Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 1.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MANUEL AGUIAR PEREIRA | ||
Descritores: | CUSTAS CÍVEIS REMANESCENTE DA TAXA DE JUSTIÇA PRESSUPOSTOS INSTRUÇÃO TRIBUNAL DA RELAÇÃO AÇÃO DE ANULAÇÃO DECISÃO ARBITRAL INTERPRETAÇÃO DA LEI | ||
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Data do Acordão: | 07/02/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
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Sumário : | I) Não é enquadrável no regime de isenção do pagamento do remanescente da taxa de justiça previsto no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais a tramitação de uma acção de anulação de um acórdão arbitral cuja fase de instrução na primeira instância judicial se resumiu à apresentação e análise dos articulados e de prova documental, e em que foi proferida decisão sobre o mérito da causa que foi objecto de recurso de revista; II) Do facto de não ter tido lugar a realização de outras diligências de prova requeridas não se pode concluir que a fase de instrução permanece por concluir mesmo depois de proferida decisão em primeira instância judicial na Relação e depois no Supremo Tribunal de Justiça; III) O regime de isenção do pagamento do remanescente da taxa de justiça previsto no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais tem aplicação quando a instância finde antes de se concluir a instrução a que haja lugar e encontra justificação na maior simplificação do processado e na menor necessidade de utilização dos serviços de administração da justiça. | ||
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Decisão Texto Integral: | EM NOME DO POVO PORTUGUÊS, acordam os Juízes Conselheiros da 1.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: ◊ I - RELATÓRIO Parte I – Introdução 1) AA intentou oportunamente no Tribunal da Relação de Lisboa acção de anulação de acórdão arbitral, contra Sporting Clube de Portugal - Futebol, SAD, peticionando a anulação dos acórdãos arbitrais proferidos pelo Tribunal Arbitral do Desporto ("TAD") em 18 de março de 2020 e 6 de julho de 2020. Em 2o de janeiro de 2022 o Tribunal da Relação de Lisboa julgou a acção improcedente e manteve as decisões proferidas pelo Tribunal Arbitral do Desporto, condenando o autor nas custas da acção. Tendo sido de tal acórdão interposto recurso de revista o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 30 de maio de 2023, transitado em julgado, confirmou o acórdão recorrido condenando o recorrente nas custas respectivas. 2) Em 8 de setembro de 2023 foi elaborada a conta de custas processuais, dela resultando que o autor deveria pagar a quantia de € 598,230,00 (quinhentos e noventa e oito mil duzentos e trinta euros) ainda em dívida. O autor apresentou reclamação da conta e, na sequência, viria a ser proferida decisão em que, depois de apreciar a questão da aplicabilidade ao caso do disposto no artigo 6.º n.º 8 e 14-A alínea d) do Regulamento das Custas Processuais, da aplicabilidade do regime de tributação de recursos em ambas as instâncias e da tempestividade do pedido de dispensa de pagamento do remanescente da taxa de justiça devida decidiu julgar parcialmente procedente a reclamação e determinar a reforma da conta elaborada, por forma a que fosse considerado no cálculo do valor do remanescente devido a título de taxa de justiça a Tabela I-B anexa ao Regulamento das Custas Processuais, em ambas das instâncias e deduzidos os valores pagos pela pate vencedora, consignando que o valor em dívida pelo autor / reclamante era de € 396.372,0o (trezentos e noventa e seis mil trezentos e setenta e dois euros) e indeferindo quanto ao mais a reclamação da conta apresentada. ◊ ◊ ◊ Parte II – A Revista 3) Inconformado o autor interpôs recurso de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, tendo formulado as seguintes conclusões nas respectivas alegações: “1.ª — O Recorrente apresentou acção de anulação de acórdão arbitral contra o Sporting Clube de Portugal – Futebol, SAD, peticionando a anulação dos acórdãos arbitrais proferidos pelo Tribunal Arbitral do Desporto (“TAD”) em 18 de março de 2020 e 6 de julho de 2020. 2.ª — A 20.01.2022 foi proferido Acórdão que manteve as referidas decisões arbitrais, tendo este sido objecto de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça que, mediante Acórdão de 30.05.2023, decidiu manter o Acórdão recorrido. 3.ª — Em 08.09.2023, foi elaborada a conta com o n.º ...23, mediante a qual foi considerado que o Recorrente deveria pagar o valor global de 598.230,00 €, conta que foi objecto de reclamação apresentada a 21.09.2023. 4.ª — O Tribunal a quo proferiu Acórdão a 23.11.2023, sendo que das decisões proferidas o Recorrente apenas não se conforma com a decisão proferida na alínea d) do dispositivo, mais concretamente o Recorrente não se conforma com a decisão que considera não aplicável aos autos o disposto no artigo 6.º, n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais — é este o objecto do presente recurso. 5.ª — Este recurso não abrange os segmentos decisórios identificados nas alíneas a), b) e c) do Acórdão recorrido. 6.ª — Em suma, foi entendimento do Tribunal a quo que a não aplicabilidade do disposto no artigo 6.º, n.º 8 do RCP resultava de: (i) haver uma diferença entre a decisão proferida pelo Tribunal da Relação e uma decisão proferida em sede de despacho saneador, tendo no caso em apreço o processo terminado com decisão que apreciou o mérito da causa em sede de julgamento; e (ii) o processo ter terminado com prolação de Acórdão e não com decisão singular e liminar do relator. 7.ª — Nos termos do artigo 1.º, n.º 2 do RCP “Para efeitos do presente Regulamento, considera-se como processo autónomo cada acção, execução, incidente, procedimento cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação própria.” 8.ª — Para efeitos do Regulamento das Custas Processuais, considera-se como “processo” uma acção, considerando-se como outro processo (para o mesmo efeito de custas) a instância de recurso. 9.ª — A acção em 1ª instância judicial, enquanto “processo autónomo” que é, terminou “antes de concluída a fase da instrução” com a prolação de Acórdão de 20.01.2022, que apreciou do mérito da causa e terminou “antes de concluída a fase de instrução”. 10.ª — A tramitação da acção de anulação apresenta muitas semelhanças com a do recurso de apelação; no entanto, a produção de prova não só é admissível como possível no âmbito da acção de anulação, ainda que nos casos legalmente previstos; o artigo 46.º, n.º 2 da LAV prevê-o expressamente. 11.ª — O início da fase de instrução não coincide com o início da audiência final; a instrução termina na audiência final. 12.ª — No caso dos autos em 1ª instância a fase de instrução teve início (com os documentos juntos aos articulados), mas não foi concluída porquanto o Tribunal a quo entendeu que o estado do processo permitia sem mais provas o conhecimento imediato do mérito da causa, ou seja, não foram esgotados os recursos materiais inerentes à produção de prova e realização de audiência final. 13.ª — Assim, a decisão de mérito vertida no Acórdão de 22.01.2022, e que pôs termo à acção em 1ª instância, foi proferida sem que a fase instrutória fosse concluída. 14.ª — Sendo, assim, legítima e devida a aplicação automática do disposto no artigo 6.º, n.º 8 do RCP ao montante de custas devido pela tramitação da acção em 1ª instância judicial. 15.ª — Neste sentido pode ver-se o Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, de 19.11.2020, proc. n.º 02357/16.2..., e o Parecer elaborado pela Exma. Senhora Professora Doutora Paula Costa e Silva, datado de 22.09.2023, junto aos presentes autos mediante requerimento de 26.09.2023, com a ref.ª citius ...59. 16.ª — Não é possível equiparar a fase de “julgamento de recurso” prevista para os recursos com a “audiência final” prevista para a acção declarativa. 17.ª — Não há justificação para diferente tratamento caso o processo termine por decisão singular e liminar do relator ou caso termine por Acórdão, pois que em ambas as situações o processo terminaria sem que fosse concluída a fase da instrução e o Tribunal apreciaria do mérito da causa. 18.ª — Introduzir uma diferença que não existe corresponderia a uma grave violação do princípio da igualdade, além de que essa interpretação sempre seria ilegal por implicar a criação de um pressuposto que a regra prevista no artigo 6.º, n.º 8 do RCP não prevê. 19.ª — Os critérios de aplicação do disposto no artigo 6.º, n.º 8 do RCP são apenas legais e os critérios legais são apenas dois: (i) o processo autónomo tem de terminar (como terminou no caso em apreço com o Acórdão proferido a 20.01.2022), e (ii) o processo autónomo tem determinar antes de finda a fase de instrução (como também terminou pois que não foi produzida a prova requerida pelas partes nos articulados, com excepção da prova documental que o Tribunal a quo entendeu como suficiente para conhecer imediatamente do estado do processo). 20.ª — Qualquer outra interpretação é, assim, inequivocamente contra legem, ou seja, contrária a lei expressa. 21.ª — Assim, e interpretando devidamente, e nos termos expostos, o número 8 do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, na medida em que o processo em 1ª instância judicial terminou antes de concluída a fase da instrução, podemos afirmar que se encontram verificados os pressupostos do referido dispositivo legal, pelo que não há lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça relativamente ao processo em 1.ª instância judicial. 22.ª — Deve ser revogada a decisão que julgou inaplicável aos autos o disposto no artigo 6.º, n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais, revogando-se, nesta parte, a alínea d) do dispositivo. Termos em que deve julgar-se procedente o presente recurso e, em consequência, deve ser revogada a decisão que julgou inaplicável à 1ª instância, que correu termos no Tribunal da Relação, o disposto no artigo 6.º, n.º 8 do RCP. ◊ ◊ ◊ 4) O Ministério Público junto do Tribunal recorrido respondeu às alegações apresentadas, pedindo a improcedência da revista e a confirmação do acórdão recorrido. ◊ ◊ ◊ 5) Colhidos que foram os vistos dos Juízes Conselheiros adjuntos importa apreciar e decidir. Tendo em conta o teor das alegações de recurso e a expressa limitação do seu âmbito feita nas respectivas conclusões, a única questão de direito a decidir prende-se com a interpretação a dar à norma contida no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais e à sua aplicabilidade ao caso dos autos. Não é devido o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida porque o processo terminou antes de concluída a fase de instrução? ◊ ◊ ◊ II - FUNDAMENTAÇÃO Parte I – Os Factos Os factos relevantes para a decisão a proferir são os que emergem do antecedente relatório. ◊ ◊ ◊ Parte II – O Direito 1) A questão a decidir nestes autos pode ser colocada da forma seguinte: nos casos em que o Tribunal da Relação funciona em primeira instância, não havendo lugar à produção de qualquer prova pessoal, apesar de requerida e seguindo-se à apresentação dos articulados das partes e da prova documental a tramitação do recurso de apelação, deve entender-se que o processo termina “antes de concluída a fase de instrução” nos termos e para os efeitos previstos no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais? O acórdão recorrido respondeu negativamente a esta questão concluindo que era devido o pagamento do remanescente da taxa de justiça devida a final, não sendo aplicável o invocado artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais. O acórdão recorrido tratou a questão em apreciação – cremos que com acerto – da forma seguinte: “No caso em apreço, não houve lugar à produção de qualquer prova, seguindo-se, após os articulados, a tramitação do recurso de apelação. Preencherá a ausência dessa fase de produção de prova a previsão do art. 6º, nº 8º citado, podendo entender-se que, nesses casos, o processo terminou antes de concluída a fase de instrução? Parece-nos que não. Desde logo, porque esta norma pressupõe que o processo termina sem que o Tribunal profira sentença ou decisão sobre o mérito da causa, mas, excepcionalmente, antes da fase que seria expectável para a sua conclusão. Sem que se proceda à produção de prova, em sede de audiência final. Não esquecemos a possibilidade de prolacção de decisão final de mérito em sede de despacho saneador – também essa situação beneficia do regime excepcional de dispensa do pagamento da taxa de justiça remanescente. Por isso, parece-nos que o legislador optou por um critério economicista, emergente da duração processual e dos meios judiciais utilizados: se o processo termina antes da produção de prova, em sede de audiência final, não há lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça; se termina, independentemente do teor da decisão (de mérito ou de apreciação de pressuposto processual em falta), mas depois de esgotados os recursos materiais inerentes à produção de prova e realização de audiência final, esse remanescente será, em princípio, devido. Como se refere no Acórdão da Relação de Guimarães, de 27/6/2019 (Fernando Freitas), disponível em www.dgsi.pt: Dispondo o n.º 7 que o pagamento do remanescente da taxa de justiça pode ser dispensado pelo juiz, atendendo, designadamente, “à complexidade da causa” e “à conduta processual das partes”, afigura-se evidente que com a introdução daquele n.º 8, o legislador quis significar que uma causa em que as partes fazem terminar o processo em momento anterior ao da prolação da sentença, posto que o tribunal não é chamado a decidir, a causa não poderá ser considerada complexa e nem a conduta processual das partes deverá ser valorada negativamente, com o que sempre deviam ter-se por verificados os pressupostos de dispensa do pagamento do remanescente da taxa de justiça. Na situação, como a dos autos, em que o processo termina com a prolação de Acórdão, em que se aprecia o mérito da causa, decidido pelo colectivo de juízes, em sede de julgamento, inexistem as razões subjacentes ao regime excepcional de isenção do pagamento do remanescente previsto neste preceito. Diferente seria, caso o processo terminasse por decisão singular e liminar do relator, nos termos previstos no art. 652º, nº1, alíneas b) e c) do Código de Processo Civil. A simplicidade da tramitação e a economia de meios justificaria, nesse caso, a aplicação da isenção prevista no citado art. 6º, nº 8. Não foi o caso dos autos, pois, como se disse, o processo terminou na sua instância inicial com a prolação de Acórdão proferido pelo colectivo de Juízes. O processo terminou, assim, na instância judicial inicial, no seu momento normal e previsível, não antecipadamente em relação ao iter processualis expectável. Improcede, pois, esta argumentação, não se vendo razões que justifiquem a aplicação ao caso do art. 6º, nº8 do Regulamento das Custas Processuais.” 2) As regras gerais sobre a Taxa de Justiça constam do artigo 6.º do Regulamento das Custas Processuais, importando destacar os seguintes aspectos parcelares: “1 - A taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento. 2 - Nos recursos, a taxa de justiça é sempre fixada nos termos da tabela I-B, que faz parte integrante do presente Regulamento. (…) 6 – Nos processos cuja taxa seja variável, a taxa de justiça é liquidada no seu valor mínimo, devendo a parte pagar o excedente, se o houver, a final. 7 – Nas causas de valor superior a 275.000 euros, o remanescente da taxa de justiça é considerado na conta a final, salvo se a especificidade da situação o justificar e o juiz de forma fundamentada, atendendo designadamente à complexidade da causa e à conduta processual das partes, dispensar o pagamento. 8 – Quando o processo termine antes de concluída a fase de instrução, não há lugar ao pagamento do remanescente. (…)” 3) Temos assim que, de acordo com o regime de tributação processual vigente as partes auto liquidam o valor da taxa de justiça devida pelo impulso processual que vão promovendo pelo seu valor mínimo e de acordo com o valor da causa e a complexidade do processo tal como estabelecido, na ausência de regra especial, na tabela I-A anexa ao Regulamento das Custas Processuais. O apuramento efectivo e concreto do valor da taxa de justiça devido em cada caso é feito na conta final do processo, podendo não corresponder – como habitualmente sucede – ao valor pago ao longo do processo. Daí que nos processos em que a taxa de justiça é variável a parte tenha, a final, que pagar o excedente da taxa de justiça devida, se o houver, tendo em conta o valor de taxa de justiça já pago (artigo 6.º n.º 6 do Regulamento as Custas Processuais). No caso específico das acções de valor superior a 275.000 euros, o Regulamento das Custas Processuais confere ao Juiz a possibilidade de dispensar, total ou parcialmente, o pagamento do remanescente da taxa de justiça que seria devida, considerando o valor já pago (artigo 6.º n.º 7 do Regulamento das Custas Processuais). 4) Casos há, porém, em que o próprio Regulamento das Custas Processuais prevê que não haja lugar ao pagamento do remanescente da taxa de justiça (artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais) ou ao pagamento da segunda prestação da taxa de justiça que seria devida (artigo 14.º-A alínea d) do Regulamento das Custas Processuais). São situações identificadas pelo legislador que, assumindo a relação de correspondência tendencial entre o serviço efectivamente desenvolvido e a taxa de justiça a pagar, tomando como critério a complexidade do processo e o empenhamento dos serviços de administração da justiça, teve por ajustado estabelecer, em função do serviço prestado a redução da tributação ou a isenção de pagamentos de taxa em reforços dos pagamentos já realizados. 5) A tramitação típica de uma acção de anulação de acórdão arbitral em primeira instância judicial está prevista no artigo 46.º da Lei de Arbitragem Voluntária. Dela consta a apresentação de documentação (cópia certificada da sentença arbitral e documentação conexa), e o requerimento de meios de prova com os articulados, sendo a parte contrária requerida para se opor ao pedido de anulação e requerer os meios de prova que entende, sendo admitido um articulado de resposta a eventuais excepções. Segue-se a produção de prova a que houver lugar e a tramitação específica do recurso de apelação, incluindo a audiência de julgamento e a publicação da decisão do Tribunal Colectivo nos termos previstos para essa espécie de recurso. 6) No caso dos autos não houve lugar à produção de prova pessoal no Tribunal da Relação de Lisboa, seguindo-se à apresentação dos articulados a tramitação do recurso de apelação e, nela incluída, a decisão de mérito. Daí não decorre, porém, que não seja devido o pagamento do remanescente da taxa de justiça que, a final, se apurar. Como se assinala no acórdão recorrido a isenção do pagamento do remanescente da taxa de justiça ao abrigo do invocado preceito assenta na ausência de complexidade que anda habitualmente associada à menor duração do processo e a uma mais racional utilização dos meios do serviço público de administração da justiça disponíveis. Citando Salvador da Costa in “As custas processuais – análise e comentário” Almedina 2023 – 9.ª edição – reimpressão, a página 103, este regime especial foi “inspirado na ideia de simplificação e de celeridade processual em virtude de o processo cessar definitivamente antes do encerramento da audiência final e conclusão do processo ao juiz para a sentença …”, constituindo seu “pressuposto da sua aplicação que o processo termine antes do encerramento da fase de instrução, por decisão de mérito ou de forma transitada em julgado”. 7) A presente acção tendo em vista a anulação do acórdão arbitral não terminou antes de concluída a fase de instrução. É algo artificioso, com respeito e consideração por opinião contrária, considerar como o faz o recorrente, que a fase de instrução nos presentes autos se iniciou com a apresentação da prova documental pelas partes, mas não se concluiu porque o Tribunal da Relação entendeu que o estado do processo permitia, sem a produção de mais provas, o conhecimento imediato do mérito da causa. Nos termos do artigo 410.º do Código de Processo Civil a instrução tem por objecto os factos necessitados de prova quando não tenha havido enunciação dos temas da prova, pelo que se o Tribunal da Relação entendeu que todos os factos necessitados de prova estavam documentados nos autos, é porque, ao menos de forma implícita, mas sem qualquer manifestação em contrário por parte do recorrente, teve por concluída a instrução e cumprida a finalidade por ela visada. A realização do julgamento e a prolação do acórdão – atos processuais que se seguem na lógica do processo à conclusão da instrução – são disso evidência, não sendo compreensível por que razão continuaria a fase de instrução aberta e por concluir após a decisão da acção. 8) De onde, em contrário, se concluiu que, apesar de não registar uma típica e bem definida fase de instrução autónoma, a instância judicial inicial da acção de anulação foi concluída com a prolação do acórdão do Tribunal Colectivo competente, vindo a ter o seu julgamento definitivo no momento que era previsível sem qualquer antecipação em relação ao que era expectável. Na instância judicial inicial e na instância de recursos foi desenvolvida a actividade requerida pela conduta processual do ora recorrente sem qualquer aligeiramento justificativo da redução da tributação devida. 9) Esta interpretação não é restritiva nem ilegal porque é a única que se afigura ser consentida pela letra da lei nos termos do artigo 9.º do Código Civil. Ficcionar que, apesar de o processo de anulação do acórdão arbitral só ter ficado definitivamente decidido com o acórdão proferido na revista, ele terminou “antes de concluída a fase de instrução”, definitivamente ultrapassada com a prolação do acórdão proferido no Tribunal da Relação (depois confirmado em sede de revista) seria aceitar pela via da interpretação da lei um pensamento legislativo sem o mínimo de correspondência verbal na formulação legal do artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais. 10) O recorrente não usou, podendo fazê-lo, da faculdade de requerer a isenção ou a redução do pagamento da taxa de justiça devida, não tendo sido oficiosamente dispensado tal pagamento. O recorrente tendo sido condenado no Tribunal da Relação e no Supremo Tribunal de Justiça no pagamento das custas da acção que interpôs não tinha, objectivamente, razão para acreditar que não era devido o pagamento integral da taxa de justiça que viesse a ser calculada a final. A conta final do processo, contra a qual deduziu reclamação o ora recorrente, ao considerar ser devido o pagamento do remanescente da taxa de justiça, nos termos já rectificados, não merece qualquer censura. Como decidiu o acórdão recorrido, que se acompanha, não é aplicável ao caso presente o disposto no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais. 11) Em resumo, improcede o recurso de revista interposto pelo recorrente AA contra o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 23 de novembro de 2023 que desatendeu a sua reclamação contra a conta, na parte em que considerou inaplicável ao caso o disposto no artigo 6.º n.º 8 do Regulamento das Custas Processuais. As custas do recurso de revista serão suportadas pelo recorrente, nos termos gerais do artigo 527.º n.º 1 do Código de Processo Civil. ◊ ◊ ◊ ◊ III - DECISÃO Termos em que os Juízes Conselheiros deste Supremo Tribunal de Justiça acordam em negar provimento à revista e confirmar o acórdão recorrido. Condenam o recorrente no pagamento das custas da revista que interpôs.
Lisboa e Supremo Tribunal de Justiça, 2 de julho de 2024
Manuel José Aguiar Pereira (Relator) Henrique Ataíde Rosa Antunes Maria Clara Pereira de Sousa de Santiago Sottomayor |