Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | ALVES CARDOSO | ||
Descritores: | IRREDUTIBILIDADE DA RETRIBUIÇÃO IRCT | ||
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Nº do Documento: | SJ20080710013334 | ||
Data do Acordão: | 07/10/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | I - O princípio da irredutibilidade da retribuição reporta-se ao seu valor global e não, directamente, a cada uma das suas componentes II - Este entendimento é aplicável independentemente do modo de cálculo das parcelas componentes, ou seja, mesmo que o valor de alguma das componentes seja calculado com base em determinada percentagem da retribuição-base, na medida em que os acréscimos constituem parcelas, ainda que variáveis, da retribuição, e é o valor global desta que está em causa quando se analisa a sua irredutibilidade global. III - A diminuição da retribuição, quando tal esteja consagrado em instrumento de regulamentação colectiva aplicável, é uma das excepções ao princípio da irredutibilidade da retribuição previstas na alínea c) do n.º1 do artigo 21.º da LCT. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I. Relatório AA intentou a presente acção declarativa de condenação, sob a forma comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra Pingo Doce – Distribuição Alimentar, SA, pedindo a condenação desta a pagar-lhe: 1. a quantia de € 38.891,58, correspondente às seguintes prestações e quantias parcelares: a) € 16.520,16, a título do não pagamento integral da remuneração respeitante ao trabalho prestado aos Domingos, desde 1/5/1994 e 31/10/2004; b) € 1.997,46, a título do não pagamento integral da remuneração respeitante ao trabalho prestado aos feriados, desde 1/5/1994 e 31/10/2004; c) € 615,48, a título do não pagamento integral da remuneração respeitante ao trabalho nocturno prestado, desde 1/ 5/1994 e 31/12/2003; d) € 5.285,16, a título da não inclusão nas remunerações das férias e subsídio de férias das médias do trabalho prestado aos Domingos, feriados e em horário nocturno, desde 1/9/1993 e 31/10/2004; e) € 2.962,50, a título da não inclusão nas remunerações do subsídio de Natal das médias do trabalho prestado aos Domingos, feriados e em horário nocturno, desde 1994 a 2004; f) € 11.510,82, a título de diferenças salariais referentes à remuneração que deveria ter sido paga ao Autor como Chefe de Talho e aquela que efectivamente auferiu, desde 1/10/1999 a 30/11/2004; II - as importâncias que se vencerem até decisão final e respeitantes às prestações acima discriminadas; III - juros de mora calculados sobre os montantes referidos em I e II, à taxa legal de 4%, desde a citação da Ré e até integral pagamento. Após infrutífera audiência de partes, contestou a Ré, por excepção e impugnação: a) por excepção, alegou o pagamento efectivo, na retribuição das férias vencidas em 1/1/2004 e correspondente subsídio de férias, das médias das remunerações auferidas pelo Autor em virtude do trabalho prestado aos domingos; b) por impugnação, negou parte do alegado pelo Autor, com referência a cada um dos factos invocados como causas de pedir relativamente aos pedidos deduzidos por aquele na sua petição inicial, alegando, em síntese, o seguinte: - O A. não exerceu, a partir de Outubro de 1999 e durante vários anos, as funções de Chefe de Secção de Talho, coordenando os trabalhadores daquela secção, sendo certo que a alegação efectuada é vaga; - O Autor não teve desde a sua admissão o horário de trabalho por ele alegado, nem trabalhou sempre ao Domingo de duas em duas semanas; - O A. não recebeu as médias remuneratórias a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e feriados, entre 1/1/1993 e 30/11/2004, que são por ele indicadas; - Ela, R., relativamente à remuneração do trabalho prestado aos Domingos e feriados, não aplicou o CCT do Comércio de Carnes, pois que, a partir de Abril de 1994, passou a aplicar o CCT para os Hiper e Supermercados, assim como não pagou as médias do trabalho nocturno ou prestado aos Domingos e feriados na retribuição das férias e subsídio de férias, por a tal não estar legalmente obrigada até à entrada em vigor do Código de Trabalho, pois aquelas realidades não possuíam natureza retributiva para aquele efeito; - Não aceitou ou sequer reconheceu ao Autor o direito de receber as médias do trabalho nocturno e prestado aos Domingos e feriados na retribuição das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal; - Em virtude das alterações percentuais relativas ao trabalho nocturno e ao prestado aos domingos e feriados, não diminuiu a retribuição do Autor, pois a alteração de tais realidades, que obedeceu à aplicação do novo CCT, foi devidamente compensada com aumentos salariais, directos ou indirectos, não tendo ocorrido uma redução global da retribuição total do demandante; - Além disso, não deixou, a partir de Maio de 1994, de pagar ao A. os dias trabalhados em Domingos, dado que passou a fazê-lo através do chamado "Subsídio de Domingo" (100%), integrado na retribuição-base; - Acrescenta que, com a referida conduta, não violou o princípio de salário igual, trabalho igual; Pugnou, em consequência, pela improcedência da acção. O Autor apresentou resposta à excepção, na qual aceitou que recebeu as quantias constantes das rubricas indicadas pela R., mas afirmou desconhecer a que título foi feito o pagamento, pelo que concluiu como na petição inicial. Procedeu-se à audiência de julgamento, com observância do formalismo legal, tendo a decisão relativa à matéria de facto sido objecto de arguição de nulidade, por parte da Ré, a qual foi indeferida por despacho de fls. 535/537. Em seguida, foi proferida sentença em que, julgando-se parcialmente procedente a acção, se decidiu: “ I - Condenar a Ré a pagar ao Autor o montante de 13.195,51 €, correspondente às seguintes prestações e quantias parcelares, que se venceram até 31/10/2004: a) Euros 3.559,29, a título da não inclusão nas remunerações das férias, subsídio de férias e subsídio de Natal das médias do trabalho prestado aos Domingos, Feriados e em horário nocturno, desde 1/9/1993 e 31/10/2004; b) Euros 9.636,22, a título de diferenças salariais referentes à remuneração que deveria ter sido paga ao Autor, como chefe de talho, e aquela que efectivamente auferiu, desde 1/10/1999 a 30/11/2004; II - Condenar a Ré a pagar ao Autor as importâncias que se vencerem até decisão final e respeitantes às prestações acima discriminadas e enquanto a demandada não regularizar tais situações, nos termos apreciados e ordenados; III - Condenar a Ré a pagar ao Autor os juros calculados à taxa legal de 4% ao ano e contados desde a citação da Ré e até integral pagamento dos montantes mencionados nos pontos I e II.” Inconformada, a R. interpôs recurso de agravo do despacho que indeferiu a nulidade, por ela arguida, relativamente à decisão sobre a matéria de facto. A. e R. apelaram da decisão final, aquele subordinadamente, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, pelo acórdão de fls. 797 a 807, decidido: A) Não conhecer do recurso de agravo interposto pela Ré; B) Julgar improcedentes os recursos de apelação interpostos pela Ré e pelo Autor; C) Confirmar a sentença recorrida. Inconformados com a decisão, A. e R. recorreram de revista, tendo o recurso desta sido julgado deserto, por falta de alegações, pelo despacho de fls. 859, que transitou em julgado. Nas suas alegações, o A. formulou as seguintes conclusões: “1. O A. intentou acção contra a R. alegando em suma, no que interessa para o presente recurso, que: a) Tendo sido admitido ao serviço da R. em 1 de Agosto de 1991, a R. sempre pagou ao A., até Abril de 1994, o trabalho prestado aos Domingos e feriados, com o acréscimo de 200%, tendo no entanto deixado de o fazer a partir de Maio de 1994, passando a partir esse mês a pagar o trabalho prestado aos Domingos e feriados mas somente com o acréscimo de 100%, e quanto ao trabalho nocturno a R. sempre o pagara até Abril de 1994 com o acréscimo de 50%, mas a partir de Maio desse ano passou a pagá-lo somente com o acréscimo de 25%; b) A R. nunca lhe pagara nas férias e subsídio de férias e no subsídio de Natal a média daqueles acréscimos retributivos em violação do art. 6° do Dec. - Lei 874/76 e do Dec. - Lei 88/96; c) Ao trabalhador da R. JS, tal como o A. chefe de talho, a R. sempre lhe pagara o trabalho prestado aos Domingos e feriados e o trabalho nocturno com os acréscimos pedidos e bem assim incluía no pagamento das férias, subsídio de férias e de Natal as médias daqueles acréscimos retributivos; d) A partir de Outubro de 1999 o A. passara a desempenhar as funções de Chefe de Talho mas a R. continuara a pagar - lhe como oficial cortador de carnes, sendo - - lhe devidas as diferenças de retribuição respectivas; 2. Pedia por isso a condenação da R. a pagar-lhe as diferenças dos acréscimos retributivos pelo trabalho prestado aos Domingos e feriados e pelo trabalho nocturno prestado e ainda a pagar - lhe a média desses acréscimos retributivos nas férias, subsídio de férias e de Natal, quer por a sua diminuição representava violação do art. 21°, n° 1, c), do Dec. - Lei 49.408, quer a violação do princípio de que a trabalho igual corresponde salário igual, e finalmente as diferenças salariais decorrentes das funções de Chefe de Talho que desempenhava; 3. Proferida sentença o Mm.º Juiz da 1.ª instância condenou a R. no pagamento ao A. das férias, subsídio de férias e de Natal na média dos acréscimos retributivos pelo trabalho prestado aos Domingos e feriados, e pelo trabalho nocturno prestado, condenando - a também no pagamento das diferenças salariais decorrentes da retribuição que o A. deveria ter auferido como Chefe de Talho, absolvendo a R. do restante pedido, decisão que foi confirmada na parte em que aquela sentença absolveu a R. pelo Acórdão agora recorrido; 4. Ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, não há que apreciar somente a questão da diminuição global da retribuição do A. porquanto, tratando - se, como se trata, de acréscimos retributivos, é manifesto que os mesmos incidiam sobre a retribuição de base sendo por isso proporcionalmente aumentados sempre que a retribuição de base sofria aumentos - É o que resulta dos recibos juntos aos autos e que a própria contestação da R. não refutou; 5. A R. ao proceder como procedeu modificou unilateralmente a componente retributiva que se referia aos acréscimos por trabalho prestado aos Domingos, feriados e trabalho nocturno impedindo com esse procedimento que o A. em razão do trabalho prestado naquelas situações beneficiasse de acréscimos retributivos por esse facto, nos termos em que beneficiava até então, situação que, com o decurso do tempo revertia inevitavelmente numa diminuição objectiva da retribuição uma vez que os aumentos periódicos da retribuição de base nunca seriam reflectidos na mesma percentagem em que o eram anteriormente na prestação de trabalho aos Domingos, feriados e trabalho nocturno; 6. Existe pois efectiva diminuição global da retribuição do A. quando em razão dos aumentos da retribuição de base o A. não viu aumentados os acréscimos retributivos no mesmo montante percentual que se verificava anteriormente; 7. Tendo - se dado como provado que a R. até Abril de 1994 sempre pagara o trabalho prestado aos Domingos e feriados com o acréscimo de 200%, e o trabalho nocturno com o acréscimo de 50%, esses pagamentos verificados com regularidade ao A., criaram no A. a legítima expectativa de continuar a ser remunerado por essa forma nos termos e com as consequências previstas no arte 82° do Dec. - Lei 49.408; 8. Assim não decidindo, o Acórdão recorrido violou o art.º 21º nº1, c), do mesmo diploma legal”. A Ré não contra-alegou. Neste Supremo Tribunal, a Exma. Procuradora-Geral-Adjunta emitiu “parecer” no sentido de ser negada a revista. Este parecer foi notificado às partes, não tendo suscitado qualquer resposta destas. Colhidos os “vistos” legais, cumpre decidir: II. Matéria de facto O acórdão recorrido deu como assente a seguinte factualidade, que se aceita por não se vislumbrar fundamento legal para a sua alteração: 1. A Ré é uma empresa que se dedica ao comércio e distribuição de produtos alimentares, possuindo para tanto diversos estabelecimentos de venda ao público, possuindo talhos em tais instalações; 2. O Autor foi admitido ao serviço da Ré em 1 de Agosto de 1991, como 2.º oficial - cortador de carnes, tendo desde essa data desempenhado as suas funções sob as ordens, direcção e autoridade daquela; 3. O Autor, desde 1/8/1991 até 30/11/2004, conheceu a seguinte evolução em termos de carreira profissional: a) 2.º Oficial - cortador de carnes: 1/8/1991 a 30/4/1994; b) 1.º Oficial - cortador de carnes: 1/5/1994 a 31/5 ou 30/6/1997; c) Oficial de carnes especializado: 1/6 ou 1/7/97 a 31/10/2001; d) Oficial de carnes principal: 1/11/2001 até, pelo menos, 30/11/2004; 4. O Autor, desde a sua admissão ao serviço da Ré, desempenhou funções nos talhos dos seguintes supermercados da Ré: a) Linda-a-Velha - 1/8/1991 até data incerta, não posterior a 1/1/1993; b) Alcântara - 1/1/993 a 31/7/1997; c) São Marcos - 1/8/1997 a 30/9/1997; d) Alfragide - 1/10/1997 a 31/3/2003; d) Gemini - 1/4/2003 até, pelo menos, 30/11/2004; 5. O Autor, a partir de, pelo menos, 1/6/1993, teve o seguinte horário de trabalho: entrada às 7h00 e saída às 17h00, com intervalo de descanso diário das 12h00 às 14h00, de 2.ª Feira a Domingo, sendo o dia de descanso semanal às 3.ª Feiras e 4.ª Feiras e Domingo e 5.ª Feiras, alternadamente; 5-A Certamente por lapso, constam da matéria de facto dois factos distintos sob o número 5, pelo que se atribuiu ao segundo o n.º 5-A.. As contrapartidas pecuniárias mensais recebidas pelo Autor desde Janeiro de 1993 foram as seguintes: a) De 1 de Janeiro de 1993 a 30 de Junho de 1994, 67.000$00 (334,19 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; b) De 1 de Julho de 1994 a 28 de Fevereiro de 1995, 78.200$00 (390,06 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; c) De 1 de Março de 1995 a 28 de Fevereiro de 1996, 82.500$00 (411,51 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; d) De 1 de Março de 1996 a 28 de Fevereiro de 1997, 85.600$00 (426,97 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; e) De 1 de Março de 1997 a 31 de Março de 1998, 100.600$00 (501,79 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; f) De 1 de Março de 1998 a 28 de Fevereiro de 1999, 103.700$00 (517,25 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; g) De 1 de Março de 1999 a 31 de Março de 2000, 107.200$00 (534,71 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; h) De Abril de 2000 a Fevereiro de 2001, Esc. 115.000$00 (573,62 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; i) De Março de 2001 a Dezembro de 2001, 135.000$00 (673,38 €) de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; j) De Janeiro de 2002 a Dezembro de 2002, 695,00 € de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de trabalho nocturno e serviço prestado aos Domingos e Feriados; K) De Janeiro de 2003 a Dezembro de 2003, 711,00 € de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de serviço prestado aos Domingos e Feriados; l) De Janeiro de 2004 a Novembro de 2004, 726,00 € de retribuição base, para além dos montantes constantes dos respectivos recibos e que foram liquidados pela Ré, designadamente, a título de serviço prestado aos Domingos e Feriados, conforme ressalta dos recibos de vencimento juntos aos autos a fls. 16 e seguintes, como Documentos números 1 a 164 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 6. A Ré, desde Janeiro de 1993 e até 30/4/1994, pagou ao Autor o exercício de funções ao Domingo de duas em duas semanas, com o acréscimo de 200%; 7. A partir de Maio de 1994, no entanto, a Ré passou a pagar ao Autor o serviço prestado aos Domingos e feriados com o acréscimo de 100%; 8. A Ré, desde 1/8/1992, não integrou na remuneração referente às férias, subsídio de férias e de Natal, as médias das contrapartidas pecuniárias auferidas pelo desempenho de funções aos Domingos e feriados e a título de trabalho nocturno; 9. Entre 1 de Junho de 1993 e 30 de Abril de 1994, a Ré sempre pagou ao Autor o serviço a título de trabalho nocturno com o acréscimo de 50%; 10. A partir de 1/5/1994, a Ré passou a pagar ao Autor esse mesmo serviço realizado a título de trabalho nocturno com o acréscimo de 25%; 11. A Ré aceitou integrar na remuneração referente às férias, subsídio de férias e de Natal, as médias das contrapartidas pecuniárias auferidas pelo desempenho de funções aos Domingos e feriados e a título de trabalho nocturno desde que constituam verbas regulares e periódicas, em reunião convocada e havida no IDCT, no dia 6/6/2000, conforme Documentos n.ºs. 165 e 166, juntos a fls.179 e seguintes e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 12. A Ré paga ao cortador de carnes ao seu serviço, com a categoria de Chefe de Talho, de nome JS, quer o serviço prestado aos Domingos e feriados com aquele acréscimo de 200%, quer aquele realizado como trabalho nocturno, com o acréscimo de 50%, conforme documentos juntos a fls. 254 e seguintes e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido; 13. A Ré, relativamente a esse trabalhador JS, procede à inclusão na remuneração das férias, subsídio de férias e de Natal, da média das quantias liquidadas a título do trabalho nocturno, dos Domingos e dos feriados; 14. Os acréscimos devidos pelo serviço prestado aos Domingos, feriados e por trabalho nocturno são processados e pagos pela Ré no mês seguinte ao da sua execução, conjuntamente com o salário desse mês (seguinte) e com a correspondente menção no respectivo recibo; 15. A Ré pagou o serviço prestado aos feriados através do denominado "subsídio de feriado", conforme ressalta dos recibos juntos aos autos a fls. 16 e seguintes, como documentos números 1 a 164 e cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzidos; 16. Os "subsídio de feriado" e "subsídio de domingo" pagos pela Ré ao Autor passaram, em Maio de 1994, a ser calculados com base no valor/hora de Esc. 451$15, quando até aí tal valor era de Esc. 351$40; 17. O subsídio de alimentação pago pela Ré ao Autor, passou, em Abril de 1994, para Esc. 14.300$00 mensais, quando até aí era no montante mensal de Esc. 8.800$00; 18. O Autor não prestou serviço a título de trabalho nocturno nos anos de 2003 e 2004, conforme ressalta dos recibos de vencimento juntos aos autos; 19. A partir de Outubro de 1999, o Autor passou a exercer, entre outras, as seguintes funções: a) Gestão corrente do talho; b) Responsabilidade pela organização, limpeza, higienização e arrumação do talho em geral (incluindo vitrinas e câmaras frigoríficas); c) Coordenação dos restantes empregados daquela secção (talho); d) Determinação e orientação do serviço dos restantes empregados da secção de talho; e) Controle, fiscalização e avaliação do serviço prestado pelos restantes empregados da secção de talho; f) Estabelecimento dos horários de trabalho e controle e comunicação das faltas dos restantes empregados da secção de talho, bem como organização e coordenação do mapa de férias destes últimos; g) Realização dos pedidos de carne e recepção da mesma, sendo responsável pela sua divisão, arrumação, exposição e armazenamento; h) Responsável pelas vendas, podendo ainda promover a colocação de produtos excedentes noutros talhos de outras lojas; i) Controle dos "stocks" e responsável pelas quebras (carne imprópria para consumo); j) Fecho diário da loja (talho); 20. O Autor, à imagem dos demais empregados da Ré com idênticas funções, não tem a conta de exploração da respectiva secção de talho a seu cargo e responsabilidade; 21. Parte das funções exercidas pelo Autor e que se encontram descritas na alínea 19) estão dependentes de determinações, orientações e autorizações superiores, como é o caso das seguintes situações: a) Exposição dos produtos (sujeita ao "lay-out" determinado superiormente e comum a todas as lojas); b) Mudanças ao "lay-out" (dependentes de autorização do supervisor ou do gerente de loja); c) Colocação de produtos excedentes noutras lojas (contacto prévio e determinação do supervisor e formalização da saída dos mesmos pelo gerente de loja); d) Mapa de Férias (análise pelo gerente de loja e devolução do mesmo ao Autor, caso considere inadequada a organização e coordenação dos períodos de férias referentes aos empregados do talho); e) Pedidos da carne (Análise e controle dos mesmos por parte do armazém, com eventual alteração, para mais ou para menos, das quantidades e tipos de carne enviados para o talho do Autor); f) Aspecto geral do talho - organização, limpeza, higienização e arrumação - e respectivos produtos (sujeitos a pontuais controles e vistoria por parte do supervisor ou do gerente de loja); 22. O Autor deve, pelo menos, manter informados os supervisor, responsável distrital ou gerente de loja, consoante as competências de cada um, acerca das situações anómalas ou dos aspectos mais importantes e relevantes das respectivas funções e actividade da sua secção de talho, sendo limitado o seu poder autónomo de decisão; 23. Ao conjunto de funções acima descrito é, internamente, atribuída a denominação de "Chefe de Talho" ou "Chefe de Secção" (Talho), existindo empregados que, formal e oficialmente, são denominados e reconhecidos pela Ré como possuindo tal categoria profissional; 24. O "Chefe de Talho" é, nas suas ausências e impedimentos, substituído pelo Subchefe de Talho; 25. As partes aceitam que, a partir de 1994, o CCTV para os Hiper e Supermercados passou a regular a relação profissional dos autos, tendo sido publicado no BTE, 1.ª Série, n.º 12, de 29/3/1994.III. Fundamentação de direito Face ao teor das conclusões da revista que, como é sabido, delimitam o objecto do recurso (arts. 684.º, n.º 3 e 690.º, n.º 1, do CPC, ex vi do art. 1.º, n.º 2, a), do CPT), a única questão fundamental a decidir consiste em saber se a Ré violou o princípio da irredutibilidade da retribuição por virtude de, tendo pago durante algum tempo ao Autor o trabalho prestado aos Domingos e feriados com um acréscimo de 200% e o trabalho nocturno com acréscimo de 50%, a partir de Maio de 1994, ter reduzido tais acréscimos a 100% e 25%, respectivamente, ainda que o mesmo Autor não tenha visto diminuído o montante global das importâncias recebidas a título de retribuição. Sobre esta questão, aduziu-se no acórdão recorrido: “O Autor, aqui Recorrente, alega que tendo a Ré até Abril de 1994 pago o trabalho prestado aos Domingos e Feriados com o acréscimo de 200% e o trabalho nocturno com o acréscimo de 50%, pagamentos esses verificados com regularidade, criou no A. a legítima expectativa a ser remunerado por essa forma e tendo-se provado que a partir de Maio de 1994 a R. passou a pagar o trabalho prestado aos Domingos e feriados com o acréscimo de 100% e o trabalho nocturno com o acréscimo de 25%, violou o art. 21º nº 1 al. c) da LCT. O art. 21º nº 1 al. c) da LCT consagra o princípio da irredutibilidade da retribuição, no sentido de que, em princípio não é lícita a diminuição da retribuição devida como correspectivo da prestação do trabalhador. Mas, conforme referem Mário Pinto e outros (…) esta regra não conhece excepções quando se trate de modificação unilateral; será todavia, admissível quando prevista em fonte juslaboral, ou quando, verificando-se o consenso das partes, seja consentida pela administração do trabalho”. A Ré terá adoptado esse procedimento por aplicação do CCT celebrado entre a APEC e a FEPCES, publicado no BTE nº 12 de 29.03.94, que segundo está provado é aplicado na Ré desde o ano de 1994, o qual estipula nas suas cláusulas que “o trabalho prestado em dias de descanso semanal ou complementar e em feriado será pago com acréscimo de 100% sobre a remuneração base do trabalho” e que o trabalho nocturno será pago com o acréscimo de 25%. Também quanto a esta questão remetemos para a fundamentação constante da decisão recorrida que analisou de forma discriminada a evolução salarial do A. com recurso a quadros ilustrativos, para concluir que apesar de ter havido essa diminuição nas parcelas referentes ao pagamento do trabalho prestado aos Domingos e feriados bem como no trabalho nocturno, no ano de 1994, não se verificou decréscimo retributivo em termos da retribuição global auferida pelo Autor, nem nesse ano nem nos seguintes. A doutrina e jurisprudência dominantes entendem que o princípio da irredutibilidade da retribuição não significa que a entidade patronal esteja obrigada a manter indefinidamente a concessão de determinado tipo de retribuição, não imposta por lei ou por convenção colectiva, desde que, por efeito da alteração na sua composição, a retribuição não sofra redução no respectivo montante global. Também nós entendemos que o princípio da irredutibilidade da retribuição consagrado no art. 21º nº 1 al. c) da LCT, se deve entender em termos globais, não proibindo modificações na arquitectura de cada um dos componentes da retribuição. O que é necessário é que o valor global da retribuição não seja diminuído – cfr., Mário Pinto e Outros, Comentário às Leis do Trabalho, LEX, pág. 99, Ac. do STJ de 15/5/87, Ac. Dout., 311º, 1506, e da Rel. de Lisboa de 13/3/96, Col. Jur., 1996, II, 163 e de 16/2/2005, proc. 565/04-4, in www.dgsi.pt; e neste sentido, vejam-se também os recentes acórdãos desta Relação nº 5699/07 no processo nº 355/07 e Ac. nº 779/07 (nos quais estava em causa, como Ré, o Pingo Doce)”. Alega, porém, o A. que, “ao contrário do decidido no Acórdão recorrido, não há que apreciar somente a questão da diminuição global da retribuição”, mas ter-se em conta também a componente retributiva que se referia aos acréscimos por trabalho prestado aos Domingos, feriados e trabalho nocturno. “Com efeito”, acrescenta, “a R. ao proceder como procedeu modificou unilateralmente a componente retributiva”, uma vez que “os aumentos periódicos da retribuição de base nunca seriam reflectidos na mesma percentagem em que o eram anteriormente na prestação de trabalho aos Domingos, feriados e trabalho nocturno”. E, por isso, no seu entender, existe uma “efectiva diminuição global da retribuição do A. quando em razão dos aumentos da retribuição de base o A. não viu aumentados os acréscimos retributivos no mesmo montante percentual que se verificava anteriormente”, como era “sua legítima expectativa”. Conclui, por isso, que o Acórdão recorrido violou o art.º 21.º, n.º1, c), da LCT então aplicável. Dispõe o referido art.º 21.º, n.º1, c), da LCT, que é proibido à entidade patronal diminuir a retribuição, salvo nos casos previstos na lei, nas portarias de regulamentação do trabalho e nas convenções colectivas, ou quando, precedendo autorização do Instituto Nacional de Trabalho e Previdência, haja acordo do trabalhador. Este preceito consagra o chamado princípio da irredutibilidade da retribuição, segundo o qual a entidade patronal não pode diminuir a retribuição devida ao trabalhador como contraprestação do seu trabalho. Contudo, como é jurisprudência deste Supremo Tribunal, o princípio da irredutibilidade da retribuição reporta-se ao valor global da retribuição e não, directamente, a cada uma das suas componentes. E este entendimento é aplicável independentemente do modo de cálculo das parcelas componentes, ou seja, mesmo que, como sucede no caso em apreço, o valor de algumas das componentes seja calculado com base em determinada percentagem da retribuição base. Com efeito, os acréscimos agora em questão constituem parcelas, ainda que variáveis, da retribuição e é o valor global desta que está em causa quando se analisa a sua irredutibilidade legal. A questão, mesmo nos termos em que a coloca o A, já não é nova, pois, conforme refere a Exma. Procuradora-Geral-Adjunta, no seu parecer, este Supremo Tribunal já teve oportunidade de se pronunciar em vários acórdãos sobre situações de facto em tudo idênticas à do presente recurso (Cfr. os acórdãos de 11-05-2005, Recurso n.º 478/05, de 23-11-2005, Recurso n.º 1960/05, de 03-05-2006, Recurso n.º 4025/05 e de 26-03-2008, Recurso n.º 3791/07, todos da 4.ª Secção). Relativamente à questão decidenda, escreveu-se no último acórdão indicado, aliás, com referência ao anterior: “Como se observou no Acórdão deste Supremo de 3 de Maio de 2006 (Revista n.º 4025/05-4.ª Secção) (…), o princípio da irredutibilidade da retribuição reporta-se ao seu valor global, independentemente do modo de cálculo das parcelas componentes (…), daí que a circunstância de a determinação do valor de uma das parcelas depender da incidência de uma percentagem sobre o valor da remuneração base não seja impeditiva da aplicação do referido critério. É, por conseguinte, lícito ao empregador alterar a estrutura da retribuição, se esta não lhe for imposta por lei, por instrumento de regulamentação colectiva ou pelo contrato. Não se vislumbra fundamento legal para conferir a garantia de irredutibilidade a umas parcelas da retribuição e não a outras, em função da sua forma de cálculo. Decorre do que acima se deixou dito que a lei só protege a expectativa relativamente à manutenção do valor global da retribuição, por isso que não pode acolher-se o argumento aduzido pelo Autor quanto à “legítima expectativa de continuar a ser remunerado”, no tocante ao trabalho prestado em Domingos e feriados com o acréscimo de 200% sobre a remuneração base”. Não vemos qualquer razão ponderosa para alterar a solução que tem vindo a ser uniformemente adoptada por esta mesma Secção do STJ. Por outro lado, como se refere no acórdão recorrido, a R. terá passado a pagar o trabalho prestado aos Domingos e feriados com o acréscimo de 100% e o trabalho nocturno com o acréscimo de 25%, por aplicação do CCTV publicado no BTE, 1.ª série, n.º 12, de 29.03.94, em cujas cláusulas 16.ª, n.º 2, e 18.ª, n.º 1, se fixam tais acréscimos. Ora, como se viu, a diminuição da retribuição, quando tal esteja consagrado em instrumento de regulamentação colectiva aplicável, é uma das excepções previstas no citado alínea c) do n.º 1 artigo 21.º da LCT ao princípio da irredutibilidade da retribuição. Improcedem, por isso, as conclusões do Recorrente. IV. Decisão
Pelo exposto, decide-se negar a revista e confirmar o acórdão recorrido. Custas a cargo do Recorrente.
Lisboa, 10 de Julho de 2008
Alves Cardoso( relator) Bravo Serra Mário Pereira
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