Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | FERREIRA LOPES | ||
Descritores: | PROCESSO TUTELAR PROCESSO DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA RECURSO DE REVISTA ADMISSIBILIDADE DE RECURSO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA CRITÉRIOS DE CONVENIÊNCIA E OPORTUNIDADE REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
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Data do Acordão: | 12/15/2022 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
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Sumário : | Porque proferida num processo de jurisdição voluntária, como é o processo tutelar cível, a decisão que, num juízo de conveniência e na ponderação do superior interesse da criança, determina que a menor fica a residir com a mãe e não em residência alternada, não admite recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça (art. 988º, nº2 do CPC). | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Nos autos de alteração da regulação das responsabilidades parentais relativos à menor AA, em que são progenitores BB e CC foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: “IV.1. Nos termos do art. 40º do RGPTC, decido regular o exercício das responsabilidades parentais da forma seguinte: 1.1. O exercício das responsabilidades parentais relativo às questões de particular importância fica a cargo de ambos os progenitores. 1.2. A religião da menor deverá ser escolhida de comum acordo. Na falta de acordo, a menor não poderá frequentar atividades religiosas e de culto. 1.3. A menor só poderá ausentar-se do país com a autorização escrita do progenitor com quem não esteja. 1.4. Os registos de som e imagem da menor, mesmo em local público, só poderão ser divulgados nas redes sociais com autorização de ambos os progenitores, devendo os progenitores procurar impedir que terceiros a quem tenham cedido registos de imagem e som da menor exibam tais registos sem autorização de ambos os progenitores, solicitando assim a sua remoção. 1.5. O exercício das responsabilidades parentais relativo aos atos da vida corrente da menor fica a cargo do progenitor com quem a menor estiver em cada momento. 1.6. A escola deverá ser escolhida por mútuo acordo, privilegiando além da qualidade formativa, a escola que facilitar os contatos e convívios da menor com cada progenitor, pelo que idealmente a escolha escolhida deverá ficar entre as residências dos progenitores ou perto do trabalho de ambos. 1.7. Na falta de acordo sobre quem será o encarregado de educação em cada ano letivo, este ano mantém-se a mãe, e no próximo, 2022/2023, será o pai, alternando anualmente. 1.8. O progenitor que estiver com a menor e o que for encarregado de educação deverá sempre prestar ao outro todas as informações relevantes da menor. 2.1. A menor residirá alternadamente com cada progenitor, em regime a acordar entre os progenitores. Na falta de acordo ou combinação será de semanas completas, alternadas, indo o progenitor com quem a menor for residir buscá-la à escola na segunda-feira após as atividades letivas. Caso não haja escola o progenitor com quem a menor irá residir deverá ir buscá-la à casa do outro progenitor em horário a acordar, sendo que na falta de acordo será pelas 08:00 da manhã. 2.2. Os pais poderão fazer-se substituir nas entregas e recolhas por familiar ou pessoa de confiança da menor, evitando que a pessoa nomeada seja alguém com mau relacionamento com o outro progenitor por forma a preservar sempre a menor de qualquer potencial conflito ou evitável situação de tensão. 2.3. Os pais poderão estar com a menor na escola, respeitando as atividades escolares e os regulamentos da escola. 2.4. A consoada e dia de Natal serão alternados, sendo dia 24 para dia 25 com um progenitor e o resto do dia 25 desde as 09:30 às 20:00 com o outro progenitor. O mesmo regime se fará na passagem do ano e dia de ano novo. Na falta de acordo ou combinação nos anos civis pares escolhe a mãe e nos ímpares escolhe o pai. 2.5. As férias de verão, páscoa e Natal serão repartidas em partes iguais, sendo que até aos 6 anos da menor, até acordo em contrário, nenhum progenitor poderá passar mais do que duas semanas seguidas de férias com a menor. Como a mãe é professora e, em regra, só tem garantido o mês de agosto como mês de férias, deverá garantir-se que a mesma passará até 3 semanas de férias em agosto com a menor. As férias deverão ser agendadas até ao final de abril do ano a que respeitam. Na falta de acordo ou combinação sobre os períodos de férias, de passagem da consoada ou da passagem do ano, nos anos pares escolhe a mãe e nos anos ímpares escolhe o pai 2.6. A menor estará com o pai no dia do pai e no aniversário do pai e com a mãe no dia da mãe e dia de aniversário da mãe. No dia de anos da menor tomará uma refeição principal com cada progenitor, jantando com o progenitor com quem vai passar a noite. As datas festivas prevalecem sobre o regime da residência e das férias. 2.7. Os documentos originais da menor (nomeadamente de identificação e saúde) deverão ser entregues ao progenitor com quem a menor estiver a residir. 2.8. Para meros efeitos administrativo/burocráticos, quando só seja admissível a indicação de uma única morada para a menor, deverá indicar-se a morada da mãe. 2.9. Os progenitores não deverão tomar a iniciativa, e por outro lado deverão impedir em absoluto que a menor os cumprimente com um beijo na boca, devendo promover junto de familiares e amigos dos pais que tal não ocorra. 3. Cada progenitor pagará metade de todas as despesas da menor, nomeadamente as de educação e saúde, e sempre relativamente à parte não comparticipada. As despesas deverão ser pagas até ao final do mês seguinte à sua realização, sem prejuízo de se efetuar regularmente um encontro de contas. /// A progenitor a interpôs recurso desta decisão, insurgindo-se contra a fixação do regime de residência alternada, pugnando para que se fixe a residência da menor em casa da progenitora. Por acórdão de 9 de Junho de 2022, o Tribunal da Relação de Lisboa concedeu provimento ao recurso, revogou a sentença na parte respeitante aos pontos 1.3, 1.5, 1.6, 1.7, 1.8, 2.1, 2.5, 2.6, 2.7, 2.8 e 3, regulando o exercício das responsabilidades parentais nos seguintes termos: 1. O exercício das responsabilidades parentais relativo às questões de particular importância fica a cargo de ambos os progenitores. 2. A menor residirá habitualmente com a mãe, que sobre ela exercerá as responsabilidades parentais nos atos da vida corrente, sendo sua encarregada de educação. 3. A religião da menor deverá ser escolhida de comum acordo. Na falta de acordo, a menor não poderá frequentar atividades religiosas e de culto. 4. A menor só poderá ausentar-se do país com a autorização escrita do progenitor que não a acompanha . 5. Os registos de som e imagem da menor, mesmo em local público, só poderão ser divulgados nas redes sociais com autorização de ambos os progenitores, devendo os progenitores procurar impedir que terceiros a quem tenham cedido registos de imagem e som da menor exibam tais registos sem autorização de ambos os progenitores, solicitando assim a sua remoção. 6. A escola deverá ser escolhida por mútuo acordo, privilegiando além da qualidade formativa, a escola que ficar na proximidade da residência ou trabalho da mãe e que não dificulte os contatos e convívios da menor com o pai. 7. Cada um dos progenitores deve prestar ao outro todas as informações relevantes da menor. 8. A menor passará com o pai fins de semana alternados, indo o pai buscar a menor à escola à 5ª feira, após o termo das atividades letivas e/ou extracurriculares, e entregando-a na escola na 2ª feira seguinte, antes do início da atividade letiva. Se sexta for feriado vai buscar na quinta, se segunda for feriado entrega na terça. 9. A menor pernoitará, ainda, com o pai, na semana que antecede o fim de semana com a mãe, à 4ª feira, indo o pai buscá-la à escola após o termo das atividades escolares e entregando-a na escola no dia seguinte, antes do início das atividades letivas. 10. Os pais poderão fazer-se substituir nas entregas e recolhas por familiar ou pessoa de confiança da menor, evitando que a pessoa nomeada seja alguém com mau relacionamento com o outro progenitor por forma a preservar sempre a menor de qualquer potencial conflito ou evitável situação de tensão. 11. Os pais poderão estar com a menor na escola, respeitando as atividades escolares e os regulamentos da escola. 12. A consoada e dia de Natal serão alternados, sendo dia 24 para dia 25 com um progenitor e o resto do dia 25 desde as 09:30 às 20:00 com o outro progenitor. O mesmo regime se fará na passagem do ano e dia de ano novo. Na falta de acordo ou combinação nos anos civis pares escolhe a mãe e nos ímpares escolhe o pai. 13. Sem prejuízo do referido no ponto anterior, nas férias de verão, páscoa e Natal a menor poderá: - passar com o pai uma semana de férias na páscoa e Natal (primeira ou segunda semana da interrupção letiva) - passar com o pai, na interrupção letiva do verão, até aos 6 anos da menor, e até acordo em contrário, dois períodos de quinze dias consecutivos, cada um, intercalados com pelo menos uma semana em que fica aos cuidados da mãe. Como a mãe é professora e, em regra, só tem garantido o mês de agosto como mês de férias, deverá garantir-se que a mesma passará até 3 semanas de férias em agosto com a menor. As férias deverão ser agendadas até ao final de abril do ano a que respeitam. - Na falta de acordo ou combinação sobre os períodos de férias, nos anos pares escolhe a mãe e nos anos ímpares escolhe o pai. 14. A menor estará com o pai no dia do pai e no aniversário do pai e com a mãe no dia da mãe e dia de aniversário da mãe. No dia de anos da menor tomará uma refeição principal com cada progenitor, jantando com o progenitor com quem vai passar a noite. 15. As datas festivas prevalecem sobre o regime das férias. 15. Os documentos originais da menor (nomeadamente de identificação e saúde) deverão ser entregues ao pai nos fins de semana alternados que a menor poderá estar consigo, bem como na 5ª feira que pernoita com o pai, sendo devolvidos à mãe no final desses períodos. 16. Os progenitores não deverão tomar a iniciativa, e por outro lado deverão impedir em absoluto que a menor os cumprimente com um beijo na boca, devendo promover junto de familiares e amigos dos pais que tal não ocorra. 17. O Pai contribuirá com metade de todas as despesas da menor (com exceção das despesas com alimentação da menor na residência da mãe), nomeadamente as de educação e saúde, e sempre relativamente à parte não comparticipada. As despesas deverão ser pagas até ao final do mês seguinte à sua realização. /// É a vez do Recorrido interpor recurso de revista, pugnando pela revogação do acórdão e a repristinação da sentença da 1ª instância na parte relativa à fixação da residência da menor.
Pretensão que fundamenta nas seguintes conclusões: 1. Pretende o recorrente ver modificada a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, no sentido de ser fixado um regime de residência alternada, revogado o Acórdão recorrido, com a repristinação da sentença proferida em Primeira Instância e consequentemente a fixação de um regime de residência alternada nos exactos termos ali exarados.” 2. O Recorrente entende que o Acórdão recorrido, ao revogar a sentença da 1ª Instância que fixou um regime de residência alternada da criança, fixando a residência exclusiva com a progenitora, errou na interpretação e aplicação do Direito. 3. Assim e com o devido respeito, que é muitíssimo, entende o Recorrente que o referido acórdão, ao decidir como decidiu por um regime de residência exclusiva, não observou o superior interesse da criança e os direitos e interesses legítimos dos progenitores, violando assim as disposições legais contidas nos artigos 1878º, 1885º, 1906º nº 5, nº 6 e 8 todos do Código Civil. 4. O acórdão recorrido, viola ainda os artigos, 3º, 5º, 7º, 8º, 9º nº 1 e 18º da Convenção sobre os Direitos da Criança e ainda os artigos 36º, nº 5 e os artigos 2º, 13º, 26º, nº1, 36º nº1, 111º nº 1 e 2 e 202º da Constituição da República Portuguesa, o princípio da igualdade dos progenitores, impostos pelos artigos 36º nº 5 e 13º da Constituição e o superior interesse da Criança. 5. Por outro lado, o Acórdão recorrido ignorou manifestamente, o que hoje é consabido que, com a alteração efectuado pela Lei nº 65/2020, de 4 de novembro, o artigo 1906º do Código Civil elege o modelo de guarda conjunta e residência alternada da menor com os dois progenitores como meio privilegiado de proporcionar uma ampla convivência entre a filha e cada um dos progenitores, bem como a partilha de responsabilidades parentais. 6. Esta alteração veio sanar as divergências existentes na jurisprudência quanto à admissibilidade da residência alternada e regime desta, clarificando que a imposição legal prescinde do acordo dos pais, mas não da competência e aptidão dos mesmos na medida em que o fundamento da imposição da residência alternada é sempre a salvaguarda do superior interesse da criança. 7. O Superior interesse encontra-se também inscrito como vetor fundamental no artigo 7º da Declaração dos Direitos da Criança e traduz-se na necessidade de assegurar a solução mais adequada para a criança no sentido de promover o seu normal desenvolvimento, físico psíquico, intelectual, moral e de forma harmoniosa no meio familiar. 8. Para alcançar tal objectivo, é necessário a manutenção de uma relação de proximidade e estreita convivência entre pais e filhos. 9. Dos autos sob escrutínio não se verifica qualquer incapacidade educativa por parte do progenitor, que mantém com a menor uma ligação de afeto, pelo que este deverá poder acompanhar mais de perto a educação e os cuidados da sua filha, estabelecendo-se uma guarda conjunta com alternância da residência da menor, o que se justifica atendendo a que: i) as responsabilidades parentais são exercidas no interesse da menor; ii) o objetivo final é obter o contacto, tão próximo quanto possível, da menor com os seus progenitores, de modo a que a menor possa usufruir em pleno, e em termos paritários, do afeto, apoio e segurança que cada um deles lhe proporcionará. 10. O superior interesse da criança exige uma adequada inserção desta no meio familiar de cada um dos pais, passando a integrar ambos agregados familiares, possibilitando deste modo uma saudável convivência entre todos. 11. No caso concreto, o desacordo da mãe da menor não assenta em fundamentos relevantes que possam de algum modo inviabilizar um regime de residência alternada. 12. Antes pelo contrário foi sempre esta que obstaculizou a convivência entre pai e filha e sempre estimulou e fomentou o litígio. 13. A progenitora recusou sempre partilhar a guarda e a residência e imbuída desse espírito, optou por litigar com todas as suas forças para poder, defender como defendeu a tese da “elevada litigiosidade”. 14. E tanto assim é, que a progenitora logo que foi agendado o julgamento na 1ª instância a 27/10/2020 e até ao início e durante o julgamento apresentou 7 (sete) requerimentos, entre articulados supervenientes, incumprimentos, tudo com vista a entorpecer e protelar a decisão. 15. O processo da Regulação das Responsabilidades Parentais teve uma duração de longuíssimos e extenuantes 4 anos, sempre sob o mesmo “muro” edificado pela progenitora para impedir os convívios da filha com o pai e a residência alternada. 16. Bem como, teve 16 atas, entre conferências de Pais e sessões de julgamento, este último durou quase um ano, de 14/01/21 a 17/12/2021. 17. A progenitora, não compareceu nas sessões do CAFA..., faltou às perícias, recusou cumprir os regimes provisórios decididos pelo tribunal, etc... 18. O CAFA... logo considerou que o pai tinha todas as capacidades para interagir com a menor e que o convívio da menor com o pai era uma clara mais-valia, entendendo não ser necessário qualquer seguimento de visitas supervisionadas e apelando a que começassem pernoitas e mais dias de convívio da menor com o pai. Tal parecer levou a que o regime fosse alterado e alargado a fins-de-semana com pernoita, o que, ainda assim, levou ao ostensivo incumprimento da mãe ao longo de mais de quatro meses, sendo que a AA é que foi prejudicada, pois não se fortaleceram nessa altura os laços com a família paterna, nomeadamente com a irmã, pai e avós (sendo que entretanto o avô paterno faleceu), atrasando-se o que já estava muito atrasado. 19. Já a progenitora recebeu muito mal estas sugestões e, na prática, em concreto, acabou por não dar seguimento ao programa de aconselhamento parental que se estava a gizar. 20. A posição da progenitora levou a que o Tribunal durante os primeiros anos de pendência destes autos atuasse de forma prudente, impressionado pelos seus relatos e pelas consequências que a ausência da mãe ou a presença do pai provocavam na menor, tentando perceber se tal ocorria realmente como relatado pela progenitora ou se era fruto das suas inseguranças e incapacidades. 21. A observação do CAFA..., foi a este título indispensável e altamente esclarecedora. Por isso, o regime foi alterado e alargando a fins-de-semana com pernoita, o que levou ao ostensivo incumprimento da mãe que não se coibiu de afirmar taxativamente que se recusava, e citamos, a cumprir o decidido pelo Tribunal, sem antes assegurar que a menor está bem adaptada ao regime proposto e em segurança. Levará esta sua proteção até às últimas consequências, se necessário for irá presa. 22. Em todos os relatórios, perícias, se conclui pelo alargamento dos convívios, pelas aptidões do pai, para zelar, cuidar e educar a filha, visto que detém um “estilo parental óptimo” 23. A douta sentença proferida em primeira instância escalpelizou os factos dados como provados e aplicou o direito com enorme rigor, minúcia e qualidade, sustentando e demonstrando a necessidade de aplicação de um regime de residência alternada em nome dos superiores interesses da criança. 24. O acórdão recorrido, ao mesmo tempo que relativiza totalmente um incumprimento prolongado no tempo durante 4 meses e meio pela mãe, considera insuscetível de compensação que a mãe não tenha estado com a filha na data de aniversário desta, ainda que pelas razões que se explicam no facto provado 59. Mas o que dirá o progenitor que durante mais de 2 anos foi privado de todas as datas importantes, aniversários, Natal, Ano Novo, dia do Pai, etc.. certamente que estas datas e estes momentos não são recuperáveis, nem suscetíveis de compensação. 25. Verifica-se, assim, de forma evidente, que o acórdão recorrido ao valorizar apenas determinados factos em detrimento de outros, violou o direito de igualdade entre os progenitores. 26. Na sequência do acórdão recorrido e com o devido respeito, está encontrada a fórmula para o progenitor que pretender a residência exclusiva, ou seja, alimentar “ad nauseam” o conflito com o outro progenitor, o qual e para o evitar terá que aceitar serena e pavidamente todas as acusações, omissões, incumprimentos e decisões unilaterais. 27) A Criança tem hoje 5 anos e fará em .../10/2022, 6 anos de idade 28) Há 6 meses que vigora o regime de residência alternada, encontrando-se o aludido conflito já esvaziado, exactamente por conta do regime de residência alternado que tem vindo a ser aplicado e que esmoreceu o intuito e os propósitos iniciais da progenitora. Também por esta razão não faz qualquer sentido reverter-se o regime estipulado e não aplicar a guarda conjunta com residência alternada. 29) Sendo que, este é o regime que mais respeita o princípio da igualdade dos progenitores e o superior interesse da criança. 30) O superior interesse da criança determina que o julgador face ao caso concreto deve dar prioridade à criança, designadamente ao seu direito de ter relações gratificantes e estáveis com ambos os progenitores, não podendo o regime decidido ser uma decisão para satisfação de um dos progenitores, mas uma decisão que permita o melhor e mais harmonioso crescimento da criança. 31) E é com base nesse princípio que a recente alteração ao artigo 1906º do Código Civil efectuada pela Lei nº 65/2020 de 4 de Novembro veio sanar as divergências existentes na doutrina e jurisprudência quanto à admissibilidade da residência alternada e regime desta, clarificando que a imposição legal prescinde do acordo dos pais, mas não da competência e aptidão dos mesmos na medida em que o fundamento da residência alternada é sempre a salvaguarda do superior interesse da criança. 32) Com a aplicação de um regime igualitário como a residência alternada a criança sentirá que pertence a ambas as casas dos dois progenitores em igualdade de circunstâncias, onde terá o seu espaço que sentirá como o seu espaço e não como um espaço provisório, 33) Em boa verdade, nos autos sob escrutínio não se verificam qualquer incapacidade educativa por parte do progenitor, que mantém com a menor uma ligação de afeto, pelo que este deverá poder acompanhar mais de perto a educação e os cuidados da sua filha, estabelecendo-se uma guarda conjunta com alternância da residência da menor. 34) O progenitor mostra tem uma forte ligação de afecto com a filha, possui família que possibilita a rede de apoio necessária, reside na mesma freguesia e a curta distância da progenitora. 35) Como é consabido, a igualização dos direitos dos pais diminui a conflitualidade e encoraja a cooperação entre estes pois, deixa de haver um perdedor e um vencedor o que só por si reduz a tentativa de denegrir a imagem um do outro através de acusações mútuas. 36)Verifica-se assim, que residência alternada pode ser instituída mesmo sem o acordo dos progenitores. 37) Ou seja, no caso concreto, o desacordo da mãe não assenta em fundamentos relevantes que possam de algum modo inviabilizar um regime de residência alternada. 38) Aliás, a progenitora não impugnou os seguintes factos dados como provados na sentença da 1ª instância: “53. Os pais, A. e R., mostravam-se e mostram-se interessados no percurso escolar da AA, contactando com regularidade os responsáveis, técnicos e educadoras do equipamento educativo frequentado pela menor. 60. Ambos os progenitores contam com o apoio da família alargada para cuidarem da menor, nomeadamente quando não a possam ir buscar ou levar à escola por motivos profissionais dos progenitores, contando cada um dos progenitores com o apoio dedicado das respetivas mães, avós materna e paterna. 62. A menor tem um fortíssimo vínculo afetivo com cada um dos progenitores, sendo gratificante o tempo que passa com o pai e com mãe, e tem um forte vínculo afetivo com a irmã DD, avó materna, avós paternos. 63. Ambos os progenitores estão muito motivados para cuidar da menor e cuidar do seu integral desenvolvimento, desejando que a mesma cresça em segurança e seja feliz. 39) É até, precisamente por reconhecer estes factos que a progenitora nas suas alegações (cfr. art. 45 a 48 das alegações) que propôs convívios de quinze em quinze dias, indo o pai buscar a menor à 5ª feira no final das atividades escolares à creche e entregá-la na segunda-feira. E na semana que o fim-de-semana corresponde à mãe, a menor ficaria com o pai de quinta a sábado de manhã, por voltas das 10/11 horas, tendo assim nesta semana também duas pernoitas. 40) A alegada conflitualidade que se diz existir entre os pais, é aquela que decorre exatamente do facto de a progenitora nunca ter aceitado, desde o primeiro momento, um regime de convívios alargado da filha com o pai. 41)“In casu” resulta cristalinamente dos autos, que a progenitora sempre se opôs frontalmente ao regime da residência alternada e nunca teve qualquer disponibilidade para se entender com o progenitor. 42) Como resulta claro, entre outros, dos factos (15,32,39 e 44) dados como provados pela sentença da 1ª instância “15. A 22.01.2018 o pai, que fazia anos nesse dia, veio aos autos informar que continuava sem ver a filha desde 10.01.2018, pois a mãe deixou de a levar à creche sem qualquer justificação, a mãe não lhe responde a mensagens, desconhece se filha está bem de saúde, tal como o seu paradeiro. Viu o carro da mãe à porta de uma pastelaria nesse dia o qual tinha a cadeira de bebé e esperou no seu carro pela mãe e esta saiu sem a filha. Tentou ligar-lhe e a mãe não lhe atendeu. Pede urgência na atuação do Tribunal pois teme pela filha a qual tinha uma forte ligação com o pai e convívio diário e receia que a mãe não esteja psicologicamente bem, pois no final do relacionamento a mesmo lhe terá dito: «Ninguém me tira a menina nem que mate». 43) É assim forçoso e urgente a reposição de um regime de regulação das responsabilidades parentais mais justo, igualitário entre os progenitores e adequado aos superiores interesses da criança. 44) Assim, salvo Douto e melhor entendimento de Vossas Excelências, Egrégios Conselheiros, o Acórdão recorrido deveria ter mantido um regime de residência alternada da criança nos termos do disposto disposições legais contidas nos artigos 1878º, 1885º, 1906º nº 5, nº 6 e 8 todos do Código Civil e nos artigos, 3º, 5º, 7º, 8º, 9º nº 1 e 18º da Convenção sobre os Direitos da Criança e ainda os artigos 36º, nº 5 e os artigos 2º, 13º, 26º, nº1, 36º nº1, 111º nº 1 e 2 e 202º da Constituição da República Portuguesa, em respeito pelo princípio da igualdade dos progenitores, impostos pelos artigos 36º nº 5 e 13º da Constituição e tendo em conta o superior interesse da Criança. Contra alegou a Recorrida pugnando pela não admissão da revista, por do acórdão recorrido não caber recurso para o STJ; assim não se entendendo, pugna pela improcedência da revista. /// Cumpre apreciar da admissibilidade da presente revista.
Está em causa o segmento decisório do acórdão da Relação que, revogando a decisão da 1ª instância que fixara o regime de residência alternada, determinou que a menor AA, nascida em .../10/2016, fique a residir com a mãe.
Neste particular decidiu a 1ª instância: A menor residirá alternadamente com cada progenitor, em regime a acordar entre os progenitores. Na falta de acordo ou combinação será de semanas completas, alternadas, indo o progenitor com quem a menor for residir buscá-la à escola na segunda-feira após as atividades letivas. Caso não haja escola o progenitor com quem a menor irá residir deverá ir buscá-la à casa do outro progenitor em horário a acordar, sendo que na falta de acordo será pelas 08:00 da manhã.
Decisão revogada pela Relação que fixou o seguinte regime: A menor residirá habitualmente com a mãe, que sobre ela exercerá as responsabilidades parentais nos atos da vida corrente, sendo sua encarregada de educação. /// A regulação do exercício dos poderes paternais e o conhecimento das questões a este atinentes, configura uma providência tutelar cível (art. 3º, alínea c) do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC), aprovado pela Lei º 141/2015 de 8 de Setembro).
Os processos tutelares cíveis têm a natureza de jurisdição voluntária (art. 12º do RGPTC).
Os processos de jurisdição voluntária contrapõem-se aos processos de natureza contenciosa, sendo assinalado pela doutrina que naqueles se discute um interesse juridicamente tutelado cuja regulação o juiz efectuará nos termos mais convenientes. A função do juiz não é tanto a de aplicar soluções legais estritas, antes gerir de melhor forma a satisfação dos interesses juridicamente tutelados pela lei (cf. António Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Sousa, Código de Processo Civil Anotado, II, p. 434). Princípio consagrado no art. 987º do CPC que, com referência ao critério de julgamento nos processos de jurisdição voluntária, estabelece que “nas providências a tomar, o tribunal não está sujeito a critérios de legalidade estrita, devendo antes adotar em cada caso a solução que julgue mais conveniente e oportuna.” Das decisões proferidas no âmbito de processos de jurisdição voluntária, segundo critérios de conveniência ou oportunidade, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (nº2 do art. 988º). O Supremo Tribunal de Justiça, na aplicação deste princípio, tem reiteradamente decidido que não admite recurso para o Supremo o acórdão da Relação nos segmentos em que: tendo em conta os factos provados, à luz do superior interesse da criança, considera adequado e conveniente que se mantenha a criança confiada à mãe com quem mantém uma relação afectiva intensa (STJ, 02.06.2016, P. 1233/14); fixa o regime da residência da menor, entre duas alternativas permitidas no quadro legal, ponderando qual a que melhor prosseguia os interesses da menor, tendo em conta a sua situação concreta (STJ, 23.04.2015, P. 1869/11).” Entendimento afirmado nos recentes acórdãos de 21.06.2022 e de 29.09.2022. O primeiro, proferido no P. 3489/12, relatado pelo Conselheiro Nuno Pinto Oliveira e subscrito pelo relator do presente e pelo 1º Adjunto, Conselheiro Manuel Capelo, decidiu: “Entre os casos típicos de decisão tomada de acordo com os critérios de conveniência ou oportunidade estão aqueles em que sejam ou devam ser ponderadas as circunstâncias concretas da vida de um menor ou seus progenitores para que seja tomada uma decisão sobre o regime de residência alternada ou sobre o regime de visitas.” No acórdão de 29.09.2022, P. 89/19, lê-se no respectivo sumário: Entre as decisões de que não é admissível recurso de revista estão aquelas em que sejam ou devam ser ponderadas as circunstâncias concretas da vida de um menor ou da vida dos seus progenitores para que seja tomada uma decisão sobre o regime de residência alternada, de acordo com critérios de adequação e razoabilidade. No caso presente, a Relação entendeu que o interesse superior da menor, ponderadas as circunstâncias relevantes, não aconselham a fixação do regime de residência alternada, como se extrai do seguinte excerto do acórdão recorrido: “A residência alternada “é admissível desde que se faça um juízo de prognose favorável quanto ao que será a vida do menor, suportada em elementos de facto evidenciados no processo, afigurando-se-nos que, em regra, a fixação desse regime só é compatível com uma situação em que se verifica uma particular interacção entre os progenitores, um relacionamento amistoso entre ambos, bem como uma razoável proximidade entre os locais onde os progenitores habitam. (…) O regime de residência alternada não é, normalmente, o mais adequado no caso de conflito acentuado entre os progenitores e em que estejam em causa crianças muito pequenas. Aceita-se que a residência alternada possa em alguns casos funcionar bem, garantindo um contacto equivalente entre o menor e cada um dos progenitores, mas pressupondo que exista um relacionamento civilizado entre estes e tratando-se de adolescentes ou jovens que já têm alguma autonomia e capazes de se organizar em função de hábitos já adquiridos. (…) Assim, apoiados em tais entendimentos e tendo em conta que a M... ainda só conta 6 anos de idade, que sempre viveu com a mãe, que a zela, cuida, educa e dela toma totalmente conta desde que nasceu, existindo laços afetivos fortes entre ambas, e que é manifesto a elevada animosidade existente entre os progenitores, bem retratada nos presentes autos, nada, mas mesmo nada aconselha ou recomenda que se altere a residência atual e habitual da menor, tanto mais que só este ano letivo iniciou a sua vida escolar, pelo que mais se acentua a necessidade de a criança ter rotinas adequadas e certas, de não estar sujeita a frequentes e absolutamente desnecessárias mudas de casa. É, assim, manifesta não só a conflitualidade entre os progenitores como a falta de acordo quanto a aspetos relevantes da formação da menor; a existência de modelos de educação/formação diferentes, a total ausência de diálogo, respeito, cordialidade, interação entre os progenitores. Estes fatores afiguram-se absolutamente necessários para que um regime de residência alternada seja bem-sucedido, pelo que, inexistindo tais requisitos, deve fixar-se a residência da menor AA com a sua mãe, com quem sempre viveu, que dela tem cuidado, acompanhado - não só à creche (o que o pai também tem feito nos dias que lhe estão atribuídos), como também a consultas, nomeadamente de psicologia, por si integralmente suportadas, e com quem tem relação afetiva forte. Também o fator da idade da menor – atualmente com 5 anos – é aspeto que propende no sentido da residência exclusiva.” Contra este entendimento, o Recorrente alega no essencial: “A decisão recorrida não observou o superior interesse da criança e os direitos e interesses legítimos dos progenitores”; “Não se verifica qualquer incapacidade educativa por parte do progenitor, que mantém com a menor uma ligação de afeto, pelo que este deverá poder acompanhar mais de perto a educação e os cuidados da sua filha, estabelecendo-se uma guarda conjunta com alternância da residência da menor;” “O superior interesse da criança exige uma adequada inserção desta no meio familiar de cada um dos pais, passando a integrar ambos agregados familiares, possibilitando deste modo uma saudável convivência entre todos”; “O desacordo da mãe da menor não assenta em fundamentos relevantes que possam de algum modo inviabilizar um regime de residência alternada”; “Foi sempre esta que obstaculizou a convivência entre pai e filha e sempre estimulou e fomentou o litígio”; “Sendo que este é o regime que mais respeita o princípio da igualdade dos progenitores e o superior interesse da criança”. Como se vê, o que aqui está em causa é uma valoração meramente factual, circunstancial e casuística, não uma valoração jurídica. Ora, como decidiu o Acórdão do STJ de 11.11.2021, P. 1629/15, “a valoração dos factos em processo de jurisdição voluntária cabe exclusivamente às instâncias e não ao STJ, por não estarem em causa questões de legalidade estrita.” Resta dizer que a decisão recorrida não violou qualquer das disposições legais citadas pelo Recorrente. A mesma em nada conflitua com os princípios constitucionais da igualdade dos progenitores, do direito e dever dos pais à educação e manutenção dos filhos, de identidade pessoal, do direito a constituir família, de separação de poderes, da função jurisdicional consagrados nos artigos 13º, 36º, nº5, 26º, 111º e 202º da Constituição da República Portuguesa. Os direitos e deveres do Recorrente, enquanto pai da menor, estão perfeitamente assegurados nos termos em que foi regulado o exercício das responsabilidades parentais. É que “o facto de se alegar que foi violado um conjunto de disposições legais, sem especificar as razões de facto e de direito por que teriam sido violadas, não significa que sejam suscitadas questões de legalidade e, em todo o caso, nunca transformaria questões de conveniência ou de oportunidade em questões de legalidade” (Acórdão do STJ de 17.11.2021, supra citado). Donde se conclui que a revista não é admissível. Decisão. Pelo exposto, não se toma conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo Recorrente. Lisboa, 15.12.2022 Ferreira Lopes (Relator) Manuel Capelo Tibério Nunes da Silva |