Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
Relator: | JORGE DIAS | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE EXTRACONTRATUAL RESPONSABILIDADE OBJECTIVA ATIVIDADES PERIGOSAS ENERGIA ELÉTRICA FORÇA MAIOR NEXO DE CAUSALIDADE CULPA CÁLCULO DA INDEMNIZAÇÃO DANOS NÃO PATRIMONIAIS DANOS FUTUROS EQUIDADE QUESTÃO NOVA RECURSO DE REVISTA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DUPLA CONFORME FUNDAMENTAÇÃO ESSENCIALMENTE DIFERENTE MATÉRIA DE DIREITO MATÉRIA DE FACTO PODERES DE COGNIÇÃO PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA | ||
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Data do Acordão: | 10/07/2021 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
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Sumário : | I - Verificando-se que o autor obteve decisão (acórdão) que lhe é mais favorável do que se fosse confirmação integral da sentença, conforme entendimento quer a doutrina, quer a jurisprudência, em situações como a que se verifica nos autos há dupla conforme, para efeitos do previsto no art. 671º, nº 3 do CPC. II - Por se verificar a dupla conforme e sem fundamentação essencialmente diferente, tal como define o nº 3 do art. 671º do CPC, não é de admitir o recurso como revista normal, relativamente à impugnação, pelo Autor, da matéria de direito. III - Falhado este requisito (conformidade decisória) inexiste dupla conforme. É necessário que se verifiquem todos os requisitos, enunciados no nº 3 do art. 671º do CPC, para que se verifique a dupla conforme. IV - A intervenção do STJ na decisão da matéria de facto está limitada aos casos previstos nos arts. 674º, nº 3 e 682º, nº 3, do CPC, o que exclui a possibilidade de interferir no juízo da Relação sustentado na reapreciação de meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação. V - Há que fazer a distinção na responsabilidade objetiva, entre a responsabilidade que possa resultar da instalação da energia elétrica e, a responsabilidade resultante da condução e entrega da mesma energia. VI - E não isenta de responsabilidade na condução da energia o facto de a linha condutora se encontrar de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação. VII - Enquanto nos danos resultantes da própria instalação elétrica pode haver afastamento da culpa quando, ao tempo do acidente a instalação estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação, em relação aos danos derivados da condução e entrega da eletricidade, a responsabilidade só é afastada quando se verificar uma situação que exclui o nexo de causalidade, isto é, quando os danos são devidos a causa de força maior. VIII- No caso não se provou que tivesse acontecido “um fenómeno”, uma causa exterior e independente do funcionamento e utilização da linha elétrica que fosse causa da descarga. Não resulta provada a ocorrência de nenhum fenómeno (seja qual for a natureza) que não se pudesse evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências. IX - Não é lícito que um recorrente invoque, em qualquer recurso, questões que não tenham sido objeto de apreciação pela decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação. X - A indemnização pecuniária deve medir-se pela diferença entre a situação (real) em que o facto deixou o lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria sem o dano sofrido, diferença que se estabelece entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento. XI - A fixação da indemnização em termos de equidade deve ter em conta as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida. Em caso de julgamento segundo a equidade, devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, aquelas regras. | ||
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Decisão Texto Integral: | *** Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, 1ª Secção Cível.
1 - AA instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra EDP Distribuição – Energia, S. A., pedindo que a Ré seja condenada: a) a pagar ao A., a título dos danos patrimoniais já sofridos como consequência direta e necessária da eletrocussão, os montantes de: 1) - €: 500,00 (vide artigos 106 e 107); 2) - €: 100,00 (vide artigo 110); 3) - €: 485,00 (vide artigos 106 e 107); b) a pagar ao A., a título de danos patrimoniais futuros: 1) - €: 10.000,00 (vide artigos 108 e 109); 2) - €: 10.280,88 (vide artigos 111 a 114); 3) - €: 90.000,00, sem prejuízo do A. provar que era expectável obter rendimentos superiores ao salário mínimo nacional com a concretização do seu projeto empresarial, caso em que os cálculos efetuados nos últimos quatro artigos deverão ter como referência os determináveis valores desses rendimentos, podendo atingir os €: - 636.389,69 (vide artigos 131 a 146); c) a pagar ao A. uma compensação pecuniária global nunca inferior (mas que pode ser superior) a €: 100.000,00, a título dos danos não patrimoniais causados pela eletrocussão (vide artigos 31 a 105); d) a pagar juros moratórios, à taxa legal civil e até efetivo e integral pagamento: 1) - desde a data de citação sobre o capital das verbas peticionadas na alínea a); 2) - desde a data do acórdão da 1.ª instância (que determinará o valor atualizado dos danos patrimoniais futuros e não patrimoniais reportado a essa data), sobre o capital das verbas peticionadas nas alíneas b) e c). Para tanto alegou, em súmula, que quando participava numa prova de pesca desportiva de rio, organizada pelo Município de Santo Tirso e pela Sociedade Recreativa Rebordoense, foi varado por uma descarga elétrica de alta voltagem, proveniente de cabos elétricos existentes por cima do lugar de pesqueiro atribuído ao Autor. Em consequência, o Autor sofreu graves lesões, que implicaram o seu internamento hospitalar, daí decorrendo múltiplos danos não patrimoniais e também patrimoniais. 2 - A Ré EDP contestou, pugnando no essencial pela improcedência da ação, ao dizer que o acidente se deveu a culpa das organizadoras do evento e do próprio Autor, impugnou a generalidade dos danos invocados pelo Autor e invocou que, da sua parte, cumpriu com todas as regras de segurança exigidas. 3 - Foi requerida, pelo Autor, a intervenção principal provocada, pelo lado passivo, do Município de Santo Tirso e da Sociedade Recreativa Rebordoense (fls. 194), foram os mesmos admitidos a intervir nos autos nessa qualidade (fls. 224-225); e, após, deduziram contestação, na qual declinaram qualquer responsabilidade pela ocorrência do acidente, impugnaram a generalidade da factualidade alegada pelo Autor e requereram a intervenção principal provocada, pelo lado passivo, da seguradora “Allianz” (Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A.), para a qual foi transferida a responsabilidade civil decorrente da realização da prova, e a intervenção acessória da seguradora “Lusitânia” (Lusitânia – Companhia de Seguros, S. A.), para a qual o Réu ...... transferiu a sua responsabilidade civil, pelo que pretende assegurar o seu direito de regresso contra a mesma, caso venha a ser condenado nos autos. 4 - Foram admitidas tais intervenções (fls. 278-279). A Lusitânia deduziu contestação, na qual impugnou toda a factualidade alegada pelo Autor na petição inicial. Por seu turno, a Allianz alegou as limitações da cobertura do seguro que subscreveu com a ... e impugnou a generalidade dos factos invocados pelo Autor na petição inicial. * 5 - ... os autos e uma vez realizada a audiência final, veio a ser proferida a respetiva sentença que assim decidiu: “julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: III.a) Condena-se a Ré EDP Distribuição – Energia, S. A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 31.519,65 (trinta e um mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação desta sentença quanto ao montante de € 31.500,00 (trinta e um mil e quinhentos euros), até integral pagamento; III.b) Absolvem-se a Ré EDP Distribuição – Energia, S. A. e os Intervenientes Principais Município de Santo Tirso, Sociedade Recreativa Rebordoense e Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A. do demais peticionado pelo Autor”. 6 - Inconformados, o A. e a Ré EDP interpuseram, cada um deles, recurso de apelação e apresentaram as correspondentes alegações, sendo decidido pelo Tribunal da Relação do Porto: “Pelo exposto, acordamos em julgar a apelação da R. totalmente improcedente e a do A. parcialmente procedente e, consequentemente, alteramos a sentença recorrida no que respeita à quantia global da indemnização que passa a ser de €56.519,65 (cinquenta e seis mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação da decisão quanto ao montante de €56,500,00 (cinquenta e seis mil e quinhentos euros), até integral pagamento. No mais, vai a mesma confirmada, nos seus exatos termos”. * Novamente inconformados, com o decidido pela Relação, interpõem recurso de Revista para este STJ, o A. e a R. e, formulam as seguintes conclusões: Recurso de Revista do Autor AA: Conclui este recorrente: “1.ª O douto acórdão da Relação do Porto, peça processual brilhante, confirmou, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente (aliás, exactamente igual), a decisão proferida pelo Tribunal da ... quanto à questão de direito da responsabilidade da Ré EDP: sobre isso não se admite já a revista, nem se admite sobre o montante mínimo arbitrado na 1.ª Instância que a Relação confirmou e aumentou – mas admite-se a revista sobre a decisão quanto a esse aumento (isto é, só do valor fixado na 1.ª Instância para cima) e admite-se quanto à decisão da matéria de facto em que se fundamenta o juízo de discordância quanto à insuficiência do montante fixado na Relação. 2.ª De feito, o apelante imputara à sentença vícios decisórios, consubstanciados na não consideração como provados de determinados factos que o deveriam ter sido, o que, na sua perspectiva, influi na decisão de direito sobre o montante indemnizatório: porque esses vícios (decorrentes da violação de preceitos de natureza adjectiva) na reapreciação da matéria de facto foram invocados, pela primeira vez, na Relação do Porto, jamais sobre os mesmos poderá haver dupla conforme, que visa impedir a terceira decisão sobre certa questão: como é óbvio, sobre a questão da reapreciação da matéria de facto pela ... nunca se pronunciou, pelo que, sobre isso, não houve dupla (conforme ou desconforme) decisão e não ser admitido que outra instância se pronunciasse sobre essa reapreciação seria, isso sim, violador de um protuberante princípio processual, o do duplo grau de jurisdição. (Quanto ao recurso da matéria de facto:) 3.ª Nos termos do disposto na 2.ª parte do n.º 3 do artigo 674.º e no n.º 2 do artigo 682.º do CPC, e sucintamente, o Supremo Tribunal de Justiça (só, mas muito) pode decidir alterar a decisão em matéria de facto se verificar que o Tribunal da Relação decidiu: i) com ofensa de qualquer norma legal de índole probatória; ii) com alguma ilogicidade; ou iii) partindo de factos não provados. 4.ª O modelar acórdão da Relação do Porto deu como verificados vícios da sentença na fixação da matéria de facto provada, decorrentes de ofensa das normas legais de índole probatória, e, em consequência, alterou a decisão quanto à maior parte dos factos sobre que incidiu a apelação: acontece que os fundamentos para tal alteração (aditamento de factualidade ao elenco dos factos provados), que subscrevemos na íntegra, impunham que fosse também alterada a decisão quanto a outros factos e acrescentados os mesmos ao rol dos provados. 5.ª Com base na mesma fundamentação que presidiu à alteração quanto a determinados pontos de facto (a maior parte) não poderia ser recusada a alteração quanto a alguns dos outros (a menor parte) – nisso radica a ilogicidade: o que valeu para o mais não valeu para o menos (conclusão que nos parece ilógica porque contradizente da máxima argumentativa a maiori ad minus), sendo que apenas trazemos em revista a alteração de três desses factos, com arrimo aos concretos meios probatórios discriminados neste recurso para cada um desses factos (no capítulo I.4 e 5.), para os quais se remete, devendo a passar a integrar a materialidade provada os seguintes factos que o douto acórdão da Relação deu como não provados: i) - O Autor sente dores na mudança do tempo (Facto n.º 92); ii) - Devido ao acidente, o Autor deixou de ter capacidade física para conduzir camiões (Facto n.º 97); iii) - O Autor necessita de colocar loção corporal (pomada), duas vezes por dia, para amaciar e hidratar a zona das feridas, gastando cerca de 800 ml por mês (Facto n.º 100), sobre o que depôs com perfeito conhecimento de causa a testemunha BB: (14:16) Testemunha: Ainda hoje continuamos a gastar o dinheiro que de, de uma pomada que ele põe, gasta dois boiões por mês e anda à volta de 19 euros. (14:27) Mandatário do Autor: E que boiões são, Dona BB? (14:29) Testemunha: São uns boiões de ..., ... de 400 mililitros. (14:34) Mandatário do Autor: É para quê? São… São… (14:36) Testemunha: É para hidratar a pele. Tem que pôr duas vezes por dia, que é para… (14:41) Mandatário do Autor: Costumam colocar quantas vezes por dia? (14:43) Testemunha: Duas. (14:44) Mandatário do Autor: E gastam em média quantos por mês? (14:46) Testemunha: São dois boiões de 400 mililitros. (14:49) Mandatário do Autor: Dois boiões de 400 mililitros… Eh… E continuam? (14:55) Testemunha: Continuamos. (14:58) Mandatário do Autor: Eh… (14:59 a 15:17) Testemunha: Sim, porque ele tem dias que, que tem a pele fica, mesmo ele (imperceptível) tem alturas em certos sítios onde ele foi cosido ou que lhe fizeram aqueles enxertos, onde a pele está mais unida e ela pra hidratar tem que se lhe pôr mesmo porque senão ele não se consegue mexer. (Quanto ao recurso da aplicação do direito: i) - improcedência do pedido de indemnização pelo dano patrimonial das despesas com a pomada; ii) - insuficiente quantificação compensatória dos danos não patrimoniais (quantum doloris, dano estético e outros danos morais; iii) - não apreciação do pedido recursório acerca da insuficiente quantificação indemnizatória do dano biológico.) Dano patrimonial: 6.ª: Ipso facto da alteração da decisão para provado do quesito n.º 100 (item iii) da conclusão anterior), considerando que a esperança média de vida de um homem português com 59 anos (feitos no dia anterior à electrocussão!) em 2011/2013 era de 21,8 anos (cfr. Tabela Completa de Mortalidade para Portugal 2011-2013 (Homens), publicada pelo INE), e que 800 ml mensais correspondem a 2 boiões de 400 ml (sendo que, nos termos do facto provado n.º 58, está assente que cada boião custava €: 19,65), o Recorrente tem direito a reclamar uma verba de €: 10.280,88 (24 boiões de €: 19,65 x 21,8 anos), a título indemnização do dano patrimonial consistente nos gastos expectáveis decorrentes da necessidade de colocar pomada duas vezes por dia, sem contar com a inflação e o natural aumento do preço dessa loção corporal. Danos não patrimoniais (sem incluir o dano biológico): 7.ª A decisão da 1.ª Instância laborou num erro seminal, que contaminou todo o seu raciocínio subjacente à fixação do valor compensatório dos danos não patrimoniais, porquanto, apesar de ter autonomizado (e bem) o dano biológico, não desdobrou as vertentes que integram os danos não patrimoniais lato sensu, concretamente, o quantum doloris, o dano estético e os demais danos não patrimoniais (incluindo prejuízo da afirmação social, o prejuízo da saúde em geral, o prejuízo da longevidade, o prejuízo da vertente lúdica, recreativa e de lazer da sua vida), alegados na petição inicial ( artigos 31 a 105 da petição inicial, quase todos dados como provados, pois só os dos n.ºs 88 a 95 da sentença não o foram; dos quais os n.º 89, 90, 91, 93, 94 e 95 passaram a estar provados na Relação, apenas o não estando os n.ºs 88 e 92). 8.ª Data venia, a doutíssima decisão da Relação incorreu no mesmíssimo erro: apesar de ter aumentado o valor global de €: 20.000,00 para €: 45.000,00, se tivesse desdobrado e valorizado cada uma dessas vertentes (quantum doloris, dano estético e demais danos não patrimoniais) teria chegado a um valor necessariamente mais alto e mais aproximado da equidade que se impõe, pois tal exercício teria conduzido à ponderação mais criteriosa da facticidade impressionante, nalguns pontos arrepiante, que foi dada como provada, e, logo, à sua avaliação concreta e verdadeiramente equitativa, de que o valor aumentado (€: 45.000,00 dos €: 100.000,00 do pedido indemnizatório global que integra todas essas parcelas danosas) fica muito distante e tem de ser revisto em alta, por ficar muito próximo do miserabilismo compensatório de que os nossos Tribunais acentuadamente se vêm afastando (ilustrativamente, o acórdão da Relação de Guimarães, de 08.04.2019, processo n.º 344/12.9TAFAF.G1). 9.ª No que concerne ao quantum doloris (factualidade de II-B.2 supra), relevam especialmente os factos albergados nos n.ºs 31 a 38, 44, 47 e 54, já dados como provados na 1.ª instãncia (e, complementarmente, os dos n.ºs 89 e 91, entretanto dados como provados na Relação) e devem ser escrutinadas as dezenas de páginas do dossier clínico do Recorrente, bem como o relatório fotográfico (com imagens chocantes que valem bem mais do que 1000 palavras), donde se aquilata o autêntico calvário, o sofrimento, o martírio por que e passou, com dezenas de sessões de tratamentos, mudanças de penso supliciantes (com pele agarrada aos pensos, pele arrancada, deixando essas partes do corpo em carne viva), desbridamentos excruciantes, drenagens tormentosas. 10.ª Nos três casos do acórdão referenciado na 8.ª conclusão – o decidido nesse acórdão e os decididos nos acórdãos do STJ, de 26.01.2012 (processo nº 220/2001-7.S1), e de 24.4.2013, processo198/06TBPMS.C1.S1) –, para um quantum doloris de grau 5 numa escala crescente de 7 graus (em que o grau 7 representa 100%), foi sempre fixada compensação de €: 40.000,00, pelo que, para o quantum doloris do Recorrente, de grau 4 nessa escala de 7 graus, percentualmente mais reduzido em 14% (de grau 4 em vez de grau 5), a compensação proporcionalmente reduzida em 14% será de €: 34.400,00 – impondo-se o aumento da compensação equitativa, adequada ao seu quantum doloris, para o montante arredondado (por defeito) de €: 34.000,00. 11.ª No que concerne ao dano estético (factualidade de II-B.2 supra), relevam especialmente os factos albergados nos n.ºs 40 e 56, já dados como provados na 1.ª instância (e, complementarmente, o do n.º 90 entretanto dados como provados na Relação), no caso decidido no acórdão referenciado na 8.ª conclusão, o dano estético de grau 5 numa escala crescente de 7 graus foi compensado com o valor de €: 20.000,00, pelo que, para o dano estético do Recorrente, de grau 4 nessa escala de 7 graus, percentualmente mais reduzido em 14% (de grau 4 em vez de grau 5), a compensação proporcionalmente reduzida em 14% será de €: 17.200,00 – impondo-se o aumento da compensação equitativa, adequada ao seu dano estético, para o montante arredondado (por defeito) de €: 17.000,00. 12.ª No que concerne aos outros danos não patrimoniais (factualidade de II-B.2 supra), relevam especialmente os factos albergados nos n.ºs 41 a 52 e 54, já dados como provados na 1.ª instância (e, complementarmente, os dos n.ºs 93, 94 e 95, entretanto dados como provados na Relação), no caso do acórdão citado referenciado na 8.ª conclusão, a repercussão permanente nas actividades sexual, desportivas e de lazer de grau 2 numa escala crescente de 7 graus, foi compensada com o valor de €: 15.000,00 pela 1.ª Instância e de €: 9.000,00 pela Relação, mas este valor de €: 9.000,00 apenas sopesou a limitação nas actividades desportivas, de lazer e sexual, como o acórdão faz questão de sublinhar; no caso dos presentes autos, temos uma repercussão permanente nas actividades desportivas e de lazer de grau 4 (o dobro do caso do sobredito acórdão, ainda que não abrangendo a vertente sexual) e muitos outros factos que se subsumem a danos não patrimoniais: seis meses sem conseguir conduzir; três meses sem conseguir arranjar-se (designadamente para vestir e despir as calças, calçar-se e colocar as peúgas, apertar os atacadores e descalçar-se) e assegurar sozinho a sua higiene diária, levantar ou transportar pesos, agachar-se, necessitando de se ajoelhar para apanhar qualquer objecto do chão, dormir serenamente e descansar sem sobressaltos, ajudar na lide doméstica, manter-se muito tempo consecutivo sentado, dobrado sobre a barriga, tendo de dormir virado para qualquer um dos lados e vendo-se obrigado a dormir de costas ou de barriga para baixo; ter deixado de conseguir fazer footing, de jogar futebol com os amigos, de praticar cicloturismo (bicicleta de estrada e BTT); ter ficado profundamente abalado e emocionalmente fragilizado, tendo-se tornado um homem nervoso, irritadiço; ter-se tornado uma pessoa introvertida, descarregando a sua frustração naqueles que o rodeiam. 13.ª Portanto, comparativamente com o caso desse acórdão, ao dobro do grau (2 para 4) proporcionalmente corresponderia o dobro do valor indemnizatório (€: 18.000,00), mas: de uma banda, a benefício da qualidade de vida do Recorrente há a relevar a questão da actividade sexual; da banda oposta, em prejuízo dessa qualidade de vida há a considerar os demais danos não patrimoniais supra aludidos – vantagem e desvantagem comparativas que praticamente se anulam, admitindo-se, todavia, um factor correctivo pela relevância da vida sexual, embora atenuado pelas limitações naturais inerentes à idade do Recorrente, o que fará situar a equidade do juízo compensatório em valor na ordem dos €: 15.000,00. 14.ª Portanto, atendendo a que o juízo de equidade na determinação do montante que compense todos os danos não patrimoniais concretamente sofridos pelo Recorrente terá necessariamente de se computar num valor global que contemple as «parcelas integrativas do mesmo» (segundo a formulação empregada no acórdão do STJ, apud decisão judicial transcrita na alínea A) do ponto 3 do capítulo IV da motivação), o montante de €: 45.000,00 arbitrado no professoral acórdão da Relação do Porto continua a ser a tradução pecuniária de uma abordagem minimalista, devendo ser determinado o aumento desse montante para os €: 66.000,00 (ut supra, conclusões 10.ª, 11.ª e 13.ª). Dano biológico: 15.ª Na sua apelação (conclusões 17.ª a 19.ª), o Autor suscitou a questão do aumento do montante da indemnização (de €: 11.500,00 para €: 22.500,00) pelo dano biológico – mas o doctíloquo acórdão da Relação (que só se pronunciou sobre o aumento do montante da indemnização pelos danos não patrimoniais a que respeitam as 20.ª a 28.ª conclusões da apelação) que se não se pronunciou sobre essa questão, com os efeitos da 1.ª parte da alínea d) do artigo 615.º do CPC, em que se funda o presente recurso (2.ª parte do n.º 4 do artigo 615.º e alínea c) do n.º 1 do artigo 674.º do CPC) – o que expressamente arguimos, com vista ao respectivo suprimento. 16.ª Quanto ao dano biológico (de que o Autor peticionou indemnização de €: 90.000,00), a douta sentença, começando por professar entendimento acertado acerca da sua qualificação jurídica, autonomia e ressarcibilidade, acaba afastando-se do juízo de equidade que concretamente se impõe para conferir expressão pecuniária a tal entendimento, arbitrando indemnização de cariz simbólico no montante de €: 11.500,00 (para lesado com 59 anos e Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 4 pontos, compatível com exercício da actividade habitual, mas que implica esforços suplementares), a qual fica muitíssimo aquém do que a equidade exige, conforme se afere, comparativamente, do caso decidido no acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de 30.05.2019 (processo n.º 1760/16.2T8VCT.G1), e com os dois casos nele sopesados. 17.ª Com efeito, no caso do acórdão do STJ, de 16.06.2016, para um lesado com 40 anos e Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 6 pontos, foi fixada indemnização de €: 25.000,00: o Recorrente tinha mais 19 anos, mas também tem mais 25% (2 pontos, de 6 pontos para 8 pontos) de défice funcional, e foi-lhe atribuída indemnização 13.500,00 mais baixa (a indemnização dessoutro processo foi quase 120% superior!); no caso do acórdão do STJ, de 06.12.2017, para uma lesada com 31 anos e Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 2 pontos, foi fixada indemnização de €: 20.000,00: o Recorrente tinha mais 28 anos (47%), mas também tem mais 300% (6 pontos, de 2 pontos para 8 pontos) de défice funcional, e foi-lhe atribuída indemnização 8.500,00 mais baixa (a indemnização dessoutro processo, onde o défice funcional era inferior em 300%, foi quase 75% superior!); no caso sob apreciação no acórdão da Relação de Guimarães, de 30.05.2019, confirmou-se, para lesado com 48 anos e Défice Funcional Permanente da Integridade Físico-Psíquica de 4 pontos, compatível com exercício da actividade habitual, mas implica esforços suplementares, o valor fixado na 1.ª Instância, de €: 15.000,00: o Recorrente tinha mais 11 anos (22%), mas também tem mais 100% (4 pontos, de 4 pontos para 8 pontos) de défice funcional, e foi-lhe atribuída indemnização 3.500,00 mais baixa (a indemnização dessoutro processo, onde o défice funcional era inferior em 100%, foi mais de 30% superior!). 18.ª No caso dos presentes autos, será equitativo rever em alta a indemnização a que o Recorrente tem direito a título do seu dano biológico, em valor superior ao de €: 15.000,00 fixado no do acórdão da Relação de Guimarães, de 30.05.2019 (pois o Recorrente tem pouco mais de um 1/5 da idade do lesado nesse caso, mas tem o dobro de défice funcional) e próximo do valor de €: 25.000,00 fixado pelo STJ no acórdão de 16.06.2016, eventualmente a meio termo entre esse e o de €: 20.000,00 fixado no acórdão de 06.12.2017, fixando-se o mesmo em €: 22.500,00. Nestes termos, com o avisado aprimoramento que só os COLENDOS CONSELHEIROS professoralmente saberão dotar, como é de Vosso dom e mester, dirimindo as questões ut supra com a sobriedade almejada e a sabença reconhecida, deverá ser concedida a revista – fixando-se (em €: 10.280,88) a indemnização pelo dano patrimonial consistente nos gastos expectáveis decorrentes da necessidade de colocar pomada duas vezes por dia até ao final do tempo da esperança média de vida do Recorrente; apreciando-se a questão (que ficou por conhecer no douto acórdão da Relação) do aumento (para €: 22.500,00) do montante de €: 11.500,00 da indemnização a título do dano biológico; e revendo-se em alta (para €: 66.000,00) o montante compensatório de €: 45.000,00 fixado a título de todos os danos não patrimoniais –, com o que V. Ex.ªs, ponderada e atiladamente, exercerão a acostumadamente mais cristalina, depurada, criteriosa, serena e sã JUSTIÇA”. Responde a Ré EDP e, conclui: “… deve a revista a que se responde ser rejeitada, por não admissível ou, sem prescindir, ser julgada totalmente improcedente, com as legais consequências”. Recurso da Ré EDP DISTRIBUIÇÃO – ENERGIA, S.A... Conclui esta recorrente: “B1 a B16 (matéria respeitante a fundamentar a admissão da revista excecional) B17. Assente que está a excepcionalidade da presente revista ao abrigo do art. 672º-1, als. a) a c): o Tribunal a quo entendendo que no caso está em causa um dano resultante da actividade distribuição de energia eléctrica, não por um dano resultante da própria instalação e, ainda, que o alegado pela EDP quanto ao estado da conservação da instalação e à sua conformidade com as regras técnicas não releva para excluir a sua responsabilidade” omitiu pronúncia acerca do recurso interposto da matéria de facto, incorrendo em nulidade. B18. Na verdade, foram incorrectamente julgados. - Dos factos não provados: 107) O Autor aceitou o regulamento da prova, com o teor que consta do documento junto a fls. 247-247v, que se dá aqui por integralmente reproduzido. 108) As canas de pesca carbono têm a menção da proibição da sua utilização junto às redes eléctricas. 109) Todos os praticantes de pesca desportiva, incluindo o Autor, sabem que é proibido praticar pesca desportiva junto às redes eléctricas, sobretudo utilizando canas de carbono dada a sua condutibilidade. 111) Caso o ......, a a S... ou os participantes na prova tivessem verificado as condições de segurança para a prática de pesca desportiva em termos de segurança, antes da prova, esta não se teria iniciado e ter-se-ia evitado o acidente. 112) Na ocasião do sinistro, a cana de pesca utilizada pelo Autor tinha um comprimento superior a 10 metros. B19. Impunha-se que se desse o facto 107) como provado dado que o mesmo resulta da factualidade provada em 7) a 9), tendo por referência os depoimentos prestados pelas testemunhas CC, DD, EE, FF, GG, HH e II, conjugados com os documentos junto a fls. 29, 244v-248, 359, 537, 541-551, 567-572, 616 e 628, que o A., na ocasião do sinistro, se encontrava a participar numa prova de pesca desportiva. B19. (repetida a numeração) Isto é, se o A. participava na referida prova de pesca era porque, necessariamente, aceitava o regulamento da mesma. Isto é, a partir do momento em que se inscreveu e, principalmente, a partir do momento em que iniciou a prova desportiva aceitou o regulamento e as regras inerentes à boa prática desportiva. B20. Impunha-se que se desse como provado o facto 108) por força das declarações prestadas pela testemunha II (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 10 de Janeiro de 2020 com início às 16:22 e fim às 17:17 22, gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...), o qual, peremptoriamente afirmou que as canas de carbono têm um aviso de proibição de utilização junto de redes eléctricas. B21. Também o facto 109 devia ser dado como provado atendendo ao documento junto a fls. (210-210v), às declarações da já identificada testemunha II (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 10 de Janeiro de 2020 com início às 16:22 e fim às 17:17 22, gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...) – das quais resulta que qualquer pescador de pesca desportiva sabe (ou tem essa obrigação) que é proibido pescar junto a redes eléctricas, tanto para mais utilizando canas de carbono em virtude da sua alta condutibilidade de energia eléctrica – e, ainda, considerando que o A., à data do sinistro tinha 59 anos (cfr. 30)) e era imputável; era atleta federado (cfr. 67)); dedicava-se à pesca desportiva há cerca de três anos (cfr. 68)); viu os postes eléctricos e os cabos eléctricos no pesqueiro onde se encontrava (cfr. 69)); é proibida a pesca desportiva a menos de 40 metros da prumada das linhas eléctricas (cfr. 71) e documento de fls. 210-210v); o A. tinha conhecimento que a cana de pesca era de carbono e extensível com comprimento de até 13 metros (cfr. 74) e 75)); as regras do bom senso e da experiência comum; B22. Considerando os factos provados sob 11), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 21), 25), 26), 27), 65), 69), 71), 72), 73), 74), 75), 76), 79), 83), o doc. de fls. 210-210v) e as declarações da testemunha II, depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 10 de Janeiro de 2020 com início às 16:22 e fim Às 17:17 22 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ..., sempre deveria o facto 111) ser dado como provado. B23. Com efeito, atendendo que tanto o Município como a ... foram as entidades dinamizadoras e do concurso de pesca desportiva e, por outro lado, que a EDP nada sabia sobre a existência do pesqueiro e / ou da realização da prova de pesca desportiva debaixo das linhas de MT, recaía sobre elas um especial dever de cuidado de verificação das condições de segurança para a prática de pesca desportiva, dever esse que não verificaram. B24. Mas, igualmente recaía sobre o A., pessoa maior, imputável, experiente e federado o cuidado de verificar as condições de segurança e de, perante a sua inobservância por parte das entidades organizadoras, recusar participar na prova ou, pelo menos, recusar-se a tomar assento naquele pesqueiro. B25. Considerando que: no momento em que se deu a descarga eléctrica, o A. segurava uma cana de pesca de carbono – 11) – e que essa descarga ocorreu entre os apoios 29 e 30 da linha – 21); (23) O apoio 29 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: R32-15,4; altura total: 15,4 metros; altura útil: 12,37 metros; fixação: amarração reforçada; tipo armação: TAN; (24) O apoio 30 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: H-12,7; altura total: 12,7 metros; altura útil: 9,04 metros; fixação: rígidos verticais duplos; tipo armação: TAN.; (25) Junto à margem onde se encontrava o apoio 29, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, nas condições mais desfavoráveis, era de cerca de 12 metros; (26) Em todo o vão, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, em condições mais desfavoráveis, situava-se na proximidade do apoio 30 e era de cerca de 9 metros; (27) Os condutores passavam sobre o ... a cerca de dez metros de altura; (28) Na data do sinistro, a montante, a linha encontrava-se dotada de protecções ao nível do painel de média tensão e ao nível do barramento de média tensão, sendo esta uma protecção de reserva; (73) A distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à rede eléctrica era inferior a 13 metros; (74) As canas de pesca desportiva em carbono são extensíveis com um comprimento de até 13 metros; Ainda, que: (79) Para haver descarga eléctrica proveniente de uma linha eléctrica de 15 kV, não sendo necessário tocar na linha, impõe-se que o objecto condutor se aproxime da mesma a uma distância inferior a 15 centímetros; E, por fim, como infra se defenderá, a distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à linha eléctrica era superior a 10 metros, a cana de pesca utilizada pelo A. tinha necessariamente que ter um comprimento superior a 10 metros pelo que deve o facto 112) ser dado como provado. B26: Ainda: impunha essa decisão, as fotos juntas pela R. EDP ao processo em 13.06.2016, coadjuvadas pelas explicações dadas pelas testemunhas JJ (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:54 e fim às 12:20 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ... ) e LL (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 14:07 e fim às 14:27 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...). B27. Acresce que, atendendo ao acervo probatório constante dos autos, por compreender alegações de factos essenciais às pretensões das partes, designadamente da aqui R. / recorrente, deveria ainda ter sido dada como provada a seguinte matéria alegada na sua contestação: 6, 7, 10, 12, 13, 14, 16, 23, 26, 33, 41, 42, 43, 45, 48, 49, 50, 51, 53, 54, 55, 57, 59, 59, 60, 61, 62, 63, 69, 83, 84 B28: Os factos: 6, 7, 10, 12, 14, 16 deveriam ter sido apreciados pelo Tribunal a quo dado que, no caso vertente, está em causa a responsabilidade da R. e, não obstante esta exercer uma actividade perigosa a presunção de culpa que sobre ela recai pode ser ilidida se o agente provar que tomou todas as providências que, segundo a experiência comum, são adequadas a evitar o perigo. B29: E, em relação à prova da transcrita factualidade e que impunha decisão no sentido de se considerar provada a mesma: documento junto sob doc 1 junto com o requerimento da R. que deu entrada em juízo a 18.12.2014, depoimento de parte do representante da R. MM, depoimento prestado na sessão de julgamento que teve lugar no dia 12 de Junho de 2019 com início às 14:43 e términus às 15:22, gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ... e, ainda, as declarações das testemunhas NN (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:27 e fim às 11:52 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...), JJ (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:54 e fim às 12:20 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...), OO (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 12:23 e fim às 12:31 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...) e LL, depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 14:07 e fim às 14:27 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...). B30. Efectivamente, do acervo probatório invocado na conclusão que antecede, resulta que a Ré, cumprindo o ónus probatório que lhe competia, logrou comprovar que a rede eléctrica de onde proveio a descarga eléctrica beneficiou de licenças de estabelecimento prévia à construção; tal rede eléctrica foi construída em conformidade com o projecto aprovado e, após vistoria, obteve licenças de exploração; a referida rede eléctrica é alvo de acções de verificação e manutenção regulares pela EDP Distribuição e é vistoriada pelo menos uma vez por ano, tendo assegurado e confirmado tais vistorias as boas condições de exploração da rede eléctrica. B31. Dessarte, devem os referidos factos ser dados como provados. B32: Factos 13 e 23: Estes factos são uma decorrência natural daquele dado como provado sob 20 e, ainda, daqueles sob 6, 7, 10, 12, 14 e 16 cujo aditamento à matéria de facto se defende (e para cuja argumentação se remete, por razões de economia processual), pelo que devem os mesmos ser dados como provados. B33. Factos 26, 33, 57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 69, 83 e 84: talqualmente aqueles referidos ut supra, impunha-se que sobre eles o Tribunal a quo se pronunciasse atenta a sua relevância para a justa composição do litígio dado que aludem ao bom funcionamento da rede no momento do sinistro e a resposta adequada que teve perante este e, provados que estejam – e estão, conforme decorre do acervo probatório invocado – são aptos a excluir a responsabilidade da R. EDP, nos termos que infra (em sede de apreciação do julgamento de direito) se discorrerá. B34. A prova deste grupo de factos ancora-se quer nos gráficos constantes da contestação – os quais são verdadeiros documentos que reproduzem a análise técnica do comportamento da rede perante o sinistro – quer no depoimento de parte do legal representante da R. EDP (MM, depoimento prestado na sessão de julgamento que teve lugar no dia 12 de Junho de 2019 com início às 14:43 e términus às 15:22, gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...) quer, ainda, nas declarações das testemunhas NN (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:27 e fim às 11:52 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...), JJ (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:54 e fim às 12:20 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...), OO (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 12:23 e fim às 12:31 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...) e LL (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 14:07 e fim às 14:27 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...). B35. Resulta, pois, do conjunto da prova invocada o total desconhecimento da EDP no que se refere à existência do pesqueiro, quer porque construído depois da colocação das linhas eléctricas quer por que construído sem o seu conhecimento e assentimento quer porque nunca o Município comunicou tal facto (65)) quer porque a plataforma de madeira que se consubstanciava no referido pesqueiro não estava como tal marcada. Também é cristalino que a EDP desconhecia a realização da prova de pesca e da ocorrência do sinistro (neste sentido, para além da prova supra, vide factos 66), 77), 78)), o qual só chegou ao seu conhecimento através dos meios de comunicação social, no dia seguinte ao sinistro. Mais: B36. A actuação da EDP, após o conhecimento da ocorrência, também se assoma clara da análise da referida prova: enviou técnicos ao local, tendo-se constatado que as linhas estavam regulamentares, em bom estado de conservação e que tinham reagido de forma óptima à descarga eléctrica (a este respeito é pertinente ter em consideração os gráficos constantes da acusação que reproduzem o comportamento da linha e que foram confirmados através do depoimento de parte e do depoimento das mencionadas testemunhas). B37. Ante o exposto, deveriam os factos em epígrafe ser todos dados como provados. B38. Factos 41, 42, 43, 45, 48, 49, 50, 51, 53, 54, 55: Também estes factos deveriam ter sido apreciados pelo Tribunal a quo dado que, comprovados, responsabilizam quer o ...... quer a ... pela ocorrência do sinistro. B39. O facto 45. é consequência natural daqueles dados como provados na sentença sob 11), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 19), 22), 23), 24), 25), 26, 27), 65), 69), 70), 71), 72), 73), 74), 75), 76), 79). B40. Por outro lado, não reunindo, o mencionado local, condições para o exercício da pesca desportiva ao permitir-se, pior, ao dinamizar-se e organizar-se um evento de pesca desportiva naquele local adoptou-se uma postura temerária, ou seja, quer o Município quer a ... actuaram conformando-se com a possibilidade de o participante colocado debaixo da linha eléctrica, no caso, o A., poder tocar nas linhas de MT e ser electrizado e / ou mesmo electrocutado. B41. Mas, também o próprio participante, que, mesmo sendo visível o perigo, aceitou tomar lugar no pesqueiro sobrepassado das linhas eléctricas se conformou com a possibilidade de ser electrizado / electrocutado. B42. Dessarte, considerando o exposto e, ainda, atentando aos depoimentos de CC, depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 10:01 e fim às 10: 28, gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ..., DD, depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no 25 de Novembro de 2019 com início Às 10:29 e fim às 11:03 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ... e a carta junta com o requerimento da EDP de 13.09.2016, também os demais factos – 41, 42, 43, 48, 49, 50, 51, 53, 54 e 55 – têm que ser dados como provados. B43. Deve, ainda, ser aditada à matéria de facto provada aquela que se passa a transcrever: A distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à rede eléctrica era superior a 10 metros. B44. Esta factualidade resulta, para além dos factos dados como provados sob 23), 24), 25), 26), 27) do depoimento de parte prestado pelo legal representante da R. e, ainda, das declarações prestadas pelas testemunhas JJ (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 11:54 e fim às 12:20 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...) e LL (depoimento prestado em sessão de julgamento que teve lugar no dia 25 de Novembro de 2019 com início às 14:07 e fim às 14:27 gravado em suporte digital no aplicativo "...", ficheiro ...). Vejamos: B45: Nos termos da alínea c) do artigo 640.º do CPC, devem ser aditados aos factos provados, os que se passam a indicar: A) O Autor aceitou o regulamento da prova, com o teor que consta do documento junto a fls. 247-247v, que se dá aqui por integralmente reproduzido. B) As canas de pesca carbono têm a menção da proibição da sua utilização junto às redes eléctricas. C) Todos os praticantes de pesca desportiva, incluindo o Autor, sabem que é proibido praticar pesca desportiva junto às redes eléctricas, sobretudo utilizando canas de carbono dada a sua condutibilidade. D) Caso o Município de Santo Tirso, a a Sociedade Recreativa Rebordoense ou os participantes na prova tivessem verificado as condições de segurança para a prática de pesca desportiva em termos de segurança, antes da prova, esta não se teria iniciado e ter-se-ia evitado o acidente. E) Na ocasião do sinistro, a cana de pesca utilizada pelo Autor tinha um comprimento superior a 10 metros. F) A referida linha foi construída de acordo com os regulamentos em vigor e em obediência às melhores regras de arte. G) A referida linha encontra-se licenciada, beneficiando, nomeadamente, de licença de estabelecimento. H) Assim, a linha a 15kV, ... - ..., sofreu, nomeadamente, as seguintes acções de manutenção: Ano 2010 Inspecção Termográfica – executada em 25 Agosto 2010; Limpeza de Faixa protecção - executada em Agosto 2010 Manutenção Preventiva Condicionada – efectuado abate árvores grande porte entre Ap 13 e 17; Manutenção Preventiva Condicionada – efectuada Substituição condutores e isolamento ramal ...; Manutenção Correctiva - reparação de condutores; Ano 2011 Limpeza de Faixa protecção – executada em Fevereiro 2011; Manutenção Preventiva Condicionada – efectuada em Maio Manutenção ao Seccionador 63 no ramal ...; Ano 2012 Manutenção Preventiva Condicionada – efectuada Substituição isoladores AP2 no ramal .... Ano 2013 Limpeza de Faixa protecção – executada em Maio 2013 no ramal ...; Manutenção Correctiva – reparação condutor no ramal ...; I) As acções de manutenção d surgiram na sequência do acompanhamento que foi feito à linha e de vistorias totais ou parciais da linha. J) A inspecção termográfica verificou que a linha se encontrava em boas condições de exploração K) A linha no vão em causa apresentava-se, à data do sinistro, construída de acordo com as boas regras de arte, em bom estado de conservação e funcionamento, cumprindo as distâncias mínimas de segurança estabelecidas regulamentarmente. L) As vistorias efectuadas e as acções de manutenção asseguraram a exploração da linha em condições de segurança para pessoas e bens e em respeito pelos regulamentos em vigor. M) A rede eléctrica, bem como a sua exploração, eram seguras para pessoas e bens. N) À data do sinistro a pista de pesca existia sem que a EDP soubesse da sua existência e à sua revelia. O) A Ré desconhecia na ocasião a existência, quer da pista de pesca no local, quer a iniciativa desportiva em que ocorreu o sinistro. P) A EDP teve conhecimento da existência do sinistro pelos meios de comunicação social, nomeadamente pelo jornal. Q) Ao tomar conhecimento do sinistro, logo no dia seguinte fez deslocar ao lado o técnico JJ, a fim de verificar as condições de exploração da rede. R) No local verificou que o vão em causa se encontrava de acordo com o perfil junto. S) O mencionado JJ mediu a distância ao solo dos condutores da rede eléctrica, tendo verificado e medido a distância de doze metros T) De seguida, a EDP procedeu à análise técnica do comportamento da rede perante o sinistro. Assim, a) Às 11:21h (09Jun), registou-se em ... informação de arranque da função protecção de terras resistentes (PTR) da saída ... que normalizou passados cerca de 500ms. Juntamente com esta informação, também se registou o alarme/repouso das PTR das saídas ... e Arco. b) Não se identificou qualquer sinalização de arranque do ... associado ao barramento respectivo. c) Analisados os oscilogramas da saída .... Tensões de Barras 1 de 15kV e F.... Correntes da linha ... d) caracteriza-se o defeito eléctrico como sendo ..., resistivo com medida de corrente nos primeiros instantes da ordem dos 25A. Impacto na tensão desprezável. e) Do ponto de vista eléctrico não houve alteração significativa das grandezas corrente e tensão, havendo inclusivamente uma auto-extinção do suposto arco eléctrico pelo qual se estabeleceu a ruptura do isolamento (ar) entre a fase L 1 e a terra (eventualmente cana/corpo). U) As protecções encontravam-se aptas a funcionar em conformidade com o estabelecido regulamentarmente, razão por que a linha reagiu adequadamente perante o sinistro. V) Após intervenção ATOM, verificou-se via ensaios, que o sistema de protecção da cela da ... funcionou conforme esperado, não tendo qualquer anomalia, estando em boas condições de funcionamento. W) A distância da linha do solo era bem superior a 6 metros cumprindo, dessa forma, as distâncias mínimas regulamentares. X) Previamente à execução da modificação, a Ré verificou as condições de estabelecimento e exploração da linha, incluindo o vão em causa, tendo confirmado que a mesma estava construída e em funcionamento de acordo com as melhores regras de arte. Y) No vão onde ocorreu o sinistro a linha mantinha as supra descritas características que constam do perfil e as mesmas protecções encontravam-se em bom estado de conservação. Z) Ao criar e promover condições para a prática da pesca desportiva junto à rede eléctrica, o ...... contribuiu com culpa para a ocorrência do sinistro. AA) O Município e a Sociedade Recreativa ao organizaram e dinamizarem um torneio de pesca desportiva junto à rede eléctrica contribuíram com culpa para a ocorrência do sinistro. BB) Os participantes, incluindo o A., ao aceitarem competir num torneio de pesca desportiva junto à rede eléctrica, utilizando um pesqueiro tão próximo dessa rede, contribuíram com culpa para a ocorrência do sinistro. CC) O local não reunia as condições para prática da pesca desportiva. DD) Ora, era evidente a possibilidade de choque eléctrico no decurso da competição, tendo, quer o ......, enquanto promotor, quer a Sociedade Recreativa, exposto os atletas ao risco de choque eléctrico, transformando a competição numa actividade perigosa sujeita ao risco eléctrico. EE) Os próprios atletas, incluindo o A, expuseram-se a esse risco, aceitando intervir numa competição perigosa, exposta ela própria ao risco eléctrico. FF) O A., o Município de Santo Tirso, a Sociedade Recreativa organizadora e todos os participantes tinham a obrigação de se certificar de que existiam condições de segurança para a prática de pesca desportiva antes do início da prova. GG) Não obstante saberem da existência da rede eléctrica e do risco que a mesma comportava, conformaram-se com ele e iniciaram a prática da pesca desportiva com recurso a canas de carbono extensíveis, utilizando o pesqueiro junto à rede eléctrica. HH) Assim, o comportamento do Município, da Sociedade organizador a e do próprio A. foram determinantes para a ocorrência do sinistro. II) Caso qualquer um deles tivesse sido prudente e adoptado o comportamento ajustado teriam evitado o acidente. JJ) Sendo o acidente da responsabilidade exclusiva do Município, da Sociedade Recreativa e do próprio A. KK) A distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à rede eléctrica era superior a 10 metros. B46. O desacerto da decisão proferida pelo Tribunal a quo assenta outrossim no âmbito do direito discutido, mormente na existência de situação que exclui a responsabilidade por culpa (presumida ou efectiva) da Ré e, mesmo no âmbito da responsabilidade objectiva, a verificação de causas de exclusão, designadamente a responsabilidade por culpa de terceiro e do próprio A., sobre os quais o Tribunal da Relação nem se pronunciou. B47. A causa de pedir do A. (cfr. petição inicial) assenta na responsabilidade por culpa da R. B48. A actividade levada a cabo pela R., no mais, de distribuição de energia eléctrica, é uma actividade perigosa (é unânime a jurisprudência), donde é aplicável ao caso vertente o disposto no art. 493º-2 do CC que estabelece uma presunção legal de culpa relativamente à R. EDP, cabendo-lhe, então, provar e a fim de se eximir à responsabilidade, que não teve culpa na produção do evento sofrido. B49. Ora, com relevância para esta sede resultou provado que: 19) A linha de transporte de energia eléctrica que passava sobre o local onde se encontrava o Autor integrava a Rede Nacional de Distribuição em média tensão (15 kV) e é designada por .... 20) A EDP Distribuição – Energia, S. A. realizou diversas acções de manutenção nessa linha, designadamente, inspecções termográficas, inspecções visuais, limpezas de faixa de protecção, substituição e reparação de condutores, isoladores e seccionadores. 21) A descarga que atingiu o Autor ocorreu entre os apoios 29 e 30 da referida linha. 22) Tratava-se de uma linha em cobre de 70mm2, com tracção 8.00 daN/mm2. 23) O apoio 29 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: R32-15,4; altura total: 15,4 metros; altura útil: 12,37 metros; fixação: amarração reforçada; tipo armação: TAN. 24) O apoio 30 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: H-12,7; altura total: 12,7 metros; altura útil: 9,04 metros; fixação: rígidos verticais duplos; tipo armação: TAN. 25) Junto à margem onde se encontrava o apoio 29, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, nas condições mais desfavoráveis, era de cerca de 12 metros. 26) Em todo o vão, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, em condições mais desfavoráveis, situava-se na proximidade do apoio 30 e era de cerca de 9 metros. 27) Os condutores passavam sobre o ... a cerca de dez metros de altura. 28) Na data do sinistro, a montante a linha encontrava-se dotada de protecções ao nível do painel de média tensão e ao nível do barramento de média tensão, sendo esta uma protecção de reserva. 63) Em data anterior a junho de 2013, o ...... executou na margem do ... onde se encontrava o apoio n.º 29 da linha eléctrica ... - ... uma pista de pesca, construindo um pesqueiro junto a esse apoio. 64) O ...... executou a pista de pesca e construiu o pesqueiro sem disso dar conhecimento à EDP. 65) A ..., foi organizada pela ... e pelo ...... para ser realizada no dia 09-06-2013, na referida pista de pesca, junto à rede eléctrica de 15kV .... 66) Nem o Município de Santo Tirso, nem a Sociedade Recreativa Rebordense, nem qualquer dos participantes, incluindo o Autor, deram conhecimento prévio à EDP de que no local iria decorrer essa prova/concurso de pesca. 69) Os postes eléctricos e os cabos eléctricos da linha ... eram bem visíveis do pesqueiro onde o Autor se encontrava, não podendo passar despercebidos; 70) …Tendo o Autor visto tais cabos e tais postes. 71) O § único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, vigente em junho de 2013, estabelecia o seguinte: «Se o percurso for atravessado por linhas eléctricas, é interdita a marcação de pesqueiros a menos de 40 metros lineares da prumada das mesmas». 72) As canas de pesca de carbono são condutoras de energia eléctrica. 73) A distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à rede eléctrica era inferior a 13 metros. 74) As canas de pesca desportiva em carbono são extensíveis com um comprimento de até 13 metros;75) …O que era do conhecimento do Autor; 76) …E da Sociedade Recreativa Rebordoense 77) A EDP não tomou conhecimento do sinistro no dia da ocorrência. 78) O sinistro não foi comunicado à EDP Sociedade Recreativa Rebordoense ou pelo Município de Santo Tirso. 79) Para haver descarga eléctrica proveniente de uma linha eléctrica de 15 kV, não sendo necessário tocar na linha, impõe-se que o objecto condutor se aproxime da mesma a uma distância inferior a 15 centímetros. 80) Uma cana com 6 metros não permitia fisicamente a ocorrência de uma descarga eléctrica dos condutores da rede eléctrica ao solo. 83) Na sequência do acidente que vitimou o Autor, em 13-06-2013, o Município de Santo Tirso solicitou à EDP que fosse removido, com urgência, o poste existente junto à pista de pesca (apoio 29 da linha de transporte de energia eléctrica), a fim de eliminar «os problemas de segurança que efectivamente existem no desenvolvimento de atividades de pesca neste local». B50. Ou seja, a R. EDP logrou provar que respeitou todas as regras previstas no Regulamento de Segurança das Linhas Eléctricas previstas Decreto Regulamentar 1/92, de 18.02, nomeadamente no seu art. 27º-2 (factos provados 19) a 28). B51. Por outro lado, também resulta da matéria de facto assente que a construção do pesqueiro foi posterior à colocação da linha e que foi efectuada sem o conhecimento e consentimento da R. e, ainda, que a própria R., não só desconhecia a sua existência na data do sinistro como também desconhecia a realização do evento desportivo. B52. Mais: deu-se, ainda, como provado que 79) Para haver descarga eléctrica proveniente de uma linha eléctrica de 15 kV, não sendo necessário tocar na linha, impõe-se que o objecto condutor se aproxime da mesma a uma distância inferior a 15 centímetros. e, ainda que 80) Uma cana com 6 metros não permitia fisicamente a ocorrência de uma descarga eléctrica dos condutores da rede eléctrica ao solo. B53. Ou seja, a vítima para ter sido atingida pela descarga eléctrica, teve que, necessariamente, invadir a distância de segurança de 15 cm às linhas e a vítima exerceu a actividade piscatória em clara violação do ponto único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, vigente em junho de 2013, estabelecia o seguinte: «Se o percurso for atravessado por linhas eléctricas, é interdita a marcação de pesqueiros a menos de 40 metros lineares da prumada das mesmas. (71) B54. A R. EDP assegurando que o estabelecimento e a exploração das linhas eléctricas obedecia ao Regulamento de Segurança, nomeadamente com o cumprimento da distância de segurança ao solo (a distância mínima é de 6 metros e aquelas estavam a 12 metros), não tinha como evitar o acidente posto que não é suposto nem razoável admitir que alguém aproxime um objecto condutor, a menos de 15 cm de distância da linha eléctrica. B55. A EDP não podia ter evitado o acidente na medida em que a linha podia estar a qualquer altura do solo desde que superior a 6 metros mas sempre exposta, independentemente da altura, a que alguém se aproximasse dela a menos de 15 cm e, seja qual for a altura da linha, ainda que superior a 6 metros, se alguém se aproximar dela a menos de 15 cm ocorrerá inevitavelmente o choque eléctrico, uma vez que as linhas são, tal como está previsto no Decreto Regulamentar e é tecnicamente adequado, linhas de condutores nus. B56. Mas a vítima sabia que as linhas estavam lá, tal como resulta da matéria de facto provada ((69) Os postes eléctricos e os cabos eléctricos da linha ... eram bem visíveis do pesqueiro onde o Autor se encontrava, não podendo passar despercebidos; 70) …Tendo o Autor visto tais cabos e tais postes.) e ainda assim, tomou a decisão de pescar debaixo das linhas e de aproximar a cana de pesca de modo a causar a descarga. B57. Portanto, a vítima é culpada porque é temerário pescar debaixo das linhas e é, em si mesmo, uma actividade perigosa cujo resultado é evitável, mas ainda assim a vítima optou por correr, não acautelando a sua integridade física. B58. Conscientemente e enquanto pescador, numa prova profissional, violou a regra internacional de proibição de pescar dentro de área proibida, ou seja, a uma distância não inferior a 40 metros lineares da prumada das linhas eléctricas (71) O § único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, vigente em junho de 2013, estabelecia o seguinte: «Se o percurso for atravessado por linhas eléctricas, é interdita a marcação de pesqueiros a menos de 40 metros lineares da prumada das mesmas».) B59. A R., ilidindo a presunção do art. 493º-2 CC, provou que empregou todas as providências ao seu alcance exigidas pelas circunstâncias para prevenir sinistros como o dos autos, logo há-de a responsabilidade da Ré por facto ilícito ser excluída, por inexistência de culpa (presumida ou efectiva) da R. B60. E, também não poderá a R. ser responsabilizada com base no art. 509º do CC, que consagra a responsabilidade pelo risco, considerando os factos provados 7) 8), 9), 13), 14), 15), 16), 17), 18), 63), 64), 65), 66), 69), 74), 75), 76), 78), 79), 83). B61. Isto é, resulta da materialidade dada como provada que o ...... construiu ou mandou construir um pesqueiro por baixo da linha eléctrica que já aí se encontrava estabelecida, pela R. EDP de acordo com o Regulamento de Segurança, nomeadamente no que respeita à distância mínima de segurança das linhas ao solo que é de 6 metros sendo que, no caso, a EDP logrou provar que as mesmas se encontravam, pelo menos, a 12 metros de distância ao solo, o que fez sem ter acautelado previamente a modificação da linha e sem ter dado qualquer conhecimento disso à EDP que, por sua vez, desconhecia a existência do pesqueiro. B62. Por outro lado, nomeou para superintender o departamento de pesca concelhia, um seu funcionário DD o qual, em sede de audiência de discussão e julgamento demonstrou ser um mero burocrata, sem formação mínima e / ou habilitação para o exercício desse cargo. B63. A R. edilidade, para além de ter ordenado a construção de um pesqueiro debaixo de linhas eléctricas de média tensão aí existente em clara violação do já citado ponto único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva e / ou não ter solicitado a modificação do traçado da linha (como o veio a requerer após o infeliz sinistro dos autos – cfr. requerimento da EDP de 13.09.2016) como lhe era mister, não teve o cuidado de nomear para o exercício do cargo de pesca desportiva concelhia um agente conhecedor das regras desportivas de pesca, nomeadamente de segurança e, especificadamente, aquela que proíbe a prática de pesca desportiva a menos de 40 metros da prumada das linhas eléctricas (cfr. 71 factos provados), e que, conhecedor dessa proibição (por força do risco de descarga / electrocussão que implica) impedisse a realização de provas debaixo da linha eléctrica. B64. Pelo contrário, resulta demonstrado que a própria edilidade tinha um departamento de pesca desportiva e não respeitava as regras na realização de eventos, tendo promoviso a realização da prova de pesca desportiva em violação das mais elementares regras de segurança. B65. Acresce que, a própria Câmara Municipal de Santo Tirso acabou por confessar o conhecimento da insegurança no desenvolvimento da actividade piscatória debaixo do traçado da linha e, dessarte, a sua culpa quando, em carta dirigida à R. EDP após o malogrado sinistro (cfr. requerimento da EDP de 13.09.2016), vem solicitar-lhe a alteração do traçado da linha. B66. Mutatis mutandis quanto à R. Sociedade Recreativa Rebordoense, dando-se aqui por integralmente reproduzido o expendido quanto à edilidade. B67. Em suma: os comportamentos do Município e da Sociedade Rebordoense foram determinantes para a ocorrência do sinistro. Tanto as condutas culposas da edilidade como da mencionada Sociedade foram causa determinante da ocorrência do evento. B68. Mas, também a infeliz vítima contribui, e muito, para a ocorrência do sinistro, considerando que: a vítima era maior, tinha 59 anos de idade, e imputável. (29. AA (ora Autor) nasceu no dia XX/XX/1954); era pescador de pesca desportiva há pelo menos três anos. (68. E já se dedicava à pesca desportiva há cerca de 3 anos); era desportista federado. (67. Tomando como referência a data do acidente (09-06-2013), o Autor estava filiado na Federação Portuguesa de Pesca Desportiva); tinha, pois, o dever de conhecer as regras dessa prática desportiva, nomeadamente aquelas que respeitam a normas de segurança e, consequentemente, a proibição do exercício da pesca desportiva a menos de 40 metros da prumada das linhas eléctricas. (71) O § único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, vigente em junho de 2013, estabelecia o seguinte: «Se o percurso for atravessado por linhas eléctricas, é interdita a marcação de pesqueiros a menos de 40 metros lineares da prumada das mesmas». 72) As canas de pesca de carbono são condutoras de energia eléctrica.) B69. E, admitindo que o desconhecimento das regras da prática desportiva “jogasse” aqui a seu favor – o que não se concede – seguindo os padrões do homem médio, o bonus pater familiae, sempre a sua responsabilidade no sinistro persistia. Com efeito, considerando o padrão do homem médio, sempre o A., que pescava com uma cana de carbono extensível até 13 metros, num dia de tempo húmido e em que tinha chovido de noite, debaixo das linhas eléctricas, teria que ter previsto a possibilidade de ocorrência do sinistro nas condições em que ocorreu e, ainda assim detendo-se no pesqueiro em causa, conformou-se com a possível ocorrência do mesmo. B70. Considerando-se que se compreendem dentro do conceito de força maior, toda a causa exterior independente do funcionamento ou utilização da coisa e nos casos de culpa da vítima ou de terceiros, as actuações supra descritas do A., do R. Município e da R. Sociedade consubstanciam caso de força maior. B71. Na verdade, o acidente deveu-se a culpa da vítima, que ao colocar-se debaixo de linhas de tensão eléctrica a cerca de 12 metros do solo, com uma cana de pesca de carbono cujo comprimento ia até aos 13 metros actuou temerariamente e a culpa do Município e Associação que promoveram e realizaram uma competição marcando um lugar num pesqueiro que se encontrava debaixo das linhas eléctricas quando a lei assim o proíbe. B72. Vítima e terceiros, ao omitirem um dever de cuidado que conheciam e a que estavam obrigadas, contribuíram culposa e decisivamente para a ocorrência do sinistro B73. Dessarte, só pode concluir-se pela exclusão da responsabilidade objectiva, pelo risco, por parte da R. EDP e, excluídas as responsabilidades objectivas e subjectivas, a acção tinha que necessariamente improceder. B74. Responsabilizar a EDP no caso vertente seria abrir um precedente perigoso e inaceitável onde vítimas que deliberadamente se expusessem ao perigo das linhas eléctricas, e seus familiares, pudessem depois de ocorrido o sinistro pedir responsabilidade à EDP locupletando-se à custa dela. No limite, um qualquer suicídio por descarga eléctrica com origem da rede de serviço público seria da responsabilidade da distribuidora, tendo a EDP que indemnizar o suicida. B75. Ante todo o exposto, deve o acórdão proferido ser revogado e substituído por outra que absolva a R. EDP do pedido, por violador do disposto nos arts. 483º, 487º, 493º, 509º, 570, todos do CC, art. 6º do Decreto Regulamentar 1/92, de 18.02 e art. 6º do Regulamento Geral dos campeonatos nacionais de Federação Portuguesa de Pesca Desportiva. Caso a argumentação expendida não mereça provimento, o que se excogita por mera cautela de raciocínio e patrocínio: B76. O Tribunal a quo condenou a EDP a pagar ao A. a quantia de € 56.519,65, assim discriminada: € 45.000,00 a título de danos morais; € 11.500,00 a título de dano patrimonial futuro, valores excessivos face à matéria de facto provada e, ainda, aqueles que a jurisprudência vem fixando- B77. Considerando a conduta adoptada pelo A. – num dia húmido, depois de chover, colocou-se com uma cana de pesca de carbono, com comprimento que pode atingir até 13 metros, num pesqueiro em cima da água, o qual era sobrepassado por uma rede eléctrica de MT; que a instalação eléctrica estava de acordo com as normas regulamentares; à data do sinistro, o A. contava já com 59 anos de idade; não tinha rendimentos; ficou internado um mês; o período de défice funcional temporário total é de 60 dias; teve dores em grau 4/7; ficou com uma IPP de 8%.; o dano estético é de 3/7; em 2013 o valor do salário mínimo ser de € 485,00, o valor de € 11.500,00 fixado a título de dano futuro de natureza patrimonial peca por excesso. B78. Igualmente excessiva foi a indemnização arbitrada ao A., a título de danos não patrimoniais, face à matéria de facto dada como provada nesse sentido e até comparativamente com aqueles que a jurisprudência vem decidindo devendo fixar-se em valor inferior a € 10.000,00 B79. Dessarte, sempre deve a sentença recorrida ser revogada, por violadora do disposto nos arts. 494.º, 496.º, 499º e 566.º todos do Código Civil, e substituída outra que, considerando o exposto, reduza o valor das indemnizações fixadas a favor do A. NORMAS VIOLADAS: - - arts. 483º, 487º, 493º, 496º, 499º, 509º, 566º, 570, todos do CC, - art. 6º do Decreto Regulamentar 1/92, de 18.02; - art. 6º do Regulamento Geral dos campeonatos nacionais de Federação Portuguesa de Pesca Desportiva Termos em que deve dar-se provimento ao presente recurso, revogando-se o Acórdão recorrido, em conformidade com as conclusões”. Responde o Autor e apresenta as seguintes conclusões: “(I – EXTEMPORANEIDADE DO REQUERIMENTO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO.) Conclusões 1.ª a 23.ª (respeitam ao prazo de interposição e, consequente, admissibilidade do recurso). (II. A1 – (IN)ADMISSIBILIDADE DA REVISTA EXCEPCIONAL.) Conclusões 24.ª a 3.6ª (II. A2 – NULIDADE DO ACÓRDÃO RECORRIDO.) 37.ª Este capítulo, que consome mais de 2/3 da revista (pp. 17 a 108 da motivação e conclusões B.16 a B.45), não tem qualquer cabimento processual. Por várias razões – e bastaria uma. (RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL VS IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO.) 38.ª A revista excepcional incide sobre factualidade (provada e não provada) consolidada nos autos – não serve para, a pretexto/a “reboque” da questão de direito (a única que, em qualquer dos três pressupostos da admissibilidade do recurso excepcional, tem guarida processual), querer alterar tal factualidade! (RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL VS ARGUIÇÃO DE NULIDADE DO ACÓRDÃO.) 39.ª Ainda que assim não fosse, a revista excepcional não serve para apreciar nulidades do acórdão recorrido – serve para sindicar o seu mérito e nunca a sua forma; serve para a apreciação substantiva do acórdão e não para a sua apreciação adjectiva. (RECURSO DE REVISTA EXCEPCIONAL VS ARGUIÇÃO DE NULIDADE DO ACÓRDÃO RELACIONADA COM QUESTÕES DE FACTO.) 40.ª Ainda que assim não fosse, a revista excepcional não serve para, em sede de nulidade do acórdão recorrido, apreciar as nulidades decorrentes da sua apreciação de matéria de facto, pois está vocacionado exclusivamente para a questão de direito. (IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO VS ARGUIÇÃO DE NULIDADE DO ACÓRDÃO RELACIONADA COM QUESTÕES DE FACTO.) 41.ª Numa frase da pág. 19, “fugiu a boca para a verdade” à recorrente: «Na verdade, o Tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto.» 42.ª Reproduzimos as 10.ª a 16.ª conclusões: o que a recorrente pretende, com a ínvia arguição desta nulidade, não é a apreciação dessa nulidade, mas a impugnação da matéria de facto, como se o STJ fosse aqui Tribunal de 2.ª instância. 43.ª Ao longo de mais de 2/3 desta revista excepcional, reproduz o seu recurso de apelação quanto à impugnação da matéria de facto, pelo que o fulcro do recurso de revista da EDP é EXACTAMENTE IGUAL ao objecto do seu recurso de apelação: o teor das pp. 19 (desde «nestes termos») a 107 (até «Ora») da revista é a transcrição ipsis verbis do teor das pp. 5 (desde «Nestes termos») a 92 (até «A3. Erro de direito») da apelação!!! 44.ª O recurso de apelação da Ré foi julgado improcedente na impugnação da matéria de facto – e nem a revista, muito menos a revista excepcional, podem servir para tornar a impugná-la como a impugnou nesse recurso de apelação, exactamente da mesma maneira, com a mesmíssima motivação: sobretudo, no que aqui importa, não pode isso ser feito por via da arguição de uma nulidade do acórdão recorrido, muito menos quando essa arguição é feita numa revista excepcional. (NULIDADE POR OMISSÃO DE PRONÚNCIA SOBRE FACTOS EM QUE A RECORRENTE SUSTENTA A SUSCITAÇÃO DA QUESTÃO DO CASO DE FORÇA MAIOR.) 45.ª Jamais poderia haver omissão de pronúncia sobre tais factos porquanto a questão do caso de força maior não foi levantada na 1.ª instância; e, quando o foi, como questão nova, no recurso de apelação, foi-o apenas nestes termos (p. 4, última linha, da apelação da Ré): «como poderia consistir em caso de força maior» – o que fica muito aquém da exigível descrição fáctica pormenorizada de tal evento que corporizaria um caso de força maior, da sua qualificação fundamentada como caso de força maior, e o nexo de causalidade adequada da sua ocorrência para a electrocussão, 46.ª Assim sendo, não pode haver omissão de pronúncia do acórdão da Relação acerca de factos (nem sequer alegados) de uma questão não suscitada na 1.ª instância – pelo contrário, a pronúncia sobre tais factos e sobre tal questão é que traduziria a prática de uma nulidade por excesso de pronúncia! (DA NULIDADE CONCRETAMENTE ARGUIDA: OMISSÃO DE PRONÚNCIA VS PRONÚNCIA ERRADA.) 47.ª No final desse capítulo A2), a recorrente qualifica tudo quanto integra esse capítulo como «nulidade do Acórdão, por omissão, que ora se invoca, nos termos do disposto no art. 615º-1, d), ex vi art. 666º» (1.º parágrafo da pág. 108, sic), isto é, arguiu a nulidade por omissão de pronúncia quanto ao julgamento da matéria de facto, ao passo que, no início do mesmo capítulo A2), considera que «Na verdade, o Tribunal a quo errou no julgamento da matéria de facto.» 48.ª É axiomático: se errou ao julgar a matéria de facto não omitiu a pronúncia sobre a matéria de facto; se a Relação se pronunciou, mas erradamente (na sua opinião), não pode haver nulidade por não se ter pronunciado… (CONTRA-ALEGAÇÕES SOBRE CADA UM DESSES FACTOS.) 49.ª Ex abundanti cautela, uma vez que, quanto à matéria de facto, nas pp. 19 a 107, a Recorrente EDP se limita a transcrever, sem tirar uma vírgula nem alterar uma letra, o seu recurso de apelação (pp. 5 a 92), limitar-nos-emos a reproduzir, mas sem transcrever, a resposta a cada um desses factos, remetendo para os pontos A2.2.) a A2.5) das contra-alegações do Autor (final da pág. 2 a final da pág. 10). (II. A3 – DIREITO.) (RESPONSABILIDADE CULPOSA, ARTIGO 493.º, N.º 2 DO CC VS RESPONSABILIDADE PELO RISCO, ARTIGO 509.º, N.º 1 DO CC.) 50.ª Nas 47.ª a 59.ª conclusões, a recorrente disserta sobre a questão de não poder ser condenada com base na responsabilidade por culpa, nos termos do artigo 493.º, n.º 2 do CC, mas isso é uma não questão, pois a recorrente foi condenada com base na responsabilidade pelo risco (artigo 509.º, n.º 1 do CC), conforme aventado pelo Autor no artigo 156 da petição inicial e na esteira do decidido no acórdão da Relação de Guimarães, de 26.04.2018, invocado na 25.ª conclusão supra. 51.ª A recorrente repete, à exaustão, que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir os danos, e investe nisso quase todo o seu recurso (com dezenas e dezenas de páginas com transcrições de depoimentos sobre factos acerca de tais providências), concluindo pela exclusão da sua responsabilidade culposa (conclusão 59.ª) – mas isso é uma causa de exclusão de responsabilidade por factos ilícitos (actividade perigosa), expressamente prevista no artigo 493.º, n.º 2, 2.º parte, mas as instâncias condenaram a Ré EDP por responsabilidade objectiva, ao que a recorrente, para rebater esse entendimento, contrapõe argumentos que afastam a sua responsabilidade… subjectiva! (RESPONSABILIDADE PELO RISCO DO ARTIGO 509.º, N.º 1: DANOS RESULTANTES DA ACTIVIDADE DE CONDUÇÃO OU ENTREGA DE ENERGIA ELÉCTRICA VS DANOS RESULTANTES DA PRÓPRIA INSTALAÇÃO.) 52.ª A recorrente, para afastar a sua responsabilidade objectiva, continua a “bater na tecla” errada, pois persiste em alegar a observância das regras técnicas em vigor na instalação e o estado de conservação da mesma e, na linha do que advogara na apelação (vide o 2.º parágrafo da pág. 26), porfia em alegar essa factualidade como fundamento para não aplicação do n.º 1 do artigo 509.º (conclusões 60.ª a 69.ª), 53.ª Salvo o devido respeito, trata-se de um “tiro ao lado” do alvo, pois como bem realçou o M.º Julgador a quo (pág. 32 da sentença), não estamos perante um caso de danos resultantes da própria instalação, mas sim da actividade de distribuição de energia eléctrica: «No caso em análise, está em causa um dano resultante da atividade de distribuição de energia elétrica, não um dano resultante da própria instalação, pois o Autor foi atingido por uma descarga elétrica, não por qualquer elemento da instalação. Assim, o alegado pela EDP quanto ao estado de conservação da instalação e à sua conformidade com as regras técnicas, não releva para excluir a sua responsabilidade.» 54.ª Este entendimento foi expressamente confirmado pelos Venerandos Desembargadores da Relação do Porto (pág. 51 do acórdão), em consonância com toda a doutrina e a jurisprudência. 55.ª De qualquer modo, não há dúvida que a electrocussão derivou de uma descarga eléctrica, isto é, que o evento gerador dos danos foi uma descarga eléctrica, e que essa descarga proveio dos cabos da linha de condução da electricidade – logo, o nexo de causalidade (entre a condução da energia eléctrica por aquela linha e a descarga eléctrica proveniente dessa linha, que atingiu o Autor) está mais do que demonstrado pelos factos dados como provados. (CASO DE FORÇA MAIOR.) 56.ª A recorrente, nas conclusões 70.ª a 72.ª, vira a agulha para o caso de força maior, obnubilando que, na 1.ª instância, nunca suscitou tal questão, a qual só levantou pela primeira vez na apelação, mas apenas numa linha da motivação («como poderia consistir em causa de força maior», pág. 4, última linha), sem levar essa questão às conclusões! 57.ª Obviamente que essa questão nem sequer pode ser apreciada, por se tratar uma questão nova (ibidem conclusões 45.ª e 46.ª supra). 58.ª Além disso, a recorrente continua a não alegar os factos que traduzem o nexo de causalidade adequada entre esse caso de força maior e a descarga eléctrica, pois não consta dos factos provados, nem a recorrente pugna por que passe a constar (pois isso não foi alegado por nenhuma das partes nem foi feita prova alguma sobre isso), a causalidade adequada do caso de força maior para a electrocussão. 59.ª Mas sempre seria de seu ónus alegar e provar os factos corporizadores do nexo causal entre essa causa (de força maior) e os danos, nos termos do n.º 2 do artigo 342.º do Código Civil, conforme expressamente fundamentado pelo acórdão recorrido no 3.º parágrafo da pág. 58 (nesse sentido, inter alia, o aresto do STJ, de 12.07.2018, referenciado na 25.ª conclusão). (MONTANTES INDEMNIZATÓRIOS.) 60.ª Desde logo, é inadmissível e revista excepcional sobre esta questão, porquanto a questão de direito em que a recorrente a sustenta é a dos termos de aplicação do artigo 509.º, n.º 1 do Código Civil: ou é aplicado este normativo nos termos determinados pelas instâncias, e amplamente sufragados por toda a doutrina e pela jurisprudência (e a condenação mantém-se, nos mesmíssimos termos); ou não é aplicado nesses termos (e a decisão de condenação deve ser alterada, mas não relativamente aos montantes). 61.ª Nem a Recorrente alega sequer que sobre essa questão dos valores se verifique algum dos fundamentos de admissibilidade da revista excepcional (alíneas a) a c) do n.º 1 do artigo 672.º do CPC). 62.ª Nas conclusões 76.ª a 79.ª, a recorrente pede que a indemnização baixe para valores inferiores aos fixados na 1.ª instância, mas até aos valores fixados na 1.ª Instância e confirmados na Relação (que, inclusivamente, agravou um dos pedidos indemnizatórios), sempre haveria dupla conforme, a qual só não existe na parte da indemnização agravada pela Relação. 63.ª É completamente descabida a pretensão da Recorrente em reduzir os valores indemnizatórios, conforme amplamente demonstrado no recurso de revista do Autor, onde, fundamentadamente (nos factos e no direito) e com respaldo jurisprudencial, pugna pela: i) condenação da Ré ao pagamento de dano patrimonial a fixar em €: 10.280,88 (6.ª conclusão da revista do Autor); ii) aumento da indemnização por todos os danos não patrimoniais, exceptuando o dano biológico, de €: 45.000,00 para €: 66.000,00 (€: 34.000,00 de quantum doloris, €: 17.000,00 de dano estético e €: 15.000,00 de outros danos não patrimoniais – conclusões 7.ª a 14.ª da revista); iii) aumento (em sede de suprimento de nulidade por omissão de pronúncia) da indemnização pelo dano biológico, de €: 11.500,00 para €: 22.500,00 (conclusões 15.ª a 18.ª da revista). Nestes termos, e nos do avisado aprimoramento que só os COLENDOS CONSELHEIROS superiormente lhes saberão prover, como é de Vosso dom e privilégio, dirimindo as questões recursórias com a sabença reconhecida e a predicativa sobriedade, deverá ser liminarmente indeferido o recurso de revista excepcional, por intempestivo (artigo 641.º, n.º 2, alínea a) do CPC), sem prejuízo de dever ser recusada a revista excepcional em sede de apreciação preliminar sumária pela formação (artigo 672.º, n.º 3 do CPC), ou, a ser admitido o recurso, ser o mesmo julgado totalmente improcedente e coonestado o modelar acórdão recorrido (com os valores indemnizatórios revistos em alta), com o que V. EX.ªs, COLENDOS CONSELHEIROS, exercerão a mais criteriosa, depurada e sã JUSTIÇA”. Responde o Interveniente ...... e conclui: “I. O recurso de revista em causa carece de manifesto fundamento legal e não passa de uma tentativa encapotada de “tentar” a alteração da matéria de facto, o que é manifestamente inadmissível, nesta sede! A) Da inadmissibilidade do recurso de revista: Conclusões II. A XV. (respeitam a inadmissibilidade do recurso de revista excecional) II. Dos fundamentos do recurso de revista Da alegada omissão de pronúncia XVI. O recorrente invoca, sem razão, a omissão de pronúncia do recurso interposto quanto ao pedido de alteração da matéria de facto. XVII. Ora, resulta da matéria provada que o “AA (ora Autor) foi atingido por uma descarga elétrica, proveniente dos cabos de uma linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava.” – facto dado como provado e não impugnado. XVIII. Face a tal, é matéria definitivamente assente que o Autor foi atingido por uma descarga elétrica e não por qualquer elemento da instalação elétrica, razão pela qual está também definitivamente assente que nos presentes autos está em causa um dano resultante da atividade de distribuição de energia elétrica e não um dano resultante da própria instalação. Sucede que, XIX. Os factos da contestação que a Recorrente pretende ver aditados são relativos, exclusivamente, ao estado de conservação da instalação e à sua conformidade com as regras técnicas, e, nos termos do artigo 509º do Código Civil, o estado de conservação da instalação elétrica e a sua conformidade com as regras técnicas apenas releva para efeitos de limitação ou exclusão da responsabilidade civil quando estejam em causa danos causados pela dita instalação. XX. Ora, encontrando-se assente que o dano, nos autos, tem origem na atividade de distribuição de energia elétrica e não da instalação, revela-se irrelevante o estado daquela ou o cumprimento das regras técnicas a ela referentes, razão pela qual, se pronunciou, doutamente, o Tribunal a quo, deixando bem claro o supra mencionado e concluindo no seguinte sentido: “(...) dada a irrelevância apontada que subscrevemos, ser manifesta a improcedência da pretensão da Recorrente nessa parte.” Acresce que, XXI. A Recorrente peticionou a alteração dos factos vertidos em 108, 109, 111 e 112, dados como não provados, para a matéria provada e, ainda, o aditamento da conclusão B30 – matéria não relacionada com o estado de conservação ou cumprimento de regras técnicas da instalação elétrica, XXII. Quanto a tal, o Tribunal a quo pronunciou-se no seguinte sentido: “(...) não encontramos fundamentos para acolher tais pretensões, pelos motivos devidamente explanados pelo Tribunal a quo no excerto da respectiva motivação, acima decalcado, que, nessa parte, fazemos nosso e aqui damos por reproduzido, nada se nos oferecendo acrescentar-lhe, sob pena de repetição.” Assim sendo: XXIII. Do exposto, dúvidas não restam de que o Tribunal a quo conheceu as questões que foram submetidas à sua apreciação, não tendo deixado de se pronunciar sobre as mesmas, pelo que, não se verifica no acórdão recorrido qualquer nulidade por omissão de pronúncia. XXIV. Na verdade, resulta claro e evidente que a Recorrente, com o presente recurso, pretende a alteração da decisão do Tribunal a quo quanto matéria de facto, sendo que, a invocação da nulidade ora em causa tem encapotado tal desiderato – a alteração da matéria de facto, o que é inadmissível – vide nº 2 do artigo 682º e nº 4 do artigo 662º do C.P.C., XXV. Pelo que, não deve proceder a pretensão da Recorrente, seja quanto à alegada omissão de pronúncia, seja quanto à alteração da matéria de facto. Da responsabilidade civil da Recorrente: XXVI. A Recorrente, nas suas doutas alegações, ora invoca a exclusão da sua responsabilidade por factos ilícitos com fundamento no facto no alegado cumprimento de todas as providências exigidas pelas circunstâncias para prevenir o sinistro, ora invoca, por referência a responsabilidade pelo risco, a verificação de causas de exclusão da sua responsabilidade, designadamente, a responsabilidade por culpa de terceiro e do próprio A. XXVII. Com o devido respeito, a Recorrente mistura conceitos e institutos jurídicos, na tentativa de encontrar a sua “boia de salvação” para a exclusão da sua responsabilidade. Ora, XXVIII. Salvo melhor opinião, estamos perante dois institutos distintos e cuja aplicabilidade não é, naturalmente, simultânea, mas alternativa ou, no limite, subsidiária. XXIX. Pois que, o artigo 493º, nº 2 do Código Civil, relativo à responsabilidade civil por factos ilícitos, é aplicável aos danos resultantes de atividades perigosas e consigna uma presunção legal de culpa, sendo a sua ilisão restrita à prova de que foram cumpridas todas as providências exigidas pelas circunstâncias com o fim de prevenir a ocorrência dos danos causados. XXX. Por sua vez, o artigo 509º do Código Civil, relativo à responsabilidade civil objetiva, consagra a responsabilidade por danos causados por instalações de energia elétrica ou gás, isto é, consagrou, especificamente, uma responsabilidade para os danos causados pelos dispositivos destinados ao transporte e fornecimento de eletricidade e gás, atenta a sua perigosidade. XXXI. Significa isto que, quanto aos danos resultantes da condução ou entrega da electricidade ou do gás, quem tiver a direção efetiva da respetiva instalação e a utilizar no seu interesse só poderá evitar o dever de indemnizar os danos devidos aos efeitos da electricidade ou do gás se demonstrar que estes resultaram de causa de força maior – vide artigo 509º, nº 2 – e no caso de danos provocados pela própria instalação, se provar que esta, ao tempo do acidente, se encontrava em perfeito estado de conservação – vide artigo 509º, nº 1. XXXII. No referido normativo resulta notória e evidente a diferenciação de regimes entre os danos devidos aos efeitos da electricidade ou gás e os danos causados pelas instalações que conduzem e entregam estas fontes de energia, diferenciação essa absolutamente justificada, pois que, como sabemos, a especial perigosidade reside na energia eléctrica e no gás e não nas instalações que os conduzem e entregam. Posto isto, XXXIII. No caso vertente, dúvidas não restam de estarmos perante danos que resultam dos efeitos da electricidade ou do gás, pois que, nos presentes autos provou-se que,” (...) quando se encontrava no pesqueiro que lhe foi atribuído, a participar na prova, AA (ora Autor) foi atingido por uma descarga eléctrica, proveniente dos cabos de uma linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava”. Ora, XXXIV. O regime previsto na primeira parte do nº 1 do artigo 509º do Código Civil (danos derivados da condução ou entrega de electricidade ou gás) regulamenta a responsabilidade civil, especificamente, quanto a tal situação, pelo que, existindo um regime especial é esse o aplicável aos danos que advierem. XXXV. Sendo certo que, a aplicação do regime previsto no nº 2 do artigo 493º do Código Civil, sempre exigiria a prévia existência de um comportamento ilícito por parte da Recorrente, designadamente, uma desconformidade técnica ou como a não observância de quaisquer normas que regulassem a distribuição eléctrica - o que não resultou provado nos presentes autos, nem sequer foi alegado, antes pelo contrário. XXXVI. Pelo que, salvo melhor entendimento, não há sequer factos que permitam a responsabilização da Recorrente ao abrigo do disposto no artigo 493º, nº 2 do Código Civil. XXXVII. Estamos, pois, perante a primeira hipótese prevista no nº 1, do artigo 509º, do Código Civil, razão pela qual a responsabilidade da Recorrente EDP, que detém a direção efetiva da linha e a utiliza no seu interesse, só podia ser evitada, caso ela demonstrasse que a descarga elétrica sofrida pelo Autor resultou de uma causa de força maior, o que afastaria o nexo de causalidade entre os danos ocasionados e a atividade de condução de energia elétrica. Sucede que, XXXVIII. A Recorrente insiste, na sua alegação, na exclusão da sua responsabilidade com fundamento na imputação de culpa ao Autor, invocando que, conforme resulta do facto provado 69, “(...) a vítima sabia que as linhas estavam lá (...)”, mas com o devido respeito, não foi o facto de o Autor ter “visto tais cabos e tais postes” que gerou o dano, não existindo qualquer relação de causalidade existe tal facto e os danos sofridos pelo Autor e que advieram da descarga elétrica a que foi sujeito. XXXIX. Ora, no presente caso, não se provou a existência de qualquer conduta do lesado (Autor) ou de terceiro (R. Município ou R. Sociedade) que determinasse, definitiva e objetivamente, que o Autor sofresse a descarga elétrica em causa e, consequentemente, os danos que dela advieram, XL. Aliás, apenas se provou que o Autor “foi atingido por uma descarga elétrica, proveniente dos cabos de uma linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava.”, XLI. Não se tendo apurado, concreta e objetivamente, qual o acontecimento que determinou ou originou a descarga elétrica, não se verificando, por isso, qualquer causa de força maior nos presentes autos. XLII. Concluindo, não logrou a Recorrente demonstrar a existência de uma força maior e nem da sua causalidade adequada para a eletrocussão, XLIII. Pelo que, não existe, nos presentes autos, qualquer causa de exclusão da responsabilidade da Recorrente. Termos em que o Recurso de revista não deve ser admitido, sempre deve ser julgado por improcedente. Assim se fazendo inteira e acostumada JUSTIÇA!”. Responde a Interveniente Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A., concluindo: “Deve o recurso de revista excepcional ser rejeitado, por inadmissibilidade legal. Caso assim não seja entendido, deve o mesmo recurso ser julgado improcedente, como é de JUSTIÇA!”. * Admissibilidade dos recursos: Entende o Autor, na sua resposta, que o recurso da Ré é extemporâneo. Alega o autor que a ré pretende utilizar, no prazo de interposição do recurso, o acréscimo de 10 dias, previsto no nº 7 do art. 638º do CPC, mas entende que, no caso não há lugar a reapreciação da prova gravada e, consequentemente, não há esse acréscimo do prazo. Não tem razão o autor, pois não levou em conta o período das férias judiciais da Páscoa, que suspendeu o decurso do prazo de interposição do recurso. O acórdão recorrido foi proferido e notificado em 23-02-2021 (terça-feira) e o recurso da Ré foi interposto em 08-04-2021 (quinta-feira). Tendo em conta o disposto no nº 1 do art. 248º, a notificação presume-se feita no terceiro dia posterior, ou seja, no dia 26-02. Sendo o prazo de interposição do recurso de 30 dias, nos termos do nº 1 (primeira parte), do art. 638º, terminaria em 29-03-2021 (segunda-feira). Porém, porque, a 28-03-2021(domingo de Ramos) tiveram início as férias judiciais que se prolongaram até dia 5-04-2021 (segunda-feira da Páscoa), estando o prazo suspenso durante esse período, conforme art. 138º, nº 1, temos que o termo do prazo do recurso só ocorreu em 06-04-2021. O recurso foi interposto em 08-04-2021, no segundo dia útil seguinte ao termo do prazo, mas a recorrente fez uso da faculdade concedida pelo nº 5, al. b), do art. 139º, pagando a multa correspondente. O art. 28º da L. nº 62/2013 de 26-08 (LOSJ) determina os períodos de férias judiciais, sendo relevante, in casu, o período de domingo de Ramos a segunda-feira de Páscoa. Assim que o recurso da ré, não foi extemporaneamente interposto. Recorre o Autor, da matéria de direito. Relativamente à matéria de direito, e contrariamente ao que o recorrente entende, verifica-se dupla conforme. A 1ª Instância condenou a ré: “Condena-se a Ré EDP Distribuição – Energia, S. A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 31.519,65 (trinta e um mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação desta sentença quanto ao montante de € 31.500,00 (trinta e um mil e quinhentos euros), até integral pagamento”. E o Tribunal da Relação condenou a ré no pagamento: “… de €56.519,65 (cinquenta e seis mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação da decisão quanto ao montante de €56,500,00 (cinquenta e seis mil e quinhentos euros), até integral pagamento”. Verifica-se que o autor obteve decisão (acórdão) que lhe é mais favorável do que se fosse confirmação integral da sentença. E vem entendendo quer a doutrina, quer a jurisprudência, que em situações como a que se verifica nos autos há dupla conforme, para efeitos do previsto no art. 671º, nº 3 do CPC. “O apelante que é beneficiado com o acórdão da Relação relativamente à decisão da 1.ª instância – isto é, o réu que é condenado em “menos” do que na decisão da 1.ª instância ou o autor que obtém “mais” do que conseguiu na 1.ª instância – nunca pode interpor recurso de revista para o Supremo, porque ele também o não poderia fazer de um acórdão da Relação que tivesse mantido a – para ele menos favorável – decisão da 1.ª instância…” – Professor Miguel Teixeira de Sousa (Cadernos de Direito Privado, 21, 21 e seguintes) e no mesmo sentido, Conselheiro Pereira da Silva, “Recursos em Processo Civil: abordagem crítica à última reforma”, (disponível em http://www.stj.pt/nsrepo/cont/Coloquios/Discursos/Intervenção-colóquioVPPS%2027%2005.pdf), citados por Lopes do Rego no Ac. do STJ de 22-02-2017, no Proc. nº 811/10.9TBBJA.E1.S1. E no mesmo sentido o Ac. do STJ de 02-02-2016, no proc. nº 540/11.6TVLSB.L2.S1, ao decidir que, “II - Na interpretação da norma constante no art. 671.º, n.º 3, do NCPC, deve ponderar-se o seu elemento racional-teleológico para se concluir pela dupla conformidade de decisões, mesmo nos casos de ausência de sobreposição total, mas com decisão mais favorável para a recorrente”. Entende Abrantes Geraldes in Recursos no Novo Código de Processo Civil, 5ª ed., pág. 371 que em casos como o dos autos estaremos perante “desconformidade” meramente literal ou aparente e, acrescenta a pág. 373 que, “por via do elemento racional ou teleológico que intervém na interpretação normativa, não faria sentido que fosse recusada a revista normal nos casos em que a Relação pura e simplesmente tivesse confirmado a decisão da 1ª Instância, sem voto de vencido e com base na mesma fundamentação essencial, sendo, no entanto, admitida em casos em que a Relação, em sede de apreciação do recurso de apelação interposto pela parte vencida, tivesse decretado um resultado mais benéfico para o recorrente do que aquele que emergia da decisão da 1ª instância”. Face ao exposto, só podemos concluir que, por se verificar a dupla conforme e sem fundamentação essencialmente diferente, tal como define o nº 3 do art. 671º do CPC, não é de admitir o recurso como revista normal, relativamente à impugnação, pelo Autor, da matéria de direito. Recurso da matéria de facto: O A. e a R. recorrem da matéria de facto. É entendimento do STJ que nos casos em que foi violada a lei processual que disciplina os pressupostos e os fundamentos da reponderação pela 2.ª Instância da decisão sobre a matéria de facto, no sentido de garantir um duplo grau de jurisdição em tal matéria, é admissível o recurso de revista - Revista n.º 232/13.1TBLMG.C1.S1 - 1.ª Secção. “Não existe dupla conforme entre a decisão da 1.ª instância e o acórdão da Relação que, por via da impugnação da decisão da matéria de facto em apelação, dela conhece e não a altera, confirmando o decidido, se a questão colocada no recurso de revista radica no uso pela 2.ª instância dos poderes conferidos no art. 662.º, n.º 2, do CPC, próprios e privativos do tribunal da Relação, sem correspondência na decisão da 1.ª instância” – Ac. do STJ de 03-11-2016, in Revista excecional n.º 3081/13.3TBBRG.G1.S1. Assim e com estes fundamentos, admitem-se os recursos de revista, do A. e da R., no que respeita à decisão da matéria de facto pela Relação. Recorre a R. da matéria de direito: Conforme já supra se referiu, a sentença decidiu: “julgar a ação parcialmente procedente, por provada, e, em consequência: III.a) Condena-se a Ré EDP Distribuição – Energia, S. A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 31.519,65 (trinta e um mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação desta sentença quanto ao montante de € 31.500,00 (trinta e um mil e quinhentos euros), até integral pagamento; III.b) Absolvem-se a Ré EDP Distribuição – Energia, S. A. e os Intervenientes Principais Município de Santo Tirso, Sociedade Recreativa Rebordoense e Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A. do demais peticionado pelo Autor. Condenam-se o Autor e a Ré a pagar as custas, na proporção do decaimento (art. 527.º do Código de Processo Civil). Registe e notifique.” Por outro lado, foi decidido pelo acórdão recorrido: “Pelo exposto, acordamos em julgar a apelação da R. totalmente improcedente e a do A. parcialmente procedente e, consequentemente, alteramos a sentença recorrida no que respeita à quantia global da indemnização que passa a ser de €56.519,65 (cinquenta e seis mil, quinhentos e dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, contados desde a citação quanto ao montante de € 19,65 (dezanove euros e sessenta e cinco cêntimos) e contados desde a data da prolação da decisão quanto ao montante de €56,500,00 (cinquenta e seis mil e quinhentos euros), até integral pagamento. No mais, vai a mesma confirmada, nos seus exactos termos. Custas nas respectivas proporções.” Dispõe o nº 3 do art. 671º do CPC que: “3 - Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte.” No caso em análise, sendo requerida a revista excecional, é claro que: -Não estamos perante situação processual em que o recurso seja sempre admissível (art. 629º, nº 2 e art. 671º, nº 2, do CPC); -No acórdão recorrido não existe voto de vencido; - A fundamentação, de ambas as decisões, não é essencialmente diferente (tanto não é que a R. alega os pressupostos da revista excecional relativamente aos fundamentos das decisões - a responsabilidade civil; - Resta verificar se há, ou não, confirmação da decisão da 1ª Instância: No caso inexiste essa confirmação, relativamente à R., uma vez que a mesma foi condenada na 1ª Instância a pagar a quantia de € 31.519,65 e, na Relação foi condenada a pagar a quantia de €56.519,65 (resultado da parcial procedência do recurso do A.). A não verificação de confirmação da decisão da 1ª Instância obsta a que se verifique dupla conforme para efeitos do disposto no art. 671º, nº 3, do CPC e que, só excecionalmente possa ser admitido recurso de revista. Falhado este requisito (conformidade decisória) inexiste dupla conforme. É necessário que se verifiquem todos os requisitos, enunciados no nº 3 do art. 671º do CPC, para que se verifique a dupla conforme. Assim e, inexistindo dupla conforme relativamente às condenações da R. nas Instâncias, não há lugar a revista excecional, mas sim revista normal (uma vez que os requisitos da revista normal hão de sempre estar preenchidos e, só a dupla conforme ser obstáculo à admissão da revista normal). * Dispensados os vistos cumpre apreciar e decidir. * Nas Instâncias foram julgados como provados e não provados, os seguintes factos: “1) Entre o Município de Santo Tirso e a Lusitânia – Companhia de Seguros, S. A. foi celebrado um contrato de seguro titulado pela apólice n.º …...801, com o teor que consta do documento junto a fls. 249v-254, que aqui se dá por integralmente reproduzido. 2) Entre a Associação Regional do Norte de Pesca Desportiva e a Companhia de Seguros Allianz Portugal, S. A. foi celebrado um contrato de seguro titulado pela apólice n.º …....092., com o teor que consta do documento junto a fls. 298-305, que aqui se dá por integralmente reproduzido. 3) A EDP Distribuição – Energia, S. A. (ora Ré) é concessionária da distribuição de energia elétrica em média tesão e alta tensão em Portugal Continental. 4) Integraram a concessão um conjunto de redes elétricas de serviço público, que no seu todo se denominou Rede Nacional de Distribuição. 5) Compete à EDP Distribuição – Energia, S. A. (ora Ré) explorar o serviço público de distribuição de energia elétrica utilizando as redes pré-existentes e promovendo a sua expansão, respeitando os regulamentos em vigor, nomeadamente o regulamento de segurança de redes elétricas. 6) A EDP Distribuição – Energia, S. A. (ora Ré) detinha e detém a direção efetiva da atividade de distribuição de energia elétrica em média tesão e alta tensão em Portugal Continental, atividade que prosseguia e prossegue no seu interesse. 7) No dia 09-06-2013 realizou-se a ... Campeonato Concelhio de Pesca Desportiva, na margem do ..., na freguesia de ..., concelho de .... 8) Essa prova foi organizada pelo Município de Santo Tirso e pela Sociedade Recreativa Rebordoense. 9) AA (ora Autor) participou nessa prova, tendo-lhe sido atribuído o pesqueiro n.º .... 10) Cerca das 11:30 horas, quando se encontrava no pesqueiro que lhe foi atribuído, a participar a prova, AA (ora Autor) foi atingido por uma descarga elétrica, proveniente dos cabos de uma linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava. 11) O Autor estava a pescar utilizando uma cana de pesca de carbono. 12) A descarga elétrica que atingiu o Autor entrou pela sua mão esquerda. 13) O pesqueiro onde estava o Autor era uma construção em madeira, situada na margem do .... 14) Atrás desse pesqueiro, existia um poste metálico (apoio 29 da linha de transporte de energia elétrica). 15) Este poste suportava os cabos de uma linha de transporte de energia elétrica;... 16) …Que vinham de um poste, situado na outra margem do rio;… 17) …E que depois seguiam para um outro poste, também situado na outra margem do rio;… 18) …Pelo que os cabos da linha de transporte de energia eléctrica estavam dispostos em «V» sobre o leito do ..., assentando dois dos vértices desse triângulo em dois postes situados na margem do rio onde não se encontrava o Autor e o outro vértice no poste existente atrás do pesqueiro onde se encontrava o Autor. 19) A linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava o Autor integrava a Rede Nacional de Distribuição em média tensão (15 kV) e é designada por .... 20) A EDP Distribuição – Energia, S. A. realizou diversas ações de manutenção nessa linha, designadamente, inspeções termográficas, inspeções visuais, limpezas de faixa de proteção, substituição e reparação de condutores, isoladores e seccionadores. 21) A descarga que atingiu o Autor ocorreu entre os apoios 29 e 30 da referida linha. 22) Tratava-se de uma linha em cobre de 70mm2, com tracção 8.00 daN/mm2. 23) O apoio 29 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: R32-15,4; altura total: 15,4 metros; altura útil: 12,37 metros; fixação: amarração reforçada; tipo armação: TAN. 24) O apoio 30 tinha, à data do sinistro, as seguintes características: apoio: metálico; tipo: H-12,7; altura total: 12,7 metros; altura útil: 9,04 metros; fixação: rígidos verticais duplos; tipo armação: TAN. 25) Junto à margem onde se encontrava o apoio 29, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, nas condições mais desfavoráveis, era de cerca de 12 metros. 26) Em todo o vão, à data do sinistro, a distância mínima dos condutores ao solo, em condições mais desfavoráveis, situava-se na proximidade do apoio 30 e era de cerca de 9 metros. 27) Os condutores passavam sobre o ... a cerca de dez metros de altura. 28) Na data do sinistro, a montante a linha encontrava-se dotada de proteções ao nível do painel de média tensão e ao nível do barramento de média tensão, sendo esta uma proteção de reserva. 29) AA (ora Autor) nasceu no dia XX/XX/1954. 30) Em consequência da descarga elétrica supra referida, o Autor desfaleceu e ficou inconsciente;… 31) …Sofreu queimaduras de 3.º grau, que atingiram 3% da superfície corporal, atingindo a zona do tórax à esquerda, zona tenar esquerda, mão esquerda, abdómen no flanco direito, hipocôndrio direito e na região da linha média axilar direita;… 32) …Tendo sido assistido no local e depois transportado para o Hospital de ..., no ..., onde deu entrada na Unidade de Queimados, cerca das 14:35 horas, do dia 09-06-2013. 33) O Autor ficou internado no Hospital de ... desde 09-06-2013 até 08-07-2013, data em que teve alta para residência;… 34) …Tendo estado internado na Unidade de Queimados, desde o dia 09-06-2013 até ao dia 03-07-2013, e no Serviço de Cirurgia Plástica, Reconstrutiva, Estética e Maxilo-Facial, desde o dia 03-07-2013 até ao dia 08-07-2013. 35) Durante o internamento hospitalar, o Autor manteve-se sempre acamado, sendo sido sujeito a diversos tratamentos e sendo-lhe administrada diversa medicação. 36) O Autor foi submetido a uma intervenção cirúrgica a 13-06-2013, para desbridamento de tecido desvitalizado do hemitórax direito (com amputação do CAM) e face lateral do tórax à esquerda; bem como para plastia das áreas desbridadas com EPP colhido da face anterior da coxa esquerda;... 37) …E a uma outra intervenção cirúrgica a 02-07-2013, para desbridamento de áreas queimadas ao nível do hemitórax esquerdo, hemitórax direito e hipocondrio direito; bem como para plastia de defeito com avanço de retalhos locais a nível do hemitórax esquerdo e hemitórax direito e plastia de defeito do hipocondrio direito com retalho de rotação de base supero lateral 38) Depois de receber alta para a residência, o Autor foi observado duas vezes na consulta externa de Cirurgia Plástica, no ...; a primeira em 29-08-2013 e a segunda em 06-02-2014, data em que lhe foi dada alta administrativa. 39) Devido ao acidente, o Autor padeceu de dores pelas lesões sofridas, pelas cirurgias efetuadas e pelos tratamentos a que foi sujeito;... 40) …E apresenta cicatriz não recente no tórax, com queloide, de vinte e cinco por cinco centímetros no hemitórax esquerdo, cicatriz não recente no abdómen, com queloide, de vinte e três por vinte e um centímetros no hipocôndrio e flanco direito e cicatriz, não recente, na mão esquerda, com queloide, de dois por dois centímetros na região tenar. 41) O Autor esteve seis meses sem conseguir conduzir;… 42) Durante três meses, o Autor não conseguia arranjar-se (designadamente para vestir e despir as calças, calçar-se e colocar as peúgas, apertar os atacadores e descalçar-se) e assegurar sozinho a sua higiene diária;… 43) …Não conseguia levantar ou transportar pesos e não conseguia agachar-se, necessitando de se ajoelhar para apanhar qualquer objecto do chão;… 44) …Não conseguia dormir serenamente e descansar sem sobressaltos;…. 45) …Não conseguia ajudar na lide doméstica. 46) O Autor deixou de poder estar muito tempo consecutivo sentado, dobrado sobre a barriga. 47) O Autor não consegue dormir virado para qualquer um dos lados, vendo-se obrigado a dormir de costas ou de barriga para baixo. 48) O Autor deixou de pescar. 49) A data da consolidação médico-legal das lesões sofridas pelo Autor em consequência do acidente é fixável em 06-02-2014. 50) O período de défice funcional temporário total em consequência do acidente é fixável num período de 60 dias. 51) O período de défice funcional temporário parcial em consequência do acidente é fixável num período de 183 dias. 52) O período de repercussão temporária na atividade profissional total em consequência do acidente é fixável num período de 243 dias. 53) As dores e demais sofrimentos sentidos pelo Autor em consequência do acidente são quantificáveis no grau 4, numa escala crescente de 0 a 7. 54) Em consequência do acidente, o Autor é portador de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8%. 55) As sequelas de que o Autor é portador, em consequência do acidente, são, em termos de repercussão permanente na actividade profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares. 56) O dano estético permanente sofrido pelo Autor, em consequência do acidente, é quantificável no grau 3, numa escala crescente de 0 a 7. 57) Em consequência do acidente, o Autor ficou a padecer de lesões com repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, repercussão essa quantificável no grau 4, numa escala crescente de 0 a 7. 58) O Autor despendeu a quantia de € 19,65 na aquisição de um boião de ..., com 400 ml. 59) A partir do ano 2000, o Autor desenvolveu atividade empresarial em Portugal, tendo formado uma sociedade com outros sócios, no ramo do comércio de camiões. 60) Nesse âmbito o Autor deslocava-se por todo o território nacional e pelo estrangeiro, para levar e trazer camiões novos e usados, que ele próprio conduzia. 61) A referida atividade empresarial do Autor cessou em 2005. 62) À data do acidente, o Autor encontrava-se desempregado. 63) Em data anterior a junho de 2013, o Município de Santo Tirso executou na margem do ... onde se encontrava o apoio n.º 29 da linha elétrica ... - ... uma pista de pesca, construindo um pesqueiro junto a esse apoio. 64) O Município de Santo Tirso executou a pista de pesca e construiu o pesqueiro sem disso dar conhecimento à EDP. 65) A ... Campeonato Concelhio de Pesca Desportiva, foi organizada pela Sociedade Recreativa Rebordense e pelo Município de Santo Tirso para ser realizada no dia 09-06-2013, na referida pista de pesca, junto à rede elétrica de 15kV .... 66) Nem o Município de Santo Tirso, nem a Sociedade Recreativa Rebordense, nem qualquer dos participantes, incluindo o Autor, deram conhecimento prévio à EDP de que no local iria decorrer essa prova/concurso de pesca. 67) Tomando como referência a data do acidente (09-06-2013), o Autor estava filiado na Federação Portuguesa de Pesca Desportiva;… 68) …E já se dedicava à pesca desportiva há cerca de 3 anos. 69) Os postes elétricos e os cabos elétricos da linha ... eram bem visíveis do pesqueiro onde o Autor se encontrava, não podendo passar despercebidos;… 70) …Tendo o Autor visto tais cabos e tais postes. 71) O § único do artigo 6.º do Regulamento Geral de Campeonatos Nacionais, da Federação Portuguesa de Pesca Desportiva, vigente em junho de 2013, estabelecia o seguinte: «Se o percurso for atravessado por linhas elétricas, é interdita a marcação de pesqueiros a menos de 40 metros lineares da prumada das mesmas». 72) As canas de pesca de carbono são condutoras de energia elétrica. 73) A distância do pesqueiro onde ocorreu o acidente à rede eléctrica era inferior a 13 metros. 74) As canas de pesca desportiva em carbono são extensíveis com um comprimento de até 13 metros;… 75) …O que era do conhecimento do Autor;… 76) …E da Sociedade Recreativa Rebordoense. 77) A EDP não tomou conhecimento do sinistro no dia da ocorrência. 78) O sinistro não foi comunicado à Sociedade Recreativa Rebordoense ou pelo Município de Santo Tirso 79) Para haver descarga elétrica proveniente de uma linha elétrica de 15 kV, não sendo necessário tocar na linha, impõe-se que o objeto condutor se aproxime da mesma a uma distância inferior a 15 centímetros. 80) Uma cana com 6 metros não permitia fisicamente a ocorrência de uma descarga elétrica dos condutores da rede elétrica ao solo. 81) A pista de pesca utilizada em 09-06-2013 na ... já havia sido utilizada em provas anteriores, assim como em treinos ou em pescaria de passatempo;... 82) …Incluindo o lugar de pesqueiro a que correspondeu o número cinco nessa na .... 83) Na sequência do acidente que vitimou o Autor, em 13-06-2013, o ...... solicitou à EDP que fosse removido, com urgência, o poste existente junto à pista de pesca (apoio 29 da linha de transporte de energia elétrica), a fim de eliminar «os problemas de segurança que efetivamente existem no desenvolvimento de atividades de pesca neste local». 84) Tendo esse poste sido retirado do local algumas semanas depois”. Factos alterados pelo Acórdão recorrido: “Face ao exposto, decidimos acrescentar ao elenco dos factos provados a seguinte factualidade: a) - Na sequência da descarga eléctrica que o atingiu, o Autor experienciou a iminência da sua morte, tendo pensado que estava irremediavelmente perdido, que estava malferido de morte e que não voltaria a ver os seus filhos. b) - O Autor andava sempre em tronco nu quando ia à praia marítima ou à praia fluvial, ou quando estava entre amigos, tendo deixado de fazer porque tem vergonha das cicatrizes que existem no seu tronco. c) - Devido ao acidente, durante três meses, o Autor claudicava na marcha de forma visível e pronunciada, sujeito a muito esforço para poder caminhar e vendo-se muitas vezes forçado a amparar-se para repousar. d) - O Autor deixou de conseguir fazer footing, de jogar futebol com os amigos, de praticar cicloturismo (bicicleta de estrada e BTT). e) - Em consequência do acidente, o ficou profundamente abalado e emocionalmente fragilizado, tendo-se tornado um homem nervoso, irritadiço. f) - O Autor tornou-se uma pessoa introvertida, descarregando a sua frustração naqueles que o rodeiam. g) - Antes do sinistro, o A. era uma pessoa alegre; h) –Era dinâmico; i) - Fazia a lida de casa; j) -Estimava o seu corpo; l) - Passou noites em claro”. Com relevo para a decisão da causa, não se provaram os seguintes factos: 85) Quando o Autor foi atingido pela descarga elétrica, segurava na cana de pesca com a sua mão esquerda. 86) Naquele momento, a cana de pesca estava com cerca de 6 metros de extensão e próxima dos cabos da linha de transporte de eletricidade. 87) Depois de receber alta para a residência, o Autor deslocou-se seis vezes ao Hospital de ... para fazer os curativos (trocar os pensos e tirar os pontos, em duas fases). 88) Depois de 06-02-2014, o Autor continuou a ir a consultas externas de Cirurgia Plástica, no ..., com frequência semestral. 89), 90) e 91) Eliminados dos não provados, pelo Acórdão recorrido. 92) O Autor sente dores na mudança do tempo. 93), 94) e 95) Eliminados dos não provados, pelo Acórdão recorrido. 96) Devido ao acidente, o Autor deixou de ter capacidade física para conduzir camiões. 97) O Autor despendeu a quantia de € 500,00, com viagens realizadas para realizar drenagens e para fazer curativos. 98) O Autor terá de efectuar deslocações a unidades de saúde até ao final dos seus dias e necessitará de acompanhamento médico e de medicação até ao fim da sua vida. 99) O Autor gastou € 100,00 para adquirir medicação para as lesões (comprimidos) 100) O Autor necessita de colocar loção corporal (pomada), duas vezes por dia, para amaciar e hidratar a zona das feridas, gastando cerca de 800 ml por mês. 101) O Autor trabalhou em Portugal na construção civil dos 13 aos 17 anos. 102) O Autor esteve emigrado em ..., entre 1972 e 2000, trabalhando por conta de outrem e teve como último emprego o da montagem de gruas giratórias. 103) No âmbito da atividade de comércio de camiões, muitas vezes era necessário carregar reboques (uns em cima de outros) para atrelar ao camião, bem como, no ... de ..., carregar os tratores dos camiões para os navios, no que o Autor colaborava activamente, o que, por envolver movimentação de grandes pesos, requeria muita força e vigor. 104) O Autor desentendeu-se com um dos sócios e, juntamente com outros dois, saiu da sociedade. 105) Quando ocorreu o acidente, o Autor tinha em preparação um projeto empresarial para regressar à atividade de comércio de camiões, exercendo as funções referidas em 60);… 106) …Que lhe proporcionaria rendimentos anuais de € 50.000,00. 107) O Autor aceitou o regulamento da prova, com o teor que consta do documento junto a fls. 247-247v, que se dá aqui por integralmente reproduzido. 108) As canas de pesca carbono têm a menção da proibição da sua utilização junto às redes elétricas. 109) Todos os praticantes de pesca desportiva, incluindo o Autor, sabem que é proibido praticar pesca desportiva junto às redes elétricas, sobretudo utilizando canas de carbono dada a sua condutibilidade. 110) O supra referido em 74) era do conhecimento do Município de Santo Tirso 111) Caso o Município de Santo Tirso, a a Sociedade Recreativa Rebordoense ou os participantes na prova tivessem verificado as condições de segurança para a prática de pesca desportiva em termos de segurança, antes da prova, esta não se teria iniciado e ter-se-ia evitado o acidente. 112) Na ocasião do sinistro, a cana de pesca utilizada pelo Autor tinha um comprimento superior a 10 metros”. * Conhecendo: São as questões suscitadas pelos recorrentes e constantes das respetivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 608, 635, nº 3 a 5 e 639, nº 1, do C.P.C. No caso em análise questiona-se: - Autor e Ré questionam a análise da matéria de facto efetuada pelo Tribunal recorrido. - A Ré questiona ainda a responsabilidade civil que lhe é imputada na sentença e no acórdão. Entende que os factos excluem a responsabilidade por culpa (presumida ou efetiva) da Ré e se verificam causas de exclusão, mesmo no âmbito da responsabilidade objetiva, designadamente a responsabilidade por culpa de terceiro e do próprio A.. * Recursos da matéria de facto (do A. e da R.): Refere o acórdão recorrido, no que a esta questão respeita, que após apreciação das impugnações relativamente à matéria de facto: “No mais, i.e., relativamente ao restante da impugnação da decisão de facto feita pelo A./Recorrente e no concernente à impugnação da Recorrente/Ré – onde incluímos o desejado aditamento do facto inserido em B30 (veja que, quanto a essa matéria, já se mostra fixado o ponto 73, da f.f. (não impugnado) inexistindo prova bastante que nos leve a alterar tal amplitude métrica, designadamente, para o valor proposto pela Recorrente) -, não encontramos fundamentos para acolher tais pretensões, pelos motivos devidamente explanados pelo Tribunal a quo no excerto da respectiva motivação, acima decalcado, que, nessa parte, fazemos nosso e aqui damos por reproduzido, nada se nos oferecendo acrescentar-lhe, sob pena de repetição.” A matéria de facto apurada (factos provados e não provados) há-de resultar da prova produzida (depoimentos/declarações de parte, pareceres, exames/perícias, documentos) conjugada com as regras da experiência comum. O recurso sobre a matéria de facto é o meio legal para corrigir erros de julgamento sobre matéria apontada pelo recorrente e tendo por base a sua argumentação, o que pode levar a decisão diversa. A Relação, e face ao objeto do recurso que lhe é apresentado, “deve alterar a decisão sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”, tal como preceitua o art. 662º nº 1 do CPC. Mas deve a Relação no acórdão, assim como qualquer tribunal nas sentenças ou despachos que não sejam de mero expediente, especificar os fundamentos de facto decisivos para a sua convicção e que justificam a decisão da matéria de facto, sendo que não o fazendo, se verificará, nos termos da al. b), do nº 1, do art. 615º, do CPC, a nulidade do acórdão (sentença) não motivado. Mas, no caso presente, essa fundamentação consta do acórdão, como supratranscrito (falta de fundamentos para acolher as pretensões dos recorrentes, na parte em que não foram acolhidas). A intervenção do STJ na decisão da matéria de facto está limitada aos casos previstos nos arts. 674º, nº 3 e 682º, nº 3, do CPC, o que exclui a possibilidade de interferir no juízo da Relação sustentado na reapreciação de meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação. Assim o entendemos no Ac. deste STJ de 04-02-2020, Revista n.º 3932/17.3T8BRG.G1.S1 e, no Ac. de 13-10-2020, no Proc. nº 439/18.5T8FAF.G1.S1 – ambos da 1.ª Secção. Os impugnantes da matéria de facto (A. e R.) não indicavam prova que tivesse força probatória plena e que fosse, por si, determinativa da convicção do Tribunal da Relação. Face ao normativo do CPC, a Relação e para formar a sua própria convicção, pode proceder não só à reapreciação dos meios de prova indicados pelas partes, como de todos aqueles que se mostrem acessíveis nos autos e estejam abarcados pela previsão do art. 662º. De igual modo entende Teixeira de Sousa, no Comentário, fls. 32 e segs., sobre “Prova, Poderes da Relação e Convicção: a lição de epistemologia”, onde refere: “O Princípio que rege a apreciação da prova é o da livre valoração: sempre que a prova não tenha um valor legal ou tarifado, a prova é apreciada segundo a prudente convicção do juiz (art. 607º, nº 5, do CPC). Isto significa que o juiz tem de formar uma convicção subjetiva sobre a verdade ou a plausibilidade do facto probando – ou seja, tem de adquirir um estado psíquico de convicção sobre essa verdade ou plausibilidade – baseado numa convicção objetiva – isto é, num conjunto de razões que permite afirmar que um facto é verdadeiro ou é plausível”. No caso vertente não ocorreu, neste domínio da reapreciação da matéria de facto, erro suscetível de sindicância deste Tribunal Supremo e também não se descortina qualquer violação das regras de direito probatório, soçobrando tudo o que os recorrentes alegaram e concluíram a tal propósito. Assim também entendeu o ac. do STJ de 19-01-2017, proferido no proc. nº 841/12.6TBMGR.C1.S1, concluindo, “Há que manter intocável, por isso, a materialidade fáctica dada por assente pela Relação”. “I - É definitivo o juízo formulado pelo tribunal da Relação, no âmbito do disposto no art. 662.º, n.º 1, do CPC, sobre a prova sujeita à livre apreciação, não podendo ser modificado ou censurado pelo STJ, cuja intervenção está limitada aos casos da parte final do n.º 3 do art. 674.º do mesmo Código.” - ac. do STJ de 03-03-2020, Revista n.º 3936/17.6T8PRT.P1.S1.S1 - 1.ª Secção Como já se referiu e, não se verificando qualquer das exceções previstas na parte final desta norma - nº 3 do art. 674º do CPC -, a fundamentação alegada pelos recorrentes não pode ser objeto do recurso de revista. “Nada havendo a censurar à legalidade da decisão recorrida, não pode o STJ apreciar o seu acerto ou o erro de julgamento que lhe é imputado” - Revista n.º 232/13.1TBLMG.C1.S1 - 1.ª Secção, de 04-07-2017. “II - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista salvo havendo "ofensa de uma disposição expressa da lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe força de determinado meio de prova" (artigo 674.º/3 do CPC)”. – Revista nº1345/13.5TVLSB.L1.S1 ,de 03-05-2018. Tendo a Relação reapreciado a matéria de facto, não compete ao STJ, em sede de revista, colocar em causa essa reapreciação por não se verificar a previsão do art. 674º, n.º 3, do CPC. Neste sentido, a Revista n.º 248/12.5TBCMN.G1.S1, de 30-03-2017. O poder do Supremo Tribunal de Justiça, nesta matéria, como tribunal de revista, está limitado, nomeadamente ao conhecimento da eventual violação do direito probatório material, da qual poderá resultar a modificação da decisão relativa à matéria de facto (art. 674º, n.º 3, do CPC). Trata-se, contudo, de um poder meramente residual, cabendo à Relação a última palavra sobre a matéria de facto. Não se verificam fundamentos, neste segmento. Não se verificando fundamentos da revista, no âmbito da matéria de facto, fica prejudicado o conhecimento das pretendidas alterações aos factos apurados, mantendo-se, por conseguinte, intacta a decisão da matéria de facto que foi fixada pelo Tribunal da Relação. É que, conforme nº 3 do art. 674º do CPC, “3 - O erro na apreciação das provas e na fixação dos factos materiais da causa não pode ser objeto de recurso de revista, salvo havendo ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova”. Pelo que, e resumindo, na fixação a matéria de facto pelas instâncias, a prova é livremente apreciada pelo julgador nas instâncias e, não cabe, em princípio, no âmbito do recurso de revista. Em princípio, o STJ como tribunal de revista limita-se a aplicar, aos factos definitivamente fixados pelo tribunal da Relação, o regime jurídico adequado -art. 682º, n.º 1 do C P C. As situações de exceção são, apenas, as referidas no n.º 3 do art. 674.º do CPC (citado). Como refere o Ac. do STJ de 07-02-2017, no Proc. nº 3071/13.6TJVNF.G1.S1, “o STJ só pode conhecer do juízo de prova fixado pela Relação quando tenha sido dado como provado um facto sem que tivesse sido produzida a prova que a lei declare indispensável para a demonstração da sua existência ou se tiverem sido violadas as normas reguladoras da força probatória de alguns meios de prova.” E a alegação da ré, de que o Tribunal a quo omitiu pronúncia acerca do recurso interposto da matéria de facto, incorrendo em nulidade, não tem fundamento. O Tribunal pronunciou-se, entendendo que tal matéria não tinha relevância e sustentando a posição reproduzindo a sentença: “No caso em análise, está em causa um dano resultante da actividade de distribuição de energia eléctrica, não um dano resultante da própria instalação, pois o Autor foi atingido por uma descarga eléctrica, não por qualquer elemento da instalação. Assim, o alegado pela EDP quanto ao estado de conservação da instalação e à sua conformidade com as regras técnicas, não releva para excluir a sua responsabilidade”. E como veremos adiante, com razão. E acrescenta: “De onde, dada a irrelevância apontada que subscrevemos, ser manifesta a improcedência da pretensão da Recorrente nessa parte. Resta-nos analisar o reivindicado pela mesma quanto aos pontos 108, 109, 111, 112, dos f.n.p., bem como o aditamento a que faz alusão na conclusão B30. Delimitados os termos de ambas as impugnações, vejamos se há sustentação para as modificações factuais nelas defendidas”. Pronunciando-se de seguida. Face ao que ficou dito, temos como improcedentes as conclusões dos recursos e, consequentemente, a improcedência das revistas do Autor e da Ré (neste segmento respeitante à matéria de facto). Recurso da R. -matéria de direito: Como já referido, a Ré questiona ainda a responsabilidade civil que lhe é imputada na sentença e no acórdão. Entende que os factos excluem a responsabilidade por culpa (presumida ou efetiva) da Ré e se verificam causas de exclusão, mesmo no âmbito da responsabilidade objetiva, designadamente a responsabilidade por culpa de terceiro e do próprio A.. É fundamentação do acórdão recorrido: “- A Recorrente Ré põe em causa a condenação de que foi alvo, desde logo, por, segundo defende, não ter ficado demonstrado o nexo causal entre o facto e o dano. Manifestamente não tem razão. Como bem argumenta o Recorrido/A. na resposta, em 6 da conclusão, “não há dúvida que a electrocussão derivou de uma descarga eléctrica, isto é, que o evento gerador dos danos foi uma descarga eléctrica, e que essa descarga proveio dos cabos da linha de condução da electricidade – logo, o nexo de causalidade … está mais do que demonstrado pelos factos dados como provados, que a Recorrente não contesta”. Como bem sinaliza o Tribunal a quo, no “caso em análise, está em causa um dano resultante da actividade de distribuição de energia eléctrica, não um dano resultante da própria instalação, pois o Autor foi atingido por uma descarga eléctrica, não por qualquer elemento da instalação.” – cfr. 10, da f.f. – daí ter enquadrado o caso, e bem, na previsão normativa do nº 1, 1ª parte, do artº 509º, enquanto responsabilidade “puramente objectiva” (cfr. Pires de Lima/Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª ed., com a colaboração de M. Henrique Mesquita, Coimbra Editora, Coimbra, 1987, pág. 525), só afastada em caso de força maior, cfr. nº 2, do mesmo preceito. Ora, como bem refere o Recorrido/A., na conclusão 12ª, da sua resposta, onde cita o Ac. do STJ proferido no processo nº802/14.0TBTNV.E1.S1 (a que já havia feito referência na conclusão 10ª, onde identifica outros Acórdão que seguiram idêntica orientação), “não consta dos factos provados, nem a Ré/Recorrente pugna por que passe a constar (pois isso não foi alegado por nenhuma das partes nem foi feita prova alguma sobre isso), a existência de uma força maior nem da sua causalidade adequada para a electrocussão, sendo certo que era de seu ónus alegar e provar os factos corporizadores de cal causa de força maior, bem como do nexo causal entre essa causa e os danos, nos termos do nº 2 do artº 342º do Código Civil”, o que não fez, “pelo que terá de suportar os efeitos negativos do ónus que sobre si impendia”. Assim, nenhum reparo há da nossa parte a fazer ao enquadramento jurídico feito na sentença recorrida, assente no acabado de expor, e à conclusão dele decorrente, i.e., a responsabilidade civil de onde emerge a obrigação de indemnizar o A., por parte da Ré EDP, pelos danos apurados, onde, naturalmente, se incluem os constantes da factualidade por nós decidida aditar”. Entende a recorrente verificar-se contradição com o decidido no ac. do STJ de 22-09-2011, no Proc. nº 1700/05.4TBPVZG.P1.SL (com voto de vencido) onde se concluiu que: “1.Circunscrevendo-se a actividade da ré “EDP-ENERGIAS DE PORTUGAL, SA” no âmbito de assegurar o serviço público de distribuição de energia eléctrica e incumbindo-lhe, ainda, proceder à vigilância, manutenção e conservação da rede de distribuição de energia eléctrica de média tensão, segue-se que o regime legal a aplicar-lhe há-de ser o que está previsto no n.° 1 do art.° 509.° do C.Civií (danos causados por instalações de energia eléctrica ou gás). 2. Deste normativo legal (art.° 509.° do C.Civil) se infere que só nestes contados três casos é que a “EDP” poderá ficar isenta de satisfazer ao … a indemnização pelo infortúnio que lhe sobreveio em consequência da descarga eléctrica que, através da linha aérea eléctrica e de um papagaio construído com aros de arame, o atingiu: - Provando que a instalação eléctrica, à sua guarda e manutenção, se encontrava conforme com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação; - Demonstrando que acidente resultou de caso de força maior, ou seja, de uma causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa; - Convencendo o tribunal de que o acidente resultou de culpa da própria vítima ou de terceiro. 3. Não pode imputar-se ao recorrente/lesado, menor de cinco anos de idade no momento em que sofreu a descarga eléctrica, culpa alguma da sua actuação para a ocorrência dos danos que comportou, porque a isso obsta o disposto no n.° 2 do artigo 488.° do Código Civil. 4. Todavia, afastado o juízo de culpa ao menor inimputável, continuam a valer do mesmo modo as considerações respeitantes à culpa dos seus representantes legais e das pessoas de quem ele se tenha utilizado nas circunstâncias em que se produziu o dano (culpa in vigilanão) e a quem a lei responsabiliza, igualmente, no caso de terem faltado aos seus deveres de guarda e protecção do menor (com a idade de cinco anos) e dessa omissão ter resultado o trágico evento que ora abordamos. Pelo exposto, nega-se a revista e confirma-se o acórdão recorrido”. No caso do acórdão fundamento, ficou provado e referente à atuação da vítima: “O embate do arame do papagaio com o cabo eléctrico originou uma descarga eléctrica que vitimou o autor. Na altura referida em 2 [em 26.01.92, pelas 16 horas], o autor levantou o braço direito, agarrou no arame e puxou o papagaio para si. Na altura referida em 2, o autor, sem precisar de fazer esforço nem de saltar, levantou o braço direito e puxou o papagaio para si. E recebeu de imediato uma descarga eléctrica, feita através dos referidos, linha aérea e papagaio”. No caso vertente, e face aos factos provados, não resulta que a vítima tivesse estabelecido contacto, nomeadamente através da cana de pesca de carbono, com a linha elétrica, apenas se fazendo referência ao comprimento (extensível) das canas de carbono e não daquela, em concreto, utilizada. Relevante é o facto “10) Cerca das 11:30 horas, quando se encontrava no pesqueiro que lhe foi atribuído, a participar a prova, AA (ora Autor) foi atingido por uma descarga elétrica, proveniente dos cabos de uma linha de transporte de energia elétrica que passava sobre o local onde se encontrava”. Como ocorreu a descarga, não resulta provado. A atuação concreta da vítima não resultou provada. Ignora-se se houve omissão de deveres de cuidado, da vítima ou de terceiros organizadores da prova, como alega a recorrente ré. Assim, entendemos que não ficou demonstrada a culpa do autor. E também não ficou demonstrada a culpa ré, apesar de esta desenvolver uma atividade considerada perigosa, pois que demonstrado ficou que as providências exigidas foram tomadas, já que a linha elétrica foi construída observando os ditames da lei em vigor e não se demonstrou qualquer deficiência da instalação, nem de manutenção. Conforme provado, facto “20) A EDP Distribuição – Energia, S. A. realizou diversas ações de manutenção nessa linha, designadamente, inspeções termográficas, inspeções visuais, limpezas de faixa de proteção, substituição e reparação de condutores, isoladores e seccionadores”. Mas verifica-se a responsabilidade objetiva. Como bem refere o Ac. da Rel. de Lisboa de 13-07-2017, no Proc. nº 6800/15.0T8LSB.L1-6, “O facto de terem sido cumpridas as regras técnicas em vigor, e tudo estar em perfeito estado de conservação, não isenta de responsabilidade objectiva a entidade responsável pela condução e entrega de energia eléctrica”. Dispõe o art. 509º do Cód. Civil: “1.–Aquele que tiver a direcção efectiva de instalação destinada a condução ou entrega da energia eléctrica ou do gás, e utilizar essa instalação no seu interesse, responde tanto pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da electricidade ou do gás, como pelos resultantes da própria instalação, excepto se ao tempo do acidente esta estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação. 2.–Não obrigam a reparação os danos devidos a causa de força maior; considera-se de força maior toda a causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa". E há que fazer a distinção na responsabilidade objetiva, entre a responsabilidade que possa resultar da instalação da energia elétrica e, a responsabilidade resultante da condução e entrega da mesma energia. E não isenta de responsabilidade na condução da energia o facto de a linha condutora se encontrar de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação. Na condução e entrega de energia elétrica, o facto de terem sido cumpridas, as regras técnicas em vigor e tudo estar em perfeito estado de conservação não isenta de responsabilidade a entidade responsável pela condução e entrega de energia. E este entendimento não vai em contrário do sufragado no acórdão fundamento, já que: - Tendo ficado provado que a instalação elétrica, à guarda e manutenção da Ré, se encontrava conforme com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação, não é a instalação da rede a causa do dano e da responsabilidade. - Não se demonstrou que o acidente resultou de caso de força maior, ou seja, de uma causa exterior independente do funcionamento e utilização da coisa, e só caso de força maior, que interferisse na condução e entrega de energia elétrica seria causa de afastamento da responsabilidade. - Assim como não resultou provado que o acidente resultou de culpa da própria vítima ou de terceiro. Pires de Lima e A. Varela em anotação ao art. 509º do seu Código Civil anotado distinguem a responsabilidade objetiva quanto aos danos resultantes da própria instalação, que consideram poder ser atenuada, ou afastada, se se provar que a instalação se encontrava “ao tempo do acidente, de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação”, da responsabilidade objetiva quanto aos danos resultantes da condução ou transporte e da entrega ou distribuição referindo-se-lhe com responsabilidade “já puramente objetiva”. Assim que se concorda com o enquadramento jurídico dos factos provados feito pelas Instâncias, na previsão normativa do nº 1, 1ª parte, do artº 509º, do Cód. Civil. A ré, porque tinha a direção efetiva da instalação destinada a condução e entrega da energia elétrica e porque utilizava essa instalação no seu interesse, responde pelo prejuízo que derive da condução ou entrega da eletricidade. Enquanto nos danos resultantes da própria instalação elétrica pode haver afastamento da culpa quando, ao tempo do acidente a instalação estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação, em relação aos danos derivados da condução e entrega da eletricidade, a responsabilidade só é afastada quando se verificar uma situação que exclui o nexo de causalidade, isto é, quando os danos são devidos a causa de força maior. Neste sentido o Ac. da Rel. de Co. de 04-04-2017, no Proc. nº 1347/15.7T8GRD.C1 que refere: “II - Quanto aos danos resultantes da condução ou entrega da electricidade ou do gás, quem tiver a direção efetiva da respectiva instalação e a utilizar no seu interesse só poderá evitar o dever de indemnizar os danos devidos aos efeitos da electricidade ou do gás se demonstrar que estes resultaram de causa de força maior – art.º 509º, n.º 2 - e no caso de danos provocados pela própria instalação, também se provar que esta, ao tempo do acidente, se encontrava em perfeito estado de conservação - artigo 509º, n.º 1. III - Na primeira hipótese, ao contrário da segunda, já não estamos perante a possibilidade de demonstração de uma situação que exclui a culpa, como forma de evitar a responsabilização pelos danos causados, mas sim perante a exigência de que se verifique uma situação que exclui o nexo de causalidade para que a responsabilidade seja excluída, o que revela que aqui a culpa não é requisito da responsabilização, sendo irrelevante a sua presença ou ausência, pelo que estamos perante um caso de responsabilidade objetiva”. A ré remete para o “conceito de força maior, como sendo toda a causa exterior independente do funcionamento ou utilização da coisa e nos casos de culpa da vítima ou de terceiros”, que é o conceito dado pelo nº 2 do art. 509 do Cód. Civil acrescentado pelos casos em que se verifica culpa. Mas não pode integrar o conceito de força maior qualquer causa exterior (pode ser causa de força maior um ciclone ou forte temporal, mas já não o será uma ventania forte, mesmo com algumas rajadas). No caso não se provou que tivesse acontecido “um fenómeno”, uma causa exterior e independente do funcionamento e utilização da linha elétrica que fosse causa da descarga. Não resulta provada a ocorrência de nenhum fenómeno (seja qual for a natureza) que não se pudesse evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências. Assim, só podemos concluir, como concluíram as Instâncias, pela responsabilidade civil objetiva da ré e consequentemente incorre no dever de indemnizar os danos sofridos pelo autor. Montante dos danos: A ré/recorrente considera valores excessivos face à matéria de facto provada e, ainda, aqueles que a jurisprudência vem fixando, os arbitrados pelo Tribunal da Relação, nos montantes de € 45.000,00 a título de danos morais e, € 11.500,00 a título de dano patrimonial futuro. Quanto aos danos futuros: Relativamente à indemnização a título de danos futuros verifica-se que o acórdão recorrido não se pronunciou (contabilizando a estipulada pelo Tribunal da 1ª Instância), apenas alterando e em resultado da alteração da matéria de facto ocorrida, a indemnização a título de danos não patrimoniais. Entendendo a ré que havia impugnado, no recurso de apelação, a indemnização arbitrada nesta sede pela 1ª Instância, como entendemos que impugnou (veja-se a conclusão nesse recurso “B61. Por outro lado, e no que tange ao valor de fixado a título de dano futuro de natureza patrimonial, considerando a idade de 59 anos, a IPP de 8%, que o A. não tinha rendimentos, o valor da RMN à data era de € 485,00, e a jurisprudência em casos semelhantes, torna-se claro que o valor de € 11.500,00 deve ser reduzido”), deveria neste recurso alegar a verificação de nulidade por omissão de pronuncia e para que este tribunal se pudesse pronunciar. Apesar de não ter alegado a ocorrência de nulidade, pretende a recorrente que este tribunal se pronuncie sobre questão não apreciada pelo Tribunal da Relação. Não é lícito que um recorrente invoque, em qualquer recurso, questões que não tenham sido objeto de apreciação pela decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação. No entanto diremos: Na determinação do montante da justa indemnização destinada a ressarcir danos futuros, perante a constatação da impossibilidade de averiguar o valor concreto dos danos, tem a jurisprudência recorrido ao juízo de equidade a que se reporta o art. 566º, n.º 3, do Cód. Civil, a partir dos elementos de facto apurados, conjugados com diversos critérios de cálculo de natureza instrumental. Factos relevantes são, nomeadamente: - Em consequência do acidente, o Autor é portador de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8%. - As sequelas de que o Autor é portador, em consequência do acidente, são, em termos de repercussão permanente na atividade profissional, compatíveis com o exercício da atividade habitual, mas implicam esforços suplementares. - A idade do autor (nasceu no dia XX/XX/1954). E outras sequelas que de danos físicos e morais sofridos que lhe dificultarão o aceder ao mercado de trabalho. Como refere o Ac. deste STJ de 10-11-2016, no Proc. nº 175/05.2TBPSR.E2.S1, “I. Ao avaliar e quantificar o dano patrimonial futuro, pode e deve o tribunal reflectir também na indemnização arbitrada a perda de oportunidades profissionais futuras que decorra do grau de incapacidade fixado ao lesado, ponderando e reflectindo por esta via na indemnização, não apenas as perdas salariais prováveis, mas também o dano patrimonial decorrente da inevitável perda de chance ou oportunidades profissionais por parte do lesado”. É inquestionável que o dever de indemnizar que recai sobre o lesante compreende os danos futuros, desde que previsíveis, quer se traduzam em danos emergentes ou em lucros cessantes. O art. 566º do Cód. Civil, consagra o princípio da reconstituição natural do dano, mandando o art. 562º reconstituir a situação hipotética que existiria se não fosse o facto gerador da responsabilidade e não sendo possível a reconstituição natural, não reparando a mesma integralmente os danos ou sendo excessivamente onerosa para o devedor, deve a indemnização ser fixada em dinheiro – nº 1. do art. 566º. E a indemnização pecuniária deve medir-se pela diferença entre a situação (real) em que o facto deixou o lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria sem o dano sofrido, diferença que se estabelece entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento. Deve atender-se aos danos futuros, nº 2, do art. 564º, desde que previsíveis, sendo que o nº 3, do art. 566º, confere ao tribunal a faculdade de recorrer à equidade quando não seja possível, designadamente face à imprecisão dos elementos de cálculo, fixar o valor exato dos danos. Assim, a lei prevê a indemnização dos danos futuros, exigindo tão só a sua previsibilidade. Constitui entendimento da jurisprudência que a indemnização a arbitrar por tais danos patrimoniais futuros deve corresponder a um capital produtor do rendimento de que a vítima ficou privada e que se extinguirá no termo do período provável da sua vida, determinado com base na esperança média de vida e não apenas em função da duração da vida profissional ativa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma. Não havendo fórmula exata de cálculo destes danos, a solução encontrada deve ser mitigada com o recurso à equidade. Perante os factos, a percentagem de incapacidade permanente do autor, a sua idade e a dificuldade acrescida de, na situação de desemprego encontrar um compatível, mesmo tendo em conta o ordenado mínimo, temos que não se vê razão para pôr em causa o montante da indemnização fixada equitativamente em 11.500,00€. Quanto aos danos não patrimoniais: O Tribunal da Relação alterou o montante arbitrado pela 1ª Instância, nesta sede, em resultado da alteração da matéria de facto (aditamento de factos julgados provados). Tendo em conta os factos provados, a partir do ponto nº 30: - Desfalecimento e inconsciência do autor após sofrer a descarga elétrica. - Sofreu queimaduras de 3.º grau, que atingiram 3% da superfície corporal, atingindo a zona do tórax à esquerda, zona tenar esquerda, mão esquerda, abdómen no flanco direito, hipocôndrio direito e na região da linha média axilar direita; - O período de internamento (inclusive na Unidade de Queimados). - As intervenções cirúrgicas para desbridamento de áreas queimadas e para plastia de defeito com avanço de retalhos locais. - Autor padeceu de dores pelas lesões sofridas, pelas cirurgias efetuadas e pelos tratamentos a que foi sujeito. - As cicatrizes que lhe resultaram. - Durante três meses, o Autor não conseguia arranjar-se e assegurar sozinho a sua higiene diária; - Dificuldades para dormir e descansar. - Os períodos de incapacidade que sofreu (total e parcial). - É portador de um défice funcional permanente da integridade físico-psíquica de 8%. - O dano estético permanente sofrido pelo Autor, em consequência do acidente, é quantificável no grau 3, numa escala crescente de 0 a 7. - Ficou a padecer de lesões com repercussão permanente nas atividades desportivas e de lazer, repercussão essa quantificável no grau 4, numa escala crescente de 0 a 7. - Na sequência da descarga elétrica que o atingiu, o Autor experienciou a iminência da sua morte, tendo pensado que estava irremediavelmente perdido, que estava malferido de morte e que não voltaria a ver os seus filhos. - O Autor andava sempre em tronco nu quando ia à praia marítima ou à praia fluvial, ou quando estava entre amigos, tendo deixado de fazer porque tem vergonha das cicatrizes que existem no seu tronco. - Devido ao acidente, durante três meses, o Autor claudicava na marcha de forma visível e pronunciada, sujeito a muito esforço para poder caminhar e vendo-se muitas vezes forçado a amparar-se para repousar. - O Autor deixou de conseguir fazer footing, de jogar futebol com os amigos, de praticar cicloturismo (bicicleta de estrada e BTT). - Em consequência do acidente, o ficou profundamente abalado e emocionalmente fragilizado, tendo-se tornado um homem nervoso, irritadiço. - O Autor tornou-se uma pessoa introvertida, descarregando a sua frustração naqueles que o rodeiam. - Antes do sinistro, o A. era uma pessoa alegre; – Era dinâmico; - Fazia a lida de casa; - Estimava o seu corpo; - Passou noites em claro. São factos provados e demonstrativos de danos não patrimoniais com gravidade suficiente para merecerem a tutela do direito. Para alterar a indemnização arbitrada nesta sede, refere o Tribunal da Relação: “Neste campo, como é sabido o tribunal tem, para fixar a correspondente indemnização, não que encontrar e ajuizar o "quanto as coisas valem", mas sim que encontrar "o quantum necessário para obter aquelas satisfações que constituem a reparação indirecta" (Galvão Telles, Direito das Obrigações, pág. 377). Aqui, o prejuízo, na sua materialidade, não desaparece, mas é economicamente compensado ou, pelo menos, contrabalançado. O dinheiro não tem a virtualidade de apagar o dano, mas pode este ser contrabalançado, "mediante uma soma capaz de proporcionar prazeres ou satisfações à vítima, que de algum modo atenuem ou, em todo o caso, compensem esse dano" (cfr. Pinto Monteiro, Sobre a Reparação dos Danos Morais, Revista Portuguesa do Dano Corporal, Setembro 1992, n.º 1, 1º ano, APADAC, pág. 20). A dificuldade de «quantificar» os danos não patrimoniais não pode servir de entrave à fixação de uma indemnização que procurará ser justa, correndo o risco, embora, de ser aleatória, tanto mais que, neste campo, repete-se, assume particular relevância a vertente da equidade. Na verdade, aqui, mais do que nunca, encontramo-nos na incerteza inerente a um imprescindível juízo de equidade (cfr.Ac. do STJ, de 20 de Novembro de 2001, in www.dgsi.pt, doc nº SJ200111200028836). À luz de todo o exposto, e tendo bem presente, para além do mais, o sofrimento que o A. já vivenciou e irá experienciar, devido ao descrito sinistro, e todo o mais apurado, leva-nos considerar desajustada – por manifestamente escassa - a importância de €20.000,00, globalmente fixada pela 1ª instância para tais danos, devendo este montante ser alterado para €45.000,00, por nos parecer mais adequado a alcançar os fins visados para este tipo de indemnização, em conformidade com o já dito atrás, chamando à colação os ensinamentos de Galvão Telles e de Pinto Monteiro”. Também nesta sede de indemnização por danos não patrimoniais, o princípio é o de que a indemnização deve calcular-se de acordo com a equidade, conforme o art. 496º, nº 4, do Cód. Civil. A fixação da indemnização em termos de equidade deve ter em conta as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida. Em caso de julgamento segundo a equidade, devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, aquelas regras. Aqui, o acórdão recorrido encontra-se fundamentado, demonstrando que foram considerados os critérios de avaliação dos danos de acordo com a legislação e a jurisprudência. Pelo que entendemos que é equitativo indemnizar os danos não patrimoniais sofridos pelo autor com o montante arbitrado (de acordo com critérios de equidade e não de forma arbitrária) pelo Tribunal da Relação. Assim, são julgadas improcedentes as conclusões dos recursos, e negam-se as revistas, mantendo-se o acórdão da Relação. * Sumário elaborado ao abrigo do disposto no art. 663 nº 7 do CPC: I - Verificando-se que o autor obteve decisão (acórdão) que lhe é mais favorável do que se fosse confirmação integral da sentença, conforme entendimento quer a doutrina, quer a jurisprudência, em situações como a que se verifica nos autos há dupla conforme, para efeitos do previsto no art. 671º, nº 3 do CPC. II - Por se verificar a dupla conforme e sem fundamentação essencialmente diferente, tal como define o nº 3 do art. 671º do CPC, não é de admitir o recurso como revista normal, relativamente à impugnação, pelo Autor, da matéria de direito. III - Falhado este requisito (conformidade decisória) inexiste dupla conforme. É necessário que se verifiquem todos os requisitos, enunciados no nº 3 do art. 671º do CPC, para que se verifique a dupla conforme. IV - A intervenção do STJ na decisão da matéria de facto está limitada aos casos previstos nos arts. 674º, nº 3 e 682º, nº 3, do CPC, o que exclui a possibilidade de interferir no juízo da Relação sustentado na reapreciação de meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação. V - Há que fazer a distinção na responsabilidade objetiva, entre a responsabilidade que possa resultar da instalação da energia elétrica e, a responsabilidade resultante da condução e entrega da mesma energia. VI - E não isenta de responsabilidade na condução da energia o facto de a linha condutora se encontrar de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação. VII - Enquanto nos danos resultantes da própria instalação elétrica pode haver afastamento da culpa quando, ao tempo do acidente a instalação estiver de acordo com as regras técnicas em vigor e em perfeito estado de conservação, em relação aos danos derivados da condução e entrega da eletricidade, a responsabilidade só é afastada quando se verificar uma situação que exclui o nexo de causalidade, isto é, quando os danos são devidos a causa de força maior. VIII- No caso não se provou que tivesse acontecido “um fenómeno”, uma causa exterior e independente do funcionamento e utilização da linha elétrica que fosse causa da descarga. Não resulta provada a ocorrência de nenhum fenómeno (seja qual for a natureza) que não se pudesse evitar, nem em si mesmo nem nas suas consequências. IX - Não é lícito que um recorrente invoque, em qualquer recurso, questões que não tenham sido objeto de apreciação pela decisão recorrida, pois os recursos são meros meios de impugnação das decisões judiciais pelos quais se visa a sua reapreciação e consequente alteração e/ou revogação. X - A indemnização pecuniária deve medir-se pela diferença entre a situação (real) em que o facto deixou o lesado e a situação (hipotética) em que ele se encontraria sem o dano sofrido, diferença que se estabelece entre a situação real atual e a situação hipotética correspondente ao mesmo momento. XI - A fixação da indemnização em termos de equidade deve ter em conta as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida. Em caso de julgamento segundo a equidade, devem os tribunais de recurso limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, aquelas regras. Decisão: Pelo exposto, acorda-se em julgar improcedentes os recursos admitidos, negam-se as revistas e, mantém-se o acórdão recorrido. Custas pelos recorrentes. Lisboa, 07-10-2021 Fernando Jorge Dias – Juiz Conselheiro relator Pedro Lima Gonçalves – Juiz Conselheiro 1º adjunto Maria Clara Sottomayor – Juíza Conselheira 2ª adjunta |