Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
108/24.7YRLSB.S1
Nº Convencional: 1ª SECÇÃO
Relator: HENRIQUE ANTUNES
Descritores: REVISÃO DE SENTENÇA ESTRANGEIRA
DECISÃO ARBITRAL
IMUNIDADE JURISDICIONAL
ESTADO
ORDEM PÚBLICA INTERNACIONAL
TRIBUNAIS PORTUGUESES
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
ABUSO DO DIREITO
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRESSUPOSTOS
Data do Acordão: 07/09/2025
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I - Dado que a imunidade de jurisdição do Estado constitui uma prerrogativa ou um privilégio disponível, o Estado que, expressa ou tacitamente, consentiu no exercício da jurisdição por Estado estrangeiro, designadamente no reconhecimento de uma sentença arbitral estrangeira, não deve ser admitido a opor, ao pedido desse reconhecimento, a excepção da imunidade de jurisdição.

II - O recurso à cláusula de ordem pública internacional material do Estado português, enquanto fundamento de recusa da confirmação da sentença arbitral estrangeira, só deve admitir-se quando o reconhecimento da decisão dos árbitros viole de forma inaceitável a ordem jurídica portuguesa, por atentar contra um princípio fundamental, pelo que, a fim de respeitar a proibição de revisão de mérito da decisão arbitral estrangeira, esse atentado deve constituir uma violação manifesta, ostensiva, patente, de uma regra de direito considerada essencial ou de um direito reconhecido como fundamental, o que só sucederá se o reconhecimento conduzir a um resultado absolutamente intolerável ou chocante, de todo não assimilável pela ordem e pela comunidade jurídica portuguesas.

Decisão Texto Integral:
Proc. 108/24.7YRLSB.S1

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

1. Relatório.

O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão proferido no dia 25 de Fevereiro de 2025, julgou procedente a acção de revisão e confirmação de sentença estrangeira, com processo especial, proposta por Gold Reserve Inc. contra a República Bolivariana da Venezuela e confirmou e reconheceu a Sentença Arbitral proferida, por unanimidade, em..., França, a 22 de setembro de 2014, pelo Tribunal Arbitral constituído ao abrigo das ICSID Additional Facility Rules, composto pelos Árbitros Professor Pierre-Marie Dupuy, Professor David A.R Williams QC e Professor Piero Bernardini, com sede em ..., França, no âmbito do processo ICSID n.º .../09/1, na qual se condenou a ré a pagar à autora:

i) uma compensação no montante de USD 713.032.000,00, acrescido de juros vencidos desde 14 de abril de 2008 até à data da prolação da Sentença Arbitral, calculados à taxa de juro para os Bilhetes do Tesouro do Governo dos Estados Unidos, composta anualmente, o que correspondia a USD 22.299.576,00 à data da prolação da Sentença Arbitral, perfazendo um total de USD 735.331.576,00;

(ii) os juros vincendos sobre o montante total referido em (i), à taxa LIBOR acrescida de 2%, compostos anualmente, desde a data de prolação da Sentença Arbitral até ao pagamento integral; e

(iii) a reembolsar a Autora o montante de USD 5.000.000,00, a título de compensação pelos custos e despesas incorridos pela Autora com a arbitragem.

A requerida interpôs deste acórdão recurso ordinário de revista, no qual pede a sua revogação e substituição por outro que julgue improcedente a acção.

Os fundamentos do recurso, expostos nas bem numerosas conclusões, são os seguintes:

A. O presente recurso tem por objeto o Acórdão Recorrido, proferido pelo Tribunal da Relação de Lisboa no passado dia 21.02.2025, que julgou procedente a ação interposta pela Recorrida em 04.01.2024, reconhecendo a Sentença Arbitral proferida.

B. Para o efeito, acordaram os Venerandos Desembargadores em julgar procedente a presente ação, considerando, em síntese, que: (i) As normas CNI vigoram na ordem interna portuguesa e têm primazia sobre o direito interno; (ii) Inexiste a invocada imunidade de jurisdição, porque a ação em causa é apenas de reconhecimento da sentença arbitral e não de execução; porque a Recorrente renunciou à sua imunidade de jurisdição; e porque consentiu no exercício da jurisdição se tiver consentido expressamente no exercício da jurisdição por acordo internacional; (iii) Não se verifica qualquer violação da Ordem Pública Internacional, porquanto o Tribunal esclareceu que a mesma se refere aos princípios fundamentais do direito que são essenciais para a moralidade e justiça, só sendo admissível a invocação da ordem pública internacional onde a aplicação da lei estrangeira resultaria numa ofensa intolerável aos princípios ético-jurídicos da comunidade portuguesa.

C. A solução do Acórdão Recorrido consolida uma situação de abuso de direito da Recorrida, aceitando colocar em causa a estabilidade da ordem pública internacional do Estado Português, desconsiderando, para o efeito, vários argumentos tecidos pela Recorrente. Razões pelas quais não se pode admitir o sentido decisório do Acórdão Recorrido. Vejamos.

D. Tendo em consideração o disposto no artigo 5.º da Convenção das Nações Unidas Sobre Imunidades Jurisdicionais dos Estados (CNUIJ), os Estados devem garantir imunidade de jurisdição, abstendo-se de exercer a sua jurisdição num processo judicial instaurado nos seus tribunais contra outro Estado e, para esse fim, devem atuar com a preocupação que os seus tribunais determinem oficiosamente que a imunidade desse outro Estado seja respeitada.

E. Atendendo-se ao disposto no artigo 7.º da referida Convenção, e contrariamente ao entendimento do Tribunal a quo, o disposto no referido artigo não é, per si, suficiente para afastar a imunidade de jurisdição que a Recorrente invoca no âmbito dos presentes autos.

F. A Recorrente é um Estado soberano e, como tal, goza de imunidade de jurisdição, pelo que, nessa medida, não pode ser sujeita à jurisdição de tribunais de outros Estados sem o seu consentimento expresso.

G. Pelo que, é com enorme espanto que a Recorrente constata que o Tribunal a quo considera que “a presente ação é apenas de reconhecimento”, e que, consequentemente, “não cabe, nesta sede, invocar (nem verificar), a imunidade do Estado da Venezuela à execução daquela Sentença”.

H. Este entendimento é, nada mais, que um “lavar de mãos” por parte do Tribunal a quo, que pretende limitar-se a reconhecer a sentença em território nacional, não querendo atender às suas implicâncias e à ratio das convenções internacionais.

I. Embora a ação objeto dos presentes autos seja de reconhecimento, a decisão sobre a imunidade de execução está intrinsecamente ligada à decisão de reconhecimento, uma vez que, por uma dedução lógica, a viabilidade da futura execução influencia, necessariamente, a decisão de reconhecer a sentença.

J. Em bom rigor, o reconhecimento de uma sentença arbitral estrangeira tem como objetivo permitir a sua execução no país onde o reconhecimento é solicitado. Se, desde logo, se verificar que a execução é inviável devido à imunidade do Estado, o reconhecimento perde qualquer efeito prático.

K. É, pois, neste sentido, que o Tribunal, quando confrontado com uma situação deste teor, deve realizar uma análise prospetiva para determinar se a execução da sentença é possível, considerando, para o efeito, as normas de direito internacional sobre imunidade - A este respeito, atente-se ao disposto no artigo 706.º, n.º 1 do CPC.

L. Assim, rapidamente nos vemos forçados a concluir que a questão da imunidade de execução é relevante para efeitos da decisão sobre o reconhecimento da sentença arbitral e que o Tribunal a quo andou mal ao considerar que não lhe competia verificar a imunidade da Recorrente à execução da Sentença Arbitral.

M. Ora, importa ainda esclarecer, à cautela, que não se verifica nenhuma das circunstâncias especificas em que a Recorrente tenha consentido ao levantamento da referida imunidade.

N. É verdade que a Convenção das Nações Unidas prevê excepções à imunidade de jurisdição – é o caso de transações comerciais ou danos causados a pessoas e bens.

O. No entanto, a situação em apreço não se enquadra em nenhuma dessas exceções, uma vez que não está em causa uma transação comercial entre as partes, nem, tampouco, danos ocorridos em território português.

P. De qualquer forma sempre se diga que, ainda que se considerasse que poderíamos estar perante a exceção prevista no artigo 17.º da Convenção das Nações Unidas – o que não se concede - existirá sempre a imunidade jurisdicional referente a medidas de execução.

Q. Como parece evidente, a Recorrida pretende o reconhecimento da sentença arbitral para posterior execução, perante os tribunais portugueses, de forma a obter, por via da penhora dos bens da Recorrente, o pagamento do montante em que esta foi condenada.

R. Ora, o princípio da imunidade jurisdicional dos estados inclui a imunidade relativa a medidas de execução relacionadas com processos judiciais.

S. Isto quer dizer que, ainda que se considere que a Recorrente tenha dado o seu consentimento para a arbitragem que deu origem à sentença cujo reconhecimento se requer, e, como tal, estaríamos perante a exceção prevista no artigo 17.º, tal consentimento não implica que exista consentimento para medidas de execução.

T. E não estando reunidas as condições previstas no artigo 19.º da Convenção das Nações Unidas para que possam ser tomadas medidas de execução pelos tribunais do Estado Português, a Recorrida não poderá, nos tribunais portugueses, obter tais medidas de execução, tais como o arrolamento, arresto ou penhora.

U. Pelo que tal significa que, também aqui, andou mal o Tribunal a quo quando considerou que a Recorrente renunciou à sua imunidade de jurisdição, “conforme resulta, nomeadamente, do artigo 17.º, al. c) da Convenção das Nações Unidas Sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos Seus Bens (doravante “CNUIJ”): ou seja, é um dos casos de exceção à imunidade de jurisdição”.

V. É, pois, nestes termos que se torna crucial distinguir imunidade de jurisdição – direito de não ser julgado – e imunidade de execução – direito de não ter bens apreendidos. Sendo certo, que a renúncia à imunidade de jurisdição não implica automaticamente a renúncia à segunda - tal como decorre do artigo 7.º da CNUIJ, a renúncia deve ser expressa e inequívoca, sendo que a mera referência a acordos de investimento ou à CNI não cumpre com esse requisito.

W. Mas mais! Contrariamente ao que refere Acórdão Recorrido quando alega que a Recorrente renunciou expressamente à imunidade de jurisdição dos tribunais arbitrais e dos tribunais aos quais seja pedida a execução das decisões proferidas por tais tribunais arbitrais, a verdade é que, de uma breve leitura da Cláusula 7 do referido Acordo, rapidamente concluímos que a Recorrente, em momento algum, concordou com a execução em qualquer jurisdição, incluindo em Portugal.

X. A menção a “qualquer tribunal competente” referida na Cláusula 7, refere-se aos tribunais com jurisdição para supervisionar a arbitragem – tais como tribunais nos EUA, onde a arbitragem é tendencionalmente conduzida, não implicando uma renúncia geral à imunidade de execução em qualquer país onde a Recorrida procure executar a sentença.

Y. Sendo, também, fundamental ter em consideração o contexto em que o referido acordo foi firmado, não podendo ser interpretado, sem mais, e, em especial, sem atender às suas especificidades.

Z. A cláusula em questão deve ser interpretada restritivamente, uma vez que as partes, ao concordarem com a arbitragem em Washington D.C. pretendiam resolver litígios nesse foro, e não em qualquer jurisdição para efeitos de execução.

AA. Pelo que, a tal renuncia à imunidade – a existir - está estritamente ligada a esse processo aos tribunais competentes para supervisioná-lo, como são o caso dos tribunais norte-americanos.

BB. O objetivo principal do acordo era fornecer um mecanismo de resolução de litígios eficaz e eficiente, devendo a alegada renúncia à imunidade ser interpretada neste contexto, e não como uma carta em branco para a Recorrida escolher qualquer jurisdição para executar a sentença arbitral.

CC. Para além de que o referido acordo não contém nenhuma menção expressa ou implícita à jurisdição portuguesa para fins de execução.

DD. Pelo que, para que a renuncia à imunidade fosse plenamente válida em Portugal, e de modo que o Tribunal a quo se pudesse arrogar, sem mais, que a Recorrente renunciou à sua imunidade, seria necessário um consentimento específico e inequívoco para essa jurisdição. O que não sucedeu.

EE. A interpretação deste, e de qualquer acordo, deve ser feita de boa fé, tendo em conta os interesses legítimos de ambas as partes. Não se pode, obviamente, presumir que a Recorrente pretendia renunciar a um direito fundamental, como a imunidade de execução, de forma tão ampla a irrestrita.

FF. Nunca se olvide que a jurisdição para a execução de sentenças estrangeiras é regida por regras especificas de conexão e competência, sendo que, a mera existência de um acordo de arbitragem não confere automaticamente jurisdição a qualquer tribunal para executar a sentença.

GG. As regras de competência internacional dos tribunais portugueses exigem uma conexão relevante com o litígio para que a jurisdição seja estabelecida, mas já analisaremos melhor a questão infra a propósito da violação do princípio da não ingerência.

HH. Pelo que, não deve ser reconhecida na ordem jurídica portuguesa a sentença em causa nos presentes autos, sob pena de violação do princípio da imunidade jurisdicional de que goza a Recorrente enquanto Estado Soberano, a qual se invocada para os devidos efeitos.

II. Razão pela qual, se torna também necessário que o Supremo Tribunal de Justiça tenha a oportunidade de se pronunciar sobre o presente recurso.

JJ. Entendeu o Tribunal a quo que “nitidamente não ocorre a violação dos princípios de ordem publica internacional do Estado, ou sequer a violação de normas constitucionais, ou da União Europeia”.

KK. No entanto, não pode a Recorrente conformar-se com o entendimento do douto Tribunal da Relação, porquanto, e salvo o devido respeito, este parte de um pressuposto errado: sem prejuízo de não lhe competir reanalisar o mérito da decisão, questão essa amplamente reconhecida pela Recorrente aquando da apresentação da oposição, a verdade é que tal não o iliba de ter de perceber o alcance da sentença e concluir por que medida tal conflitua com princípios estruturantes da ordem publica internacional.

LL. Em Portugal, o reconhecimento de sentenças estrangeiras está sujeito à condição de que estas não sejam contrárias à ordem pública nacional – sendo certo que, se uma sentença, à luz do ordenamento jurídico português, for percebida como injusta ou inadequada, ou se impuser obrigações desproporcionais ou irrelevantes para Estado português, pode ser recusada. Bem como se for atentatória de princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa.

MM.O CPC, no artigo 980.º, alínea f), estabelece que uma sentença estrangeira não pode ser reconhecida se o seu conteúdo for manifestamente incompatível com os princípios da ordem pública internacional do Estado Português.

NN. Tendo em consideração a fundamentação apresentada pela Recorrente em sede de arbitragem, o primeiro princípio posto causa com o possível reconhecimento da sentença, é o princípio do superior interesse do Estado.

OO. Este princípio é chamado aos autos por ser, precisamente, um princípio estruturante da ordem pública portuguesa, e não por se estar a pôr em causa o interesse da República da Venezuela – esse campo deveria sido tratado, como o acórdão entende e bem, em sede de sentença arbitral.

PP. O que aos Tribunais portugueses diz respeito, é, por sua vez, se podemos admitir no nosso ordenamento o reconhecimento de uma sentença que desconsidera, por completo, um princípio tão basilar como esse.

QQ. Ora, em Portugal, sempre se terá de ter em consideração o princípio da proporcionalidade para garantir que as medidas tomadas pelo Estado não ultrapassam o estritamente necessário para atingir determinado fim, o que implica que o princípio do superior interesse do Estado deva ser sempre atendido.

RR. In casu, e sendo que a sentença que se pretende o reconhecimento assenta precisamente nesta dicotomia: por um lado, a proteção das leis internas da República da Venezuela, as suas obrigações para com o meio ambiente, e a proteção dos povos indígenas e, por outro lado, os interesses económicos por parte da Gold Reserve com a manutenção da Concessão Brisas -, impõe-se determinar se este juízo, aos olhos do ordenamento jurídico português, é ou não atentatório da sua ordem pública. E, mais uma vez, só podemos concluir pela positiva.

SS. Uma Sentença Arbitral que manifestamente dá primazia a interesses económicos na sequência de um acordo, em detrimento da proteção ambiental e das populações, violaria diretamente disposições constitucionais do Estado português e aquele que tem vindo a ser o nosso entendimento jurisprudencial e o entendimento internacional.

TT. Reconhecer uma sentença estrangeira que privilegia uma exploração mineira, que causa danos ambientais irreversíveis e prejudica as comunidades locais, constituiria uma clara violação deste princípio.

UU. Pelo que, também o Estado português tem um dever constitucional de recusar qualquer sentença que comprometa ou atente contra o equilíbrio ecológico, ou que permita que interesses económicos de entidades privadas ou estrangeiras prevaleçam sobre o direito ao ambiente.

VV. A questão que fica no ar, e que se cumpre ver esclarecida é, pois, como é que o douto Tribunal da Relação chegou à conclusão de que a sentença revidenda não é incompatível com princípios de ordem publica internacional do Estado Português, por um lado, e por outro, a que conclusão é que chegou quanto ao resultado da decisão, uma vez que não é possível, lido e relido o Acórdão Recorrido, retirar essa compatibilidade.

WW. Ora, o conceito de ordem pública em Portugal envolve a preservação dos valores fundamentais da sociedade, incluindo a proteção da saúde pública, da segurança das populações e da sustentabilidade ambiental.

XX. Pelo que, qualquer decisão estrangeira que entre em conflito com estes valores fundamentais pode ser recusada com base no princípio da ordem pública.

YY. O CPC, no seu artigo 980.º prevê precisamente esta realidade – situações cujo reconhecimento conduza a um resultado manifestamente incompatível com os princípios da ordem publica internacional do estado português -, termos em que, sendo que a sentença ora sob analise dá primazia a interesses económicos face à possibilidade de comprometimento do ambiente ou à segurança das populações, tal representa uma clara afronta aos valores constitucionais e legais que constituem a ordem pública portuguesa, justificando a sua não aplicação no território nacional.

ZZ. Termos em que se impõe concluir que o reconhecimento da sentença arbitral no ordenamento jurídico português implicaria, necessariamente, uma violação da ordem pública internacional do Estado.

AAA. Mas mesmo que assim não fosse, sempre teríamos de concluir que nunca poderia a referida sentença ser reconhecida em Portugal por violação do princípio da não ingerência.

BBB. Foi em França que a sentença arbitral objeto dos presentes autos foi proferida, sendo que, no âmbito da referida Sentença, foi a Recorrente condenada a pagar uma compensação à Recorrida, sendo que, em virtude do não pagamento integral do valor em que foi condenada, a Recorrida vem requerer o reconhecimento da referida sentença no ordenamento jurídico português, para efeitos de execução.

CCC. Ora, a sentença proferida e cujo reconhecimento se pretende não tem qualquer conexão com a ordem jurídica portuguesa.

DDD. O princípio da não ingerência baseia-se na ideia de que tribunais estrangeiros, completamente alheios à causa, não devem ser usados para reforçar decisões que não tenham qualquer relevância, direta ou indiretamente, para o próprio Estado.

EEE. Não devendo o sistema jurídico português ser instrumentalizado como um veículo para disputas entre partes sem qualquer ligação ao país. Principalmente quando é um Estado Soberano, no caso, a República Bolivariana da Venezuela, que está em juízo.

FFF. A ordem pública internacional, que inclui o respeito pela soberania e não ingerência, pode ser invocada para impedir a aplicação de uma sentença arbitral estrangeira que viole este princípio, sendo que, não pode o Tribunal a quo escudar-se da CNI para justificar qualquer situação.

GGG Na verdade, a própria CNI prevê exceções à sua aplicação que, pese embora facilite o reconhecimento e a execução de sentenças arbitras estrangeiras, não é, nem pode ser, uma garantia absoluta.

HHH. A CNI não é absoluta, sendo maleável a interpretações e ao contexto em que as situações se verificam, pelo que só nos compete concluir que o Tribunal a quo se manteve, ainda que erradamente, sempre irredutível.

III. Para além do mais, sempre se teria de atender ao princípio da proporcionalidade, porquanto está intrinsecamente relacionado com a ideia de que uma medida ou uma decisão deve ser adequada, necessária e proporcional ao fim a que se destina, garantindo que não se impõe um sacrifício excessivo a qualquer uma das partes. Pelo que, uma sentença estrangeira que imponha uma penalidade ou obrigação desproporcional em relação à situação ou a conduta das partes, sempre terá de ser vista como incompatível com a ordem pública portuguesa.

JJJ. Ora, na senda do que tem vindo a ser defendido pela Recorrente, os motivos que levaram às decisões tomadas pela República da Venezuela, e o respetivo enquadramento não podem ser desconsiderados, bem como as circunstâncias em que se inseriu, a complexidade da causa e a boa-fé da parte.

KKK. Muito menos podem ser desconsiderados para efeitos de decisão e, consequentemente, de cálculo da compensação.

LLL. O douto Tribunal Arbitral não podia ter desconsiderado na totalidade a situação económica da Venezuela, bem como não podia, e com o devido respeito, o douto Tribunal da Relação, ignorar este enquadramento, não tendo, para o efeito, de reavaliar o mérito da sentença arbitral, mas apenas concluir pela incompatibilidade de uma decisão deste cariz com a ordem publica internacional.

MMM. Não interessa, minimamente, para este efeito, que a Venezuela tenha reconhecido ser devedor daquele valor. Tal questão deve, e será tratada entre as partes em sede própria. O que releva, para efeitos da presente ação de reconhecimento, é se tal decisão é incompatível com princípios estruturantes do ordenamento jurídico português, neste caso, na medida da sua desproporcionalidade.

NNN. Sendo, pois, nesta medida, que a Recorrente esclareceu que o princípio da proporcionalidade exige que a compensação atribuída seja adequada à gravidade do dano ou prejuízo sofrido e, ao mesmo tempo, razoável em relação às circunstâncias do caso concreto.

OOO.A compensação, ao ser calculada de forma proporcional, cumpre duas funções primordiais: reparar o lesado e prevenir comportamentos futuros lesivos por parte do devedor. Uma compensação justa tem o efeito de restabelecer a justiça entre as partes, permitindo que a vítima obtenha uma reparação suficiente para mitigar os efeitos do dano sofrido.

PPP. Assim, em Portugal, os tribunais possuem uma discricionariedade bastante limitada na atribuição de compensações, estando sujeitos a princípios e limites estabelecidos pela lei e pela jurisprudência.

QQQ.É, pois, inadmissível à luz do ordenamento jurídico português, que o tribunal disponha de um poder discricionário e que não atente ao caso concreto para efeitos de determinação da compensação.

RRR. Termos em que, e sem prejuízo de já nada se poder fazer no que concerne ao entendimento do Tribunal Arbitral no que concerne aos valores atribuídos, encontramo-nos no momento de poder impedir que cooperemos com este tipo de arbitrariedades, sendo forçoso concluir que andou mal o Acórdão Recorrido.

SSS. Entendeu, por fim, o Tribunal a quo que “por tudo o aludido, não está consubstanciado, nem se verificam os requisitos do abuso de direito, nem sequer tal invocação está contida na possibilidade permitida pela CNI”.

TTT. Em contexto de reconhecimento de sentenças estrangeiras, o abuso de direito pode ser invocado quando o pedido de reconhecimento é feito com o objetivo de obter vantagens indevidas, ou quando o exercício do direito de reconhecimento causa prejuízos desproporcionais à parte contrária.

UUU. Pelo que, o entendimento do Tribunal a quo de esta invocação não ser permitida pela CNI deve ser, manifestamente, reanalisada pelo Supremo Tribunal de Justiça.

VVV. A CNI permite que um tribunal recuse o reconhecimento de uma sentença arbitral estrangeira se a execução da sentença for contrária à ordem pública do país onde o reconhecimento é solicitado.

WWW. Sendo que, parece-nos claro que princípio do abuso de direito pode ser invocado como parte da análise da ordem pública. E é, também aqui, que a Convenção de Viena ganha novamente terreno, quando exige que os Tratados e Convenções sejam encarados e interpretados de boa fé.

XXX. No presente caso, a Recorrida visa o reconhecimento da sentença arbitral para efeitos de execução em Portugal, apesar de bem saber que a República Bolivariana da Venezuela não possui bens penhoráveis no país.

YYY. Não há dúvidas que o real interesse da Recorrida não é executar os valores peticionados contra a Recorrente, mas sim a execução de bens de outras entidades venezuelanas alegando o levantamento da respetiva personalidade jurídica.

ZZZ. Sendo que, o Acórdão Recorrido nem sequer se dignou a analisar em detalhe todos os pressupostos do abuso de direito antes de decidir como decidiu.

AAAA. Com o devido respeito, a Recorrida está a utilizar o sistema jurídico português como um meio para atingir fins que não estão diretamente relacionados com o litígio original, pretendendo algo completamente diferente do que invoca, o que configura um abuso de direito.

BBBB. O que torna, mais uma vez, fundamental, relembrar que o Supremo Tribunal de Justiça concluiu, por diversas pelas, pela recusa do reconhecimento de sentença estrangeira quando o resultado se manifestar incompatível com a ordem pública.

CCCC. Ora, nesses termos, não se compreende como é que podemos aceitar que a referida sentença não é incompatível, quando, a aceitá-la, o resultado será obtido mediante uma atuação em abuso de direito.

DDDD. Pelo que, o pedido de reconhecimento da sentença arbitral deve ser indeferido, uma vez que a Recorrida está a tentar exercer um direito de forma a obter vantagens indevidas e a causar prejuízos desproporcionais à Venezuela.

EEEE. Este comportamento é contrário aos princípios de boa-fé e justiça que sustentam o ordenamento jurídico português, pelo que se requer a reapreciação da questão.

FFFF. Com efeito, é forçoso concluir que andou mal o Acórdão Recorrido ao julgar procedente presente ação e, consequentemente, confirmar e reconhecer a Sentença Arbitral Proferida.

A requerente, na resposta, concluiu pela improcedência do recurso.

2. Delimitação do âmbito objectivo do recurso e individualização da questão concreta controversa que deve ser solucionada.

Como o âmbito objetivo da revista é delimitado, sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso, pelo objecto da acção, pelos casos julgados formados na instância, pela parte dispositiva da decisão impugnada que for desfavorável ao impugnante, e pelo recorrente, ele mesmo, designadamente nas conclusões da sua alegação, é uma só a questão concreta controversa que importa resolver: a de saber se o acórdão impugnado, que reviu e confirmou – reconheceu - a sentença arbitral, proferida no dia 22 de Setembro de 2014, em ..., França, deve ser revogado e, acto contínuo, substituído por outro que recuse o reconhecimento daquela decisão estrangeira (art.ºs 635.º n.º 4, 639.º, n.º 1, e 608.º, n.º 2, ex-vi art.º 663.º, n.º 2, do CPC).

O objecto, da causa e do recurso, é constituído pelo reconhecimento de uma decisão arbitral estrangeira, i.e., de uma sentença proferida por um tribunal arbitral, no território de um Estado diferente daquele em que é pedido o seu reconhecimento.

As decisões estrangeiras – que no caso de provirem dos tribunais estaduais são actos de soberania - só podem produzir efeitos fora do Estado no qual são proferidas através de um acto de reconhecimento por um outro Estado – reconhecimento que outra coisa não é que a aceitação por este outro Estado – Estado do reconhecimento ou Estado requerido – dos efeitos que as decisões, estaduais ou arbitrais, produzem no Estado de origem. O reconhecimento da decisão estrangeira evita a repetição de processos e previne o proferimento de decisões contraditórias e pode ser automático – quando se realiza ope legis, sem que tenha de ser requerido por qualquer interessado – ou expresso – quando tem de ser pedido por um interessado e é concedido por uma autoridade do Estado requerido. Este distinguo releva para a determinação do momento da produção dos efeitos da decisão estrangeira no Estado do reconhecimento: no caso de reconhecimento automático aqueles efeitos produzem-se no segundo Estado no mesmo momento em que são produzidos no Estado de origem; no reconhecimento expresso, a decisão estrangeira só produz efeitos, no Estado do reconhecimento, no momento em que este tiver lugar – mas produz neste Estado os mesmos efeitos que realiza no Estado de origem: verifica-se aqui uma extensão dos efeitos que a decisão estrangeira, arbitral ou estadual, produza no Estado de origem, segundo o seu direito, embora não possa produzir, no Estado do reconhecimento, efeitos que o ordenamento do Estado de origem desconheça.

O reconhecimento consiste, genericamente, na extensão a um segundo Estado dos efeitos processuais que a decisão estrangeira produz no Estado de origem: o efeito do caso julgado e o efeito constitutivo, a atribuição de força executiva e outros modos de relevância, tais como o valor probatório e o valor como mero facto material; a execução da sentença estrangeira, consiste na satisfação coactiva de qualquer prestação, assente no reconhecimento, àquela decisão, num outro Estado, da qualidade de titulo executivo. A execução de uma decisão estrangeira, estadual ou arbitral, num segundo Estado pressupõe que essa decisão satisfaz as condições para ser reconhecida neste mesmo Estado, dado, evidentemente, que um Estado só pode atribuir exequibilidade a uma sentença estrangeira que ele próprio pode reconhecer. Quer dizer: exequibilidade de uma decisão estrangeira implica, em regra, o reconhecimento desta decisão; mas este reconhecimento – seja ele expresso ou automático – não importa necessariamente a sua execução.

E no tocante às decisões, designadamente arbitrais, estrangeiras, o primeiro problema que deve ser resolvido é o da fonte ou fontes definidoras dos requisitos do reconhecimento. Essas fontes, são, incontroversamente, no caso, duas: uma, de origem internacional convencional multilateral: a Convenção de Nova Iorque sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras- CNI -1, de que a República Portuguesa e a República Francesa – e a República Bolivariana da Venezuela - são partes, a segunda, por força de ratificação datada de 26 de Junho de 1959 (art.º 8.º , n.º 2 da Constituição da República e 1.º, n.º 1 )2; outra, de origem puramente interna: a Lei da Arbitragem Voluntária, aprovada pela Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro (art.ºs 55.º e 56.º). Convenção que, de harmonia com a reserva declarada por Portugal, que aquele instrumento internacional, permite, só é aplicável no caso de sentenças arbitrais que tenham sido proferidas no território de Estados a ela vinculados (art.º 2.º da Resolução da Assembleia da República, n.º 37/94).

A CNI é aplicável ao reconhecimento e à execução das sentenças arbitrais, embora não defina o que se deve entender por reconhecimento e por execução, o que coloca o problema de saber se a parte interessada deve requerer o reconhecimento e a execução conjuntamente ou se se pode limitar a pedir o reconhecimento. A boa interpretação dos termos da CNI é a de que se pode pedir o reconhecimento separadamente da execução3. Efectivamente, os termos reconhecimento e execução, tal como são utilizados na Convenção não estão incindível ou indissoluvelmente ligados, pelo que se a atribuição de executoriedade ou de força executiva à sentença arbitral têm necessariamente implícita o seu reconhecimento, este reconhecimento pode ter lugar ainda que não se vise a sua execução4.

Ponto de especial relevo para o tratamento do objecto da revista, dado que – como o acórdão impugnado foi terminante em declarar e a recorrida sublinha na resposta ao recurso – o objecto da acção é constituído, em linha com o pedido da autora e da vinculação temática do tribunal a esse pedido, que decorre do princípio da disponibilidade objectiva, apenas pelo reconhecimento da sentença arbitral estrangeira e não também, pela sua execução. Dito doutro modo: o única questão que importa resolver é se a decisão arbitral deve ser objecto de simples reconhecimento expresso, i.e., se o Estado Português – Estado do reconhecimento ou Estado requerido – deve aceitar os efeitos que aquela sentença produziu no Estado no qual foi proferida.

Segundo a recorrente, o reconhecimento da sentença arbitral estrangeira deve ser recusado, na essência, pelos fundamentos seguintes:

- Por gozar da prerrogativa da imunidade à jurisdição dos tribunais portugueses;

- Por o reconhecimento da sentença da sentença arbitral estrangeira ser incompatível com a ordem pública internacional material do Estado Português;

A resolução destes problemas vincula, naturalmente, a que examine se, no caso, a recorrente goza da imunidade de jurisdição que invoca e se o resultado do reconhecimento da sentença arbitral estrangeira é incompatível com a ordem pública internacional material do Estado Português.

3. Fundamentos.

3.1. Fundamentos de facto.

O Tribunal de que provém o recurso julgou provados, com base nos documentos juntos e confissão, os factos seguintes;

1. A Autora é uma sociedade originalmente constituída segundo as leis do Território de Yukon, Canadá, e actualmente constituída segundo as regras de Alberta, Canadá, que tem por objecto a actividade mineira, em concreto à aquisição, exploração e desenvolvimento de projectos nesta indústria (facto provado pelo Doc. n.º 1 junto com a Petição Inicial).

2. A 22 de Setembro de 2014, foi proferida, por unanimidade, pelo Tribunal Arbitral constituído ao abrigo das ICSID Additional Facility Rules, composto pelos Árbitros Professor Pierre-Marie Dupuy, Professor David A.R Williams QC e Professor Piero Bernardini, com sede em ..., França, no processo ICSID n.º .../09/1, sentença junta aos autos e cujo teor se dá por reproduzido, nos termos da qual foi a ré condenada nos seguintes termos:

(i) a pagar à Autora uma compensação no montante de USD 713.032.000,00, acrescido de juros vencidos desde 14 de abril de 2008 até à data da prolação da Sentença Arbitral, calculados à taxa de juro para os Bilhetes do Tesouro do Governo dos Estados Unidos, composta anualmente, o que correspondia a USD 22.299.576,00 à data da prolação da Sentença Arbitral, perfazendo um total de USD 735.331.576,00;

(ii) a pagar à Autora os juros vincendos sobre o montante total referido em (i), à taxa LIBOR acrescida de 2%, compostos anualmente, desde a data de prolação da Sentença Arbitral até ao pagamento integral; e

(iii) a reembolsar a Autora o montante de USD 5.000.000,00, a título de compensação pelos custos e despesas incorridos pela Autora com a arbitragem (cf. Doc. n.º 2 junto com a Petição Inicial, cujo teor se dá por reproduzido);

3. Do montante da condenação arbitral, a Ré pagou à Autora o montante de USD 13.811.558,00, dos quais USD 5.000.000 foram imputados ao pagamento dos custos e despesas especificados na Sentença Arbitral e os restantes USD 8.811.558 imputados ao pagamento dos juros vencidos sobre o montante da condenação (confissão da ré);

4. A sentença arbitral foi proferida ao abrigo do “Acordo celebrado entre o Governo do Canadá e o Governo da República da Venezuela para a Promoção e Proteção de Investimentos”, de 1 de julho de 1996, junto como doc. nº 3 cujo teor se reproduz;

5. Tal acordo, celebrado em 1 de julho de 1996, entre os Governos do Canadá e da República da Venezuela, iniciou a sua produção de efeitos em 1 de janeiro de 1998, e visava garantir a proteção dos investimentos de investidores dos Estados Partes no território do outro Estado Parte, desse modo promovendo a iniciativa económica e o desenvolvimento da cooperação económica entre ambos os países (cf. preâmbulo do Acordo, constante do Doc. 3).

6. Nesse Tratado, consentiu a Ré resolver os litígios dele emergentes por arbitragem ao emitir, no Artigo XII, uma oferta unilateral para arbitrar a qualquer “Investidor” na acepção desse Tratado: “Resolução de litígios entre um investidor e a Parte Contratante Anfitriã […] 2. Se um diferendo não tiver sido resolvido amigavelmente no prazo de seis meses a partir da data em que foi iniciado, pode ser submetido pelo investidor à arbitragem nos termos do n.º 4. […]”.

7. O diferendo pode, pelo investidor em causa, ser submetido a arbitragem nos termos: […] (b) dos ICSID Additional Facility Rules, desde que a Parte Contratante no diferendo ou a Parte Contratante do investidor, mas não ambas, seja parte da Convenção ICSID […]

Cada Parte Contratante dá o seu consentimento incondicional à submissão de um diferendo a arbitragem internacional em conformidade com as disposições do presente artigo.” (facto provado pelo Doc. n.º 3 junto com a Petição Inicial);

8. O Artigo XII, n.º 6, alínea a), (ii), do Tratado Canadá-Venezuela, reafirma a existência de uma convenção de arbitragem por escrito entre a Autora e a Ré, ao dispor que: “6. (a) O consentimento dado nos termos do n.º 5, juntamente com o consentimento dado nos termos do n.º 3, ou os consentimentos dados nos termos do n.º 12, deve satisfazer os requisitos quanto: […] (ii) à existência de «acordo escrito» para efeitos do artigo II da Convenção das Nações Unidas sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, Iorque»).”(facto provado pelo Doc. n.º 3 junto com a Petição Inicial).

9. Em 21.10.2009, a Autora, enquanto Investidora, na acepção do Tratado Venezuela-Canadá, aceitou a proposta da Ré para arbitrar o litígio emergente do “Projeto ...”, ao submeter o Requerimento de Arbitragem que veio a culminar na prolação da Sentença Arbitral (facto provado pelo Doc. n.º 6 junto com a Petição Inicial).

10. O litígio decidido pela Sentença Arbitral diz respeito ao “Projeto ...”, um conjunto de concessões mineiras de que a Autora era titular, tendo o Tribunal Arbitral concluído que essas concessões foram ilegitimamente terminadas pela Ré, em violação da obrigação de “tratamento justo e equitativo” do investimento da Autora, nos termos do Artigo II, n.º 2, do Tratado Venezuela-Canadá (facto provado pelo Doc. n.º 2 junto com a Petição Inicial, cf. pontos 564 a 615).

11. Em 17.07.2016, após a prolação e notificação às partes da Sentença Arbitral, a Autora e a Ré celebraram um Acordo de Transação (“Settlement Agreement”), que foi modificado por três vezes (facto provado pelo Doc. n.º 3 junto com a Resposta à Oposição cujo teor se reproduz).

12. Em tal “Settlement Agreement” e nos três aditamentos subsequentes resulta que:

− A Ré confessou-se devedora integral do montante em cujo pagamento foi condenada na Sentença Arbitral e acordou com a Autora os termos em que pagaria esse montante (cf. Cláusula 2.2 (a) do “Settlement Agreement”, Doc. n.º 3 junto com a Resposta à Oposição);

− A Ré renunciou expressamente à imunidade de jurisdição a) dos tribunais arbitrais constituídos para dirimir os litígios emergentes do “Settlement Agreement” e b) dos tribunais aos quais seja pedida a execução das decisões proferidas por tais tribunais arbitrais (cf. Cláusula 7 do “Settlement Agreement”, Doc. n.º 3 junto com a Resposta à Oposição).

13. Após a prolação da sentença, ambas as Partes requereram a correção da decisão arbitral, o que foi rejeitado pelo Tribunal Arbitral mediante decisão datada de 15 de dezembro de 2014 (cf. Doc. 4 junto, que corresponde à Decisão proferida pelo Tribunal Arbitral, a 15 de dezembro de 2014, sobre os pedidos das Partes para correções).

14. A Sentença Arbitral foi objecto de um pedido de anulação por parte da Ré, apresentado diante dos Tribunais franceses, jurisdição onde a Sentença Arbitral foi proferida, tendo o referido pedido sido já julgado definitivamente improcedente pela Cour d’appel de ..., a 7/02/2017 (cf. Doc. 5, que constitui a decisão da Cour d’appel).

3.2. Fundamentos de direito.

3.2.1. Imunidade de jurisdição.

Para o processo se constituir e correr regularmente nos tribunais estaduais portugueses não é suficiente que estes sejam competentes e que as partes sejam dotadas de personalidade judiciária: é ainda imprescindível que estejam, ambas, sujeitas á jurisdição portuguesa. A não sujeição das partes à jurisdição portuguesa resolve-se, segundo a orientação que se tem por correcta, não num problema de competência absoluta do tribunal – mas antes numa excepção dilatória, necessariamente inominada, determinante da absolvição da instância (art.ºs 576.º, n.ºs 1 e 2, e 278.º, n.º 1, e), do CPC)5.

Como regra, todas as pessoas, físicas ou meramente jurídicas, nacionais ou estrangeiras, domiciliadas ou não em Portugal, estão submetidas à jurisdição portuguesa. Há, porém, entidades que gozam de imunidade de jurisdição, imunidade por força da qual lhes assiste prerrogativa ou o privilégio de, sem o seu consentimento, não poderem ser submetidas à jurisdição portuguesa. É, designadamente, o caso dos Estados estrangeiros, para os quais vale a regra de direito internacional comum de que in parem non habet jurisdicionem. Imunidade jurisdicional do Estado estrangeiro que assenta num duplo fundamento: por um lado, no princípio da soberana igualdade entre os Estados – e da sua independência – que constitui uma das características dominantes da comunidade internacional; por outro, é reflexo do princípio da separação de poderes, em virtude do qual os órgãos jurisdicionais de um Estado não podem interferir na política externa do próprio Estado, reservada para órgãos políticos centrais – o Governo e o Parlamento. Este Tribunal Supremo tem, efectivamente, salientado, que a imunidade de jurisdição constitui corolário do princípio da igualdade entre Estados e radica num regra consuetudinária, segundo a qual nenhum Estado pode, contra a sua vontade, ser sujeito à condição de parte no foro de outro Estado6. Todavia, como o mesmo Tribunal tem sublinhado, consistentemente, a imunidade dos Estados estrangeiros não é, porém, absoluta ou irrestrita, dado que a concepção conforme com o sistema constitucional português, aceite na comunidade internacional e , todo o caso, dominante na doutrina e na jurisprudência, é uma concepção relativa - logo mais restrita – segundo a qual deve distinguir-se, na imunidade de jurisdição, os actos praticados iure imperii e os actos praticados iure gestionis7.

No tocante ao âmbito da imunidade do Estado estrangeiro há, realmente, que atender ao distinguo entre actos de soberania e actos de gestão: pelos primeiros devem entender-se os actos que cumprem finalidades de soberania, v.g., actos de guerra, relativamente aos quais o direito internacional público é terminante em conceder uma certa medida de imunidade de jurisdição; pelo segundos devem entender-se aqueles que o Estado estrangeiro pratica enquanto pessoa colectiva, que não sejam próprios os específicos da sua qualidade de ente soberano e que sejam praticados ius gestionis; por actos de soberania, o Estado estrangeiro, não pode ser demandado, a menos que se submeta à jurisdição, seja por acto unilateral, seja por acto contratual, dado que a imunidade é uma prerrogativa ou privilégio que está na inteira disponibilidade do Estado estrangeiro e à qual, portanto, lhe é lícito renunciar, mesmo tacitamente - como sucede, por exemplo, quando é o próprio Estado estrangeiro a propor acção; por actos de gestão, o Estado estrangeiro - independentemente da renúncia à imunidade, está sujeito à jurisdição, como qualquer outra pessoa colectiva. A qualificação do acto como pertencendo a uma ou outra dessas categorias é feita pela lex fori, portanto, quanto a acções propostas nos tribunais nacionais, pela lei portuguesa.

Da imunidade de jurisdição deve distinguir-se a imunidade de execução. Os Estados estrangeiras, para além de gozarem da imunidade de jurisdição, gozam de imunidade de execução – que impede a realização de actos executivos, v.g., de penhora ou arresto, no tocante a bens, móveis ou imóveis ou direitos, localizados no Estado do foro, quando se mostrem afectados ao exercício das funções de soberania do Estado estrangeiro – pelo que da renúncia à imunidade de jurisdição, ou da celebração de uma convenção arbitral, não se segue, como corolário que não possa ser recusado, uma renúncia à imunidade de execução, i.e., a renúncia à imunidade de jurisdição não implica o reconhecimento de um waiver relativamente à imunidade de execução sobre os bens que um determinado Estado tenha no estrangeiro.

O distinguo entre imunidade de jurisdição e imunidade de execução - que, aliás, não é absoluta mas antes, meramente relativa - é patente na Convenção das Nações Unidas sobre as Imunidades Jurisdicionais dos Estados e dos seus Bens (CNUIJEB), concluída em Nova Iorque no dia 2 de Dezembro de 20048, Convenção que ainda não se encontra em vigor – por não terem sido depositados o número de instrumentos de ratificação que ela mesma exige com condição do seu início de vigência9 (art.º 30.º).

Apesar de a CNUIJEB ainda não se encontrar em vigor, as respectivas normas não devem ser desconsideradas. Por um lado, porque a CNUIJEB exprime, nos seus traços essenciais, o direito de fonte consuetudinária vigente neste domínio10, por outro, dado que assinou, ratificou e depositou o instrumento de ratificação, ainda que a CNUIJBE continue desprovida de eficácia na ordem internacional, a República Portuguesa está vinculada, à luz da Convenção da Convenção de Viena sobre Direito dos Tratados11 a não praticar actos que privem esse tratado do seu objecto e do seu fim (art.º 18.º, alínea b)). É certo que a ratificação, por si, não antecipa internamente a produção dos seus efeitos, mas o Estado que, como aconteceu com a República Portuguesa no tocante à CNUIJE, se vinculou a esta não pode invocar a sua ineficácia em termos que comprometam o seu objecto ou o seu fim12.

Todavia, na espécie do recurso – e ao contrário do que inculca a alegação do recorrente – julga-se claro que não temos de nos preocupar com o problema da imunidade de execução. Porquê? Pela razão, simples mas sólida que se expôs a propósito da delimitação do âmbito objectivo da causa e, logo também, da revista: é que, tanto a acção como o recurso, têm por único objecto a questão do reconhecimento da sentença arbitral estrangeira e não – também ou cumulativamente – a sua execução. E relativamente à imunidade da recorrente à jurisdição dos tribunais portugueses, o acórdão impugnado foi terminante na conclusão de que a recorrente consentiu no exercício dessa jurisdição. Esta conclusão é inteiramente correcta.

De harmonia com os factos que a instância de que provém o recurso julgou adquiridos para o processo, a sentença arbitral foi proferida ao abrigo do “Acordo celebrado entre o Governo do Canadá e o Governo da República da Venezuela para a Promoção e Proteção de Investimentos”, de 1 de julho de 1996, tratado no qual consentiu a Ré resolver os litígios dele emergentes por arbitragem ao emitir, no Artigo XII, uma oferta unilateral para arbitrar a qualquer “Investidor” na acepção desse Tratado: “Resolução de litígios entre um investidor e a Parte Contratante Anfitriã […] 2. Se um diferendo não tiver sido resolvido amigavelmente no prazo de seis meses a partir da data em que foi iniciado, pode ser submetido pelo investidor à arbitragem nos termos do n.º 4. […]; o mesmo tratado, no Artigo XII, n.º 6, alínea a), (ii), reafirma a existência de uma convenção de arbitragem por escrito entre a Autora e a Ré, ao dispor que: “6. (a) O consentimento dado nos termos do n.º 5, juntamente com o consentimento dado nos termos do n.º 3, ou os consentimentos dados nos termos do n.º 12, deve satisfazer os requisitos quanto: […] (ii) à existência de «acordo escrito» para efeitos do artigo II da Convenção das Nações Unidas sobre o Reconhecimento e a Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, Iorque»); em 21.10.2009, a Autora, enquanto Investidora, na acepção do Tratado Venezuela-Canadá, aceitou a proposta da Ré para arbitrar o litígio emergente do “Projeto ...”, ao submeter o Requerimento de Arbitragem que veio a culminar na prolação da Sentença Arbitral.

Embora um tal facto não surja expressamente individualizado na matéria de facto que a Relação considerou provada, decorre do art.º XII, n.º 6, alínea b), da Convenção concluída entre a recorrente e o Canadá, junto pela recorrida como documento n.º 3, que o acórdão recorrido deu como reproduzido – convencionou-se que o local para qualquer arbitragem nos termos deste artigo será tal que garanta a aplicabilidade da Convenção de Nova Iorque, e as acções (claims) submetidas a arbitragem serão consideradas como decorrentes de uma relação comercial ou transacção, para os fins do artigo 1 dessa Convenção.

Deste conjunto de disposições do tratado concluído entre a recorrente e o Canadá, e sobretudo das referências repetidas à CNI, de que a recorrente é parte, e da convenção de que a arbitragem deveria ter lugar num país que assegurasse a aplicabilidade daquela Convenção à decisão arbitral, decorre que os contraentes – a recorrente e o Canadá - não se limitaram a acordar na submissão dos litígios a arbitragem, tendo logo previsto – e aceite, de modo expresso – a aplicabilidade á decisão dos árbitros, daquela Convenção e, consequentemente, a possibilidade de ser pedido o seu reconhecimento, por um tribunal do Estado, mesmo de Estado diverso daquele em cujo território se realizou a arbitragem. E tendo a recorrente consentido, expressamente, por instrumento internacional, relativamente a uma questão – no caso, o reconhecimento da decisão arbitral – no exercício da jurisdição por um tribunal do Estado, não lhe é lícito, invocar e opor à contraparte a excepção da imunidade de jurisdição (art.º 7.º, n.º 1, alínea a) da CNUIJEB). De resto, ao aceitar, ainda que em abstracto, a resolução de litígios sobre uma dada questão através do recurso à arbitragem, deve entender-se que o Estado prescinde do recurso à sua própria jurisdição interna como resolução de litígios relacionados com aquele objecto em que este Estado seja parte, sendo-lhe assim negada a invocação futura de qualquer imunidade de jurisdição, mas já não, necessariamente, da imunidade de execução.

A CNUIJEB, na Parte III, congrega um conjunto significativo de normas especiais que atenuam, mas não afastam por inteiro, a imunidade de jurisdição declarativa: transações comerciais de direito privado (art.º 10.º), contratos de trabalho para funções não públicas (art.º 11.º), responsabilidade extracontratual (art.º 12.º), direitos reais e sucessórios (art.º 13.º), direitos de autor e propriedade industrial (art.º 14.º), participação em sociedades (civis ou comerciais) ou em outras pessoas coletivas (art.º 15.º), marinha mercante (art.º 16.º) e convenções de arbitragem (art.º 17.º).

No que especificamente se refere aos efeitos da convenção arbitral, concluída, por escrito, entre um Estado e uma pessoa singular ou colectiva estrangeira, relativa a uma transacção comercial, a CNUIJBE é terminante em proibir àquele Estado, salvo disposição contrária do acordo de arbitragem, a invocação da imunidade de jurisdição num tribunal de outro Estado, em processo judicial relativo, designadamente, à confirmação da decisão arbitral (art.º 17.º, alínea, c)). A transacção comercial, designa, na CNUIJBE, qualquer contrato ou transacção de natureza comercial, industrial ou profissional, excluindo contratos de trabalho (art.º 2.º, alínea c), iii)). Segundo o Anexo da CNUIJBE, que contém as disposições sobre a interpretação acordada de algumas das suas normas, a expressão transacção comercial abrange questões de investimento (art.º 17.º).

De harmonia com os factos que a Relação julgou adquiridos para o processo, é seguro que a convenção de arbitragem foi convencionada, designadamente pela recorrida, estrangeira em relação à recorrente, por escrito, e a sentença arbitral teve, precisamente por objecto, o Projeto ..., um conjunto de concessões mineiras de que a Autora era titular, tendo o Tribunal Arbitral concluído que essas concessões foram ilegitimamente terminadas pela Ré, em violação da obrigação de “tratamento justo e equitativo” do investimento da Autora, nos termos do Artigo II, n.º 2, do Tratado Venezuela-Canadá, i.e., incidiu sobre um questão de investimento e, portanto, sobre uma transacção comercial, na acepção da CNUIJBE. Ergo, a aplicação à recorrente da apontada proibição de invocar a sua imunidade de jurisdição, é coisa que se compreende por si.

Como decorre da matéria de facto julgada provada pelo Tribunal de que provém o recurso, em 17.07.2016, após a prolação e notificação às partes da Sentença Arbitral, a Autora e a Ré celebraram um Acordo de Transação (“Settlement Agreement”), que foi modificado por três vezes, Settlement Agreement”, e dos três aditamentos subsequentes, resulta que:

− A Ré confessou-se devedora integral do montante em cujo pagamento foi condenada na Sentença Arbitral e acordou com a Autora os termos em que pagaria esse montante (cf. Cláusula 2.2 (a) do “Settlement Agreement”, Doc. n.º 3 junto com a Resposta à Oposição);

− A Ré renunciou expressamente à imunidade de jurisdição a) dos tribunais arbitrais constituídos para dirimir os litígios emergentes do “Settlement Agreement” e b) dos tribunais aos quais seja pedida a execução das decisões proferidas por tais tribunais arbitrais.

Estas disposições contratuais – como a recorrida observa na resposta – são duplamente relevantes: de um aspecto, corroboram, concludentemente, a correcção da conclusão de que a recorrente já antes havia aberto mão da imunidade de jurisdição, e de outro, que a invocação dessa excepção, conflitua abertamente com a conduta anterior, de nítida feição contratual, portanto, voluntária, da recorrente.

Pelo lado da excepção da imunidade de jurisdição o recurso não dispõe, patentemente, de bom fundamento.

3.2. Compatibilidade do resultado do reconhecimento com a ordem pública internacional material do Estado português.

O regime instituído pela CNI – e pelo direito interno - para o reconhecimento – e, se for caso disso, para a execução – de decisão arbitral proferida num Estado subscritor tem por base o princípio da confiança mútua, motivo pelo qual os fundamentos de não reconhecimento são reduzidos a um mínimo indispensável e sujeitos a um numerus clausus ou a uma enumeração taxativa (art.º V, n.º 1). Dado que se visa assegurar a liberdade e a facilidade de circulação das decisões arbitrais entre os Estados contratantes, o tribunal do Estado requerido deve presumir que estão preenchidos os requisitos exigidos para o reconhecimento de uma decisão arbitral proferida num desses Estados, pelo que recai sobre a parte demandada, nalguns casos, desde logo, a alegação e a prova do fundamento de recusa do reconhecimento, sem prejuízo dos fundamentos que sejam de conhecimento oficioso, que, no caso, se resumem à inarbitrabilidade do objecto do litígio e à contrariedade com a ordem pública internacional (art.º V, n.ºs 1 e 2).

O sistema de reconhecimento instituído pela CNI é fundamentalmente formal13, i.e., o reconhecimento da decisão arbitral estrangeira decorre, em regra, do preenchimento de certos requisitos formais pelo que não implica nenhuma reapreciação da causa pelo tribunal do reconhecimento que, assim, não pode, desde logo, controlar o Direito que foi aplicado pelos árbitros ao mérito da causa. A regra é, por isso, a da proibição da révision au fond. Esta proibição, aliás, muito comum na generalidade dos regimes de reconhecimento, compreende-se com facilidade, dado que, doutro modo, o reconhecimento da decisão arbitral estrangeira nenhuma vantagem traria porque equivaleria à propositura no segundo Estado, de uma nova acção. Por força desta exclusão da révision au fond, o tribunal do Estado requerido só pode verificar se se verifica algum impedimento ou fundamento de não reconhecimento, não o podendo recusar com a justificação de que a decisão estrangeira é, por um qualquer erro de facto ou de direito, incorrecta.

Uma excepção à proibição da révision au fond é constituída, como é, aliás, também comum, pelo respeito da ordem pública – internacional - do Estado do reconhecimento (art.º V, nº 2, alínea b), CNI). Mas dado justamente o seu carácter excepcional, o reconhecimento só pode ser recusado se esse reconhecimento contrariar os princípios fundamentais daquele Estado. A ofensa da ordem pública internacional é material se estiver em causa a violação de princípios ou normas de direito material ou de direito internacional privado.

O reconhecimento da decisão arbitral estrangeira deve recusar-se, mesmo oficiosamente, se for manifestamente contrário à ordem pública internacional material do Estado requerido, o que sucederá – mas só sucederá – se aquele reconhecimento determinar a violação evidente de uma norma jurídica material considerada essencial na ordem jurídica do Estado requerido ou de um direito reconhecido como fundamental pela ordem jurídica do último Estado, devendo ter-se presente que o que é relevante não é se a decisão revivenda ofende a ordem pública do Estado requerido – mas se o seu reconhecimento importa essa violação. Dado que, como regra, a circulação de decisões, mesmo arbitrais, entre os Estados não deve ser dificultada, a reserva de ordem pública deve ser aplicada em casos excepcionais, não se devendo qualificar como ofensa da ordem pública uma qualquer inobservância do direito do Estado requerido, ainda que imperativo ou injuntivo – mas apenas a violação que atinja princípio essenciais estruturantes do seu ordenamento jurídico, como sucederá, por exemplo, com o princípio da não discriminação, que deve ter-se como concepção fundamental do direito interno português.

Realmente, este Tribunal Supremo tem sublinhado, de modo constante, que a reserva de ordem pública deve interpretar-se de forma restritiva, devendo atender-se, em primeiro lugar, apenas aos princípios da ordem pública internacional do Estado Português, depois ao resultado do reconhecimento da decisão estrangeira, devendo, por último, aferir-se se há uma incompatibilidade e uma incompatibilidade manifesta ou evidente. Com a exigência de que apenas é atendível o resultado do reconhecimento, quer-se significar que a lesão da ordem pública internacional material do Estado português deve ser avaliada em concreto, i.e., através da comparação entre os princípios daquela ordem e os resultados ou consequências do reconhecimento da decisão estrangeira; por incompatibilidade e por incompatibilidade manifesta deve ter-se apenas o desrespeito da ordem pública internacional material que seja evidente ou ostensiva – de tal modo que possa ser reconhecida sem largas indagações – e grave, i.e., tão séria ou severa que possa ser qualificada como atropelo grosseiro, ou como ofensa intolerável e intolerada de alguns bens, de alguns princípios ou de alguns valores que devam ter-se por estruturantes ou essenciais, um resultado que não seja passível de assimilação pela comunidade jurídica portuguesa, que represente uma quebra ou ruptura absolutamente inaceitável de princípios estruturantes da nossa ordem jurídica14. Pela sua correcção, e pela sempre desejável uniformidade de decisões, esta orientação deste Tribunal Supremo deve reiterar-se.

Efectivamente, o conceito de ordem pública não deixa encerrar-se numa qualquer definição: a ordem pública é conceitualmente indefinível e, por isso, a noção de ordem pública não é unívoca, embora o seja a sua função15. Apesar da sua indeterminação e imprecisão, doutrina e jurisprudência convergem na conclusão de que a ordem pública internacional de um Estado é constituída pelos princípios estruturantes da respectiva ordem jurídica, como são os que integram a Constituição, em sentido material, dado que as normas e princípios constitucionais, sobretudo os que tutelam direitos fundamentais, não só informam, mas também conformam aquela ordem pública16. A Constituição reflecte, indubitavelmente, os valores mais importantes que conformam, no plano estrutural, a ordem jurídica fundamental de uma comunidade, pelo que é nas normas constitucionais que a ordem pública internacional deve assentar, o mesmo sucedendo, entre nós, com os princípios do Direito da União Europeia. São comummente apontados como integrando a ordem pública internacional de cada Estado, entre outros, os princípios estruturantes ou fundamentais como o da boa fé, dos bons costumes, da proibição do abuso de direito, da proporcionalidade e da não discriminação.

De outro aspecto – reitera-se - a cláusula só intervém como limite ao reconhecimento da decisão estrangeira quanto a solução dada ao caso for, não apenas divergente ou contrastante com a que resultaria da aplicação do direito interno do Estado do reconhecimento, v.g., o português – mas manifestamente incompatível com os princípios fundamentais da respectiva ordem jurídica. O recurso á cláusula de ordem pública só deve admitir-se quando o reconhecimento – ou a execução – da decisão, estadual ou arbitral, proferida noutro Estado viole de forma inaceitável a ordem jurídica do Estado requerido, por atentar contra um princípio fundamental. A fim de respeitar a proibição de revisão de mérito da decisão estrangeira, esse atentado deve constituir uma violação manifesta, ostensiva, patente, de uma regra de direito considerada essencial na ordem jurídica do Estado requerido ou de um direito reconhecido como fundamental nessa ordem jurídica, o que só sucederá se o reconhecimento conduzir a um resultado intolerável17, absolutamente intolerável18, ou chocante19.

A recorrente alega, a propósito deste requisito de reconhecimento da decisão arbitral francesa, que este acto decisório, manifestamente dá primazia a interesses económicos na sequência de um acordo, em detrimento da proteção ambiental e das populações, violaria diretamente disposições constitucionais do Estado português e que reconhecer uma sentença estrangeira que privilegia uma exploração mineira, que causa danos ambientais irreversíveis e prejudica as comunidades locais, constituiria uma clara violação deste princípio. Mas é claro que a objecção deve ter-se por improcedente.

A sentença arbitral cujo reconhecimento é pedido não atribuiu ou concedeu à recorrida qualquer direito de exploração de recursos mineiros – mas, como linearmente decorre do seu Capítulo VIII, dos §§ 680 e ss. e do seu dispositivo – antes vinculou a recorrente ao cumprimento de uma – pura - obrigação de indemnização pecuniária, por violação da obrigação de conceder um tratamento justo e equitativo ao investimento, relativo a licenças de exploração mineira, da recorrida, indemnização que o tribunal arbitral computou por recurso aos princípios do ressarcimento integral e da eliminação das consequências da violação, julgando também adequada uma metodologia do valor de mercado justo. Tendo presente a natureza da prestação a que a sentença arbitral vinculou a requerida, recorrente, se é seguro que se repercute na sua esfera jurídico-patrimonial, não o é menos que o seu cumprimento não tem, por definição, qualquer impacto no território da recorrente, pelo que o argumento de que o reconhecimento da decisão dos árbitros provoca danos ambientais e prejudica as comunidades locais é completamente deslocado.

Depois, o que a cláusula da contrariedade à ordem pública internacional impõe ao tribunal do reconhecimento da sentença arbitral é a averiguação se o resultado desse reconhecimento é incompatível com sua ordem pública internacional material, e se essa incompatibilidade é manifesta, patente ou gritante, e não se a sentença objecto do reconhecimento regulou de modo adequado os interesses conflituantes das partes relativamente ao objecto litigado, dado que isso implicaria o exame do conteúdo material daquela sentença, e um novo julgamento da causa, o que proibição de révision au fond impede, injuntiva e completamente.

Porém, segundo a recorrente, o reconhecimento da sentença arbitral viola o princípio dos superiores interesses do Estado. Mas no tocante a este fundamento de oposição ao reconhecimento é também evidente o equívoco de perspectiva da recorrente. Para a recusa do reconhecimento da sentença arbitral estrangeira, o que releva não são os interesses do Estado Venezuelano – que, supõe-se, os acautelou na convenção internacional que concluiu com o Canadá, quando violou a obrigação determinante da sua constituição, segundo a decisão arbitral, na obrigação, substitutiva, de indemnização e quando, por acto contratual, se confessou devedora da indemnização em que foi condenada e convencionou os termos do seu pagamento – mas sim - repete-se – se os resultados do reconhecimento violam a ordem pública internacional material do Estado Português, ordem pública a que são, de todo, inteiramente estranhos os interesses, por mais proeminentes ou eminentes que sejam, do Estado estrangeiro, interesses que, na espécie sujeita, são, aliás, de índole puramente patrimonial. De resto, uma sentença arbitral que vincula um Estado, com fundamento na violação de direitos ou posições jurídicas subjectivas de um particular, a uma obrigação de indemnização é, de todo, compatível com a ordem pública internacional material do Estado Português, considerado o princípio, de dignidade constitucional, da responsabilidade civil ou patrimonial do Estado, que garante a substantividade jurídico-constitucional sobretudo como um direito de defesa, legitimador de pretensões indemnizatórias contra a violação de direitos, liberdades e garantias de quaisquer pessoas, singulares ou colectivas (art.ºs 22.º da Constituição da República Portuguesa e 1.º do Regime da Responsabilidade Civil Extracontratual do Estado e Demais Entidades Públicas, aprovado pela Lei n.º 67/2007, de 31 de Dezembro, na sua redacção actual).

Obtempera, porém, a recorrente que o reconhecimento da sentença arbitral estrangeira, ofende o princípio da não ingerência – que não caracteriza – que, no seu ver, se baseia na ideia de que tribunais estrangeiros, completamente alheios à causa, não devem ser usados para reforçar decisões que não tenham qualquer relevância, direta ou indiretamente, para o próprio Estado, e que a ordem pública internacional, que inclui o respeito pela soberania e não ingerência, pode ser invocada para impedir a aplicação de uma sentença arbitral estrangeira que viole este princípio, sendo que, não pode o Tribunal a quo escudar-se da CNI para justificar qualquer situação. Mas a verdade, é que pode.

A Constituição da República consagra, no domínio das relações internacionais, o princípio da não ingerência nos assuntos internos dos outros Estados, que constitui, aliás, um dos princípios de direito internacional comum pelo que, mesmo no silêncio da Constituição, sempre vincularia o Estado Português (art.º 7.º, n.º 1).

Simplesmente – como, com correcção a recorrida observa na resposta ao recurso – a intervenção do Estado Português, através do tribunal do reconhecimento, legitima-se, por um lado, na aceitação expressa pela recorrente, no art.º XII da Convenção ou do tratado que concluiu com o Canadá, do recurso à arbitragem e, por outro, porque o Estado Português – tal, como, aliás, o Estado Venezuelano - se vinculou, por força da CNI, a reconhecer a autoridade de uma sentença arbitral e a conceder-lhe, se fosse caso disso, execução (art.º III). Dito doutro modo: a intervenção do Estado Português, através do órgão jurisdicional de reconhecimento, decorre, aqui, por um lado, de um acto de vontade, de natureza contratual da recorrente – dado que a arbitragem apesar de jurisdicional na sua função e pública no seu resultado, é privada na sua natureza e contratual na sua origem – e, por outro, do cumprimento de uma obrigação – aliás, recíproca – que lhe é imposta por um instrumento convencional internacional a que está vinculado. De resto, também a este propósito, importa reiterar que ao tribunal do reconhecimento está proibido qualquer julgamento ou reapreciação do mérito da decisão arbitral – actividade que, essa sim, poderia, de algum modo, consubstanciar a violação do princípio da não ingerência - limitando-se a verificar se reúne os pressupostos exigidos para o reconhecimento, de que se salienta a não incompatibilidade da sentença arbitral com a ordem púbica internacional material do respectivo Estado.

A recorrente logo objecta, porém, que o reconhecimento da sentença arbitral viola o princípio da proporcionalidade, dado que, no seu ver, a obrigação de indemnização a que aquela sentença a vinculou é arbitrária e desproporcional. Também, quanto a esta objecção, convém recordar – e repetir - à recorrente, que ao tribunal do reconhecimento está vedado qualquer exame de mérito ou de fundo da sentença arbitral, e só um exame dessa espécie permitiria concluir pelo carácter arbitrário ou desproporcionado, por referências aos danos reparáveis ou ressarcíveis, do quantum da indemnização fixado por aquela decisão. Além disso, é notório que os critérios utilizados pelos árbitros no cálculo da obrigação substitutiva de indemnização, coincidem na essência, com os dispostos na lei interna, nitidamente orientada pelo princípio da reparação integral do dano, indemnização que, revestindo natureza pecuniária, é computada segundo a chamada teoria ou hipótese da diferença, sendo certo, de resto, que no tocante a um dos parâmetros de cálculo da indemnização – o do justo valor de mercado – de que os árbitros se socorreram, a recorrente e a recorrida, como expressamente consta dos §§ 681 e 687 da sentença arbitral, reconheceram a sua adequação enquanto parâmetro do cômputo, sempre complexo e difícil, da indemnização (art.º 562.º do Código Civil).

Por último, a invocação do carácter arbitrário ou desproporcional da indemnização que o tribunal arbitral impôs à recorrente constitui um verdadeiro venire contra facta própria.

Tanto no Setlement Agreement que concluiu com a recorrida, como nos três aditamentos que sofreu, a recorrente confessou-se devedora integral do montante em cujo pagamento foi condenada na Sentença Arbitral e acordou com a Autora os termos em que pagaria esse montante – convenção que, segundo a qualificação que se julga correcta, integra um contrato de acertamento, e não de transacção, genericamente admissível à sombra do princípio da autonomia provada, através do qual as partes acordam em determinar a existência ou o conteúdo de uma situação jurídica, duvidosa mas não litigiosa (art.º 405.º do Código Civil).

Ora a parte que, vinculada por decisão heterónoma, no caso arbitral, que a adstringiu ao pagamento de uma indemnização se confessa devedora, por acto contratual concluído com o credor, dessa mesma indemnização e convenciona com aquele credor os termos do seu pagamento, reconhece, implícita e necessariamente a correcção da decisão condenatória, designadamente quanto ao aspecto nevrálgico, da proporcionalidade do quantum indemnizatório e, em consequência não deve ser admitida a invocar, o carácter desproporcional da reparação arbitrada, enquanto fundamento de não reconhecimento da decisão arbitral condenatória, por violação da ordem pública material do Estado do reconhecimento.

Como derradeiro argumento ou fundamento de oposição ao reconhecimento da decisão arbitral estrangeira, a recorrente invoca o abuso, pela recorrida, do direito, alegação que compreende, do mesmo passo, o abuso do direito á acção – que se verifica quando o autor utilizada a acção com uma finalidade diversa daquela que é a sua função – a obtenção da tutela jurisdicional - quando ocorre um uso reprovável do processo – e do direito de acção, que se dá quando se verifica o exercício abusivo de um direito substantivo e que tem por consequência a improcedência da acção ou a procedência da contestação ou oposição20.

O acórdão recorrido desamparou a alegação com fundamento em que não se verificam os requisitos do abuso do direito, nem sequer tal invocação está contida na CNI. Este último argumento não é correcto, dado que em matéria de reconhecimento de decisões estrangeiras, o abuso do direito sempre releva por a sua proibição constituir um princípio integrante da ordem pública internacional material do Estado Português e, consequentemente, por via deste fundamento de recusa do reconhecimento da decisão arbitral estrangeira, dado que esta é apta para veicular todos os princípios e normas fundamentais de ordem jurídica do foro que tenham a aplicação a situações transnacionais. Mas é correcto o primeiro.

Desde logo, porque a recorrente não produziu um alegação concludente de que o pedido de reconhecimento a recorrida aja em abuso do direito, que de, modo amplo, consiste no exercício ilegítimo - ilícito - de direitos ou posições jurídicas, e a qual são reconduzidos, entre outras tipologias de actos abusivos, com os quais se procura densificar a indeterminação do conceito correspondente, o venire contra factum proprium, quer dizer, a proibição do comportamento contraditório; a supressio (supressão), ou seja, a neutralização de um direito que durante muito tempo se não exerceu, tendo-se criado, pela própria conduta, uma expectativa legítima de que não iria ser exercido, e a surrectio, i.e., o surgimento de um direito por força de um comportamento contraditório qualificado pelo decurso do tempo, o desequilíbrio no exercício de posições jurídicas, v.g., por desproporcionalidade entre a vantagem auferida pelo titular do direito e o sacrifício imposto por esse exercício a outrem21 (art.º 334.º do Código Civil). Depois, porque as alegações com base nas quais a recorrente assaca à recorrida o abuso do direito de pedir o reconhecimento - que a Recorrida visa o reconhecimento da sentença arbitral para efeitos de execução em Portugal, apesar de bem saber que a República Bolivariana da Venezuela não possui bens penhoráveis no país e que não há dúvidas que o real interesse da Recorrida não é executar os valores peticionados contra a Recorrente, mas sim a execução de bens de outras entidades venezuelanas alegando o levantamento da respetiva personalidade jurídica – não encontram na matéria de facto que a Relação considerou adquirida para o processo - a que não apontada qualquer defeito – a mínima tradução. O que não deve surpreender dado que, na oposição ao pedido reconhecimento, no qual invocou aqueles factos, a recorrente não produziu, nem se propôs produzir, qualquer prova adequada, ordenada para a demonstração da sua realidade ou veracidade. De resto, como se observou, em face da CNI, o interessado na revisão e na confirmação da sentença arbitral estrangeira pode, licitamente, limitar-se a pedir o seu reconhecimento.

Todas as contas feitas, a conclusão a tirar é a de que não está verificado, no caso, um qualquer fundamento de recusa – maxime o da contrariedade ou incompatibilidade da decisão arbitral com a ordem pública material internacional do Estado Português – do seu reconhecimento. E em face desta conclusão, a improcedência da revista é meramente consequencial.

Do percurso argumentativo percorrido, extraem-se, como proposições conclusivas, mais salientes as seguintes:

- Dado que a imunidade de jurisdição do Estado constitui uma prerrogativa ou um privilégio disponível, o Estado que, expressa ou tacitamente, consentiu no exercício da jurisdição por Estado estrangeiro, designadamente no reconhecimento de uma sentença arbitral estrangeira, não deve ser admitido a opor, ao pedido desse reconhecimento, a excepção da imunidade de jurisdição;

- O recurso á cláusula de ordem pública internacional material do Estado português, enquanto fundamento de recusa da confirmação da sentença arbitral estrangeira, só deve admitir-se quando o reconhecimento da decisão dos árbitros viole de forma inaceitável a ordem jurídica portuguesa, por atentar contra um princípio fundamental, pelo que, a fim de respeitar a proibição de revisão de mérito da decisão arbitral estrangeira, esse atentado deve constituir uma violação manifesta, ostensiva, patente, de uma regra de direito considerada essencial ou de um direito reconhecido como fundamental, o que só sucederá se o reconhecimento conduzir a um resultado absolutamente intolerável ou chocante, de todo não assimilável pela ordem e pela comunidade jurídica portuguesas.

A recorrente sucumbe no recurso. Essa sucumbência torna-a objectivamente responsável pelas respectivas custas (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do CPC).

4. Decisão.

Pelos fundamentos expostos, nega-se a revista.

Custas pela recorrente.

2025.07.09

Henrique Antunes (Relator)

Maria João vaz Tomé

António Domingos Pires Robalo

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1. Aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 37/94, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 37/94, que iniciou a sua vigência, de harmonia com o aviso do Ministério dos Negócios Estrangeiros n.º 142/95, de 21 de Junho, em 16 de Janeiro de 1995↩︎

2. Informação disponível em https://treatis.un.org/doc/Publications/MTDSG/Volume%2011.↩︎

3. Ac. da RE de 31.01.2008 (1141/06-2) e, com indicações, o Guia Relativo à Convenção sobre o Reconhecimento e a Execução das Sentenças Arbitrais Estrangeiras (Novo Iorque, 1958), disponível http://newyorkconvention1958.0rg/pdf/guide/2016_Guide_on_the_NY..., pág. 24 (versão em inglês).↩︎

4. António Sampaio Caramelo, o Reconhecimento e Execução de Sentenças Arbitrais Estrangeiras, Almedina, Coimbra, 2016, págs. 24 e 25.↩︎

5. Assim, o Ac. do STJ de 29.03.2022 (15998/18), Isabel Alexandre, Direito Processual Internacional, 5.ª edição, Gestlegal, Coimbra, 2019, pág. 300, e Miguel Teixeira de Sousa, blogippc.blogspot.com, entrada de 06.04.2022, Jurisprudência 2021 (170); diferentemente, os Acs. do STJ de 08.09.2021 (19354/20) e 13.04.2023 (1948/21).↩︎

6. Acs. do STJ de 19.01.2023 (25603/21), 18.02.2006 (0583279) e 07.12.2016 (2079/15).↩︎

7. Ac. do STJ de 19.01.2023, cit.,, e João de Castro Mendes/Miguel Teixeira de Sousa, Manual de Processo Civil, Vol. I, AAFDL, 2022, pág. 301.↩︎

8. Aprovada pela Resolução da Assembleia da República n.º 46/2006, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 57/2006 (DR I-A, n.º 117, de 20 de Junho de 2006). O instrumento de ratificação foi depositado junto o Secretário-Geral da ONU no dia 14 de Setembro de 2006 (Aviso n.º 698/2006, de 12 de Outubro)↩︎

9. Informação obtida em treaties.un.org.pt↩︎

10. Ac. do STJ de 07.12.2016 (2079/15) Jónatas E. Machado , Direito Internacional, Coimbra Editora, 4ª edição, pág. 242.↩︎

11. Aprovada para ratificação pela Resolução da Assembleia da República n.º 67/2003, ratificada pelo Decreto do Presidente da República n.º 46/2003 (DR I-A, n.º 181, de 07/08/2003.↩︎

12. Parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria-Geral da República, nº 11/2022, disponível em Portal do Ministério Público, https://www,ministeriopublico.pt»pareceres-pgr., e Luís de Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, Vol. I, introdução e Direito dos Conflitos. Parte Geral, AAFDL. 3.ª edição, 2021, pág. 32 – na medida em que a Convenção representa, até certo ponto, uma codificação do Direito Internacional Público Geral e que, quando vai mais além, reflecte um amplo consenso internacional, é recomendável que os tribunais portugueses sigam as suas soluções mesmo antes da sua entrada em vigor.↩︎

13. Luís de Lima Pinheiro, Arbitragem Transnacional, A Determinação do Estatuto da Arbitragem, Almedina, pág. 311, e António Menezes Cordeiro, Tratado da Arbitragem, Comentário à Lei n.º 63/2011, de 14 de Dezembro, Almedina, pág. 549.↩︎

14. Por último, v.g., os Acs. de 15.05.2025 (1355/24) e (63/24).↩︎

15. Baptista Machado, Lições de Direito Internacional Privado, 3.ª edição, 1992, pág. 359.↩︎

16. Acs. do STJ de 14.03.2017 (103/13.1YRLSB.S1) e da RL de 16.01.2014 (103/12.4YRLSB-8), Luís Lima Pinheiro, Direito Internacional Privado, I, 2014, pág. 663 e Apontamentos sobre a impugnação da decisão arbitral, ROA, Ano 2007, vol. III, Dez. 2007, Moura Ramos, Direito Internacional Privado e Constituição, 1991, págs. 251 e 252, Ferrer Correia, A revisão do Direito Internacional Privado, Estudos Vários de Direito, Coimbra, 1982, pág. 300.↩︎

17. Baptista Machado, cit. pág. 32.↩︎

18. Ferrer Correia, Direito Internacional Privado, Alguns Problemas, 1991, pág. 126.↩︎

19. Oliveira Ascensão, Parecer, CJ, X, 4.º, 23 e ss.↩︎

20. Ac. do STJ de 12.01.2021 (2689/19).↩︎

21. António Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Parte Geral, 2ª edição, Almedina, 2000, cit. págs. 250 a 265, e Da Boa Fé no Direito Civil, vol. II, Coimbra, 1984, § 30, págs. 797 e ss.↩︎