Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
Relator: | ERNESTO VAZ PEREIRA | ||
Descritores: | RECURSO PARA FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA PRESSUPOSTOS PRAZO DE INTERPOSIÇÃO DO RECURSO TRÂNSITO EM JULGADO EXTEMPORANEIDADE REJEIÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 11/23/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA (PENAL) | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário : | I. Um dos pressupostos formais do recurso para fixação de jurisprudência é o trânsito em julgado do acórdão recorrido. Como já se decidiu no acórdão deste Supremo de 11/03/2021, proc. nº 130/14, “Num plano mais lato, o que se sustenta é que no caso em que o recurso não é admissível para o STJ, a decisão transita a partir do momento em que já não é possível reagir processualmente à mesma, estabilizando-se o decidido, pelo que, no caso de decisões que não admitam recurso, o trânsito verifica-se findo o prazo para arguição de nulidades ou apresentação de pedido de correcção (arts. 379.º, 380.º e 425.º, n.º 4, do CPP), ou seja, o prazo-regra de 10 dias fixado no n.º 1 do art. 105.º do CPP, em caso de não arguição ou de não apresentação de pedido de correcção e, em caso de arguição, após o trânsito da decisão que conhece da arguição, data a partir do qual se inicia a contagem do prazo dos recursos extraordinários que pressupõe o trânsito em julgado. Deste modo, impede-se a abertura de uma nova via para prolongar, ou seja, alterar, os prazos legalmente estabelecidos.”. II. O entendimento unânime deste Supremo Tribunal de Justiça tem sido o de rejeitar, por intempestivo (prematuridade), o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido. III. A fixação do prazo peremptório de 30 dias para interposição de recurso de fixação de jurisprudência tem três consequências processuais, (i) a primeira é a de, por via do seu efeito preclusivo, o recurso não poder ser apresentado depois do decurso desse prazo; (ii) a segunda é a de que, apresentado antes de tempo, seja, antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido, por fora do prazo fixado, terminus intra quem, será rejeitado por intempestividade; (iii) a terceira é de que, em hipotético caso, não pode haver despacho de admissão proferido depois do trânsito, a convalidar a sua entrada intempestiva em tempestiva, com o argumento de que se é verdade que o recurso foi interposto antes do tempo já o subsequente despacho de admissão o foi no prazo de 30 dias. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os juízes da 3ª secção criminal I - RELATÓRIO 1. O Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Évora, em 17/06/2022, interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão proferido por essa Relação em 07/06/2022, invocando soluções opostas entre esse acórdão recorrido e um outro, o acórdão fundamento de 13/04/2022 da mesma Relação, este proferido no processo nº 914/18.1T9ABF-B.E1. Alega que no acórdão recorrido decidiu-se que, (nos termos do seu sumário), “I. Nas comunicações com os tribunais, nomeadamente para envio de peças processuais, os intervenientes processuais, representados por advogado ou solicitador, podem utilizar o correio eletrónico, equivalendo essa comunicação à remessa por via postal registada, desde que a respetiva mensagem seja cronologicamente validada, mediante a aposição de selo temporal por uma terceira entidade idónea II. A falta de apresentação do original do requerimento para abertura da instrução do arguido, remetido a juízo, por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, no prazo legal de 10 dias, não tem como consequência imediata a rejeição liminar daquele requerimento, por inadmissibilidade legal, nos termos do disposto no artigo 287.º/ 3 CPP. III. O dever de notificar o arguido para apresentar o original do requerimento para a abertura da instrução, que foi remetido por correio eletrónico simples e sem validação cronológica, antes de rejeitar o requerimento de abertura de instrução, corresponde à exigência de um processo equitativo, revelando-se desproporcional, sancionar essa omissão, com a rejeição liminar.” E no acórdão fundamento decidiu-se que, (recuperando o seu sumário),: “Em processo penal, é admissível a remessa a juízo de peças processuais através de correio electrónico, nos termos do disposto no artigo 150.º, n.º 1, alínea d), e n.º 2, do Código de Processo Civil, na redacção do Decreto-Lei n.º 324/2003, de 27.12, e na Portaria n.º 642/2004, de 16.06, aplicáveis conforme o disposto no artigo 4.º do Código de Processo Penal. Todavia, a validade endoprocessual do requerimento remetido a juízo por correio electrónico está condicionada à observação das regras constantes da Portaria n.º 642/2004, de 16/06, nomeadamente, nos seus artigos 3.º, n.ºs 1 a 3 e 10.º. Na situação em apreço, os dois requerimentos de abertura da instrução foram remetidos a juízo por correio electrónico, cf. fls. 156 e fls. 161, mas sem a aposição de assinatura electrónica e sem validação cronológica – MDDE, em qualquer deles. Daqui decorre que o modo de envio dos requerimentos não se ajusta à norma de permissão que se extrai do artigo 3.º, n.ºs. 1 e 3, da Portaria 642/2004. A realização de um convite por parte do Tribunal, para junção dos originais, redundaria na obnubilação de dever legalmente imposto (o previsto n.º 3 do artigo 4.º do DL 28/92) e na “implosão” do prazo peremptório de 20 dias para requerer a abertura da instrução previsto no artigo 287.º, n.º 1, do Código de Processo Penal.” Depois de enunciar a oposição dos acórdãos disse o MºPº: “Em Conclusão”: “1. Qual o valor do requerimento de abertura de instrução que deu entrada em prazo pelo correio eletrónico sem assinatura e data certificada, sem que tenham sido juntos os originais em 10 dias e qual a consequência jurídica ou o procedimento a adoptar pelo tribunal 2. Atendendo a que a solução encontrada em ambos os acórdãos para a mesma situação jjurídica e no domínio da mesma legislação +é manifestamente oposta 3 urge fixar acórdão uniformizador de jurisprudência sobre a matéria.” Pretende que o STJ, dirimindo a questão de opostos em conflito, profira decisão sobre se, como bem o enuncia o MºPº neste Supremo, “a remessa a tribunal de peças processuais, designadamente de requerimento de abertura de instrução, por correio electrónico, sem assinatura e sem data certificada, não tendo sido juntos os originais no prazo de 10 dias, deve levar à rejeição, sem mais, do requerimento de abertura de instrução, sem que ao requerente deva ser formulado convite à junção dos originais, como se decidiu no acórdão fundamento, ou, se pelo contrário, deverá ter lugar a notificação do requerente para, em prazo a determinar, apresentar o original do requerimento para abertura de instrução, como foi decidido no acórdão recorrido.” 2. Responderam os arguidos em peça conjunta, pugnando pela rejeição do recurso por não se verificarem os fundamentos para a sua interposição, porque, aquando da interposição do recurso, o acórdão recorrido ainda não havia transitado em julgado, e, consequentemente, não existia fundamento para a interposição de recurso de fixação de jurisprudência, não se verificando um dos pressupostos formais indispensáveis à sua tramitação. 3. O Exmo PGA emitiu douto parecer, nestes termos,: 1 – Por requerimento apresentado em 17 de Junho de 2022 no processo n.º 1066/17.0T9LLE-B.E1, o Ministério Público no Tribunal da Relação de Évora interpôs recurso extraordinário para fixação de jurisprudência do acórdão proferido em 7 de Junho de 2022, então ainda não transitado em julgado, alegando que questão de direito nele decidida está em oposição com a apreciada e dirimida no acórdão de 13 de Abril de 2021 desse mesmo Tribunal da Relação de Évora, proferido no processo n.º 914/18.1T9ABF-B.E1. A questão que o recorrente coloca, e sobre a qual pretende que o Supremo Tribunal de Justiça (S.T.J.) profira decisão, é a de saber se a remessa a tribunal de peças processuais, designadamente de requerimento de abertura de instrução, por correio electrónico, sem assinatura e sem data certificada, não tendo sido juntos os originais no prazo de 10 dias, deve levar à rejeição, sem mais, do requerimento de abertura de instrução, sem que ao requerente deva ser formulado convite à junção dos originais, como se decidiu no acórdão fundamento, ou, se pelo contrário, deverá ter lugar a notificação do requerente para, em prazo a determinar, apresentar o original do requerimento para abertura de instrução, como foi decidido no acórdão recorrido. 2 – Notificados nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 439.º, n.º 1, do C.P.P., Antobetão – Betão Pronto, S.A. e AA, arguidos nos autos, apresentaram, em peça conjunta, resposta ao recurso, em que consideram dever ser rejeitado o recurso por não se verificarem os fundamentos para a sua interposição, concluindo como segue (transcrição): 1.º O recurso extraordinário para fixação de jurisprudência deve ser interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar (cfr. estatuído no nº1 do artigo 438.º do Código de Processo Penal). 2.º O Acórdão do Tribunal da Relação de Évora no âmbito do processo 1066/17.0T9LLE-B.E1 foi enviado no dia 08.06.2022 aos Recorridos, considerando-se os mesmos notificados no dia 13.06.2022. 3.º O trânsito em julgado verificou-se no dia 23.06.2022. 4.º No dia 17 de junho de 2022, a mui Digna Procuradora-Geral Adjunta do Ministério Público submeteu o recurso extraordinário de fixação de jurisprudência para o Supremo Tribunal de Justiça. 5.º Nesse mesmo dia (17.06.2022) o Acórdão anterior (proferido no dia 07.06.2022) ainda não havia transitado em julgado, e, consequentemente, não existe fundamento para a interposição de recurso de fixação de jurisprudência (cfr. nº4 do artigo 437.º do Código de Processo Penal). 6.º Não se verificando os pressupostos formais indispensáveis à sua tramitação. 7.º A lei exige o trânsito em julgado de ambos os Acórdão em subjudice, tendo o prazo de interposição de recurso extraordinário de fixação de jurisprudência prazo de natureza perentória. 8.º A interposição do recurso antes do início do seu prazo, terá de conduzir à sua rejeição (no mesmo sentido Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça no processo nº 34/07.4GGLSB-A.S1 no dia 21.04.2010 disponível em www.dgsi.pt). 9.º Se no dia 17 de junho de 2022, a decisão do Tribunal da Relação de Évora no âmbito do processo 1066/17.0T9LLE-B.E1 ainda não havia transitado em julgado, não se poderia afirmar, como se afirmou, que uma mesma questão haveria sido decidida em sentido contrário a outro Acórdão. 10.º O que inviabiliza o disposto no nº4 do artigo 437.º bem como o disposto no nº1 do artigo 438.º ambos do Código de Processo Penal. 11.º Pelo que, o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência é intempestivo, porquanto foi interposto antes do trânsito em julgado do Acórdão do Tribunal da Relação de Évora no âmbito do processo 1066/17.0T9LLE-B.E1. 3 – Dispõe o artigo 437.º do C.P.P: 1 - Quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas, cabe recurso, para o pleno das secções criminais, do acórdão proferido em último lugar. 2 - É também admissível recurso, nos termos do número anterior, quando um tribunal de relação proferir acórdão que esteja em oposição com outro, da mesma ou de diferente relação, ou do Supremo Tribunal de Justiça, e dele não for admissível recurso ordinário, salvo se a orientação perfilhada naquele acórdão estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça. 3 - Os acórdãos consideram-se proferidos no domínio da mesma legislação quando, durante o intervalo da sua prolação, não tiver ocorrido modificação legislativa que interfira, directa ou indirectamente, na resolução da questão de direito controvertida. 4 - Como fundamento do recurso só pode invocar-se acórdão anterior transitado em julgado. 5 - O recurso previsto nos n.os 1 e 2 pode ser interposto pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis e é obrigatório para o Ministério Público. E o artigo 438.º, do mesmo diploma legal, preceitua: 1 - O recurso para a fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. 2 - No requerimento de interposição do recurso o recorrente identifica o acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre em oposição e, se este estiver publicado, o lugar da publicação e justifica a oposição que origina o conflito de jurisprudência. 4 – Nesta fase, a apreciação do recurso deve orientar-se para a aferição dos pressupostos processuais comuns aos recursos ordinários, tais como a competência, a legitimidade, tempestividade, regime e efeitos, e do pressuposto próprio deste recurso extraordinário, ou seja, a existência de efectiva oposição de soluções sobre a mesma questão de direito, em duas decisões de tribunais superiores transitadas em julgado. 5 – O prazo de interposição deste recurso extraordinário é, como se viu, de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. Uma decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação, tal como se define no artigo 628.º do Código de Processo Civil (C.P.C.), aplicável ex vi do artigo 4.º do C.P.P. Tem sido precisamente a partir deste artigo 628.º do C.P.C. que o Supremo Tribunal de Justiça (S.T.J.) tem vindo a densificar o conceito de trânsito em julgado para efeitos de contagem do prazo do recurso de fixação de jurisprudência. E, com base nele, tem vindo a decidir que «(…) no caso em que o recurso não é admissível para o STJ, a decisão transita a partir do momento em que já não é possível reagir processualmente à mesma, estabilizando-se o decidido, pelo que, no caso de decisões que não admitam recurso, o trânsito verifica-se findo o prazo para arguição de nulidades ou de apresentação do pedido de correcção (arts 379º, 380º e 425º, nº 4 do CPP), ou seja, o prazo-regra de 10 dias fixado no nº 1 do artº 105º do CPP, em caso de não arguição ou de não apresentação de pedido de correcção e, em caso de arguição, após o trânsito da decisão que conhece da arguição, data a partir da qual se inicia a contagem do prazo dos recursos extraordinários que pressupõe trânsito em julgado. Deste modo, impede-se a abertura de uma nova via para prolongar, ou seja, alterar os prazos legalmente estabelecidos.»[1] Resulta da certidão disponível nos autos que a notificação do acórdão recorrido (o qual data de 07.06.2022, relembre-se), foi efectuada ao Ministério Público, por termo nos autos, em 08.06.2022, assinado em 13.06.2022, e aos arguidos, através do seu ilustre mandatário, via electrónica, igualmente em 08.06.2022. Presumindo-se notificados, os intervenientes processuais, a 13.06.2022 (primeiro dia útil seguinte), e por não admitir recurso ordinário, nem ter sido objecto de reclamação, arguição de nulidades, irregularidades ou pedido de rectificação, aquela decisão colegial transitou em julgado decorridos 10 dias sobre os efeitos aquela notificação, ou seja, no dia 23 de Junho de 2022, já depois de ter sido interposto o recurso em presença. Ou dito de outro modo, o recurso foi interposto antes que a decisão que visa tivesse transitado em julgado, constatação que leva a concluir ser o mesmo extemporâneo, como, aliás, defendem os arguidos na sua resposta. Considere-se, a este respeito, o acórdão de 09.12.2021, deste Supremo Tribunal, proferido no processo n.º 3974/15.3T8LSB.L1.S1, da 5ª Secção, Relator: Conselheiro António Gama: (…) 5. O regime processual penal do recurso extraordinário para fixação de jurisprudência é muito claro ao fixar para a sua interposição «o prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar», art. 438.º, CPP. Esta exigência legal, de natureza formal, mas taxativa e inultrapassável, de o recurso de fixação de jurisprudência só poder ser interposto depois de esgotados os recursos ordinários, com o sentido de que à data da interposição do recurso extraordinário, já não ser possível a interposição de recurso ordinário (ac. STJ de 6.7.2011, disponível em www.dgsi.pt) não foi respeitada, pelo que à data em que foi interposto, o recurso para fixação de jurisprudência era inadmissível, motivo pelo qual se agora se rejeita (art. 441.º/1, CPP).(…) No mesmo sentido, sobre esta problemática, foi tirado o acórdão de 07.04.2022 deste Supremo Tribunal, proferido no processo n.º 209/10.9TAGVA.C1.S1-B, da 5ª Secção, Relatora: Conselheira Helena Moniz: (…) «Antes desse trânsito em julgado não começa a correr o prazo, pelo que é intempestivo o requerimento de interposição que seja entretanto apresentado. O que se compreende, pois que, no esquema traçado pelo CPP para os recursos de fixação de jurisprudência, a imposição do trânsito em julgado, como termo a quo do prazo de interposição, integra-se na disciplina pensada e que estabelece o efeito da decisão fixadora de jurisprudência em função desse trânsito (cfr. art. 445.º do CPP). Antes de transitar em julgado a decisão não é definitiva a oposição de julgados, nem exequível a decisão recorrida. Dizer-se, como o faz o recorrente, que esse prazo é «peremptório, (preclusivo do direito), o que não significa que a antecipação do prazo do recurso leve à sua não admissão, sendo certo que, se não ocorreu trânsito à data da interposição de recurso, na data da admissão deste, já tal trânsito tinha ocorrido, assim sanando desde logo a eventual falta de pressuposto do recurso, qual seja o trânsito em julgado da decisão», não é exacto nas duas dimensões que comporta. Não é exacto, desde logo, pois que, se foi interposto recurso, a decisão não transita em julgado. Logo não se começou sequer a contar o prazo de interposição de recurso. Depois, não é exacto pretender-se que o prazo peremptório só estabelece o seu termo ad quem (30 dias depois do trânsito em julgado), podendo ser validamente antecipada a prática do acto para antes da ocorrência do termo a quo (ocorrência do trânsito em julgado). Com efeito, «os prazos peremptórios estabelecem o período de tempo dentro do qual o acto pode ser praticado (terminus intra quem). Se o acto não for praticado no prazo peremptório, também chamado preclusivo, não poderá já, em regra, ser praticado. Exemplos de prazo peremptório são os prazos para arguir nulidades e irregularidades, requerer a instrução ou interpor recursos.» (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, pág. 37, no mesmo sentido Anselmo de Castro, Lições de Processo Civil, III, pág. 77-8). Esses prazos representam, pois, o período de tempo dentro do qual podem ser levados a efeito os respectivos actos, o referido terminus intra quem, e a sua fixação funciona como instrumento de que a lei se serve em ordem a levar as partes a exercer os seus poderes-ónus segundo um determinado ritmo, a adoptar um determinado comportamento processual e, consequentemente, praticar o acto dentro dos limites de tempo que lhe são assinalados (cfr. Anselmo de Castro, op. cit., pág. 78) e não do limite final. (…) Ora, como se viu (...) o recurso foi interposto antes de ter transitado em julgado o acórdão recorrido, antes de se ter iniciado o respectivo prazo, pelo que, sendo intempestivo, tem de ser rejeitado.» (ac. Do STJ, de 09.10.2003, proc. n.º 03P2711, Relator: Cons. Simas Santos[2]). (…) 6 – Assim, e pelo que fica exposto, é de entender que o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência é intempestivo, devendo, como tal, ser rejeitado, em conferência, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 438.º, n.º 1, 440.º, n.º 3 e 4, e 441.º, n.º 1, 1ª parte, todos do C.P.P. 6. Foi aos vistos e decidiu-se em conferência II - FUNDAMENTAÇÃO 7. Questão prévia a decidir: tempestividade, ou não, da apresentação do presente recurso Marcha processual relevante 8. O recurso do Ministério Público deu entrada em 17/06/2022. O acórdão recorrido foi proferido em 07/06/2022. O acórdão fundamento foi proferido em 13/04/2022, no proc. nº 914/18.1T9ABF-B-E1, também pelo Tribunal da Relação de Évora. O acórdão recorrido foi notificado ao MºPº em 13/06/2022. E considera-se notificado aos recorrentes em 13/06/2022, uma vez que o envio da notificação por correio eletrónico teve lugar em 08/06/2022, sendo, portanto, o dia 13 subsequente o terceiro dia útil após a notificação. O trânsito em julgado do acórdão recorrido só ocorreria, mesmo dele não cabendo recurso ordinário, para o STJ, em 23/06/2022. Porque, o trânsito em julgado da decisão, só ocorre, nos termos do artigo 628 do CPC, aplicável no processo penal ex vi do artigo 4º do CPP, “logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação”. Quando a decisão é suscetível de recurso ordinário, tal efeito consuma-se no momento em que se encontrem esgotadas as possibilidades de interposição de recurso. Nas demais situações, incluindo aquelas em que se encontra esgotada a possibilidade de interposição de recurso ordinário, ocorre no fim do prazo, que é o geral de 10 dias, artigo 105, n.º 1, do CPP, para a eventual arguição de nulidades ou pedidos de reforma ou correção de sentença. Que integram a figura da reclamação a qual afasta o trânsito em julgado. “Num plano mais lato, o que se sustenta é que no caso em que o recurso não é admissível para o STJ, a decisão transita a partir do momento em que já não é possível reagir processualmente à mesma, estabilizando-se o decidido, pelo que, no caso de decisões que não admitam recurso, o trânsito verifica-se findo o prazo para arguição de nulidades ou apresentação de pedido de correcção (arts. 379.º, 380.º e 425.º, n.º 4, do CPP), ou seja, o prazo-regra de 10 dias fixado no n.º 1 do art. 105.º do CPP, em caso de não arguição ou de não apresentação de pedido de correcção e, em caso de arguição, após o trânsito da decisão que conhece da arguição, data a partir do qual se inicia a contagem do prazo dos recursos extraordinários que pressupõe o trânsito em julgado. Deste modo, impede-se a abertura de uma nova via para prolongar, ou seja, alterar, os prazos legalmente estabelecidos.”, in ac. do STJ de 11/03/2021, proc. nº 130/14 (cfr também ac. do STJ de 06/09/2006, proc. nº 06P1555, “Código de Processo Civil Anotado”, I, Abrantes Geraldes et alii, 2ª edição, pag. 778, e “Recursos em Processo Civil”, Abrantes Geraldes, 6ª edição, notas aos artigos 628 e 689). Destarte, o presente recurso foi interposto pelo Ministério Público antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido. Direito 9.A admissibilidade do recurso de fixação de jurisprudência está dependente da verificação de requisitos formais e materiais, fixados nos termos dos artigos 437.º e 438.º, do CPP. Sendo jurisprudência uniforme do STJ que daí se extraem como a) Formais: 1. Legitimidade do recorrente; 2. Interposição do recurso no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido; 3. Identificação do acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontra em oposição (acórdão fundamento), com menção do lugar da publicação, se publicação houver; 4. Trânsito em julgado do acórdão fundamento. E retiram-se como b) – Substanciais: 1. Que os acórdãos respeitem à mesma questão de direito; 2. Sejam proferidos no domínio da mesma legislação; 3. Assentem em soluções opostas a partir de idêntica situação de facto; 4. Que as decisões em oposição sejam expressas. 2. Quanto a estes dois últimos requisitos - soluções opostas a partir de idêntica situação de facto; decisões em oposição expressas -, constitui jurisprudência assente deste Supremo Tribunal que só havendo identidade de situações de facto nos dois acórdãos é possível estabelecer uma comparação que permita concluir, quanto à mesma questão de direito, que existem soluções jurídicas opostas, bem como é necessário que a questão decidida em termos contraditórios seja objeto de decisão expressa, isto é, as soluções em oposição têm de ser expressamente proferidas (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. STJ 11.12.2014, proc. 356/11.0IDBRG.G1-A.S1 – 5.ª) acrescendo que, de há muito, constitui também jurisprudência pacífica no STJ que a oposição de soluções entre um e outro acórdão tem de referir-se à própria decisão, que não aos seus fundamentos (ac. STJ 30.01.2020, proc. n.º 1288/18.6T8CTB.C1-A.S1, 5.ª, ac. de 13.02.2013, Proc. 561/08.6PCOER-A.L1.S1). 10. Despiciendo se torna assinalar que, se a apresentação do recurso se mostrar fora de tempo, tal recurso será forçosamente rejeitado por falta do requisito formal da tempestividade de apresentação. O recurso para a fixação de jurisprudência é um recurso extraordinário cujo regime processual está fixado nos artigos 437 a 448 do CPP. Sendo que para o não especialmente regulado se aplicam subsidiariamente as disposições que regulam os recursos ordinários (448). Sob a epígrafe “Fundamento do recurso”, dispõe, para o aqui pertinente, o artigo 437.º do C.P.P: 1 - Quando, no domínio da mesma legislação, o Supremo Tribunal de Justiça proferir dois acórdãos que, relativamente à mesma questão de direito, assentem em soluções opostas, cabe recurso, para o pleno das secções criminais, do acórdão proferido em último lugar. 2 - É também admissível recurso, nos termos do número anterior, quando um tribunal de relação proferir acórdão que esteja em oposição com outro, da mesma ou de diferente relação, ou do Supremo Tribunal de Justiça, e dele não for admissível recurso ordinário, salvo se a orientação perfilhada naquele acórdão estiver de acordo com a jurisprudência já anteriormente fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça. 3 –(…) 4 - Como fundamento do recurso só pode invocar-se acórdão anterior transitado em julgado. 5 - O recurso previsto nos n.os 1 e 2 pode ser interposto pelo arguido, pelo assistente ou pelas partes civis e é obrigatório para o Ministério Público. E sob a epígrafe “Interposição e efeito”, o artigo 438.º, do mesmo diploma legal, preceitua: 1 - O recurso para a fixação de jurisprudência é interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. 2 - No requerimento de interposição do recurso o recorrente identifica o acórdão com o qual o acórdão recorrido se encontre em oposição e, se este estiver publicado, o lugar da publicação e justifica a oposição que origina o conflito de jurisprudência. 3- (…)” No caso o recorrente tem legitimidade. Todavia, como bem assinala o Exmo PGA, o recurso de fixação de jurisprudência tem de incidir sobre dois acórdãos em confronto ambos transitados em julgado (437º, nº 2). E para interposição de recurso o artigo 438º fixa o prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. A duração do prazo é de 30 dias e o início do prazo conta-se a partir do trânsito em julgado do acórdão recorrido, quando se escreve que esse prazo conta do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar.
O recurso para fixação de jurisprudência, nos termos do art. 438.º, n.º 1, do CPP, deve ser interposto no prazo de trinta dias a contar do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. Significa isto, que só é admissível depois do trânsito em julgado de ambas as decisões (fundamento e recorrida), o que bem se compreende, já que enquanto não transitar em julgado a decisão, não é definitiva a jurisprudência que nela se fixa ou aplica, e sendo ela condenatória, não é exequível. Assim, é de rejeitar, por inadmissível em razão da sua extemporaneidade, o recurso para fixação de jurisprudência interposto antes de se verificar o trânsito do acórdão recorrido (Ac. do STJ de 11/01/2001, proc. n.º 3292/00-5, In casu, extrai-se da certidão junta que a notificação do acórdão recorrido, proferido em 07.06.2022, foi efetuada ao Ministério Público, por termo nos autos, em 08.06.2022, assinado em 13.06.2022, e aos arguidos, através do seu ilustre mandatário, via electrónica, igualmente em 08.06.2022, considerando-se perfeita a notificação dos mesmos em 13/06/2022. Assim, considerando a notificação do MP em 13/06/2022 e presumindo-se também notificados os arguidos a 13.06.2022, primeiro dia útil seguinte ao terceiro dia posterior ao do envio da notificação, quando não útil, ut artigo 113, nº 12, do CPP, por não admitir recurso ordinário, aquela decisão colegial transitou em julgado decorridos 10 dias sobre os efeitos aquela notificação, ou seja, no dia 23 de Junho de 2022, já depois de ter sido interposto o recurso em presença. (cfr ac. do STJ de 11/03/2021, proc. 130/14, já citado). Como vimos o recurso para a fixação de jurisprudência só pode ser interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido (art. 438.º/1, CPP), Ora, se o presente recurso foi interposto em 17/06/2022, mas transitando a decisão recorrida apenas em 23/06/2022, o recurso para fixação de jurisprudência é intempestivo, porque prematuro, pois devendo ser interposto no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado do acórdão recorrido, foi interposto seis dias antes do trânsito da decisão recorrida. A fixação deste prazo peremptório de 30 dias tem três consequências processuais, (i) a primeira é a de, por via do seu efeito preclusivo, o recurso não poder ser apresentado depois do decurso desse prazo; (ii) a segunda é a de que, apresentado antes de tempo, seja, antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido, por prematuro e fora do prazo fixado, terminus intra quem, será rejeitado por intempestividade; (iii) a terceira é de que, em hipotético caso, não pode haver despacho de admissão proferido depois do trânsito, a convalidar a sua entrada intempestiva em tempestiva, com o argumento de que se é verdade que o recurso foi interposto antes do tempo já o subsequente despacho de admissão o foi no prazo de 30 dias; “Com efeito, «os prazos peremptórios estabelecem o período de tempo dentro do qual o acto pode ser praticado (terminus intra quem). Se o acto não for praticado no prazo peremptório, também chamado preclusivo, não poderá já, em regra, em regra ser praticado. Exemplos de prazo peremptório são os prazos para arguir nulidades e irregularidades, requerer a instrução ou interpor recursos.» (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, I, pág. 37, no mesmo sentido Anselmo de Castro, Lições de Processo Civil, III, pág. 77-8). Esses prazos representam, pois, o período de tempo dentro do qual podem ser levados a efeito os respectivos actos, o referido terminus intra quem, e a sua fixação funciona como instrumento de que a lei se serve em ordem a levar as partes a exercer os seus poderes-ónus segundo um determinado ritmo, a adoptar um determinado comportamento processual e, consequentemente, praticar o acto dentro dos limites de tempo que lhe são assinalados (cfr. Anselmo de Castro, op. cit., pág. 78) e não do limite final.” (in ac. do STJ de 09/10/2003, 03P2711) A exigência legal de interposição do recurso no prazo de 30 dias só iniciado com o trânsito em julgado do acórdão recorrido é de natureza formal, mas taxativa e inultrapassável. Se não há trânsito não há decisão definitiva e, se não há decisão definitiva, é prematuro concluir por oposição de julgados. O entendimento unânime deste Supremo Tribunal de Justiça tem sido o de rejeitar, por intempestivo (prematuridade), o recurso extraordinário para fixação de jurisprudência interposto antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido. Assim, acs do STJ de 16/10/2003, proc. nº 1207/03, 30/10/2003, proc. nº 2632/03, de 11/03/1993, proc. 44337 , de 29/09/1993, proc. n.º 44580, de 24/11/1993, proc. n.º 45305, 08/10/1998, proc. n.º 784/98, de 11/01/2001, proc. n.º 3292/00-5, de 09/05/2002, proc. n.º 1201/02-5 e de 30/01/2003, proc. n.º 133/03, 19/10/2005, proc. nº 1086/03, 18/04/2007, proc. 789/07, de 06/09/2006, proc. nº 06P1555, 09/12/2021, proc. nº 3974/15. A doutrina vai igualmente nesse sentido. “1.O recurso extraordinário em causa só pode ser interposto no prazo de trinta dias contados do trânsito em julgado do acórdão proferido em último lugar. Se a decisão não transitou em julgado, não é definitiva, e portanto não pode falar-se com segurança na existência de jurisprudência - definitiva – contraditória. Sendo admissível ainda recurso ordinário, manda a economia de meios que seja por essa via que a eventual divergência de julgados seja superada. Nesse caso, a divergência pode ser efémera, pois o tribunal superior pode vir a pôr-lhe termo. De resto, o recurso porque extraordinário constitui um expediente excepcional a intervir apenas e só para suprir as carências dos meios processuais comuns, ou seja, os recursos ordinários. 2.O recurso extraordinário interposto antes do trânsito em julgado da decisão definitiva pelos meios comuns, leva à respetiva rejeição – artº 441, nº 1.” (Código de Processo Penal Comentado”, Henriques Gaspar et alii, em nota ao artigo 448) Por isso, o presente recurso, por interposto antes do trânsito em julgado do acórdão recorrido, é extemporâneo, impondo-se a sua rejeição. Sendo assim, como é, fica prejudicado o peticionado. III - DECISÃO Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 437, 438.º, n.º 1, 440.º, n.º 3, e 441.º, n.º 1, todos do C.P.P. por intempestividade, rejeita-se o presente recurso extraordinário para fixação de jurisprudência. Sem custas por o MºPº delas estar isento. STJ, 23 de novembro de 2022 Ernesto Vaz Pereira (Relator) Lopes da Mota (1º Adjunto) Conceição Gomes (2ª Adjunta) ______ [1] Acórdão de 11.03.2021 do S.T.J., proferido no processo n.º 130/14.1PDPRT.P1.S1 – No caso, estava em causa uma reclamação do despacho que não admitiu o recurso, tendo o S.T.J. entendido que tal reclamação não tem qualquer reflexo no trânsito em julgado. |