância a Ré quanto a qualquer pedido deduzido. 2.ª O acesso ao terceiro de grau de jurisdição não configura uma exigência constitucional, mormente em processos de natureza civil, pelo que o recurso ao STJ é absolutamente excecional, até porque a lei permite reclamar dos despachos de não admissão do recurso. 3.ª Nos termos do n.º 1 do artigo 671.º do CPC, a referência para aferir da admissibilidade do recurso é o teor do acórdão da Relação (e não o da decisão da 1.ª instância, como se previa no artigo 721.º, n.º 1 do CPC de 1961), só sendo admitida a revista de acórdãos da Relação que, incidindo sobre decisões da 1.ª instância, conheçam (no todo ou em parte) do mérito da causa, bem como ainda aqueles que ponham termo ao processo, mediante a absolvição da instância do réu quanto ao pedido deduzido. 4.ª Ora, o acórdão recorrido não conheceu do mérito da causa e nem pôs termo ao processo, pelo que à sua luz não é admissível recurso de revista. 5.ª O despacho da 1.ª instância de 07.10.2023 contém segmentos vários e independentes entre si, não podendo assemelhar-se a uma sentença, no que toca à sua estrutura formal, o que aliás poderia ter levado a que os aludidos segmentos decisórios fossem proferidos em datas e momentos diferentes, e não necessariamente naquele mesmo despacho. 6.ª Ao não recorrer autonomamente do segmento do despacho que lhe foi desfavorável (ao declarar a ineptidão da ampliação do pedido), quando tinha alçada para tanto e quando se verificava a necessária sucumbência, a recorrente conformou-se com esse mesmo segmento decisório. 7.ª A Autora recorreu subordinadamente de outro segmento decisório interlocutório formal e esse preciso segmento decisório intercalar que julgou inepta a ampliação do pedido da Autora – do qual a Ré não recorreu jamais – admitia apelação autónoma, pelo que não tendo a Autora dele recorrido, esse segmento da decisão transitou em julgado (cfr. acórdão do TCA Norte, de 30.09.2022). 8.ª O facto de em ambos os segmentos do despacho posto em causa a 1.ª instância ter declarado a existência de uma exceção dilatória, num caso desfavorável à Ré, no outro caso desfavorável à Autora, não é suficiente para que se encontrem preenchidos todos os requisitos de admissibilidade do recurso subordinado, do qual a Autora só lançou mão por ter percebido que devia ter recorrido autonomamente do despacho que julgou inepta a ampliação do pedido que a própria efetuara, tendo ao invés deixado transitar em julgado a dita decisão, nessa parte. 9.ª O despacho de 07.10.2023 comporta em si vários despachos diversos, sobre questões de Direito várias, o que aliás poderia ter levado a que tais segmentos decisórios fossem proferidos em datas e momentos diferentes, e não necessariamente no mesmo despacho, como aliás a Relação afirmou no acórdão recorrido. 10.ª O que é viável à luz do CPC, que não nos dá uma definição una quanto ao momento em que deve ser proferido um despacho pré-saneador ou um despacho saneador, pois o que releva é o teor de cada um dos despachos que vão sendo proferidos ao longo da instância, cabendo aos intervenientes processuais analisar o seu conteúdo e, com base nos conhecimentos técnicos que devem ter e que se pressupõe que tenham efetivamente (e que, nalguns casos, a lei obriga mesmo a ter), saber como – quando e de que modo – reagir. 11.ª Na audiência prévia de 19.12.2023 não se discutiu qualquer questão relacionada com o que havia já sido determinado por via do despacho recorrido, proferido em 07.10.2023, pelo que nem sequer ficou a constar da respetiva ata a menção a qualquer ineptidão do pedido reconvencional ou da ampliação do pedido, o que já havia sido anteriormente decidido, por despacho, do qual a ora recorrente não recorreu em tempo nem segundo a forma adequada (tendo assim precludido o seu direito), e em relação ao que já se havia esgotado o poder jurisdicional do juiz. 12.ª Sendo esclarecedor que na audiência prévia de 19.12.2023 já a Ré havia interposto recurso e o Sr. Juiz da 1.ª instância disso já tinha tomado conhecimento nos autos, o que resulta da ata respetiva bem como da gravação de suporte à diligência, em que fica claro que o Sr. Juiz titular do processo remeteu o comentário sobre tais questões para o seu despacho de 07.10.2023, o qual porém não havia ainda transitado em julgado nessa data, precisamente porque a Ré havia entretanto recorrido, como era já do seu conhecimento. 13.ª Ao referir que a opção da 1.ª instância foi realizar a audiência prévia para outros fins, mas não já para proferir despacho saneador, a Relação teve em conta o despacho que determinou a sua realização e os fins ali referidos, bem como o teor do despacho que veio a ser proferido na audiência prévia, sendo irrelevante a sua designação ou denominação aposta pelo próprio Sr. Juiz ou pelo Sr. Oficial de Justiça que redige a ata. 14.ª Nenhum sentido tem a tese da recorrente quanto ao facto de se ter querido evitar uma decisão-surpresa, porque, seguindo a sua tese, não teria havido sequer decisão nenhuma, já que após o despacho de 07.10.2023 mais nenhum despacho ou decisão consta dos autos relacionada com as ditas matérias em apreciação. 15.ª Ainda que seja admissível a revista quanto ao segmento do acórdão da Relação do Porto que decidiu não conhecer do recurso subordinado, deve o STJ validar e manter esse mesmo entendimento, improcedendo a pretensão recursória da Autora. 16.ª Quanto ao outro segmento da decisão recorrida, que respeita à (in)admissibilidade processual do recurso da agora recorrida, cumpre sublinhar que o acórdão recorrido não é subsumível nos casos do n.º 2 do artigo 671.º do CPC, por não apreciar uma decisão interlocutória que recaia unicamente sobre a relação processual. 17.ª Quando se trata de acórdão da Relação que incide sobre decisão da 1.ª instância de natureza interlocutória que verse sobre matéria adjetiva, considera-se que, em regra, é bastante o duplo grau de jurisdição, como vinha ocorrendo no âmbito do sistema dualista quanto ao recurso de agravo que também só era admitido, sem entraves, até à Relação. 18.ª Não é admissível a revista do acórdão da Relação também neste segmento e, como tal, não pode o STJ conhecer do objeto do recurso. 19.ª De qualquer forma, à recorrente estava vedada a invocação e pedido de apreciação de questões novas, perante o STJ, as quais não invocou na fase recursiva anterior (nem nas contra-alegações, nem no recurso subordinado), nomeadamente ao qualificar a decisão posta em crise como decisão-surpresa. 20.ª Se entendesse que o despacho de 07.10.2023 comportava uma decisão-surpresa, era contra esse despacho que a recorrente deveria ter recorrido diretamente, o que não fez, nem no prazo de 15 dias nem no prazo de 30 dias, nem na resposta ao recurso da ora recorrida nem em sede de recurso subordinado. 21.ª A Autora conformou-se com aquele despacho, dele não recorreu, e não pode agora vir dizer, perante o STJ, que o mesmo encerrou uma decisão-surpresa, pois tanto só seria fundamento ou argumento autónomo de recurso para a Relação (ainda que se admitisse mesmo no âmbito das contra-alegações ou do recurso subordinado, mas nem isso aconteceu, pois no seu articulado CONTRA-ALEGAÇÕES e RECURSO SUBORDINADO não há qualquer menção ao fator surpresa do despacho de 07.10.2023. 22.ª Está vedado à recorrente, na revista, invocar que o despacho de 07.10.2023 constitui uma decisão-surpresa, porquanto coloca o STJ na posição processualmente inadmissível de se pronunciar sobre questões novas. 23.ª Os recursos, enquanto meio de impugnação de anteriores decisões judiciais, regra geral, só podem visar questões que tenham sido anteriormente apreciadas, não podendo confrontar-se o tribunal de recurso com questões novas. 24.ª Os recursos não visam a prolação de decisões novas sobre questões novas, mas antes impugnar, reapreciar e, eventualmente, alterar as decisões do tribunal a quo, sobre os pontos já questionados e dentro dos mesmos pressupostos em que se encontrava o tribunal a quo no momento em que proferiu essa mesma decisão. 25.ª É irrelevante que haja contradição entre o acórdão da Relação (recorrido) e os dois acórdãos da Relação e do STJ que a recorrente junta como fundamento, pois estes têm que ver com a eventual ilegalidade de uma decisão-surpresa e o acórdão recorrido não se pronunciou, sequer, sobre essa questão, desde logo por não ter sido suscitada. 26.ª Até porque teria sido a decisão de 1.ª instância – e não o acórdão da Relação de que agora recorre de revista – ter consubstanciado o que chama de decisão-surpresa. 27.ª Porque a recorrente não expôs, para apreciação na Relação, a questão de a decisão da 1.ª instância ter comportado uma surpresa, então jamais o acórdão recorrido – porque não se pronunciou em concreto sobre essa questão – pode estar em contradição com qualquer dos acórdãos mencionados, dado não se verificar o requisito da identidade da mesma questão fundamental de direito. 28.ª A recorrente só poderia recorrer de revista, com os fundamentos invocados, se o acórdão recorrido tivesse apreciado a questão de saber se o despacho de 07.10.2023, proferido pela 1.ª instância, comportava, ou não, uma decisão-surpresa, o que a Relação não apreciou e muito menos julgou, desde logo porque a recorrente não expôs essa questão ao tribunal recorrido. 29.ª Não pode também ser admitida a revista nesta parte e, ainda que a mesma fosse admissível, o que apenas por dever de patrocínio se equaciona, deve o STJ pugnar pela admissibilidade do recurso de apelação da recorrida, tal como julgou a Relação do Porto, não concedendo provimento ao recurso da Autora. Nestes termos e nos melhores de Direito, deve ser rejeitado o recurso de revista interposto pela Autora, por inadmissibilidade processual, em toda a sua extensão, não tomando V. Exas. conhecimento do recurso, ou, caso assim se não entenda (o que se admite apenas por dever de patrocínio), deve ser negado provimento à revista e, em consequência, deve manter-se integralmente o teor do acórdão já proferido pela Relação, assim se fazendo a habitual Justiça”. 14. Foram colhidos os vistos legais. II. FUNDAMENTAÇÃO 1. As questões objeto desta revista são as seguintes: - admissibilidade do recurso subordinado interposto pela autora; improcedência do recurso da ré quanto ao despacho de não admissão da reconvenção. 2. Primeira questão (admissibilidade do recurso subordinado interposto pela autora) 2.1. Para o conhecimento deste segmento da revista releva a seguinte Matéria de facto a. Na sua oposição ao requerimento de injunção a R. deduziu reconvenção, na qual invocou ter resolvido o contrato de empreitada com justa causa, pretendendo ser indemnizada pelos prejuízos daí resultantes. b. A A. replicou, tendo aperfeiçoado a petição inicial, invocando prejuízos por atrasos nos pagamentos efetuados pela R. e, bem assim, reclamando créditos por trabalhos a mais realizados a pedido da R.; mais formulou ampliação do pedido. c. A R. respondeu à réplica, ampliando o pedido reconvencional. d. A A. respondeu à peticionada ampliação do pedido reconvencional. e. Em 07.10.2023 foi proferida a decisão supra mencionada em I.7, na qual: -se absolveu o A. da instância reconvencional, por se entender que a petição reconvencional era inepta, por existir contradição entre os pedidos formulados na reconvenção; - se absolveu a R. da instância quanto ao requerimento de ampliação do pedido formulado pela A., por se considerar que tal requerimento era inepto, por ser contraditório nos seus termos; - considerou-se prejudicada a atualização do pedido reconvencional apresentada pela R., face à ineptidão da reconvenção; - rejeitou-se, por extemporaneidade, o pedido de eliminação de defeitos e indemnização das reparações, formulado pela R.. f. As partes foram notificadas da decisão referida em e. por expediente de notificação elaborado nos autos a 9/10/2023. g. A R. interpôs recurso de apelação contra a decisão referida em e., quanto aos segmentos que lhe foram desfavoráveis. h. A A. contra-alegou na referida apelação e interpôs recurso subordinado, quanto ao segmento da decisão referida em e. em que se absolveu a R. da instância quanto à ampliação do pedido formulado pela A. 2.2. O Direito Antes de mais, apreciando a questão da inadmissibilidade deste segmento do recurso, suscitada pela R./recorrida, cumpre dizer o seguinte: Tem-se entendido que o acórdão da Relação que rejeita a apelação, com base na sua putativa extemporaneidade ou na falta de cumprimento de determinados requisitos legais (v.g. falta de conclusões) é suscetível de revista, desde que estejam reunidos os pressupostos gerais de recurso (art.º 629.º n.º 1 do CPC). Com efeito, a rejeição da apelação configurará, neste caso, uma decisão final, nos termos e para os efeitos previstos no art.º 671.º n.º 1 do CPC (neste sentido, cfr. António Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, Almedina, 7.ª edição, 2022, páginas 410 e 411; STJ, 29.10.2019, processo n.º 738/03.0TBSTR.E1.S3, consultável, tal como os acórdãos adiante referidos, em www.dgsi.pt). Assim, tendo a Relação rejeitado a apelação quanto ao recurso subordinado, nessa parte está-se perante decisão final que admitirá revista, nos termos do n.º 1 do art.º 671.º do CPC. Apreciemos, pois, a revista, no que concerne à não admissão do recurso subordinado interposto pela A.. Se ambas as partes ficarem vencidas, cada uma delas poderá recorrer na parte que lhe é desfavorável, podendo-o fazer de forma independente ou subordinada (art.º 633.º n.º 1 do CPC). Na modalidade do recurso subordinado, a parte que decidira aceitar o veredito final, conformando-se com a parcial improcedência na ação, ao ser notificada da interposição de recurso pela parte contrária, tem a oportunidade de, por sua vez, reagir contra a decisão na parte em que ficou vencida, nos termos e condições previstas no art.º 633.º do CPC. No recurso independente, o prazo de interposição do recurso conta-se a partir da notificação da decisão alvo do recurso (n.º 1 do art.º 638.º do CPC). No recurso subordinado, o prazo da sua interposição conta-se a partir da notificação da interposição do recurso da parte contrária (n.º 2 do art.º 638.º do CPC). No que diz respeito a prazos, a única regra particular prevista pelo legislador atinente ao recurso subordinado reporta-se, pois, ao dies a quo da sua contagem: contrariamente ao regime geral e por razões que não carecem de explicação, o prazo de interposição do recurso subordinado não se conta a partir da data da notificação da decisão recorrida, mas sim da notificação da interposição do recurso pela parte contrária. O acórdão recorrido não admitiu o recurso subordinado, por entender que ele, no caso, não era possível. Exarou-se o seguinte: “Como decorre de tal preceito [art.º 633.º n.º 1 do CPC], o recurso subordinado só pode ser interposto como tal se a parte ficar vencida pela mesma decisão em relação à qual também ficou vencida a parte que interpõe o recurso independente (só assim logra sentido a expressão “cada uma delas pode recorrer na parte que lhe seja desfavorável”). O recurso subordinado interposto pela autora com as suas contra-alegações versa sobre o despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto III, que optou por “julgar inepto” o requerimento de ampliação do pedido por si apresentado em 31/3/2023 e “em consequência” decidiu absolver a ré “da instância criada por aquele requerimento”. Ora, tal despacho integra uma decisão autónoma em relação à ampliação do pedido nele referida e nada a tem a ver com o despacho em relação ao qual foi interposto o recurso da ré, que consta proferido também naquela data mas sob o ponto I. Quem ficou vencida naquele despacho proferido sob o ponto III foi apenas a autora. Se a autora pretendia recorrer daquele despacho, teria que interpor recurso autónomo dele em prazo a contar da notificação da decisão dele constante. Assim, o recurso em causa não tem cabimento como recurso subordinado e, além disso, não seria sequer admissível como recurso independente quando deu entrada nos autos, pois tendo o prazo para este recurso há muito decorrido já se tinha formado caso julgado formal sobre a decisão com ele visada. Como tal, não há que conhecer do mesmo”. Sem prejuízo do devido respeito pela opinião contrária, discorda-se do tribunal a quo. A decisão proferida em 07.10.2023 enfrentou as pretensões das partes, de ampliação do objeto da causa, efetuadas através da dedução de reconvenção e de ampliação da reconvenção (do lado da R.) e de ampliação do pedido (do lado da A.). Nessa data a primeira instância decidiu rejeitar tais pretensões, tanto do lado da A. como do lado da R.. A A., constatando a recusa do pedido reconvencional, decidiu acatar a rejeição da sua própria ampliação do pedido. Mas, verificando que a R. impugnara a decisão no que concerne à rejeição da reconvenção, decidiu, também ela, questionar a rejeição da ampliação do pedido. Tanto mais que ambas as rejeições (da reconvenção e da ampliação do pedido) se haviam sustentado na mesma motivação, isto é, no facto de as partes alegadamente não poderem cumular, por serem contraditórios entre si, pedidos assentes na resolução do contrato e, simultaneamente, na pretensão de cumprimento do contrato. Tal opção da A. é perfeitamente legítima, face à letra e ao espírito do disposto no art.º 633.º n.ºs 1 e 2 do CPC. Este entendimento é expressamente acolhido por José Lebre de Freitas, Armindo Ribeiro Mendes e Isabel Alexandre, em Código de Processo Civil Anotado, volume 3.º, 3.ª edição, 2022, Almedina, páginas 60 e 61, os quais assim se exprimem: “…a lei portuguesa não exige que os recursos principal e subordinado sejam interpostos de partes distintas da decisão ligadas por uma relação de prejudicialidade, o que vedaria em caso de pronúncia sobre vários pedidos autónomos. Também em caso de pedidos cumulados (art. 555) o recurso interposto pelo autor da decisão de absolvição de um dos pedidos permite ao réu interpor recurso subordinado da condenação nos restantes pedidos, ainda que nenhuma relação de prejudicialidade entre eles se verifique. O mesmo se diga quanto ao pedido do autor e ao pedido reconvencional (independente) do réu, bem como quando o recorrido alargue o objeto do recurso a um despacho interlocutório, só impugnável (nos termos do art. 644-3) com a decisão recorrida…” Discorda-se, assim, com todo o respeito, da opinião contrária exposta por Rui Pinto (Código de Processo Civil Anotado, volume II, Almedina, 2018, páginas 251 a 253) e por Miguel Teixeira de Sousa (Estudos sobre o novo processo civil, Lex, 2.ª edição, 1997, páginas 496 e 497) – por não se alcançar que diferença substancial existe entre o decaimento parcial num único pedido e o decaimento total num pedido cumulado com pedido que é julgado procedente, em ordem em que a parte apenas possa interpor recurso subordinado na primeira situação. Em ambas as situações há um conjunto de ganhos e perdas que a parte poderá aceitar no caso de a outra parte também o fazer; caso contrário, fica salvaguardada a hipótese de a parte recorrer subordinadamente, se a contraparte interpuser recurso principal do veredito emitido, independentemente da existência de uma relação de prejudicialidade entre os pedidos. Nesta parte, pois, a revista é procedente. 3. Segunda questão (improcedência do recurso da ré quanto ao despacho de não admissão da reconvenção) 3.1. Para a apreciação desta questão releva, além do que consta no Relatório supra, a seguinte Matéria de facto a. Na contra-alegação à apelação deduzida pela R., a A. pugnou pela inadmissibilidade da apelação, nos seguintes termos: “De acordo com a Recorrente, o presente recurso é interposto “nos termos do disposto nos artigos 629.º, n.º 1, 631.º e 638.º todos do Código do Processo Civil (CPC) (…), o qual sendo de apelação (artigo 644.º, n.º 1, alínea b) do CPC), deverá subir imediatamente, em separado e com efeito meramente devolutivo, conforme dispõem o n.º 2 do artigo 645.º e os n.ºs 1 e 3 (a contrario) do artigo 647.º ambos do citado diploma legal” (realces e sublinhados nossos). Do excerto acima transcrito extrai-se que a Ré interpôs o presente recurso ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC, disposição nos termos da qual “cabe recurso de apelação: b) Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos” (realces e sublinhados nossos). Sucede que, Conforme se detalhará infra, ao presente recurso subjaz uma qualificação jurídico-processual manifestamente equivocada do Despacho de que a Ré pretende recorrer, na medida em que o Despacho recorrido não consubstancia o Despacho Saneador a que se refere o artigo 644, n.º1 alínea b) do CPC. Vejamos, Dispõe o n.º 2 do artigo 590.º do CPC que, “findos os articulados, o juiz profere, sendo caso disso, despacho pré-saneador destinado a: a) Providenciar pelo suprimento de exceções dilatórias, nos termos do n.º 2 do artigo 6.º b) Providenciar pelo aperfeiçoamento dos articulados, nos termos dos números seguintes; c) Determinar a junção de documentos com vista a permitir a apreciação de exceções dilatórias ou o conhecimento, no todo ou em parte, do mérito da causa no despacho saneador.” (realces e sublinhados nossos). Paralelamente, prescreve o subsequente artigo 591.º do CPC que, “concluídas as diligências do preceituado do n.º 2 do artigo anterior, se a elas houver lugar, é convocada audiência prévia (…) destinada, nomeadamente, a “d) proferir despacho saneador , nos termos do n.º 1 do artigo 595.º” (realces e sublinhados nossos). Deste modo, o despacho saneador – destinado a proceder, por definição, ao saneamento do processo – é prolatado, pela sua própria natureza e finalidade normativa, em momento posterior à audiência prévia, excepção feita aos casos em que a mesma não se realiza por imposição legal - artigo 592.º do CPC – e, bem assim, aos casos em que a lei admite a sua dispensa - artigo 593.º do CPC. Aliás, e como o próprio legislador esclarece (alínea d) do n.º 1 do artigo 591.º do CPC), o despacho saneador é elaborado na própria audiência prévia e ditado para a respetiva acta, salvaguardando-se a possibilidade de o mesmo ser elaborado por escrito como peça autónoma nos casos em que “a complexidade das questões a resolver o exija” (artigo 595, n.º2, 2.ª parte do CPC). De tudo decorrendo que o despacho saneador é, por força de lei, proferido em momento posterior à realização da audiência prévia, Circunstância que, só por si, inviabiliza a qualificação do Douto Despacho de que a Ré pretende recorrer como despacho-saneador e determina a inadmissibilidade do recurso nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC. Sem prescindir, Faz-se notar que, nos autos em recurso, tendo terminado a fase dos articulados e não se afigurando a ocorrência de qualquer das situações em que a lei impõe a não realização da audiência prévia ou em que permite a sua dispensa, o Tribunal a quo estava em condições de proferir despacho pré-saneador/despacho correctivo destinado a acautelar uma (ou várias) das três situações previstas no n.º2 do artigo 590.º do CPC. Ora, do teor do Douto Despacho em recurso extrai-se que o Tribunal recorrido, para além de proceder à marcação da audiência prévia – circunstância que, só por si, impede a qualificação do presente despacho como despacho-saneador –, convida a Autora, “ao abrigo do disposto no art. 590.º, n.º 2, al. b), e n.º 4, do CPC”, a suprir uma “insuficiência da matéria de facto alegada”, o que constitui justamente uma das previsões normativas que justifica a prolação do despacho pré-saneador (alínea b) do n.º 2 do artigo 590.º do CPC). Na verdade, e salvo melhor opinião, não podem subsistir quaisquer dúvidas de que o Douto Despacho em recurso consubstancia um despacho pré-saneador, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 590.º n.º2 do CPC, que, nessa medida, não é susceptível de recurso ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do CPC. Por outro lado, Como acima se assinala, no Despacho em recurso e para além da marcação de audiência prévia e do convite ao aperfeiçoamento da matéria de facto alegada pela Autora, o Tribunal a quo julgou: Inepta a reconvenção deduzida pela Ré “por haver incompatibilidade substancial entre os pedidos alegados (…)” e, “em consequência”, absolveu a “Autora/Reconvinda da instância reconvencional”; Inepto o requerimento de ampliação do pedido apresentado pela Autora e, “em consequência”, absolveu “a Ré da instância; mas apenas da instância criada por aquele requerimento (:..)”; Extemporânea a formulação do pedido de eliminação dos defeitos apresentada pela Ré. Do que decorre que o Tribunal a quo apreciou e decidiu, a título oficioso e, face aos elementos constantes dos autos, sobre as exceções dilatórias correspondentes de que, no seu entender, enfermam os pedidos reconvencionais deduzidos pela Recorrente. Ora, sendo certo que o conhecimento e decisão sobre a matéria de excepção constitui uma das finalidades da prolação do despacho saneador (cfr. alínea a) do n.º 1 do artigo 595.º), é igualmente irrecusável que daí não se pode extrair, como pretende a Recorrente, que o Douto Despacho em recurso constitui um despacho saneador e que, nessa medida, seria recorrível nos termos do artigo 644.º, n.º 1, alínea b) do CPC, até porque o Despacho em recurso não reúne os pressupostos para ser qualificado como tal, pelas razões antes expostas. Pelo que, salvo melhor opinião, e porque o Despacho em recurso não é subsumível a qualquer das situações previstas e tipificadas no n.º 1 e 2 do artigo 644.º do CPC – a saber, os casos em que os Despachos intercalares possam ser objecto de recurso autónomo – tal Despacho só é passível de ser impugnado em recurso de apelação, a interpor da decisão que ponha termo à causa, isto é, a sentença final ou o despacho saneador sentença. Sem prejuízo, E caso se pudesse entender, como hipótese teórica, que o Tribunal a quo deveria, antes da prolação do Despacho em recurso, ter promovido o contraditório das partes, então deveria a Recorrente ter reclamado do Despacho ora em recurso no prazo de dez dias a contar da sua prolação (n.º 1 do artigo 149.º do CPC) – o que não sucedeu. Razões que determinam, sem mais, a inadmissibilidade do Recurso”. b. O acórdão recorrido apreciou a questão da inadmissibilidade da apelação nos seguintes termos: “A autora defende que o recurso da ré não se integra na previsão de qualquer dos nºs 1 e 2 do art. 644º do CPC. Prevê-se em tal preceito, sob a alínea b) do nº1, que “Cabe recurso de apelação… Do despacho saneador que, sem pôr termo ao processo, decida do mérito da causa ou absolva da instância o réu ou algum dos réus quanto a algum ou alguns dos pedidos”. Como se sabe, havendo reconvenção, a reconvinte tem nela o lugar de autora e a reconvinda tem nela o lugar de ré. O despacho saneador é um despacho proferido após os articulados e destinado a conhecer das questões referidas nas alíneas a) e b) do nº1 do art. 595º do CPC. Estando em causa um despacho proferido após os articulados no qual se julgou inepta a reconvenção deduzida pela ré e, em consequência, se absolveu a autora da instância reconvencional, o mesmo, ainda que tenha sido proferido antes da audiência prévia – o que a lei permite por via do art. 547º do CPC (adequação formal), não obstante o seu lugar “normal” seja ser proferido naquela audiência ou até subsequentemente a ela (arts. 591º nº1 d) e 595º nº2 do CPC) –, não deixa de ser considerado integrante do despacho saneador. Note-se que o art. 591º do CPC diz que a audiência prévia se destina a algum ou alguns dos fins designados nas várias alíneas do seu nº1, do que decorre que, não obstante o proferimento do despacho saneador se conte entre eles, a mesma pode ter lugar e nela não ser proferido tal despacho – ou porque já foi proferido antes (como possibilitado pelo art. 547º do CPC) ou até porque se opta por proferi-lo depois (como o possibilita o nº2 do art. 595). Aliás, como se vê do despacho proferido a 7/10/2023 sob o ponto V, foi aquela primeira opção a tomada nos autos: decidiram-se anteriormente, noutros despachos, as questões que se entendeu serem de resolver e designou-se ali audiência prévia para vários fins mas não já para proferir despacho saneador, pois, naturalmente, considerou-se que aqueles outros despachos anteriores já o integravam. Assim, o despacho em causa, ao absolver a autora/reconvinda da instância reconvencional, integra-se na previsão da alínea b) do nº1 do art. 644º, sendo por isso passível de recurso de apelação autónomo. Como tal, é quanto a ele admissível o recurso. Impõe-se no entanto fazer uma precisão importante: o recurso, como se vê da suas conclusões 13ª, 14ª e 15º, abrange não só aquele despacho que absolveu a autora/reconvinda da instância reconvencional (proferido sob o ponto I) mas também o despacho também proferido a 7/10/2023 sob o ponto IV, que, debruçando-se sobre a ampliação do pedido reconvencional apresentada pela ré a 11/5/2023, considerou, sob o seu nº1, prejudicada aquela ampliação quanto a lucros cessantes em virtude da ineptidão da reconvenção decidida em despacho anterior, e, sob o seu nº2, não admitiu tal ampliação quanto aos pedidos de indemnização por despesas com reparação de defeitos e de eliminação de defeitos ali também deduzidos. Ora, sendo o despacho proferido sob aquele ponto IV um despacho autónomo, não subsumível a qualquer das previsões das alíneas a) e b) do nº1 do art. 644º do CPC, e integrando o mesmo, sob o seu nº2, a rejeição de um articulado – no caso, o que corporiza a pretendida ampliação do pedido (pois efetua-se nele a alegação de factos que baseiam tal ampliação para serem assim introduzidos nos autos e tidos em conta na apreciação do mérito causa) –, o recurso a interpor do mesmo teria como base a previsão da alínea d) do nº2 do art. 644º do CPC e deveria ser interposto no prazo de 15 dias, como se prevê no art. 638º nº1. Ora, tendo tal despacho sido notificado por expediente enviado à ré na mesma data em que o foi o despacho em que se julgou inepta a reconvenção e se absolveu a autora da instância reconvencional, a 9/10/2023, do que decorre que tal notificação se operou a 12/10/2023 (art. 248º nº1 do CPC), e tendo a ré apenas vindo a interpor o seu recurso a 16/11/2023, é óbvio de concluir que aquando desta data já tinha decorrido o prazo de 15 dias supra referido, mesmo contando com o possível acréscimo de 3 dias úteis previsto no art. 139º nº5 do CPC. Assim, quando a ré interpôs o seu recurso já o despacho proferido sob aquele ponto IV tinha transitado em julgado, tendo-se com ele formado caso julgado formal (art. 620º nº1 do CPC), o qual, tendo força obrigatória dentro do processo, torna inadmissível decisão posterior sobre a mesma questão que dele tenha sido objeto1. Como tal, não se conhece do recurso quanto àquele despacho proferido sob o nº2 do ponto IV. Já quanto ao decidido sob o seu nº1, como sob este segmento se considerou apenas prejudicada a apreciação da ampliação ali aludida (quanto a lucros cessantes) em virtude da ineptidão decidida quanto à reconvenção, debruçar-nos-emos sobre o mesmo no âmbito da questão seguinte (pois esta tem como objeto a questão de saber se ocorre ou não aquela ineptidão)”. 3.2. O Direito Conforme o reconhece a própria recorrente, nesta parte o acórdão recorrido não se integra no n.º 1 do art.º 671.º do CPC (pois, ao admitir a reconvenção deduzida pela R., a Relação não conheceu de mérito nem pôs termo ao processo). Nesta parte, ao pronunciar-se sobre um despacho que rejeitou a reconvenção deduzida pela R., o acórdão recorrido pronunciou-se sobre decisão interlocutória que recaiu unicamente sobre a relação processual. Ora, nos termos do n.º 2 do art.º 671.º do CPC, apenas é admissível revista de um tal acórdão se ocorrer algumas das situações em que é sempre admissível recurso (alínea a) do n.º 2 do art.º 671.º), ou se o acórdão estiver “em contradição com outro, já transitado em julgado, proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, no domínio da mesma legislação e sobre a mesma questão fundamental de direito, salvo se tiver sido proferido acórdão de uniformização de jurisprudência com ele conforme” (alínea b) do n.º 2 do art.º 671.º). A recorrente alega que, na parte ora objeto de recurso, o acórdão recorrido está em contradição com o acórdão do STJ proferido em 02.05.2024 no âmbito do processo n.º 1099/21.1T8AMD.L1.S1. Vejamos. O apuramento da contradição jurisprudencial relevante obedecerá a critérios semelhantes aos que se verificam quanto à admissibilidade do recurso extraordinário para uniformização de jurisprudência (cfr., v.g., Abrantes Geraldes, Recursos em Processo Civil, 7.ª edição, 2022, Almedina, páginas 75 e 76; acórdão do STJ, de 29.10.2020, processo n.º 13585/19.9T8SNT-A.L1.S1). Isto é: - Deverá ocorrer uma verdadeira contradição entre os acórdãos. Tal significa que a questão essencial, que constituiu a razão de ser e objeto da decisão, foi resolvida de forma frontalmente oposta nas decisões em confronto. Não basta oposição respeitante a questões laterais ou a fundamentos de ordem secundária, nem oposição meramente implícita; – Deve verificar-se uma relação de identidade entre a questão de direito apreciada no acórdão que é objeto de recurso e a apreciada no acórdão-fundamento, não bastando que nos dois acórdãos se tenha abordado o mesmo instituto jurídico. Tal pressupõe que os elementos de facto relevantes para a ratio da regra jurídica sejam coincidentes, isto é, que a subsunção jurídica feita em qualquer das decisões tenha operado sobre núcleo factual essencialmente idêntico, sem se atribuir relevo a elementos de natureza acessória; - Por último, a divergência deve verificar-se num quadro normativo substancialmente idêntico. Reportemo-nos ao caso dos autos. No caso do acórdão recorrido, estava em causa a admissibilidade de apelação imediata e autónoma contra um despacho que o tribunal recorrido considerou ser enquadrável na previsão da alínea b) do n.º 1 do art.º 644.º do CPC, isto é, ser subsumível ao conceito de “despacho saneador” e, por isso, suscetível de recurso imediato. Ora, o acórdão do STJ citado pela recorrente não enfrentou essa questão, da qualificação de uma decisão para o efeito da admissibilidade, ou não, de recurso imediato contra esse despacho. O que o STJ apreciou foi se a primeira instância, ao proferir a sentença, deu ao litígio um enquadramento jurídico que surpreendeu as partes, nomeadamente o A., não lhes tendo facultado o exercício do contraditório e confrontando-os, assim, com uma decisão surpresa. Não existe, assim, entre o acórdão do STJ e o acórdão recorrido qualquer controvérsia. É certo que a recorrente, prevendo a eventual não verificação da recorribilidade do acórdão da Relação em face ao apresentado acórdão do STJ, veio, em subsidiariedade de admissibilidade muito discutível, apresentar um outro acórdão, desta feita da Relação do Porto, de 26.9.2023, proferido no processo n.º 15212/21.5T8PRT.P1. Nesse desiderato a recorrente invoca as disposições conjugadas da alínea a) do n.º 2 do art.º 671.º e da alínea d) do n.º 2 do art.º 629.º do CPC. Admitindo, como se admite, a invocabilidade da alínea d) do n.º 2 do art.º 629.º do CPC, como hipótese enquadrável na alínea a) do n.º 2 do art.º 671.º do CPC, aponta-se, ao caso sub judice, o mesmo obstáculo que já se apontara ao acórdão do STJ apresentado pela A. para fundar a admissibilidade da revista sub judice: o acórdão da Relação do Porto apontado versou sobre questão diversa da do acórdão recorrido. O acórdão apresentado como acórdão fundamento incidiu sobre a seguinte questão, nele mesmo enunciada: “Apurar se a decisão recorrida, violando o princípio do contraditório, deve ser encarada como decisão-surpresa e se foi correta a dispensa da audiência prévia”. Ora, salvo o devido respeito por quem tenha opinião contrária, essa vexata questio nada tem em comum com aqueloutra que foi apreciada no acórdão recorrido, já reiteradamente descrita. Pelo que, nesta parte, a revista não é admissível. III. DECISÃO Pelo exposto: 1.º Rejeita-se, por não ser admissível, a revista no que concerne ao segmento do acórdão recorrido que julgou procedente a apelação quanto ao despacho que rejeitara a reconvenção deduzida pela R.; 2.º Julga-se procedente a revista no que concerne à não admissão do recurso subordinado deduzido pela A. e, em consequência, determina-se a anulação do acórdão recorrido nessa parte, devendo os autos baixar à Relação para apreciação do recurso subordinado; 3.º No mais, mantém-se o acórdão recorrido. As custas da revista, na vertente das custas de parte, são a cargo da recorrente e da recorrida, na proporção de 50% por cada uma, por em tal se computar o respetivo decaimento (artigos 527.º n.ºs 1 e 2, 533.º do CPC). LISBOA, 11.11.2025 Jorge Leal António Pires Robalo António Magalhães |