Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | PIRES DA GRAÇA | ||
Descritores: | RESPONSABILIDADE CIVIL EMERGENTE DE CRIME PRINCÍPIO DA ADESÃO DANOS NÃO PATRIMONIAIS EQUIDADE DIREITO À VIDA | ||
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Nº do Documento: | SJ200903120006113 | ||
Data do Acordão: | 03/12/2009 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
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Sumário : | I - Embora deduzida em processo penal, de harmonia com o princípio da adesão (arts. 71.º e ss. do CPP), a indemnização de perdas e danos emergentes de crime subordina-se, na dimensão quantitativa e respectivos pressupostos, à lei civil. II - A indemnização deve ter carácter geral e actual, abarcar todos os danos, patrimoniais e não patrimoniais, mas quanto a estes apenas os que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito e, quanto àqueles, incluem-se os presentes e futuros, mas quanto aos futuros só os previsíveis (arts. 562.º a 564.º e 569.º do CC). III - A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja excessivamente onerosa para o devedor – art. 566.º, n.ºs 1 e 2, do CC. IV - Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados. V - A Portaria 377/2008, de 26-05, contém «critérios para os procedimentos de proposta razoável, em particular quanto à valorização do dano corporal» (cf. o respectivo preâmbulo). Tem um âmbito institucional específico de aplicação, extrajudicial, e, por outro lado, pela sua natureza, não revoga nem derroga lei ou decreto-lei, situando-se em hierarquia inferior, pelo que o critério legal necessário e fundamental, em termos judiciais, é o definido pelo CC. VI - Na indemnização pelo dano não patrimonial o pretium doloris deve ser fixado por recurso a critérios de equidade, de modo a proporcionar ao lesado momentos de prazer que, de algum modo, contribuam para atenuar a dor sofrida – Ac. deste STJ de 07-11-2006, Proc. n.º 3349/06 - 1.ª. VII - Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto. VIII - Para que o dano não patrimonial mereça a tutela do direito tem de ser grave, devendo essa gravidade avaliar-se por critérios objectivos e não de harmonia com percepções subjectivas ou da sensibilidade danosa particularmente sentida pelo lesado, de forma a concluir-se que a gravidade do dano justifica, de harmonia com o direito, a concessão de indemnização compensatória.IX - Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, necessariamente com apelo a um julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, «as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida» – cf. Ac. do STJ de 17-06-2004, Proc. n.º 2364/04 - 5.ª. X - À míngua de outro critério legal, na determinação do quantum compensatório pela perda do direito à vida importa ter em linha de conta, por um lado, a própria vida em si, como bem supremo e base de todos os demais. E, por outro, conforme os casos, a vontade e a alegria de viver da vítima, a sua idade, a saúde, o estado civil, os projectos de vida e as concretizações do preenchimento da existência no dia-a-dia, designadamente a sua situação profissional e socioeconómica. XI - A indemnização devida pelo dano morte é transmissível, bem como, por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais, que cabe, em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros ascendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem – art. 496.º, n.º 2, do CC –, sendo ainda indemnizáveis, por direito próprio, os danos não patrimoniais sofridos pelas pessoas referidas no preceito, familiares da vítima, decorrentes do sofrimento e desgosto que essa morte lhes causou (cf. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7.ª ed., pág. 604 e ss.; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4.ª ed., pág. 500; Pereira Coelho, Direito das Sucessões, e Ac. do STJ de 17-03-1971, BMJ 205.º/150; Leite de Campos, A Indemnização do Dano da Morte, Boletim da Faculdade de Direito, vol. 50, pág. 247; e Galvão Telles, Direito das Sucessões, pág. 88 e ss.). XII - Tendo em consideração que: - o acidente de que resultou a morte da vítima ocorreu em 20-02-2005; - a mesma nasceu em 02-04-1980, faleceu no estado de solteira e sem deixar descendentes; - vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria; - era professora do agrupamento de escolas de S…, encontrando-se, à data da morte, no 3.º escalão, índice 151, da carreira indiciária do Pessoal Docente de Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário, auferindo o vencimento mensal líquido de € 958,09; - era saudável e gostava de viver; verifica-se ser ajustada a quantia de € 55 000, arbitrada pela Relação, a título de indemnização pelo dano morte. XIII - Mostra-se, por outro lado, equitativamente adequado o montante atribuído, de € 25 000 para cada um dos demandantes (pais da vítima), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos, perante a seguinte factualidade apurada: - a vítima, NS, vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria, sendo uma filha extremosa e dedicada, auxiliando, sempre que podia, o pai num estabelecimento de café que este explorava; - os demandantes tinham grande orgulho na sua filha NS, vivendo apenas com ela, que era o seu grande aconchego, sendo que têm um outro filho, mas mais velho, casado e com família e vida própria; - a morte da filha NS causou aos demandantes grande desgosto, sofrimento e angústia; - em Outubro de 2006 os demandantes estavam a ser acompanhados no Centro de Saúde da sua localidade, por padecerem de perturbações depressivas desde a morte da filha NS; e, desde 02-02-2006 até, pelo menos, Maio de 2006, o demandante também foi acompanhado pelos serviços de psiquiatria e saúde mental de V…, em consequência da morte da filha NS. XIV- E, tendo em conta que, como vem provado, do acidente resultaram para a passageira NS os ferimentos descritos no relatório de autópsia, nomeadamente enfarte cerebral consecutivo a dissecação traumática da artéria carótida primitiva esquerda, que lhe causou, directa e necessariamente, a morte, ocorrida no dia 22-02-2005, que a NS sofreu dores físicas imediatamente após o acidente, resultantes dos ferimentos de que foi vítima, que só se extinguiram com a morte, e sofreu a angústia da morte, justifica-se a quantia arbitrada, de € 20 000, pelos danos morais sofridos pela NS em consequência do sofrimento padecido entre o momento do acidente e o seu falecimento. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça --- Nos autos de processo comum com n.º 25/05.0GAMGD do Tribunal Judicial da Comarca de Mogadouro, o Ministério Público acusou, com intervenção do tribunal singular, o arguido AA, filho de A... G... L... J... e de B... de S..., natural de Angola, nascido a 19/05/1947, casado, motorista, residente no Bairro da Terronha, casa ..., Miranda do Douro, imputando-lhe a violação das disposições previstas nos artigos 27.º, n.º 2, alínea b), do Código da Estrada, e 7.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 272/89, de 19/08, e, em consequência delas e da falta de cuidado e atenção no exercício da condução, a prática de um crime de homicídio por negligência, p. e p. pelo artigo 137.º, n. 1, do Código Penal, com fundamento nos factos constantes da acusação de fls. 442 a 446. - Porém, veio a convolar-se a qualificação jurídica indicada na acusação, para se imputar ao arguido, em autoria material e concurso ideal heterogéneo, um crime de homicídio por negligência grosseira, p. e p. pelo artigo 137.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, e, dois crimes de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelo artigo 148.º, n.º 1, do Código Penal (cfr. fls. 610 a 616).- Declarou-se a incompetência do tribunal singular para julgar a causa e competente paro o efeito o tribunal colectivo (cfr. fls. 616 a 617). - Formularam pedido de indemnização civil contra I... B... - Companhia de Seguros, S.A.:- BB e CC, residentes na Rua ..., n.º ..., Valongo, dela reclamando o pagamento, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia global de € 461.080,00, acrescida de juros legais desde a notificação até integral pagamento (cfr. fls. 526 a 538). - DD, residente na Urbanização ...., bloco ..., ... Dt.º, Rua ..., Viana do Castelo, dela reclamando o pagamento, a título de indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia global de €123.512,41, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% a contar da notificação (cfr. fls. 574 a 586). - Realizada a audiência de discussão e julgamento – no seu início foi proferido despacho a remeter as partes para os tribunais civis relativamente ao pedido de indemnização civil deduzido pela demandante DD, nos termos do disposto no artigo 82.º, n.º 3, do Código de Processo Penal -, veio a ser proferido acórdão, em 11 de Março de 2008, que decidiu:- Absolver o arguido do crime de homicídio por negligência grosseira p. e p. pelo artigo 137.º, n.ºs 1 e 2, do Código Penal, que lhe vinha imputado; - Condenar o arguido, pela prática em autoria material, e em concurso efectivo, de um crime de homicídio por negligência simples, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos artigo 137.º, n.º 1, 15.º, alínea b), e 26.º, 1ª parte, do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão; - Condenar o arguido, pela prática em autoria material, e em concurso efectivo, de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 148.º, n.º 1, 15.º, alínea b), e 26.º, 1ª parte, do Código Penal, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; - Condenar o arguido, pela prática em autoria material, e em concurso efectivo, de um crime de ofensa à integridade física por negligência, p. e p. pelas disposições conjugadas dos artigos 148.º, n.º 1, 15.º, alínea b), e 26.º, 1ª parte, do Código Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão; - Em cúmulo jurídico das preditas penas parcelares, condenar o arguido na pena única de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo mesmo período de 2 (dois) anos e 6 (seis) meses; - Condenar ainda o arguido nas custas criminais, (…) - Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido a fls. 526 a 538 e, em consequência, condenar a demandada I... B... - Companhia de Seguros, S.A. a pagar aos demandantes a quantia total de € 140.000,00 (cento e quarenta mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4% desde o trânsito em julgado deste acórdão até integral pagamento, absolvendo-a do mais pedido; - Condenar os demandantes e a demandada nas custas relativas a este pedido cível, na proporção do respectivo decaimento; --- Inconformados com a decisão, dela recorreram para o Tribunal da Relação do Porto:A demandada I... B... - Companhia de Seguros, S.A., por não se conformar quanto aos montantes de indemnização atribuídos a título de danos não patrimoniais; parecendo-lhe excessivo e injustificado o montante arbitrado de 10.000,00 euros, sendo adequado atribuir aos demandantes a título de dano sofrido pela vítima a quantia de 5.000,00 euros; e, de igual modo, relativamente aos danos morais ou não patrimoniais sofridos pelos demandantes, pedindo a redução da indemnização para 20.000,00 euros para cada demandante. Os assistentes e demandantes CC e BB, restrito à parte cível, pedindo a alteração “da matéria de facto dada como não provada, relativamente aos pontos insertos nas alíneas b) a e) dos factos não provados, de forma a ser condenada a Companhia de Seguros na indemnização pelos danos patrimoniais referidos, e, revogando-se parcialmente a douta decisão recorrida no que diz respeito aos danos não patrimoniais, físicos e morais, sofridos pela vitima, fixando o quantitativo dessa indemnização em valor superior a 10.000,00 €, entre os 15.000,00 € e 20.000,00€.” - A Relação do Porto, decidiu, por acórdão de 8 de Outubro de 2008:“A - Em conceder parcial provimento ao recurso da demandada Companhia de Seguros I... B..., S.A. e, consequentemente: Alteram para o montante de € 55.000,00 (cinquenta e cinco mil euros) o valor da indemnização pelo dano decorrente da morte da própria vítima; Alteram para o montante de € 25.000,00 (vinte cinco mil euros) o valor da indemnização devida a cada um dos demandantes pelos danos não patrimoniais decorrentes do desgosto sofrido com a morte da filha. B - Em conceder parcial provimento ao recurso dos demandantes e consequentemente: Alteram para o montante de € 20.000,00 (vinte mil euros) o valor da indemnização devida pelos danos morais sofridos por EE em consequência do sofrimento padecido entre o momento do acidente e o seu falecimento. * Em tudo o mais, negam provimento aos recursos interpostos.* Custas pelos demandantes e pela demandada em função do respectivo decaimento.”--- De novo inconformados, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça:Os assistentes CC e BB, apresentando as seguintes conclusões na motivação de recurso: 1ª Foram considerados como provados os factos constantes dos números 1 a 16 do presente articulado, com interesse para a matéria em recurso; 2ª Na fixação dos valores dos montantes indemnizatórios pela morte da vítima EE, deverão ser tidos em conta os critérios estabelecidos no Art°496° do Código Civil bem como, as tendências da Jurisprudência mais recente relativamente a essa matéria. 3ª Relativamente ao "dano morte" que é a lesão de um bem superior a todos os outros (vida), o julgador não deverá, com base no disposto no n°3 do Art°493° e 494° áo Código Civil abstrair do grau de culpa do agente, do reflexo económico - social que o facto tem na vida dos familiares do lesado nem da repercussão que o pagamento da indemnização pode ter na situação patrimonial do responsável; devendo ainda o julgador ter em conta a própria vida em si como bem supremo e base de todos os demais atendendo no que à vítima respeita, a sua vontade de viver, a sua idade, a saúde, o estado civil, os projectos de vida e outros respeitantes ao seu dia a dia incluindo a sua situação sócio económica . 4ª No caso em análise o acidente que motivou a morte da EE deu-se por culpa exclusiva do motorista (arguido) que violou as regras estradais ao circular a velocidade excessiva para o local e inadequada ás características da via e do veículo, sendo que o grau de culpa do responsável é elevado, 5ª a vida que se perde é a de uma jovem de 24 anos, já formada e professora do ensino secundário ( há cerca de 3 anos) portanto, com um percurso de vida estudantil e profissional exemplar; sendo conceituada, saudável e gostava de viver, 6ª Porquanto, ponderados os referidos factos entendem os Recorrentes que é justa e adequada a fixação da indemnização pelo dano decorrente da morte da própria vítima, no quantitativo fixado pela 1ª Instância - 60.000,00 €. 7ª Provou-se que a EE era solteira e vivia com os Recorrentes, a quem muito amava e queria; que era o seu aconchego; sendo uma filha extremosa e dedicada a seus pais, auxiliando o pai num estabelecimento de café que este explorava; Que havia portanto, uma grande intensidade de laços familiares; 8ª Tendo em conta o que resulta do ponto anterior e do facto de que os recorrentes tinham grande orgulho da filha e que a morte desta lhes causou grande desgosto, sofrimento e angústia, e ainda, que padeceram de perturbações depressivas desde a morte da filha sendo acompanhados a nível psiquiátrico, parece evidente que a perda da filha envolveu os demandantes num quadro particularmente doloroso e com resultados negativos a nível psíquico e mental. 9ª Pelo que, ponderados os factos descritos nas conclusões 7ª e 8ª, entendem os Recorrentes que deverão ser mantidos os quantitativos fixados pela 1ª Instância a título de indemnização pelos danos não patrimoniais que estes sofreram em consequência do desgosto sofrido com a morte da filha, na quantia de 35.000,00 € a cada um. 10° As actualizações das indemnizações referentes aos danos não patrimoniais é uma decorrência da alteração das condições de vida da população e da desvalorização do dinheiro sendo certo que ultimamente estão os tribunais sensibilizados para a quantificação dos danos não patrimoniais em montantes mais elevados tendo em conta a progressiva consciência do carácter único da vida humana e sua importância. Razão pela qual, a fixação da indemnização pelos danos não patrimoniais atribuída pela 1ª Instância (em montantes superiores aos fixados na invocada Jurisprudência de 2006) deverá considerar-se justa e equilibrada. 11ª Ademais, a responsável é uma companhia de seguros com grande poder económico pelo que, o pagamento da indemnização tal como foi fixada pela Ia Instância não lhe trará qualquer repercussão negativa a nível patrimonial enquanto que, relativamente aos pais Recorrentes, trata-se de uma questão de justiça que pese embora não vise recuperar a vida da filha, sempre poderá minimizar todo o desgosto que tiveram com a sua morte. 12ª O douto Acórdão recorrido violou nesta parte, o estatuído nos Art°s 493, 494° e 496° do Código Civil, Termos em que, e nos mais que V.Exas doutamente se dignarem suprir, dentro do mais Alto Saber e critério, deve o presente recurso ser considerado procedente, alterando-se o Acórdão recorrido na parte em que diz respeito aos danos não patrimoniais resultantes da perda do direito à vida e dos danos sofridos pelos Recorrentes em consequência da morte da mesma, Assim se fazendo JUSTIÇA , - A demandada I...- B..., Companhia de Seguros S.A, concluindo:1ª- A recorrente, não obstante apenas o parcial provimento do recurso pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto , entende com o devido respeito e salvo melhor opinião , que os montante fixados pelo douto acórdão recorrido a titulo de danos não patrimoniais são excessivos e injustificados , pelo que o douto acórdão recorrido efectuou uma menos correcta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto ; 2ª- Sempre tendo em conta que neste tipo de danos impera a equidade, este principio impõem que sejam tratados e indemnizados de modo razoável e justo situações idênticas , ou seja, devemos seguir-nos por critérios e medidas padrão, em que se obtenha , tanto quanto possível um modelo indemnizatório que permita uma maior certeza jurídica , de igualdade e socialmente justa . 3ª- Pelo que, salvo o devido respeito, a indemnização e valoração dos danos corporais/danos não patrimoniais, deve pautar-se e obedecer a critérios e princípios de objectividade, transparência, razoabilidade, justiça e equidade . 4ª- Por isso, a recente legislação vai exactamente nesse sentido, e a publicação da Portaria n° 377/2008 de 26 de Maio, estabeleceu valores que devem ser seguidos, como critérios orientadores e uniformizadores. 5ª- O que aplicado ao caso dos autos, com idade da vitima nos 25 anos e tudo ponderado, conclui-se que o montante para indemnização pela perda do direito à vida deve situar-se nos 50.000,00 euros. 6ª- Em termos de equidade, deverá ser atribuída, a titulo de compensação por danos não patrimoniais sofridas pela vitima nos dois dias que antecederam a sua morte a quantia de 4.000,00 euros . 7ª- De igual modo e relativamente aos danos morais ou não patrimoniais sofridos pelos demandantes, parece-nos que os montantes globais atribuídos são exagerados e injustificados . 8ª- Pelo que quanto aos danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes com a morte de sua filha, deve a indemnização ser reduzida para 15.000,00 euros para cada demandante. 9ª- Ao decidir, como julgou o douto acórdão recorrido, fixando as quantias indemnizatórias aqui impugnadas, fez o Venerando Tribunal recorrido uma menos correcta interpretação e aplicação do direito ao caso concreto, com violação do disposto nos arts 483°, 494° , 496° , 562° e 566° do Código Civil Termos em que, e nos mais e melhores de direito que V. EXas doutamente suprirão , deve ser concedido provimento ao recurso , e consequentemente revogar-se o douto acórdão recorrido , substituindo-se por outro que considere procedentes as alegações e conclusões supra aduzidas, com as legais consequências , e assim, farão V. EXas a costumada JUSTIÇA. - Responderam os demandantes à motivação de recurso apresentada pela demandada, concluindo:1ª Entendem os demandantes que a recorrente não tem razão ao sustentar que sejam ainda mais reduzidos os montantes indemnizatórios fixados pelo Acórdão do Tribunal da Relação do Porto. 2ª A valorização habitualmente atribuída pelo Supremo Tribunal de Justiça para o dano morte tem oscilado entre os 50.000,00 e 60.000,00 € euros, 3ª Não há qualquer impedimento, nomeadamente de ordem legal, para fixação de montante indemnizatório superior a 50.000,00 €, bem pelo contrário, quer os Tribunais quer a Jurisprudência têm aumentado estas indemnizações de forma a acompanhar a evolução dos tempos, a progressiva evolução da população e a desvalorização do dinheiro, na esteira dos sucessivos aumentos dos prémios de seguro e de capitais indemnizatórios garantidos pelas seguradoras. 4ª Não cabe aqui trazer à colação a recente Portaria n°377/2008 de 26 de Maio porque a mesma entrou em vigor após o acidente em causa. No entanto, ainda que assim não fosse, os valores referidos na Portaria são meramente orientadores para efeitos de apresentação aos lesados de propostas razoáveis para indemnização. Não são valores fixos ou estanques a que os Tribunais tenham que ficar sujeitos sem mais. Aliás, conforme refere o n°2 do Art° 1° da mesma, as disposições da Portaria não afastam a fixação de valores superiores aos propostos. A verdade é que são valores "propostos" e não fixos. 5ª Mas, ainda que assim não fosse, tendo em conta que a vítima no caso tinha 24 anos à data do acidente, a referida Portaria propõe um valor de indemnização até 60.000,00 €. 6a Relativamente ao dano sofrido pela vítima, terá que se atender à matéria provada com interesse para este facto nomeadamente, que a vítima estava viva no momento do acidente e que agarrou a mão ao arguido; portanto, teve a consciência do acidente, pressentiu-o e pressentiu e teve consciência da chegada da morte; Que só veio a falecer ao fim de dois dias. O sofrimento da vítima entre o acidente e o momento do decesso prolongou-se por dois dias. Assim, Atendendo a estas circunstâncias deverá manter-se o quantitativo fixado pelo douto Acórdão do Tribunal da Relação. 7ª Quanto ao dano moral sofrido pelos demandantes deverá fixar-se de acordo com o decidido em 1ª Instância , tendo em conta os factos que resultaram provados ( conforme ficou explanado em sede de recurso interposto ), entendendo os demandantes que a fixação destes danos no montante pretendido pela recorrente companhia de seguros é um passo atrás em todo o esforço dos Tribunais e da Jurisprudência , um retorno às indemnizações insignificantes e desajustadas. 8ª Não é esse retorno que pretendeu o legislador, com toda a certeza, com a criação da Portaria 377/2008, bem pelo contrário, o que pretendeu o nosso legislador foi fixar regras de propostas razoáveis para indemnizações, seguindo assim a tendência dos Tribunais e da Jurisprudência de uma permanente actualização dos critérios de indemnização. Termos em que, e nos melhores que V.Exas doutamente suprirão, deve ser negado provimento ao recurso da I... B... — Companhia de Seguros S.A. --- Neste Supremo, a Exma Magistrada do Ministério Público pronunciou-se nos termos de fls, dos autos.--- Não tendo sido requerida audiência, seguiu o processo para conferência, após os vistos legais.--- Vem assente pelas instâncias:1) No dia 20 de Fevereiro de 2005, por volta das 22:20 horas, o arguido conduzia o veículo pesado de passageiros, de matrícula ...-...-..., na Estrada Nacional n. ° 221, no sentido Mogadouro / Miranda do Douro, pela metade direita da faixa de rodagem, considerando o seu sentido de marcha, imprimindo ao referido veículo ...-...-... a velocidade de 100 km/hora. 2) Ao chegar ao km 23,800 da Estrada Nacional n.° 221, na área desta comarca, o veículo ...-...-... despistou-se, saindo parcialmente da estrada para a valeta situada no lado direito, sentido Mogadouro / Miranda do Douro, entrando depois novamente na via, percorrendo, descontrolado, toda a faixa de rodagem do sentido em que circulava e do sentido contrário, acabando o veículo por tombar no lado esquerdo, fora da faixa de rodagem, atento o sentido Mogadouro / Miranda do Douro, aí ficando imobilizado. 3) O local onde se deu o acidente tem a configuração de uma curva à esquerda, considerando o sentido Mogadouro / Miranda do Douro, com inclinação, o pavimento é asfaltado, tem a largura de 6 metros e no momento do acidente o piso encontrava-se seco e em bom estado e o tempo estava bom. 4) A referenciada velocidade a que o arguido circulava excedia o limite máximo legal a que era permitido circular na aludida estrada, que era de 80 km/hora, e era inadequada às características da via e do veículo que conduzia, 5) No veículo ...-...-..., propriedade da empresa A..., Ld.a, com sede na Avenida ..., Alfandega da Fé, seguiam o arguido e 17 passageiros, nomeadamente as passageiras EE, GG e FF, 6) Do acidente resultaram para a passageira EE, os ferimentos descritos no relatório de autópsia de fls. 197 a 205, nomeadamente enfarte cerebral consecutivo a dissecação traumática da artéria carótida primitiva esquerda que lhe causou, directa e necessariamente, a morte, ocorrida no dia 22/02/ /2005. 7) Do acidente resultaram ainda ferimentos na passageira DD, designadamente, escoriações dispersas, cicatriz arredondada com 1,5 cm de diâmetro, situada na face anterior do tórax, 12 cm abaixo da linha média clavicular esquerda, e duas cicatrizes no flanco esquerdo do abdómen, obliquas, lineares paralelas entre si e distanciadas 3 cm, medindo 5 cm cada uma, derivadas de traumatismo torácico com pneumotóraxe à esquerda, e fractura do 5. ° e 7. ° arcos costais esquerdos, que lhe causaram, directa e necessariamente, 15 dias de doença, com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional pelo período de 8 dias. 8) Do acidente resultaram ainda ferimentos na passageira FF, nomeadamente, cicatriz de 8 cm na região parietal mediana, cicatriz linear de 3 cm na região submentoniana da face, cicatriz queloide arredondada de 2 cm na face anterior ao nível do 3. ° espaço do tórax, cicatriz queloide arredondada anterior ao nível do 4.° espaço esquerdo do tórax, cicatriz com 4 cm, na região axilar esquerda, cicatriz queloide com 3 cm por 2 cm na base do polegar e cicatriz de 0,3 por 0,5 cm na face dorsal do dedo anelar, derivadas de traumatismo torácico (pneumotórax bilateral com contusão pulmonar bilateral), TCE ligeiro e luxação do ombro esquerdo, que lhe causaram, directa e necessariamente, 347 dias para a consolidação médico-legal, com afectação da capacidade de trabalho geral e profissional pelo período de 120 dias. 9) O arguido agiu com inobservância de regras estradais e com falta de cuidado que o dever geral de previdência aconselha e que podia e devia ter para evitar um resultado, o acidente de que adveio a morte de EE e os descritos ferimentos de DD e FF, que de igual modo podia e devia ter evitado, bem sabendo que a sua conduta era proibida por lei. 10) O arguido é titular da carta de condução n.°..., emitida pela DGV de Bragança, a 30-08-1975, para a categoria D (pesados de passageiros). 11) O arguido não tem antecedentes criminais e não tem averbado no seu registo individual de condutor qualquer infracção rodoviária. 12) A EE nasceu no dia 2/04/1980, é filha dos demandantes e faleceu no estado de solteira e sem deixar descendentes. 13) A EE era professora do agrupamento de escolas de Sendim, encontrando-se, à data da morte, no 3. ° escalão índice 151, da carreira indiciária do Pessoal Docente de Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário, auferindo o vencimento mensal líquido de € 958,09. 14) A EE era saudável e gostava de viver e era conceituada. 15) A EE sofreu dores físicas imediatamente após o acidente resultantes dos ferimentos de que foi vítima, que só se extinguiram com a morte, e sofreu a angústia da morte. 16) A EE vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria. 17) A EE era uma filha extremosa e dedicada a seus pais. 18) A EE auxiliava, sempre que podia, o seu pai num estabelecimento de café que este explorava. 19) Os demandantes viviam apenas com a sua filha EE, que era o seu grande aconchego, sendo que têm um outro filho, mas mais velho, casado e com família e vida própria. 20) Os demandantes tinham grande orgulho na filha EE. 21) A morte da filha EE causou aos demandantes grande desgosto, sofrimento e angústia. 22) Em Outubro de 2006 os demandantes estavam a ser acompanhados no Centro de Saúde da sua localidade, por padecerem de perturbações depressivas desde a morte da filha EE. 23) Desde 2/02/2006 e até pelo menos Maio de 2006, o demandante também foi acompanhado pelos serviços de psiquiatria e saúde mental de Valongo, em consequência da morte da filha EE. 24) Os demandantes possuem casa própria, onde vivem, são donos de um estabelecimento de café, situado no rés-do-chão da residência, e a demandante encontra-se reformada. 25) O arguido tem como habilitações literárias a 4."classe; é casado; vive com a mulher, doméstica, e com um filho com 28 anos de idade, doente, que está a seu cargo; trabalha como motorista desde os 20 anos de idade e trabalha como motorista de veículos pesados de passageiros para a mesma empresa desde há cerca de 23 anos, auferindo o salário mensal de €556,00; e possui casa própria. 26) A data do acidente a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo ...-...-... encontrava-se transferida, por contrato de seguro titulado pela apólice n.° ..., para a demandada I... B... - Companhia de Seguros, S.A.. Relativamente ao não provado foi consignado o seguinte: Não se provou a demais factualidade constante da acusação e do pedido de indemnização civil, nomeadamente, e com relevo para a discussão da causa, não resultou provada a seguinte matéria de facto: a) A velocidade a que o arguido circulava era inadequada ao seu estado físico, pois conduzia sem que tivesse observado, nesse dia 20 de Fevereiro de 2005 e até à hora do acidente, qualquer período de repouso; b) A EE contribuía para o sustento de seus pais com a quantia de €500,00 mensais; c) A partir da morte da EE os demandantes ficaram privados de tal montante necessário ao seu sustento; d) A filha EE nunca deixaria de ajudar economicamente os demandantes; e) Em consequência da morte da filha EE, o demandante cessou a actividade de exploração de um estabelecimento de café, deixando, por isso, de auferir a quantia mensal de € 370,00. --- Cumpre apreciar e decidir:Inexistem vícios e nulidades de que cumpra conhecer, nos termos do artigo 410º nºs 2 e 3 do CPP. O recurso é restrito a matéria cível, sobre o montante da indemnização concedida pelo acórdão recorrido relativamente ao dano morte, aos danos não patrimoniais sofridos pelas demandantes e, ainda, no objecto do recurso interposto pela Seguradora, quanto ao dano não patrimonial sofrido pela vítima - BB e CC, no pedido de indemnização civil formulado pediam como indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, a quantia total de € 461.080,00, assim repartida: 100.000,00 € pela perda do direito à vida da EE; 100.000,00 € por danos morais sofridos por esta; e 100.000,00 € por danos morais sofridos pelos demandantes pela morte de sua filha a referida EE; Reclamavam ainda 161.080,00 € por danos patrimoniais -, acrescida de juros legais desde a notificação até integral pagamento. À 1ª instância afigurou-se-lhe “ ajustado fixar, em equidade, o montante de € 10.000,00 para compensar o sofrimento que a vítima suportou antes de morrer e a quantia de € 60.000,00 para compensar o dano da perda do seu direito à vida.” e, “adequado fixar em € 35.000,00 a quantia devida a cada um dos demandantes destinada a compensar o dano não patrimonial por cada um sofrido.” O valor total da indemnização era pois de “€ 140.000,00 (€ 10.000,00 + € 60.000,00 + 35.000,00 + 35.000,00).”, já que, considerou que aos demandantes “não assiste o direito a haver qualquer outra quantia indemnizatória, nomeadamente a título de danos patrimoniais, porquanto não ficou provada qualquer matéria de facto susceptível de consubstanciar danos de tal índole, sendo que os demandantes não lograram provar a atinente factualidade, como lhes competia, segundo as regras gerais do ónus da prova (artigo 342.º, n.º 1, do Código Civil).” Por sua vez, a 2ª instância, como supra se referiu, alterou, para 55.000,00 € (cinquenta e cinco mil euros) o valor da indemnização pelo dano decorrente da morte da própria vítima; para 25.000,00 € (vinte cinco mil euros) o valor da indemnização devida a cada um dos demandantes pelos danos não patrimoniais decorrentes do desgosto sofrido com a morte da filha; e para 20.000,00 €(vinte mil euros) o valor da indemnização devida pelos danos morais sofridos por EE em consequência do sofrimento padecido entre o momento do acidente e o seu falecimento - Agora, no recurso interposto para este Supremo Tribunal, os demandantes pedem a repristinação das quantias arbitradas na 1º instância, quanto ao dano morte e aos danos não patrimoniais por eles sofridos, indicando porém a demandada, como valor dos mesmos, na sua motivação de recurso, as quantias de 50 000,00 € pelo dano morte, 15 000,00 € pelos danos não patrimoniais sofridos por cada demandante e 4000,00 € pelo dano não patrimonial sofrido pela vítima.Vejamos: A indemnização de perdas e danos emergentes de crime é regulada pela lei civil. – artº 129º do C.Penal. Embora deduzida em processo penal, de harmonia com o princípio da adesão (artºs 71º e segs do CPP), subordina-se, porém, na dimensão quantitativa e respectivos pressupostos, à lei civil. Aquele que com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação. - artº 483º nº 1 do Código Civil. (C.C.) Como se sabe, a indemnização deve ter carácter geral e actual, abarcar todos os danos, patrimoniais, e não patrimoniais, mas quanto a estes apenas os que pela sua gravidade mereçam a tutela do direito e, quanto àqueles, incluem-se os presentes e futuros, mas quanto aos futuros só os previsíveis (arºs 562º, a 564º e 569º do C.C.) A indemnização é fixada em dinheiro, sempre que a reconstituição natural não seja possível, não repare integralmente os danos ou seja essencialmente onerosa para o devedor - artº 566º nºs 1 e 2 do C.C. Se não puder ser averiguado o valor exacto dos danos, o tribunal julgará equitativamente dentro dos limites que tiver por provados. - Desde logo cumpre dizer, relativamente à invocada Portaria nº 377/2008 de 26 de Maio, que não pode esquecer-se, como consta do seu preâmbulo, que se trata de “critérios para os procedimentos de proposta razoável, em particular quanto à valorização do dano corporal.Parte significativa das soluções adoptadas nesta portaria baseia -se em estudos sobre a sinistralidade automóvel do mercado segurador e do Fundo de Garantia Automóvel e na experiência partilhada por este e pelas seguradoras representadas pela Associação Portuguesa de Seguradores, no domínio da regularização de processos de sinistros.” Como consta do seu objecto referido no Artigo 1.º: 1 — Pela presente portaria fixam -se os critérios e valores orientadores para efeitos de apresentação aos lesados por acidente automóvel, de proposta razoável para indemnização do dano corporal, nos termos do disposto no capítulo III do título II do Decreto -Lei n.º 291/2007, de 21 de Agosto. 2 — As disposições constantes da presente portaria não afastam o direito à indemnização de outros danos, nos termos da lei, nem a fixação de valores superiores aos propostos Como resulta da mesma Portaria, “o regime relativo aos prazos e as regras de proposta razoável, agora também aplicáveis ao dano corporal, exige o apoio de normativos específicos que evidenciem, com objectividade, a transparência e justiça do modelo no seu conjunto e sejam aptos a facilitar a tarefa de quem está obrigado a reparar o dano e sujeito a penalizações, aliás significativas, pelo incumprimento de prazos ou quando for declarada judicialmente a falta de razoabilidade na proposta indemnizatória.” A Portaria, tem pois um âmbito institucional específico de aplicação, extrajudicial, sendo que, por outro lado, e, pela natureza do diploma que é, não revoga nem derroga lei ou decreto-lei, situando-se em hierarquia inferior, pelo que o critério legal necessário e fundamental, em termos judiciais, é o definido pelo Código Civil. - De harmonia com o artigo 496º nº 1 do Código Civil: na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito e, segundo o nº 3 do preceito, o montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção, em qualquer caso, as circunstâncias referidas no artº 494º;.O artº 494º alude ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado e às demais circunstâncias do caso justificativas. A indemnização por danos não patrimoniais tem por finalidade compensar desgostos e sofrimentos suportados pelo lesado, Na indemnização pelo dano não patrimonial o "pretium doloris" deve ser fixado, por recurso a critérios de equidade, de modo a proporcionar ao lesado momentos de prazer que, de algum modo, contribuam para atenuar a dor sofrida. (assim, Ac. deste Supremo, de 7-11-2006 in 3349/06, 1ª secção) Equidade não é sinónimo de arbitrariedade, mas sim, um critério para a correcção do direito, em ordem a que se tenham em consideração, fundamentalmente, as circunstâncias do caso concreto. A lei não dá qualquer conceito de equidade, mas, tem-se aceite a mesma como a consideração prudente e acomodatícia do caso, e, em particular, a ponderação das prestações, vantagens e inconvenientes que concorram naquele (v.já Ac. do S.T.J. de 19-4-91 in A.J. 18º, 6) A expressão “em qualquer caso”, constante do artº 496º do CC, tanto abrange o dolo como a mera culpa (v. C.J. 1986, 2º, 233 e, Vaz Serra in Rev. Leg. Jur., 113º-96). Por sua vez, “demais circunstâncias do caso” é uma expressão genérica que se pretende referir a todos os elementos concretos caracterizadores da gravidade do dano, incluindo a desvalorização da moeda. Para que o dano não patrimonial mereça a tutela do direito, tem de ser grave, devendo essa gravidade avaliar-se por critérios objectivos e, não de harmonia com percepções subjectivas, ou da sensibilidade danosa particularmente sentida pelo lesado, de forma a concluir-se que a gravidade do dano, justifica, de harmonia com o direito, a concessão de indemnização compensatória.(em sentido idêntico – Acórdão deste Supremo de 18 de Dezembro de 2007, in www.dgsi.pt) Na atribuição dessa indemnização deve respeitar-se «todas as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas, de criteriosa ponderação das realidades da vida» (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. 1.º, 4.ª edição, p, 501 e, entre outros, Ac. deste Supremo de 05-11-2008, in Proc. n.º 3266/08 desta 3ª Secção) Estando em causa a fixação do valor da indemnização por danos não patrimoniais, necessariamente com apelo a um julgamento segundo a equidade, o tribunal de recurso deve limitar a sua intervenção às hipóteses em que o tribunal recorrido afronte, manifestamente, «as regras de boa prudência, de bom senso prático, de justa medida das coisas e de criteriosa ponderação das realidades da vida», conforme exposto no Acórdão do STJ de 17-06-2004, Proc. n.º 2364/04 - 5.ª Secção,- (v Ac.,do STJ de 3-7-2008 in prc. 122&708 da 5ª secção, e de 05-11-2008, in Proc. n.º 3266/08 desta Secção) Sendo certo que, essa indemnização por danos não patrimoniais, para responder, actualizadamente, ao comando do artº 496º do Cód. Civil e, porque visa oferecer ao lesado uma compensação que contrabalance o mal sofrido, deve ser significativa, e não meramente simbólica, devendo o juiz, ao fixá-la segundo critérios de equidade, procurar um justo grau de “compensação”.(v. por ex, Acórdão do S.T.J. de 11 de Setembro de 1994 (in Col. Jur. Acs do S.T.J. ano II tomo III -1994 p. 92), - Quanto ao dano morte, como referia o Acórdão deste Supremo de 27-09-2007, in www.dgsi.pt, sabe-se que a vida é o bem mais precioso da pessoa que ele não tem preço, porque é a medida de todos os preços, e que a sua perda arrasta consigo a eliminação de todos os outros bens de personalidade. À míngua de outro critério legal, na determinação do concernente quantum compensatório importa ter em linha de conta, por um lado, a própria vida em si, como bem supremo e base de todos os demais. E, por outro, conforme os casos, a vontade e a alegria de viver da vítima, a sua idade, a saúde, o estado civil, os projectos de vida e as concretizações do preenchimento da existência no dia a dia, designadamente a sua situação profissional e sócio-económica. A indemnização devida pelo dano morte é transmissível, bem como, por morte da vítima, o direito à indemnização por danos não patrimoniais cabe em conjunto, ao cônjuge não separado judicialmente de pessoas e bens e aos filhos ou outros descendentes; na falta destes, aos pais ou outros descendentes; e, por último, aos irmãos ou sobrinhos que os representem – artº 496º nº 3 do Código Civil, sendo ainda indemnizáveis, por direito próprio, os danos não patrimoniais sofridos pelas pessoas referidas no preceito familiares da vítima, decorrentes, do sofrimento e desgosto essa morte lhes causou (v. Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, vol. I, 7ª ed., pág. 604 e segs.; Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol. I, 4ª ed. pág. 500; Pereira Coelho, Direito das Sucessões, e Ac. do S.T.J. de 17/03/1971, B.M.J. 205, pág. 150; Leite Campos, A indemnização do dano da morte, Boletim da Faculdade de Direito, vol. 50, pág. 247 Galvão Telles, Direito das Sucessões, págs. 88 e segs). Posto isto: Sobre o dano resultante da privação da vida, refere o acórdão recorrido: “A jurisprudência mais recente sobre o tema enfatiza o afastamento de critérios miserabilistas e o reconhecimento do valor da vida humana, ainda que com valoração do condicionalismo próprio de cada situação. No caso vertente há que ponderar a idade da vítima - contava então 24 anos de idade - solteira, saudável, vivendo com os pais, que a amavam, gostava de viver, era professora e conceituada, factualismo que foi devidamente equacionado para efeitos de determinação do quantum indemnizatório. Vejamos como vem o STJ decidindo esta questão: - É adequada a indemnização, a título de perda do direito à vida, fixado em 50.000,00 €, considerando que o falecido tinha 40 anos (...), gozava de boa saúde, era pessoa amante da vida, estimado pelos amigos, família e vizinhos e exercia a sua actividade profissional como agente da GNR (Revista n° 2520/06, 7a secção -Ac. de 12-10-2006); - A morte é o prejuízo supremo, no plano dos interesses da ordem jurídica, pelo que, sendo o bem vida o valor supremo, há que ressarcir o dano de morte de forma a garantir a elevada dignidade que ele merece. A data do acidente os falecidos tinham 21 e 30 anos de idade, eram pessoas saudáveis e com alegria de viver, justificando-se que a indemnização pela perda das suas vidas seja elevada para 49.879,79 € (Revista n°3021/06, 6o secção - Ac. de 24-10-2006); - A indemnização do dano morte, atendendo a que se trata do bem jurídico supremo, um valor absoluto cuja compensação tem vindo a aumentar gradualmente situa-se agora numa plataforma que raramente fica abaixo dos €50.000,00 (Revista n° 2873/06, 6"secção - Ac. de 07-11-2006). Mais recentemente, decidiu o STJ, no Ac. de 18/12/2007 2, que "é adequado fixar em € 50.000,00 a indemnização pelo dano morte de um jovem de 17 anos, saudável, a terminar os seus estudos secundários, pronto para iniciar um curso superior e com um projecto de vida idealizado; e em igual montante a indemnização pelo dano da morte de uma jovem de 11 anos de idade, filha única, estudante do ensino secundário, assídua e boa aluna, saudável e muito alegre ". Esta breve resenha jurisprudencial permite verificar que o valor comummente adoptado pela jurisprudência para ressarcir o dano morte se situa tendencialmente nos 50.000,00 €. Claro que não há qualquer impedimento, nomeadamente, de ordem legal, na fixação de montante superior. Bem pelo contrário, a permanente actualização do critério é não apenas uma decorrência da alteração das condições de vida da população e da desvalorização do dinheiro, mas sobretudo um imperativo de justiça decorrente da progressiva consciência acrescida do carácter único de cada vida humana e da evolução e acompanhamento que desse princípio vem fazendo a justiça, enquanto concretização prática do direito. Não vemos, no entanto, que no caso concreto e com o circunstancialismo descrito, se verifiquem razões que justifiquem um alargamento tão significativo dos valores normalmente adoptados. Nesta medida, a sentença recorrida excede ligeiramente os valores que deverão considerar-se como referência, devendo a indemnização a que nos reportamos ser reduzida em conformidade, contemplando, no entanto, a actualização imposta pelo decurso do tempo relativamente à época em que se iniciou a adopção frequente do quantitativo a que antes nos referimos, mostrando-se assim ajustado o valor de 55.000,00 €.” - Ora tendo em conta que o acidente de que resultou a morte da vítima ocorreu em 20 de Fevereiro de 2005, que a vítima Natália Sofia Freire Silva nasceu em 2 de Abril de 1980, portanto com 24 anos (iria perfazer 25, dai a menos de dois meses); faleceu no estado de solteira e sem deixar descendentes; vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria; era professora do agrupamento de escolas de Sendim, encontrando-se, à data da morte, no 3. ° escalão índice 151, da carreira indiciária do Pessoal Docente de Educação Pré-Escolar e dos Ensinos Básico e Secundário, auferindo o vencimento mensal líquido de € 958,09; era saudável, e gostava de viver, e, tendo ainda em conta a jurisprudência actual deste Supremo, sobre o valor do dano morte, verifica-se, ser ajustada a quantia arbitrada pela Relação, que, in casu, é de manter.- Sobre os danos não patrimoniais sofridos pelos demandantes:Considerou a Relação: “Com pertinência para a determinação deste montante provou-se que a Natália Sofia Freire Silva vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria, sendo uma filha extremosa e dedicada a seus pais, auxiliando o pai num estabelecimento de café que este explorava, sempre que podia. Os demandantes viviam apenas com a filha Natália, que era o seu grande aconchego porque embora tenham um outro filho, este é mais velho, casado e com família e vida própria. Os demandantes tinham grande orgulho na filha e a sua morte causou-lhes grande desgosto, sofrimento e angústia. Em Outubro de 2006 os demandantes estavam a ser acompanhados no Centro de Saúde da sua localidade, por padecerem de perturbações depressivas desde a morte da filha e desde 2/02/2006 e até pelo menos Maio de 2006, o demandante também foi acompanhado pelos serviços de psiquiatria e saúde mental de Valongo, em consequência da morte da filha. Dentro do circunstancialismo apontado e vistas as circunstâncias do caso tal como resultam da matéria de facto que em primeira instância se teve como provada, socorramo-nos uma vez mais da jurisprudência recente para aquilatar do equilíbrio da indemnização fixada: - No acórdão do STJ de 24-01-2006 (Revista n° 3941/05 - 6a Secção), numa situação de repartição de culpas, fixada a culpa da própria vítima em 75%, ponderados o sofrimento, abalo moral e desgosto, dados os laços recíprocos de afecto e ternura e ponderado o melindre que a quantificação de tais danos acarreta, foram os danos não patrimoniais da viúva da vítima fixados em € 20.000,00; - No acórdão do mesmo tribunal de 24-01-2006 (Revista n° 3517/05 - Ia Secção), foi fixado em € 39.903,00 o montante da indemnização global atribuída a ambos os autores para compensar os danos não patrimoniais correspondentes ao desgosto e à dor que tiveram com a morte do seu filho, que era ainda um jovem, sendo especialmente relevante a intensidade do dolo com que actuou o lesante, que procurou intencionalmente obter a morte da vítima; - No acórdão do STJ de 12-10-2006 (Revista n° 2520/06 - T Secção), foi arbitrada a indemnização de € 20.000,00 a cada uma das autoras, para reparação dos danos não patrimoniais decorrentes da perda do marido e pai, respectivamente; - Noutro acórdão do STJ, também de 12-10-2006 (Revista n° 2890 - T Secção), considerou-se como justo e equitativo o montante indemnizatório de € 20.000,00 para ressarcir os danos não patrimoniais sofridos pela Autora com a morte súbita e violenta do marido, traduzidos numa forte dor moral e num vazio existencial que ainda hoje perduram; - Em acórdão de 24-10-2006 (Revista n° 3021 - 6a Secção), em que se provou que a viúva e o marido formavam um casal feliz, tinham contraído matrimónio cerca de um ano antes do acidente, fruto de cinco anos de namoro, tendo o falecimento do marido deixado a viúva profundamente desgostosa e abalada, com os sonhos desfeitos, sem perspectivas de futuro e grávida do único filho do casal que veio a nascer, considerou-se equitativo para ressarcir a viúva pelo dano moral decorrente da morte do marido o montante de € 24.939,89 - Mais recentemente, em acórdão de 13-09-2007 6, decidiu o STJ que como a vítima e o cônjuge formavam um casal feliz e a morte do pai originou aos seus três filhos, de 20, 17 e 13 anos de idade, abalo e desnorte no percurso estudantil, justifica-se a fixação da compensação por danos não patrimoniais em € 20.000,00 para em primeira e em € 12.500,00 para cada um dos três últimos. Como é sabido, a fixação da indemnização por danos morais pressupõe o recurso aos padrões jurisprudencialmente definidos, assim se obtendo uma uniformização de critérios que evite o mero subjectivismo na fixação da indemnização. Ora, vistas as coisas a esta luz e mesmo considerando uma actualização dos valores apontados, o montante de € 35.000,00 atribuído a cada um dos demandantes pelo desgosto sofrido com a morte da filha, situado num patamar muito próximo do valor fixado pelo dano morte, revela-se excessivo, havendo que reduzi-lo para € 25.000,00 para cada um dos demandantes, valor que se oferece como mais ajustado face aos critérios jurisprudenciais habitualmente seguidos.” - Também aqui assiste razão à decisão da RelaçãoNa verdade, a EE vivia com os seus pais, a quem muito amava e queria, sendo uma filha extremosa e dedicada a seus pais, auxiliando, sempre que podia, o seu pai num estabelecimento de café que este explorava. Os demandantes tinham grande orgulho na filha EE, vivendo apenas com ela, que era o seu grande aconchego, sendo que têm um outro filho, mas mais velho, casado e com família e vida própria. A morte da filha EE causou aos demandantes grande desgosto, sofrimento e angústia; em Outubro de 2006 os demandantes estavam a ser acompanhados no Centro de Saúde da sua localidade, por padecerem de perturbações depressivas desde a morte da filha EE; e desde 2/02/2006 e até pelo menos Maio de 2006, o demandante também foi acompanhado pelos serviços de psiquiatria e saúde mental de Valongo, em consequência da morte da filha EE. É, pois, evidente que “a perda da filha envolveu os demandantes num quadro particularmente doloroso e com resultados negativos a nível psíquico e mental.”, como salientam os demandantes na conclusão 8ª da motivação do recurso. O montante atribuído de vinte e cinco mil euros para cada demandante mostra-se equitativamente adequado. - Por último sobre os danos morais sofridos pela vítima:A Relação atribuiu 20 000,00 € como indemnização devida pelos mesmos. A 1ª instância atribuíra 10 000,00 €. A demandada indica 4 000,00 € Disse a Relação “Como resulta do n° 3 do art. 496° do Código Civil, este dano - o sofrimento da própria vítima entre o momento do acidente e o momento da sua morte - tem carácter autónomo para efeitos indemnizatórios, a par do dano morte. Ora, vistos os factos provados, em que releva particularmente o período por que se prolongou o sofrimento da vítima, a quantia arbitrada em primeira instância para ressarcimento deste dano, fixada em montante muito inferior ao valor arbitrado a título de danos não patrimoniais dos familiares da vítima, peca pela escassez, nomeadamente se se tiver presente que o sofrimento da vítima entre o acidente e o momento do decesso, se prolongou por dois dias. A quantia de € 20.000,00 peticionada pelos demandantes revela-se maís ajustada, num juízo de equidade que atenda a todas as circunstâncias relevantes do caso, pelo que para tal valor haverá que alterá-la.” - Ora, tendo em conta que, como vem provado, do acidente resultaram para a passageira EE, os ferimentos descritos no relatório de autópsia de fls. 197 a 205, nomeadamente enfarte cerebral consecutivo a dissecação traumática da artéria carótida primitiva esquerda que lhe causou, directa e necessariamente, a morte, ocorrida no dia 22/02/ /2005; a EE sofreu dores físicas imediatamente após o acidente resultantes dos ferimentos de que foi vítima, que só se extinguiram com a morte, e sofreu a angústia da morte, justifica-se a quantia arbitrada, atenta a idade da vítima, a natureza das lesões e dor permanente resultante das mesmas até ao momento da morte, que ocorreu passados dois dias, e a percepção sentida pela vítima, que viveu a angústia da morte.De todo o exposto, conclui-se que os recursos não merecem provimento. --- Termos em que, decidindo: Acordam os deste Supremo – 3ª Secção – em negar provimento aos recursos, assim confirmando o douto acórdão recorrido. Custas pelos recorrentes de harmonia com o decaimento. Supremo Tribunal de Justiça, 12 de Março de 2009 Elaborado e revisto pelo relator Pires da Graça (Relator) Raul Borges |