Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2ª SECÇÃO | ||
Relator: | TOMÉ GOMES | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO RURAL BENFEITORIAS NECESSÁRIAS BENFEITORIAS ÚTEIS DIREITO À INDEMNIZAÇÃO DIREITO DE RETENÇÃO LEVANTAMENTO DE BENFEITORIAS DENÚNCIA ENRIQUECIMENTO SEM CAUSA DÍVIDA DE VALOR ACTUALIZAÇÃO ATUALIZAÇÃO EMBARGOS DE EXECUTADO RENÚNCIA ACEITAÇÃO TÁCITA PRINCÍPIO DA PRECLUSÃO | ||
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Data do Acordão: | 12/19/2018 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | |||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTAS | ||
Decisão: | CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA | ||
Área Temática: | DIREITO CIVIL – DIREITO DAS OBRIGAÇÕES / GARANTIAS ESPECIAIS DAS OBRIGAÇÕES / DIREITO DE RETENÇÃO / CONTRATOS EM ESPECIAL / LOCAÇÃO / OBRIGAÇÕES DO LOCATÁRIO / RESTITUIÇÃO DA COISA LOCADA – DIREITO DAS COISAS / POSSE / DEFESA DA POSSE. | ||
Doutrina: | - Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil em comentário ao Código Civil Português, Vol. III, Coimbra Editora, 1931, p. 622-623; - Jorge Aragão Seia, Manuel da Costa Calvão e Cristina Aragão Seia, Arrendamento Rural, Almedina 4.ª Edição, p. 114-115; - Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. 1º, Coimbra, 1974, p. 274; - Menezes Cordeiro, In Direitos Reais, Lex, 1979, p. 211 e 516; - Oliveira Ascensão, Direito Civil Reais, 5.ª Edição (reimpressão), Coimbra Editora, 2000, p. 109; - Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. III, Coimbra Editora, 2.ª Edição, 1987, p.43. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO CIVIL (CC): - ARTIGOS 754.º, 756.º, 761.º, 1046.º, N.º 1 E 1273.º, N.ºS 1 E 2. ARRENDAMENTO RURAL, APROVADO PELO DL N.º 385/88, DE 25 DE OUTUBRO: - ARTIGO 14.º, N.º 1. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: - DE 15-01-2002, PROCESSO N.º 01A2834; - DE 23-04-2002, PROCESSO N.º 01A4298; - DE 17-12-2002, PROCESSO N.º 02A3632; - DE 19-05-2011, PROCESSO N.º 892/05.7TBSTC.E1.S1; - DE 13-03-2018, PROCESSO N.º 390/09.0T2ODM.E1, TODOS IN WWW.DGSI.PT. | ||
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Sumário : | I. A qualificação de benfeitorias necessárias ou úteis realizadas por arrendatário em prédio rústico destinado a exploração agro-pecuária deve pautar-se por critérios normativos que enquadrem a coisa benfeitorizada sob um prisma de compreensão dinâmica em torno da sua função económica, como unidade produtiva, e do inerente aproveitamento das suas potencialidades, em detrimento de uma visão meramente estruturalista ou estática com mero enfoque nas exigências de conservação do corpus predial. II. Nessa perspetiva, serão de considerar como benfeitorias necessárias os incrementos indispensáveis à prossecução da função e do normal rendimento económico da coisa benfeitorizada, sem os quais esta sofreria depreciação. III. Num caso, como o dos presentes autos, em que, num prédio destinado a exploração agro-pecuária, foram realizadas pelo arrendatário rural obras de inovação consistentes na construção de raiz de um ovil e sala de ordenha mecânica, na implantação de cercas para parqueamento de gados e em eletrificação, dantes não existentes, tais obras traduzem-se em fatores que, além de valorizarem a coisa benfeitorizada, se revelam indispensáveis ao seu normal desempenho e aproveitamento económico, como unidade produtiva, sem as quais se acentuaria o estado de degradação ou depreciação existente aquando do início do arrendamento, devendo, nessa medida, ser qualificadas como benfeitorias necessárias. IV. No domínio do regime constante do Dec.-Lei n.º 358/88, nos casos de denúncia do arrendamento rural pelo senhorio, assiste ao arrendatário o direito a ser indemnizado: a) - pelas benfeitorias necessárias mesmo que não consentidas pelo senhorio, nos termos do artigo 1273.º, n.º 1, do CC; b) – pelas benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio, quando não possa haver lugar ao seu levantamento sem detrimento da coisa benfeitorizada, segundo as regras do enriquecimento sem causa, nos termos conjugados dos artigos 14.º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 358/88 e 1273.º, n.º 2, do CC. V. A obrigação de indemnização por benfeitorias necessárias reveste a natureza de uma dívida de valor, sendo, por isso, suscetível de atualização, tendo em conta a depreciação do valor originário do seu custo. VI. Ao arrendatário credor de indemnização por benfeitorias é conferido o direito de retenção do locado, nos termos da regra geral do artigo 754.º em conjugação com os artigos 1046.º, n.º 1, e 1273.º do CC, ressalvados os casos de exclusão daquele direito previstos no artigo 756.º do mesmo Código, nomeadamente quando as benfeitorias tenham sido realizadas de má-fé. VII. Quando o arrendatário demandado em execução de despejo não invocar, em sede de oposição por embargos, o direito de retenção por benfeitorias realizadas na coisa exequenda, deve considerar-se que o não uso dessa faculdade equivale a renúncia tácita deste direito, extintiva do mesmo nos termos do artigo 761.º do CC. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na 2.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório 1. AA e BB (A.A.) intentaram, em 04/03/2002, a presente ação declarativa, sob a forma de processo ordinário - então autuada sob o n.º 92/ 2002 e agora correndo termos sob o n.º 214/14.6T8BJA - contra: - CC e cônjuge DD (1.ºs R.R.); - EE e cônjuge FF (2.ºs R.R.); - e GG (3.ª R.). Alegaram, em resumo, que: . Os A.A., por escrito particular datado de 10/04/1987, tomaram de arrendamento a HH, com início em 15/08/1986, os seguintes prédios: a) – O prédio rústico, sito na freguesia de …, no município de …, inscrito na respetiva matriz, sob o artigo n.º 108 da Secção E, com a área de 64,8500 hectares, denominado “II”; b) – O prédio rústico, sito na mesma freguesia e município, inscrito na matriz sob o art. 139 da Secção E, com a área de 41,500 hectares, denominado "JJ”; c) – O prédio rústico, sito na mesma freguesia e município, inscrito na matriz sob o artigo 111 da Secção E, com a área de 58,9750 hectares, denominado “KK”; d) – O prédio rústico, sito na mesma freguesia e município, inscrito na respetiva matriz, sob o artigo 109 da Secção E, com a área de 6,1500 hectares, denominado “LL”; e) – Os prédios urbanos inscritos na matriz da mesma freguesia sob os artigos 861.º, 863.º, 939.º e 1204.º, . O referido contrato foi celebrado por um período de 6 anos, renovável por períodos de 3 anos, no âmbito da Lei n.º 76/77, de 29/09, então em vigor; . Em 18/01/1989, o A. marido e o então senhorio procederam a um aditamento escrito ao contrato inicial, alterando o prazo para 20 anos a contar do início do contrato e alterando o montante da renda inicial; . O A., a solicitação do senhorio, atualizou as rendas, a partir do ano agrícola de 1996, para o valor de 900.000$00; . Em 13/08/1998, a então senhoria, mãe dos R.R., denunciou extrajudicialmente o referido contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 15/08/1999, tendo-se seguido então uma execução judicial de despejo, que os A.A. impugnaram mediante embargos; . Ao longos dos anos de vigência do contrato, os A.A., com autorização do senhorio, realizaram, no conjunto dos prédios locados, diversas obras e melhoramentos que se traduziram em benfeitorias necessárias e úteis, cujo levantamento não é possível sem detrimento dos imóveis e que aumentaram consideravelmente o respetivo valor, ascendendo ao total de € 319.000,00. . De entre as benfeitorias realizadas pelos A.A., constam: - a construção de um ovil e sala de ordenhas, com 650 m2 + 700 m2, edificados de raiz, com comedouros e bebedouros, água com bomba do poço, estimados, atualmente, em valor não inferior a € 125.000,00; - implantação de cercas para parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, no valor atual de € 38.000,00; - eletrificação da habitação, todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiros, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com implantação de um PT e bombas elétricas, em valor não inferior a € 50.000,00. Concluíram os A.A. a pedir que: a) - Fosse reconhecido e declarado que a carta de denúncia escrita pela mãe dos R.R. ao A. marido é extemporânea, sendo nula e de nenhum efeito, não respeitando a antecedência legal; b) - Fosse reconhecido e declarado que, não podendo o A. opôr-se à denúncia nos termos da lei, os R.R. só podiam obter título executivo de denúncia através de ação judicial própria; c) – Fosse reconhecido que aquela denúncia só poderia proceder eventualmente para 15/08/2006; d) – Fosse reconhecido aos A.A. o direito de indemnização por benfeitorias, com base no enriquecimento dos R.R., no valor de € 319.000,00 e estes condenados a pagar àqueles tal valor; e) - Fosse reconhecido o direito de retenção dos A.A. sobre os referidos imóveis, pelo valor das benfeitorias, constituindo garantia a ser exercida enquanto não lhes forem pagas as quantias respetivas. 2. Os R.R. apresentaram contestação a invocar, além do mais, as exceções de caso julgado, de litispendência e de preclusão do direito a deduzir os pedidos formulados, em virtude da existência dos autos de embargos de executado apensos aos autos de execução em que foi pedida a passagem de mandados de despejo. 3. Em sede de audiência preliminar realizada em 02/03/2004, foi proferido o despacho saneador de fls. 402-410 a julgar: i) - procedente a exceção do caso julgado quanto aos pedidos formulados em a), b) e c), com a consequente absolvição dos réus da instância nessa parte; ii) - improcedentes as exceções de litispendência e de caso julgado quanto aos pedidos formulados nas alíneas d) e e) do petitório; iii) – improcedente a exceção de preclusão do direito dos A.A.. No mais, prosseguiram os autos para julgamento com a seleção da matéria de facto tida por relevante. 4. Os R.R. recorreram então das referidas decisões que julgaram improcedentes as exceções de litispendência e de caso julgado relativamente aos pedidos formulados em d) e e), bem como a exceção de preclusão do direito dos A.A., tendo tais recursos sido admitidos com subida diferida conforme despacho de fls. 456. 5. Entretanto, foi intentada outra ação sob o n.º 183/06.6TBSRP, cujo autos foram apensados ao presente processo com o n.º 92-B/2002, em que figuram como autores CC e mulher DD, EE e mulher FF e GG e como réus AA e BB, a pedir que estes fossem condenados a pagar àqueles: a) – a indemnização pela perda das ajudas previstas no Regulamento de Aplicação da Intervenção «Medidas Agro-Ambientais», no valor de € 71.671,20; b) - a indemnização pelos prejuízos causados com a perda dos lucros decorrentes da produção de azeite, no valor de € 41.967,47; c) - a indemnização pela perda das ajudas concedidas pela produção de azeite no valor de € 48.917,90; d) - a indemnização pela perda das ajudas complementares à produção de azeite, no valor de € 3.644,08; e) - a indemnização pela perda dos lucros decorrentes da produção de culturas arvenses, nos anos agrícolas de 2004/2005 e de 2005/2006, no valor de € 4.836,35; f) - a indemnização pela perda de apoios concedidos à produção de culturas arvenses, no valor de € 13.757.56; g) - a indemnização pela perda da ajuda complementar aos produtores de culturas arvenses, no valor de € 1.007,86; h) - a indemnização pelos prejuízos decorrentes da impossibilidade de implementação do projeto de turismo rural, no valor de € 50.480,82; i) - a indemnização pela ocupação ilícita do imóvel desde 1998/1999 até 19 de maio de 2003, no valor de € 21.634,16; l) – os juros sobre as quantias em dívida, até ao seu efetivo e integral pagamento. Mais tarde, os ali autores ampliaram a causa de pedir e o pedido requerendo a condenação dos réus em mais € 47.080,00 correspondente ao que gastaram na recuperação dos imóveis. 6. Prosseguindo a causa e realizada a audiência final, foi proferida a sentença de fls. 1913-1940, datada de 25/03/2014, em que: A – Foi julgada parcialmente procedente a ação n.º 92/2002, decidindo-se: a) – reconhecer o direito de indemnização por benfeitorias dos A.A. no valor de € 161.921,20, condenando-se os R.R. a pagar àqueles tal quantia; b) - reconhecer aos A.A. o direito de retenção dos imóveis pelo valor das benfeitorias; c) - absolver os RR. dos restantes pedidos; B – E foi julgada improcedente a ação n.º 92-B/2002 (anterior processo n.º 183/06.6TBSRP) com a consequente absolvição dos ali réus de todos os pedidos formulados. 7. CC e outros, réus na ação principal e autores na ação apensa, recorreram dessa sentença para o Tribunal da Relação de … que, através do acórdão proferido a fls. 2266-2292, datado de 16/06/2016, revogou as decisões da 1.ª instância que tinham julgado improcedentes as exceções de caso julgado e preclusão do direito, julgando-as, por sua vez, procedentes com a consequente absolvição dos R.R. da instância e, por via disso, prejudicado o conhecimento das questões suscitadas no âmbito do recurso interposto da sentença final. 8. Inconformados com tal decisão, AA e BB, autores na ação principal, vieram interpor revista a pedir que fosse revogado o acórdão recorrido e mantida a sentença de 1.ª instância. 9. Por sua vez, CC e cônjuge DD, EE e cônjuge FF e ainda GG, réus na ação principal e autores na ação apensa, também interpuseram revista com fundamento em omissão de pronúncia sobre a decisão da 1.ª instância que julgou improcedente a ação n.º 92-B/2002. 10. Ambas as revistas foram objeto de apreciação no acórdão deste Supremo proferido a fls. 2437-2456, datado de 08/06/2017, em que se concluiu nos seguintes termos: A – Conceder, parcialmente, a revista interposta por AA e BB, decidindo-se: a) - Revogar o segmento decisório do acórdão recorrido que julgou procedentes as exceções de caso julgado e de preclusão do peticionado direito às benfeitorias e julgar tais exceções improcedentes; b) – Confirmar o segmento decisório do acórdão recorrido sobre a preclusão do direito de retenção com a entrega judicial dos prédios em causa; c) – Em consequência disso, determinar que os autos baixem à Relação para conhecer do objeto da apelação interposta da sentença da 1.ª instância no respeitante ao direito às benfeitorias ali reconhecido e ao direito de retenção até à sobredita entrega judicial, bem como quanto ao impugnado segmento decisório daquela sentença que julgou improcedente a ação n.º 92-B/2002; B – Considerar, por via disso, prejudicado o objeto da revista interposta por CC e outros. 11. Em cumprimento desse aresto, o Tribunal da Relação proferiu o acórdão de fls. 2484-2592, datado de 07/12/2017, a julgar parcialmente procedente a apelação, decidindo: 1. Revogar a sentença recorrida na parte em que julgou a ação n.º 92/2002 parcialmente provada e procedente (A e B do dispositivo) e absolver os R.R. apelantes da integralidade dos pedidos formulados pelos A.A. apelados; 2. Revogar a sentença recorrida na parte em que julgou a ação nº 92-B/2002 totalmente improcedente, julgando-a parcialmente procedente e nessa conformidade: a) – Condenando os ali apelados a pagar aos apelantes uma indemnização devida pela ocupação ilícita do imóvel entre 15/08/1999 e 19/05/ 2003, no valor de € 16.874,40. b) – Condenando os ali apelados a pagar aos apelantes juros de mora sobre a quantia referida em a), à taxa legal, até ao seu efetivo e integral pagamento. c) – Absolvendo os apelados do mais aí peticionado. 12. Desta feita, vêm agora os A.A. AA e BB pedir revista, formulando as seguintes conclusões: 1.ª - As obras realizadas pelos arrendatários, em causa nos autos (obras nas casas e instalações urbanas e agrícolas, obras na construção de ovil e sala de ordenha, obras na eletrificação de todas as casas e instalações urbanas e agrícolas, obras na construção de cercas para parqueamento e maneio do gado), foram todas realizadas de boa-fé; 2.ª – Tais obras foram todas autorizadas ou consentidas pelo senhorio; 3.ª - Devem qualificar-se todas como “benfeitorias necessárias” - art.º 216.º do CC; 4.ª - Todas elas conferem o direito à respetiva indemnização - artigos 1.046.º e 1.273.º CC - e conferem aos arrendatários o inerente direito de retenção sobre os imóveis arrendados até serem pagos pelas benfeitorias realizadas - artigos 754.º e seguintes CC. 5.ª - As faturas emitidas em nome de Sociedade da LL não são um meio de prova idóneo, legalmente admissível, de despesas efetuadas pelos senhorios, ora recorridos, nem conferem a estes o direito a serem pagos pelos ora recorrentes pelo seu valor; 6.ª - A interpretação dada no acórdão recorrido aos artigos 14.º e 15.º da LAR viola os princípios e regras contidos nos artigos 9.º e 10.º do CC; 7.ª - Em tudo o que a LAR não afaste o regime geral da locação, este é aplicável; 8.ª - O arrendamento dos autos não cessou por mútuo acordo nem por resolução levada a cabo pelo senhorio, caindo-se no regime geral, no tocante a benfeitorias; 9.ª - O arrendatário tem o direito de ser indemnizado pelas benfeitorias necessárias e compensado pelas úteis - artigos 1.046.º e 1.273.º do CC; 10.ª - O acórdão recorrido deve ser revogado e manter-se o dispositivo da sentença da 1.ª Instância, com a condenação dos senhorios a pagarem aos arrendatários a indemnização de € 161.222,96 pelas referidas benfeitorias realizadas nos prédios e reconhecer-lhes o inerente direito de retenção sobre os imóveis locados. 13. Os Recorridos apresentaram contra-alegações com ampliação do âmbito do recurso, pugnando pela não provimento da revista, mas sustentando, a título subsidiário, o seguinte: 1.ª – O valor das obras autorizadas pelo senhorio foi todo ele compensado pelo não pagamento das rendas e as demais obras, porque não autorizadas, devem ser consideradas ilícitas e, em consequência, não podem ser indemnizáveis; 2.ª - Não fora isto, não consta dos autos qualquer facto que permita concluir que as benfeitorias úteis não possam ser levantadas - neste sentido - vide acórdãos do STJ de 23.02.2002 e 20.06.2012; 3.ª - Ainda assim, o valor das benfeitorias, à data da entrega dos prédios, não se encontra provado, apenas ficou provado que: - O valor atual (em 2005) das cercas, para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 m, ascende a € 17.722,96, correspondendo 3.975 m construídos em 1988 ao valor atual (em 2005) de € 2.921,63 e 4635 m construídos em 1990 ao valor actual (em 2005) de 2.433,38" - A obras de eletrificação da habitação, todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas, caso tivessem sido executadas em janeiro de 2006, teriam um valor de € 43 500,00; 4.ª - Ou seja, os valores apurados tiveram por referência o ano de 2005 e janeiro de 2006, sendo que, conforme consta dos factos provados que: N - Por termo efetuado em 02.05.2006 no âmbito do Proc. 128/00, foram entregues as chaves dos prédios pelos AA e BB aos autores no processo apenso; 5.ª - Acresce que, conforme resulta dos factos provados: 30 - Na data da entrega dos prédios referidos, em 02.05.2006: a) - a pintura do edifício aí existente estava deteriorada. b) - Um dos vidros estava fissurado e os vitrais da sala rachados e a desfazerem-se. c) - Os telhados e as canalizações estavam degradados. d) - O que causava infiltrações. e) As paredes apresentavam buracos, estavam picadas e com o reboco à vista e revelavam infiltrações. f) - As paredes estavam repletas de pregos. g) - O chão apresentava-se degradado. h) - Os fios eléctricos estavam cortados e as tomadas e interruptores tinham sido removidos. i) - O edifício apresentava sinais de sujidade 6.ª - Aqui chegados, resulta óbvio que os valores indicados nos factos provados não refletem de modo algum o valor atual das obras realizadas no locado à data de entrega do mesmo; 7.ª - Mais se note, como refere o acórdão, "Sabendo-se que a obra de eletrificação não estava "em estado novo", porquanto o próprio relatório pericial refere aparentar ter cerca de 10 anos (...)"; 8.ª- Assim, somos forçados a concluir que não existem factos provados que permitam determinar qual o valor das alegadas benfeitorias que foram "recebidas" pelos Recorridos em 02.05.2006; 9.ª - Ainda assim, caso se considere existir direito algum a indemnização por benfeitorias, sempre se deverá deduzir ao mesmo o valor de € 17.471,00, valor correspondente às reparações dos estragos referidos no facto provado em 30, conforme facto provado em 31 e facto provado agora aditado por acórdão a fls. 86; 10.ª - Porém, nem esse valor (reparações dos estragos) fará com que a obra de eletrificação que aparenta ter mais de 10 anos fique em estado novo; 11.ª - A final, deve reconhecer-se serem os Recorridos credores dos Recorrentes, não tendo estes qualquer direito a indemnização por benfeitorias, nem tão-pouco qualquer direito de retenção, devendo manter-se na íntegra o acórdão recorrido. Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir. II – Delimitação do objeto do recurso Tendo as ações sido propostas, respetivamente em 2002 e 2006 e o acórdão recorrido proferido em 08/06/2017, é aplicável à presente revista o atual regime recursório com a ressalva do disposto no n.º 3 do artigo 671.º do CPC, nos termos do artigo 7.º, n.º 1, do Lei n.º 41/2013, de 26-06. Como é sabido, o objeto do recurso é definido em função das conclusões formuladas pelo recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 3 a 5, 639.º, n.º 1, do CPC. Dentro de tais parâmetros, as questões a resolver consistem em saber: i) – Se assiste aos A.A./Recorrentes o direito a serem indemnizados pelas benfeitorias por eles realizados nos prédios locados, no valor de € 161.921,20, tal como foi decidido pela 1.ª instância; ii) – Se lhes assistia também o correspetivo direito de retenção de modo a tornar lícita a ocupação que fizeram do locado; iii) – Se, no caso de assistir aos A.A. direito a indemnização por benfeitorias, deverá ser deduzido o valor de € 17.471,00 correspondente às reparações dos estragos nos bens locados, conforme o constante dos pontos 30 a 34 dos factos provados na audiência final e aditamento introduzido pela Relação a fls. 2569. III – Fundamentação 1. Factualidade dada por provada pelas instâncias Vem dada como provada pelas instâncias a seguinte factualidade: 1.1. Por inscrição G Ap. 8 de 2006/08/01 foi registada a aquisição, sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de MM, do prédio misto denominado “LL”, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 1663/ 20060801, anteriormente sob o n.º 3141 do Livro B-8 e inscrito no Serviço de Finanças de …, sob os arts. 1204.º, 108 secção E, 861 e 863 da freguesia de … a favor dos ora AA. EE, CC e GG – alínea A). 1.2. Por inscrição G Ap. 8 de 2006/08/01 foi registada a aquisição, sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de MM, do prédio rústico denominado “LL”, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 1705/ 20070206, desanexado do prédio descrito em 1.1 (A), e inscrito no Serviço de Finanças de …, sob o art. 108 secção E, da freguesia de … a favor dos ora AA. EE, CC e GG – alínea B); 1.3. Por inscrição G Ap. 8 de 2006/08/01 foi registada a aquisição, sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de MM, do prédio rústico denominado “KK”, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 1664/ 20060801, desanexado do prédio descrito em 1.1 (A) e inscrito no Serviço de Finanças de …, sob o art.º 111 secção E, da freguesia de … a favor dos ora AA. EE, CC e GG – alínea C); 1.4. Por inscrição G Ap. 8 de 2006/08/01 foi registada a aquisição, sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de MM, do prédio misto denominado “LL”, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 1663/ 20060801, desanexado do prédio em 1.1. (A), e inscrito no Serviço de Finanças de …, sob o art.º 109 secção E, da freguesia de … a favor dos ora AA. EE, CC e GG – alínea D); 1.5. Por inscrição G Ap. 8 de 2006/08/01 foi registada a aquisição, sem determinação de parte ou direito, por sucessão hereditária de MM, do prédio misto denominado “NN”, descrito na Conservatória do Registo Predial de … sob o n.º 1665/ 20060801, desanexado o prédio descrito em 1.1. (A) inscrito no Serviço de Finanças de …, sob os art. 139.º E, da freguesia de … a favor dos ora A.A. EE, CC e GG – alínea E); 1.6. Originalmente os prédios referidos em 1.1 e 1.2 (A e B) eram um prédio único, designado por prédio misto artigo 108E da freguesia de …, Concelho de …, constituído por uma parte rústica com 64,85 ha e urbanos 1204, 861 e 863 – alínea F); 1.7. Este prédio foi dividido em duas partes tendo dado origem aos prédios descritos em 1.1 e 1.2 (nas alíneas A e B) – alínea G); 1.8. O prédio misto 108E (ponto 1.1 - alínea A) deu origem ao prédio misto 155E e o prédio rústico 108E (ponto 1.2 - alínea B)) deu origem ao prédio rústico 154E – alínea H). 1.9. O artigo 861 corresponde agora ao artigo 1305 – alínea I); 1.10. O artigo 863 corresponde ao atual 1307 – alínea J); 1.11. O artigo 1204 corresponde ao atual 1747 – alínea L). 1.12. Por escrito particular celebrado em 10/04/1987 e intitulado “Contrato de Arrendamento”, HH declarou dar de arrendamento a AA, que declarou aceitar, os prédios rústicos inscritos na matriz predial rústica sob os artigos 108, 139, 111 e 109, todos da secção E, e os prédios urbanos inscritos na matriz predial urbana sob os artigos 861.º, 863.º, 939.º e 1204.º da freguesia de … – alínea M); 1.13. Da 1.ª cláusula do escrito referido em 1.6 (alínea F) consta que: “o seu início é em 15 de agosto de 1986, celebrado por um período de seis anos, renovável por um período de três anos, enquanto não for denunciado nos termos da Lei do Arrendamento Rural.” – alínea N); 1.14. Estipulou-se no contrato referido em 1.6 (alínea F) “que a renda anual é no valor de 500.000$00 (quinhentos mil escudos), paga em dinheiro na casa do senhorio ou do seu representante, contra recibo, em 15 de agosto de cada ano, porém, nos anos de 1987 e 1988, o rendeiro só terá que pagar o montante de 300.000$00 (trezentos mil escudos) por cada ano, destinando-se os diferenciais ao pagamento da comparticipação das despesas com as beneficiações e obras a realizar no monte e anexos, obras que o senhorio desde já autoriza – alínea O); 1.15. Consta também do referido contrato que: “O segundo outorgante para obras futuras, designadamente construções, parques para gados, necessita para tal de autorização do senhorio” – alínea P). 1.16. Ficou estipulado na cláusula 6.ª do contrato que “o segundo outorgante fica com a obrigação de proceder à conservação dos prédios urbanos” dados no arrendamento – alínea Q). 1.17. Por escrito particular celebrado em 18/01/1989 e intitulado “Adenda ao contrato de arrendamento rural celebrado em 10 de abril de 1987”, HH e AA declararam acordar que: “o prazo de arrendamento respeitante ao prédio rústico denominado “KK” sito na freguesia de … concelho de …, inscrito na matriz cadastral rústica sob o art.º 111 da secção E, passa a ser de 20 anos” – alínea R). 1.18. Por despacho proferido, em 19/05/2003, no processo n.º 128/00 intentado pelos ora apelantes contra os ora apelados, foi ordenado o despejo dos locados – alínea S). 1.19. AA e mulher BB interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de … do despacho referido, ao qual, por despacho proferido em 30/01/ 2004, foi fixado efeito suspensivo – alínea T); 1.20. Por despacho proferido em 17/01/2004 no Proc. 128/00, foi o recurso mencionado em 1.19 (T) julgado deserto por falta de alegações – alínea U); 1.21. AA e mulher BB desistiram do recurso interposto do despacho referido em 1.20 (U) que julgou deserto o recurso interposto do despacho que ordenou a emissão de mandados de despejo – alínea V). 1.22. Por termo efetuado em 02/05/2006 no âmbito do Proc. 128/00, foram entregues as chaves dos prédios pelos AA e mulher BB aos autores do processo apenso – alínea X); 1.23. O ano 2005 foi um ano de seca – alínea Y). 1.24. Os 48,83 hectares da área total dos prédios são compostos por olival com mais de 61 árvores por hectare – alínea Z); 1.25. O A., em 13 de abril de 1987, solicitou ao senhorio autorização, por escrito, para proceder à execução de cercas, com perímetro de 4.000 metros, que foi concedida – facto 1 provado em audiência; 1.26. Em 16, 20 e 22 de março de 1990, requereu autorização por escrito, ao senhorio, para a enxertia do olival e eletrificação, tal como a edificação de um ovil e ordenha mecânica nos prédios – facto 2 provado em audiência; 1.27. Tal autorização foi concedida – facto 3 provado em audiência; 1.28. Os A.A. procederam à realização de obras na casa de habitação do monte e anexos – facto 4 provado em audiência; 1.29. Procederam à elaboração do projeto de arquitetura, redes de águas e esgotos e assistência técnica – facto 5 provado em audiência; 1.30. Realizaram obras nos telhados, casões, cozinha, casa de caseiro, palheiro, celeiros e arramadas no II – facto 6 provado em audiência; 1.31. Procederam: a pinturas e caiados; à reparação do portão, conserto de 8 portas exteriores do rés-do-chão, janelas novas, pinturas, vidros; à montagem da instalação elétrica interior na habitação; à colocação de madeiras para o soalho, tábuas, barrotes, reparação de portas, pinturas, armário – facto 7 provado em audiência; 1.32. Em 19/12/1992, procederam à limpeza e restauração das paredes interiores e exteriores da habitação e anexos e recuperação de toda a cobertura com suporte de trabalho – facto 8 provado em audiência; 1.33. Os A.A. reconstruíram 2 celeiros para guarda e recolha de palhas, 2 armazéns, palheiros e cavalariça, além de uma cavalariça do monte – facto 9 provado em audiência; 1.34. Os A.A. colocaram telhados novos, paredes, rebocos, pinturas, janelas, madeiras, portas e vidros, 2 fossas – facto 10 provado em audiência; 1.35. A construção do ovil e da sala de ordenha é feita em alvenaria, de tijolo furado, rebocada e revestida a azulejo até 2 metros, com cobertura de fibrocimento e pavimento em mosaico cerâmico – facto 11 provado em audiência; 1.36. Procederam: à eletrificação da habitação, casa do caseiro, armazéns, celeiros e demais dependências urbanas; à elaboração de projetos, fornecimentos, montagem de um posto de transformação rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva, contendo as peças indicadas nos projetos – facto 12 provado em audiência; 1.37. Além das autorizações referidas nos factos provados em 1 e 3 (pontos 1.25 e 1.27), os R.R., em 02/06/1992, concederam também autorização aos A.A. para a implantação de 5000 metros de cercas – facto 13 provado em audiência, mas alterado pela Relação (fls. 2553); 1.38. Os A.A. implantaram ainda cercas, para o parqueamento dos gados, com paus tratados, redes e arame farpado – facto 14 provado em audiência; 1.39. A construção do ovil e sala de ordenha com 650 m2+700 m2, respetivamente, edificados de raiz, com comedouros e bebedouros, água com bomba do poço têm um valor atual não inferior a € 100.000,00 – facto 15 provado em audiência; 1.40. O valor atual (em 2005) das cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros, ascende a € 17.722,96, correspondendo 3.975 metros construídos em 1988 ao valor atual (em 2005) de € 2.921,63 e 4.635 metros construídos em 1990 ao valor atual (em 2005) de € 2.433,38 – facto 16 provado em audiência, mas alterado pela Relação (fls. 2557); 1.41. As obras de eletrificação da habitação, todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas, caso tivessem sido executadas em janeiro de 2006, teriam um valor de € 43.500,00 – facto 17 provado em audiência, alterado pela Relação (fls. 2558); 1.42. Os A.A. procederam à reconversão do olival, numa área de 16 hectares, efetuando a enxertia das variedades em “C…” e “V…” – facto 18 provado em audiência; 1.43. Estas variedades aumentaram o valor dos prédios, tal como as produções e produtividade – facto 19 provado em audiência; 1.44. Todos estes melhoramentos aumentaram e valorizaram o prédio dos R.R. – facto 20 provado em audiência; 1.45. O trabalho realizado pelos R.R. mostra-se incorporado nos prédios – facto 21 provado em audiência; 1.46. Em 1992, porque se encontravam em dívida as rendas dos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/1991, foi acordado que as mesmas não seriam pagas ao senhorio para serem imputadas ao valor dos “arranjos” efetuados pelos A.A. no “Monte” – facto 22 provado em audiência; 1.47. A ausência de entrega dos prédios após a prolação do despacho que ordenou a entrega impossibilitou os A.A. de apresentar a sua candidatura no âmbito dos regulamentos de aplicação das medidas agro-alimentares e dos planos zonais, prevista no Regulamento de Aplicação da Intervenção “Medidas Agro-Alimentares” e no Regulamento de Aplicação dos Planos Zonais integrados naquela intervenção – facto 23 provado em audiência; 1.48. A falta de entrega dos prédios identificados em 1.1 (A) e 1.5 (E), após a prolação do despacho referido, impediu os AA. de, nos anos agrícolas de 2003 a 2006, exercer neles a atividade agrícola e de produzir azeitona e azeite – facto 24 provado em audiência; 1.49. Nos imóveis referidos existem 6.159 oliveiras – facto 25 provado em audiência; 1.50. Impediu-os, também, de produzir culturas arvenses, nomeadamente de trigo, centeio e cevada forrageira – facto 26 provado em audiência; 1.51. A falta de entrega dos prédios identificados após a prolação do despacho referido impediu os A.A. de beneficiar das ajudas concedidas aos produtores de culturas arvenses previstas nos Despachos Normativos 72/98 de 16.10 e 37/2001 de 02.10 e no anexo I do Regulamento (CE) 1251/1999 do Conselho, e que no ano agrícola de 2003/2004 totalizam € 13.058,87 – facto 27 provado em audiência; 1.52. E de beneficiar dos pagamentos complementares aos produtores de culturas arvenses, nas campanhas de 2004/2005 e 2005/2006, previstos no Despacho Normativo 23/2005 de 07.04, no montante total de € 1.007,86 – facto 28 provado em audiência; 1.53. No período compreendido entre maio de 2003 e maio de 2006 os R.R. beneficiaram: a) - dos lucros provenientes da produção de azeitona, azeite e culturas arvenses; b) - das ajudas referidas; c) - dos pagamentos complementares à produção aludidos - facto 29 provado em audiência; 1.54. Na data da entrega dos prédios referidos, em 02.05.2006: a) - a pintura do edifício aí existente estava deteriorada; b) - um dos vidros estava fissurado e os vitrais da sala rachados e a desfazerem-se; c) - os telhados e as canalizações estavam degradados; d) - o que causava infiltrações; e) - as paredes apresentavam buracos, estavam picadas e com o reboco à vista e revelavam infiltrações; f) - as paredes estavam repletas de pregos; g) - o chão apresentava-se degradado; h) - os fios elétricos estavam cortados e as tomadas e interruptores tinham sido removidos; i) - o edifício apresentava sinais de sujidade – facto 30 provado em audiência; 1.55. Para reparar os estragos referidos é necessário proceder às seguintes obras na casa principal: I) - No R/C: a) - remoção de pregos e reparação do reboco das paredes interiores; b) - reparação de paredes e tectos com infiltrações; c) - pintura interior; II) - No 1.º andar: a) - remoção de pregos e reparação de reboco das paredes interiores; b) - reparação de fugas de águas de esgoto e substituição dos tubos da varanda; c) - colocação de pedras na bancada da cozinha e reparação dos estragos provocados pela sua remoção; d) - pintura interior; III) - No exterior: a) - reparação do telhado, reposição de telhas e reparação de infiltrações; b) - reparação do reboco exterior; c) – pintura exterior; d) - impermeabilização do terraço e da varanda da cozinha – facto 31 provado em audiência; 1.56. Para reparar os estragos referidos, é necessário proceder às seguintes obras no “casarão”: a) - reparação de fissuras nas paredes e reboco exterior; b) - pintura exterior; c) - reparação do telhado e substituição de telhas partidas e reparação de infiltrações de água; d) - reparação do alpendre; e) - pintura do alpendre – facto 32 provado em audiência; 1.57. Para reparar os estragos referidos é necessário proceder às seguintes obras na “casa agrícola”: a) - reparação do reboco exterior; b) – pintura exterior; c) - reparação do telhado com a substituição de telhas partidas e reparação de infiltrações de água; d) - reparação de reboco das paredes interiores; e) - pintura interior – facto 33 provado em audiência; 1.58. Os A.A. terão que reparar as portas e as janelas – facto 34 provado em audiência; 1.59. Aquando do início do contrato de arrendamento referido, o monte e as suas dependências estavam degradados e destruídos – facto 35 provado em audiência; 1.60. Havia falta de portas, janelas e telhas – facto 36 provado em audiência; 1.61. As louças estavam partidas e as dependências degradadas – facto 37 provado em audiência; 1.62. A casa de habitação do monte tem mais de 100 anos de construção – facto 38 provado em audiência; 1.63. A renda relativamente ao contrato referido na alínea A) da base instrutória de fls. 410-411, correspondentes aos pontos 1.12 a 1.14 dos factos aqui provados, passou a ser de 900.000$00, a partir da renda vencida em 15/08/1996 – aditado pela Relação a fls. 2561; 1.64. Os R.R. efetuaram apenas o pagamento da renda relativa à ocupação dos prédios arrendados concernente ao ano de 1998/1999 – aditado pela Relação a fls. 2562; 1.65. As reparações referidas nos pontos 30 a 34 dos factos provados na audiência final ascendem a quantia não inferior a € 17.470,00, acrescida de IVA – aditado pela Relação a fls. 2569. Adita-se ainda, ao abrigo do disposto no artigo 607.º, n.º 4, 2.ª parte, ex vi dos artigos 663.º, n.º 2, e 679.º do CPC, com base nos elementos documentais constantes dos autos, o seguinte facto: 1.66. AA e mulher BB deduziram oposição mediante embargos à execução de despejo no processo 128/2000 identificado no ponto 1.18, em 11/07/2000, conforme o documento reproduzido a fls. 96-103. 2. Factos dados como não provados Vem dado como não provado o seguinte: 2.1. Os valores atuais indicados pelos A.A. da ação principal para o ovil, sala de ordenha, anexos, cercas e eletrificação; 2.2. Os referidos A.A. reconstruíram a casa de habitação do monte e os anexos, que estavam destruídos. 2.3. Todas as implantações efetuadas foram com o acordo expresso do senhorio; 2.4. A preços atuais, as quantias despendidas pelos A.A. na casa de habitação e anexos têm um valor não inferior € 100.000,00; 2.5. A falta de entrega dos prédios impediu os réus de beneficiar, durante 5 anos, das ajudas às medidas arvenses de sequeiro, sementeira direta, conservação do restolho e enrelvamento da entrelinha de culturas permanentes, nos montantes de: a) - € 15.381,12, relativamente ao ano agrícola de 2003/2004; b) - € 14.648,38, para o ano agrícola de 2004/2005; c) - € 14.398,42, para o ano agrícola de 2005/2006; d) - € 11.861,12, para o ano agrícola de 2006/2007; e) - € 15.381,14, para o ano agrícola de 2007/2008. 2.6. E, descontadas as despesas com podas, fertilização, desinfestação e fitossanidade, os A.A. na ação apensa deixaram de obter com tal atividade as quantias de: a) - € 17.445,98 no ano agrícola de 2003/2004; b) - € 17.678,95 no ano agrícola de 2004/2005; c) - € 6.842,54 no ano agrícola de 2005/2006. 2.7. Se os R.R. na ação apensa houvessem entregue os imóveis em maio de 2003, os ali A.A. poderiam ter beneficiado de ajudas à produção, no montante de € 48.917,00. 2.8. A falta de entrega dos prédios após a prolação do despacho referido em J impediu os AA. na ação apensa de beneficiar dos pagamentos complementares aos agricultores do sector do azeite e da azeitona de mesa, previstos no Despacho Normativo 54/2005 de 12.12.2005. E de receber a quantia de € 3.644,08. 2.9. E de auferir os lucros correspondentes à produção dessas culturas nas campanhas de 2003/2004, 2004/2005, 2005/2006, no montante de € 4.836,35; 2.10. A falta de entrega dos prédios em agosto de 1999 impediu os A.A. na ação apensa de proceder à implementação do projeto de Turismo Rural que aí pretendiam desenvolver. 2.11. Os A.A. na ação apensa pretendiam disponibilizar 7 quartos duplos, com uma diária de alojamento entre € 65,00 na época baixa e €75,00 na época alta, bem como a prestação de serviços de restauração e hotelaria. 2.12. O que lhes acarretou prejuízos no valor de € 50.480,43; 2.13. Os R.R., na ação apensa não tiveram nos imóveis qualquer pombal. 2.14. Os A.A. na ação apensa abandonaram os imóveis referidos após a sua entrega pelos R.R. na mesma ação em maio de 2006; 2.15. Os A.A. na ação apensa suportarão com as reparações referidas em 72.º a 74.º quantia não inferior a € 17.470,00, acrescida de IVA à taxa de 5%. 2.16. Os A.A. na ação apensa terão de proceder, igualmente, à limpeza de arbustos, ervas e catos na área social no monte e em cerca de 100 hectares da propriedade devido ao estado de abandono em que foi entregue, com o que despenderão aproximadamente € 3.000,00. 2.17. E à limpeza e remoção para vazadouro de lixo detetado nos edifícios do monte e na propriedade, com o que despenderão aproximadamente € 500,00. 2.18. Terão que proceder ao desalojamento de um pombal abandonado numa das divisões da casa agrícola do monte. E à desinfestação de uma praga de pulgas junto da entrada do casão, debaixo do telheiro do casão e junto das casotas de cão abandonadas junto da casa agrícola do monte, com o que despenderão aproximadamente € 150,00. 2.19. Os R.R. na ação apensa tenham efetuado o pagamento da renda relativa à ocupação dos prédios arrendados para além do período temporal referido em 1.64 – dado como não provado pela Relação a fls. 2562. 3. Da fixação pelas instâncias dos factos provados e não provados relevantes Fixados que foram pelas instâncias os factos provados e não provados acima descritos, compete a este tribunal de revista acatá-los nos seus precisos termos, de acordo com o preceituado no artigo 682.º, n.º 1 e 2, do CPC. Todavia, pretendem os Recorridos, em sede das respetivas contra-alegações, pôr em crise o seu alcance, no respeitante à uma alegada ampliação do ovil e da sala de ordenha, bem como à implantação de algumas cercas, convocando para tal os resultados da perícia e até elementos de prova produzidos no processo n.º 128/A/00. Sucede que não cabe no âmbito da revista reapreciar eventuais erros de valoração da prova livre ou da fixação dos factos materiais, salvo em caso de ofensa de uma disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência do facto ou que fixe a força de determinado meio de prova, nos termos do artigo 674.º, n.º 3, do CPC, além dos casos em que se mostre indispensável ampliar a decisão de facto, de acordo com o disposto no artigo 682.º, n.º 3, do mesmo diploma. Nesta conformidade, no que aqui releva, impõe-se considerar os factos dados por provados constantes dos pontos 1.35 a 1.41 acima consignados, sustentados como estão na apreciação livre da prova, sem se mostrar que ofendam qualquer disposição legal expressa probatória ou que careçam de qualquer ampliação ou sanação indispensável à solução jurídica do pleito. 4. Do mérito do recurso 4.1. Enquadramento preliminar O litígio em causa neste processo emerge de um contrato de arrendamento rural, reduzido a escrito particular datado de 10/04/1987, mas com início em 15/08/1986, tendo por objeto quatro prédios rústicos inscritos sob os artigos 108, 139, 111 e 109 da secção E na matriz predial rústica e quatro prédios urbanos inscritos sob os artigos 861.º, 863.º, 939.º e 1204.º na matriz predial urbana da freguesia de … do município de … - ponto 1.12 da factualidade provada. O referido contrato foi celebrado pelo prazo de seis anos, renovável por períodos de três anos (ponto 1.13), mas, mediante escrito particular de 18/01/1989, intitulado “Adenda ao contrato de arrendamento rural celebrado em 10 de abril de 1987”, as partes alargaram para 20 anos o prazo de arrendamento respeitante ao prédio rústico denominado “KK”, inscrito sob o art.º 111 da secção E na matriz rústica da freguesia de Santa Maria – ponto 1.17. A casa de habitação do monte tem mais de 100 anos de construção (ponto 1.62) e, aquando do início do referido contrato de arrendamento, o monte e as suas dependências estavam degradados e destruídos (ponto 1.59), havia falta de portas, janelas e telhas (ponto 1.60), as louças estavam partidas e as dependências degradadas (ponto 1.61). No referido contrato ficou estipulado que o rendeiro ficava com a obrigação de proceder à conservação dos prédios urbanos” dados de arrendamento (ponto 1.16) e que necessitava de autorização do senhorio para realização de obras futuras, designadamente construções e parques para gados (ponto 1.15). Foi inicialmente estipulada a renda anual de 500.000$00, a pagar em dinheiro a 15 de agosto de cada ano, mas que, nos anos de 1987 e 1988, o rendeiro só pagaria o montante de 300.000$00, destinando-se o diferencial ao pagamento da comparticipação das despesas com as beneficiações e obras a realizar no monte e anexos, obras que o senhorio desde logo autorizava – ponto 1.14. Em 1992, encontravam-se em dívida as rendas dos anos de 1986/ 1987, 1987/1988, 1988/1989 e 1990/1991, tendo sido acordado que as mesmas não seriam pagas ao senhorio mas imputadas no valor dos arranjos efetuados pelos A.A. no monte – ponto 1.46. A renda relativamente ao contrato de arrendamento em referência passou a ser de 900.000$00, a partir da renda vencida em 15/08/1996 – ponto 1.63. Em 13/08/1998, a então senhoria, mãe dos R.R., denunciou extrajudicialmente o referido contrato de arrendamento, com efeitos a partir de 15/ 08/1999, o que veio a culminar na execução judicial de despejo, tendo os A.A. AA e mulher BB entregue aos R.R., em 02/05/2006, as chaves dos prédios arrendados, no âmbito do proc. 128/00 – ponto 1.22. Os R.R. efetuaram apenas o pagamento da renda relativa à ocupação dos prédios arrendados respeitante ao ano de 1998/1999. Sucede que os A.A., durante a vigência do contrato de arrendamento, realizaram diversas obras nos bens locados, algumas delas com autorização expressa escrita do senhorio, pretendendo agora a respetiva indemnização a título de benfeitorias. Como decorre do já acima relatado, o objeto da presente revista circunscreve-se ao decidido pelas instâncias sobre as pretensões dos A.A. de condenação dos R.R. em indemnização pelas benfeitorias por aqueles realizadas nos bens locados e de reconhecimento do correspetivo direito de retenção por forma a considerar lícita a ocupação que fizeram do arrendado. Subsidiariamente, para o caso de serem reconhecidos tais direitos, vieram ainda os R.R./Recorridos ampliar o objeto do recurso no sentido se ser então deduzido ao montante indemnizatório em perspetiva o valor de € 17.471,00 correspondente às reparações dos estragos nos bens locados, conforme o constante dos pontos 1.54 a 1.58 e 1.65 da factualidade dada como provada acima consignada. Importa, pois, analisar cada uma das questões assim enunciadas. 4.2. Quanto à pretensão de indemnização por benfeitorias Antes de mais, importa reter que, no respeitante à pretensão dos A.A. AA e BB de serem indemnizados pelas benfeitorias realizadas, a 1.ª instância, perfilhando o entendimento de que assiste ao arrendatário rural o direito a ser indemnizado, conforme o tipo de benfeitorias, nos termos gerais do CC, fora dos casos especificados no artigo 15.º, n.º 1, do regime do contrato de arrendamento rural constante do Dec.-Lei n.º 358/88, de 25/10, incluindo o caso em que o contrato cesse por denúncia do senhorio, ocupando-se do caso dos autos, considerou o seguinte: «Provou-se que os autores procederam à realização de obras na casa de habitação do monte e anexos. Procederam à elaboração do projecto de arquitectura, redes de águas e esgotos e assistência técnica. Realizaram obras nos telhados, casões, cozinha, casa de caseiro, palheiro, celeiros e arramadas no II. Procederam a pinturas e caiados; à reparação do portão, conserto de 8 portas exteriores do rés-do-chão, janelas novas, pinturas, vidros; à montagem da instalação eléctrica interior na habitação; à colocação de madeiras para o soalho, tábuas, barrotes, reparação de portas, pinturas, armário. Em 19 de Dezembro de 1992, procederam à limpeza e restauração das paredes interiores e exteriores da habitação e anexos e recuperação de toda a cobertura com suporte de trabalho. Reconstruíram 2 celeiros para guarda e recolha de palhas, 2 armazéns, palheiros e cavalariça, além de uma cavalariça de monte. Colocaram telhados novos, paredes, rebocos, pinturas, janelas, madeiras, portas e vidros, 2 fossas. A construção do ovil e da sala de ordenha é feita em alvenaria, de tijolo furado, rebocada e revestida a azulejo até 2 metros, com cobertura de fibrocimento e pavimento em mosaico cerâmico. Procederam à electrificação da habitação, casa do caseiro, armazéns, celeiros e demais, dependências urbanas; à elaboração de projectos, fornecimentos, montagem de um posto de transformação rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva, contendo as peças indicadas nos projectos. Implantaram ainda cercas para o parqueamento dos gados, com paus tratados, redes e 1 arame farpado. Os AA. procederam à reconversão do olival, numa área de 16 hectares, efetuando a enxertia das variedades em “C…” e “V…”. Estas variedades aumentaram o valor dos prédios, tal como as produções e produtividade. Todo este trabalho mostra-se incorporado nos prédios. Algumas das implantações foram efetuadas com o acordo expresso do senhorio. Expresso por escrito como acima referimos e de acordo com os documentos assinalados. Sendo que não careciam de assinatura reconhecidas, ou formalidades especiais. Efetivamente, a fls. 721 consta a autorização para a construção do ovil e de ordenha mecânica; a fls. 722 a autorização para a construção de 5000 m de cercas; a fls. 723 a autorização para a enxertia do olival; a fls. 724 a autorização para proceder à electrificação agrícola; e a fls. 725 autorização para a execução de cercas com 4000m. Todos estes melhoramentos aumentaram e valorizaram o prédio dos RR.. Assim, com exceção da limpeza e restauração das paredes interiores e exteriores da habitação e anexos e recuperação de toda a cobertura com suporte de trabalho, da reconstrução de 2 celeiros para guarda e recolha de palhas, 2 armazéns, palheiros e cavalariça, além de uma cavalariça de monte e da colocação de telhados novos, paredes, rebocos, pinturas, janelas, madeiras, portas e vidros, 2 fossas, para as quais não se provou a existência de autorização escrita, todas as restantes constituem benfeitorias indemnizáveis. Perante os critérios legais bem como os acima referidos não podemos deixar de concluir que estamos perante benfeitorias. Classificadas como úteis. Assim, de acordo com o regime legal referido (nomeadamente o especificamente previsto no art.º. 14.º, n.º 1, do Regime do Arrendamento Rural) e da interpretação que realizamos quanto aos casos de cessação do contrato como os dos autos, há lugar a indemnização. Apurou-se o valor das benfeitorias: - A construção do ovil e sala de ordenha com 650 m2+700 m2, respectivamente, edificados de raiz, com comedouros e bebedouros, água com bomba do poço têm um valor atual não inferior a € 100.000. - O valor atual das cercas, para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, ascende a € 18.421,2 - A eletrificação da habitação, todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas têm um valor não inferior a 43.500. Provou-se, no entanto, que em 1992, porque se encontravam em dívida as rendas dos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/1991, foi acordado que as mesmas não seriam pagas ao senhorio para serem imputadas ao valor dos arranjos efectuados pelos AA. no Monte. Dos autos não resulta claro qual o significado da expressão “Monte”. A referência surge no documento de fls. 757. Assim, de acordo com os usos correntes desta região e ao facto do próprio documento referir também ao “prédio rústico” (como realidade distinta), entendemos que se refere apenas à casa de habitação e anexos (ou seja, as construções com ela relacionadas). Ou seja, este acordo, e atendendo à sua data - 24 de março de 1992 -, refere-se às benfeitorias acima referidas como: - realização de obras na casa de habitação do monte e anexos, e à electrificação da habitação. - à elaboração do projecto de arquitectura, redes de águas e esgotos e assistência técnica - obras nos telhados, casões, cozinha, casa de caseiro, palheiro, celeiros e arramadas no II. - a pinturas e caiados; à reparação do portão, conserto de 8 portas exteriores do rés-do-chão, janelas novas, pinturas, vidros; à montagem da instalação eléctrica interior na habitação; à colocação de madeiras para o soalho, tábuas, barrotes, reparação de portas, pinturas, armário. Portanto, quanto a estas, os autores não têm o direito de indemnização. Têm, como já vimos, quanto às restantes (construção do ovil e sala de ordenha, cercas e electrificação). O valor demonstrado dessas benfeitorias ascende a € 161.921,2 - € 100.000 (pelo ovil e sala de ordenha); € 18.421,2 (cercas; € 43.500 (eletrificação). Os autores não provaram o valor da reconversão do olival. Alegaram, de resto, apenas o valor da mão-de-obra.» Em síntese, a 1.ª instância, considerando todas as obras realizadas pelo rendeiro como benfeitorias úteis, agrupou-as em dois conjuntos: i) - Um, compreendendo as obras e melhoramentos realizados na habitação, anexos e construções com ela relacionadas, tendo-as como integradas no que foi designado por “Monte” no documento junto a fls. 757; ii) – Outro, incluindo: - a construção do ovil e sala de ordenha; - as cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado; - a eletrificação da habitação, todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas. No primeiro conjunto, incluiu o seguinte: - a realização de obras na casa de habitação do monte e anexos, e a eletrificação da habitação; - a elaboração do projeto de arquitetura, redes de águas e esgotos e assistência técnica - obras nos telhados, casões, cozinha, casa de caseiro, palheiro, celeiros e arramadas no II. - a pinturas e caiados; à reparação do portão, conserto de 8 portas exteriores do rés-do-chão, janelas novas, pinturas, vidros; à montagem da instalação elétrica interior na habitação; à colocação de madeiras para o soalho, tábuas, barrotes, reparação de portas, pinturas, armário. Relativamente a este conjunto, foi considerado que, muito embora não se tenha provado a existência de autorização escrita por parte do senhorio, para a generalidade dessas obras, o seu valor se encontrava compensado por via da imputação no valor das rendas em dívida dos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/ 1991, conforme o acordado em 1992. Nessa base, concluiu-se que não assistia aos A.A. o direito a serem indemnizados por tais benfeitorias. Quanto ao segundo conjunto, considerou-se que as obras nele incluídas, todas autorizadas pelo senhorio, eram indemnizáveis, nos termos gerais do CC, no valor total de € 161.921,20, correspondente à soma das seguintes parcelas: € 100.000,00, pelo ovil e sala de ordenha; € 18.421,20, pelas cercas; € 43.500,00 pela eletrificação. Deteta-se, no entanto, uma discrepância, na parte em que, a eletrificação da habitação consta do primeiro conjunto, mas foi também incluída na despesa total de € 43.500,00 da eletrificação compreendida no segundo conjunto. Ora, como a eletrificação a que se refere o segundo conjunto respeita à “eletrificação agrícola” autorizada pelo senhorio através do documento reproduzido a fls. 724, parece que nela não será de incluir a eletrificação da habitação. Seja como for, esta foi já tida por compensada pelo valor das rendas de 1986 a 1991. Sucede que os R.R. da ação principal, na apelação que interpuseram da sentença final, impugnaram, no que ora releva, em sede de facto e de direito, o segmento decisório por que foram condenados a pagar a indemnização de € 161.921,20, a título das sobreditas benfeitorias, não tendo os A.A. impugnado o segmento em que aqueles foram absolvidos da pretensão indemnizatória relativa às obras incluídas no primeiro dos conjuntos acima referidos. Assim sendo, só as obras compreendidas no segundo conjunto continuam em litígio e que são as seguintes: - a construção do ovil e sala de ordenha; - a implantação das cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado; - a eletrificação, à exceção da habitação, das demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas. Por sua vez, no âmbito da apelação interposta pelos R.R., a Relação, através do acórdão ora recorrido, procedeu à alteração e aditamento de parte da decisão de facto impugnada, mais precisamente da matéria constante dos pontos 1.37, 1.40, 1.41, 1.63, 1.64 e 1.65 dos factos provados acima consignados, e seguidamente, em sede de fundamentação de direito, considerou que: - Tal como a sentença recorrida e os apelantes reconhecem, as obras executadas pelos A.A. se devem classificar como benfeitorias úteis, porquanto, não sendo indispensáveis à conservação dos imóveis, lhes aumentaram o valor, sendo-lhes aplicável o regime jurídico do contrato de arrendamento rural constante do Dec.-Lei n.º 385/88 de 25/ 10; - Todavia, tal regime, no respeitante às benfeitorias, só será aplicável àquelas que foram efetuadas sob a vigência do referido diploma, o que compreende a generalidade das obras, à exceção da cerca com a extensão de 3.975 metros construída em 1988 na sequência da autorização concedida em 1987, a que será então aplicável o regime constante da Lei n.º 76/77, de 29/09; - Assim, de acordo com o disposto nos artigos 15.º e 25.º desta Lei, os rendeiros teriam direito a ser indemnizados pelo valor de 3.975 metros de cerca que implantaram em 1988, valor esse que ascendia a € 2.921,63; - Porém, tal valor deve, ainda assim, ter-se como compensado por via da redução da renda anual inicialmente estabelecida e do valor das posteriores rendas em dívida (de 1986 a 1991), conforme o acordado em 1992, na medida em que, diversamente do entendido na 1.ª instância, esta compensação abrange todas as obras autorizadas pelo senhorio no II, no período de 1987 a 1992; - Relativamente às benfeitorias úteis realizadas já na vigência da Lei n.º 385/88, de 25/10, na linha do entendimento adotado no acórdão do STJ, de 15/01/2002 e mais recentemente no acórdão da Relação de Évora de 21/01/2016, segundo o qual o regime do arrendamento rural ali contemplado, mormente por via dos respetivos artigos 14.º e 15.º, afasta os casos de cessação do contrato em caso de denúncia, não havendo lugar a aplicação subsidiária do CC, pelo que não é devida indemnização por tais benfeitorias. Nessa base, concluiu a Relação pela improcedência da pretensão dos A.A. a serem indemnizados pelas sobreditas benfeitorias como fora decidido em 1.ª instância. Vêm agora os A.A., na presente revista, impugnar tal solução, sustentando, em síntese, que: - As obras em causa (obras nas casas e instalações urbanas e agrícolas, obras na construção de ovil e sala de ordenha, obras na eletrificação de todas as casas e instalações urbanas e agrícolas, obras na construção de cercas para parqueamento e maneio do gado), foram todas realizadas de boa-fé e autorizadas ou consentidas pelo senhorio, devendo ser qualificadas como “benfeitorias necessárias”, nos termos do art.º 216.º do CC; - Todas elas conferem o direito à respetiva indemnização, nos termos dos artigos 1.046.º e 1.273.º do CC; - A interpretação dada no acórdão recorrido aos artigos 14.º e 15.º do Dec.-Lei n.º 385/88, de 25/10, viola os princípios e regras contidos nos artigos 9.º e 10.º do CC, sendo de aplicar o regime geral da locação, nos casos, como o dos autos, em que o contrato não cessou por mútuo acordo nem por resolução do senhorio; - Assim sendo, o acórdão recorrido deve ser revogado e mantido o segmento decisório da sentença da 1.ª Instância a condenar os senhorios a pagarem aos arrendatários a indemnização de € 161.222,96 pelas referidas benfeitorias realizadas nos prédios (€ 100.000,00 pelo ovil e sala de ordenha, € 17.722,96 pelas cercas e € 43.500,00 pela eletrificação). Vejamos. Não sofre dúvida de que estamos no âmbito de um contrato de arrendamento rural reduzido a escrito em 10/04/1987, mas com início em 15/08/ 1986, pelo prazo de 6 anos, renovável por períodos de 3 anos, tendo por objeto: - quatro prédios rústicos inscritos sob os artigos 108, 139, 111 e 109 da secção E na matriz predial rústica da freguesia de … do município de …, denominados, respetivamente, “II”, “JJ”, “KK” e “LL”; - e quatro prédios urbanos inscritos sob os artigos 861.º, 863.º, 939.º e 1204.º na matriz predial urbana da mesma freguesia. O referido contrato foi denunciado extrajudicialmente pela então senhoria, mãe dos R.R., em 13/08/1998 com efeitos a partir de 15/08/1999, ao que se seguiu uma execução judicial de despejo, tendo os A.A. AA e mulher BB entregue aos R.R., em 02/05/2006, as chaves dos prédios arrendados. Assim, o mencionado contrato de arrendamento esteve inicialmente sujeito ao regime do arrendamento rural constante da Lei n.º 76/77, de 29/09, alterada pela Lei n.º 76/79, de 03/12, passando a reger-se pelo regime introduzido pelo Dec.-Lei n.º 385/88, de 25/10, com início de vigência em 30/10/1988, sendo aplicável aos contratos então existentes nos termos do respetivo artigo 36.º. Este último diploma, entretanto alterado pelo Dec.-Lei n.º 524/99, de 10/12, foi revogado pelo Dec.-Lei n.º 294/ 2009, de 13/10, que veio introduzir o regime de arrendamento rural ora em vigor, mas que não interfere com o caso dos autos. Conforme o já referido neste capítulo, está apenas em causa a pretensão de indemnização pelas benfeitorias realizadas pelos rendeiros, ora A.A., nos prédios locados, durante a vigência daquele contrato, mais precisamente: - a construção de um ovil e sala de ordenha; - a implantação de cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado; - a eletrificação, à exceção da habitação, das demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a implantação de um PT e bombas elétricas. Quanto às restantes benfeitorias [realização de obras na casa de habitação do monte e anexos; eletrificação da habitação; elaboração do projeto de arquitetura; redes de águas e esgotos e assistência técnica; obras nos telhados, casões, cozinha, casa de caseiro, palheiro, celeiros e arramadas no II; pinturas e caiados; reparação do portão, conserto de 8 portas exteriores do rés-do-chão, janelas novas, pinturas, vidros; montagem da instalação elétrica interior na habitação; colocação de madeiras para o soalho, tábuas, barrotes, reparação de portas, pinturas, armário], a 1.ª instância concluiu que aos A.A. não assistia o direito à sua indemnização pelas razões já cima indicadas, tendo absolvido os R.R. do pedido nessa parte, o que não foi então impugnado por aqueles. Além disso, apesar de se ter provado que os A.A. procederam à reconversão do olival numa área de 16 hectares, efetuando a enxertia de variedades em “C…” e “V…”, variedades estas que aumentaram o valor e a produtividade dos prédios, a 1.ª instância considerou que não provaram o valor dessa reconversão, mas apenas o da mão-de-obra, não atribuindo qualquer indemnização por tais implantações, o que também não foi objeto de impugnação. De resto, os A.A. limitam-se, na presente revista e no que aqui interessa, a pugnar pela manutenção do segmento decisório da 1.ª instância em que os R.R. foram condenados a pagar-lhes a indemnização pelas benfeitorias respeitantes à construção de um ovil e sala de ordenha, à implantação de cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado e à dita “eletrificação agrícola”, no valor ora calculado de € 161.222,96. No respeitante a tais benfeitorias, da factualidade provada colhe-se o seguinte: i) - Ficou estipulado na cláusula 6.ª do contrato de arrendamento ajuizado que “o segundo outorgante fica com a obrigação de proceder à conservação dos prédios urbanos” dados no arrendamento – ponto 1.16; ii) - Consta do referido contrato que: “O segundo outorgante para obras futuras, designadamente construções, parques para gados, necessita para tal de autorização do senhorio” – ponto 1.15; iii) - Aquando do início do contrato de arrendamento referido, o monte e as suas dependências estavam degradados e destruídos – ponto 1.59; iv) - Em 13/04/1987, o A. solicitou e obteve do senhorio autorização, por escrito, para proceder à execução de cercas, com perímetro de 4.000 metros – ponto 1.25; v) - Em 02/06/1992, os R.R. concederam também autorização aos A.A. para a implantação de 5.000 metros de cercas – ponto 1.37; vi) - Os A.A. implantaram cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros, ascendendo ao valor de € 17.722,96, correspondendo 3.975 metros, construídos em 1988, ao valor de € 2.921,63 e 4.635 metros, construídos em 1990, ao valor de € 2.433,38, valores estes reportados ao ano de 2005 – pontos 1.38 e 1.40, este alterado pela Relação (fls. 2557); vii) - Em março de 1990, o A. requereu e obteve autorização do senhorio, por escrito, para a edificação de um ovil e ordenha mecânica nos prédios locados – pontos 1.26 e 1.27; viii) - A construção do ovil e da sala de ordenha, com 650 m2+700 m2, respetivamente, edificados de raiz, com comedouros e bebedouros, água com bomba do poço, foi feita em alvenaria, de tijolo furado, rebocada e revestida a azulejo até 2 metros, com cobertura de fibrocimento e pavimento em mosaico cerâmico e têm o valor atual não inferior a € 100.000,00 – pontos 1.35 e 1.39; ix) - Também em março de 1990, os A.A. requereram e obtiveram autorização do senhorio, por escrito, para a eletrificação – pontos 1.26 e 1.27; x) - Os A.A. procederam a obras de eletrificação, além da habitação, de todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a montagem de um de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas; caso tivessem sido executadas aquelas obras em janeiro de 2006, teriam um valor de € 43.500,00 – pontos 1.36 e 1.41, este alterado pela Relação (fls. 2558); xi) - Todos estes melhoramentos aumentaram e valorizaram o prédio dos R.R. – ponto 1.44; xii) - O trabalho realizado pelos R.R. mostra-se incorporado nos prédios – ponto 1.45; xiii) - Estipulou-se no contrato de arrendamento em referência “que a renda anual é no valor de 500.000$00, paga em dinheiro, em 15 de agosto de cada ano, porém, nos anos de 1987 e 1988, o rendeiro só terá que pagar o montante de 300.000$00 por cada ano, destinando-se os diferenciais ao pagamento da comparticipação das despesas com as beneficiações e obras a realizar no monte e anexos, obras que o senhorio desde já autoriza – ponto 1.14; xiv) - Em 1992, porque se encontravam em dívida as rendas dos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/1991, foi acordado que as mesmas não seriam pagas ao senhorio para serem imputadas no valor dos “arranjos” efetuados pelos A.A. no “Monte” – ponto 1.46; xv) - A renda relativamente ao contrato em referência passou a ser de 900.000$00, a partir da renda vencida em 15/08/1996 – ponto 1.63 aditado pela Relação a fls. 2561; xvi) - Os R.R. efetuaram apenas o pagamento da renda relativa à ocupação dos prédios arrendados concernente ao ano de 1998/1999 – ponto 1.64 aditado pela Relação a fls. 2562. Assim, a generalidade das obras aqui em apreço foram autorizadas pelo senhorio e efetuadas pelo rendeiro já na vigência do regime constante do Dec.-Lei n.º 385/88, de 25/10, com início em 30/10/1988, à exceção da implantação de cercas na extensão de 3.975 metros, que foi autorizada ainda em 1987 e efetuada em data não apurada de 1988. A esta implantação, atendendo, em especial, ao momento em que foi gerada, por via da autorização do senhorio, a expetativa da sua realização por parte do arrendatário, é aplicável o regime consagrado na Lei n.º 76/77, de 29/09, como foi entendido no acórdão recorrido.[1] Posto isto, dado os Recorrentes, diversamente do entendimento das instâncias, sustentarem que as benfeitorias em causa devem ser qualificadas de necessárias, com relevo para efeitos de determinação do regime aplicável em sede de indemnização, importa, antes de mais, resolver a questão relativa a essa qualificação. Dispõe o artigo 216.º do CC o seguinte: 1. Consideram-se benfeitorias todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa. 2. As benfeitorias são necessárias, úteis ou voluptuárias. 3. São benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem lhe aumentando o valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante. Embora a noção legal de benfeitoria tenha como género próximo a ideia de “despesas”, segundo Menezes Cordeiro, tal “ideia … deve ser alargada, porquanto “efectivamente, uma benfeitoria não é apenas o dispêndio de pecúnia com a coisa; pode consistir na adição de novas coisas, partes de coisa, incorporação de trabalho, etc.”, o que, de resto, melhor condiz com a consagração do direito do benfeitorizante, nalguns casos, ao seu levantamento (ius tollendi)[2]. Fora da noção de benfeitoria ficam, porém, as chamadas “despesas de produção ou cultura (despesas de frutificação)”, que se destinam diretamente a cada colheita.[3] Vejamos agora a distinção entre benfeitorias necessárias e úteis. Ainda do domínio do Código Civil de 1867, Cunha Gonçalves[4] distinguia tais categorias nos seguintes moldes: «(…) benfeitorias necessárias são as “despesas indispensáveis para a conservação da cousa (…), isto é, para manter íntegra a cousa na sua função económica normal e cuja omissão importaria, ou a destruição, ou a deterioração da cousa ou do seu estado de utilização. São as “reparações ordinárias e extraordinárias” (…), tais como consertos dos telhados, caiações ou pinturas das paredes exteriores e das portas e janelas, reposição dos vidros partidos, restauração dos muros parcialmente caídos, etc. Benfeitorias necessárias podem ser também obras novas, como a construção de sebes, valados e muros, a colocação de marcos divisórios, se forem indispensáveis para a conservação da integridade da cousa; ao passo que simples reparações, quando dispensáveis, não serão benfeitorias necessárias. Benfeitorias úteis (…) são aquelas que, não sendo indispensáveis para a conservação da cousa, lhe aumentam todavia o valor. São os melhoramentos (…); e a maior valorização pode realizar-se com ou sem aumento de rendimento. Em geral, são benfeitorias úteis as novas construções, as novas plantações, as inovações ao modo de desfrutar a cousa, as aberturas de poços e fontes, etc.» E, segundo o ensinamento de Oliveira Ascensão[5]: «As benfeitorias estão ligadas ao poder jurídico de transformação, que é um dos aspectos do gozo. São melhoramentos de uma coisa, portanto alterações nela realizadas com o fim de a beneficiar. Consoante o benefício efectivamente obtido distinguem-se em necessárias, úteis e voluptuárias (art.º 216.º/2 e 3). São necessárias as que evitam o detrimento da coisa; úteis as que aumentam a potencialidade de gozo desta (…).» Se a distinção entre benfeitorias necessárias e úteis, no plano teórico, se apresenta fácil, já a sua aplicação prática se revela, por vezes, dificultosa. No caso presente, torna-se crucial saber se o ovil e sala de ordenha mecânica, as cercas para parqueamento de gados e a dita “eletrificação agrícola” implantadas pelo rendeiro constituem obras indispensáveis à conservação e normal funcionamento do prédio em que foram incorporadas, como unidade económica de exploração agro-pecuária, atendendo ao seu estado de conservação, aquando o início do arrendamento em 1986. E se, por conseguinte, a falta de tais obras se traduziria em deterioração do prédio em que foram incorporadas, na perspetiva dinâmica do normal aproveitamento das suas potencialidades económicas. Sobre o alcance a dar à categoria de “benfeitorias necessárias” no tipo de casos como o presente, que envolve prédios destinados a exploração agro-pecuária, no acórdão do STJ, de 19/05/2011, proferido no processo n.º 892/05.7TBSTC.E1.S1[6], citado pelos aqui Recorrentes, foi considerado o seguinte: «Em terrenos destinados à exploração agrícola ou agro-pecuária, ninguém poderá validamente sustentar que a instalação electricidade, desmatação, dotação de águas canalizadas, reconstruções de habitações, reparação de pocilgas e currais, etc., constituem, na era em que vivemos, simples benfeitorias destinadas a aumentar-lhes o valor e não essenciais ou indispensáveis à sua conservação e ao funcionamento normal das actividades que em tais terrenos se executam. Trata-se, na verdade, de melhoramentos indispensáveis à manutenção (conservação) e funcionamento da coisa enquanto unidade económica, apta a desempenhar a função ou actividade para a qual foi destinada ou que nela tem vindo a ser exercida. Importa ter em atenção que a terminologia legal respeita a conceitos normativos, vale dizer, axiológico-valorativos, pois o Direito é uma ciência normativa que não se restringe aos conceitos ôntico-naturalísticos ou fenomenológicos. Desta sorte, importa ter presente que o conceito de perda ou de deterioração não pode ser encarado somente no sentido naturalístico de desaparecimento físico (como acontece com as coisas consumíveis), mas, porque se trata de conceitos normativos (Normativerbegriffe) eles terão uma abrangência que inclui o normal aproveitamento das suas potencialidades ou funcionamento, o que não se confunde com a frutificação.» Nestas judiciosas considerações encontra-se bem refletida a ideia de que a aferição de melhoramentos em prédios daquela natureza e destino económico, para efeitos de qualificação de benfeitorias necessárias, se deve pautar por critérios normativos que enquadrem a coisa benfeitorizada sob o um prisma de compreensão dinâmica em torno da sua função económica, como unidade produtiva, e do inerente aproveitamento das suas potencialidades, em detrimento de uma visão meramente estruturalista ou estática com mero enfoque nas exigências de conservação do corpus predial. Nessa perspetiva, serão de considerar como benfeitorias necessárias os incrementos indispensáveis à prossecução da função e do normal rendimento económico da coisa benfeitorizada, sem os quais esta sofreria depreciação. Cremos que este método de abordagem é o que melhor se adequa a uma aplicação eficiente do direito em sintonia com o devir próprio da vida social. Contudo, a qualificação jurídica de benfeitorias necessárias nos casos e termos referidos requer a comprovação de uma factualidade que espelhe, além das características geofísicas e da vocação económica do prédio benfeitorizado, em particular, o modo de exploração nele exercido antes do melhoramento e depois com este prosseguido, em ordem a surpreender como e em que medida tal melhoramento se tornou elemento indispensável à conservação da função e normal aproveitamento económico daquele bem. A este propósito, convém notar que, no caso de que se ocupou o citado acórdão do STJ de 19/05/2011, dos factos ali dados por provados consta o modo de exploração evolutivo do prédio ali em referência – antes da sua benfeitorização (alíneas NN e OO) e depois dela (alíneas PP a UU) –, sendo até dado como provado (alínea BBB) que “umas dessas obras foram necessárias para evitar a perda, destruição ou deterioração da parte urbana do locado, enquanto outras aumentaram o seu valor. Também o acórdão do STJ, de 17/12/2002, proferido no processo n.º 02A3632[7] ocupou-se de um caso em que ficou provado que: - aquando do início do arrendamento, os terrenos estavam sem ser cultivados, encontrando-se a terra na sua maior extensão com tojo e codessos, e que um desses terrenos estava encharcado; - a Quinta e terrenos que passaram a ser explorados pelo réu necessitavam de ser adaptados para a exploração que se pretendia passar a ser efetuada em consequência do contrato; - o réu efetuou a drenagem do solo através de canalizações, procedeu à limpeza da terra, à sua mobilização a grande profundidade, surribando-a, e à sua fertilização. Considerou-se assim que a despesa feita com tais melhoramentos visou criar condições para a produção de fruta em benefício da atividade do benfeitorizante e da Quinta, que se encontrava em progressiva degradação, recuperando-se, desse modo, a sua produtividade. Nessa base, concluiu-se que a despesa efetuada consubstanciava uma benfeitoria necessária, já que evitara a deterioração da Quinta, recuperando-a e melhorando a sua produtividade. No caso dos presentes autos, da factualidade provada colhe-se que, aquando do início do contrato de arrendamento (1986/1987), o monte e as suas dependências estavam degradados e destruídos (ponto 1.59), tendo sido estipulado que o rendeiro ficava com a obrigação de proceder à conservação dos prédios urbanos dados no arrendamento (ponto 1.16) e que para realizar obras futuras, designadamente construções e parques para gados, necessitava de autorização do senhorio (ponto 1.15). Significa isto que, perante o referido estado de degradação do monte e suas dependências, além de ser cometida ao rendeiro a obrigação de conservar a parte urbana dos locados, foi ainda preconizada a realização por ele de obras futuras, incluindo construções e parques para gados, para o que necessitaria, no entanto, da autorização do senhorio. Nessa conformidade, logo em 13/04/1987, o A. solicitou e obteve do senhorio autorização para proceder à execução de cercas num perímetro de 4.000 metros (ponto 1.25) e, em 02/06/1992, para a implantação de mais 5.000 metros (ponto 1.37). Todavia, os A.A. implantaram cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros, dos quais 3.975 metros construídos em 1988 e 4.635 metros construídos em 1990 (pontos 1.38 e 1.40). Além disso, em março de 1990, o A. requereu e obteve autorização do senhorio para a edificação de um ovil e sala de ordenha mecânica nos prédios locados (pontos 1.26 e 1.27), tendo realizado uma edificação de raiz com 650 m2 e 700 m2, respetivamente, com comedouros e bebedouros, água com bomba do poço, em alvenaria, tijolo furado, rebocada e revestida a azulejo até 2 metros, com cobertura de fibrocimento e pavimento em mosaico cerâmico (pontos 1.35 e 1.39). Também em março de 1990, os A.A. requereram e obtiveram autorização do senhorio para a eletrificação (pontos 1.26 e 1.27), tendo procedido à eletrificação, além da habitação, de todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenha, com a montagem de um de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas (pontos 1.36 e 1.41). Assim, a unidade de exploração agro-pecuária arrendada, dantes degradada, passou a dispor de novas estruturas e equipamentos como são o ovil e sala de ordenha mecânica, as cercas para parqueamento dos gados e a eletrificação, o que não pode deixar de ser tido como elementos indispensáveis para um normal desempenho da respetiva função económica numa linha de modernização que, obviamente, já naquela altura se impunha. Neste contexto, afigura-se existir tal indispensabilidade económica tanto no que respeita à construção do ovil e da sala de ordenha, como no tocante à dita “eletrificação agrícola”. De igual modo, as cercas para parqueamento dos gados constituem dispositivos operacionais para o necessário maneio seletivo dos rebanhos, numa conjuntura de escassez da mão-de-obra que era utilizada no tradicional pastoreio de vigia; bem sintomático da sua importância é o facto de terem sido logo preconizadas no contrato, sendo as primeiras cercas autorizadas pelo senhorio logo em 13/04/1987. De resto, mal se compreenderia que o esforço de investimento do rendeiro na realização das demais obras de conservação e restauro da parte urbana dos locados não fosse acompanhado do investimento em estruturas e equipamentos destinados a proporcionar um rendimento produtivo compensador do esforço financeiro de conservação e restauro. Nesta perspetiva integrada e funcional do arrendado, as referidas obras de inovação realizadas pelo rendeiro – ovil e sala de ordenha mecânica, cercas para parqueamento de gados e eletrificação -, dantes não existentes, traduzem-se em fatores que, além de valorizarem a coisa benfeitorizada, se revelam indispensáveis ao seu normal desempenho e aproveitamento económico, como unidade produtiva, sem as quais se acentuaria o estado de degradação ou depreciação existente aquando do início do arrendamento. Por isso, à luz dos ensinamentos doutrinários e jurisprudenciais acima convocados, não hesitamos em qualificar tais inovações como benfeitorias necessárias, porquanto, parafraseando Cunha Gonçalves, “indispensáveis para a conservação da integridade da cousa”, tendo em vista a função económica integrada que lhe foi contratualmente destinada. Aqui chegados, importa agora atentar no regime respeitante à respetiva indemnização do arrendatário rural. Como já acima foi dito, o contrato de arrendamento em referência iniciou-se sob a vigência do regime do contrato de arrendamento rural constante da Lei n.º 76/77, de 29/09, alterada pela Lei n.º 76/79, de 03/12, mas passou a reger-se pelo regime introduzido pelo Dec.-Lei n.º 385/88, de 25/10, com início de vigência em 30/10/1988, aplicável aos contratos então existentes nos termos do respetivo artigo 36.º. Assim, porque, pelo menos, uma das benfeitorias aqui em causa, mais precisamente a implantação de 3.975 metros de cercas, foi autorizada pelo senhorio em 1987 e realizada em 1988, haverá que, quanto a esta, tomar em consideração do regime da Lei n.º 76/77, inscrevendo-se às restantes no domínio de vigência do regime introduzido pelo Dec.-Lei n.º 385/88. Ora, o artigo 15.º da Lei 76/77, de 29/09, prescrevia, quanto a benfeitorias a realizar pelo arrendatário, o seguinte: 1 - O arrendatário poderá fazer no prédio ou prédios arrendados benfeitorias úteis com consentimento do senhorio ou, na falta deste, mediante a elaboração de um plano prévio, semelhante ao exigido para a reconversão agrícola do prédio ou prédios arrendados, a aprovar pela comissão concelhia de arrendamento rural, sob parecer favorável dos competentes serviços do Ministério da Agricultura e Pescas, a emitir no prazo máximo de sessenta dias, a contar da data de recepção do pedido da comissão, que o considerará como dado favoravelmente se não for prestado em tal prazo. (…) 3 - As benfeitorias referidas nos números anteriores poderão implicar alteração da renda ou do prazo do contrato, o que será objecto de decisão aprovatória do plano ou dos interessados, conforme os casos. (…) 5 - O arrendatário poderá fazer no prédio ou prédios arrendados benfeitorias necessárias sem observância dos requisitos referidos no n.º 1, aplicando-se o regime do Código Civil. E o artigo 25.º do mesmo diploma dispunha que: 1 - Aquando da cessação da relação contratual, o arrendatário tem direito a exigir do senhorio indemnização: a) - Se tiver feito benfeitorias, consentidas expressa ou tacitamente pelo senhorio ou aprovadas pela comissão concelhia de arrendamento rural; b) - Se, sem oposição expressa do senhorio, tiver feito plantações ou trabalhos de melhoramento ou modificação do solo que o tornaram cultivável ou beneficiaram manifestamente a sua normal produtividade, ainda que não objecto da aprovação aludida na alínea anterior. 2 - A indemnização será calculada tendo em conta o valor das benfeitorias ou demais melhoramentos no momento da cessação do contrato. Por sua vez, o Dec.-Lei n.º 385/88, de 25/10, que revogou e substituiu o regime precedente, veio estabelecer no seu artigo 14.º, sob a epígrafe benfeitorias, o seguinte: 1 - O arrendatário pode fazer no prédio ou prédios arrendados benfeitorias úteis com o consentimento escrito do senhorio ou, na falta deste, mediante um plano de exploração a aprovar pelos serviços regionais do Ministério da Agricultura, Pescas e Alimentação no prazo de 90 dias a contar da recepção do pedido, depois de ouvidas as partes ou seus representantes. (…) 3 - As benfeitorias referidas no n.º 1 poderão implicar alteração do prazo do contrato e as constantes do n.º 2 poderão fazer alterar o prazo do contrato e o montante da renda, alterações que serão acordadas entre as partes e, em caso de discordância, estabelecidas na decisão aprobatória do plano. (…) E o respetivo artigo 15.º, sob a epígrafe indemnização por benfeitorias, prescrevia que: 1 - Quando houver cessação contratual antecipada por acordo mútuo das partes, haverá lugar a indemnização das benfeitorias realizadas pelo arrendatário e consentidas pelo senhorio. 2 - A indemnização, quando a ela houver lugar, será calculada tendo em conta o valor remanescente e os resultados das benfeitorias ou demais melhoramentos no momento de cessação do contrato. 3 - Se houver resolução do contrato invocada pelo senhorio, ou quando o arrendatário ficar impossibilitado de prosseguir a exploração por razões de força maior, tem o arrendatário direito a exigir do senhorio indemnização pelas benfeitorias necessárias e pelas úteis consentidas pelo senhorio, calculadas estas segundo as regras do enriquecimento sem causa. Perante este quadro legal, as instâncias, tendo qualificado as benfeitorias aqui em causa como úteis, dissentiram, no entanto, quanto à sua ressarcibilidade. Assim, enquanto que a 1.ª instância entendeu que havia lugar a indemnização nos termos gerais do artigo 1273.º do CC, a Relação considerou que, à exceção das cercas implantadas ainda sob a vigência da Lei n.º 76/77, as demais benfeitorias não eram indemnizáveis, perfilhando o entendimento adotado no acórdão do STJ, de 15/01/2002, proferido no processo n.º 01A2834[8], segundo o qual o regime consagrado nos artigos 14.º e 15.º do Dec-Lei n.º 358/88, ao não contemplar a indemnização por benfeitorias úteis realizadas pelo arrendatário em caso de denúncia do contrato, afastava a aplicação do regime geral do Código Civil. Com efeito, naquele aresto foi considerado que o regime consagrado no Dec.-Lei n.º 358/88 veio prover de forma bastante diferente, em relação aos regimes antecedentes, sobre a indemnização devida ao arrendatário das benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio, distinguindo, para o efeito, as causas de cessação do arrendamento rural e só contemplando a respetiva ressarcilibidade nos casos de cessação antecipada por mútuo acordo (art.º 15.º, n.º 1), resolução pelo senhorio por culpa do arrendatário e cessação por impossibilidade de força maior deste (art.º 15.º, n.º 2), afastando assim, por exemplo, tal indemnização em caso de denúncia do contrato pelo senhorio, mormente nos termos gerais do CC. Tal solução foi ali justificada com o argumento de que, sendo facultada ao arrendatário a alteração do prazo contratual em caso de realizar benfeitorias úteis com consentimento do senhorio, nos termos do artigo 14.º, n.º 3, do Dec.-Lei n.º 385/88, a compensação desse investimento haveria de ser lograda por via da alteração daquele prazo, que não pela via indemnizatória. Se é certo que esse entendimento tem vindo a ser seguido, sem grande questionamento, em especial por alguma jurisprudência das Relações, não é menos certo que não tem sido inteiramente acolhido, nomeadamente, pela jurisprudência deste Supremo, como, por exemplo, no acórdão, de 23/04/2002, proferido no processo n.º 01A4298[9], num caso em que, não obstante a solução a que ali se chegou, foi considerado aplicável às benfeitorias úteis realizadas pelo arrendatário rural o disposto no art.º 1273.º do CC. Mais recentemente, no acórdão do STJ, de 13/03/2018, proferido no processo n.º 390/09.0T2ODM.E1[10] foi também afirmado que o regime constante do Dec.-Lei n.º 385/88 introduziu “modificações substanciais em matérias de benfeitorias e direito à sua indemnização (art.º 15.º, para os casos aí referidos e regime geral do possuidor benfeitorizante para as situações não indicadas)”. Também Jorge Aragão Seia, Manuel da Costa Calvão e Cristina Aragão Seia, in Arrendamento Rural, Almedina 4.ª Edição, pp. 114-115, em comentário ao indicado art.º 15.º, a propósito da indemnização por benfeitorias especificamente no caso de denúncia do contrato, escrevem o seguinte: «Benfeitorias necessárias O arrendatário tem sempre direito a indemnização, sejam ou não consentidas – n.º 1 do art. 1273.º do C.C. Benfeitorias úteis Tem de aplicar-se o regime geral, com a modificação que resulta do art.º 14.º. O arrendatário só as pode fazer com consentimento do senhorio ou de acordo com o plano. Pode sempre levantá-las, se isso for possível sem detrimento do prédio – n.º 1 do art. 1273.º do C.C (…) Havendo detrimento, nunca as pode levantar. Quando, para evitar o detrimento do prédio, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, o senhorio satisfará ao arrendatário o valor delas, calculado segundo as regras do enriquecimento sem causa – n.º 2 do art. 1273.º do C.C. – se as tiver consentido ou se tiverem sido feitas de acordo com o plano.» No mesmo sentido e com argumentação mais desenvolvida foi o douto parecer junto a fls. 300-327. Muito embora a qualificação acima assumida das benfeitorias em causa como necessárias dispense uma análise detalhada da referida questão, que se circunscreve às benfeitorias úteis, sempre diremos que uma interpretação de alcance sistemático e teleológico das normas contidas nos artigos 14.º e 15.º do Dec.-Lei n.º 385/88 não autoriza a que se tenha por afastado o regime geral do artigo 1273.º do CC. Em primeiro lugar, não se afigura que tais normas revistam natureza excecional, constituindo antes segmentos do regime especial do arrendamento rural, compagináveis, nessa medida, com a aplicação subsidiária das normas gerais da locação não excluídas por aquele regime especial, como são as respeitantes à indemnização por benfeitorias a coberto do artigo 1046.º, n.º 1, do CC, em que o locatário é, para tal efeito, equiparado ao possuidor de má-fé, nos termos do 1273.º do mesmo Código. Não se tratando, portanto, de normas excecionais (em especial as do artigo 15.º do Dec.-Lei n.º 385/88), não vemos também que possam ser, sem mais, interpretadas a contrario sensu[11]. O facto de, no indicado artigo 15.º, não se encontrar prevista indemnização por benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio em caso de denúncia do arrendamento por iniciativa deste não significa, por si só, que lhes não possam ser aplicáveis, a título subsidiário, os termos gerais do artigo 1273.º do CC. Nem o facto de o artigo 14.º, n.º 1 e 3, permitir que, em caso de benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio, o arrendatário altere o prazo do contrato se mostra decisivo, a nosso ver, para concluir que tenha sido essa a única via consagrada para o arrendatário obter o retorno do investimento benfeitorizante, ressalvados os casos previstos no artigo 15.º. Com efeito, não se descortina razão ponderosa para que ao arrendatário seja atribuído o direito a indemnização pelas benfeitorias úteis nos casos previstos no artigo 15.º, n.º 1 e 3, do Dec.-Lei n.º 385/88 – cessação antecipada do contrato por acordo, resolução do contrato pelo senhorio e impossibilidade de o arrendatário prosseguir a exploração por razão de força maior – e já não em caso de denúncia do contrato pelo senhorio, que nem tão pouco é imputável ao arrendatário. Também o artigo 15.º, n.º 3, da Lei n.º 76/77 previa a alteração da renda ou do prazo do contrato, nomeadamente nos casos de benfeitorias úteis realizadas pelo arrendatário com consentimento do senhorio, sem que isso implicasse a perda do direito a indemnização pelas respetivas benfeitorias como decorria do artigo 25.º da mesma Lei. E note-se que, já em sede do atual regime de arrendamento rural constante do Dec.-Lei n.º 294/2009, de 13/10, podendo ser convencionada mediante escrito, por iniciativa do arrendatário, a alteração da data da cessação do contrato, nomeadamente, quando este realizar, com autorização do senhorio, investimento de desenvolvimento, melhoria ou reconversão cultural ou obras de beneficiação do prédio, nos termos do respetivo art.º 9.º, n.º 7, mesmo assim há lugar a indemnização pelas benfeitorias úteis realizadas pelo arrendatário com o consentimento do senhorio, sem diferenciação da causa de cessação do contrato, nos termos do artigo 23.º, n.º 5, do referido diploma. Neste horizonte de evolução legislativa, não se divisa que com o regime intermédio consagrado no Dec.-Lei n.º 385/88 se tenha pretendido um desvio tão restritivo no sentido de só permitir a indemnização por benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio nas hipóteses contempladas no respetivo 15.º. Mas avisado parece ser o entendimento sustentado no douto parecer de fls. 300-327 no sentido de que a consagração do direito a indemnização por benfeitorias nos casos previstos no artigo 15.º do referido Dec.-Lei teve em vista consagrar expressamente tal direito naqueles casos em que poderia ser duvidosa essa atribuição, dado tratar-se de situações, de algum modo, imputáveis ou ligadas ao arrendatário, mas nunca afastar a aplicação subsidiária dos termos gerais do CC aos demais casos ali não contemplados. E, salvo o devido respeito, não se coloca aqui a hipótese de lacuna do regime especial do arrendamento rural a integrar por via da analogia legis, como foi perspetivado no acórdão recorrido, considerando, porém, não ocorrer lacuna a preencher, mas simplesmente perante uma situação de aplicação subsidiária do regime geral da locação. Em suma, conclui-se que, no domínio do regime constante do Dec.-Lei n.º 358/88, nos casos de denúncia do arrendamento rural pelo senhorio, como é o caso dos presentes autos, assiste ao arrendatário o direito de ser indemnizado: a) - pelas benfeitorias necessárias mesmo que não consentidas pelo senhorio, nos termos do artigo 1273.º, n.º 1, 1.ª parte, do CC; b) – pelas benfeitorias úteis consentidas pelo senhorio, quando não possa haver lugar ao seu levantamento sem detrimento da coisa benfeitorizada, segundo as regras do enriquecimento sem causa, nos ter-mos conjugados dos artigos 14.º, n.º 1, do Dec.-Lei n.º 358/88 e 1273.º, n.º 1, 2.ª parte, e 2, do CC. À luz deste quadro normativo, as benfeitorias aqui em causa, qualificadas de necessárias como foram, são suscetíveis de indemnização pelo valor do seu custo, tanto as que se realizaram no domínio da Lei n.º 76/77, nos termos dos respetivos artigos 15.º, n.º 5, e 25.º, n.º 2, como as que foram efetuados já na vigência do Dec.-Lei n.º 385/88, estas por aplicação subsidiária do artigo 1273.º, n.º 1, 1.ª parte, do CC. E diga-se que mesmo que tais benfeitorias fossem qualificadas de úteis, desde que consentidas pelo senhorio, sempre seriam passíveis de indemnização, ainda que segundo as regras do enriquecimento sem causa, nos termos do artigo 14.º, n.º 1, daquele Dec.-Lei e do artigo 1273.º, n.º 1, 2.ª parte, e 2, do CC. Importa agora saber qual o montante indemnizatório a que os A.A. poderão ter direito pelas benfeitorias necessárias em apreço. De acordo com o disposto no citado artigo 1273.º, n.º 1, 1.ª parte, “tanto o possuidor de boa-fé como o de má-fé têm o direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito”, evitando-se assim o locupletamento injusto por parte do proprietário da coisa benfeitorizada. Segundo o ensinamento de Pires de Lima e Antunes Varela[12], essa obrigação de indemnizar “deve ser considerada como uma dívida de valor e, como tal, actualizada em função da depreciação que o valor da moeda entretanto tenha sofrido”. Esclarecem aqueles Autores[13] que: «Entre a data da realização das benfeitorias e a data em que é reclamada a respectiva indemnização pode mediar um longo período e o possuidor deve receber o valor real que despendeu para conservar a coisa ou para lhe introduzir melhoramentos» Assim, no que respeita ao ovil e sala de ordenha mecânica, está provado que têm o valor atual não inferior a € 100.000,00 – ponto 1.39 -, o que só pode significar ser esse o valor atualizado daquelas benfeitorias à data mais recente a considerar, nos termos do artigo 566.º, n.º 2, in fine, do CC, ou seja, o encerramento da discussão em 1.ª instância. Relativamente às cercas para parqueamento dos gados está provado que: «Os A.A. implantaram cercas para o parqueamento dos gados, em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros, ascendendo ao valor de € 17.722,96, correspondendo 3.975 metros, construídos em 1988, ao valor de € 2.921,63 e 4.635 metros, construídos em 1990, ao valor de € 2.433,38, valores estes reportados ao ano de 2005» - pontos 1.38 e 1.40. Atendendo a que as cercas implantadas constituem benfeitorias necessárias, cuja indemnização não depende de terem sido ou não consentidas pelo senhorio, serão todas elas considerados no valor total de € 17.722,96, valor este tido por atual em 2005, que será tido, portanto, como data mais recente a tomar em linha de conta, com que os A.A./Recorrentes se conformam. Quanto às obras de eletrificação, ficou provado que: «Os A.A. procederam a obras de eletrificação, além da habitação, de todas as demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a montagem de um de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas; caso tivessem sido executadas aquelas obras em janeiro de 2006, teriam um valor de € 43.500,00» – pontos 1.36 e 1.41, este alterado pela Relação (fls. 2558). Sucede que o indicado valor de € 43.500,00 se encontra calculado para a eventualidade, não comprovada, de terem sido executadas em 2006, o que não corresponde, necessariamente, ao seu valor atualizado a essa data. Por outro lado, como acima foi referido, nesse valor total está incluída a eletrificação da habitação que já fora tida em conta, pela primeira instância, na compensação das rendas não pagas relativas ao período de 1986 a 1991, segundo o acordo de 1992 referido no ponto 1.46 dos factos provados, o que não foi impugnado pelos A.A.. Assim sendo, importa agora apurar o valor atualizado das obras de eletrificação demais dependências urbanas, palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas, com a montagem de um de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas, dentro do limite ora peticionado. Tal apuramento poderá ser feito em ulterior incidente de liquidação. Posto isto, coloca-se agora a questão de saber se os valores das referidas benfeitorias se deverão ter por compensados nas rendas não pagas relativos aos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/1991, em virtude do acordo celebrado em 1992 descrito no ponto 1.46 dos factos provados, questão sobre a qual as instâncias tiveram entendimento divergente. Neste particular, na 1.ª instância, foi entendido que tal compensação só abarcava as obras realizadas na parte urbana do locado por se confinar a esta parte a designação tradicional e corrente de “monte”. Por seu lado, a Relação considerou que a referência a “monte” feita no sobredito acordo de 1992 constante do escrito de fls. 757, dado o seu contexto, se reportava ao “II” ali designado, compreendendo, portanto, todas as obras nele implantadas e consentidas pelo senhorio. Ora, o vocábulo “monte” aplicado às herdades alentejanas, pode ser empregue com dois alcances distintos: - um em sentido restrito ou técnico, que compreende apenas o conjunto edificativo urbano da herdade, situado normalmente em sitio elevado – habitação principal e demais dependências urbanas[14]; - outro de sentido mais amplo, que designa toda a propriedade rural. Poder-se-ia, pois, dizer que a referência a “monte” consignada naquele escrito tanto pode significar a parte urbana, como querendo designar porventura toda a herdade. Sucede que do documento de fls. 757 consta mais precisamente a locução “arranjos do Monte”. Assim, muito embora o termo “monte” se possa ali apresentar ambíguo, já a referência a “arranjos” tem o sentido comum de “consertos” ou “reparações”, não se afigurando adequado para designar as obras inova-doras como são as aqui em causa – o ovil e sala de ordenha mecânica, as cercas e a dita “eletrificação agrícola”. Todas elas constituem antes obras e equipamentos de vulto, incorporados de novo no locado para o desempenho normal da sua função económica, como unidade produtiva agro-pecuária, e que, por isso, não podem ser consideradas como “arranjos”, para mais atendendo ao seu expressivo custo em relação aos montantes das rendas não pagas. Nesta conformidade, impõe-se concluir que as benfeitorias em causa não se encontram compreendidas na compensação a que se refere o acordo de 1992 mencionado no ponto 1.46. Em síntese, assiste aos A.A. o direito a serem indemnizados pelos R.R. quanto às benfeitorias necessárias em causa, nos seguintes termos: i) – pelo ovil e sala de ordenha mecânica, no valor de € 100.000,00 (cem mil euros); ii) – pelas cercas implantadas para parqueamento de gados em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros, no valor de € 17.722,96 (dezassete mil setecentos e vinte e dois euros e noventa e seis cêntimos); iii) – pela eletrificação, à exceção da habitação, de todas as demais dependências urbanas - palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenhas - com a monta-gem de um de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas, no valor atualizado a liquidar ulteriormente, dentro do limite máximo de € 43.500,00 traçado pelos A.A./Recorrentes. 4.3. Quanto ao direito de retenção e à licitude da ocupação do locado nessa base Pugnaram os A.A. ora Recorrentes pelo reconhecimento do seu direito de retenção sobre o locado como garantia do direito à indemnização pelas benfeitorias em causa e, consequentemente, pela licitude da ocupação que fizeram daquele locado. Por sua lado, na ação apensa os ali A.A. e aqui R.R., pediram a condenação dos ali R.R. e aqui A.A. a pagar-lhes uma indemnização devida pela ocupação ilícita do imóvel desde 1998/1999, supostamente desde a cessão do arrendamento por denúncia do senhorio com efeitos a partir de 15/08/1999 até 19/05/2003, data do despacho que ordenou o despejo no processo n.º 128/00, no valor de € 21.634,16. Sucede que o direito a benfeitorias e o correspetivo direito de retenção invocados pelos A.A. foram-lhes reconhecidos em 1.ª instância, mas negados pelo Tribunal da Relação através do acórdão proferido a fls. 2266-2292, de 16/06/ 2016. No âmbito do recurso de revista então interposto pelos A.A. da ação principal, foi proferido por este Supremo o acórdão de fls. 2437-2456, de 08/06/2017, em que, no que aqui releva, se considerou o seguinte: «(…) em caso de entrega judicial a que o retentor não opôs oportunamente, como lhe era facultado, o direito de retenção, é forçoso concluir que o não uso dessa faculdade equivale a renúncia tácita deste direito real de garantia e portanto extintiva do mesmo, nos termos do artigo 761.º do CC, sem prejuízo da subsistência do direito a benfeitorias que lhe estiver associado, mas agora desprovido daquela garantia.» Não obstante isso, foi também ali considerado que, uma vez efetuada a entrega judicial da coisa retida, sem que o executado tivesse invocado o direito a benfeitorias que autorizassem a retenção da coisa, se extinguia o direito de retenção de que porventura gozasse, sendo que, no caso, a entrega judicial ocorrera em 02/05/2006. Nessas circunstâncias, no referido acórdão, decidiu-se: b) – Confirmar o segmento decisório do acórdão recorrido sobre a preclusão do direito de retenção com a entrega judicial dos prédios em causa; c) – Em consequência disso, determinar que os autos baixem à Relação para conhecer do objeto da apelação interposta da sentença da 1.ª instância no respeitante ao direito às benfeitorias ali reconhecido e ao direito de retenção até à sobredita entrega judicial. Foi assim deixada ao Tribunal da Relação margem para, consoante a apreciação que viesse a fazer sobre o peticionado direito a benfeitorias, ajuizar também sobre a existência ou não do correspetivo direito de retenção até à referida entrega judicial e, consequentemente, sobre a licitude/ ilicitude da ocupação do locado pelos autores da ação principal e de que dependiam as pretensões indemnizatórias deduzidas pelos autores na ação apensa, aqui réus. Foi nessa base que o acórdão ora recorrido, tendo negado aos A.A. o direito a indemnização por benfeitorias, considerou não existir fundamento para aqueles não procederem à entrega dos imóveis a partir da cessação do contrato de arrendamento por denúncia, ocorrida em 15/08/1999, considerando ilícita a conduta dos A.A. desde então. No entanto, tendo em conta que os senhorios – autores na ação apensa e aqui réus – só peticionaram o pedido de indemnização por ocupação ilícita até à data da prolação do despacho que ordenou o despejo, em 19/05/2003, arbitrou-lhes a indemnização de € 16.874,40, até esta data, nos termos do artigo 1045.º, n.º 1, do CC. Da factualidade provada, no que aqui releva, consta que: 1.18. Por despacho proferido, em 19/05/2003, no processo n.º 128/00 intentado pelos ora apelantes contra os ora apelados, foi ordenado o despejo dos locados – alinea S). 1.19. AA e mulher BB interpuseram recurso para o Tribunal da Relação de … do despacho referido, ao qual, por despacho proferido em 30/01/2004, foi fixado efeito suspensivo – alínea T); 1.20. Por despacho proferido em 17/01/2004 no Proc. 128/00, foi o recurso mencionado em 1.19 (T) julgado deserto por falta de alegações – alínea U); 1.21. AA e mulher BB desistiram do recurso interposto do despacho referido em 1.20 (U) que julgou deserto o recurso interposto do despacho que ordenou a emissão de mandados de despejo – alínea V). 1.22. Por termo efetuado em 02/05/2006 no âmbito do Proc. 128/00, foram entregues as chaves dos prédios pelos AA e mulher BB aos autores do processo apenso – alínea X); 1.46. Em 1992, porque se encontravam em dívida as rendas dos anos de 1986/1987, 1987/1988, 1988/1989, 1990/1991, foi acordado que as mesmas não seriam pagas ao senhorio para serem imputadas ao valor dos arranjos efetuados pelos A.A. no “Monte” – facto 22 provado em audiência; 1.63. A renda relativamente ao contrato referido na alínea A) da base instrutória de fls. 410-411, correspondentes aos pontos 1.12 a 1.14 dos factos aqui provados, passou a ser de 900.000$00, a partir da renda vencida em 15/08/1996 – aditado pela Relação a fls. 2561; 1.64. Os R.R. efetuaram apenas o pagamento da renda relativa à ocupação dos prédios arrendados concernente ao ano de 1998/1999 – aditado pela Relação a fls. 2562. Ora, definido que ficou, no ponto precedente, o direito dos A.A. a indemnização pelas benfeitorias em causa, assistia-lhe, correspondentemente, à data da denúncia do contrato, o direito de retenção do locado nos termos da regra geral do artigo 754.º em conjugação com os artigos 1046.º, n.º 1, e 1273.º do CC[15]. Nem da factualidade provada se colhe que tais benfeitorias tenham sido realizadas de má-fé pelos arrendatários para que se considerasse excluído o direito de retenção nos termos do art.º 756.º, alínea b), do CC. No entanto, tal direito extinguiu-se, entretanto, por renúncia tácita dos arrendatários, nos termos do artigo 761.º do CC, ao não terem invocado aquele direito em sede de embargos à execução judicial do despejo, deduzidos em 11/07/2000, despejo este que acabou por ser ordenado no despacho de 19/05/2003, do qual foi interposto recurso pelos aqui A.A., a que foi então fixado efeito suspensivo, por despacho de 30/01/2004. Daqui resulta que os A.A. mantiveram a ocupação lícita do locado ainda após a cessação do arrendamento em 15/08/1999, na base do seu direito de retenção, como garantia do direito de indemnização por benfeitorias, até à respetiva renúncia em virtude da sua não invocação em sede dos embargos à execução do despejo, deduzida em 11/07/2000, conforme documento de fls. 96-103 – ponto 1.66. Só depois desta data é que a ocupação dos A.A. deve ser considerada ilícita, dada a subsistência da cessação do arrendamento conjugada agora com a referida extinção do direito de retenção, não obstante a suspensão da execução e o efeito suspensivo atribuído ao despacho que ordenou o despejo. Assim sendo, aos R.R., autores na ação apensa, assiste o direito a uma indemnização correspondente à renda anual de 900.000$00, equivalente a € 4.489,18, fixada em 1996, ao abrigo do artigo 1045.º, n.º 1, do CC, a partir de 11/07/2000 exclusive e até 19/05/2003 inclusive, data esta a que aqueles confinaram o seu pedido. Termos em que se impõe alterar a decisão recorrida nesta parte, reduzindo a indemnização aos R.R. fixada pela Relação em € 16.874,40 a tais parâmetros temporais, donde resulta o valor indemnizatório, com arredondamento, de € 12.803,50 = [€ 4.489,18 x 2 anos + € 4.489,18 /365 x 311 dias]. 4.5. Quanto à questão subsidiária suscitada pelos Recorridos Os Recorridos pediram nas suas contra-alegações, a título subsidiário, que, caso se considere existir algum direito de indemnização por benfeitorias, deve ser deduzido o valor de € 17.471,00 correspondente às reparações de estragos no arrendado provadas nos pontos 1.54, 1,55 e 1.65. Sucede que a pretensão dos A.A. da ação apensa, aqui Recorridos, de condenação dos ali R.R. e aqui A.A./Recorrentes na sobredita indemnização foi julgada improcedente na primeira instância com confirmação pela Relação. Nessa medida, aos ora Recorridos, como vencidos nesse segmento decisório, cabia-lhes impugná-lo por via de recurso, o que não fizeram, não sendo idóneo, para tal, o mecanismo da ampliação do objeto da revista interposta pelos A.A., a título de defesa subsidiária, uma vez que esta só cabe à parte vencedora, nos termos do art.º 636.º do CPC. Assim, tendo os Recorridos decaído naquela pretensão, não se mostra lícito agora considerar o valor daqueles alegados estragos - tidos como não imputáveis aos arrendatários - dedutível aos valores, já dados como atualizados, das benfeitorias em causa. Termos em que improcede o assim pretendido pelos Recorridos. IV - Decisão
Pelo exposto, acorda-se em conceder parcialmente a revista, revogando-se a decisão recorrida e, em sua substituição, decide-se: A – Julgar procedente a pretensão dos A.A. da ação principal, AA e BB, quanto às benfeitorias em causa, condenando-se os R.R. CC, DD, EE, FF, GG, a pagar-lhes, a esse título, o seguinte: a) - € 100.000,00 (cem mil euros), pelo ovil e sala de ordenha mecânica; b) – € 17.722,96 (dezassete mil setecentos e vinte e dois euros e noventa e seis cêntimos), pelas cercas implantadas para parqueamento dos gados em toda a propriedade, com paus tratados, rede e arame farpado, num total de 19.760 metros; c) – no que se vier a liquidar ulteriormente, dentro do limite máximo de € 43.500,00, pela eletrificação, à exceção da habitação, de todas as demais dependências urbanas - palheiros, celeiro, cavalariça, armazéns, casa do caseiro, ovil, sala de ordenha - com a montagem de um posto de transformação (PT) rural, tipo AS 50 Kva E 30 Kva PT e bombas elétricas; B) – Reconhecer aos mesmos A.A. o direito de retenção sobre o locado associado às referidas benfeitorias até à sua extinção por não invocação do mesmo em sede dos embargos à execução de despejo, em 11/07/2000; C - Julgar procedente a pretensão dos A.A. da ação apensa, aqui Recorridos, de indemnização por ocupação ilícita do arrendado pelos ali R.R., ora Recorrentes, a partir de 11/07/2000 exclusive e até 19/05/2003 inclusive, condenando-se estes a pagar àqueles a quantia de € 12.803,50 (doze mil oitocentos e três euros e cinquenta cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação dos ora Recorrentes para aquela ação apensa, absolvendo-os no demais a esse título peticionado; D – Desatender a questão suscitada pelos Recorridos, em sede de ampliação da revista, a título de defesa subsidiária, relativa à pretendida dedução de despesas por estragos no arrendado. As custas da ação, na parte aqui impugnada, e as do recurso ficam a cargo das partes na proporção do respetivo decaimento, devendo as relativas à condenação ilíquida ser suportadas pelos A.A./ Recorrentes, mas a compensar posteriormente conforme o resultado dessa liquidação.
Lisboa, 19 de dezembro de 2018
Manuel Tomé Soares Gomes (Relator)
Maria da Graça Trigo
Maria Rosa Tching __________ [1] Neste sentido, vide acórdão do STJ, de 13/03/2018, proferido no processo n.º 390/09.0T2ODM.E1, relatado pela Juíza Cons. Fátima Gomes, acessível a Internet http://www.dgsi.pt/jstj. |