Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
| Processo: |
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| Nº Convencional: | 4ª SECÇÃO | ||
| Relator: | ANTÓNIO LEONES DANTAS | ||
| Descritores: | PENSÃO DE SOBREVIVÊNCIA SETOR BANCÁRIO SEGURANÇA SOCIAL APLICAÇÃO DA LEI NO ESPAÇO PRINCÍPIO DA IGUALDADE | ||
| Data do Acordão: | 05/14/2015 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA | ||
| Decisão: | NEGADA | ||
| Área Temática: | DIREITO CIVIL - LEIS, SUA INTERPRETAÇÃO E APLICAÇÃO. DIREITO CONSTITUCIONAL - DIREITOS E DEVERES FUNDAMENTAIS. DIREITO DO TRABALHO - DIREITO COLECTIVO ( DIREITO COLETIVO ) / ACORDO COLECTIVO DE TRABALHO ( ACORDO COLETIVO DE TRABALHO ). DIREITO PROCESSUAL CIVIL - PROCESSO DE DECLARAÇÃO / RECURSOS. | ||
| Doutrina: | - BAPTISTA MACHADO, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Almedina, 1990, pp. 233 e 234. - FERNANDO PINTO BRONZE, Lições de Introdução ao Direito, 2.ª Edição, Coimbra Editora, 2010, p. 860 e ss.. - J. J. GOMES CANOTILHO E VITAL MOREIRA, “Constituição da República Portuguesa” Anotada, Volume I, Coimbra Editora, 4.ª Edição, 2007, pp. 337-340, 819. - MARIA DO ROSÁRIO DA PALMA RAMALHO, Tratado de Direito do Trabalho, Parte III – Situações Laborais Coletivas, 2.ª Edição,2015, Almedina, 318. | ||
| Legislação Nacional: | ACT DO SETOR BANCÁRIO, CELEBRADO ENTRE AS MESMAS INSTITUIÇÕES E A FEBASE — FEDERAÇÃO DO SETOR FINANCEIRO, CUJO TEXTO CONSOLIDADO FOI PUBLICADO NO BOLETIM DO TRABALHO E EMPREGO, 1.ª SÉRIE, N.º 3, DE 22 DE JANEIRO DE 2011, DECORRENTES DAS ALTERAÇÕES ÀQUELE ACT INTRODUZIDAS PELO ACORDO COLETIVO PUBLICADO NO BTE, N.º 8 DE 29 DE FEVEREIRO DE 2012. CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 9.º, 10.º, 12.º, 13.º. CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL (CPC): - ARTIGO 608.º, N.º2, 636.º, N.ºS 1 E 2, 679.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 59.º, 63.º, 72.º. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 5 DE MAIO DE 2010, PROFERIDO NA REVISTA N.º 3870/06.5TTL5B.LL.SL, COM SUMÁRIO ACESSÍVEL EM WWW.STJ.PT ; -DE 30 DE ABRIL DE 2014, PROFERIDO NA REVISTA N.º 3230/11.6TTLSB.S1, DISPONÍVEL EM WWW.DGSI.PT . | ||
| Sumário : |
1 – O direito à pensão de sobrevivência consagrado nos n.º 6 e 7 da cláusula 140.ª do ACT dos bancários, na sequência da alteração publicada no BTE, n.º 8 de 29 de fevereiro de 2012, na falta de norma em contrário naquele ACT, está sujeito aos princípios decorrentes dos n.ºs 1 e 2 do artigo 12.º do Código Civil; 2 – As diferenças entre as prestações reconhecidas na cláusula 140.ª daquele ACT aos trabalhadores bancários ou seus familiares e as prestações reconhecidas na cláusula 142.ª do mesmo ACT, assentam na diversidade da relação dos trabalhadores abrangidos pelas duas cláusulas com o sistema de segurança social dos trabalhadores bancários. 3 - Nada na Constituição ou na lei obriga a que o cálculo das pensões seja igual para todos os trabalhadores, independentemente do regime de proteção social de que beneficiam, antes, sendo exigência do princípio da igualdade, o tratamento igual de situações de facto iguais e o tratamento diverso de situações de facto diferentes. | ||
| Decisão Texto Integral: |
Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:
I 1 - AA, intentou a presente ação emergente de contrato de trabalho contra “BANCO BB, SA”, pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe as seguintes quantias: a) € 6 273,18, a título de retroativos referentes aos montantes de pensão de sobrevivência em dívida, acrescida dos respetivos juros legais de mora vincendos, até efetivo e integral pagamento: b) € 348,51, a título de prestação mensal de pensão de sobrevivência. Invocou como fundamento da sua pretensão, em síntese, ter sido casada com CC, até 24 de setembro de 2002, data em que aquele faleceu. O seu marido foi admitido em março de 1969 ao serviço de um banco em Angola, onde trabalhou até novembro de 1975, data em que regressou a Portugal. Em abril de 1977, o marido da Autora começou a trabalhar para o “Banco DD, SA”, em regime de comissão de serviço, na sucursal daquele banco em França. A fim de ser integrado no sistema bancário português, a partir de fevereiro de 1980, o marido da Autora passou a trabalhar simultaneamente na sede do "Banco DD, SA", no Porto; e na agência daquele banco em França, o que sucedeu até 31 de março de 1998. Em 25 de março de 1998, o Autor e o "Banco DD, SA" celebraram um acordo de revogação do daquele contrato, com efeitos no dia 31 de março de 1998. Posteriormente, o "Banco DD, SA" extinguiu-se, por fusão com o banco aqui Réu. No ano de 2003, e na sequência do falecimento do marido ocorrido no ano anterior, a Autora requereu junto da Ré a atribuição de uma pensão de sobrevivência, o que foi indeferido pelo banco. Em 2009, a Autora voltou a formular novo pedido de idêntica natureza, o qual mereceu a mesma resposta de indeferimento; situação que se repetiu em setembro de 2012. Porém, de acordo com a nova versão do Acordo Coletivo de Trabalho para o Setor Bancário, resultante da alteração publicada em fevereiro de 2012, a Autora passou a ter direito à mencionada pensão de sobrevivência, por força do disposto nas Cláusulas 140.ª, n.º 6 e 142.ª, n.ºs 3 e 10 daquele instrumento de regulamentação coletiva do trabalho. 2 - A ação instaurada foi contestada pela Ré que impugnou parcialmente a factualidade alegada pela Autora e que, defendendo entendimento jurídico diverso, concluiu pela improcedência da ação, com a sua consequente absolvição do pedido. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, datada de 15 de julho de 2014, que julgou presente a ação improcedente absolvendo a Ré dos pedidos formulados pela Autora. 3 - Inconformada com esta decisão dela interpôs a Autora recurso, per saltum, para este Tribunal, nos termos do artigo 678.º do Código de Processo Civil, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: Terminou pedindo a revogação da sentença recorrida e a sua substituição «por outra que condene a Recorrida nos pedidos formulados pela Autora na ação». 4 - A Ré respondeu ao recurso interposto sustentando a improcedência do mesmo e pediu a ampliação do respetivo âmbito, nos termos do artigo 636.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, tendo apresentado, nesse âmbito, as seguintes conclusões: A Autora respondeu ao pedido de ampliação do âmbito do recurso, sustentando a respetiva improcedência. 5 - Neste Tribunal, o Exmº Procurador-Geral Adjunto proferiu parecer, nos termos do n.º 3 do artigo 87.º do Código de Processo de Trabalho, integrando a seguinte síntese conclusiva: 6 - Sabido que o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos do disposto nos artigos 635.º, n.º 3, e 639.º do Código de Processo Civil, ressalvadas as questões de conhecimento oficioso, está em causa na presente revista saber se é devida à Autora a pensão de sobrevivência prevista no n.º 6 da Cláusula 140.ª do ACT do Setor Bancário, publicado no B.T.E n.º 8, de 29 de fevereiro de 2012, por força do disposto no n.º 10 da cláusula 142.ª do mesmo ACT. Em caso de resposta negativa a esta questão, está em causa saber se a interpretação das normas subjacentes a essa interpretação, viola o disposto nos artigos 12.º, 13.º, 63.º, 59.º, 67.º e 72.º da Constituição da República; Em caso de procedência do recurso da Autora, por força da ampliação do respetivo âmbito, está ainda em causa na presente revista, saber se a inscrição do falecido marido da Autora na segurança social francesa obsta ao reconhecimento do direito à peticionada pensão de sobrevivência.
II Na sentença recorrida fixou-se a seguinte matéria de facto: «a) No dia 24 de dezembro de 1970, a Autora casou com CC, nascido em 08 de maio de 1944. b) No dia 06 de março de 1969, o marido da Autora foi admitido ao serviço do “Banco de FF, SARL”, sediado em Angola. c) O marido da Autora trabalhou para o banco mencionado em b) até ao dia 12 de novembro de 1975, altura em que regressou a Portugal, na sequência da guerra civil que assolou Angola. d) No âmbito dum despacho do Sr. Ministro das Finanças de 27/03/1976, foi constituído um Grupo de Trabalho composto por representantes da Secretaria de Estado do Tesouro; da Comissão de Retornados do Banco de Angola e da Comissão de Retornados da Banca Comercial. e) Esse Grupo de Trabalho elaborou um protocolo sobre as admissões dos retornados bancários nas instituições de crédito em Portugal (“Metrópole”), prevendo, além do mais, que: “(…) As admissões dos retornados bancários processar-se-ão em 2 fases. Na 1ª fase, as vagas que se verifiquem nas Instituições de Crédito serão preenchidas pelos bancários retornados de Angola até 12 de novembro de 1975 (…). (…) Somente serão de encarar admissões, não havendo assim lugar a transferências. (…) deverão ser respeitadas as condições estabelecidas pelo CCT em vigor e demais instrumentos reguladores do trabalho. (…) Para efeitos de reforma, o tempo de serviço prestado nas ex-colónias será contado desde que o interessado faça prova concludente. (…)”. f) Tal protocolo foi ratificado por despacho do Secretário de Estado do Tesouro, de 15/04/1976. g) No dia 01 de abril de 1977, o marido da Autora, por sua iniciativa, começou a exercer funções na sucursal de Paris do então “Banco DD, SA”, em regime de comissão de serviço. h) No dia 01 de fevereiro de 1980, o marido da Autora foi integrado nos quadros de pessoal do então “Banco DD, SA”, mantendo o exercício de funções na sucursal de Paris daquele banco. i) Nessa data, o marido da autora detinha a categoria profissional de executivo, com o nível 9, e com o reconhecimento de 24 anos e 2 meses de antiguidade no setor bancário. j) Em 25 de março de 1998, o marido da Autora e o então “Banco DD, SA”, subscreveram um documento, que denominaram de “REVOGAÇÃO DO CONTRATO DE TRABALHO POR ACORDO MÚTUO”, mediante o qual, entre outras coisas, declararam que: “(…) acordam em fazer cessar o contrato de trabalho, que celebraram e vigora desde 1 de fevereiro de 1980 (…) 1º O acordo agora celebrado produzirá efeitos a partir de 31 de março de 1998. 2º Como compensação pecuniária global foi acordada a quantia de 4 686 000$00 (…)”. k) Entre 01 de fevereiro de 1980 e 31 de março de 1998, o marido da Autora descontou para a “Caixa de Abono de Família dos Empregados Bancários”. l) O marido da Autora foi associado do “Sindicato dos Bancários do Norte”. m) No dia 20 de julho de 1998, o “Banco de EE, SA” procedeu à integração, por fusão, do “Banco DD, SA” e do “Banco GG, SA”, tendo de imediato a sociedade incorporante alterado a denominação para “Banco BB, SA”. n) CC faleceu no dia 24 de setembro de 2002, no estado de casado com a Autora. o) A Autora mantém-se no estado de viúva. p) No ano de 2003, a Autora requereu junto da Ré a atribuição de uma pensão de sobrevivência, por falecimento do seu marido. q) A Ré indeferiu tal pedido, com fundamento em o contrato de trabalho ter cessado por mútuo acordo em 31 de março de 1998. r) No ano de 2009, a Autora formulou à Ré novo pedido de atribuição de uma pensão de sobrevivência. s) A Ré respondeu através de carta datada de 07 de agosto de 2009, através da qual, entre outras coisas, lhe comunicou que: “(…) não lhe é devida pelo BB a atribuição de qualquer pensão de sobrevivência, na medida em que o seu marido estava abrangido pela segurança social francesa, para cujos regimes (geral e complementar) o Banco efetuou as devidas contribuições legais enquanto entidade patronal. Nestes termos, será da responsabilidade da segurança social francesa a atribuição da pensão de sobrevivência. (…) Relativamente ao tempo de serviço prestado (…) no ex-BCCI em Angola entre 1969 e 1975, (…) não é igualmente da responsabilidade do BB garantir-lhe o pagamento de qualquer pensão (…)”. t) Em 25 de setembro de 2012, a Autora requereu novamente junto da Ré a atribuição de uma pensão de sobrevivência pelo falecimento do seu marido. u) A Ré respondeu através [de] carta datada de 19 de outubro de 2012, indeferindo o requerido e reiterando o teor das anteriores comunicações enviadas à Autora. v) A Autora recebe da Segurança Social da República de França a quantia mensal de 391,24 €, a título de pensão de sobrevivência devida pelo falecimento do seu marido. w) A quantia mencionada em v) foi calculada com base nos salários auferidos pelo marido da Autora em França, e sobre os quais incidiram os respetivos descontos legais para a Segurança Social daquele país.»
III 1 – A autora pretende ver reconhecido o direito à pensão de sobrevivência prevista nos n.ºs 6 e 7 da cláusula 140.ª do ACT do setor bancário, celebrado entre as mesmas instituições e a FEBASE — Federação do Setor Financeiro, cujo texto consolidado foi publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1.ª série, n.º 3, de 22 de janeiro de 2011, decorrentes das alterações àquele ACT introduzidas pelo Acordo Coletivo publicado no BTE, n.º 8 de 29 de fevereiro de 2012, invocando como fundamento da sua pretensão o disposto no n.º 10 da cláusula 142.ª do mesmo ACT, decorrente da mesma alteração. Aquelas cláusulas do referido ACT, após as alterações em causa ficaram com a seguinte redação: «Cláusula 140.ª 1 — O trabalhador de instituição de crédito, sociedade financeira ou das antes designadas instituições parabancárias não inscrito em qualquer regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social garantido pelo presente acordo, terá direito, quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou invalidez presumível, ao pagamento, pelas referidas instituições e na proporção do tempo em que lhes tenha prestado serviço, de uma importância calculada nos termos do n.º 2 desta cláusula.Reconhecimento de direito em caso de cessação do contrato de trabalho 2 — Para efeitos do cálculo da mensalidade prevista no n.º 1 desta cláusula, a parte da pensão de reforma a pagar por cada instituição, correspondente ao tempo de serviço nela prestado, será calculada com base na retribuição do nível em que o trabalhador se encontrava colocado à data da saída do setor bancário, atualizada segundo as regras do presente ACTV, tomando‑se em consideração a taxa de formação da pensão do regime geral de segurança social. 3 — A verificação das situações de invalidez, fora do âmbito de qualquer regime de segurança social, será apurada por junta médica, constituída nos termos da cláusula 141.ª 4 — Para efeitos da contagem do tempo de serviço prestado no setor bancário, referido no n.º 1 desta cláusula, aplica -se o disposto nas cláusulas 17.ª e 143.ª 5 — No caso de o trabalhador não chegar a adquirir direitos noutro regime nacional de segurança social, a retribuição de referência para aplicação no disposto no n.º 1 desta cláusula será a correspondente à do nível em que aquele se encontrava colocado à data da saída do setor bancário, atualizada segundo as regras do presente acordo. 6 — Por morte dos trabalhadores a que se refere a presente cláusula, as pessoas designadas no n.º 3 da cláusula 142.ª têm direito a uma pensão de sobrevivência, no montante global de 60 % do valor da pensão de reforma que a instituição vinha a pagar ou que o trabalhador teria direito a receber da mesma, nos termos da presente cláusula, se se reformasse na data do seu falecimento. 7 — No caso de existência de uma pluralidade de beneficiários, o montante da pensão a que se refere o número anterior é repartido nos termos dos n.ºs 4 a 6 da cláusula 142.ª» «Cláusula 142.ª 1 — Por morte do trabalhador, as instituições concederão: a) Um subsídio por morte, calculado nos termos do regulamento do Centro Nacional de Pensões, ou igual à importância mensalmente recebida pelo falecido, a título de vencimento, ou pensão de doença ou invalidez, conforme o que se mostre, no caso concreto, mais favorável ao beneficiário; b) Uma pensão mensal de sobrevivência igual a 40 % do valor da retribuição mensal, constante do anexo II, com o mínimo do ordenado mínimo nacional; c) Um subsídio de Natal, no valor correspondente à pensão mensal de sobrevivência, a satisfazer em novembro; d) Um 14.º mês, no valor correspondente à pensão mensal de sobrevivência, a satisfazer em abril, sendo-lhe aplicável o princípio estabelecido no n.º 3 da cláusula 102.ªFalecimento 2 - A determinação dos beneficiários do subsídio previsto na alínea a) do número anterior far -‑se -á segundo as regras estabelecidas para a atribuição do subsídio por morte concedido pelo Centro Nacional de Pensões. 3 — São beneficiários da pensão de sobrevivência, do subsídio de Natal e do 14.º mês: a) Cônjuge sobrevivo ou pessoa que, à data da morte do trabalhador, viva com ele em união de facto há mais de dois anos, não estando qualquer deles casado ou, estando algum deles casado, se tiver sido decretada a separação judicial de pessoas e bens; b) Os filhos, incluindo os nascituros e adotados plenamente, até perfazerem 18 anos, ou 21 e 24 anos, enquanto frequentarem, respetivamente, o ensino médio, superior e, sem limite de idade, os que sofrerem de incapacidade permanente e total para o trabalho. 4 — As mensalidades referidas na alínea b), o subsídio de Natal referido na alínea c) e o 14.º mês referido na alínea d) do n.º 1 desta cláusula são atribuídos do seguinte modo: a) 50 % para o cônjuge sobrevivo ou para pessoa em união de facto; b) 50 % para os filhos ou adotados plenamente, nos termos definidos na alínea b) do número anterior; c) 100 % para os filhos ou adotados plenamente, nas condições da alínea b) do número anterior, no caso de o falecido não ter deixado cônjuge sobrevivo; d) 100 % para o cônjuge sobrevivo ou para pessoa em união de facto, se não existirem os beneficiários previstos na alínea b) do número anterior ou, no caso de existirem, não terem direito à pensão, subsídio de Natal e 14.º mês. 5 — A pensão de sobrevivência do cônjuge ou do unido de facto será mantida enquanto não contrair novo casamento ou iniciar nova união de facto. 6 — No caso de morte do beneficiário a que se refere o número anterior ou se este contrair novo casamento ou iniciar nova união de facto, a pensão reverte para os filhos do trabalhador, nas condições estabelecidas na alínea b) do n.º 3 desta cláusula. 7 — Quando algum ou alguns dos beneficiários deixarem de ter direito à pensão de sobrevivência, ao subsídio de Natal e ao 14.º mês, a sua parte acrescerá à dos restantes. 8 — A pensão de sobrevivência do cônjuge será atribuída se o trabalhador, à data da morte, estiver casado há mais de um ano com o beneficiário, não se aplicando esta condição se a morte tiver resultado de acidente. 9 — As atualizações do anexo II aplicam -se a todos os pensionistas, quer adquiram os direitos aqui previstos antes ou depois dessas atualizações. 10 — Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os pensionistas, quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor deste acordo.» 2 - À data do óbito do marido da Autora, ocorrido em 24 de setembro de 2002, as mencionadas cláusulas daquele instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, tinham a seguinte redação: «Cláusula 140.ª 1 — O trabalhador de instituição de crédito, sociedade financeira ou das antes designadas instituições parabancárias não inscrito em qualquer regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe de estar abrangido pelo regime de segurança social garantido pelo presente acordo, terá direito, quando for colocado na situação de reforma por invalidez ou invalidez presumível, ao pagamento, pelas instituições de crédito ou parabancárias, na proporção do tempo de serviço prestado a cada uma delas, da importância necessária para que venha a auferir de uma pensão de reforma igual à que caberia se o tempo de serviço prestado no setor bancário fosse considerado como tempo de inscrição no regime geral de segurança social, ou outro regime nacional mais favorável que lhe seja aplicável.Reconhecimento de direito em caso de cessação do contrato de trabalho 2 — Para efeitos do cálculo da mensalidade prevista no n.º 1 desta cláusula, a parte da pensão de reforma a pagar pelas instituições, correspondente ao tempo de serviço prestado no setor bancário, será calculada com base na retribuição correspondente ao nível em que o trabalhador se encontrar colocado à data da saída do setor, atualizada segundo as regras do presente ACTV, se outra não for mais favorável. 3 — A verificação das situações de invalidez, fora do âmbito de qualquer regime de segurança social, será apurada por junta médica, constituída nos termos da cláusula 141.ª 4 — Para efeitos da contagem do tempo de serviço prestado no setor bancário, referido no n.º 1 desta cláusula, aplica-se o disposto nas cláusulas 17.ª e 143.ª 5 — No caso de o trabalhador não chegar a adquirir direitos noutro regime nacional de segurança social, a retribuição de referência para aplicação no disposto no n.º 1 desta cláusula será a correspondente à do nível em que aquele se encontrava colocado à data em que deixou de estar abrangido pelo regime de segurança social deste acordo, atualizada segundo as regras do mesmo regime.»[1] «Cláusula 142.ª 1 — Por morte do trabalhador, as instituições concederão: a) Um subsídio por morte, calculado nos termos do regulamento do Centro Nacional de Pensões, ou igual à importância mensalmente recebida pelo falecido, a título de vencimento, ou pensão de doença ou invalidez, conforme o que se mostre, no caso concreto, mais favorável ao beneficiário; b) Uma pensão mensal de sobrevivência igual a 40 % do valor da retribuição mensal, constante do anexo II, com o mínimo do ordenado mínimo nacional; c) Um subsídio de Natal, no valor correspondente à pensão mensal de sobrevivência, a satisfazer em novembro; d) Um 14.º mês, no valor correspondente à pensão mensal de sobrevivência, a satisfazer em abril, sendo-lhe aplicável o princípio estabelecido no n.º 3 da cláusula 102.ªFalecimento 2 — A determinação dos beneficiários do subsídio previsto na alínea a) do número anterior far-se-á segundo as regras estabelecidas para a atribuição do subsídio por morte concedido pelo Centro Nacional de Pensões. 3 — São beneficiários da pensão de sobrevivência, do subsídio de Natal e do 14.º mês: a) Cônjuge sobrevivo; b) Os filhos, incluindo os nascituros e adotados plenamente, até perfazerem 18 anos, ou 21 e 24 anos, enquanto frequentarem, respetivamente, o ensino médio, superior e, sem limite de idade, os que sofrerem de incapacidade permanente e total para o trabalho. 4 — As mensalidades referidas na alínea b), o subsídio de Natal referido na alínea c) e o 14.º mês referido na alínea d) do n.º 1 desta cláusula são atribuídos do seguinte modo: a) 50 % para o cônjuge sobrevivo; b) 50 % para os filhos ou adotados plenamente, nos termos definidos na alínea b) do número anterior; c) 100 % para os filhos ou adotados plenamente, nas condições da alínea b) do número anterior, no caso de o falecido não ter deixado cônjuge sobrevivo; d) 100 % para o cônjuge sobrevivo, se não existirem os beneficiários previstos na alínea b) do número anterior ou, no caso de existirem, não terem direito à pensão, subsídio de Natal e 14.º mês. 5 — A pensão de sobrevivência do cônjuge será mantida enquanto se mantiver no estado de viuvez, revertendo, se o trabalhador não tiver deixado cônjuge sobrevivo, ou, por morte deste ou no caso de contrair novo casamento, a favor dos filhos do trabalhador, nas condições referidas na alínea b) do n.º 3 desta cláusula. 6 — Quando algum ou alguns dos beneficiários deixarem de ter direito à pensão de sobrevivência, ao subsídio de Natal e ao 14.º mês, a sua parte acrescerá à dos restantes. 7 — A pensão de sobrevivência será atribuída nos termos dos números anteriores desde que o trabalhador à data do seu falecimento, fosse casado há mais de um ano. 8 — As atualizações do anexo II aplicam-se a todos os pensionistas, quer adquiram os direitos aqui previstos antes ou depois dessas atualizações. 9 — Os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os pensionistas, quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor deste acordo.»[2] A comparação das duas versões do acordo coletivo de trabalho em análise, ou seja, a que se encontrava em vigor na data do óbito do marido da Autora e a que decorre das alterações ao mesmo instrumento de regulamentação coletiva, publicadas no BTE n.º 8, de 29 de fevereiro de 2012, em que aquela fundamenta a sua pretensão ao direito à pensão de sobrevivência, evidencia que o direito à pensão em causa não existia na data em que ocorreu aquele óbito, não prevendo, nessa altura, o mencionado acordo coletivo de trabalho, o reconhecimento do direito à pensão de sobrevivência ao cônjuge sobrevivo de trabalhador abrangido pela cláusula 140.º. Tal pensão estava, contudo, prevista naquele acordo relativamente aos cônjuges sobrevivos de trabalhadores abrangidos pela cláusula 142.º De facto, decorria da alínea c) do n.º 1 daquela cláusula, o reconhecimento ao cônjuge sobrevivo e aos filhos, nas condições discriminadas nos n.ºs 3, 4 e 5 daquela cláusula, de «uma pensão mensal de sobrevivência igual a 40 % do valor da retribuição mensal, constante do anexo II, com o mínimo do ordenado mínimo nacional». Já no âmbito desta cláusula 142.ª, no seu n.º 9, previa-se que «os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os pensionistas, quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor deste acordo». 3 - O universo de trabalhadores a que as duas cláusulas se dirigem é diverso e esse facto terá necessariamente que ser tomado em consideração na abordagem das questões que constituem o objeto do presente recurso. As cláusulas em causa integram-se no capítulo do ACT dedicado aos benefícios sociais, que, na versão em vigor, se inicia na cláusula 136.º Consagra-se neste capítulo um regime específico de segurança social dos trabalhadores bancários, que assenta na responsabilidade das instituições de crédito, conforme decorre daquela cláusula 136.º daquele instrumento de regulamentação coletiva. Em linhas gerais, a cláusula 140.ª consagra um complemento de reforma, reconhecido aos trabalhadores «não inscrito[s] em qualquer regime de segurança social e que, por qualquer razão, deixe[m] de estar abrangido[s] pelo regime de segurança social garantido pelo presente acordo», quando for[em] colocados na situação de reforma por invalidez ou invalidez presumível». Por seu lado, na cláusula 142.ª, estabelecem-se as prestações sociais devidas pela morte do trabalhador, onde se insere uma pensão de sobrevivência, a favor do cônjuge e dos filhos, nas condições descritas nos números 3 e 4 daquela cláusula. O universo de trabalhadores abrangidos por esta norma não coincide com o da cláusula 140.ª, estando em causa os trabalhadores que se mantêm beneficiários do regime de segurança social estabelecido neste ACT, na data em que ocorrem os factos que fundamentam a atribuição das referidas prestações. O universo de trabalhadores cuja morte origina o direito a estas prestações é o mesmo dos benificiários das prestações por doença ou invalidez previstos na cláusula 137.ª daquele ACT, que, para além do mais, estabelece as pensões de reforma devidas a estes trabalhadores. O n.º 1 desta cláusula delimita os beneficiários destas prestações por recurso à locução «trabalhadores em tempo completo». Estão em causa trabalhadores que mantêm a ligação ao regime de segurança social consagrado durante uma carreira e que se encontram nessa situação quando ocorrem os factos que fundamentam o reconhecimento das prestações ali previstas. Trata-se claramente de uma situação que nada tem a ver com a dos complementos de reforma estabelecidos na cláusula 140.ª para os trabalhadores que perderam, por qualquer motivo, a ligação com o referido regime de segurança social. 4 - Esta diferenciação da situação dos trabalhadores abrangidos pelas cláusulas em causa, nomeadamente a contraposição entre os beneficiários das prestações previstas na cláusula 137.ª, face aos beneficiários da prestação estabelecida na cláusula 140.ª, que se projeta igualmente noutras direções, foi já objeto de ponderação desta Secção, nomeadamente, no acórdão de 12 de dezembro de 2001, proferido no processo n.º 01S2552, citado na decisão recorrida, em termos que mantêm completa atualidade. Referiu-se, com efeito, naquele aresto, o seguinte: «Este entendimento respeita os aludidos princípios constitucionais e a diferença de regimes entre as cláusulas 137ª (só aplicável aos trabalhadores que se encontravam ao serviço da instituição bancária quando passaram para a situação de reforma) e 140ª justifica-se por contemplarem situações diversas: a diversidade entre uma carreira homogeneamente desenvolvida até ao seu termo no setor bancário (com um regime próprio de segurança social, caracterizado, além do mais, pela inexistência de contribuições, quer dos trabalhadores, quer das entidades patronais) e uma carreira heterogénea em termos de diversificados regimes de segurança social ou até incompleta (contemplando-se mesmo as situações em que o antigo trabalhador não adquiriu no âmbito de qualquer outro regime nacional de segurança social - situação prevista e regulada no n. 5 da citada cláusula 140ª.) É orientação que ora se reitera, pelo que cumpre revogar, neste ponto, o acórdão recorrido.»[3] Mantém inteira atualidade e continua válida a diferenciação do universo dos trabalhadores destinatários das cláusulas em causa, que se projeta igualmente na ponderação dos beneficiários da pensão estabelecida nos atuais n.ºs 6 e 7 da cláusula 140.ª que é reclamada pela Autora. Estes dispositivos, tal como acima se referiu, estabelecem, desde a alteração de 29 de fevereiro de 2012, uma pensão de sobrevivência a favor do cônjuge sobrevivo e dos respetivos filhos, em condições paralelas às estabelecidas para estes familiares do universo em geral dos trabalhadores, na cláusula 142.ª Deste modo para os familiares dos trabalhadores abrangidos pela cláusula 140.ª, para além do complemento de reforma acima referido, resultante dos n.ºs 1 a 5 daquela cláusula, o ACT consagra agora também uma pensão de sobrevivência para os respetivos familiares.
IV 1 – Está em causa na presente revista saber se a Autora tem direito a esta pensão, apesar de a mesma só ter sido criada pela alteração de 2012 do ACT, já depois do óbito do trabalhador bancário, que era seu marido, ocorrido em 24 de setembro de 2002. A alteração à cláusula 140.ª do acordo coletivo de trabalho publicada no BTE, n.º 8 de 29 de fevereiro de 2012 veio atribuir aos familiares dos trabalhadores bancários abrangidos por aquela cláusula o direito à pensão de sobrevivência prevista nos n.ºs 6 e 7 daquela cláusula. O direito à pensão em causa constitui-se com a morte do trabalhador bancário. No caso dos autos, o marido da Autora faleceu muito antes da entrada em vigor daquela alteração ao ACT. A autora fundamenta a sua pretensão à pensão em causa, para além do mais, no n.º 10 da cláusula 142.º do referido ACT, que prevê que «os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os pensionistas, quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor deste acordo». A pretensão da Autora e a determinação do sentido deste número suscita uma questão de aplicação da lei no tempo, exigindo-se uma abordagem, ainda que sumária, dos princípios que enquadram essa questão em termos de direito privado. 1.1 – Resulta do n.º 1 do artigo 12.º do Código Civil que «a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroativa, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular». Por sua vez, decorre do n.º 2 do mesmo artigo, que «quando a lei dispõe sobre as condições de validade substancial ou formal de quaisquer factos ou sobre os seus efeitos, entende-se, em caso de dúvida, que só visa os factos novos; mas quando dispuser diretamente sobre o conteúdo de certas relações jurídicas, abstraindo dos factos que lhe deram origem, entender-se-á que a lei abrange as próprias relações já constituídas, que subsistam à data da sua entrada em vigor». Na determinação do sentido desta norma a distinção entre facto que origina uma situação jurídica e a situação jurídica emergente desse facto assume uma dimensão estrutural para definir o âmbito de aplicação no tempo da lei. Em regra, a lei nova aplica-se às situações jurídicas já constituídas à data sua entrada em vigor, quando abstraia dos factos que deram origem a essas situações. Por sua vez, a lei que dispõe «sobre as condições de validade formal ou substancial de quaisquer factos», entende-se, em caso de dúvida, que só se aplica aos factos novos. BATISTA MACHADO sintetiza o regime decorrente desta norma, nos seguintes termos: «desenvolvendo o princípio da não retroatividade nos termos da teoria do facto passado, o art. 12.º, 2 distingue dois tipos de leis ou de normas: aquelas que dispõem sobre os requisitos de validade (substancial ou formal) de quaisquer factos ou sobre os efeitos de quaisquer factos (1.ª parte) e aquelas que dispõem sobre o conteúdo de certas situações jurídicas e o modelam sem olhar aos factos que a tais situações deram origem (2.ª parte). As primeiras só se aplicam aos factos novos, ao passo que as segundas se aplicam a relações jurídicas (melhor: Ss Js) constituídas antes da LN mas subsistentes ou em curso à data do seu IV» e prossegue, afirmando: «posto isto, poderíamos sintetizar a teoria da aplicação das leis no tempo distinguindo entre constituição e conteúdo das Ss Js. À constituição das Ss Js (requisitos de validade, substancial e formal, factos constitutivos) aplica-se a lei do momento em que essa constituição se verifica; ao conteúdo das Ss Js que subsistam à data da IV da LN aplica-se imediatamente esta lei, pelo que respeita ao regime futuro deste conteúdo e seus efeitos, com ressalva das situações de origem contratual relativamente às quais poderia haver como que uma “sobrevigência” da LA».[4] Por sua vez, FERNANDO PINTO BRONZE perspetiva uma sinopse dos princípios estruturantes da problemática da concorrência de normas no tempo, referindo que: «os facta praeterita (as situações jurídicas definitivamente estabilizadas antes de uma alteração legislativa, e os seus efeitos) são regulados pela lei antiga. É também o direito anterior a uma hipotética alteração legislativa que determina os efeitos de quaisquer relações jurídicas constituídas durante a respetiva vigência – o que significa: α) se uma concreta relação jurídica se tiver definitivamente constituído, modificado ou extinguido sob a égide do direito anteriormente em vigor, não pode a lei nova vir considerá-la como não constituída, não modificada ou não extinta; β) o conteúdo conformador de uma dada relação jurídica é modelado, até ao momento em que se opere uma alteração legislativa que se lhe refira, pelo direito anterior; e, γ) se o direito em vigor no momento em que ocorre um certo facto lhe não reconhecer um determinado efeito jurídico – se ele não gerar então, v. gr., qualquer responsabilidade – não pode a lei nova vir imputar-lhe esse efeito relativamente ao período anterior à sua entrada em vigor. Pelo que respeita às relações jurídicas de caracter duradouro (…), constituídas antes da entrada em vigor de uma alteração legislativa, sobre elas incidente, e que continuam a produzir os seus efeitos, dir-se-á que razões suficientemente ponderosas de interesse público podem determinar a respetiva submissão, para o futuro, (…), ao novo regime jurídico, contanto que desse modo se não vilipendie a intencionalidade normativo-constitucional do princípio da autonomia da vontade».[5] 1.2 - As convenções coletivas de trabalho são fontes de direito específicas do Direito de Trabalho, tendo natureza regulamentar a parte mais significativa das normas que as integram, nomeadamente, as que incidem sobre a prestação de trabalho, pelo que a respetiva interpretação e aplicação está sujeita aos critérios gerais do sistema jurídico, consagrados nos artigos 9.º e 10.º do Código Civil. Do mesmo modo, os conflitos de sucessão no tempo de normas integradas naquelas fontes de direito, fora dos casos em que estejam a coberto de dispositivos específicos, tal como os que decorrem do artigo 478.º do Código do Trabalho, ou dos artigos 7.º a 10.º da Lei n.º 7/2009,de 12 de fevereiro, estão, igualmente sujeitas, aos princípios gerais do sistema jurídico, consagrados no artigo 12.º e 13.º do Código Civil. Conforme refere MARIA DO ROSÁRIO DA PALMA RAMALHO, «como qualquer outro instrumento normativo, os instrumentos de regulamentação coletiva de trabalho apenas dispõem para o futuro. Neste sentido e em consonância com o regime geral (artigo 12.º, n.º 1 do CC), o art. 478.º n.º1 c) do CT estabelece que estes instrumentos não podem conferir eficácia retroativa às suas cláusulas»[6]. É neste quadro legal que haverá que ensaiar a resposta à questão suscitada. 2 – A recorrente invoca também como fundamento da sua pretensão a norma do n.º 10 da cláusula 142.ª do ACT, que refere que «os direitos previstos nesta cláusula aplicam-se a todos os pensionistas, quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor deste acordo». Este número desta cláusula corresponde ao n.º 9 da referida cláusula, na redação consolidada do ACT publicada no BTE n.º 3, de 22 de janeiro de 2011. Trata-se de uma disposição específica desta cláusula 142.ª que não tem paralelo na cláusula 140.ª que prevê a pensão de sobrevivência reclamada pela Autora e consagra uma específica solução, em termos de aplicação das normas no tempo, que já existia na referida cláusula 142.ª, na versão daquele ACT publicada no BTE, n.º 31 de 22 de agosto de 1990, onde já tinha o n.º 9. Decorre daquela cláusula que os benefícios consagrados a favor dos pensionistas são devidos mesmo que os factos que constituem os direitos em que aqueles benefícios se materializem tenham ocorrido antes da entrada em vigor do ACT. Ao referir-se à aquisição de direitos derivados do ACT antes da sua entrada em vigor, «quer tenham adquirido esses direitos antes ou depois da entrada em vigor», o que se pretende é reconhecer eficácia constitutiva de direitos a factos ocorridos antes da entrada em vigor do mesmo instrumento de regulamentação coletiva de trabalho, embora esses direitos só se consolidem com a referida entrada em vigor. Trata-se no fundo de um âmbito de eficácia da nova versão daquela cláusula, que, conforme se referiu, não tem correspondência na cláusula 140.ª daquele ACT. Voltando ao caso dos autos. 3 - À luz das considerações acima tecidas, constata-se que o direito à pensão de sobrevivência dos cônjuges sobrevivos e filhos de trabalhadores abrangidos pela cláusula 140.ª decorre da alteração do ACT de 2012, surgindo esse direito com o óbito do trabalhador bancário que se encontre nas condições referidas naquela cláusula. No caso do marido da Autora, o óbito ocorreu em 24 de setembro de 2002. Deste modo, na data em que ocorreu o facto do qual aquele instrumento de regulamentação coletiva faz decorrer o direito à pensão de sobrevivência, esse facto não tinha qualquer eficácia jurídica relativamente à constituição desse direito, uma vez que nessa data não era reconhecido aos familiares daqueles trabalhadores o direito a essa pensão. Por outro lado, o facto de nessa data o óbito do trabalhador não fundamentar a constituição daquele direito, ou de outro qualquer, em sede de prestações sociais, determina que com esse óbito não se tenha constituído qualquer situação jurídica que se mantivesse aberta, mais tarde, na data em que veio a entrar em vigor aquela alteração ao ACT. Deste modo, na data em que ocorreu o óbito do marido da Autora, tal óbito não tinha qualquer relevo como fundamento do direito a prestações socias, sendo, nesta sede, um facto juridicamente irrelevante, não decorrendo do mesmo a constituição de qualquer situação jurídica. Neste cenário é forçoso concluir, em termos de concurso de normas no tempo, nos termos do n.º 2 do artigo 12.º do Código Civil, que a alteração do ACT de 2012 só fundamenta a constituição do direito à pensão de sobrevivência relativamente aos óbitos ocorridos após a sua entrada em vigor. Carece, deste modo, de qualquer fundamento a pretensão da Autora de ver afirmado o seu direito a essa pensão com base na norma de n.º 10 da cláusula 142.ª Tal como acima se referiu, as cláusulas em causa têm como destinatários trabalhadores em situação diversa, havendo razões válidas para autonomizar a situação em termos de prestações sociais dos universos abrangidos por cada uma das cláusulas. Por outro lado, aquele número 10 integra a cláusula n.º 142, na linha da anterior versão da mesma cláusula, mesmo da que se encontrava em vigor na data do óbito do Autor, não tendo sido integrada disciplina análoga na referida cláusula 140.ª Ora, estamos perante um instrumento normativo de base negocial, sendo líquido que as partes conheciam a especificidade dos dois universos de trabalhadores abrangidos, o que evidencia a intencionalidade de não estender a disciplina do n.º 10 da cláusula 142.ª, para o universo da cláusula 140.ª
Improcedem, deste modo, as conclusões 1.ª a 11.ª das alegações da recorrente.
V 1 – Nas conclusões 12.ª a 15.ª das alegações que apresentou suscita a recorrente várias questões de constitucionalidade relativamente à interpretação feita na decisão recorrida das normas dos n.ºs 6 da cláusula 140.ª, e 12 da cláusula 142.ª do ACT. Refere que a interpretação dessas cláusulas, que não lhe reconheceu o direito à pretendida pensão de sobrevivência, «viola os princípios da igualdade e da segurança social plasmados nos 13.º e 63° da Constituição da República Portuguesa» e que «a não atribuição do direito à reclamada pensão de sobrevivência à Recorrente, pelo facto do seu marido não ter falecido após a entrada em vigor do novo ACT de 2011, (…) reveste tratamento não igualitário e apoiado em fundamentação não racional, justa e objetiva». Termina referindo que «na sentença recorrida foram violadas as normas convencionais e legais supra referidas, tendo a sentença feito uma errónea interpretação e aplicação da lei pertinente aos factos provados, bem como desrespeitou as normas e os princípios constitucionais relativos à universalidade, à igualdade de tratamento e da não discriminação, à segurança social, à proteção da família e à proteção da terceira idade, previstos, nomeadamente, nos arts. 12.°, 13.°, 59º, 63º, 67.° e 72.° da CRP». No Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça, de 30 de abril de 2014, proferido na Revista n.º 3230/11.6TTLSB.S1[7] ponderou-se, a propósito do Princípio da Igualdade, que «o artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa contém (...) um dos princípios fundamentais e estruturantes de qualquer Estado de Direito Democrático (artigo 2.º, da Lei Fundamental) e, enquadrando-se na parte reservada aos Direitos e Deveres Fundamentais (Parte I, Título I, do texto constitucional português), partilha, com os demais direitos e deveres fundamentais, da característica da aplicabilidade direta, bem como da vinculação a ele de todos os entes públicos e privados». Segundo J. J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, «a base constitucional do princípio da igualdade é a igual dignidade social de todos os cidadãos - que, aliás, não é mais do que um corolário da igual dignidade humana de todas as pessoas (cfr. art. 1.º) -, cujo sentido imediato consiste na proclamação da idêntica "validade cívica" de todos os cidadãos, independentemente da sua inserção económica, social, cultural e política, proibindo desde logo formas de tratamento ou de consideração social discriminatórias. O princípio da igualdade é, assim, não apenas um princípio de disciplina das relações entre o cidadão e o Estado (ou equiparadas), mas também uma regra de estatuto social dos cidadãos, um princípio de conformação social e de qualificação da posição de cada cidadão na coletividade»[8]. Uma das manifestações essenciais do princípio da igualdade consiste na proibição do arbítrio que mais não significa senão a proibição de tratar desigualmente situações materialmente idênticas, com base em critérios subjetivos e sem justificação razoável, bem como na proibição do tratamento igualitário de situações que, na sua essência, são desiguais. «Nesta perspetiva, o princípio da igualdade exige positivamente um tratamento igual de situações de facto iguais e um tratamento diverso de situações de facto diferentes»[9]. Do princípio da igualdade decorre, também, a proibição da discriminação que, não significando ou impondo uma exigência de igualdade absoluta nem impedindo as diferenciações de tratamento, qualifica como de fatores ilegítimos de discriminação aqueles que, previstos a título exemplificativo, constam do n.º 2 do artigo 13.º. Em rigor, e como nos dizem os autores citados, «o que se exige é que as medidas de diferenciação sejam materialmente fundadas sob o ponto de vista da segurança jurídica, da proporcionalidade, da justiça e da solidariedade e não se baseiem em qualquer motivo constitucionalmente impróprio. As diferenciações de tratamento podem ser legítimas quando: (a) se baseiem numa distinção objetiva de situações; (b) não se fundamentem em qualquer dos motivos indicados no n.º 2; (c) tenham um fim legítimo segundo o ordenamento constitucional positivo; (d) se revelem necessárias, adequadas e proporcionadas à satisfação do seu objetivo»[10]. Na situação materializada pela recorrente não se vislumbra qualquer afronta ao princípio da igualdade, nos termos em que fica caracterizado. Na verdade, nada na lei obriga a que o cálculo das pensões seja igual para todos os trabalhadores, independentemente do regime de proteção social de que beneficiam (cfr., neste sentido, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 5 de maio de 2010, proferido na Revista n.º 3870/06.5TTL5B.Ll.Sl, com sumário acessível em www.stj.pt) sendo, ainda, certo que o caso trazido pela recorrente aponta para carreiras contributivas qualitativa e quantitativamente diversas, a demandar tratamento diferenciado, justamente por apelo ao referido princípio da igualdade. A interpretação das normas das referidas cláusulas subjacente à decisão recorrida não colide, deste modo, com o princípio da igualdade, consagrado no artigo 13.º da Constituição da República e, muito menos, com o princípio da universalidade, consagrado no seu artigo 12.º, que não é posto em causa pela sujeição do direito a prestações sociais a critérios objetivos legalmente previstos. 2 - A recorrente entende que a interpretação em causa colide com o artigo 63.º da Constituição da República. Refere que «caso o regime previsto no n.º 6 da cláusula 140.ª do ACTV de 2011 não seja interpretado como sendo de aplicação imediata aos óbitos ocorridos anteriormente à data da sua entrada em vigor, o mesmo seria claramente inconstitucional, com fundamento na violação do direito à proteção social [previsto] no art. 63.º da Constituição da República Portuguesa consagrado no capítulo II (direitos e deveres sociais) do Título III (direitos e deveres económicos sociais e culturais). Estende tal juízo à aplicação do n.º 12 da Cláusula 142.ª do mesmo ACT, invocando também as normas dos artigos 13.º e 59.º da Lei Fundamental. A pretensão da Autora, ou seja o reconhecimento do direito a uma pensão de sobrevivência criada após a ocorrência do facto que lhe serviria de fundamento – o óbito do seu marido – viola, conforme acima se referiu, princípios fundamentais do sistema jurídico relativamente à sucessão de leis no tempo, nomeadamente, os que decorrem do artigo 12.º do Código Civil. Invocando o artigo 63.º da Constituição da República, pretende a recorrente uma interpretação daqueles princípios que lhe reconheça o direito à pensão de sobrevivência, abstraindo das razões que levam ao não reconhecimento desse direito. A verdade é que «a Constituição é omissa sobre o sistema de pensões e prestações do sistema de segurança social, bem como sobre os critérios da sua concessão e do seu valor pecuniário, ficando essa matéria na livre disposição do legislador, observando os princípios constitucionais pertinentes (igualdade, proporcionalidade, etc.). Isso inclui o direito de alterar as condições e requisitos de fruição e cálculo das prestações (designadamente das pensões) em sentido mais exigente, desde que por motivos justificados»[11]. Acresce que os direitos dos trabalhadores consagrados no artigo 59.º da Constituição, na medida em que envolvam o direito a prestações sociais, estão sujeitos aos princípios que emergem do artigo 63.º da Lei Fundamental, não concretizando sequer a recorrente a medida em que a interpretação das cláusulas em causa colide como o referido artigo 59.º. Por outro lado, relegando a Constituição para a legislação ordinária a conformação concreta das prestações do sistema de segurança social, o que há que indagar é se a solução adotada na decisão recorrida, relativamente à sucessão de leis no tempo, no que se refere ao reconhecimento do direito à pensão de sobrevivência, respeita ou não os mencionados princípios fundamentais. Ora a aplicação à verificação dos pressupostos das prestações da segurança social dos princípios gerais em matéria de sucessão de leis no tempo não colide com os princípios fundamentais que enformam o estatuto dos direitos fundamentais e, tal como acima se referiu, dá execução a alguns desses princípios, nomeadamente o princípio da confiança. Com efeito, decorrendo as prestações em causa de um instrumento de natureza negocial, produto da vontade das partes, e não existindo quaisquer elementos que permitam afirmar que elas quiseram a aplicação pretendida pela recorrente, violaria o princípio da proteção da confiança impor, à revelia da vontade das partes, a aplicação da norma em causa no sentido invocado pela recorrente. Por outro lado, os critérios que estão subjacentes à definição dos pressupostos das prestações em causa e que foram acolhidos na decisão recorrida não violam os princípios da igualdade, tal como acima se demonstrou, ou outros princípios constitucionais, nomeadamente o da proporcionalidade, constituindo uma base objetiva equilibrada para a efetivação das prestações que integram o sistema de segurança social constitucionalmente reconhecido. Do mesmo modo, carece de qualquer fundamento a afirmação da recorrente de que a interpretação subjacente à decisão recorrida violaria também os direitos dos trabalhadores referidos no artigo 59.º da Constituição, os princípios constitucionais relativos à família, decorrentes do artigo 67.º daquele diploma, e à proteção da terceira idade, consagrados no artigo 72.º da Lei Fundamental. A salvaguarda destes valores, na medida em que os mesmos possam comportar o direito a prestações, efetiva-se através do sistema de segurança social nas condições acima referidas. Improcedem, deste modo, as conclusões 12.ª a 15.ª das alegações da recorrente. 3 – A improcedência do recurso interposto pela Autora prejudica o conhecimento da ampliação do respetivo objeto, requerido pela Ré, nos termos do n.º 1 do artigo 636.º do Código de Processo Civil, relativo a parte da defesa de que o Tribunal não conheceu. Por tal motivo, não se conhece da matéria da referida ampliação, nos termos do artigo 608.º, n.º 2, do mesmo código, aplicável aos acórdãos proferidos pelo Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do disposto nos conjugados artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do citado Código. VI Nestes termos, acorda-se em negar a revista e confirmar a decisão recorrida. Custas da revista pela recorrente. Junta-se sumário do acórdão.
Lisboa, 14 de maio de 2015
António Leones Dantas (relator)
Melo Lima
Mário Belo Morgado _______________ |