Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||||||||||||||||||||||||||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||||||||||||||||||||||||||
Relator: | CARMONA DA MOTA | ||||||||||||||||||||||||||
Descritores: | TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES TRÁFICO DE MENOR GRAVIDADE ILICITUDE CONSIDERAVELMENTE DIMINUÍDA IMAGEM GLOBAL DO FACTO MEDIDA DA PENA MEDIDA CONCRETA DA PENA PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL | ||||||||||||||||||||||||||
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Nº do Documento: | SJ200701250038395 | ||||||||||||||||||||||||||
Data do Acordão: | 01/25/2007 | ||||||||||||||||||||||||||
Votação: | UNANIMIDADE | ||||||||||||||||||||||||||
Texto Integral: | S | ||||||||||||||||||||||||||
Privacidade: | 1 | ||||||||||||||||||||||||||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||||||||||||||||||||||||||
Decisão: | PROVIDO PARCIAL. | ||||||||||||||||||||||||||
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Sumário : | I - Uma situação de tráfico de drogas ilícitas tipificada no art. 21.º do DL 15/93 só merecerá o tratamento privilegiado do art. 25.º (“Tráfico de menor gravidade”) “se a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta (…) os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção e a qualidade ou a quantidade das substâncias [traficadas ou a traficar]”. II - No caso, a ilicitude do facto, embora algo «diminuída» (pela circunstância de o arguido não passar de um “retalhista”), não se mostra, no seu todo, «diminuta», nem na sua imagem global, «consideravelmente diminuída». Com efeito, o arguido, na sua actividade de revenda de drogas ilícitas «duras» (cocaína e heroína, embora “cortadas”): I) Prolongou a sua actividade, até ser detido, durante cerca de um ano; II) «Não desempenhou entretanto [qualquer] outra actividade profissional, nem possuía outra fonte de rendimentos»; III) Servia-se de «colaboradores» quer nos seus contactos com os fornecedores (mais que um) quer com os «clientes» (múltiplos), assim não ocupando, na cadeia de comercialização da droga, o último lugar; IV) Nas suas revendas, não se limitava a «passar» doses individuais (a € 10), mas revendia também «quartas» (a € 20) e, mesmo, porções de 1 g (a € 60). III - Tendo em conta, pois, os meios utilizados (nomeadamente a circunstância de o arguido utilizar «colaboradores»), a modalidade e as circunstâncias da acção (que se não limitava à revenda de doses individuais, de cerca de 1/10 de g, mas também de porções de ¼ de grama e de 1 g), e a qualidade («drogas duras») e quantidade das drogas transaccionadas, a ilicitude (global) do facto, apesar do lugar (quase terminal) ocupado pelo arguido na cadeia de comercialização da droga, não se mostra, ante o paradigma do art. 21.° do DL 15/93, «consideravelmente diminuída» (art. 25.º). IV - No caso, a qualificação da actividade do arguido como de «tráfico menor» seria fazê-lo passar por simples «passador de rua», que o arguido, decididamente, não era; o que não prejudicará, obviamente, que - tratando-se, como se trata, de uma situação de fronteira entre o tráfico comum (punível com prisão não inferior a 4 anos) e o tráfico menor (punível com prisão não superior a 5 anos) - a respectiva penalização reflicta - como deverá reflectir - essa proximidade. V - De um modo geral, «a medida da pena há-de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva», vindo a ser «definitiva e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização». VI – Sendo de 4 a 12 anos de prisão a moldura penal abstracta do crime de tráfico comum de drogas ilícitas, dir-se-á que o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade - ou seja, a medida da pena que a comunidade entenderia necessária à tutela das suas expectativas na validade e no reforço da norma jurídica afectada pela conduta do arguido - se situaria cerca dos 5,5 anos de prisão (ante o facto do arguido [por si e por intermédio de dois auxiliares] se haver dedicado, durante quase um ano, à revenda – sobretudo em «quartas» - de heroína, que adquiria ao co-arguido e a outros fornecedores, a alguns consumidores da sua região). VII - Mas, «abaixo dessa medida (óptima) da pena de prevenção, outras haverá - até ao “limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas” - que a comunidade ainda entenderia suficientes para proteger as suas expectativas na validade da norma». E, no caso, esse limite mínimo (da moldura de prevenção) poderá – tendo em conta que se destinava ao seu consumo parte das drogas de que se abastecia – encontrar-se à volta dos 4,5 anos de prisão. VIII - De qualquer modo, «os limites de pena assim definida (pela necessidade de protecção de bens jurídicos) não poderão ser desrespeitados em nome da realização da finalidade de prevenção especial, que só pode intervir numa posição subordinada à prevenção geral». Assim, estando-se em presença de um cidadão então com quase 47 anos de idade (e, agora, com quase 49), mas sem passado criminal, e que «até aos finais do Verão de 2004, residiu com a mãe (…), onde se encontrava instalado o café (...), que era explorado por ela, com a ajuda do filho», tais circunstâncias haverão, no quadro da moldura penal de prevenção, de impelir o quantum exacto da pena para meados [5 anos] da moldura de prevenção. * * Sumário elaborado pelo Relator. | ||||||||||||||||||||||||||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: Arguidos/recorrentes: AA, BB e CC ( 1) 1. OS FACTOS O arguido BB, também conhecido por “..”, "....” e “..”, dedicou-se, desde o Verão de 2004 até 03.12.2004, à actividade de compra e venda de heroína e cocaína, no intuito de obter lucros pecuniários resultantes da diferença entre o preço de compra de tais produtos e o preço de venda dos mesmos. No dia 03.12.2004, na sua residência, sita na Rua da .., ..., guardava nos bolsos das calças 20,324 gramas de cocaína (cloridrato) e 50,491 gramas de cannabis (resina). Guardava ainda, no meio das mantas da cama, 116,300 gramas de heroína e, no interior de uma carteira escondida nus sapatos de ténis, 22 embalagens de heroína. No interior do seu veículo QP, guardava duas pastilhas de MDMA. No exercício dessa actividade, deslocava-se a Lisboa, onde adquiria o produto estupefaciente. A partir do mês de Outubro de 2004, deslocou-se algumas vezes a Lisboa na companhia de DD, utilizando para tal o veículo automóvel de matrícula XX, propriedade deste. Outras vezes, DD transportava o arguido até à estação de comboios de Santarém para que aquele apanhasse o comboio para Lisboa, indo-o buscar no seu regresso, tal como aconteceu no dia 29.10.2004. DD ainda o transportava nas entregas do produto aos clientes, nomeadamente, em Leiria e Marinha Grande. O arguido BB vendia o produto estupefaciente adquirido em Lisboa aos arguidos AA e CC, que, por sua vez, o revendiam para obterem proveito económico. Na concretização da sua actividade de venda do produto estupefaciente, o arguido BB era contactado pelo seu telemóvel n.° 964031120, deslocando-se em seguida, com a quantidade de produto estupefaciente pretendida, para os locais combinados, onde se consumava a venda. A par do veículo de matrícula XX, o arguido BB também utilizava o veículo QP para se deslocar aos locais combinados com clientes. O arguido BB vendeu ao arguido AA quantidades não apuradas de cocaína e heroína, no período compreendido entre o Verão de 2004 e 03.12.2004. O arguido AA consumia uma parte deste produto estupefaciente e vendia o restante a terceiros, retirando proveito económico dessas transacções. Desde o Verão de 2004 até 03.12.2004, o arguido BB vendeu ao arguido CC quantidades não apuradas de cocaína e heroína. Este consumia uma parte e vendia o restante a terceiros, obtendo lucro dessas vendas. Além disso, desde o Verão de 2004 até 03.12.2004, o arguido BB vendeu produtos estupefacientes a vários consumidores, após prévio contacto telefónico: a) vendeu, duas vezes por semana, um pacote de heroína de € 20 de cada vez, a EE, no campo da bola de Valverde e no “Lixo”, local sito às bombas de gasolina desta localidade; b) no campo da bola de Valverde, vendeu heroína a FF, uma ou duas vezes, entre € 30 a 35 o grama; c) Na mesma localidade, aquele arguido vendeu o mesmo tipo de produto a GG, duas vezes por semana, entre meio grama e um grama, ao preço, respectivamente, de € 25 e 35; d) Na mesma localidade, e até cerca de dois meses antes de ser preso, o vendeu heroína a HH, duas vezes por semana, um pacote de € 20 de cada vez; e) Em local não apurado, vendeu uma “quarta” de heroína, pelo preço de € 20 a II; f) Diariamente, na zona de Valverde, vendeu, durante três a quatro meses, um grama de heroína, pelo preço de € 35, a JJ; g) vendeu heroína, por três a quatro vezes, a KK, meio grama de cada vez, ao preço de € 20; h) na zona de Porto de Mós e Leiria, vendeu, pelo menos por duas vezes, quantidades indeterminadas de heroína e cocaína, por preço não apurado, a LL. O arguido BB dedicava-se, de forma regular, à actividade de compra e venda de heroína e cocaína, fazendo dela o seu modo de vida, da qual retirava proveitos económicos, e, à data dos factos, não desempenhava qualquer actividade profissional, nem dispunha de qualquer outra fonte de rendimentos que lhe permitisse assegurar a sua subsistência. Ao agir da forma supra descrita, quis comprar e deter aquele produto estupefaciente, cujas características conhecia, com objectivo de destiná-lo à venda a terceiros, como efectivamente o vinha fazendo, e obter proventos económicos (...). O arguido CC dedicou-se, desde o mês de Janeiro de 2004 até 03.12.2004, à actividade de compra e venda de heroína e cocaína, com o intuito de obter lucros pecuniários resultantes da diferença existente entre o preço de compra de tais produtos e o preço de venda dos mesmos. Estas substâncias estupefacientes eram adquiridas ao arguido BB e a outros indivíduos cujas identidades não se logrou apurar. No dia 03.12.2004, na sua residência, sita na Rua de...., ..., Porto de Mós, guardava no bolso de um seu blusão, que se encontrava no seu quarto, um saco contendo 43,4 gramas de cannabis (folhas/sumidades). No mesmo quarto, guardava ainda dois tacos, com o peso líquido de 5,130 g, de cannabis (resina), e uma saqueta com 0,365 gramas de MDMA. Era auxiliado por MM, então sua namorada, entre o mês de Janeiro de 2004 e o dia 3.12.2004, na concretização desta actividade, tirando ambos proveito dos lucros das vendas efectuadas. (...) À data da sua detenção, trabalhava há dois meses, como distribuidor por conta própria, dos produtos da empresa “Empresa-A”, na localidade do Juncal. Desde Janeiro de 2004 até essa data, não desenvolveu qualquer actividade profissional, sendo as suas despesas suportadas, pelo menos em parte, pelos rendimentos obtidos com a actividade de compra e venda de produtos estupefacientes. (...) No exercício da sua actividade de compra e venda do produto estupefaciente, utilizava os seus telemóveis n.° 965242810 e 939487438, enquanto que MM utilizava o seu telemóvel n.° 916314852. No decurso desses telefonemas eram utilizados códigos de modo a que o arguido CC e MM identificassem os interlocutores, entendessem qual era o objectivo do telefonema e combinassem o local do encontro. Alguns dos clientes do arguido CC afirmavam querer convidar aquele arguido para tomar um copo ou beber um café quando pretendiam comprar-lhe produtos estupefacientes. Os locais do encontro também eram combinados num código próprio: “Cruzinha” era o cruzamento com Andam; a “Rua dos Pretos” ou “Dois” era um local em Vale de Águas; “Praia” era um areal na estrada do Juncal; “Igreja Maluca”’ ou “Maluco” era um local junto à igreja Maná em S. Jorge; “A curva”, um local situado na Estrada do Juncal para a Cruz da Légua, junto à firma Pré–Claro, e “Paralelo” um local situado na estrada em direcção ao Tojal, junto da igreja dos Combatentes. Para adquirir o produto estupefaciente aos seus fornecedores e deslocar-se até aos locais combinados com os seus clientes para efectuar as vendas, o arguido CC utilizava o veículo automóvel de matrícula DE. Entre o mês de Janeiro de 2004 e o dia 03.12.2004, vendeu produtos estupefacientes a vários consumidores destas substâncias, após prévio contacto telefónico: a) Pelo menos desde Janeiro de 2004 e até à data da sua detenção, vendeu, cerca de duas vezes por semana, a RR pacotes de heroína de 5,00 e 10,00 € cada, em vários locais da área da comarca de Porto de Mós, indicados a este por aquele; b) Entre os meses de Maio a Outubro de 2004, na “Cruzinha” e no “2”, três a quatro vezes por semana, vendeu um número indeterminado de pacotes de heroína, pelo preço de € 10,00 cada pacote, a NN; c) Durante cerca de quatro meses, duas a três por semana, no Tojal, vendeu diversos pacotes de heroína pelo preço de € 5,00 cada pacote, a OO; d) Durante os três meses que antecederam a sua detenção, uma a duas vezes por semana, na “Cruzinha”, vendeu um pacote, pelo preço, cada um, de 10,00 € a PP; e) No período compreendido entre Fevereiro de 2004 e Novembro de 2004, em locais que denominavam por “Maluco”, “Paralelo”, “Estradinha”, vendeu diariamente um pacote de heroína pelo preço de € 10,00 a QQ; f) Entre Março de 2004 e Novembro de 2004, três a quatro vezes por semana, vendeu, de cada vez, um pacote de heroína de 10,00 €, a SS, em locais denominados “Paralelo” e “A dos Pretos”; g) Durante o ano de 2004, vendeu entre um a três “tacos” de heroína, a 10,00 € cada, a TT, tendo-lhe também “tirado a ressaca” por diversas vezes; h) Durante cerca de dois meses, até Junho ou Julho de 2004, vendeu, diariamente um “taco” de heroína, ao preço de 10,00 €, a UU, e desde Agosto do mesmo ano, altura em que este recomeçou os consumos, até cerca de Novembro de 2004, também diariamente, em locais não concretamente apurados da área desta comarca; i) Pelo menos desde Maio de 2004 até à data da sua detenção, vendeu heroína a LFHSM, com uma regularidade quase diária, um “taco” de 10 € de cada vez, nos locais denominados “Paralelo”e “Rua dos Pretos”, entre outros; j) Desde Março ou Abril de 2004 e até ser preso, vendeu heroína a CMPP, um pacote de 10 € de cada vez, até Agosto duas a três vezes por semana, e depois de Agosto quase diariamente, no “Paralelo” e na “Cruzinha”, entre outros locais indicados pelo arguido; l) Desde, pelo menos, finais de Junho de 2004 até ser detido, vendeu heroína a PDND, quatro a cinco vezes por semana, um a dois pacotes de heroína de cada vez, a 10,00 € cada um, na “Rua dos Pretos”, no “Paralelo” e outros locais não apurados; m) Pelo menos, desde Abril a finais de Agosto de 2004, vendeu, cerca de duas vezes por semana, um a dois pacotes de heroína de cada vez, ao preço de 10,00 € cada, a FDPP, no “Paralelo” e outros locais não apurados; n) Desde Janeiro de 2004 e até ser detido, vendeu diariamente um pacote de heroína, ao preço de 10,00€ cada pacote, a JCRT, no “Paralelo”, “Rua dos Pretos” e “Cruzinha”, entre outros locais; o) Durante cerca de um ano, vendeu, duas vezes por semana, um pacote de heroína de cada vez, pelo preço de 10,00 €, em locais não concretamente apurados, a FMR; p) Vendeu heroína a FJSM, por volta do Verão de 2004, durante cerca de dois a três meses, uma a duas vezes por semana, um pacote de 10,00€ de cada vez, em locais não apurados; q) Um mês ou dois antes de Junho de 2004, vendeu um ou dois pacotes de heroína, a 10,00 € cada, a KK, em locais não apurados; r) Vendeu, pelo menos, duas a três vezes, durante o Verão de 2004, heroína a AJSC, um pacote de cada vez, ao preço de 10,00 € cada pacote, em locais como a “Cruzinha”; s) Durante cerca de dois meses, até ser detido, vendeu heroína, na casa da arguida MM, duas a três vezes por semana, a JPBBF, número não apurado de pacotes daquele produto, ao preço de 10,00 € cada pacote; t) Entre Agosto e Outubro de 2004, vendeu pacotes de heroína, a 10,00 € cada um, a LMSP, uma ou duas vezes; u) Entre o Verão de 2004 e a data da sua detenção, vendeu, em locais não determinados, vários pacotes de heroína, a 10,00 € o pacote, e quantidades não apuradas de cocaína, aos preços de 35,00 € e 40,00 € a grama, a PGBSP, tendo este lhe entregue um telemóvel, uma das vezes, para pagamento de duas gramas de heroína ou cocaína que encomendou ao arguido CC; v) Vendeu directamente a ASMS, no Café ..., sito em Calvaria, um pacote de heroína, por 10 €, em Agosto ou Setembro de 2004; x) Vendeu heroína, até Junho de 2004, a ANF, uma ou duas vezes, quantidade não apurada de pacotes daquele produto, tendo passado, a partir de Junho de 2004 e até Outubro desse ano, a vender-lhe quase diariamente pacotes, em número não apurado, daquele produto, para consumo desta e da ASMS, junto ao café “...”, sito em Calvaria; z) Também no mesmo café, entre Junho e Julho de 2004, vendeu, cerca de três vezes, a LVSFM, número não apurado de “tacos” de heroína, ao preço de 10,00 € cada um. (...). Ao agir desta forma, quis comprar, deter e vender aqueles produtos estupefacientes, cujas características conhecia, destinando parte deles ao seu consumo e a restante à venda a terceiros, com o objectivo de obter vantagens económicas (...). O arguido AA, também conhecido por “Sapo” e “Cocas”, dedicou-se, desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde o princípio do ano de 2004, até 03.12.2004, à actividade de compra e venda de heroína e cocaína, com o intuito de obter lucros pecuniários resultantes da diferença existente entre o preço de compra de tais produtos e o preço de venda do mesmos. Estas substâncias estupefacientes eram adquiridas ao arguido BB e a outros indivíduos, cujas identidades não se logrou apurar. No desenvolvimento da sua actividade de compra e venda de produtos estupefacientes, o arguido era auxiliado por RMPR, também conhecido por “Gordo”, e AABN. RR tinha como função entregar e vender pelo menos parte do produto estupefaciente pertencente ao arguido AA aos clientes deste e nos locais indicados por ele, bem como, ir buscar produtos estupefacientes ao arguido BB, um dos fornecedores do arguido AA, para que este os vendesse a terceiros, encontrando-se para o efeito numa lixeira, sita junto da Mendiga, ou numa recta existente na zona da Cabeça Veada. Por sua vez, AABN foi por diversas vezes buscar o produto estupefaciente adquirido ao arguido BB pelo arguido AA, para que este último o pudesse vender a terceiros. Para tal, encontrava-se com o arguido BB num local chamado “Recta”, sito em Cabeça Veada, onde este lhe entregava a heroína e a cocaína encomendadas pelo arguido AA, através de prévio contacto telefónico, para que as transportasse e as entregasse a este. Dos produtos estupefacientes adquiridos, o arguido AA destinava uma parte ao seu consumo e vendia a restante a terceiros. No dia 03.12.2004, na sua residência, sita na Estrada n.° ..., Mendiga, Porto de Mós, o arguido AA guardava na cave da moradia uma espingarda de caça, da marca Manufacture D’ Armes Colibri, com o n.° EX71735, de dois canos, calibre 12 mm, com dois canos laterais de comprimento de 70,2 cm e o valor comercial de € 50,00, um saco contendo uma substância com o peso líquido de 563,1 g de sulfato de cálcio, uma balança de precisão e respectivos pesos e recortes de plástico. A espingarda e os recortes de plástico encontravam-se no quarto ocupado pelo arguido AA, enquanto os restantes objectos se encontravam no corredor, junto ao mesmo quarto. Até aos finais do Verão de 2004, o arguido AA residiu com a sua mãe numa casa, sita na Estrada Nacional n.° ..., em Mendiga, Porto de Mós, onde se encontrava instalado o Café ..., que era explorado por aquela. Inicialmente, o arguido AA ajudava a sua mãe exploração do Café .... Contudo, a partir dos finais do Verão de 2004, data em que passou a viver sozinho, era ele quem permanecia ao balcão do referido estabelecimento comercial sempre que estava aberto. Este café tinha pouca clientela, sendo que a mesma era maioritariamente constituída por consumidores de estupefacientes. (...) Desde, pelo menos, o início do ano de 2004 e até ao dia 3.12.04, arguido AA vendeu produtos estupefacientes a vários consumidores destas substâncias: a) A partir do início do ano de 2004, em locais da Mendiga previamente indicados pelo arguido AA, este vendeu um número não apurado de pacotes de heroína pelo preço de € 10,00, cada pacote, a EE; b) Durante período não concretamente apurado do ano de 2004, e até 3.12.04, em locais também não apurados, vendeu um número indeterminado de pacotes de heroína, pelo preço de € 10,00, cada pacote, a FF; c) Em datas não determinadas mas situadas no período compreendido entre o início do ano de 2004 e o dia 03.12.2004, vendeu, uma a duas vezes, quantidades não apuradas de heroína a GG, em local não apurado de Mendiga; d) No decurso do ano de 2004, até 3.12.04, vendeu, por duas ou três vezes, um pacote de heroína de cada vez, pelo preço unitário de 10,00€ a KK; e) Em data não concretamente apurada, mas situada entre Setembro e Novembro de 2004, vendeu uma “quarta” de heroína, por 20,00 €, a LMVT; f) No mês de Outubro de 2004, no local denominado “Parapente”, em Mendiga, vendeu, por duas ou três vezes, a JID, um grama de cada vez, pelo preço unitário de 60,00 €; g) Por sua vez, desde, pelo menos, o início do ano de 2004, o arguido RMPR, em locais não determinados de Mendiga, vendeu e entregou quantidades não apuradas de heroína, designadamente, uma “quarta” a LMT, por 20,00 €; h) A partir do início do ano de 2004, vendeu, e entregou quantidades não apuradas de heroína, em locais também não determinados, de cada vez um pacote de 10 €, a EE, que, para o efeito, contactava previamente quer ... quer o arguido AA. Para além da referida, o arguido AA não desempenhava outra actividade profissional, nem possuía outra fonte de rendimentos. (...) Ao agir da forma descrita, quis comprar e deter heroína e cocaína, cujas características conhecia, com o objectivo de vender parte das mesmas a terceiros, mediante vantagens económicas, afectando outra parte ao seu consumo pessoal. Na altura da apreensão da espingarda que, no decurso da busca efectuada à casa onde residia, foi encontrada no seu quarto, o arguido não era titular de licença de uso e porte de arma. Apesar de saber não ser titular de licença de uso e porte de arma, o arguido quis deter a mencionada espingarda nas referidas circunstâncias, o que conseguiu. O arguido CC é o mais novo de uma fratria de quatro irmãos, tendo crescido no seio da sua família de origem. Durante a frequência do 10º ano abandonou os estudos para se dedicar a actividade laboral. Iniciou essa actividade como repositor de stocks num hipermercado, em Leiria, abandonou esse trabalho, para ficar mais próximo do seu lar, empregando-se numa empresa de plásticos, como distribuidor. Posteriormente, por auferir maior remuneração, empregou-se numa fábrica de móveis, como ajudante de motorista. Saiu desse emprego, tendo se empregado numa cerâmica, onde desenvolveu actividade de operador de máquinas durante sete anos. Por vontade própria também deixou este trabalho, passando a fazer biscates. Ao fim de algum tempo, colectou-se como trabalhador independente, passando, durante cerca de dois anos, a fazer distribuição de produtos para uma empresa. Posteriormente, retomou essa função de distribuidor, por conta própria, para a empresa “Empresa-A”, na localidade de Juncal, situação que, à data da sua detenção, durava há dois meses. À data da sua detenção, vivia com ambos os progenitores, tendo o pai falecido no dia 3.02.05, quando já se encontrava detido. Actualmente, a mãe é o único elemento constituinte do agregado familiar, a qual reside numa casa de construção antiga, em mediano estado de conservação, constituída por rés-do-chão e primeiro andar. A mesma subsiste dos rendimentos provenientes de parte de um negócio relacionado com o comércio de cortinados, tendo, para além disso, arrendado um quarto dos cinco que compõem a habitação, retirando também daí proventos económicos, sendo a sua situação económica equilibrada. O arguido sempre teve um bom relacionamento com todos os elementos da sua família, situação que ainda se mantém, continuando o arguido a dispor de apoio familiar, disponibilizando-se a sua família a coadjuvá-lo, designadamente na participação de programa terapêutico especializado, que pode efectuar no CAT de Leiria. Não é hostilizado na comunidade (...). Os arguidos BB, CC e AA, sujeitos, em 7.03.05, ao respectivo exame físico, não apresentavam sinais compatíveis com administração endovenosa de drogas. Os exames toxicológicos efectuados não detectaram a presença de drogas de abuso. O arguido AA, após a morte do pai, ocorrida há três ou quatro anos, continuou a habitar na casa que foi deste e da sua mãe, onde ficaram os bens que pertenceram ao casal e que não foram partilhados por óbito daquele, dos quais fazia parte a espingarda que aí foi apreendida. Em vida do pai do arguido AA, a referida arma encontrava-se habitualmente no quarto daquele. O referido arguido tem uma filha com 16 anos de idade, que vive com a mãe, e à qual o arguido não ajuda financeiramente. A mãe do arguido é reformada, recebendo mensalmente uma pensão de cerca de 200 €. O arguido BB encontra-se em Portugal há cerca de quatro anos. Os únicos familiares que tem neste país são tios e primos. Quando chegou trabalhou, como cabouqueiro, para um primo em segundo grau, durante quatro a cinco meses, tendo morado então na casa de uns tios. Depois disso, abandonou aquele emprego e aquela casa, dizendo àqueles familiares que ia para a zona de Leiria trabalhar em pedreiras. Antes de ser detido “estava a tratar do visto”. O arguido BB foi condenado, pela prática de crime de tráfico de estupefacientes, por factos cometidos em 6.04.02, por acórdão de 18.10.2002, proferido no proc. 105/02.PALSB da 1ª secção da 3ª Vara Criminal de Lisboa, na pena de dois anos e seis meses de prisão. Aos demais arguidos não são conhecidas condenações anteriores. 2. A CONDENAÇÃO Com base nos factos provados, o tribunal colectivo de Porto de Mós, em 28Nov05, condenou: I) CC (Porto de Mós, -06.12.73), pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes (art. 21.1 do Decreto-Lei nº 15/93), na pena de sete anos e seis meses de prisão; II) AA (Porto de Mós, -14.04.58), pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes (artigo 21.1 do Decreto-Lei 15/93), na pena de seis anos de prisão; pela prática de um crime p. p. artigo 6º, n.° l, da Lei n.° 22/97, na pena de cento e vinte dias de multa, à taxa diária de € 4,00; III) BB (Cabo Verde, -26.05.77), pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes (art. 21.1 do Decreto-Lei nº 15/93), na pena de oito anos de prisão: Estabelece o nº 1 do artigo 21º do Decreto-Lei 15/93: “Quem, sem para tal se encontrar autorizado, cultivar, produzir, fabricar, extrair, preparar, oferecer, puser à venda, vender, distribuir, comprar, ceder ou por qualquer outro título receber, proporcionar a outrem, transportar, importar, exportar, fazer transitar ou ilicitamente detiver, fora dos casos previstos no artigo 40º, plantas ou preparações compreendidas nas tabelas I a III, é punido com pena de prisão de 4 a 12 anos”. O exercício de qualquer dessas actividades, a prática de qualquer desses actos, sem a necessária autorização, traduz a prática de crime de tráfico de estupefacientes, que constitui “um crime exaurido pois a incriminação da conduta do agente esgota-se nos primeiros actos de execução, independentemente de eles corresponderem a uma execução completa, e em que a repetição dos actos, com produção de sucessivos resultados, é imputada a uma única realização. O resultado típico obtém-se logo pela realização inicial da conduta ilícita, de modo que a condenação de alguém pela prática de crimes de tráfico de estupefacientes, referida a uma determinado período, corresponde a uma apreciação global da sua actividade delitual durante esse período ainda que alguns actos parcelares praticados não tenham sido considerados” (2). Vale dizer que “o primeiro passo dado pelo agente na senda do iter criminis já constitui o preenchimento do tipo, valendo os passos seguintes apenas para efeitos de estabelecimento da medida concreta da pena a impor” (3). O crime de tráfico de estupefacientes do artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei 15/93 “é um crime de perigo abstracto em qualquer das modalidades de acção descritas no tipo legal” (4); afronta valores tão essenciais como a “saúde e a integridade física dos cidadãos, ou mais sinteticamente, a saúde pública” (5). O mesmo, para a sua configuração, “não exige o dano nem o perigo de um dos concretos bens jurídicos protegidos com a incriminação, mas apenas a perigosidade da acção para as espécies de bens jurídicos protegidos” (6). Importa considerar que “na economia do artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, é irrelevante que o agente criminoso aí previsto seja «barão da droga», vendedor, produtor, fabricante, importador, exportador ou transportador, já que para todos eles a lei estabeleceu a mesma moldura abstracta; em concreto, a pena há-de variar não em função da categoria daqueles traficantes, mas em função da culpa de cada um e das exigências de prevenção” (7). Para que o tipo de ilícito do artigo 21.º, n.º 1, do mencionado diploma se possa configurar, não é essencial que o agente infractor se dedique à cedência lucrativa a terceiros de produtos estupefacientes. Basta que detenha em seu poder produto daquela natureza que, pela sua quantidade e qualidade, nomeadamente, não se possa, em termos de razoabilidade, reputar como justificada tal detenção apenas para efeitos de consumo do agente que a detém. Como decidiu o STJ 15/05/96 (8) , “achando-nos face a um crime de perigo abstracto, a simples detenção já é um comportamento proibido e punido, pela potencialidade de perigo que encerra”. Vale dizer que o tráfico não se caracteriza unicamente pela colocação à venda, venda, distribuição ou cedência ou outras acções deste tipo. A simples posse ou detenção ilícita já preenche a previsão legal, que constitui uma espécie de crime complexo, em que se reúnem acções que isoladamente consideradas constituem crime, mas que, por razões de técnica legislativa, foram aglutinadas num mesmo preceito incriminador. Porém, e por outro lado, presentemente, a intenção política-legislativa é a de permitir ao julgador distinguir os casos de tráfico importante e significativo, do tráfico menor, que, apesar de tudo, não pode ser aligeirado, de modo a esquecer-se o papel essencial que os “dealers” de rua representam na cadeia do grande tráfico. Da factualidade apurada, resulta à saciedade comprovado que o arguido BB, desde, pelo menos, o Verão de 2004, e até ao dia 03.12.04, data em que foi detido, dedicou-se à comercialização, com objectivos lucrativos, de produtos estupefacientes, designadamente, heroína e cocaína, que ia regularmente comprar a Lisboa, e que depois vendia, para além de a vários consumidores desses produtos que o procuravam em locais expressamente indicados por ele, após prévio contacto telefónico, também aos arguidos AA e CC, que, por sua vez, também lucrativamente, os vendiam a terceiros, distribuindo-os pelos consumidores directos, que para tanto os procuravam em locais que também estes indicavam, mediante prévio contacto telefónico, afectando aqueles arguidos parte dos produtos adquiridos ao arguido BB, e também a outros fornecedores, ao seu consumo pessoal. O arguido BB, no desenvolvimento daquela actividade ilícita, contou com a colaboração do arguido DD, que o transportou algumas vezes, no seu veículo de marca Audi A-3, até à estação da C. P. de Santarém, onde aquele apanhava o comboio para se deslocar a Lisboa para adquirir droga, indo, também algumas vezes, aí buscá-lo, no regresso, transportando-o a Lisboa também outras vezes, quando o arguido aí se dirigia com a mesma finalidade, tendo ainda o arguido DD chegado a levar o arguido BB na sua viatura a Leiria e à Marinha Grande, para este aí fazer entregas de produtos estupefacientes a consumidores que lhe haviam encomendado os mesmos. Em todas essas circunstâncias, o arguido DD conhecia a actividade do arguido BB, sabia que este se dedicava a vender e comprar substâncias estupefacientes, e que o mesmo nessas deslocações detinha e transportava consigo aquelas substâncias, com a referida finalidade. Não obstante esse conhecimento, o arguido DD, a troco de contrapartida não concretamente apurada, acedeu em colaborar com o arguido BB, que, tudo indica, não era titular de carta de condução que o habilitasse a conduzir em Portugal, cedendo a utilização da sua viatura, e transportando-o, juntamente com o produto estupefaciente que o mesmo trazia consigo, nalgumas deslocações que o arguido BB efectuava para proceder à comercialização da droga. Aquando da sua detenção, ao arguido BB foram apreendidas, entre outras coisas, as substâncias estupefacientes constantes do auto de apreensão de fls. 844 e 845, e fotograficamente documentadas a fls. 1274 a 1279. A expressão quantitativa do estupefaciente detido pelo arguido AA é objectivamente atestado pelo peso do mesmo e pela sua natureza, sendo duas das substâncias (cocaína e heroína), substâncias rotuladas de “drogas duras”, com grande potencialidade para criação de dependência e que degradam de forma significativa os que as consomem com regularidade. As referidas quantidades de droga traduzem uma expressão já muito significativa no quadro do seu comércio ilegal, com aptidão para abastecer elevado número de consumidores. Relativamente aos demais factos cuja autoria é também atribuída ao arguido BB, integradores, segundo a acusação, de dois crimes de receptação e um crime detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 6º, nº1 e 2 da Lei nº 22/97: não se logrou a comprovação, com o grau de certeza exigíveis para efeitos de condenação, de tais factos. Com efeito, à excepção da prova resultante das escutas telefónicas, nenhuma outra prova foi produzida que demonstre aquela factualidade, sendo que também aquela é, para esse efeito, pouco esclarecedora. Não se pode concluir da análise da transcrição das intercepções telefónicas efectuadas ao telefone do arguido BB que este haja efectivamente recebido, para pagamento de droga transaccionada, objectos ou armas, designadamente a aparelhagem de marca “Sony”, desconhecendo-se por que meios ele a adquiriu, e que, por seu turno, tenha vendido qualquer arma a terceiros. Não basta, efectivamente, negociar a entrega de objectos: é antes de mais necessário, para que os crimes imputados se tenham verificado, que essa entrega se tenha chegado a concretizar, constituindo a mesma uma forma de pagamento. Ora, essa prova não se logrou obter. Por conseguinte, e do mesmo modo, no que concerne ao crime de receptação imputado ao arguido D, não se logrou a comprovação da factualidade necessária à sua configuração, já que, não se tendo apurado que o arguido BB tenha recebido as armas do arguido YY, também ficou indemonstrada a compra das mesmas pelo arguido D ao arguido BB. O único facto que logrou comprovação foi que as armas apreendidas ao arguido D estavam em poder deste, desde data não apurada, desconhecendo-se a que título as detinha e em que circunstâncias as armas chegaram à suas mãos, sendo, porém, certo que o arguido não era titular de licença de uso e porte de arma relativamente às armas que detinha. Com tal conduta, cometeu o arguido D um crime previsto e punível pelo artigo 6º, nº 1, da Lei 22/97. (...) Resultou ainda comprovado que o arguido AA desde, pelo menos o início do ano de 2004 e até 03.12.04, data da sua detenção, se dedicou à comercialização de produtos estupefacientes, que adquiria ao arguido BB e a outros fornecedores, para revender depois a terceiros, com objectivos lucrativos, afectando parte deles ao seu próprio consumo. No desenvolvimento dessa actividade era auxiliado pelos arguidos VV e XX, este com menor frequência, que iam buscar os produtos estupefacientes encomendados pelo arguido AA ao arguido BB no local por este indicado, para o entregarem àquele, procedendo ainda o arguido VV também a entregas e vendas de produtos estupefacientes. Aquando da busca efectuada à residência que ocupava, ao arguido AA foram encontrados os bens descritos no auto de apreensão de fls. 884 e 885, designadamente uma balança de precisão e respectivos pesos e recortes de plástico, objectos usualmente encontrados na posse de quem procede à revenda de produtos estupefacientes, procedendo à sua repartição, acondicionamento e pesagem, os quais são também muitas vezes “cortados” com produtos de outra natureza, com estrutura e cor semelhantes, de forma a conferir-lhe aparência semelhante aos produtos estupefacientes transaccionados. Também na mesma ocasião e local, foi aprendida uma arma de caça, não sendo o arguido titular de licença de uso e porte de arma. Tal arma havia pertencido ao pai do arguido, falecido há cerca de três anos, não tendo sido, tal como os demais bens da herança, partilhada pelos seus sucessores. Tal significa que o arguido AA não era o proprietário exclusivo dessa arma. Mas propriedade não se confunde com detenção, podendo esta existir sem aquela, sendo que é a detenção que adquire contornos de relevância para efeitos da incriminação do artigo 6º, nº 1, da Lei nº 22/97, de 27/6, com a redacção introduzida pela Lei nº 98/2001, de 25/8. Do elenco factual apurado, pode facilmente concluir-se que o arguido AA tinha a detenção dessa arma que, nomeadamente, após o falecimento do seu pai, foi transferida do quarto deste para o quarto do arguido, passando este a dispor livremente da mesma, como se pode comprovar pela transcrição da sessão nº 1134, efectuada ao alvo nº 25717, onde o “Gordo” (R) informa o BB que o arguido AA saiu com a espingarda dentro do carro, à procura daquele. Sobressai, assim, a prática pelo arguido BB do crime tipificado pelo referido artigo 6º, nº 1, da Lei nº 22/97, de 27/6, com a redacção introduzida pela Lei 98/2001, de 25/8. Por seu lado, o arguido CC, desde o início do ano de 2004 até à data da sua detenção, em 03.12.04, dedicou-se igualmente à venda de produtos estupefacientes, heroína e cocaína, que comprava ao arguido BB e a outros fornecedores, retirando uma parte da droga adquirida para seu consumo pessoal. Na sequência da busca efectuada à casa onde morava, foram encontradas no seu quarto as substâncias descritas no auto de apreensão de fls. 927 a 929. Merece especial destaque o elevado número de consumidores que nesse período abasteceu, como se extrai dos depoimentos de alguns deles prestados em audiência e se retira dos autos de transcrição das conversas telefónicas efectuadas de e para os seus telemóveis, onde sobressai a constante solicitação para a venda de produtos estupefacientes, especialmente heroína. Nessa actividade do arguido CC colaborava a arguida MM, então sua namorada, que o acompanhava nalgumas entregas aos consumidores, participando nas mesmas, efectuando muitas vezes as ligações entre os consumidores e aquele, nomeadamente, indicando-lhes o local onde o podiam encontrar, e vendendo ela própria produtos estupefacientes a terceiros, designadamente na sua casa. Durante o período em que se dedicou à venda de estupefacientes, à excepção dos dois meses que antecederam a sua detenção, o arguido não exerceu qualquer actividade profissional, o mesmo sucedendo com a arguida MM, nada apontando que esta fosse consumidora, designadamente de heroína e cocaína. Mesmo no período em que trabalhou, o arguido continuou a exercer com regularidade o tráfico, já que sendo distribuidor, por conta própria, na zona do Juncal, dispunha de tempo e de mobilidade para receber os contactos e efectuar as entregas do produto estupefaciente. Do exposto se pode concluir que a actividade dos arguidos BB, DD, CC, MM, AA, VV e XX se reconduzem às várias formas de actuação tipificadas no artigo 21º, nº 1, do Decreto-Lei nº 15/93, importando concretizar se todas elas se devem subsumir àquela realidade típica. Note-se que “a construção e a estrutura dos crimes ditos de tráfico de estupefacientes, como crimes de perigo, de protecção (total) recuada a momentos anteriores a qualquer manifestação de consequências danosas, e com a descrição típica alargada, pressupõe, porém, a graduação em escalas diversas dos diferentes padrões de ilicitude em que se manifeste a intensidade (a potencialidade) do perigo (um perigo que é abstracto-concreto) para os bens jurídicos protegidos. De contrário, o tipo fundamental, com os índices de intensidade da ilicitude pré-avaliados pela moldura abstracta das penas previstas, poderia fazer corresponder a um grau de ilicitude menor uma pena relativamente grave, com risco de afectação de uma ideia fundamental de proporcionalidade que imperiosamente deve existir na definição dos crimes e das correspondentes penas. Por isso a fragmentação por escala dos crimes de tráfico (mais fragmentação dos tipos de ilicitude do que da factualidade típica, que permanece no essencial), respondendo às diferentes realidades, do ponto de vista das condutas e do agente, que necessariamente preexistem à compreensão do legislador” (9) . Como sustenta o STJ 03/07/97 (10), “na previsão do artigo 25º do Decreto-Lei nº 15/93 estão incluídos os casos dos artigos 21º e 22º, em que a ilicitude do facto se mostra consideravelmente diminuída, tendo em conta, nomeadamente, os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações. O regime daquele artigo não funciona automaticamente, sendo indispensável para a sua aplicação a demonstração da considerável diminuição da ilicitude do facto, avaliada esta globalmente. Cada um daqueles índices ou factores, enunciados de forma não taxativa, não deve ser considerado separadamente, antes pressupondo uma «imagem» global que resulte da ponderação do conjunto dos factos provados e que corresponda a uma menor perigosidade presumida da acção para os bens penalmente protegidos”. Com efeito, “a essência da distinção entre os tipos fundamental e privilegiado reverte, assim, ao nível exclusivo da ilicitude do facto (consideravelmente diminuída), mediada por um conjunto de circunstâncias objectivas que se revelem em concreto, e que devam ser conjuntamente valoradas por referência à matriz subjacente à enumeração exemplificativa contida na lei, e significativas para a conclusão (rectius, para a revelação externa) quanto à existência da considerável diminuição da ilicitude pressuposta no tipo fundamental, cuja gravidade bem evidente está traduzida na moldura das penas que lhe corresponde. Os critérios de proporcionalidade que devem estar pressupostos na definição das penas, constituem, também, um padrão de referência na densificação da noção, com alargados espaços de indeterminação, de «considerável diminuição de ilicitude». A diversificação dos tipos apenas conforme o grau de ilicitude, com imediato e necessário reflexo na moldura penal, não traduz, afinal, senão a resposta a realidades diferenciadas que supõem respostas também diferenciadas: o grande tráfico e o pequeno e médio tráfico. Mas estas são noções que, antes de se constituírem em categorias normativas, surgem como categorias empíricas susceptíveis de apreensão directa da realidade das coisas. A justeza da intervenção, para a adequada prossecução também de relevantes finalidades de prevenção geral e especial, justifica as opções legais tendentes à adequada diferenciação do tratamento penal entre os grandes traficantes (artigos 21°, 22° e 24°) e os pequenos e médios (artigo 25°), e ainda daqueles que desenvolvem um pequeno tráfico com a finalidade exclusiva de obter para si as substâncias que consomem (artigo 26°)” (11) . Para que, nos termos do artigo 25º do Decreto-Lei 15/93, de 22/1, se possa falar em tráfico de menor gravidade, para além do requisito «quantidade», tem de atender-se à qualidade das substâncias traficadas, aos «meios utilizados e à modalidade ou circunstâncias da acção», elementos do preceito que não têm todavia natureza taxativa” (12) . Trata-se de uma construção dogmática com contornos de proximidade ao artigo 72º, nº1 do Código Penal, que visa, na descrição de um tipo legal de crime, mandar atender a certas circunstâncias da actuação do agente, de forma a concluir-se por uma sensível diminuição da ilicitude do facto, de forma a justificar uma eventual atenuação da pena. Note-se que se mostra “muito relevante para próprio enquadramento legal, o conhecimento da personalidade do arguido, do seu habitat - se era um «dealer» de apartamento ou de rua, se, em particular, não era consumidor de droga, se era consumidor ocasional ou era já um consumidor habitual ou mesmo um toxicodependente” (13). No quadro circunstancial concretizado, devendo a actuação dos arguidos BB, CC e AA reconduzir-se à previsão do artigo 21º, nº 1 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22/1, a que corresponde pena de prisão de 4 a 12 anos, já a actuação empreendida pelos arguidos DD, VV e XX é passível de ser reconduzida à previsão do artigo 25º, a) do mesmo diploma legal, já que este não desenvolviam a sua actividade de forma autónoma, estando-lhes antes reservado o papel de meros coadjuvantes dos arguidos BB (DD) e AA (VV e XX), sem contrapartidas definidas. (...) O crime previsto e punível pelo artigo 6º, nº 1, da Lei nº 22/97, de 27/6, com a redacção conferida pela Lei nº 98/2001, cometido pelos arguidos YY e AA, é alternativamente punível com pena de prisão ou multa. Considerando a primodelinquência de ambos os arguidos, e o condicionalismo que determinou a detenção da arma encontrada em poder do arguido AA, mostra-se a medida não detentiva suficiente à garantia dos fins prosseguidos pela punição daquelas actuações, privilegiando-se, assim, a escolha da pena de multa (artigo 71º do Código Penal). Relativamente aos objectos apreendidos: alguns utilizados na actividade criminosa, designadamente, telemóveis, veículos apreendidos a fls. 929, 872 e 856 (não obstando o facto de este último não se achar registado em nome do arguido BB) (14), balança, recortes de plástico, outros provenientes dessa actividade (designadamente, outros telemóveis apreendidos, dinheiro apreendido ao arguido BB), todos eles devem ser declarados a favor do Estado. Medida concreta da pena. As exigências de prevenção, sobretudo de natureza geral, dada a incidência desta prática delituosa, que a transformou em autêntica “praga social”, são particularmente prementes. Como já sustentava o STJ 30/01/90 (15), “são gravíssimos os efeitos do consumo de estupefacientes e dificilmente imagináveis os danos físicos e morais produzidos pela viciação a que, com maior ou menor facilidade, conduzem. E isto sem contabilizar todo o tipo de criminalidade a que pode conduzir e frequentemente conduz o tráfico de tais produtos: mortes, falsificações, roubos, violações; além de que são uma causa muito vulgarizada de prostituição, a qual, não sendo agora punida, não deixa de ser uma verdadeira chaga social. Há, pois, que exercer através da punição do tráfico de drogas, mormente das denominadas «duras», um intenso trabalho de pedagogia e de prevenção”. Na determinação da pena deve atender-se primordialmente aos fins prosseguidos pelas penas. Com efeito, “a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos, entendida como tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração social do agente. A primeira -a de prevenção geral positiva- ou de integração - é a finalidade primordial a prosseguir, pelo que a segunda -a de prevenção especial positiva- nunca pode pôr em causa o mínimo de pena imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada. Por sua vez, a defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva, também nunca pode pôr em causa a própria dignidade humana do agente, que é o princípio da culpa, justamente salvaguardada (nulla poena sine culpa); logo, a pena jamais pode exceder a medida da culpa ou o máximo que a culpa do agente consente, independentemente de assim se conseguir ou não atingir o grau óptimo da protecção dos bens jurídicos. Desta forma, o espaço possível de resposta às necessidades de reintegração social do agente é o que se define entre aquele mínimo imprescindível à prevenção geral positiva e o máximo consentido pela sua culpa. A determinação da medida da pena faz-se em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção, atendendo-se a todas as circunstâncias que no caso concreto, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra ele” (16). A actuação dos arguidos BB, CC e AA é particularmente grave, atentando sobretudo ao espaço temporal em que prosseguiram a sua actividade delituosa (cerca de um ano, os dois últimos), às quantidades de droga envolvidas nas transacções que efectuavam e à sua disseminação por elevado número de consumidores, à posição que ocupavam na cadeia intermediária dessa actividade, demandando a colaboração de terceiros para a sua concretização, e aos valores sociais que as suas condutas afrontaram. O arguido BB reiterou esta prática delituosa, apesar de condenado por crime da mesma natureza (não podendo ser condenado como reincidente por os respectivos pressupostos não terem sido alegados na acusação, nem esta conter pedido de condenação como reincidente), tendo mediado pouco tempo entre a prática dos novos factos e a sua restituição à liberdade. O mesmo não se mostra socialmente inserido, não tendo desempenhado actividade laboral, desde que chegou a Portugal, há quatro anos, por período que excedesse os três ou quatro meses. Também os arguidos AA e CC apenas exerceram actividade laboral de forma irregular, recorrendo ao tráfico de estupefacientes para obterem os proventos económicos que utilizaram em seu proveito. Todos eles agiram com culpa intensa. (...) Todos os arguidos (...) optaram por não prestar declarações em audiência. Ao optarem pelo silêncio, pelo qual não podem ser penalizados porque o mesmo traduz o exercício de um direito que a lei expressamente lhes reconhece, demitiram-se da possibilidade de formularem um juízo autocrítico acerca das suas condutas, expiando as sua culpas através da confissão, e da possibilidade de revelarem arrependimento. 3. OS RECURSOS PARA A RELAÇÃO 3.1. Inconformado, o arguido BB recorreu em 13Dez05 à Relação, pedindo a revogação do acórdão recorrido quanto à pena de prisão aplicada e à declaração de perda a favor do Estado do veículo automóvel: Da matéria de facto considerada provada, entende o arguido que foram incorrectamente julgados os pontos 6 a 22 e 149 e 150, que o acórdão considerou como provados no que respeita ao aqui recorrente, pois, conforme decorre do depoimento das referidas testemunhas, o conhecimento dos factos por estas declarados advém, quase exclusivamente, das escutas telefónicas, reportando-se sempre as referidas testemunhas à informação que a célula transmitia. Acresce que, as referidas testemunhas que serviram para firmar a convicção do tribunal não efectuaram seguimentos ao arguido, sendo certo que a informação que a célula transmite é falível e apenas consignava que o mesmo se encontrava em Lisboa (conforme o depoimento das referidas testemunhas) e daí não poderá retirar-se que se deslocou várias vezes a Lisboa onde adquiria o produto estupefaciente. Ora, as referidas testemunhas não seguiram o arguido BB nas alegadas deslocações a Lisboa, não presenciaram o arguido a "abastecer-se", nem “a comprar estupefacientes", nem “a vender o produto estupefaciente adquirido em Lisboa aos arguidos AA e CC". Acresce que, no n.º 26 dos factos provados, consta que à data dos factos o arguido não desempenhava qualquer profissão. Ora, tal não é verdadeiro, pois que o arguido trabalhava como cabouqueiro numa pedreira, tal é aliás referido no depoimento da testemunha CM. Com efeito, a forma como o tribunal apreciou as provas disponíveis revela uma clara violação do artigo 127.º do Código Processo Penal, pois que extraiu conclusões que plasmou na matéria de facto provada que não tem assento razoável, nem lógico, na prova efectivamente produzida, a razão da discordância do recorrente quanto aos factos indicados revela-se assim por considerar que a prova produzida quanto a uns factos é insuficiente ou mesmo inexistente e quanto a outros factos a prova produzida não permite certa conclusão ou aponta em sentido inequivocamente contrário ao facto dado como provado. Refira-se ainda que os factos considerados como provados, constantes dos n.ºs 5, 6, 7, 8, 10, 11, 13, 15, 17, 19, 20, 22, 24 e 25, não são ''factos'' susceptíveis de sustentar uma condenação penal, mas apenas imputações genéricas em que não se indica o lugar, o tempo e as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado, designadamente, "deslocou-se algumas vezes a Lisboa" “vendeu em local não apurado", "quantidades não determinadas". As afirmações genéricas contidas no elenco dos ''factos provados" do acórdão não são susceptíveis de contradita, pois não se sabe quando e quantas foram essas deslocações a Lisboa, em que locais e que quantidades o arguido vendeu os estupefacientes, e a quem, pelo que a aceitação dessas afirmações como ''factos'' inviabiliza o direito de defesa que assiste ao arguido, aqui recorrente e, assim, constitui uma grave ofensa aos princípios constitucionais previstos no artigo 32.º da CRP. Dos depoimentos das testemunhas de defesa arroladas, resultaram factos que são importantes e deveriam ter sido levados em consideração pelo tribunal, e que não constam dos factos provados, designadamente, que o arguido é uma pessoa respeitadora e respeitada, é um bom trabalhador, que apenas se deslocou para a zona de Leiria para exercer a sua verdadeira profissão "cabouqueiro". Acresce que, que o arguido juntou aos autos um documento emitido pelo Estabelecimento Prisional de Torres Novas onde consta que o mesmo "concluiu o 6° ano de escolaridade e tem um bom comportamento", pelo que também estes factos provados documentalmente deveriam constar dos factos provados, sendo relevantes também na graduação da medida da pena a aplicar. De todo o modo e sem prescindir, o recorrente coloca em crise a medida da pena que lhe foi sentenciada, entendendo que a mesma é excessiva e violadora do disposto no artigo 71.º do Código Penal, para o que invoca a circunstância do arguido se encontrar a trabalhar como cabouqueiro numa pedreira, ser bem considerado pelos familiares a nível pessoal e profissional, beneficiar de um relatório social, ter um bom comportamento no estabelecimento prisional, ter aí concluído o 6º ano de escolaridade, pelo que deveria a respectiva pena ter-se contido próximo do limite mínimo previsto na lei. O acórdão recorrido violou ainda o disposto no artigo 109.º do Código Penal, ao decretar que o veiculo automóvel de matrícula QP, apreendido a fls. 858, fosse perdido a favor do Estado. Na realidade, não estão preenchidos os pressupostos para que tal ocorresse, desde logo, porque não resultou provado que ofereça perigo típico exigido por lei ou, que tal veículo pela sua natureza ou pelas suas circunstâncias do caso, ponha em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, ou ofereça sérios riscos de ser utilizado para o cometimento de novos crimes. Não resultou assim provado que, sem o veículo automóvel de matrícula QP, apreendido a fls. 858, o arguido não teria praticado o crime. Da matéria de facto não resulta suficientemente caracterizada a relação instrumental do veículo com a prática do crime, de forma a poder dizer-se que, sem ele, o mesmo não teria sido cometido, ou que dificilmente o teria sido na forma em que foi cometido, ou seja, não resulta da matéria factual que a prática do crime foi especificamente conformada pela utilização do referido veículo. 4.2. Igualmente inconformado, também o arguido CC recorreu, em 14Dez05 (17), à Relação pedindo a revogação do acórdão recorrido, «nomeadamente no que à matéria de facto provada respeita (contradição entre fundamentação e decisão); à opção errada pela medida da pena e à nulidade da sentença por falta de fundamentação suficiente: Da análise da prova constante das cassetes áudio numeradas de 1 a 8, constata-se efectivamente que a juiz a quo deu como provados factos relativamente ao recorrente que são de todo em todo contrários à prova efectivamente produzida ou no mínimo a prova produzida não permite concluir da forma que efectivamente veio a suceder. As testemunhas nunca precisaram datas, nem quantidades exactas, mas antes confirmaram ser o recorrente consumidor tal como eles; que partilhavam consumos; que lhe pediam que comprasse para ambos e o contrário chegou a acontecer; que nestas ocasiões não havia qualquer proveito económico para o recorrente (aliás, não foi produzida qualquer prova de que o recorrente adquiria a terceiros a um preço, cortava ou dividia ele próprio e depois revendia a valores superiores para obter o dito lucro com a transacção); não se provou inclusivamente os locais concretos onde ocorriam as supostas vendas; como se não provou que o recorrente não desenvolveu qualquer actividade profissional entre Janeiro de 2004 e Setembro de 2004 (pelo contrário as testemunhas arroladas pelo recorrente afirmaram que este sempre trabalhou); como se provou ainda que variadíssimas testemunhas "curaram a ressaca" ao recorrente em diversas ocasiões. A matéria dada como provada está, assim, em contradição com a prova produzida, bastando para tanto analisar os conteúdos dos vários depoimentos, pelo que padece o acórdão recorrido dos vícios constantes no n.º 1 e n.º 2, al. c) do art. 410.º do CPP, devendo consequentemente dar-se cumprimento ao estatuído no art. 430.º do mesmo diploma legal. Mais, em face dos factos provados, da intensidade da ilicitude da conduta do ora recorrente, que não se nega ser típica objectiva e subjectivamente do tipo legal genérico consagrado no Dec.-Lei 15/93, constata-se que tal intensidade foi colocada num nível completamente desajustado, pois, se sindicada convenientemente a prova produzida bem como a conduta do recorrente, quando muito deveria este ter sido condenado pelo crime p. p. al. a) do art. 25.º do citado diploma legal, uma vez que atendendo ao modo da sua conduta e demais factos relevantes, o grau de ilicitude da mesma se acha de acordo com o tipo privilegiado pelo art.º 25.º e não com o tipo base do art. 21.º. Foram, como tal, violadas as normas constantes dos artigos 21.º e 25.º do Dec.-Lei n.º 15/93 de 22/01, bem como o estatuído na al. a), do n.º 2, do Art.º 410.º do CPP, pelo que se pugna desde já pela reforma do acórdão no sentido atrás aduzido. Não se entendendo pela reforma da sentença nesta parte e admitindo, embora dificilmente, a prática pelo recorrente do crime p. p. n.º 1 do art. 21.º, do Dec.-Lei 15/93, sempre se dirá que os juízes a quo procederam erradamente à determinação da medida da pena, atentos os limites mínimos e máximos para o tipo de crime, circunstancias em que foi praticado, prova produzida e factos que podiam e deviam ter deposto a formar um juízo de prognose mais favorável ao arguido ora recorrente. Os juízes a quo não só ao valorarem indevidamente a prova produzida, bem como na apreciação dos critérios que devem nortear o julgador na escolha e determinação da pena e sua medida, violaram de forma clara, o que estabelece o legislador penal, a propósito de tais operações. A este respeito, resulta do acórdão recorrido que não consideraram os juízes a quo os seguintes factos em favor do arguido: a) não apresentar o arguido, ora recorrente, quaisquer antecedentes criminais; b) revelar o mesmo bom enquadramento familiar, social e profissional, apesar de constar dos autos elemento essencial para aferir do passado criminal do arguido (o seu C.R.C). Apesar de as testemunhas por este arroladas terem afirmado não conhecer ao arguido qualquer factos passados que fossem passíveis de integrar qualquer tipo de ilícito criminal, os juízes a quo, não só não tomaram tal facto em consideração como nem sequer consta do acórdão recorrido que se encontra junto aos autos CRC do recorrente. Ora, e conforme se afere do CRC e também dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo recorrente, é este infractor primário, facto que, obviamente depõe a favor do arguido e que nos termos do n.º 2 do art. 71.º do CP o julgador deve atender para a determinação da medida da pena. Foi ainda violado o principio da medida da culpa como barreira inultrapassável na determinação da medida da pena, pois, face à apurada culpa do recorrente, conjugada com os pressupostos fácticos que determinaram a sua conduta, bem como atendendo às condições pessoais e falta de antecedentes criminais do mesmo, se mostra exageradíssima a medida da pena aplicada. 5. Efectivamente, excede em larguíssima medida o quantum da pena aplicada ao recorrente (7 anos e 6 meses) quando observados os critérios acima expostos. Aliás, não só tal quantum é violador dos pressupostos estabelecidos a este respeito no art. 71.º do CP, como ainda, quer em matéria de prevenção geral, quer de forma mais grave em matéria de prevenção especial, tal quantum se mostra totalmente contrário aos fins pretendidos visar. Assim, violaram os juízes a quo os critérios quanto à determinação da medida da pena bem como do principio da culpa, pelo que é nulo, nesta parte, o acórdão, por falta de fundamentação suficiente, assim se violando o disposto nos artigos 374.º, 375.º e 379.º, todos do CPP e 71.º do CP. A não se entender nulo nesta parte o acórdão recorrido, sempre se dirá que a pena a aplicar ao recorrente só poderá ser a correspondente ao mínimo previsto no art. 21.º do DL 15/93, caso não se entenda que a sua conduta se subsume ao tipo previsto na al. a) do art.º 25.º do mesmo diploma legal. 4.3. O arguido AA, também irresignado, recorreu igualmente à Relação, em 13Dez05, pedindo que «considere como não provada a matéria de facto», que se «considere que a conduta do arguido apenas se subsume ao tipo objectivo de ilícito do crime de tráfico de menor gravidade» e que, «na eventualidade de a conduta do arguido ser subsumível ao artigo 21° n° 1 daquele Decreto-Lei, seja declarada manifestamente inadequada a medida da pena concretamente aplicada e substituída por outra nunca superior ao mínimo da moldura penal»: Quanto ao depoimento dos soldados ZZ e AA1, em nada contribuem para que se dê como provada aquela matéria. De facto, e partindo do princípio que apenas o depoimento destes dois soldados poderia ser tido em conta para efeitos de considerar provada ou não a matéria de facto referida, o que resulta à saciedade desses depoimentos é exactamente que não sabem ou não têm a certeza de rigorosamente nada. Se alguma consequência se deve retirar do depoimento destes dois soldados é exactamente que a de que a matéria (...) deve figurar, no acórdão, sob a epígrafe "Factos não provados". É inacreditável que se dê como provado que a arma (existente na casa onde AA se encontrava à data da sua detenção) fosse do falecido pai deste (existindo ainda documentos comprovativos disso mesmo juntos aos autos - os documentos da arma), que se encontrasse na casa que era habitada pelo seu pai à data do seu falecimento, que os herdeiros nunca tivessem efectuado partilhas e que, mesmo assim, se condene o arguido pela prática de um crime p. p. artigo 6° n° 1 da Lei 22/97 de 27 de Junho, com a redacção introduzida pela Lei 98/2001. Ao dar como provado a matéria vertida no ponto 152 do acórdão, outra conclusão não poderia existir que não seja a absolvição do arguido do crime p. p. artigo 6° n° 1 da Lei 22/97. Para dar como provado o facto referido em I) das alegações do recorrente, o tribunal socorreu-se do depoimento da testemunha FF. O que resulta, porém, do depoimento de tal testemunha não é que o arguido AA lhe tenha vendido um número indeterminado de pacotes de heroína. Consequentemente (e atendendo à prova validamente produzida nos presentes autos), o arguido AA, a ser condenado pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, apenas poderia ser condenado pelo crime p. p. artigo 25° do Decreto-Lei 15/93. Atendendo à prova produzida em sede de audiência e julgamento, à suscitada nulidade das escutas telefónicas dos presentes autos e ao facto de a conduta do arguido AA (a ser subsumível a algum tipo legal de crime) apenas poder ser enquadrada no tráfico de menor gravidade (artigo 25° do Decreto-Lei 15/93 de 22/1), é manifestamente inadequada a medida de pena concretamente aplicada ao recorrente. Mesmo admitindo que a conduta do arguido AA fosse subsumível ao tipo legal de crime do artigo 21° n° 1 do referido Decreto-Lei, tal pena seria, ainda assim, inadequada. A actividade ilícita do recorrente era diminuta tendo em conta a quantidade de vezes que vendeu estupefacientes. Acresce que o arguido AA era, à data dos factos que vem acusado, consumidor. Assim, atentas as circunstâncias em que alegadamente foram praticados actos, se a conduta daquele fosse subsumível ao tipo de ilícito do 21º n.º 1 (o que não se concede) apresentaria sempre uma ilicitude diminuta. Na eventualidade de se considerar como provado o preenchimento do tipo objectivo de ilícito do 21º n° 1, a pena concretamente aplicada ao arguido nunca poderia ser superior a 4 anos de prisão (mínimo da moldura pena1), atendendo aos critérios de fixação da pena plasmados no artigo 70° do Código Penal. A conduta do arguido (provada como foi em sede de audiência e julgamento) nem sequer chegou a preencher o tipo objectivo de ilícito do 21º n.º 1, mas tão só do artigo 25° do Decreto-Lei 15/93. Assim sendo, a ser condenado, ao arguido AA apenas poderia ser aplicada uma pena concretamente determinada sobre a moldura penal da alínea a) do referido artigo. 4.4. Mas a Relação de Coimbra, em 12Jul06, negou provimento a todos os recursos: Demanda-se desta Relação, essencialmente, a análise das seguintes questões: a) Validade probatória das escutas telefónicas; b) Conformidade legal do operado julgamento factual; c) Nulidade do acórdão, em razão de suposta insuficiência da fundamentação sancionatória e de alegada deficiência descritiva dos respectivos actos comportamentais, do exame crítico das provas e da deliberação de perdimento de certo veículo a favor do Estado; d) Acerto jurídico-subsuntivo das atitudes comportamentais dos arguidos-recorrentes CC [pretensamente enquadrável no tipo-de-ilícito privilegiado previsto no art. 25.°, al. a), do DL 15/93] e AA [arguente de idêntico tratamento e de indevida condenação pela infracção criminal de detenção ilegal de arma]; e) Adequação sancionatória à realização das legais finalidades (e à culpa); f) Reunião dos pressupostos de perdimento a favor do Estado de bens de BB. Julgamento factual e respectiva modificabilidade. Como se observa das respectivas conclusões, todos os identificados recorrentes afrontam, no que lhes respeita, o deliberado julgamento factual, argumentando quer com a proibição valorativa das escutas telefónicas (nos termos sobreditos), quer com pretenso erro apreciativo e/ou insuficiência os residuais/diversos meios probatórios de suporte do assertivamente consignado, essencialmente, sob os pontos 6.º a 22.º, 26.º, 149.º e 150.º - BB; 10.°, 13.°, 14.° e 73.° a 75.° - AA; 6.°, 7.°, 8.°, 12.°, 1.ª parte, 28.° e 29.° - DD; limitando-se CC, singela e desconcertantemente, à alegação da contradição da matéria tida por assentes - que não especifica - com a prova produzida, e à invocação do - equivocadamente correlato - vício processual de insuficiência da matéria de facto para a decisão, previsto no normativo 410.°, n.º 2, al. a), do CPP. Porém, nenhum observou com o devido rigor o ónus processual previsto no art. 412.º, n.º 3, do CPP, que lhes estabelece o respectivo encargo - impugnando a decisão proferida sobre a matéria de facto - de especificação dos pontos de facto que considerem incorrectamente julgados bem como das provas impositivas de decisão diversa da recorrida, por referência aos suportes técnicos, quando tenham sido gravadas (como no caso), cuja expressa consignação, ainda que explanada na fundamentação/motivação recursiva, haverá que ser resumida no referente quadro conclusivo. De facto, como se colhe da respectiva análise, para além da sustentada invalidade das transcrições das conversações telefónicas, nenhum dos ditos sujeitos processuais concretizou, relevantemente, quaisquer objectivos e específicos elementos probatórios que, em seu entendimento, necessariamente demandariam decisão diversa da produzida, sendo que CC nem sequer mencionou, selectivamente, a factualidade tida por adquirida pelo Colectivo de cujo julgamento discordou, não se abstendo, ainda assim, de instar à renovação da totalidade da prova registada nas cassetes áudio 1 a 8 (!)(cfr. pessoais conclusões 9.ª a 12.ª). O que de tais peças recursivas se surpreende é a mera e irrelevante procura de cada um dos identificados cidadãos retirar e fazer sufragar a sua própria, divergente e interessada inferência do acervo probatório reunido/produzido no âmbito processual, e que o colégio julgador teve por bastamente ilustrativo do juízo conclusivo a final plasmado na peça decisória, na medida em que particularmente o desfavorece, perdendo-se em vagas, abstractas e inócuas conjecturas sobre o maior ou menor atinente valor informativo das diversas prestações testemunhais e da respectiva adequação à formação da pessoal convicção dos elementos do dito órgão decisor. Todavia, o mecanismo legal/processual de recurso, enquanto remédio jurídico, destina-se - idealmente - à correcção/reparação de erros/vícios processuais de julgamento factual/comportamental e/ou jurídicos, alegada/comprovadamente cometidos pelo competente julgador, e não à realização pelo tribunal de recurso de mera operação de aderência aos queixumes/lamentos e interesses dos recorrentes, como é por demais óbvio. Bastar-nos-íamos, pois, pelo reconhecimento de tal cabal inobservância da enunciada onerosidade procedimental recursiva para concluir pela imodificabilidade decisória do definido quadro factual, como claramente decorre do normativo 431.° do CPP, em sentido inverso. Sem prejuízo, sempre se dirá: No âmbito da apreciação das provas em processo penal, ressalvadas as especificidades de valoração normativizada/vinculada, vigora o princípio fundamental, geral, de que a decisão do tribunal sobre a "questão de facto" assenta na livre convicção do julgador, ainda que devidamente fundamentada, devendo aparecer como conclusão lógica e aceitável à luz das regras da experiência comum. Em conformidade com o normativo 127.º do CPP, demanda-se do julgador a análise dialéctica dos elementos probatórios reunidos/produzidos no âmbito processual e a respectiva harmonização entre si, de acordo com a lógica, a psicologia, e as máximas da experiência, de modo a que a decorrente conclusão silogística - que, temperada pela sua pessoal/individual/íntima convicção, toma a forma de soberana decisão - se apresente objectivável, demonstrável, aceitável e razoável para a generalidade das pessoas (dotadas de mediana capacidade intelectiva/discernitiva - o homem médio), revelando uma certeza empírica, moral, histórica, pratico-iurídica. Como assim, a exigência legal do conciso exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do julgador, prevista no comando normativo ínsito no art.º 374.º, n.º 2, apenas visa a objectivação/elucidação a terceiros da razão de ser do concreta/positivamente decidido e do processo lógico-formal que serviu de suporte ao respectivo conteúdo, pela indicação das razões justificativas do convencimento por determinado meio probatório, e não já a explicitação e valoração de cada meio de prova perante cada facto e a menção das inferências indutivas levadas a cabo pelo tribunal ou dos critérios de valoração das provas e contraprovas. Tendo presentes tais pressupostos, cuidadamente analisado o aresto em questão, particularmente o texto justificativo do julgado factual, nele exarado e supra transcrito, aí se observa, exaustiva, lógica e esclarecedora explicação do processo logico-motivacional de formação da - abstracta - convicção do colégio julgador, única processualmente válida, dele se não colhendo que, no exercício do seu soberano poder-dever de livre apreciação das provas (não vinculadas) e de respectiva susceptibilidade de decorrente convencimento proporcionada pelos insubstituíveis princípios processuais da imediação e oralidade, conferida pelo normativo 127.° (por referência ao preceituado no art.º 125.º, do C. P. Penal) -, tivesse divergido do sentido probatório quanto às definidas realidades vivenciais, ou se houvesse confrontado com sérias/inabaláveis dúvidas sobre as atitudes comportamentais que acabou por consignar como reconhecidas, então, hipoteticamente, conducentes à observância do princípio processual (em matéria probatória) in dubio pro reo e ao correlato juízo negativo, a par do que aconteceu tocantemente às residuais enunciações fácticas tidas por indemonstradas, subordinadas ao correspondente sub-capítulo II (Factos não provados). Destarte, não se observando qualquer - ostensivo - vício processual do processo de formação da convicção do julgador, cabal/suficientemente explicado (em conformidade com o preceituado no referido art. 374.°, n.º 2, do CPP) e comummente apreensível, nem se realizando a devida materialização pelos recorrentes do ónus processual postulado pelo citado normativo 412.3 e 4, do CPP, nenhuma razão juridicamente válida se antolha com aptidão modificativa do definido julgado factual - que se revela isento, outrossim, de quaisquer dos vícios prevenidos no dispositivo 410.°, n.º 2, do mesmo diploma legal, necessariamente reveláveis ao comum observador pela mera leitura do próprio texto (sem necessidade de recurso a outros elementos externos), mormente de insuficiência da matéria de facto para a decisão, elencado sob a respectiva al. a), com cujo conceito o recorrente CC confundiu a pessoal discordância da operada valoração probatória -, que, por tal sorte, se haverá que ter por definitivamente fixado, nos precisos termos. Nulidade do acórdão. Vem ainda expressamente suscitada a nulidade do acórdão pelos recorrentes CC e DD, em razão, respectivamente, de suposta insuficiência da fundamentação sancionatória (conclusão 27.ª); e de alegada deficiência descritiva dos respectivos actos comportamentais - também invocada por BB, por referência aos pontos de facto 5, 6, 7, 8, 10, 11, 13, 15, 17, 19, 20, 22, 24 e 25, sem que, contudo, daí houvesse retirado qualquer consequência jurídico-processual, quedando-se pela mera afirmação do tolhimento do seu direito constitucional de defesa (...) -, do exame crítico das provas, bem como da deliberação de perdimento a favor do estado do próprio veículo automóvel e pessoais telemóveis (...). Também neste particular se revela patente a incúria do recorrente CC no acatamento do encargo legal previsto no art. 412.º, n.º 2, al.s. a) e b), do CPP, já que se limitou à leviana afirmação da nulidade do acórdão, por falta de fundamentação suficiente, por violação pelo Colectivo dos critérios de determinação da medida da pena, bem como do principio da culpa, sem indicar expressamente, como se lhe impunha, a concreta causa invalidativa de tal peça processual, dentre as três prevenidas no n.º 1 do art. 379.º, do referido diploma legal, bem como o sentido em que, no seu entendimento, o colégio decisor interpretou as argumentadamente transgredidas normas dos art.s 374.º e 375.º do mesmo compêndio ou com que as aplicou e o que deveria ter representado ou aplicado. Por conseguinte, e por se lhe não reconhecer, a propósito, qualquer razoabilidade ou acerto jurídico, se conclui, inexoravelmente, e sem mais delongas, pelo respectivo soçobramento. Idêntico juízo se impõe tocantemente às argumentações dos recorrentes BB e DD quanto à pretensa imprecisão descritivo-factual, posto que, para além do primeiro nenhuma específica norma processual haver referentemente arguido de desrespeitada pelo julgador, em cumprimento do mencionado ónus atribuído pelo dispositivo 412.º, n.º 2, al.s a) e b), a operada enunciação assertiva (subordinada ao supra descrito sub-capítulo A-I do acórdão recorrido), nos limites do - soberanamente - tido por adquirido pelo tribunal colectivo, reúne cabal e empírica aptidão à compreensibilidade das referentes/elencadas acções humano-comportamentais, ao invés do sustentado pelos identificados sujeitos, não se vislumbrando, outrossim, em que é que lhes cerceia o direito de defesa, o que também não esclarecem devidamente. Ao mesmo destino se encontram votadas as residualmente invocadas causas de nulidade da referida peça processual (acórdão), aduzidas por DD: deficiente exame crítico das provas e imperfeição justificativa do perdimento a favor do Estado dos respectivos/apreendidos bens - automóvel e telemóveis. Aquela, naturalmente, em razão da atinente/anterior realização apreciativa da fundamentação deliberativo-factual (cfr. antecedente item 3.2), e est'última por se reportar aos respectivos pressupostos substantivo-materiais, a analisar infra, já que a formalização da referente fundamentação se conformou, manifestamente, com o postulado de concisão jurídica definido no art. 374.°, n.º 2, do CPP. Como assim, têm-se por improcedentes todas as arguidas causa de nulidade do acórdão recorrido. Subsunção jurídico-comportamental referente aos arguidos-recorrentes CC e AA. Ainda com imperfeita observância da estatuição normativa do citado art.º 412.°, n.º 2, do CPP, discutem os identificados recorrentes CC e AA a operada condenação pessoal pela figura-de-delito prevista no art.º 21.°, n.º 1, do D. Lei n.º 15/93, fundando, porém, a respectiva discordância e o propugnado privilegiamento contemplado no dispositivo 25.°, al. a), do mesmo diploma, em hipotética/alegada mitigação da ilicitude dos - limitadamente - admitidos actos de narcotráfico, decorrente da interessada (e tendenciosa) valoração probatória, como claramente se observa das respectivas conclusões. Assim, como é bom de ver, em função do realizado juízo de imodificabilidade do acervo factual assertivamente enunciado pelo tribunal recorrido, ficam, de todo, esvaziadas de sentido e suporte as atinentes pretensões, cujos pressupostos - de particular, acentuada, sensível, ou, nos dizeres legais, considerável diminuição da ilicitude comportamental -, se revelam, aliás, empírica e manifestamente antagónicos com a apurada dimensão da pessoal actividade de movimentação/comercialização de drogas [heroína, cocaína, haxixe (cannabis) e MDMA - CC; e heroína e cocaína - AA], pelo menos ao longo de todo o ano de 2004, até lhe haver sido posto termo por acção policial, com a sua detenção, em 3/12/2004 (...). Semelhantemente, por efeito da improcedência argumentativa da pessoalmente idealizada correcção do correspondente quadro fáctico, e, outrossim, por aí se não representar a exclusividade da finalidade aquisitiva de plantas, substâncias ou preparações tóxicas proibidas (de natureza estupefaciente e/ou psicotrópica) para uso próprio - aliás não alegada, em conformidade com a disciplina jurídico-recursiva estatuída no referido preceito 412.°, n.º 2, al.s. b) e c), do CPP -, elemento constitutivo do tipo-de-ilícito previsto no art. 26.° do referido D. Lei n.º 15/93, de 22/01, se imporá, naturalmente, a rejeição da formulada pretensão absolutória de DD, bem como da subsidiariamente sustentada subsunção fáctico-comportamental a tal figura-de-delito (...). AA pugna, mais, pela respectiva absolvição do imputado ilícito criminal de detenção ilegal de arma (...), em razão da enunciação proposicional definida sob ponto 152.° do quadro assertivo - "o arguido AA, após a morte do pai, ocorrida há três ou quatro anos, continuou a habitar na casa que foi deste e da sua mãe, onde ficaram os bens que pertenceram ao casal e que não foram partilhados por óbito daquele, dos quais fazia parte a espingarda que aí foi apreendida" -, sem, contudo, ainda no particular, explicar cabalmente as pertinentes premissas jurídicas do correspondente silogismo, de que, necessariamente, haverá que decorrer a aduzida dissidência do decidido, como lhe demandava o citado dispositivo 412.°, n.º 2, do CPP (...). Tanto basta, pois, à improcedência da relativa acção recursiva. Não obstante, de nenhum reparo é passível a referente deliberação do colégio julgador, de cuja fundamentação se deu conta no seguinte trecho do acórdão: “Também na mesma ocasião e local, foi aprendida uma arma de caça, não sendo o arguido titular de licença de uso e porte de arma. Tal arma havia pertencido ao pai do arguido, falecido há cerca de três anos, não tendo sido, tal como os demais bens da herança, partilhada pelos seus sucessores. Tal significa que o arguido AA não era o proprietário exclusivo dessa arma. Mas propriedade não se confunde com detenção, podendo esta existir sem aquela, sendo que é a detenção que adquire contornos de relevância para efeitos da incriminação (...). Do elenco factual apurado, pode facilmente concluir-se que o arguido AA tinha a detenção dessa arma que, após o falecimento do seu pai, foi transferida do quarto deste para o quarto do arguido, passando este a dispor livremente da mesma, como se pode comprovar pela transcrição da sessão n° 1134, efectuada ao alvo n° 25717, onde o "Gordo" (VV) informa o BB que o arguido AA saiu com a espingarda dentro do carro, à procura daquele”. Como aqui claramente se esclarece, não foi condenado por ser co-herdeiro da referida espingarda caçadeira, mas por dela dispor a seu bel-prazer mudando-a do local onde habitualmente se encontrava guardada para o seu quarto, e, quiçá, transportando-a no carro -, sem que para tanto possuísse a necessária licença (...). Medidas das reacções penais cominadas aos arguidos-recorrentes BB, CC e AA. Como se colhe da análise das respectivas motivações/conclusões recursivas, suportam os identificados cidadãos o pessoal dissídio quanto às dosimetrias penais que lhes foram definidas pela reconhecida/apurada actividade delitiva de narcotráfico, cuja redução até ao mínimo (4 anos de prisão) da moldura penal abstracta do tipo-de-ilícito tido por realizado (previsto no art. 21.º, n.º 1, do DL n.º 15/93), subsidiariamente (na eventualidade de desatendimento das demais pretensões) peticionam, na argumentação da imponderação ou deficiente/errónea valoração pelo tribunal colectivo dos seguintes essenciais factores: a) BB: trabalhar (como cabouqueiro numa pedreira); ser merecedor de boa consideração pelos familiares a nível pessoal e profissional; ter bom comportamento no estabelecimento prisional, e ter aí concluído o 6.º ano de escolaridade (...); b) CC: Medida da culpa e finalidades preventivas, quer gerais, quer especiais, estas em razão da respectiva primariedade criminal e do bom enquadramento familiar, social e profissional, demandantes de juízo de prognose mais favorável sobre a sua pessoa (...); c) AA: Diminuta ilicitude da respectiva actividade (...). Também neste particular se evidencia a insubsistência argumentativa. Senão vejamos. Em parte alguma a enunciação fáctica comporta as invocadas afirmações de BB, meramente se havendo consignado, como seguro, que desde que chegou a Portugal, há cerca de quatro anos, apenas trabalhou, como cabouqueiro (para um primo em segundo grau), durante quatro a cinco meses, após o que abandonou o emprego, pretextando junto dos parentes (tios) em cuja casa então vivia que iria trabalhar em pedreiras para a zona de Leiria (cfr. itens 162/165 do acervo factual). Para além de não explicar a - absurda - afirmação do desrespeito pelo colégio decisor da medida da sua culpa, que, de todo, se não reconhece na referente documentação, já que se teve por certo que desenvolveu a conhecida actividade de tráfico de drogas - concertadamente com terceiros - com dolo directo, liberdade determinativa da própria vontade e conhecimento da respectiva proibição, ao longo do ano de 2004, até à sua detenção, em 3/12/2004 (pelo menos), não esclarece, outrossim, o recorrente CC donde retira o pessoal e levianamente expresso entendimento de que resulta do acórdão recorrido a inconsideração pelos julgadores do declarado desconhecimento da sua sujeição a anteriores condenações criminais, situação pessoal e laboral (...), que igualmente se não alcança, nem ainda a razão de ser da assacada desconformidade penal com as finalidades preventivas [sempre em desrespeito pelo repetidamente mencionado ónus prevenido pelo normativo 412.1 e 2, maxime al. b), do CPP]. Paralela crítica, e por maioria de razão, demanda a postura recursiva de AA, que em absoluto se demitiu de convencer da - indemonstrável - arrogada mitigação da sua ilicitude comportamental que, ao invés do por si adjectivado, se apresenta, como a dos demais, deveras acentuada. Regista-se, ademais, haverem sido esclarecida e assisadamente ponderados pelo tribunal recorrido os pertinentes critérios de individualização das penas, tendo em vista a realização das legais finalidades de protecção dos bens jurídicos e reintegração social dos particulares agentes delitivos, em conformidade com o estatuído nos normativos 40.°, n.° 1, e 71.1 e 2, do C. Penal, como se pode observar do referente excerto, cujo teor se transcreve: “As exigências de prevenção, sobretudo de natureza geral, dada a incidência desta prática delituosa, que a transformou em autêntica "praga social", são particularmente prementes. Como já sustentava o STJ 30/1/90, "são gravíssimos os efeitos do consumo de estupefacientes e dificilmente imagináveis os danos físicos e morais produzidos pela viciação a que, com maior ou menor facilidade, conduzem. E isto sem contabilizar todo o tipo de criminalidade a que pode conduzir e frequentemente conduz o tráfico de tais produtos: mortes, falsificações, roubos, violações; além de que são uma causa muito vulgarizada de prostituição, a qual, não sendo agora punida, não deixa de ser uma verdadeira chaga social. Há, pois, que exercer através da punição do tráfico de drogas, mormente das denominadas «duras», um intenso trabalho de pedagogia e de prevenção ". Na determinação da pena deve atender-se primordialmente aos fins prosseguidos pelas penas. Com efeito, "a aplicação de penas visa a protecção de bens jurídicos, entendida como tutela da crença e confiança da comunidade na sua ordem jurídico-penal e a reintegração social do agente. A primeira - a de prevenção geral positiva - ou de integração - é a finalidade primordial a prosseguir, pelo que a segunda - a de prevenção especial positiva - nunca pode pôr em causa o mínimo de pena imprescindível à estabilização das expectativas comunitárias na validade da norma violada. Por sua vez, a defesa da ordem jurídico-penal, tal como é interiorizada pela consciência colectiva, também nunca pode pôr em causa a própria dignidade humana do agente, que é o princípio da culpa, justamente salvaguardada (nulla poena sine culpa), logo, a pena jamais pode exceder a medida da culpa ou o máximo que a culpa do agente consente, independentemente de assim se conseguir ou não atingir o grau óptimo da protecção dos bens jurídicos. Desta forma, o espaço possível de resposta às necessidades de reintegração social do agente é o que se define entre aquele mínimo imprescindível à prevenção geral positiva e o máximo consentido pela sua culpa. A determinação da medida da pena faz-se em função da culpa do arguido e das exigências da prevenção, atendendo-se a todas as circunstâncias que no caso concreto, não fazendo parte do tipo, deponham a favor ou contra ele". A actuação dos arguidos BB, CC e AA é particularmente grave, atentando sobretudo ao espaço temporal em que prosseguiram a sua actividade delituosa (cerca de um ano, os dois últimos), às quantidades de droga envolvidas nas transacções que efectuavam e à sua disseminação por elevado número de consumidores, à posição que ocupavam na cadeia intermediária dessa actividade, demandando a colaboração de terceiros para a sua concretização, e aos valores sociais que as suas condutas afrontaram. O arguido BB reiterou esta prática delituosa, apesar de condenado por crime da mesma natureza [...], tendo mediado pouco tempo entre a prática dos novos factos e a sua restituição à liberdade, o mesmo não se mostra socialmente inserido, não tendo desempenhado actividade laboral, desde que chegou a Portugal, há quatro anos, por período que excedesse os três ou quatro meses. Também os arguidos AA e CC apenas exerceram actividade laboral de forma irregular, recorrendo ao tráfico de estupefacientes para obterem os proventos económicos que utilizaram em seu proveito. Todos eles agiram com culpa intensa. Dest'arte, sem outras considerações por despiciendas, têm-se por improcedentes todas as pessoais pretensões de redução penal, cuja atinente medida não merece qualquer reparo jurídico. Perdimento a favor do Estado dos bens de BB e DD (veículos e telemóveis). Finalmente, admitindo, embora, a utilização dos respectivos/apreendidos veículos automóveis (de cada um) e telemóveis (do segundo) no desenvolvimento da caracterizada actividade de tráfico de droga, suscitam os referidos sujeitos a ilegalidade da declaração do correspondente perdimento a favor do Estado, por, alegadamente, se não reunirem os atinentes pressupostos, designadamente por não haverem sido essenciais ao cometimento infraccional (...). Manifestamente, também neste conspecto se não observa relevante desacerto do acto deliberativo, posto que, reconhecida que fora a utilização de tais objectos na realização delitual, não poderiam deixar de ter tal destino, como imperativamente estatui o normativo 35.º do D. Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, sendo irrelevante que, na respectiva fundamentação, se lhe não fizesse expressa menção. 5. OS RECURSOS PARA O SUPREMO 5.1. Ainda inconformado, o arguido AA, beneficiário de apoio judiciário (18), recorreu ao Supremo, em 31Jul06, pedindo a sua condenação por tráfico menor: XVIII. Decidiu mal a Relação de Coimbra ao não subsumir a conduta do arguido ao tráfico de menor gravidade. XIX. Sendo proibida a prova recolhida pela escutas telefónicas e, consequentemente, sendo proibida a sua valoração, a conduta do arguido (atenta a prova produzida em sede de audiência e julgamento) apenas se pode subsumir ao crime p. p. artigo 25° do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro. XX. Da prova produzida em sede de audiência e julgamento, apenas ficou provado que o arguido AA vendeu estupefacientes a EE (um número indeterminado - não se sabe quantos. Podem ser muitos ou muito poucos). XXI. A FF (três vezes). XXII. A GG (uma a duas vezes). XIII. A KK (duas a três vezes). XXIV. A Luís Miguel Vieira Torres (uma vez). XXV. A Joaquim Inocêncio Dias (no máximo três vezes). XXVI. A actividade ilícita do recorrente era verdadeiramente diminuta, tendo em conta a quantidade de vezes que vendeu estupefacientes. XXVII. Acresce que o arguido AA era, à data dos factos, consumidor. XXVIII. Assim, atentas as circunstâncias em que alegadamente foram praticados actos, se a conduta daquele fosse subsumível ao tipo de ilícito do 21° n.º 1 (o que não se concede), apresentaria sempre uma ilicitude diminuta. XXIX. Na verdade, a ser enquadrada no tráfico de estupefacientes p. p. artigo 21º n.º 1, nunca poderia ser aplicada ao arguido a pena de 6 anos de prisão. XXX. Na eventualidade de se considerar como provado o preenchimento do tipo objectivo de ilícito do 21 ° n.º 1, a pena concretamente aplicada ao arguido nunca poderia ser superior a 4 anos de prisão (mínimo da moldura penal), atendendo aos critérios de fixação da pena plasmados no artigo 70° do Código Penal. XXXI. Mais: somos da convicção de que a conduta do arguido (provada como foi em sede de audiência e julgamento) nem sequer chegou a preencher o tipo objectivo de ilícito do 21.1, mas tão só do artigo 25° do Decreto-Lei 15/93. XXXII. Assim sendo, a ser condenado, ao arguido AA apenas poderia ser aplicada uma pena concretamente determinada sob a moldura penal da alínea a) do referido artigo. XXXIII. Violadas foram, pois, entre outras as normas jurídicas insertas nos artigos 21° e 25° do Decreto-Lei 15/93 de 22 de Janeiro e no artigo 70° do Código Penal. 5.2. Igualmente inconformado, o arguido BB, beneficiando de apoio judiciário (19), recorreu ao Supremo em 02Ago06, pedindo a revogação do acórdão recorrido, incluindo a pena de prisão aplicada ao recorrente e a declaração de perda a favor do Estado do automóvel QP: Os factos considerados como provados, constantes dos n.ºs 5, 6, 7, 8, 10, 11, 13, 15, 17, 19, 20, 22, 24 e 25, não são “factos” susceptíveis de sustentar uma condenação penal, são apenas imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado, designadamente “deslocou-se algumas vezes a Lisboa“, ”vendeu em local não apurado”, “quantidades não determinadas”. As afirmações genéricas contidas no elenco dos “factos provados” do acórdão não são susceptíveis de contradita, pois não se sabe quando e quantas foram essas deslocações a Lisboa, em que locais e que quantidades o arguido vendeu os estupefacientes e a quem. A aceitação dessas afirmações como “factos” inviabiliza o direito de defesa que assiste ao arguido, aqui recorrente, e, assim, constitui uma grave ofensa aos princípios constitucionais previstos no artigo 32º da CRP. O recorrente coloca em crise a medida da pena que lhe foi sentenciada, entendendo que a mesma é excessiva e violadora do disposto no artigo 71º do Código Penal, para o que invoca a circunstância do período de tempo que resultou provado, que decorreu entre o Verão de 2004 até 03/12/2004, o arguido trabalhou como cabouqueiro numa pedreira, ser bem considerado pelos familiares a nível pessoal e profissional, beneficiar de um relatório social, ter um bom comportamento no estabelecimento prisional, ter aí concluído o 6º ano de escolaridade, pelo que deveria a respectiva pena a aplicar ter-se contido próximo do limite mínimo previsto na lei. A aplicação de uma pena de prisão próxima do limite mínimo mostra-se, ajustada, proporcional e não excede o grau de culpa, atendendo ao distanciamento temporal e o facto do arguido já ter cumprido parte dessa pena, em virtude de se encontrar preso preventivamente à ordem deste processo há cerca de 20 meses. O acórdão viola os critérios de dosimetria da pena ínsitos no artigo 71º do C. Penal, bem como princípios da adequação e proporcionalidade. O acórdão recorrido viola ainda o disposto no artigo 109º do Código Penal, ao decretar que o veiculo automóvel de matrícula QP, apreendido a fls. 858, fosse perdido a favor do Estado. Não estão preenchidos os pressupostos para que tal ocorresse, desde logo, porque não resultou provado que ofereça perigo típico exigido por lei ou, que tal veículo pela sua natureza ou pelas suas circunstâncias do caso, ponha em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, ou ofereça sérios riscos de ser utilizado para o cometimento de novos crimes. Não resultou assim provado que, sem o veículo automóvel de matrícula QP, apreendido a fls. 858, o arguido não teria praticado o crime. Da matéria de facto não resulta suficientemente caracterizada a relação instrumental do veículo com a prática do crime, de forma a poder dizer-se que, sem ele, o mesmo não teria sido cometido, ou que dificilmente o teria sido na forma em que foi cometido, ou seja, não resulta da matéria factual que a prática do crime foi especificamente conformada pela utilização do referido veículo. 5.3. Também o arguido CC recorreu em 02Ago06 ao Supremo, pedindo (20) a redução da pena: (...) 8. No que respeita à medida da pena, olvidaram os venerandos desembargadores a já suscitada violação da medida da culpa e circunstâncias de facto que devem depor a favor do ora recorrente; 9. e 10. Desde logo, e conforme se afere do CRC e também dos depoimentos das testemunhas arroladas pelo recorrente, é este infractor primário, facto que, obviamente depõe a favor do arguido e que nos termos do n.º 2 do art. 71.° do CP o julgador deve atender para a determinação da medida da pena, facto não atendido no acórdão recorrido; 11. e 12. Foi ainda violado o princípio da medida da culpa como barreira inultrapassável na determinação da medida da pena, pois face à apurada culpa do recorrente, conjugada com os pressupostos fácticos que determinaram a sua conduta, bem como atendendo às condições pessoais e falta de antecedentes criminais do mesmo, se mostra exageradíssima a medida da pena aplicada; 13. Efectivamente, excede em larguíssima medida o quantum da pena aplicada ao recorrente (7 anos e 6 meses) quando observados os critérios acima expostos; 14. e 15. Aliás, não só tal quantum é violador dos pressupostos estabelecidos a este respeito no art. 71.º do CP, como ainda, quer em matéria de prevenção geral, quer de forma mais grave em matéria de prevenção especial, tal quantum se mostra totalmente contrário aos fins pretendidos visar, pois sempre se dirá que a pena a aplicar ao recorrente só poderá ser a correspondente ao mínimo previsto no art. 21.º do DL 15/93. 5.4. O MP, na sua resposta de 18Ago06, pronunciou-se pelo improvimento dos recursos: (...) 2. A factualidade considerada provada contra os ora recorrentes integra, sem margem para dúvidas os crimes que foram objecto da correspondente condenação (...). 3. - As penas impostas aos recorrentes mostram-se justas e equilibradas. E, na sua concretização, tomou o tribunal em devida contra todas as circunstâncias atendíveis. 4. - Configura-se correcta e conforme à lei, por força do art. 35.º do Decreto-Lei n.º 15/93 e art. 109.º do Código Penal, como bem se refere no acórdão, a fls. 3111/3112, a declaração de perdimento do veículo automóvel, propriedade do arguido BB. 5.5. O Supremo, em 09Nov06, rejeitou, por inadmissibilidade, o recurso oposto pelo cidadão AA ao acórdão da Relação de Lisboa que, em 12Jul06, negara provimento ao recurso por ele oposto ao acórdão do tribunal colectivo do 1.º Juízo de Porto de Mós que, no âmbito do processo comum colectivo 8/03.4GATNV, o havia condenado, por «detenção ilegal de arma de caça» (art. 6º, n.º l, da Lei n.º 22/97), na pena de 120 dias de multa à taxa diária de € 4. 5.6. Em 07Dez06 (mediante acórdão transitado em 05Jan07), o Supremo, reunido em conferência para apreciar a questão prévia da (in)validade das impugnadas escutas telefónicas, considerou concretamente válido – porque observados «todos os requisitos e condições referidos nos art.s 187.º e 188.º [do CPP]» - esse meio de obtenção da prova, e, como tal, rejeitou, nessa parte, já que manifestamente improcedentes, os recursos dos arguidos AA, BB e CC. 6. TRÁFICO COMUM OU TRÁFICO MENOR? 6.1. Uma situação de tráfico de drogas ilícitas tipificada no art. 21.º do DL 15/93 só merecerá o tratamento privilegiado do art. 25.º (“Tráfico de menor gravidade”) “se a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta (…) os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção e a qualidade ou a quantidade das substâncias [traficadas ou a traficar]”. 6.2. No caso do arguido AA, a ilicitude do facto, embora algo «diminuída» (pela circunstância de o arguido não passar de um “retalhista”), não se mostra, no seu todo, «diminuta» nem, na sua imagem global, «consideravelmente diminuída». Com efeito, o arguido, na sua actividade de revenda de drogas ilícitas «duras» (cocaína e heroína, embora “cortadas”) (21): (I) Prolongou a sua actividade, até ser detido, durante cerca de um ano; (II) «Não desempenhou entretanto [qualquer] outra actividade profissional, nem possuía outra fonte de rendimentos»; (III) Servia-se de «colaboradores» quer nos seus contactos com os fornecedores (mais que um) quer com os «clientes» (múltiplos), assim não ocupando, na cadeia de comercialização da droga, o último lugar; (IV) Nas suas revendas, não se limitava a «passar» doses individuais (de € 10) ou «quartas» (a € 20), mas, por exemplo «no mês de Outubro de 2004, vendeu, duas ou três vezes, a Joaquim Dias, um grama de heroína de cada vez, pelo preço unitário de 60,00 €». 6.3. Tendo em conta, pois, os meios utilizados (nomeadamente a circunstância de o arguido utilizar «colaboradores»), a modalidade e as circunstâncias da acção (que se não limitava à revenda de doses individuais, de cerca de 1/10 de grama, mas revendendo também porções de um grama) e a qualidade («drogas duras») e quantidade das drogas transaccionadas, a ilicitude (global) do facto, apesar do lugar (quase terminal) ocupado pelo arguido na cadeia de comercialização da droga, não se mostra, ante o paradigma do art. 21.º do DL 15/93, «consideravelmente diminuída» (art. 25.º) (22). 6.4. No caso, a qualificação da actividade do arguido como de «tráfico menor» seria fazê-lo passar por simples «passador de rua», que o arguido, decididamente, não era. 6.5. O que não prejudicará, obviamente, que – tratando-se, como se trata, de tráfico de fronteira entre o tráfico comum (punível com prisão não inferior a 4 anos) e o tráfico menor (punível com prisão não superior a 5 anos) - a respectiva penalização reflicta – com deverá reflectir - essa proximidade. 7. «IMPUTAÇÕES GENÉRICAS» 7.1. Sustenta o arguido BB que «os factos considerados como provados, constantes dos n.ºs 5, 6, 7, 8, 10, 11, 13, 15, 17, 19, 20, 22, 24 e 25, não são “factos” susceptíveis de sustentar uma condenação penal, são apenas imputações genéricas, em que não se indica o lugar, nem o tempo, nem as circunstâncias relevantes, mas um conjunto fáctico não concretizado». 7.2. É certo que «a acusação contém, sob pena de nulidade, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena, incluindo, se possível, o lugar, o tempo e a motivação da sua prática, o grau de participação que o agente neles teve e quaisquer circunstâncias relevantes para a determinação da sanção» (art. 383.3.b do CPP). E que da sentença devem constar, sob pena de nulidade (art. 379.1.a), «a enumeração dos factos provados (...) bem como uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos de facto (...) que fundamentam a decisão (...)» (art. 374.2). No entanto, a sentença ora impugnada não deixou de proceder – nos limites da acusação (23) – a uma enumeração, tanto quanto possível completa, dos motivos de facto (...) que fundamentaram a condenação do arguido BB como autor de um crime de tráfico comum de drogas ilícitas: O arguido dedicou-se, de forma regular, à actividade de compra e venda de cocaína e heroína, dela fazendo dela o seu modo de vida, desde o Verão de 2004 até 03.12.2004; À data dos factos, não desempenhava qualquer actividade profissional, nem dispunha de qualquer outra fonte de rendimentos. Deslocava-se a Lisboa, de carro de ou comboio, onde adquiria o produto. Vendia o produto, adquirido em Lisboa, aos arguidos AA e CC, que, por sua vez, o revendiam. Além disso, vendeu produtos estupefacientes a vários consumidores, após prévio contacto telefónico: a) duas vezes por semana, um pacote de heroína de € 20 de cada vez, a EE; b) heroína a FF, uma ou duas vezes, entre € 30 a 35 o grama; c) heroína a GG, duas vezes por semana, entre meio grama e um grama, ao preço, respectivamente, de € 25 e 35; d) até cerca de dois meses antes de ser preso, heroína a HH, duas vezes por semana, um pacote de € 20 de cada vez; e) uma “quarta” de heroína, pelo preço de € 20 a II; f) Diariamente, durante três a quatro meses, um grama de heroína, pelo preço de € 35, a JJ; g) heroína, por três a quatro vezes, a KK, meio grama de cada vez, ao preço de € 20; h) duas vezes, heroína e cocaína, a LL. Além do veículo XX (de um terceiro), utilizava o veículo QP para se deslocar aos locais combinados com os clientes. Quando detido, tinha em casa: 20,324 g de cocaína (cloridrato); 116,3 g de heroína; 50,491 g de cannabis (resina); 2 pastilhas de MDMA. 7.3. Esta «enumeração dos factos provados» consubstancia «uma exposição», se bem que algo incompleta, «tanto quanto possível completa» (e, ao mesmo tempo, «concisa») dos «motivos de facto» que fundamentaram a decisão. 7.4. E, obedecendo assim às exigências legais (art. 374.2 do CPP), não enferma de nulidade (art. 379.1.a). 8. O CONFISCO DO VEÍCULO QP 8.1. Sustenta o arguido BB que «o acórdão recorrido viola o disposto no artigo 109º do Código Penal, ao decretar que o veiculo automóvel de matrícula QP, apreendido a fls. 858, fosse perdido a favor do Estado». E isso porque «não estão preenchidos os pressupostos para que tal ocorresse, (...) porque não resultou provado que ofereça perigo típico exigido por lei ou que tal veículo pela sua natureza ou pelas suas circunstâncias do caso ponha em perigo a segurança das pessoas, a moral ou a ordem pública, ou ofereça riscos de ser utilizado para o cometimento de novos crimes». 8.2. No entanto, o veículo em causa não foi declarado perdido a favor do Estado ao abrigo do art. 109.º do CP, mas, antes, a coberto do disposto no art. 35.1 do DL 15/93 (redacção da Lei 45/96), que se basta, para a declaração de perda a favor do Estado, que «os objectos tenham servido para a prática de uma infracção prevista no presente diploma» (ou seja, no DL 15/93), sendo certo que, no caso, era esse o veículo de que o arguido se «servia» para «se deslocar aos locais combinados com os clientes», levar até lá o produto a vender e trazer, consigo, o preço da venda realizada. 9. A MEDIDA DA PENA (arguido AA)
9.1. De um modo geral, «a medida da pena há-de ser encontrada dentro de uma moldura de prevenção geral positiva», vindo a ser «definitiva e concretamente estabelecida em função de exigências de prevenção especial, nomeadamente de prevenção especial positiva ou de socialização». «O conceito de prevenção geral (protecção de bens jurídicos alcançada mediante a tutela das expectativas comunitárias na manutenção e no reforço da validade da norma jurídica violada)» – ao traçar («em função do abalo, daquelas expectativas, sentido pela comunidade») os limites, óptimo e mínimo, da chamada «moldura de prevenção» - ater-se-á, em regra, aos limites gerais da pena. 9.2. A moldura penal abstracta do crime de tráfico comum de drogas ilícitas é de 4 a 12 anos de prisão. 9.3. Dir-se-á, quanto ao arguido AA, que o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade – ou seja, a medida de pena que a comunidade entenderia necessária à tutela das suas expectativas na validade e no reforço da norma jurídica afectada pela conduta do arguido – se situaria cerca dos 5,5 anos de prisão (ante o facto de o arguido [por si e por intermédio de dois auxiliares] se haver dedicado, durante quase ano, à revenda – sobretudo em «quartas» - de heroína, que adquiria ao co-arguido BB e a outros fornecedores, a alguns consumidores da sua região. 9.4. Mas «abaixo dessa medida (óptima) da pena de prevenção, outras haveria – até ao “limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas” - que a comunidade ainda entenderia suficientes para proteger as suas expectativas na validade da norma». E, no caso, esse limite mínimo (da moldura de prevenção) poderá – tendo em conta que destinava ao seu consumo parte das drogas de que se abastecia ( 24) - encontrar-se à volta dos 4,5 anos de prisão. 9.5. De qualquer modo, «os limites de pena assim definida (pela necessidade de protecção de bens jurídicos) não poderão ser desrespeitados em nome da realização da finalidade de prevenção especial, que só pode intervir numa posição subordinada à prevenção geral». Assim, estando-se na presença de um cidadão então com quase 47 anos de idade (e, agora, com quase 49), mas sem passado criminal, e que «até aos finais do Verão de 2004, residiu com a mãe em Mendiga, Porto de Mós, onde se encontrava instalado o Café ...., que era explorado por ela, com a ajuda do filho» (25), tais circunstâncias haverão, no quadro da moldura penal de prevenção, de impelir o quantum exacto da pena para meados [5 anos] da moldura de prevenção (26). 10. A MEDIDA DA PENA (arguido BB)
10.1. Quanto ao arguido BB, dir-se-á que o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade – ou seja, a medida de pena que a comunidade entenderá necessária à tutela das suas expectativas na validade e no reforço da norma jurídica afectada pela conduta do arguido – se situará cerca dos 7 anos de prisão (ante o facto de o arguido se haver dedicado, durante cerca de meio ano, à revenda de heroína e cocaína, que adquiria em Lisboa, a revendedores/retalhistas e – em parcelas de um e meio grama - a consumidores da zona de Leiria, Marinha Grande e Porto de Mós). 10.2. Mas «abaixo dessa medida (óptima) da pena de prevenção, outras haverá – até ao “limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas” - que a comunidade ainda entenderá suficientes para proteger as suas expectativas na validade da norma» O «limite mínimo da pena que visa assegurar a finalidade de prevenção geral» coincidirá, pois, em concreto, com «o absolutamente imprescindível para se realizar essa finalidade de prevenção geral sob a forma de defesa da ordem jurídica» (e não, necessariamente, com «o limiar mínimo da moldura penal abstracta»). E, no caso, esse limite mínimo (da moldura de prevenção) poderá encontrar-se – uma vez que lhe foi apreendida parte da droga detida para revenda (20,324 g de cloridrato de cocaína e 116,3 g de heroína) - à volta dos 6 anos de prisão. 10.3. De qualquer modo, «os limites de pena assim definida (pela necessidade de protecção de bens jurídicos) não poderão ser desrespeitados em nome da realização da finalidade de prevenção especial, que só pode intervir numa posição subordinada à prevenção geral». Assim, estando-se na presença de um cidadão estrangeiro com fracos elos de ligação ao país (e que, encontrando-se em Portugal desde 2001 [ (27)], só quando detido em fins de 2004, estaria a tratar do «visto»), mas que já aqui havia sido condenado, por crime idêntico, na pena de dois anos e meio de prisão, tais circunstâncias haverão, no quadro da moldura penal de prevenção, de impelir o quantum exacto da pena – apesar dos seus 27 anos de idade então e dos seus quase 30 anos agora - para o topo [7 anos] da moldura de prevenção (28) . 11. A MEDIDA DA PENA (arguido CC)
11.1. Dir-se-á enfim, quanto ao arguido CC, que o ponto óptimo de realização das necessidades preventivas da comunidade – ou seja, a medida de pena que a comunidade entenderia necessária à tutela das suas expectativas na validade e no reforço da norma jurídica afectada pela conduta do arguido – se situaria cerca dos 7 anos de prisão (ante o facto de o arguido [auxiliado pela namorada] se haver dedicado, durante quase ano, à revenda – em parcelas de um e meio grama - de heroína e cocaína, que adquiria ao co-arguido BB e a outros fornecedores, a numerosos consumidores da sua região e em numerosas ocasiões). 11.2. Mas «abaixo dessa medida (óptima) da pena de prevenção, outras haveria – até ao “limite do necessário para assegurar a protecção dessas expectativas” - que a comunidade ainda entenderia suficientes para proteger as suas expectativas na validade da norma». E, no caso, esse limite mínimo (da moldura de prevenção) poderá – tendo em conta que destinava ao seu consumo parte das drogas de que se abastecia ( 29) - encontrar-se à volta dos 6 anos de prisão. 11.3. De qualquer modo, «os limites de pena assim definida (pela necessidade de protecção de bens jurídicos) não poderão ser desrespeitados em nome da realização da finalidade de prevenção especial, que só pode intervir numa posição subordinada à prevenção geral». Assim, estando-se na presença de um cidadão então com 30/31 anos de idade (e, agora, com 33), mas sem passado criminal, e que «à data da sua detenção, trabalhava há dois meses, como distribuidor por conta própria, dos produtos da empresa “Empresa-A”, na localidade do Juncal» (30), tais circunstâncias (31) haverão, no quadro da moldura penal de prevenção (32), de constranger o quantum exacto da pena ao mínimo [6 anos] da moldura de prevenção. 12. DECISÃO Tudo visto, o Supremo Tribunal de Justiça, reunido em audiência para apreciar os recursos – na parte não apreciada, entretanto, em conferência – dos cidadãos AA, BB e CC, julga-os parcialmente procedentes e, nessa medida, a) Reduz a 7 (sete) anos de prisão a pena correspondente ao crime de tráfico comum de drogas ilícitas do arguido/recorrente BB; b) Reduz a 6 (seis) anos de prisão a pena correspondente ao crime de tráfico comum de drogas ilícitas do arguido/recorrente CC; c) Reduz a 5 (cinco) anos de prisão a pena correspondente ao crime de tráfico comum de drogas ilícitas do arguido/recorrente AA ( 33); e d) Condena os recorrentes nas custas do recurso, com 6 (seis) UC de taxa de justiça e 2 (duas) UC de procuradoria pelo arguido BB; com 5 (cinco) UC de taxa de justiça e 1,5 (uma e meia) UC de procuradoria pelo arguido CC, e com 4 (quatro) UC de taxa de justiça e 1 (uma) UC de procuradoria pelo arguido AA. Lisboa, 25 de Janeiro de 2007 Carmona da Mota Pereira Madeira Simas Santos Santos Carvalho ------------------------------------------------------------------------------------------------------ (1) Preventivamente presos desde 03Dez04. (2) STJ 19/11/01, www.dgsi.pt (3) STJ 07/03/01, CJ I-237. (4) STJ 30/10/96, processo nº 154/96-3. (5) Ac. cit. (6) Moraes Rocha, “Droga - Regime Jurídico”, 1994, pág. 61 (cf., ainda, RL 13/4/00, CJ II, 157; TC 7/6/94, D.R. II, 2/10/94). (7) Proc. 989/96-3 do STJ. (8)BMJ 457º-122 (9) STJ 04Mai05, www.dgsi.pt (10) BMJ 469º-181 (11)STJ 4/5/2005 (12) STJ 8/1/97, processo nº 48516/3ª. (13) Lourenço Martins, “Droga e Direito”, pág. 125. (14) STJ 2/6/2005, www.dgsi.pt (15) BMJ 393º-325 (16) STJ 26/12/97, proc. nº 1.228/3ª. (17) Contra 1 UC de multa, paga imediatamente, por ter praticado o acto no 1.º dia útil seguinte ao último do prazo (fls. 2758). (18) Por deferimento tácito de 17Mar06 (fls. 3193). (19) Na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos (cfr. despacho de 09Nov05, a fls. 2537) (20) Com apoio judiciário (cfr. deferimento tácito de fls. 2998). (21) Quando detido, foram-lhe apreendidos «um saco com 563,1 g de sulfato de cálcio, uma balança de precisão e respectivos pesos, e recortes de plástico». (22) Como o STJ vem afirmando, «a tipificação do referido art. 25.º parece significar o objectivo de permitir ao julgador que, sem prejuízo do natural rigor na concretização da intervenção penal relativamente a crimes desta natureza (considerando a grande relevância dos valores postos em perigo com a sua prática e a frequência desta), encontre a medida justa da punição em casos que, embora porventura de gravidade ainda significativa, ficam aquém da gravidade do ilícito justificativa da tipificação do art. 21.° do mesmo diploma e encontram resposta adequada dentro das molduras penais previstas no art. 25º». «No fundo, é a necessidade de distinguir, afinal, o "verdadeiro tráfico" [grande e médio] do pequeno tráfico (...) que – tantos anos volvidos e acompanhando alguma doutrina – actualmente se vê o STJ claramente assumir» (ibidem). E isso para que não se «metam no mesmo saco» todos os traficantes, distinguindo-se entre os casos «graves» (art. 21°), os muito graves (art. 24.°) e os pouco graves (art. 25.º). É certo que, em tempos, «a jurisprudência quase esvaziou [de conteúdo útil] os art.s 25.º e 26°, remetendo para o art. 21° a generalidade das situações». Mas, «aplicando-se este artigo às situações em que a ilicitude do facto se mostrar consideravelmente diminuída, tendo em conta nomeadamente os meios utilizados, a modalidade ou as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das drogas, a interpretação que parece mais consentânea com o texto (e com a epígrafe do artigo) – e que vem cativando, progressivamente, a jurisprudência – é a de que o legislador quis incluir aqui todos os casos de menor gravidade», ou seja, o «pequeno tráfico» – e, mais precisamente, o (pequeno) «tráfico de rua» - «para que situações efectivas de menor gravidade não sejam tratadas com penas desproporcionadas» nem que «ao invés, se force ou use indevidamente uma atenuante especial». «Já em 5/12/1989, no âmbito da vigência da anterior Lei da Droga», a doutrina fazia notar que «o legislador não podia ter querido equiparar o tráfico grave ao pequeno tráfico», donde que, a somar-se “a globalidade das doses que um pequeno traficante tenha transmitido a terceiros ao longo da sua vida” ou a “atender-se à totalidade do produto que num determinado momento lhe haja sido apreendida, não obstante se saber que se destinava a ser cedida a terceiros em pequenas porções”, estar-se-ia “a esvaziar de conteúdo o art. 24.1 [agora, 25.º], restringindo-se a sua aplicação a casos mal investigados, a apreensões fortuitas, no fundo a acasos da vida”. Daí que “não haja que adicionar todas as substâncias que o "dealer" vendeu (...) ou que considerar a quantidade que ele num determinado momento detinha, devendo, pelo contrário, atentar-se nas quantidades que esse vendedor transmitia individualmente a cada um dos consumidores”, de forma a “não deixar passar um intermediário por passador de rua, mas também não sancionando um e outro de forma idêntica”». (23) Sendo certo que «as nulidades respeitantes ao inquérito» devem ser arguidas – e não consta que tivessem sido – até ao encerramento do debate instrutório ou, não havendo lugar a instrução, até cinco dias após a notificação do despacho que tiver encerrado o inquérito» (art. 120.2 e 3.c do CPP) (24) Se bem que, «sujeito em 07.03.05 [três meses após a detenção] a exame físico, não apresentasse sinais compatíveis com administração endovenosa de drogas». De igual modo, «os exames toxicológicos efectuados não detectaram a presença de drogas de abuso». (25) «Contudo, a partir dos finais do Verão de 2004, data em que passou a viver sozinho, era ele quem permanecia ao balcão do referido estabelecimento comercial sempre que estava aberto; o café tinha pouca clientela, maioritariamente constituída por consumidores de estupefacientes» (26 Tanto mais que não consta, do rol dos factos provados, que seja «bem considerado pelos familiares a nível pessoal e profissional» e que tenha «um bom comportamento no estabelecimento prisional, ter aí concluído o 6º ano de escolaridade». (27) Mais de 2/3 na cadeia, apenas três ou quatro meses a trabalhar e, no mais, a «traficar droga». (28) Tanto mais que não consta, do rol dos factos provados, que seja «bem considerado pelos familiares a nível pessoal e profissional» e que tenha «um bom comportamento no estabelecimento prisional, tendo aí concluído o 6º ano de escolaridade». (29) Se bem que, «sujeito em 07.03.05 [três meses após a detenção] a exame físico, não apresentasse sinais compatíveis com administração endovenosa de drogas». De igual modo, «os exames toxicológicos efectuados não detectaram a presença de drogas de abuso». (30) Apesar de «desde Janeiro de 2004 até essa data, não haver desenvolvido qualquer actividade profissional, sendo as suas despesas suportadas, pelo menos em parte, pelos rendimentos obtidos com a actividade de compra e venda de produtos estupefacientes» (31) A que acrescerão as de o arguido, «à data da sua detenção, viver com ambos os progenitores, tendo o pai falecido no dia 3.02.05, quando já se encontrava detido»; de, «actualmente, a mãe ser o único elemento constituinte do agregado familiar, residindo numa casa de construção antiga, em mediano estado de conservação, constituída por rés-do-chão e primeiro andar e subsistindo dos rendimentos provenientes de parte de um negócio relacionado com o comércio de cortinados, tendo, para além disso, arrendado um quarto dos cinco que compõem a habitação, retirando também daí proventos económicos»; e de o arguido – que «não é hostilizado na comunidade» - «sempre ter tido um bom relacionamento com todos os elementos da sua família, situação que ainda se mantém, continuando a dispor de apoio familiar e disponibilizando-se a família a coadjuvá-lo, designadamente na participação de programa terapêutico especializado, por exemplo no CAT de Leiria». (32) Recorde-se que «o arguido CC é o mais novo de uma fratria de quatro irmãos, tendo crescido no seio da sua família de origem. Durante a frequência do 10º ano, abandonou os estudos para se dedicar a actividade laboral. Iniciou essa actividade como repositor de stocks num hipermercado, em Leiria, abandonou esse trabalho, para ficar mais próximo do seu lar, empregando-se numa empresa de plásticos, como distribuidor. Posteriormente, por auferir maior remuneração, empregou-se numa fábrica de móveis, como ajudante de motorista. Saiu desse emprego, tendo se empregado numa cerâmica, onde desenvolveu actividade de operador de máquinas durante sete anos. Por vontade própria também deixou este trabalho, passando a fazer biscates. Ao fim de algum tempo, colectou-se como trabalhador independente, passando, durante cerca de dois anos, a fazer distribuição de produtos para uma empresa. Posteriormente, retomou essa função de distribuidor, por conta própria, para a empresa “Empresa-A”, na localidade de Juncal, situação que, à data da sua detenção, durava há dois meses». (33) A que acresce a pena de multa de € 480 que, por crime de detenção ilegal de arma, lhe foi aplicada pelas instâncias |