Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FERNANDO BAPTISTA | ||
Descritores: | PRINCÍPIO DISPOSITIVO PRINCÍPIO DO PEDIDO INTERPRETAÇÃO PEDIDO PODERES DO JUIZ PEDIDO IMPLÍCITO DECISÃO SURPRESA | ||
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Data do Acordão: | 09/29/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | I. Como decorrência do princípio do dispositivo, continua a vingar na nossa lei adjectiva o princípio do pedido, de acordo com o qual o tribunal não pode resolver qualquer conflito de interesses que a acção pressupõe sem que essa resolução lhe seja pedida (art. 3º, n.º 1 do CPC). II. Se é certo que os juízes não devem ser extremamente formalistas na interpretação e aplicação dos princípios em que assenta o processo civil, sob pena de se perder a efectividade da justiça cível, também não devem, sem assento no alegado e peticionado pelo Autor, simplesmente, pôr de lado aquela espécie de mandamento que recai sobre os juízes: «Não dês mais do que aquilo que te é pedido». III. Quando perante o alegado na petição inicial há dúvidas quanto aos concretos e efectivos pedidos pretendidos pelo Autor ou ao real conteúdo da pretensão, e, recorrendo às regras interpretativas da declaração judicial, se extrai implícita uma outra pretensão petitória não expressamente ali formulada, pode o tribunal levá-la em conta, extraindo os efeitos jurídicos correspondentes, sem dessa forma violar o princípio do pedido. IV. Porém, como o princípio do pedido se encontra a par do princípio do contraditório, tem este último que ser sempre respeitado, pois uma sentença desrespeitadora do princípio do pedido, traduzir-se-ia numa decisão-surpresa. V. Pedido implícito é aquele que, com base na natureza das coisas, está presente na acção, apesar de não ter sido formulado expressis verbis, ou seja, o pedido apresentado na petição pressupõe outro pedido que, por qualquer razão, o autor não exprimiu de forma nítida ou óbvia. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça, Segunda Secção Cível
I – RELATÓRIO AA instaurou contra HIG Services – Higiene e Serviços, Lda., acção de processo comum, pedindo, a condenação da R. a pagar-lhe a quantia de 62.630,88 €, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% vencidos e vincendos sobre a quantia de 48.771,97 € até efectivo e integral pagamento. Citada, a R. invocou a incompetência material deste Tribunal e impugnou os factos dizendo no essencial que o contrato existente entre as partes foi de trabalho no âmbito do qual o A. sempre recebeu a respectiva retribuição que cessou por razões que este não desconhece, como, de resto, reconhece, terminando, por isso, a pedir a condenação do mesmo como litigante de má-fé. Em Resposta, o A. reiterou a posição inicial. Depois de respostas a respostas, foi proferido despacho saneador, com dispensa de audiência prévia e, nesse despacho, fixou-se o valor da causa [62.630,88€], julgou-se improcedente a exceção da incompetência material[1], foi identificado o objecto do processo [Pedido de condenação da R. a pagar ao A. os valores devidos – as retribuições mensais acordadas e não pagas – pela prestação de serviços e, outrossim, a indemnização pela cessação do respetivo contrato, assim como juros], fixaram-se, também os factos assentes[2] e foram enunciados os temas de prova [- Prestação de serviços do A. à R. - Contrapartida da prestação de serviços. - Pagamento da contrapartida. - Cessação do respectivo contrato]. Realizou-se a audiência de discussão e julgamento e foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “julgo a acção parcialmente procedente, condenando a R. a pagar ao A. a quantia de 27.872,94€ (vinte e sete mil oitocentos e setenta e dois euros e noventa e quatro cêntimos) acrescida de juros moratórios, à taxa legal de 4% ao ano, desde a citação até efetivo pagamento, absolvendo-a do restante peticionado. Inexiste má-fé” - quantia global que foi assim obtida: €24.000,00 de indemnização pela cessação da gerência (sem…justa causa) + €3.872,94 de remunerações em falta ao Autor pelos serviços prestados à ré nos meses de Julho a Setembro de 2012. A Ré HIG Services – Higiene e Serviços, Lda, interpôs recurso de apelação, tendo a Relação do Porto, em acórdão, decidido: “…acorda-se na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente o presente recurso e, em conformidade, revogando a sentença proferida em primeira instância, condena-se a ré no pagamento ao autor da quantia de 5.243,69€ (cinco mil, duzentos e quarenta e três euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida de juros vencidos, à taxa legal, desde o vencimento remuneratório nos meses de julho, agosto e setembro de 2012 (936,47€ x 3) e desde setembro de 2012 sobre o valor indemnizatório (2.434,38€) e dos juros vincendos, à mesma taxa, desde a propositura da ação, do mais peticionado absolvendo a ré.”. ** Por sua vez inconformado, vem agora o Autor AA interpor recurso de revista, apresentando alegações que remata com as seguintes CONCLUSÕES 1) Vem o presente recurso interposto do Acórdão prolatado pela Veneranda Relação do Poro e que revogou parcialmente a Sentença de Primeira instância, decidindo – em suma e com absoluta relevância objetiva para este recurso, que “A questão da indemnização arbitrada ao autor pela cessação da relação contratual estabelecida com a sociedade – com a sociedade e não com a sócia desta, como parece confundir-se na ação -, relação contratual essa que se traduzia numa prestação de serviço remunerada, coincidente com a qualidade de sócio e gerente da ré, decorre, pelo menos no montante fixado e no fundamento para o mesmo, de o tribunal recorrido haver alterado a remuneração contratada (e reconhecida/invocada pelo demandante), atribuindo outra e superior, com base na equidade. Efetivamente, essa nova retribuição vem a refletir-se no cálculo da indemnização decorrente da rutura do contrato bem como no valor devido entre julho e setembro de 2012, período que se considerou corresponder, ainda, à prestação de serviço feita pelo recorrido.” e que “Relativamente à referida alteração da remuneração, há que reconhecer que o tribunal, ao fazê-la, tratou, apreciou uma questão cuja apreciação não lhe foi solicitada. Com efeito, o tribunal deferiu uma pretensão, um pedido, que não foi formulado pelo autor e sobre o qual a ré não se pronunciou. Assim, mais que um excesso de pronúncia, o tribunal conheceu um pedido não formulado o que, violando o disposto no artigo 3.º, n.º 1 do CPC, constitui nessa parte, uma nulidade da sentença. Em conformidade, e como as partes já se pronunciaram, em sede de recurso, cumpre apenas anular a parte da sentença em que o tribunal recorrido decidiu alterar a remuneração do autor” para concluir – conforme sumariado – que sob pena de nulidade, o tribunal não pode conhecer de uma pretensão, de um pedido, que não foi formulado pela parte. 2) O que ditou que, consequentemente: O Recurso interposto pela R. tenha sido parcialmente procedente, em conformidade, parcialmente revogada a Douta sentença proferida em primeira instância, e desta sorte, condenando-se a ré, apenas, no pagamento ao autor da quantia de 5.243,69€ (cinco mil, duzentos e quarenta e três euros e sessenta e nove cêntimos), acrescida de juros vencidos, à taxa legal, desde o vencimento remuneratório nos meses de julho, agosto e setembro de 2012 (936,47€ x 3) e desde setembro de 2012 sobre o valor indemnizatório (2.434,38€) e dos juros vincendos, à mesma taxa, desde a propositura da ação, do mais peticionado absolvendo a ré. Custas do recurso a cargo de recorrente e recorrido, atendendo aos respetivos decaimentos.” 3) Salvo o devido respeito à franco o desacerto da decisão de mérito e o inconformismo do ora Recorrente sustenta-se no seguinte: por um lado numa erra interpretação e aplicação de normas de direito adjetivo ao causo dos autos, bem como de normas de direito substantivo, como se verá. 4) Por um lado, por entender o aqui recorrente que o facto de o Tribunal de 1ª Instância ter reconhecido que o Autor recebia 2.000€ mensais, tendo em conta as prestações pecuniárias e as vantagens que o Autor usufruía, não pode ser interpretado como a apreciação de uma questão que não lhe foi solicitada. 5) Não podendo a Veneranda Relação do Porto, com todo o respeito, considerar que o Tribunal de 1ª instância decidiu sobre um pedido não formulado pelo Autor. 6) Com efeito, o Venerando Tribunal da Relação considerou que houve uma violação do Princípio do Pedido (art.3º, n. º1 e 609º, n.º 1, do CPC) pelo Tribunal de 1ª instância, mas com carístia de razão. 7) O Pedido do Autor na Petição Inicial perfazia um total de 62.630,88€. Este valor foi calculado da seguinte forma: -A diferença entre a quantia pecuniária de 936,47€ (valor auferido pelo autor a título de remuneração) e a única quantia que não revertia para a sócia da Ré (250€) que equivale a 686,47€ mensais relativos ao período compreendido entre o mês de março de 2007 e o mês de junho de 2012; -Somando o montante remuneratório de 936,47€ mensais referentes aos meses de junho a setembro de 2012 (meses estes em que o autor prestou serviços e não auferiu qualquer remuneração pecuniária; -A este valor acresce ainda o valor da indemnização devida pela sócia da Ré ao Autor no montantede 2.434,38€, tendoemconta o fim do contrato de prestação e serviços; -Por fim, somaram-se ainda juros de mora. 8) O Digmo. Tribunal de 1ª instância considerou o pedido parcialmente procedente, decidindo que o valor da indemnização total seria de 27.872,94€, acrescida de juros, mas estribou o seu entendimento em fundamentos jurídicos distintos dos do A. (aos quais, de resto, por Lei, não estava vinculado) de maneira distinta. 9) E assim, considerando a causa de pedir, este Digmo. Tribunal entendeu que a remuneração do autor não se bastava nos 936,47€ mensais, mas que incluía também as vantagens de que o autor usufruía (viatura, seguro de saúde e casa). 10) Assim sendo, calculou o valor da indemnização total da seguinte forma: -1.872,94€, referentes á remuneração pecuniária relativa aos meses de julho e agosto de 2012, em que o autor desempenhou as funções, usufruído das vantagens mencionadas, mas não tendo recebido os habituais 936,47€. - 2.000€, referentes ao mês de setembro em que o Autor desempenhou funções, sem usufruir das vantagens mencionadas e sem auferir a sua remuneração pecuniária. - 24.000€ (12X2.000€), relativos ao período (de 12 meses) subsequente à cessação de facto das suas funções na Ré, sendo o montante de 2.000€ aquele que o Tribunal considerou, e bem, como sendo o valor real da remuneração do Autor tendo em conta a soma da remuneração pecuniária com as vantagens usufruídas pelo mesmo. 11) Vantagens não pecuniárias essas para cujo apuramento em muito contribuiu o afã probatório da própria R. 12) A R. e Apelante pugnou pela violação do disposto no art. 3º, n. º1, do CPC, pois o Autor nunca pediu para lhe ser aumentada a retribuição, e o Venerando Tribunal da Relação do Porto acolheu – sem acerto, com o devido respeito – tal entendimento. 13) E em desacerto, porque, com efeito, não houve uma alteração da remuneração do autor empreendida pelo Digmo. Tribunal de Primeira Instância, houve sim uma atribuição de um valor pecuniário às vantagens de que o autor já usufruía na pendência do contrato de prestação de serviços (viatura, seguro de saúde e casa), vantagens estas que devem ser consideradas como parte da sua retribuição. 14) Coloca-se então a questão de saber se o Tribunal poderia decidir sobre as vantagens serem parte da remuneração, tendo em conta que esse não foi o pedido expresso do Autor. 15) Trazemos, assim, à colação o Princípio do Pedido, consagrado no art.3º, nº 1, do CPC. 16) De acordo com o qual e apesar de não ter havido um pedido expresso por parte do autor, quer a doutrina, quer a jurisprudência, serenamente, consideram tal não ter de existir, podendo apreciar-se pedidos implícitos, ainda que se tenha de desenvolver um esforço interpretativo. 17) Assim, pode o Tribunal atribuir um valor às vantagens, considerando-se que tal foi um pedido implícito (e ao contrário do que se pretende fazer crer in casu debatido e alegado pelo A. nos autos – v.g. FL.s – vide artigo 30.º do Requerimento apresentado sob a referência eletrónica REFª: ...45. 18) O Tribunal de 1ª instância alicerçou-se, é certo, em fundamentação de direito distinta da oferecida pelo Autor, mas tal não pressupõe uma violação do Princípio do Pedido, tendo em conta que o pedido é o efeito prático-jurídico que o autor pretende retirar da ação, nos termos do disposto no artigo 581.º, n.º 3, do CPC, preceito esse que resultou, pois, violado. 19) O princípio do pedido encontra-se consagrado no art.3.º, n. º1 do CPC. Esta norma refere que o Tribunal apenas pode decidir sobre um conflito de interesses caso a resolução lhe seja solicitada por uma das partes e a contraparte seja devidamente chamada a deduzir oposição e art.609.º, n. º1 do CPC vem concretizar de forma mais explícita qual o papel do Tribunal quanto aos limites da condenação, como poderemos ver nos n.ºs 46 e seguintes. 20) Na doutrina mais insigne e como salientam o Exmo. Senhor Conselheiro ABRANTES GERALDES et. al. “o apego necessário ao pedido formal não impede que se pondere, em certos casos, a apreciação de pedidos implícitos” e que “também não deve obstar a que se desenvolva um esforço interpretativo no sentido de identificar o real conteúdo da pretensão em casos que possam suscitar dúvidas que não tenham sido oportunamente corrigidas”[3] (negrito e sublinhado da Responsabilidade do Recorrente), podendo ler-se, no mesmo sentido, a posição de ABÍLIO NETO que refere que “é certo não ser permitido ao tribunal alterar ou substituir a causa de pedir, isto é, o facto jurídico que o Autor invocara como base da sua pretensão, de modo a decidir a questão submetida ao veredito judicial, com fundamento numa causa que o autor não pôs à sua consideração e decisão. Mas pode bem acontecer que a causa de pedir invocada expressamente pelo autor não exclua uma outra que, por interpretação da petição, possa julgar-se compreendida naquela. Em casos deste género, a indicação feita, pelo autor, da causa de pedir tem de ser entendida de modo a corresponder ao sentido que ele quis atribuir a essa indicação, desde que, tal sentido possa valer nos termos gerais da interpretação das declarações de vontade”[4]. 21) E na Jurisprudência dos Tribunais Pátrios pode ler-se no Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 03-12-2013: “No percurso expositivo de uma petição inicial (contendo a identificação das partes e da ação a narração e a conclusão) podem existir pedidos expressamente formulados como tal na conclusão do articulado e pedidos deslocalizados dessa conclusão final, formulados ao longo do articulado na exposição dos factos e das razões de direito, mas com suficiente individualização em termos de propiciarem a sua deteção e compreensão com essa natureza: a de pedidos (…)” 22) Como tal, salvo devido respeito, é patente o desacerto ínsito na decisão da Veneranda Relação do Porto. 23) Alternativamente, Ainda que se considerasse, o que aqui por mera cautela de patrocínio se equaciona, no sentido de ter havido, efetivamente uma alteração da remuneração, como alega a Ré e confirma o Tribunal da Relação, temos de Recorrer à Teoria do Pedido referida anteriormente, e mesmo nessas circunstâncias, tendo em conta as alegações do Autor, ora Recorrente, dever-se-ia considerar a alteração da remuneração como um pedido, ainda que implícito. 24) O art.609º, n.º 1, do CPC, norma prevê que a sentença não pode condenar em quantidade superior ou objeto diverso do que o que foi pedido pelo Autor, não foi violada, pois apesar da fundamentação jurídica de direito adotada pelo Tribunal de 1ª instância ter sido diferente da do Autor, aquele não condenou a Ré numa quantidade superior (27.872,94€ é inferior em relação a 62.630.00€), nem em objeto diverso (condenou em quantia pecuniária, tal como pedido pelo autor). 25) E ainda sob a luz do direito substantivo, a Decisão que se impugna, e sempre com a ressalva pelo máximo respeito devido, estabelece notória confusão entre coisas: pedido; causa de pedir e fundamentação de direito. 26) A Decisão em mérito, salvo o devido respeito, faz uma interpretação do artigo 609.º do CPC que não se coaduna com os comandos da boa hermenêutica jurídica, posto que o interprete deve procurar a vontade psicológica da norma, pois não há textos com sentido objetivo, portanto a únicacoisaque o interprete deve procurar é um sentido razoável/racionalda norma e, nessa medida, viola também, ademais o artigo 9.º do CC. 27) Donde, também neste segmento a Recorrente, ora Recorrida, e a Veneranda Relação do Porto não procederam à exata interpretação da norma que consideram ter sido violada quando, quando em boa verdade, no rigor da hermenêutica jurídica, a mesma não foi. III. NORMAS JURIDICAS MAL INTERPRETADAS E APLICADAS PELA VENERANDA RELAÇÃO DO PORTO (NESSA MEDIDA RESULTANDO VIOLADAS NOS AUTOS) - artigos 413.º e 581.º, n.º 3, do CPC, ambos do CPC. - artigo 9.º do CC. TERMOS EM QUE DEVE SER JULGADO PROCEDENTE O PRESENTE RECURSO E A DECISÃO RECORRIDA REVOGADA E SUBSTITUIDA POR OUTRA QUE MANTENHA A DECISÃO DO DIGMO. TRIBUNAL DE 1ª INSTÂNCIA, NOS TERMOS DE UMA CORRETA INTERPRETAÇÃO DOS ARTIGOS 3º, N. º 1 E 609.º, N. º1, DO CPC. ASSIM SE FAZENDO SERENA, INTEIRA, SÃ, COSTUMADA, DOUTA E PERENE JUSTIÇA! Não forma apresentadas contra-alegações. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. ** II – DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO Nada obsta à apreciação do mérito da revista. Com efeito, a situação tributária mostra-se regularizada, o requerimento de interposição do recurso mostra-se tempestivo (artigos 638º e 139º do CPC) e foi apresentado por quem tem legitimidade para o efeito (art.º 631º do CPC) e se encontra devidamente patrocinado (art.º 40º do CPC). Para além de que tal requerimento está devidamente instruído com alegação e conclusões (art.º 639º do CPC). ** Considerando que o objecto do recurso (o “thema decidendum”) é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, atento o estatuído nas disposições conjugadas dos artigos 663º nº 2, 608º nº 2, 635º nº 4 e 639º nºs 1 e 2, todos do Código de Processo Civil (CPC), a questão a decidir é apenas uma:
* III – FUNDAMENTAÇÃO III. 1. FACTOS PROVADOS É a seguinte a matéria de facto provada (na 1ª instância, sem impugnação em recurso): 1 - A R. é uma sociedade comercial que gira no tráfego jurídico negocial sob a firma HIG SERVICES – HIGIENE DE SERVIÇOS, LDA., tratando-se de uma sociedade comercial, por quotas, que se dedica a Consultoria para negócios, atividades de auxílio ao desenvolvimento, marketing, design, organização e administração interna de empresas, comércio a retalho e por grosso de vestuário de cozinha, fardas e utensílios de cozinha, atividades de projeto em maquinaria ligeira e pesada de higiene e limpeza, importação e exportação e, ainda, formação. 2 - A sociedade vincula-se quer com a assinatura de ambos os sócios, quer apenas com a da sócia BB. 3 - A sobredita sociedade comercial tem o capital social de €5.000,00 (Cinco Mil Euros), distribuído por duas quotas, a saber: - 1 quota com o valor nominal de €4.750,00 (quatro mil, setecentos e cinquenta euros), subscrita pela ex-companheira do A., BB; - 1 quota no valor nominal de €250,00 (duzentos e cinquenta euros) subscrita pelo A. 4 - Tal divisão do capital social foi efetuada desta forma e por decisão da outra sócia da R., com o que o ora A. concordou, desde o momento da constituição da sociedade R., o que ocorreu em 14.03.2007, junto da Conservatória do Registo Comercial .... 5 - O autor contribuiu com o seu Know-how e trabalho para o sucesso da ré. 6 - O Requerente viveu em união de facto com BB entre o ano de 2006 e 11 de Setembro de 2012, tendo durante esse período partilhado com a mesma o leito, mesa e habitação em casa propriedade da segunda, cujo empréstimo para aquisição, e outras despesas como condomínio, água, luz e empregada eram suportadas por esta. 7 - Não obstante ter sido o esforço comum de ambos que determinou um incremento patrimonial para o casal foi sempre aquela sócia da ré a administrar em exclusivo esses mesmos bens. 8 - Em Setembro de 2012 a outra sócia da ré pôs termo à referida união de facto. 9 - O autor e a referida sócia da ré constituíram aquela sociedade comercial por quotas a fim de gerarem rendimentos para as despesas do seu dia a dia. 10 - Na sobredita sociedade comercial, desde o início da atividade até à presente data, aquela outra sócia da ré exerceu unicamente funções de gerência, quer de facto, quer de direito. 11 - Já o autor nunca exerceu funções de gerência atenta a relação de confiança pessoal existente entre si e a consócia. 12 - Desde o início da sua atividade até setembro de 2012, o autor trabalhou na sociedade com isenção de horário de trabalho, com total disponibilidade inclusive ao fim de semana, ministrando formação, por conta da empresa, contribuindo para os resultados positivos que a sociedade veio a registar e, em consequência, para o próprio incremento patrimonial do acervo societário. 13 - O autor é autor de um livro, com know – how e uma rede de contactos que passou para a ré, quer nas escolas de hotelaria em que dava aulas e formação quer no programa de cozinha que fez no Porto ... e na ..., na .... 14 - Depois de cessar as suas funções na ré, o autor manteve a realização do programa de cozinha ... e a ré e a sua sócia deixaram de ter participação no mesmo. 15 - O autor desempenhava todas as tarefas que fosse necessário desempenhar na sociedade, inclusive de contacto e logística com fornecedores e clientes, feiras, formação, entre outros, apenas estando afastado da contabilidade, cujo acesso sempre lhe foi vedado. 16 - Não deixa de ser também verdade que essencialmente o assunto em que o autor é perito e que foi o seu grande aporte para a ré é toda a panóplia de situações que se relacionam com a sua formação e experiência como Chefe de Cozinha. 17 - Os montantes que o autor recebia a título pessoal, nessas formações que ministrava, depositava-os (ou ordenava a transferência àquelas entidades) na conta conjunta com o n.º ...46, domiciliada no Banco 1..., e cotitulada por si e pela id. BB. 18 - Bem como o mesmo aquele fazia com os valores que recebia a título de reembolso em sede de IRS. 19 - A outra sócia da ré naquele que era o exercício dos seus poderes de administração, determinou, unilateralmente, que ao autor fosse atribuída uma quantia, pelos serviços prestados à sociedade, que a ré designou de retribuição a título de remuneração de sócio gerente, com carácter mensal e regular até Junho de 2012, no montante de 936,47€. 20 - Para si própria decidiu a outra sócia da ré atribuir uma quantia de 5.000,00€. 21 - Do mesmo passo, o autor tinha direito a utilizar viatura da ré e a seguro de saúde. 22 - O montante percebido pelo autor era por este utilizado para pagar, regular e mensalmente, enquanto este o recebeu, algumas despesas de alimentação ligadas à vida em comum que o autor e a outra sócia da ré tinham estabelecido. 23 - Da sua remuneração, o autor destinava a quantia de 250,00€ (duzentos e cinquenta euros), ao pagamento da pensão, a título de alimentos, devida ao seu único filho menor, fruto de um anterior casamento do mesmo. 24 - Nos meses de julho, agosto e setembro de 2012 o autor continuou a prestar serviços à ré. 25 - Quando terminou com a vida em comum com o autor, a supra identificada BB, do mesmo passo, de forma unilateral pôs igualmente termo aos serviços prestados por aquele à ré, arredando-o por completo da vida societária, impedindo-o, inclusivamente, de aceder às instalações onde a sociedade labora, e não lhe facultando qualquer informação sobre as contas e escrituração daquela sociedade. 26 - A partir de então, o autor deixou de viver em casa da consócia, não mais recebeu qualquer quantia da ré, e, durante o mês de setembro de 2012, deixou de ter acesso ao veículo facultado pela mesma, a conta supra referida em que recebia a remuneração que esta lhe pagava passou a não ter saldo positivo, o mesmo sucedendo com a conta da ré a que até então tinha acesso e, em fevereiro de 2013, ficou sem o seguro de saúde. 27 - Com a cessação da sua atividade na ré, o autor ficou sem qualquer rendimento para prover à sua subsistência, com exceção de 200,00€ de serviços que, como até então, continuou a prestar à ... a título individual, o que perdurou durante um período não concretamente determinado. Factos não provados Todos os que se mostrem em contradição com os que acima se deram como provados, designadamente e ainda, que: - A separação entre o autor e a id. BB tenha sido em Setembro de 2013. - Tenha sido no dia 11/09/2012 que o autor cessou a sua atividade para a ré. - Das quantias depositadas na referida conta fossem pagos despesas e empréstimos exclusivos da outra sócia da ré. - A ré deva ao A. as seguintes quantias: 1 - Março de 2007 (€ 31,21 (diários) * 17 dias = € 530, 57 - € 250,00) = € 280,57 2 - Abril de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 3 - Maio de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 4 - Junho de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 5 – Julho de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 6 - Agosto de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 7 - Setembro de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 8 – Outubro de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 9 – Novembro de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 10 – Dezembro de 2007 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 11 – Janeiro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 12 – Fevereiro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 13 – Março de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 14 – Abril de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 15 – Maio de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 16 – Junho de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 17 – Julho de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 18 – Agosto de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 19 – Setembro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 20 – Outubro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 21 – Novembro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 22 – Dezembro de 2008 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 23 – Janeiro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 24 - Fevereiro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 25 – Março de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 26 – Abril de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 27 – Maio de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 28 – Junho de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 29 – Julho de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 30 – Agosto de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 31 – Setembro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 32 – Outubro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 33 – Novembro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 34 – Dezembro de 2009 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 35 – Janeiro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 36 - Fevereiro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 37 – Março de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 38 – Abril de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 39 – Maio de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 40 – Junho de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 41 – Julho de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 42 – Agosto de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 43 – Setembro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 44 – Outubro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 45 – Novembro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 46 – Dezembro de 2010 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 47 - Janeiro de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 48 - Fevereiro de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 49 – Março de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 50 – Abril de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 51 – Maio de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 52 – Junho de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 53 – Julho de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 54 – Agosto de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 55 – Setembro de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 56 – Outubro de 2011 = (936,47 -€250,00) = € 686,47 57 – Novembro de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 58 – Dezembro de 2011 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 59 - Janeiro de 2012 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 60 - Fevereiro de 2012 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 61 – Março de 2012 = (936,47 -€250,00) = € 686,47 62 – Abril de 2012 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 63 – Maio de 2012 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 64 – Junho de 2012 = (936,47 - € 250,00) = € 686,47 - Da sua remuneração, o autor não pudesse ter dispor das quantias discriminadas no ponto antecedente. - O autor tenha esbofeteado o filho da companheira BB. - Este facto tenha sido a causa da separação e da destituição das suas funções na ré. ** III. 2. DO MÉRITO DO RECURSO Analisemos, então, a questão suscitada na revista – como dito, aferir se a sentença violou o princípio do pedido, como foi entendido pelo acórdão recorrido. Em causa está a consideração na sentença de alegadas vantagens auferidas pelo Autor na Ré (como seja, a disponibilidade de viatura, o seguro de saúde e casa), às quais atribuiu, ex officio, um valor pecuniário com base no qual fixou a indemnização devida ao Autor pela cessação da relação contratual que tinha com a sociedade ré (melhor dito, como contrapartida da exclusão de sócio na dita sociedade). Considera o recorrente que, “mesmo que o Autor não tenha expressamente pedido para serem consideradas as vantagens tal não obsta a que o tribunal possa atribuir às mesmas um valor”; e que, apesar do pedido formulado pelo autor a título de indemnização pela cessação das funções exercidas na ré, o valor pecuniário dessas vantagens deve ser atendido na sentença. Vejamos. * Nos autos, tal como vem formulada a petição inicial, são formuladas pelo Autor duas pretensões, perfeitamente demarcadas ou autónomas: ressarcimento de remunerações não pagas, relativas aos meses de Julho a Setembro de 2012, pelos serviços prestados pelo A. à Ré, tendo por referência a remuneração mensal (acordada) de €936,47; ressarcimento da indemnização devida pela cessação do acordo celebrado entre A. e sociedade Ré (uma sociedade, bem diferente da pessoa da ré), tendo igualmente por referência aquela remuneração mensal (acordada) – ut arts. 31º a 39 da pi. Considerou, porém, a sentença, por seu alvedrio ou motu proprio, que, no que tange à indemnização pela cessação da relação contratual estabelecida entre A. e Ré sociedade, apesar de ter sido acordada/aceite pelas partes contratantes (A. e Ré sociedade) que a remuneração mensal pelas funções prestadas pelo Autor era de €936,47, tal remuneração, “de acordo com juízos de equidade” não era compatível com essas mesmas funções, dadas as regalias auferidas pelo Autor na sociedade. Nessa senda, arbitrou/ficcionou a sentença, como base para a indemnização a arbitrar, uma retribuição mensal do autor de €2.000,00 (€24.000,00 anuais), condenando a Ré em conformidade. Entendeu a Relação que a sentença não podia ter alterado a remuneração contratada (e conhecida/invocada pelo demandante), atribuindo outra e superior, com base na equidade, nova retribuição essa que se veio a reflectir no cálculo da indemnização decorrente da ruptura do contrato bem como no valor devido entre Julho e Setembro de 2012, período em que o Autor continuou a prestar serviço para a Ré. ** Atentemos no vertido na petição inicial. Lida a petição inicial, retira-se, com utilidade para questão ora sob apreciação, que nela o Autor alegou, de forma clara, em suma, que: - Viveu em união de facto com a sócia da sociedade ré – BB - entre o ano de 2006 e o final de 2013 – setembro - tendo durante esse período partilhado com a mesma, o leito, mesa e habitação, e, não obstante ter sido o esforço comum de ambos que determinou um incremento patrimonial para o casal, foi sempre aquela sócia a administrar em exclusivo os bens. - A constituição da sociedade ré ocorreu durante a pendência da união de facto, mas, por razões que não consegue compreender, no final do ano de 2013 a sócia da ré pôs termo à união de facto. - O autor e a referida sócia constituíram a sociedade a fim de fazerem face às despesas do seu dia-a-dia, em 14.03.2007 e, desde o início da atividade até à data, aquela sócia exerceu funções de gerência, quer de facto, quer de direito, já que o autor apenas exerceu funções de gerência, de direito, até pelo facto de por ter sido impedido pela sócia de exercer as funções para que estava nomeado, limitando-se a assinar os documentos com que a mesma o confrontava, o que fazia, de boa-fé e com base na confiança que preside, ou que deve presidir, à relação de um casal. - Desde o início da sua atividade até à data em que cessaram a coabitação, o autor trabalhou na sociedade, com isenção de horário de trabalho, ministrando formação, por conta da empresa, contribuindo para os resultados positivos que a sociedade veio a registar. - A sócia da ré, naquele que era o exercício dos seus poderes de administração, unilateralmente, determinou que ao autor fosse atribuída uma retribuição, pelos serviços prestados à sociedade, que a ré designou de retribuição a título de remuneração de sócio gerente, com carácter mensal e regular até junho de 2012, no montante de 936,47€. Só que o montante percebido pelo autor era por este utilizado para pagar, regular e mensalmente, várias despesas correntes da vida familiar e ligadas à vida em comum com a outra sócia e daí que “a única quantia que não revertia também para proveito da outra sócia era o montante de 250,00€”. - Uma vez que a sócia da ré “fazia uma completa miscigenação patrimonial entre o acervo societário e a sua vida pessoal”, na prática, desde 14.03.2007 e junho de 2012 o autor apenas recebeu da ré, efetivamente, “a quantia de 250,00€, não obstante ter sido estipulada uma retribuição mensal de 936,47€”. Assim, o autor ficou com um crédito no montante de 686,47€ mensais, desde o período que vai desde março de 2007 a junho de 2012 e de 936,47€, no período que se computa entre julho a setembro de 2012, conforme deixa discriminado, num “total global de 46.337,59€”, a que acrescem juros num total de 13.415,79€. - A sócia da ré, sem que o autor compreendesse sequer a razão, de forma abrupta pôs cobro ao projeto de vida em comum que tinha gizado com o autor e, do mesmo passo e também de forma abrupta, a ré pôs termo de forma unilateral, igualmente, ao contrato de prestação de serviços, celebrado entre o autor e a ré e, nesta conformidade é igualmente devida ao autor, pela ré, uma indemnização a qual ascende ao montante de 2.877,50€. - Tendo o autor ficado sem qualquer forma de prover à sua subsistência - já que o único montante recebido pelo entre A. março de 2007 e setembro de 2012 era o montante transferido pela ré, da qual só usufruía 250,00€ - atenta a cessação unilateral, sem qualquer comunicação, nem ter sido acautelado um período de razoabilidade para que tal comunicação fosse efetuada, tendo em conta que o contrato teve uma duração de 5 anos e 5 meses, ora se fossem aplicáveis as normas do Código do Trabalho, a indemnização seria a correspondente a 78 dias de trabalho, o que corresponde a uma indemnização de 2.434, 38€, montante que se afigura justo, “mesmo por recurso às regras da equidade para que o Tribunal possa quantificar, com justiça, a indemnização a ser arbitrada”, quantia a que acrescem juros, já vencidos no montante de 443,12 €. - “Permanecendo, pois, ainda em dívida o montante global de 62.630,88€, pela ré ao autor (correspondente às seguintes parcelas: total do diferencial das retribuições = 46.337,59 + juros de mora respetivos no montante de 13.415,79 + Indemnização devida pela ré ao autor no montante de 2.434,38 + respetivos juros de mora no montante de 443,12). - O negócio jurídico celebrado entre o autor e a ré tratou-se de um contrato de prestação de serviços, com retribuição, conforme dispõe o artigo 1154 do Código Civil, inominado e atípico, a que se aplicam as regras do mandato e, nesta conformidade, a parte que revogar o mandato deve indemnizar a outra pelos prejuízos sofridos, devendo ser convocadas as regras “da cessação do contrato de trabalho a termo incerto, por caducidade, como sejam os artigos 140, n.º 3, 345 e 366 do Código do Trabalho”. - Assim não se entendendo, sempre terá a ré “de devolver ao autor aquela quantia a título de enriquecimento sem causa, nos termos do disposto nos artigos 473 e 474 do CC[5]. Foi isto que o Autor alegou e foi com base nesta alegação que formulou, a final, o pedido. ** Ressalta, portanto, com nitidez, da factualidade alegada pelo Autor, que o mesmo veio ao tribunal pedir a condenação da Ré a pagar-lhe (cfr. artº 43º da pi) um montante pecuniário que, embora a final tenha contabilizado no global em € 62.630,88 (sessenta e dois mil, seiscentos e trinta euros e oitenta e oito cêntimos), na peça processual da petição inicial esclarece, de forma expressa e inequívoca, respeitar (e assim é, de facto) a duas “fontes” ou causas perfeitamente demarcadas e juridicamente autónomas, quais sejam: 1. Valores devidos correspondentes ao diferencial não pago de retribuições relativas a prestações de serviço feitas à Ré e respectivos juros de mora (€ 46.337,59 + € 13.415,79 de juros); 2. indemnização devida pela cessação, abrupta e não justificada, por banda da sociedade ré, do contrato de prestação de serviço (no montante de € 2.434,38 + respectivos juros de mora no montante de € 443,12). Ora, a questão suscitada na revista respeita somente à indemnização atribuída por aquela cessação da relação contratual (revogação não justificada) estabelecida entre o Autor e a sociedade Ré (que não com a sua ex-companheira, sócia da Ré, embora, como diz o acórdão, parece que na acção se confundem as duas coisas). Não está em causa saber se há lugar à indemnização – as instâncias nisto não divergem: a indemnização é devida – ; apenas e só se questiona se a sentença podia, ponderando o todo do alegado e peticionado, alterar, como fez, motu proprio, a remuneração mensal contratada (de €936,47 e que o próprio demandante invoca e aceita), para valor (muito) superior à mesma, mesmo que recorrendo (como fez) à equidade. Não podia, salvo melhor opinião. Com efeito, a sentença, olvidou, de todo, a alegada e aceite remuneração contratada de €936,47 mensais para, subitamente, a subir para mais do dobro (€2.000,00 mensais) e, com base nesta nova retribuição fixar um valor indemnizatório ao Autor pela cessação da relação contratual. Indemnização esta que o Autor não só não pediu, como também expressamente alegara e fundamentara ser-lhe apenas devida no montante de €2.434,38 + €443,12 de juros de mora, acrescentando que considerava este peticionado montante indemnizatório como perfeitamente justo, mesmo que recorrendo à equidade. Surpreendentemente, vem agora, na revista, o Recorrente dizer que bem andou a sentença ao atribuir ao Autor, como indemnização, aquele montante mensal de €2.000,00 por um período de 12 meses (para além do mês de setembro de 2012), para tal recorrendo a “critérios de equidade e bom senso, considerando ser o tempo necessário para o Autor retomar atividade com rendimentos equivalentes aos anteriores que auferia na Ré” e tendo em conta “o valor total da retribuição como sendo a soma da remuneração pecuniária com as vantagens usufruídas pelo Autor” na sociedade Ré. O acórdão recorrido assim não concordou, considerando que, ao alterar a remuneração do Autor para…€2.000,00 mensais (esquecendo o que fora acordado e aceite por ambas as partes contratantes), a sentença apreciou uma questão cuja apreciação não lhe foi solicitada, sendo que, dessa forma, também, o tribunal deferiu uma pretensão, um pedido, que não foi formulado pelo autor e sobre o qual a ré não se pronunciou. Como tal, concluiu a Relação que mais que um excesso de pronúncia, o tribunal conheceu um pedido não formulado o que, violando o disposto no artigo 3.º, n.º 1 do CPC, constitui, nessa parte, uma nulidade da sentença. E, nessa conformidade, e porque as partes já se pronunciaram, em sede de recurso, a Relação anulou aquela parte da sentença e decidiu alterar a remuneração do autor, proferindo decisão de mérito em conformidade. ** Bom, defende o Recorrente que não houve violação alguma do princípio do pedido por banda da decisão da 1ª instância. Percute-se, porém: o Recorrente, como ficou dito, não apenas pediu, de forma clara e expressa, lhe fosse arbitrada uma indemnização de € 2.434, 38 (mil novecentos e onze euros), pela cessação do contrato com a Ré, como já na petição inicial alegara – precisamente para justificar tal valor indemnizatório – que foi precisamente pelo facto de o Autor ter prestado à Ré os serviços referidos em 37º da p.i. que (como rematou em 38º da pi) “Consequentemente, tal montante afigura-se justo, mesmo por recurso às regras da equidade para que o Tribunal possa quantificar, com justiça, a indemnização a ser arbitrada ao A.”. Ou seja: aquando da instauração da acção e da formulação do pedido conforme o alegado, entendeu o ora Recorrente que a “indemnização de € 2.434, 38” era justa, “mesmo por recurso às regras da equidade”; agora, porém – porque a sentença lhe atribuiu uma indemnização muito superior à que expressamente peticionara, acavalada em valores mensais de retribuição muito, muito superiores aos alegados (e aceites) pelo Autor/recorrente – , é que o autor se lembra de alegar que, afinal, o que queria era, não a indemnização que peticionara e justificara, mas, sim aquela que a sentença lhe arbitrou! Salvo o devido respeito, não pode ser. Não merece, portanto, censura a decisão da Relação ao considerar que a sentença deferiu uma pretensão que não fora deduzida, dessa forma violando o princípio do pedido. ** DO PRINCÍPIO DO DISPOSITIVO – DO PRINCÍPIO DO PEDIDO E DO PRETENSO PEDIDO IMPLÍCITO Procura a Ré trazer à colação a teoria do pedido implícito. In casu, porém, sem razão. E, desde logo, porque não faz sentido apelar-se a pedido implícito relativamente a um pedido indemnizatório que….foi expressamente deduzido nos autos e neles foi devidamente fundamentado – como visto, o próprio Autor considerou que a indemnização peticionada “era justa”, “mesmo por recurso às regras da equidade” (precisamente a mesma equidade a que se prendeu a 1ª instância para justificar uma alteração da retribuição mensal que estava perfeitamente definida nos autos por acordo das partes). Ou seja, parece evidente que quando se fala em pedido implícito se está a pensar em algo que extravasa do que nestes autos vem plasmado. Efectivamente, perante o alegado na petição inicial, dúvidas não parece haver relativamente aos concretos e efectivos pedidos pretendidos pelo Autor – precisamente os que expressamente formulou – , ou quanto ao “real conteúdo da pretensão” de que, muito justamente, fala ABRANTES GERALDES[6]. E não havendo dúvidas, não há qualquer necessidade de qualquer esforço interpretativo para …as sanar. A causa petendi invocada pelo Autor na petição não permite que nos movamos para campos de todo distintos daqueles que conduziram à decisão recorrida, pois esta sustentou-se, de facto, no provado e no expressamente alegado e que, segundo o Autor, justificou o peticionado. ** Como o princípio do pedido está ligado ao princípio do dispositivo – princípio este que constitui um dos princípios nucleares do processo civil e significa que as partes dispõem do processo e da relação jurídica nele controvertida – , algumas considerações se justificarão sobre este princípio. Não olvidamos que a concepção tradicional, liberal, do princípio do dispositivo, que assenta na consideração que o processo “é uma luta, um duelo entre as partes, que apenas tem de decorrer segundo certas normas”, em que o juiz arbitra a pugna, controlando a observância dessas normas e assinalando e proclamando o resultado – daí a inércia, inactividade ou passividade do juiz, em contraste com a actividade das partes e, outrossim, que a sentença procure e declare a verdade formal (intra processual) e não a verdade material (extra processual)[7] – , está um tanto arredada, ultrapassada, pela mitigação do princípio do dispositivo com o do inquisitório. Com efeito, essa concepção liberal do princípio do dispositivo, dominada pela passividade do juiz, em que às partes é concedido o controlo sobre o processo e sobre os factos relevantes para a resolução do litígio e que minimiza o papel do juiz e dos terceiros para essa resolução, em que a legitimação da decisão está unicamente dependente da observância das regras e dos pressupostos processuais, não tem presente o interesse público que subjaz a todo e qualquer processo, em que a finalidade última é a de dirimir um conflito com vista a alcançar a pacificação social entre os litigantes, em particular, e da sociedade em geral e que essa pacificação só será efectivamente alcançada quando o processo assegure a obtenção da verdade formal, intra processual, mas acautele também a verdade material e a consequente obtenção de decisões materialmente justas. De resto, essa concepção tradicional e liberal da figura do juiz enquanto “boca da lei” ignora que a actividade deste não é, sequer nunca foi, puramente neutra, uma vez que entre a lei e a respectiva aplicação se interpõe necessariamente uma actividade intermediadora do juiz, que é a actividade interpretativa da lei, a qual nunca é neutra, sequer imune a uma determinada ideologia, resultante da inserção do juiz na concreta comunidade histórica em que se insere. Deste modo, há muito que se abandonou a concepção liberal de processo, assente exclusivamente no princípio do dispositivo e se tem paulatinamente avançado para um sistema misto, em que aquele princípio tem vindo sistemática e progressivamente a ser mitigado pelo princípio do inquisitório, de que a Lei n.º 41/2013, de 26/06, é exemplo, ao dar passos decisivos no sentido dessa mitigação, ao libertar as partes e o juiz de espartilhos processuais, os quais acabam por promover a prolação de decisões de forma em detrimento das substantivas e reforçando os poderes do juiz. Agora, as partes repartem com o tribunal o domínio sobre o processo e elas próprias são consideradas uma fonte de informações relevantes para a decisão da causa; - as partes e terceiros estão obrigados a um dever de cooperação com o tribunal; - a legitimação da decisão depende da sua adequação substancial e não apenas da sua correcção formal; - as regras processuais podem ser afastadas quando não se mostrem idóneas para a justa composição do litígio”[8]. * Como ressalta do explanado, como decorrência do princípio do dispositivo, continua a vingar na nossa lei adjetiva o princípio do pedido, de acordo com o qual o tribunal não pode resolver qualquer conflito de interesses que a acção pressupõe sem que essa resolução lhe seja pedida (art. 3º, n.º 1 do CPC), o que quer dizer que o processo só se inicia sob o impulso das partes, mediante o respectivo pedido, e não sob o impulso processual do próprio juiz. Assim, é sobre o Autor ou demandante que continua a caber o ónus de dar início à instância, mediante a apresentação da petição inicial em juízo, na qual terá de delimitar subjectiva (mediante a indicação dos sujeitos) e objectivamente (mediante a identificação do pedido e da causa de pedir que lhe serve de base) a relação jurídica controvertida que submete a tribunal e são esses limites subjectivos e objectivos da relação jurídica controvertida que conjuntamente com a defesa que venha a ser apresentada pelo Réu em que este deduza excepções, que continuam a circunscrever o thema decidendum do tribunal, limitando toda a sua actividade instrutória e decisória. Sendo que tal thema decidendum delineado pelas partes não deve ser entendido no sentido rígido, formal, próprio dos sistemas processuais liberais, uma vez que se reconhece ao juiz uma margem de actuação, o que, aliás, é atestado pela jurisprudência vertida no Assento n.º 4/95, do STJ. de 28/03/1995[9] e bem assim no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência n.º 3/2001, de 23/01/2001[10]. * Se se nos afigura certo o acabado de enunciar, certo é, também, que no sistema processual civil nacional o princípio do dispositivo se encontra a par do princípio do contraditório, continuando ambos a ser princípios nucleares e fundamentais da lei adjectiva. Ora, como visto, ao considerar-se na sentença uma base retributiva que nunca foi referida nos autos, maxime pelo Autor (antes pelo contrário: indicou uma outra retribuição e foi com base nela que entendeu ser-lhe devida a peticionada indemnização, que considerou justa mesmo que recorrendo à equidade), é claro que temos uma decisão surpresa, com violação do contraditório, na medida em que a Ré não teve oportunidade de nos autos se pronunciar sobre aquela hipotética base retributiva, antes sempre agindo nos autos tendo como “pano de fundo” a alegada retribuição de €936,47 que ambas as partes sempre ali aceitaram. Portanto, não temos por legítimo que o tribunal (1ª instância) se tenha desviado do pedido que a parte lhe dirigiu, de forma expressa e devidamente fundamentada, não se podendo extrair do alegado qualquer outra pretensão petitória que não a expressamente ali formulada, mesmo que recorrendo a regras interpretativas da declaração judicial. * Há abundante jurisprudência a decidir tradicionalmente no sentido da impossibilidade de o juiz ultrapassar ex officio os limites do pedido mesmo no âmbito das chamadas obrigações pecuniárias (majorando, por exemplo, o valor pecuniário pedido em função da inflação)[11]. Porém, alguma jurisprudência tem vindo a acentuar a necessidade de ultrapassar a rigidez desse entendimento[12]. A condenação ultra ultra ou extra petita é expressamente admitida, sim, mas no processo laboral (cfr. artº 74º CPC) – sendo um dos reflexos processuais da irrenunciabilidade dos direitos substantivos do trabalhador[13]. Já, porém, no processo civil a sua admissão deve ser vista com alguma parcimónia ou cuidado. No Acórdão da relação de Coimbra de 10/09/2013[14], entendeu-se que “[o] pedido formulado pelo autor na petição inicial (artigo 467º, nº 1, e) do CPC) deve, em regra, ser feito na conclusão. Contudo, tal não obsta a que possa também ser expresso na parte narrativa do articulado, desde que se revele com nitidez a intenção de obter os efeitos jurídicos pretendidos”[15]. Esta posição foi ancorada “desde logo, no entendimento de um articulado processual, designadamente uma petição inicial, como configurando “[…] uma declaração de vontade tendente a obter determinado efeito jurídico, devendo ser interpretada segundo o critério estabelecido nos artigos 236º, nº 1 e 238º nº 1 do Código Civil […]”, acrescentando-se colher este entendimento algum respaldo no artigo 295º do CC, ao determinar a aplicação aos actos jurídicos que não se configurem como negócios jurídicos das disposições do Código Civil referentes a estes, designadamente das atinentes à interpretação e integração previstas nos ditos artigos 236º, nº 1 e 238º, nº 1, “na medida em que a analogia das situações o justifique””[16]. Ora, não se vê como, perante o alegado na petição inicial, um declaratário, com normal diligência, colocado na posição da Ré, possa ter tido outro entendimento que não aquele que o autor expressamente plasmou na petição inicial, relativamente à pretendida indemnização por cessação da relação contratual com a ré: a condenação desta a pagar-lhe o montante de €2.434,38 + juros de mora no montante de €443,12. E, precisamente, por ali ter sido o montante alegado, devidamente fundamentado e aceite pelo Autor como o valor justo e, até, no seu ver, em perfeita sintonia com o princípio da equidade (o tal princípio que a sentença chamou à liça). ** Atento explanada, não vemos, no alegado pelo Autor, qualquer pedido implícito de condenação em indemnização que não aquele expressamente peticionado ao tribunal, a tal título. É certo que os juízes não devem ser extremamente formalistas na interpretação e aplicação dos princípios em que assenta o processo civil, sob pena de se perder a efectividade da justiça cível, que é absolutamente essencial nos tempos que correm. É que um processo que não seja efectivo é um processo amorfo, que nada resolve, que se perde em questiúnculas formais, muitas das vezes dessa forma remetendo para as calendas a resolução do litígio. Mas também não podemos, simplesmente, pôr de lado aquela espécie de mandamento que recai sobre os juízes: «Não dês mais do que aquilo que te é pedido». Aceita-se, perfeitamente, que o juiz, em determinadas situações, cumprindo um dever de prevenção, resultante do princípio consagrado no artº 7º do CPC (princípio da cooperação), possa interferir, respeitado que seja, escrupulosamente, o contraditório, com o pedido, contribuindo para a utilidade do mesmo. Mas aqui há sempre que actuar com o devido cuidado – pois uma sentença desrespeitadora do princípio do pedido, traduzir-se-ia numa decisão-surpresa. A mitigação do princípio do pedido faz sentido, sim, v.g., quando o autor requer, apenas, uma determinada medida drástica e o juiz, perante os factos alegados e provados, entenda que é conveniente e justo o decretamento de uma “medida menos radical e qualitativamente diferente. Por exemplo, decide, em vez do encerramento da fábrica ou da discoteca, a condenação do respectivo proprietário a adoptar medidas que reduzam os níveis de poluição sonora, por exemplo”[17]. Neste “tipo” de situações, não se vêm razões de fundo para que o juiz não intervenha no pedido, dessa forma se mitigando o princípio do pedido e da consequente efectividade da justiça[18]. No entanto, a questão do pedido implícito – e, como dito, deste se socorre o Recorrente para levar de vencida a sua pretensão – está bem distante da situação reportada nos autos. Com efeito, pedido implícito é aquele que, com base na natureza das coisas, está presente na acção, apesar de não ter sido formulado expressis verbis[19]. Ou seja, o pedido apresentado na petição pressupõe outro pedido que, por qualquer razão, o autor não exprimiu de forma nítida ou óbvia. Como exemplo claro de pedido implícito, pode ver-se a situação em que o autor, numa acção de reivindicação, se limita a pedir a condenação na entrega da coisa. E claro que está implícito o pedido de reconhecimento do direito de propriedade do autor (mas, então, a bem dizer, aqui até nem fará sentido falar em violação do princípio do pedido, pois…pedido há, está é implícito). Da mesma forma, se o tribunal se imitou a qualificar de forma diferente o pedido que o autor deduziu, também não há violação do princípio do pedido. Ora, no caso sub judice, não há, como vimos, qualquer pedido implícito no considerado pela sentença, pois os pedidos deduzidos pelo Autor foram os que bem explicitou, ambos bem distintos e fundamentados, assentes em factos e fundamentações jurídicas perfeitamente delineadas e demarcadas. O que a sentença fez foi, sim, ver na petição um pedido que o autor não formulou, distanciando-se, de todo, do que o autor pretendia lhe fosse concedido no que tange à indemnização por cessação não justificada da relação contratual que vingava entre A. e Ré, sem que essa indemnização alguma vez estivesse na mira do Autor, ou seja, que tal indemnização pudesse, por qualquer forma, extrair-se do alegado, mesmo considerando aplicáveis as regras atinentes a interpretação da declaração judicial. Pode até dizer-se que estamos a falar de a sentença, relativamente à pretensão do Autor, lhe ter concedido coisa diferente da que ele peticionara (talvez, por isso, se possa falar mesmo num aliud) ou, perante o alegado, lhe manifestara desejar que fosse concedido; deu-lhe algo diferente e com base em algo diferente, que o autor nem, sequer, subsidiariamente peticionara: foi-se buscar uma base retributiva mensal de €2.000,00 que, no todo do alegado, jamais se pode, sequer, vislumbrar ter estado na cogitação do autor, este que expressamente consignou na petição (ut artº 38º) que o montante que pedia e pediu era o “justo, mesmo por recurso às regras da equidade para que o Tribunal possa quantificar, com justiça, a indemnização a ser arbitrada ao A.”. Em conclusão: 1. Não há qualquer pedido implícito do Autor de condenação no montante indemnizatório arbitrado na sentença; 2. A sentença violou o princípio do pedido; 3. Bem andou, como tal, a Relação ao revogar a sentença da 1ª instância. ** IV. DECISÃO Face ao exposto, acorda-se em julgar improcedente o recurso e, consequentemente, negar a revista, mantendo-se o decidido no Acórdão da Relação. Custas da revista a cargo do Autor/Recorrente. Lisboa, 29 de Setembro de 2022 Fernando Baptista de Oliveira (Juiz Conselheiro Relator) Vieira e Cunha (Juiz Conselheiro 1º adjunto) Ana Paula Lobo (Juíza Conselheira 2º Adjunto) ______ [1] “De acordo com a factualidade alegada na PI, o A. era sócio gerente da R. a quem a sua atividade era prestada o que necessariamente exclui a sua subordinação à autoridade de outrem. Nesta medida, não se enquadrando no âmbito de um contrato de trabalho, a alegada relação jurídica não merece ser apreciada pelo Tribunal do Trabalho, e, como tal, julgo improcedente a alegada exceção da incompetência material deste Tribunal que julgo competente em razão da matéria (arts. 65 do CPC, 126, 130, n.º 1, al. a), n.º 2 e 117, n.º 1, al. a) da lei n.º 62/2013 de 26/08).”. |