Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO PINTO OLIVEIRA | ||
Descritores: | OPOSIÇÃO ENTRE OS FUNDAMENTOS E A DECISÃO EXCESSO DE PRONÚNCIA OFENSA DO CASO JULGADO PRESUNÇÃO JUDICIAL COMPROPRIETÁRIO DIVÓRCIO SEPARAÇÃO DE MEAÇÕES INVENTÁRIO BENS COMUNS DO CASAL LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ | ||
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Data do Acordão: | 06/03/2025 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA | ||
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Sumário : | Em caso de uso exclusivo da coisa comum por um dos comproprietários, as partes podem derrogar por acordo o dever de contribuição proporcional para as despesas necessárias á conservação ou à fruição da coisa comum previsto no artigo 1411.º do Código Civil. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA Recorrente: AA e BB Recorrido: CC I. — RELATÓRIO 1. AA e BB propôs a presente acção declarativa contra CC, pedindo: I,. — que o Réu fosse condenado no pagamento da quantia de 38.572,67 euros, acrescida de juros de mora, desde a citação até integral e efectivo pagamento; II. — que o Réu fosse condenado no pagamento de metade de todas as prestações vincendas e relativas às fracções autónomas designadas pelas letras BV e F, do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., n.ºs 321 e 421, e na Rua ..., n.º 247, na freguesia da ... do concelho de .... 2. O Réu CC contestou e deduziu reconvenção, pedindo: I. — que a Autora fosse condenada no pagamento da quantia de 58.448,00, acrescida de juros de mora desde a notificação da contestação/reconvenção; II. — que se extinguissem, por compensação, os créditos recíprocos da Autora e do Réu. 3. O Tribunal de 1.ª instância julgou parcialmente procedente a acção e totalmente improcedente a reconvenção. 4. O dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância é do seguinte teor: “Pelo exposto: III.a) Julga-se parcialmente procedente a ação e condena-se o Réu a pagar à Autora a quantia de € 29.676,22 (vinte e nove mil, seiscentos e setenta e seis euros e vinte e dois cêntimos), acrescida de juros de mora, calculados à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento, absolvendo-se o Réu da parte restante do pedido; III.b) Julga-se improcedente a reconvenção, pelo que se absolve-se a Autora do pedido reconvencional formulado pelo Réu. Condenam-se Autora e Réu a pagar as custas, na proporção do decaimento (art. 527.º do Código de Processo Civil), sem prejuízo para o apoio judiciário de que beneficia o Réu”. 5. Inconformados, a Autora e o Réu interpuseram recursos de apelação. 6. O Tribunal da Relação julgou parcialmente procedentes os dois recursos. 7. O dispositivo do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação é do seguinte teor: Pelos motivos expostos, e nos termos das normas invocadas, acordam os juízes destes autos no Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedentes os recursos de apelação interposto pelas partes, revogando-se, em parte, a sentença recorrida. Em conformidade, julgando-se, quer o pedido em ação, quer o pedido em reconvenção parcialmente procedentes: 1) Absolvemos o réu de pagar à autora metade da quantia de 40358,42 Euros, atinente aos encargos inerentes aos imóveis (frações BV e F, apartamento e garagem), com prestações bancárias, quotas, seguros e impostos, desde a data do divórcio até à instauração da ação, por estar compensada pelo acordo efetuado pelas partes e pelo qual a autora ficou a gozar exclusivamente os imóveis. 2) Absolvemos o réu de pagar à autora metade da quantia de 6822,38 Euros, atinente aos encargos de pagamento de condomínio inerente aos imóveis (frações BV e F, apartamento e garagem), desde a data do divórcio até à instauração da ação, por estar compensada pelo acordo efetuado pelas partes e pelo qual a autora ficou a gozar exclusivamente os imóveis. 3) Condenamos o réu a pagar à autora metade (2731,60 Euros) das despesas com preparos, custos e outras despesas necessárias à preparação e concessão do mútuo bancário concedido para a aquisição dos imóveis, frações BV e F, suportadas exclusivamente pela autora (no montante total de 5463,21 Euros). 4) Condenamos o réu a pagar à autora metade (2315,13 Euros) da quantia de 4630,25 Euros, atinente aos encargos inerentes aos imóveis (frações BV e F, apartamento e garagem), com prestações bancárias, quotas, seguros e impostos, respeitante às prestações que se venceram após à interposição da ação e até à data da sentença proferida em primeira instância (prestação de março de 2024). 5) Condenamos o réu a pagar à autora metade (398,05 Euros) da quantia de despesas com o condomínio (frações BV e F, apartamento e garagem), num total de 796,11 Euros (522,25 Euros + 272,86 Euros) que a autora pagou após à interposição da ação e até à data da sentença proferida em primeira instância (quotização do primeiro trimestre de 2024). 6) Às quantias referidas em 4) e 5) a serem pagas pelo réu será deduzido metade do valor locatício mensal dos imóveis, por cada mês decorrido, a apurar em sede de liquidação de sentença, porquanto esta está a gozá-los em exclusivo. 7) As quantias referidas em 4) e 5) serão atualizadas em função da data do trânsito em julgado deste acórdão. 8) Condenamos a autora a pagar ao réu o valor, que se vier a apurar (ou não) em liquidação de sentença, que exceda metade (29224 Euros, da responsabilidade dele) da quantia de 58448 Euros (da responsabilidade de ambos) respeitante às prestações mensais relativas ao crédito à habitação e demais despesas associadas a esse empréstimo, desde a data de aquisição das frações autónomas designada pelas letras BV e F (02/05/2000) até à do divórcio entre eles (18/09/2012). 9) Até à cessação da indivisão dos imóveis (frações BV e F, apartamento e garagem), todas as despesas vincendas inerentes a eles (prestações bancárias, juros, quotas, impostos, condomínio, etc.) serão suportadas por autora e réu em partes iguais, deduzindo-se (ou recebendo o excedente, se for o caso…) na metade da responsabilidade do réu o equivalente a um meio do valor locatício mensal das frações (a liquidar em execução de sentença), por a autora estar a gozá-los em exclusivo. 10) Às quantias a pagar pelo réu à autora acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a citação, e às a pagar pela autora ao réu, nos mesmos termos, mas a contar da notificação da reconvenção. 11) Confirmamos a absolvição de ambas as partes por litigância de má-fé. 12) As custas na primeira instância e da apelação são em partes iguais por autora e réu, sem prejuízo dos acertos que forem justificados pelo resultado final, após finda a liquidação, nos termos do art.º 527.º, n.º 1, e n.º 2, do C.P.C. 8. Inconformada, a Autora AA e BB interpôs recurso de revista. 9. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: A. A Recorrente não pode concordar com o acórdão proferido pelo Tribunal a quo o qual, de forma invocadora face à sentença de primeira instância, decide condenar a aqui Autora/Recorrente e absolver, parcialmente, o Réu/Recorrido. B. O Tribunal a quo incorreu em múltiplas nulidades processuais que inquinam irremediavelmente o acórdão recorrido e impõem a sua revogação, designadamente ao violar ostensivamente o caso julgado anterior, ao incorrer em excesso de pronúncia condenando o Recorrido para além do pedido e ao incorrer em várias contradições insanáveis entre a fundamentação e a decisão. C. A violação do caso julgado é particularmente evidente e grave, porquanto a decisão recorrida, ao presumir a existência de um acordo tácito de compensação entre os ex-cônjuges, contraria frontalmente o que havia sido decidido em ação anterior transitada em julgado, que julgou a pretensão do Recorrido de pôr fim à compropriedade do imóvel, revelando justamente a inexistência de qualquer acordo nesse sentido. D. Já o excesso de pronúncia resulta manifesto do facto de o Tribunal a quo ter condenado em pretensões não deduzidas ou peticionadas pelas partes, designadamente ao estabelecer um regime de compensação para o futuro, aplicando oficiosamente um suposto acordo tácito que não se provou em primeira instância, com o crivo da imediação e oralidade. E. E a contradição entre os fundamentos e a decisão é por demais evidente quando se constata que o Tribunal a quo começa por reconhecer que certos factos essenciais à pretensão do Recorrido não estavam provados, para depois ainda assim decidir em seu favor com base num pretenso acordo que nunca ficou demonstrado, antes resultou de uma aplicação manifestamente abusiva e errónea das presunções judiciais. F. Com efeito, o Tribunal a quo fez uma aplicação indevida e abusiva das presunções judiciais previstas nos artigos 349º e 351º do Código Civil, ao presumir, sem suficiente base factual e contra as regras da experiência, a existência de um acordo tácito com base em meros comportamentos omissivos da Recorrente, que podem ter as mais variadas explicações e que não permitem, por si só, presumir um facto tão complexo e improvável como um acordo de compensação tácita entre ex-cônjuges. G. Acresce que o raciocínio do Tribunal a quo para invocar as ditas presunções enferma de múltiplas falácias lógicas que lhe retiram qualquer credibilidade ou consistência, desde a evidente petição de princípio ao presumir a existência do acordo com base na mera inércia processual da Recorrente e depois usar o suposto acordo para justificar essa mesma inércia, até à falsa dicotomia de pretender que a única explicação plausível para o comportamento das partes seria a existência de um acordo, desconsiderando todas as outras possíveis razões para a não propositura imediata de uma ação de divisão de coisa comum. H. O Tribunal a quo desconsiderou também jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça que o acordo dos cônjuges, judicialmente homologado, no qual não se prevê o pagamento de qualquer compensação pecuniária pelo uso exclusivo da casa, através dele atribuída a um dos cônjuges, deve ser interpretado no sentido de que as partes não contemplam o pagamento de qualquer quantia como contrapartida da utilização do imóvel, não sendo admissível a sua modificação substancial em termos de converter a utilização prevista no acordo, numa utilização subordinada ao pagamento de uma quantia pecuniária”. (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, processo n.º 135/12.7TBPBL-C.C1.S1, datado de 13-10-2016, relator LOPES DO REGO, disponível in www.dgsi.pt.) I. Ao criar um acordo tácito entre as partes por via destas presunções abusivas e infundadas, o Tribunal a quo desconsiderou também grosseiramente as regras de distribuição do ónus da prova plasmadas no artigo 342º do Código Civil, que impunham ao Recorrido o ónus de demonstrar positivamente a existência e conteúdo do acordo que invocava em seu favor, e não à Recorrente a prova diabólica da sua inexistência. J. A violação das regras do ónus da prova é tão mais grave quanto é certo que a factualidade dada como provada pela primeira instância, após juízos de valor próprios baseados na imediação e oralidade características da audiência de julgamento, apontava justamente no sentido de não ter existido qualquer acordo, pelo que a decisão recorrida incorre também numa inadmissível desconsideração da matéria de facto fixada, substituindo a prova produzida por meras presunções. K. Não menos grave é a evidente violação das regras imperativas que regulam os efeitos patrimoniais do casamento e que, nos termos do artigo 1676º do Código Civil, impõem a ambos os cônjuges o dever de contribuir para os encargos da vida familiar de acordo com as suas possibilidades durante toda a constância do matrimónio, sendo portanto inadmissível condenar a Recorrente a compensar o Recorrido por despesas feitas em proveito comum durante esse período. L. Acresce que mesmo após o divórcio, e justamente por não ter ficado demonstrado qualquer acordo de partilha ou assunção de encargos entre os ex-cônjuges, continuava a impor-se a regra supletiva da divisão em partes iguais de todas as despesas inerentes à compropriedade do imóvel que anteriormente constituía a casa de morada de família, pelo que carece igualmente de base legal a condenação da Recorrente a compensar o Recorrido por um suposto uso exclusivo do imóvel que ele nunca logrou provar. M. É, aliás, manifesta a contradição entre, por um lado, a absolvição do Recorrido do pedido de reembolso das despesas com o imóvel suportadas pela Recorrente após o divórcio, com fundamento num hipotético acordo de compensação pela alegada ocupação exclusiva, e, por outro lado, a condenação da Recorrente a pagar ao Recorrido uma compensação pelas despesas suportadas durante o casamento, justamente quando vigorava entre ambos uma plena comunhão de vida que implicava a responsabilidade solidária por todas as dívidas contraídas em proveito comum; ética para uns, dura lex sed lex para outros, é este o critério do Tribunal a quo. N. Termos em que, atenta a gravidade e multiplicidade de vícios e nulidades processuais de que enferma o douto acórdão recorrido, não pode o mesmo deixar de ser integralmente revogado por este Supremo Tribunal, repondo-se a justeza da decisão da primeira instância na parte em que reconheceu a obrigação legal do Recorrido de contribuir para as despesas relacionadas com o imóvel comum, por ser esse o regime legalmente aplicável à situação dos autos. O. Impõe-se, pois, revogar integralmente o acórdão da Relação do Porto na parte em que deu provimento ao recurso do Recorrido e o julgou parcialmente procedente, confirmando-se a sentença de primeira instância no que tange à condenação do Recorrido no pagamento da sua quota-parte nas despesas relacionadas com o imóvel comum. P. A decisão do Tribunal a quo, data venia, na parte em que deu provimento à apelação do Recorrido e lhe reconheceu um direito a compensação com base num acordo não demonstrado, viola ostensivamente vários preceitos legais e princípios basilares do processo civil, designadamente o princípio do dispositivo, as regras do ónus da prova, o dever de fundamentação das decisões judiciais e a obrigação de decidir segundo os factos alegados e provados, pelo que não pode deixar de ser integralmente revogada, repondo-se a legalidade e a justiça da solução alcançada pela primeira instância. Q. Apenas com a revogação integral do douto acórdão recorrido, na parte em que deu provimento ao recurso do Recorrido, e com a manutenção da condenação deste no pagamento da quota-parte que legalmente lhe incumbe nas despesas relacionadas com o imóvel, se assegura o efetivo respeito pelo princípio da legalidade e se alcança uma solução materialmente justa, que não premia a inércia e incúria daquele que, estando obrigado a comparticipar num encargo comum, se pretende locupletar à custa do outro comproprietário com base num pretenso acordo que nunca logrou demonstrar. R. E nem se invoque, como fez o Tribunal a quo(apenas quando lhe aprouve) uma suposta ética da justiça para fundamentar uma solução que, na verdade, é profundamente injusta e atentatória da legalidade, pois a verdadeira ética que deve nortear as decisões judiciais é a que resulta da correta aplicação das normas legais ao caso concreto, segundo os factos provados e à luz dos princípios basilares do Direito, e não uma qualquer ideia difusa de justiça que ignore o regime legal aplicável para presumir artificialmente factos e acordos não demonstrados com o propósito de beneficiar uma das partes em detrimento da outra. S. O Tribunal a quo refere superficialmente o instituto do enriquecimento sem causa, mas não explica minimamente em que termos se verificariam os seus pressupostos constitutivos, designadamente, o enriquecimento de alguém, o empobrecimento de outrem, a ausência de causa justificativa e o nexo de causalidade entre o enriquecimento e o empobrecimento. T. Da factualidade provada resulta precisamente o oposto: foi a Autora/Recorrente quem suportou a integralidade dos preparos e despesas com a aquisição do imóvel que constituiu a casa de morada de família, bem como, no período pós divórcio, a totalidade dos encargos associados à sua conservação, do qual o Réu/Recorrido era comproprietário e nada despendia; por sua vez foi dado como não provado que durante o casamento tenha sido apenas o Réu/Recorrido a pagar esses encargos, o que implica a conclusão inelutável de que também a Autora/Recorrente contribiu e/ou pagou para liquidar esses encargos. U. Relativamente ao período de vigência do casamento, as contribuições efetuadas por cada cônjuge para os encargos da vida familiar encontram causa jurídica no cumprimento do dever de contribuir para a economia comum do casal, plasmado no artigo 1676.º do Código Civil, não podendo ser assacadas retroativamente ao outro cônjuge a título de "compensação" ou “enriquecimento". V. No período pós-divórcio, mantendo-se a compropriedade, sobre ambos os comproprietários impendia o dever de contribuir para as despesas de conservação, não legitimando a utilização exclusiva do imóvel por um deles a sua desoneração de tal dever. W. É jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça que o uso exclusivo da coisa comum por um dos comproprietários não o obriga a pagar uma “compensação" ao outro, nem o desonera do pagamento da sua parte nas despesas de conservação, salvo acordo das partes que in casu não se provou. X. Pelo que, em conclusão, deverá o presente recurso ser julgado totalmente procedente, revogando-se na íntegra o douto acórdão recorrido na parte em que deu provimento ao recurso do Recorrido, mantendo-se a decisão da primeira instância que condenou o Recorrido no pagamento da quota-parte que lhe cabe nas despesas comuns relacionadas com o imóvel, por ser essa a solução que melhor se harmoniza com a lei e os factos provados nos autos, por imperativo da mais elementar e básica Justiça. Y. Foram violados, entre outros, os arts. 342.º, 349.º, 351.º e 1676.º do Código Civil. NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO QUE VOSSAS EXCELÊNCIAS SEMPRE SABERÃO SUPRIR, DEVE O PRESENTE RECURSO DE REVISTA SER ADMITIDO POR SE VERIFICAREM OS RESPETIVOS PRESSUPOSTOS LEGAIS E, EM CONSEQUÊNCIA, DEVE SER JULGADO TOTALMENTE PROCEDENTE, REVOGANDO-SE INTEGRALMENTE O DOUTO ACÓRDÃO RECORRIDO NA PARTE EM QUE DEU PROVIMENTO PARCIAL AO RECURSO DO RECORRIDO, MANTENDO-SE A DOUTA SENTENÇA DA PRIMEIRA INSTÂNCIA QUE CONDENOU O RECORRIDO. DECIDINDO ASSIM, V. EXAS. ATRIBUIRÃO TONS DE VERDADE À JUSTIÇA… 10. O Autor contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela improcedência do recurso. 11. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões: 1.- O presente recurso de revista consubstancia litigância de má-fé da Recorrente, que irresignada, por via dele procura obter a condenação do Réu num valor, que sabe injusto, usando argumentos que sabe serem falsos. 2.- Deve ser liminarmente rejeitado o recurso, e desentranho dos autos o documento junto, e caso assim se não entenda devem ser improcedentes por não provados os argumentos plasmados nas conclusões da Autora nas alíneas A), B), C), D), E), F), G), H), I), J), L), M), N), O), P), Q), R),S), T), U), V), X), Y), do recurso de revista. 3.- A Recorrente não pode socorrer-se do Recurso de Revista para reapreciação da matéria de facto, com base na junção de um documento (certidão de um processo), que não é superveniente, conforme supra se expôs e se deixou impugnado, cf. arts. 423º, nº 3 e 425º, ambos do CPC 4.- além de ser uma certidão de um processo de divisão de coisa comum, que culminou com a extinção da Instancia por deserção, ou seja, onde nada se decidiu quanto ao objecto da acção. 5.- Decisão que transitou em julgado em janeiro de 2015 e não em Janeiro de 2025, pelo que, além de certidão errada quanto à data do transito, que a autora não pode deixar de conhecer, não tem qualquer valor e força probatória para os fins pretendidos pela mesma. 6.- Nessa medida, não se lhe pode extrair o valor jurídico plasmado no art. 621º, e 625º do Novo CPC, que, aliás, salienta-se, a Autora não alegou, também não requereu, tal como não fundamentou o seu requerimento com base nas normas processuais vigentes. 7.-Tão pouco esse documento – dada a deserção – nada pode relevar para a apreciação da prova produzida e da decisão proferida pelo Tribunal da Relação sobre a matéria de facto no âmbito do presente processo comum, pois, no caso em apreço, caso estamos já no âmago do objecto do recurso de revista e o que a Autora pretende apreciar integra nos poderes legais dos Tribunais da Relação, por força do preceituado no art. 662º do Novo CPC. 8.- O STJ conhece matéria de direito, como princípio geral de um tribunal de revista, sendo as decisões proferidas pela Relação no plano dos factos, em regra, irrecorríveis (arts. 662.º, n.º 4, 674.º, n.º 3, e 682.º, n.os 1 e 2, do CPC). 9.- Razão pela qual se deve indeferir a junção de tal documento, determinando-se o seu desentranhamento dos autos, devendo a Autora ser condenada em custa pelo incidente. Sem prescindir, e para o caso de tal ser admitido, 10.- Não existe qualquer violação do disposto nos artigos 342º, 349º, 351º, e nem do artigo 1676º, todos do Código Civil. 11.- Do Acórdão da Relação do Porto não se verifica violação do caso julgado, na sua vertente negativa, pois as acções têm por objecto diferentes pedidos e causas de pedir. 12.- E também não se verifica violação da autoridade do caso julgado, vertente positiva, pois naquela acção, Processo 5905/12.3....., ora trazida ao recurso, nada se decidiu, nada se apreciou quanto ao objecto da causa, por ter sido julgada deserta por inércia das partes, (documento este que não é superveniente), reitere-se. 13.- O documento junto pela Autora, é mais um expediente, e, o único efeito que pode ter é o de vir corroborar a douta fundamentação do Acórdão do Tribunal da Relação, quanto à inércia da Autora, (muito conveniente para esta), pois ao nada fazer para a divisão da coisa comum (imóveis em compropriedade), continuou na sua posse exclusiva, como casa de morada de família, desde a data do divorcio até à presente data, 14º- e ainda, sem impulsionar a divisão, mantendo-se a Autora sempre no uso exclusivo do imóvel (desde o divorcio até à presente data –mais de 14 anos) pretende extrair do réu o valor das prestações mensais do crédito à habitação, sem pretender pagar um único cêntimo do valor locativo, valor uso do imóvel, situação que é no mínimo gritantemente injusta, atenta a matéria de facto provada. 15.- E, a decisão proferida pelo acórdão recorrido não é contraditória ou incompatível com o Processo 5905/12.3..... –Juiz..., nem esta constitui causa prejudicial ou necessária daquela, sendo o objecto das acções, definido pelo pedido e pela causa de pedir, perfeitamente distintos. 16.- Inexiste qualquer excesso de pronuncia da parte do Tribunal da Relação. 17.- O dever de decidir teve por referência as questões suscitadas e que podiam ser apreciadas na instância recursiva em causa, assim como as questões de conhecimento oficioso, mas não obriga a que se discutam todos os argumentos e posições revelados na pretensão do recorrente 18.- O ónus processual de decisão, em sede de recurso, ficou cumprido pelo Tribunal da Relação, porque ficaram apreciadas todas as questões suscitadas no recurso, e delimitadas em concreto nas conclusões das alegações recursivas (conforme o disposto nos arts. 635º, 3 e 4, 639º, 1 e 2, e 640º do CPC) e no próprio requerimento de interposição do recurso (art. 635º, 2, CPC), conclusões de recurso do réu que supra reproduzidas integralmente. Sem prescindir, 19.- O presente recurso de revista, para além de confuso e incoerente, antes de dever ser rejeitado, deve ser declarado inepto. 20.- Andou bem a Relação ao alterar os pontos da matéria de facto II, III, IV, considerando-os provados, e aditando-os a matéria de facto provada. 21.- Porquanto, na primeira instancia foram desconsiderados a prova documental, assim como aquelas evidencias que “todos percebem”, que a experiência comum determina, referentes às obrigações nestes casos de casamento no regime da separação de bens. Foram desconsideradas na primeira instancia aquelas evidencias que “todos percebem”, que a experiência comum determina, referentes às transferências patrimoniais que necessariamente ocorrem durante a vigência do casamento, concretamente, no regime de separação de bens, e o Tribunal da Relação depois de uma análise mais atente, criteriosa e cuidada de toda a prova, fez justiça! 22.-O tribunal da Relação atribui uma relevância positiva ás declarações de parte e depoimento do Réu, quando este declarou em julgamento que desde o divorcio que não pagou as prestações do crédito à habitação, porque a Autora ficou a viver na casa com os filhos e que foi assim acordado entre ambos, ou seja, “…ela ficaria a viver na casa e pagaria as prestações mensais do crédito ao banco” uma vez que a casa ficou atribuída à autora até à “partilha”, e o Réu teve de arrendar outra casa, e esses factos estão provados na primeira instancia e apenas foram reapreciados e alterados pelo tribunal da Relação: “13) Desde 25-11-2011 que o Réu deixou de habitar a casa de morada de família 14) A partir de 25-11-2011 e até à atualidade, a Autora habita na casa de morada de família com os três filhos do casal. “ 15) O casamento de AA e BB (ora Autora) com CC (ora Réu) foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de ...-...-2012, transitada em julgado no dia 18-10-2012. 16) Na tentativa de conciliação que precedeu o decretamento do divórcio, AA e BB (ora Autora) e CC (ora Réu) acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída a AA e BB (ora Autora) até à sua venda ou partilha; acordo que foi homologado no âmbito da sentença que decretou o divórcio. 17) No âmbito do acordo acabado de referir não foi estabelecido o pagamento de qualquer contrapartida pecuniária a cargo da Autora. “ 23.- Ora, não ficou nada escrito quanto ao pagamento de contrapartida pecuniária a pagar pela Autora por esta ter ficado a habitar a casa desde o divorcio e até à actualidade, contudo decorreram mais de 12 anos sem que a Autora tivesse exigido do Réu o pagamento da sua quota parte relativa ao contrato de mutuo, pois foi a autora que continuou a habitar a casa desde o divorcio até à actualidade, porque foi assim que ambos acordaram, muito embora não tenha ficado escrito qualquer contrapartida a pagar pela Autora ao Réu, foi assim que acordaram … 24.- Esta matéria passou a constar da matéria de facto provada, atenta a alteração feita pelo Tribunal da Relação à Matéria de facto. 25.- assim como passou a figurar no elenco dos factos provados que: “III Autora e Réu acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída à Autora até à sua venda ou partilha, comprometendo-se a Autora a pagar as prestações mensais referentes ao empréstimo bancário e demais despesas inerentes à morada de família, enquanto não se fizesse a sua divisão e enquanto não se efetuasse o acerto de contas relativas às transferências patrimoniais de rendimentos próprios do Réu para o pagamento de dívidas de ambos, ocorridas desde julho de 1995 a novembro de 2011;… IV -Entendimento que visou também compensar a saída do Réu daquela habitação e os gastos que tal situação lhe acarretou com um novo encargo mensal referente à renda de casa.” 26.- Ora estes factos resultam provados do depoimento/declarações de parte do Réu, que ficaram gravados em suporte digital no aplicativo "H@bilus Media Studio", assim como em suporte físico (CD-ROM), com inicio pelas 14:39 horas e términus pelas 15:43 horas, cuja duração é de 1 hora e 1 minuto, nos termos do art.º 155, n.º1, do Código de Processo Civil, que o Tribunal da Relação, ouviu, apreciou e fundamentou na sua decisão quando entendeu alterar a matéria de facto, 27.- após uma análise da matéria de facto mais atenta, atendendo quer à prova produzida em audiência de julgamento, quer à prova documental junta aos autos, análise essa, à luz dos princípios gerais de direito. 28.- A tese propugnada pelo Douto Tribunal da Relação compagina- se com o escrutínio decorrente da razão e das regras da experiência comum. 29.- Após o divórcio (tal com já vinha sucedendo após a separação de facto) a casa de morada de família e respectivo recheio, foi atribuída à aqui Autora, para nela morar, enquanto o Réu foi obrigada a suportar os custos de uma outra habitação para si. 30.- Se a Autora, com a separação de facto e, em especial, com o acordo feito na data do divórcio, ficou com a exclusiva administração da casa de morada de família e respectivo recheio, deverá prestar contas ao Réu não apenas das despesas suportadas, mas também dos ganhos patrimoniais obtidos. 31.- Por outro lado, a utilização exclusiva da casa de morada de família do ex-casal e respectivo recheio, representa sem qualquer dúvida, uma vantagem económica. 32.- No mínimo, o valor do uso, sempre seria de valor idêntico às despesas alegadamente suportadas pela Autora e reclamadas por esta ao Réu nos presentes autos, factos levados à acção pelo Réu, na Contestação/Reconvenção e no seu recurso de Apelação, e que apenas a Relação conheceu. 33.- Contudo, no caso concreto dos autos, atentas as concretas características do imóvel e seu recheio, o valor do uso da casa de morada de família sempre seria muitíssimo superior ao valor das simples despesas com crédito à habitação, quotas de condomínio e demais despesas referentes ao imóvel. 34.- Desde 25 de novembro de 2011, até à presente data – (uma vez que a divisão do bem ainda não foi até hoje concretizada, continuando a Autora a fazer uso da casa de morada de família sem nada pagar ao Réu) - a Autora, obteve à custa do património de ambos – casa de morada de família constituída, e do seu recheio, uma vantagem patrimonial correspondente ao valor locativo da casa de morada de família, 35.- O que significa que a Autora obteve ganho à custa do uso exclusivo do património do Réu, no período contado desde a data do divorcio até à presente data. 36.- Assim, tribunal da Relação conheceu estes factos levados à acção, que constam da Contestação/reconvenção, e que constam das alegações de recurso de Apelação, sendo que a decisão constante do Douto Acórdão da Relação não viola o disposto no artigo 1676º do C.C.. 37.- Mesmo que se entenda que a Autora pagou sozinha as prestações relativas ao crédito da habitação e demais despesas, desde o divorcio até à presente data, o certo é que é a Autora qua habita na casa desde a separação, conforme resulta dos factos provados. 38.- O Réu está privado do uso do seu imóvel desde a separação de facto até à actualidade, pois resulta dos factos provados que a Autora usa tal habitação desde a separação do casal. 39.- Nos termos do art. 334.º do Código Civil, há abuso de direito quando este, atento o circunstancialismo do caso concreto, é exercido de uma forma profundamente injusta e iníqua, com manifesto excesso ou desrespeito pelos limites axiológico- materiais da comunidade, de tal modo que o sentimento de justiça imanente à ordem jurídica, impõe a retirada do mesmo ou a responsabilização do titular. 40.-a Autora pretende responsabilizar a ex-marido pelo pagamento de metade das despesas suportadas com a casa de morada de família no período em que a mesma foi exclusivamente por si habitada, situação que obrigou a Réu a suportar, sozinho, despesas de maior valor para ter sequer um teto para se abrigar. Sem prescindir, 41.- A Recorrente deduz pretensão cuja falta de fundamento não podem ignorar, 42.- Coloca em causa a idoneidade e seriedade do recorrido e do próprio tribunal da Relação, e está bem ciente que está a exercer tal direito contra a lei e contra a lógica, mas continua a fazer faz apenas para prejudicar o Recorrido, 43.- Deve por isso ser condenada como litigantes de má-fé, em multa pelo máximo legal, e em indemnização condigna a favor do Recorrido que, deverá ser fixada segundo o prudente arbítrio deste Supremo Tribunal. TERMOS EM QUE deve ser rejeitado liminarmente o recurso de revista interposto pela Recorrente, por inadmissibilidade legal. Quando assim não se entenda, sempre deve o mesmo ser declarado improcedente, concluindo-se como no douto Acórdão recorrido. Mais deve ser desentranhado dos autos o documento junto pela Autora com o recurso de revista e, condenada a Autora nas custas do incidente, e ainda condenada em multa sancionatória elevada ao máximo, e numa indemnização ao Recorrido, fixada segundo o prudente arbítrio deste Supremo Tribunal. Assim fazendo V. Exas. inteira e sã JUSTIÇA! 12. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. artigo 608.º, n.º 2, por remissão do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), as questões a decidir, in casu, são as seguintes: I. — se o acórdão recorrido é nulo: a — por contradição entre os fundamentos e a decisão; b. — por excesso de pronúncia; II. — se o acórdão recorrido incorre em ofensa de caso julgado; III. — se o acórdão recorrido faz um uso indevido das presunções judiciais; IV. — se a decisão do acórdão recorrido conflitua com o regime legal das relações entre os cônjuges; V. — se a decisão do acórdão recorrido conflitua com o regime legal das relações entre os comproprietários; VI. — se a Autora, agora Recorrente, incorreu em litigãncia de má fé. II. — FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS 13. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes: 1) AA e BB (ora Autora) casou com CC (ora Réu) no dia .../.../1995, no regime de separação de bens, conforme convenção antenupcial outorgada aos 05/05/1995 no terceiro cartório notarial do Porto(1) [aditado]. 2) Na constância do seu casamento, Autora e Réu decidiram adquirir as frações autónomas designada pelas letras “BV” e “F”, que fazem parte do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., n.ºs 321 e 421, e Rua ..., n.º 247, freguesia da ..., concelho de ..., para que ficassem a constituir a casa de morada de família. 3) E, nessa sequência, no dia 02/05/2000 entre S..., Lda, AA e BB (ora Autora) e CC (ora Réu), e Caixa Económica Montepio Geral foi outorgada uma escritura intitulada «COMPRA E VENDA E MÚTUO COM HIPOTECA» – nos termos que constam do documento 3 da petição inicial, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido –, pelo qual, entre o mais, S..., Lda declarou vender a AA e BB (ora Autora) e a CC (ora Réu), pelo preço de 16.000.000$00, a fração autónoma designada pelas letras “BV”, destinada a habitação, no sexto andar traseiras direito, com entrada pelo n.º 421 da Travessa ..., da qual faz parte um arrumo no vão da cobertura identificado pelas letras da fração; e a fração autónoma designada pela letra “F”, correspondente a um lugar de estacionamento na subcave(2), com entrada pelo n.º 247 da Rua ...; frações que fazem parte do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, construído no lote n.º 4, do alvará de loteamento n.º 600/95, sito na Travessa ..., n.ºs 321 e 421, e Rua ..., n.º 247, freguesia da ..., concelho de .... 4) Tendo AA e BB (ora Autora) e CC (ora Réu) declarado que aceitam a venda, nos termos exarados. 5) Nessa mesma escritura intitulada «COMPRA E VENDA E MÚTUO COM HIPOTECA», entre, por um lado, a Caixa Económica Montepio Geral e, por outro lado, AA e BB (ora Autora) e CC (ora Réu), foi ajustado um contrato de empréstimo que a Caixa Económica Montepio Geral concedeu aos ora Autora e Réu, confessando-se os ora Autora e Réu solidariamente devedores à Caixa Económica Montepio Geral da quantia de 20.100.000$00, que receberam desta Caixa Económica Montepio Geral, a título de empréstimo, comprometendo-se os ora Autora e Réu a constituir hipoteca sobre as frações que adquiriram, a favor da Caixa Económica Montepio Geral. 6) Encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º ..11/19950711-BV, da freguesia de ..., a fração autónoma BV, sita na Travessa ..., n.º 421, composta por uma habitação, no sexto andar-traseiras direito, com arrumo de 8,60 m2, no vão da cobertura, identificado pelas letras da fração. Trata-se de uma fração de tipo T2(3) [aditado]. 7) Pela apresentação n.º 22, de 2000/03/03, foi definitivamente inscrita a aquisição, por compra, a favor de AA e BB (ora Autora) e de CC (ora Réu), casados no regime de separação de bens, do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..11/19950711-BV. 8) Pela apresentação n.º 23, de 2000/03/03, foi definitivamente inscrita uma hipoteca a favor da Caixa Económica Montepio Geral, quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..11/19950711-F, para garantia do montante de 25.282.182,00 Escudos. 9) Encontra-se descrita na Conservatória do Registo Predial de ..., sob o n.º ..11/19950711-F, da freguesia de ..., a fração autónoma F, sita na Rua ... n.º 247, composta por um lugar de estacionamento, na subcave. 10) Pela apresentação n.º 22, de 2000/03/03(4), foi definitivamente inscrita a aquisição, por compra, a favor de AA e BB (ora Autora) e de CC (ora Réu), casados no regime de separação de bens, do imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..11/19950711-F. 11) Pela apresentação n.º 23, de 2000/03/03, foi definitivamente inscrita uma hipoteca a favor da Caixa Económica Montepio Geral, quanto ao imóvel descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n.º ..11/19950711-F, para garantia do montante de 25.282.182,00 Escudos. 12) As frações autónomas designadas pelas letras “BV” e “F” constituíam a casa de morada de família de Autora e Réu. 13) Desde 25/11/2011 que o Réu deixou de habitar a casa de morada de família. 14) A partir de 25/11/2011 e até à atualidade, a Autora habita na casa de morada de família com os três filhos do casal. 15) O casamento de AA e BB (ora Autora) com CC (ora Réu) foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de .../.../2012, transitada em julgado no dia 18/10/2012. 16) Na tentativa de conciliação que precedeu o decretamento do divórcio, AA e BB (ora Autora) e CC (ora Réu) acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída a AA e BB (ora Autora) até à sua venda ou partilha; acordo que foi homologado no âmbito da sentença que decretou o divórcio. 16 A) Da ata da legal tentativa de conciliação, aos .../.../2012, no âmbito da qual foi decretado o divórcio entre as partes ficou a constar, entre o mais, o seguinte:
(5) [aditado]. 17) No âmbito do acordo acabado de referir não foi estabelecido o pagamento de qualquer contrapartida pecuniária a cargo da Autora para lá do que consta do facto 28 [alterado em função do 28 aditado]. 18) A partir da data em que foi decretado o divórcio (.../.../2012), o Réu não mais contribuiu para os encargos inerentes ao imóvel, apartamento e garagem, que adquiriu conjuntamente com a Autora, designadamente não pagou ou contribuiu, desde a data do divórcio, com qualquer montante atinente à amortização do crédito à habitação, como quota mensal, juros, seguros e imposto de selo, tendo sido a Autora a pagar tais quantias que ascendiam à data da instauração da ação a € 40.358,42. 19) A partir da data em que foi decretado o divórcio (.../.../2012), tem sido a Autora a pagar integralmente as cotizações do condomínio as quais ascendiam à data da instauração da ação a 6822,38 Euros(6), sendo metade o valor de 3411,19 Euros. 20) Foi a Autora quem suportou a expensas exclusivamente suas o pagamento de todos os preparos, custos e despesas necessárias à preparação e concessão do mútuo bancário concedido para a aquisição do apartamento e garagem com entrada, respetivamente, pela Travessa ... n.º 421 e Rua ... n.º 247. 21) Os quais totalizaram 5463,21 Euros, sendo metade o valor de 2731,60 Euros(7). 22) Após a data da instauração da ação, a Autora pagou a expensas exclusivamente suas a quantia global de € 4.630,25 e a quantia global de € 2.830,18, relativas à amortização do crédito à habitação, como quota mensal, juros, seguros e imposto de selo, do ano de 2022 e de 2023, respetivamente. 23) Após a data da instauração da ação, a Autora pagou integralmente as cotizações do condomínio relativas ao ano de 2022, no valor de € 522,25, e cotizações do condomínio relativas ao ano de 2023, no valor de € 273,86. 24) Após deixar de habitar na casa de morada de família, o Réu residiu, de novembro de 2011 a março de 2014, num apartamento arrendado sito na Rua ..., n.º 1335, fração AD, ..., ..., pagando uma renda mensal de € 300,00 e suportando os custos inerentes ao fornecimento de gás natural, energia elétrica, água e saneamento. 25) As prestações mensais relativas ao crédito à habitação e demais despesas associadas a esse empréstimo, desde a data de aquisição das frações autónomas designada pelas letras “BV” e “F” (02/05/2000) até à data do divórcio da Autora e do Réu (.../.../2012), ascendem a € 58.448,00. 26) Na conversão em Euros de Escudos a taxa é de 1 Euro = 200,482 Escudos(8) [aditado]. 27) O valor locativo das frações autónomas designada pelas letras “BV” e “F”, que fazem parte do prédio urbano, em regime de propriedade horizontal, sito na Travessa ..., n.ºs 321 e 421, e Rua ..., n.º 247, freguesia da ..., não foi concretamente apurado(9) [aditado]. 28) Autora e Réu acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída à Autora até à sua venda ou partilha, comprometendo-se a Autora a pagar as prestações mensais referentes ao empréstimo bancário e demais despesas inerentes à morada de família, no que foi tido em conta que, saindo o réu de casa teria de custear a sua habitação [aditado]. 14. Em contrapartida, o acórdão recorrido deu como não provados os factos seguintes: I) Com ressalva para o referido em 20) e 21), os preparos, custos e despesas necessárias à preparação e concessão do mútuo bancário concedido para a aquisição do apartamento e garagem com entrada, respetivamente, pela Travessa ... n.º 421 e Rua ... n.º 247, totalizaram € 30.011,36. II) O Réu deixou de habitar na casa de morada de família para garantir o bem-estar dos filhos do casal, pois era frequente as crianças ouvirem discussões entre o pai e a mãe, o que tinha repercussões negativas na estabilidade e bem-estar dos filhos. III) Que o acordo entre A. e R. referido em 28) dos factos provados tivesse em conta também o acerto de contas relativas às transferências patrimoniais de rendimentos próprios do Réu para o pagamento de dívidas de ambos, ocorridas desde julho de 1995 a novembro de 2011 [alterado]. IV) Eliminado. V) Eliminado. VI) Desde a data de aquisição das frações autónomas designada pelas letras “BV” e “F” (02/05/2000) até à data do divórcio da Autora e do Réu (.../.../2012), o Réu pagou com o seu rendimento próprio, proveniente apenas e só do seu salário, as prestações mensais relativas ao crédito à habitação e demais despesas associadas a esse empréstimo, no valor total de € 58.448,00. VII) Desde a data de aquisição das frações autónomas designada pelas letras “BV” e “F” (02-05-2000) até à data do divórcio da Autora e do Réu (.../.../2012), o Réu pagou com o seu rendimento próprio, proveniente apenas e só do seu salário, as despesas de condomínio relativas àquelas frações. VIII) O Réu comprou sozinho, com rendimento próprio proveniente do seu salário, todos os bens móveis e eletrodomésticos (com exceção do frigorífico) que compõem o recheio da casa de morada de família. O DIREITO 16. A primeira questão suscitada pela Autora, agora Recorrente, consiste em determinar se o acórdão recorrido é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão ou por excesso de pronúncia (por ter condenado a Autora, agora Recorrente, no pagamento de uma compensação ao Réu, agora Recorrido, pelo uso futuro do imóvel). 17. A Autora, agora Recorrente, começa por alegar que o acórdão recorrido é nulo por contradição entre os fundamentos e a decisão. 18. Explicando-o diz que “… se constata que o Tribunal a quo começa por reconhecer que certos factos essenciais à pretensão do Recorrido não estavam provados, para depois ainda assim decidir em seu favor com base num pretenso acordo que nunca ficou demonstrado, antes resultou de uma aplicação manifestamente abusiva e errónea das presunções judiciais” 10. 19. A contradição entre os fundamentos e a decisão corresponde a um vício lógico do acórdão 11 — se, na fundamentação da sentença, o julgador seguir determinada linha de raciocínio, apontando para determinada conclusão, e em vez de a tirar, decidir noutro sentido, oposto ou divergente, a oposição será causa de nulidade da sentença 12. 20. O Supremo Tribunal de Justiça tem chamado constantemente a atenção para que deve distinguir-se a autêntica contradição entre os fundamentos e a decisão, prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, e o erro de julgamento. 21. Enquanto a contradição entre os fundamentos e a decisão corresponde a um vício formal, na construção lógica da decisão 13. o erro de julgamento corresponde a um vício substancial, concretizado, p. ex., na errada apreciação da prova ou na errada subsunção dos factos provados à correspondente hipótese legal: “quando, embora indevidamente, o julgador entende que dos factos apurados resulta determinada consequência jurídica e este seu entendimento é expresso na fundamentação, ou dela decorre, está-se perante o erro de julgamento e não perante oposição entre os fundamentos e a decisão geradora de nulidade” 14. 22. Ora, aquilo que a Autora, agora Recorrente, imputa ao acórdão recorrido é um erro de julgamento. 23. A Autora, agora Recorrente, considera que o Tribunal da Relação incorreu em erro na apreciação da prova — ou seja, considera que o Tribunal da Relação não devia ter dado como provados factos essenciais à pretensão do Recorrente ou que, em todo o caso, não podia tê-los dado como provados através de presunções judiciais. 24. O alegado erro na apreciação da prova, como erro de julgamento, não é uma contradição entre os fundamentos e a decisão — em consequência, o acórdão recorrido não pode ser declarado nulo por aplicação da alínea d) do n.º 1 do 615.º, por remissão dos artigos 666.º e 685.º do Código de Processo Civil. 25. A Autora, agora Recorrente, continua alegando que o acórdão recorido é nulo por excesso de pronúncia. 26. Em primeiro lugar, alega na motivação, mas não nas conclusões do recurso de revista, que “o Tribunal a quo acrescentou à matéria de facto os seguintes pontos não impugnados pelo Réu em sede de recurso: “Ponto 16 A) Da ata da legal tentativa de conciliação, aos 18/09/2012, no âmbito do qual foi decretado o divórcio entre as partes ficou a constar, entre o mais, o seguinte:” Ponto 17), parte final “para lá do que consta do facto 28 [alterado em função do 28 aditado]; Ponto 26) Na conversão em Euros de Escudos a taxa é de 1 Euro = 200,482 Escudos”. 27. Em segundo lugar, alega na motivação e nas conclusões do recurso de revista que “o Tribunal a quo [condenou] em pretensões não deduzidas ou peticionadas pelas partes, designadamente ao estabelecer um regime de compensação para o futuro, aplicando oficiosamente um suposto acordo tácito que não se provou em primeira instância, com o crivo da imediação e oralidade” 15. 28. A nulidade invocada na motivação, mas não nas conclusões, do recurso de revista está fora do objecto do recurso e. ainda que estivesse dentro do objecto do recurso, sempre seria improcedente. 29. O n.º 1 do artigo 662.º do Código de Processo Civil determina que “[a] Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”. 30. Ora o aditamento dos pontos 16A, 17 e 26 sempre estaria coberto pelo dever de alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto. 31. A nulidade invocada na motivação e nas conclusões do recurso de revista , essa, está dentro do objecto do recurso. 32. A Autora, agora Recorrente, impugna os segmentos do acórdão recorrido em que dispõe sobre os créditos constituídos depois da propositura da acção: 6) Às quantias referidas em 4) e 5) a serem pagas pelo réu será deduzido metade do valor locatício mensal dos imóveis, por cada mês decorrido, a apurar em sede de liquidação de sentença, porquanto esta está a gozá-los em exclusivo. 7) As quantias referidas em 4) e 5) serão atualizadas em função da data do trânsito em julgado deste acórdão. 9) Até à cessação da indivisão dos imóveis (frações BV e F, apartamento e garagem), todas as despesas vincendas inerentes a eles (prestações bancárias, juros, quotas, impostos, condomínio, etc.) serão suportadas por autora e réu em partes iguais, deduzindo-se (ou recebendo o excedente, se for o caso…) na metade da responsabilidade do réu o equivalente a um meio do valor locatício mensal das frações (a liquidar em execução de sentença), por a autora estar a gozá-los em exclusivo. 10) Às quantias a pagar pelo réu à autora acrescem juros de mora à taxa legal, contados desde a citação, e às a pagar pela autora ao réu, nos mesmos termos, mas a contar da notificação da reconvenção. 33. Ora, a Autora pediu a condenação do Réu a pagar todas as prestações vincendas relativas ao imóvel e nas conclusões do recurso de apelação “na […] proporção que cabe ao R./recorrido enquanto co[,]proprietário” e o Réu, em reconvenção, pediu a condenação da Autora no pagamento de metade do valor locativo mensal do imóvel e, em todo o caso, a extinção, por compensação, dos créditos recíprocos. 34. Os pedidos deduzidos pela Autora e pelo Réu devem interpretar-se de acordo com os artigos 236.º ss. do Código Civil 16. 35. Em consonância com os artigos 236.º ss. do Código Civil, desde que haja “dúvidas quanto aos concretos e efectivos pedidos pretendidos […] ou ao real conteúdo da pretensão” e desde que, “[de acordo com] as regras interpretativas da declaração judicial, [deva extrair-se] implícita uma […] pretensão petitória não expressamente ali formulada”, o tribunal possa apreciá-la, “extraindo os efeitos jurídicos correspondentes, sem dessa forma violar o princípio do pedido” 17. 36. Em consequência, as pretensões deduzidas pelo Réu, agora Recorrido, devem interpretar-se no sentido de incluírem a extinção, por compensação, de todos os créditos recíprocos, incluindo dos créditos constituendos. 37. A segunda questão suscitada consiste em determinar se o acordão recorrido incorre em ofensa do caso julgado formado no processo n.º 5905/12.3...... 38. A Autora, agora Recorrente, alega que “… a decisão recorrida, ao presumir a existência de um acordo tácito de compensação entre os ex-cônjuges, contraria frontalmente o que havia sido decidido em ação anterior transitada em julgado, que julgou a pretensão do Recorrido de pôr fim à compropriedade do imóvel, revelando justamente a inexistência de qualquer acordo nesse sentido” 18. 39. Embora a Autora, agora Recorrente, não distinga, deve distinguir-se o efeito negativo ou a vertente negativa e o efeito positivo ou a vertente positiva do caso julgado. 40. Como se diz, designadamente, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Maio de 2019 — processo n.º 1070/17.8T8VFR.P1.S1 —, “… o caso julgado (fórmula abreviada de ‘caso que foi julgado’) encontra a sua razão de ser na necessidade de salvaguarda do prestígio dos tribunais e da certeza e da segurança jurídicas. Na expressão ‘caso julgado’ cabem, em rigor, a excepção de caso julgado e a autoridade de caso julgado, muitas vezes designadas, respectivamente, como a ‘vertente negativa’ e a ‘vertente positiva’ do caso julgado” 41. O efeito negativo ou a vertente negativa concretiza-se na excepção de caso julgado. 42. O artigo 577.º do Código de Processo Civil, sob a epígrafe Excepções dilatórias, contempla a excepção de caso julgado [alínea i)], e os artigos 580.º e 581.º determinam os conceitos e os requisitos das excepções de caso julgado e de litispendência. 43. O efeito positivo ou a vertente positiva concretiza-se na autoridade de caso julgado. 44. Como se diz, designadamente, no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Dezembro de 2021 — processo n.º 5837/19.4T8GMR.G1.S1 —, “… a autoridade do caso julgado tem […] o efeito positivo de impor a primeira decisão à segunda decisão de mérito e, sem prescindir da identidade das partes, dispensa a identidade do pedido e da causa de pedir nos casos em que existe uma relação de prejudicialidade entre o objecto da acção já definitivamente decidida e a acção posterior, ou seja, quando o fundamento da decisão transitada condiciona a apreciação do objecto de uma acção posterior, por ser tida como situação localizada dentro do objecto da primeira acção, sendo seu pressuposto lógico necessário”. 45. Em primeiro lugar, deve dizer-se que nunca poderia estar em causa o efeito negativo do caso julgado. 46. A Autora, agora Recorrente, admite que a acção em causa era uma acção de divisão de coisa comum — logo, admite que os pedidos deduzidos nas duas acções são diferentes. 47. Ora a diferença entre os pedidos deduzidos nas duas acções exclui logicamente a possibilidade de preenchimento dos requisitos do artigo 581.º do Código de Processo Civil. 48. Em segundo lugar, excluído o efeito negativo, deve dizer-se que a Autora, agora Recorrente, não alega que no processo n.º 5905/12.3..... tenha sido proferida uma decisão de mérito. 49. A motivação do recurso fala do trânsito em julgado de uma “decisão de instauração da acção de divisão de coisa comum pelo Réu/recorrido”. 50. A decisão de instauração de uma acção de divisão de coisa comum não é uma decisão judicial e, por consequência, não pode transitar em julgado — e a decisão judicial proferida no processo n.º 5905/12.3..... e transitada em julgado não foi uma decisão de mérito. 51. Em lugar de uma decisão que conhece do mérito da causa, a decisão judicial proferida no processo n.º 5905/12.3..... declarou extinta a instância por deserção. 52. Como se diz, designadamente, nos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 11 de Julho de 2019 — processo n.º 13111/17.4T8LSB.L1.S1 — e de 14 de Outubro de 2021 — processo n.º 251/13.8TBPTB-C.G1.S1 —, “[a] autoridade de caso julgado opera positivamente na definição do direito, relevando em matéria de mérito da acção, contribuindo para a procedência ou para a improcedência do pedido” 19. 53. Ora, não havendo uma decisão de mérito, nunca poderia estar em causa o efeito positivo do caso julgado. 54. A terceira questão suscitada consiste em averiguar se o acórdão recorrido fez uso indevido das presunções judiciais. 55. A Autora, agora Recorrente, alega que o acórdão recorrido F. […] fez uma aplicação indevida e abusiva das presunções judiciais previstas nos artigos 349º e 351º do Código Civil, ao presumir, sem suficiente base factual e contra as regras da experiência, a existência de um acordo tácito com base em meros comportamentos omissivos da Recorrente, que podem ter as mais variadas explicações e que não permitem, por si só, presumir um facto tão complexo e improvável como um acordo de compensação tácita entre ex-cônjuges. G. Acresce que o raciocínio do Tribunal a quo para invocar as ditas presunções enferma de múltiplas falácias lógicas que lhe retiram qualquer credibilidade ou consistência, desde a evidente petição de princípio ao presumir a existência do acordo com base na mera inércia processual da Recorrente e depois usar o suposto acordo para justificar essa mesma inércia, até à falsa dicotomia de pretender que a única explicação plausível para o comportamento das partes seria a existência de um acordo, desconsiderando todas as outras possíveis razões para a não propositura imediata de uma ação de divisão de coisa comum. […] I. Ao criar um acordo tácito entre as partes por via destas presunções abusivas e infundadas, o Tribunal a quo desconsiderou também grosseiramente as regras de distribuição do ónus da prova plasmadas no artigo 342º do Código Civil, que impunham ao Recorrido o ónus de demonstrar positivamente a existência e conteúdo do acordo que invocava em seu favor, e não à Recorrente a prova diabólica da sua inexistência. J. A violação das regras do ónus da prova é tão mais grave quanto é certo que a factualidade dada como provada pela primeira instância, após juízos de valor próprios baseados na imediação e oralidade características da audiência de julgamento, apontava justamente no sentido de não ter existido qualquer acordo, pelo que a decisão recorrida incorre também numa inadmissível desconsideração da matéria de facto fixada, substituindo a prova produzida por meras presunções. […] P. A decisão do Tribunal a quo, data venia, na parte em que deu provimento à apelação do Recorrido e lhe reconheceu um direito a compensação com base num acordo não demonstrado, viola ostensivamente vários preceitos legais e princípios basilares do processo civil, designadamente o princípio do dispositivo, as regras do ónus da prova, o dever de fundamentação das decisões judiciais e a obrigação de decidir segundo os factos alegados e provados, pelo que não pode deixar de ser integralmente revogada, repondo-se a legalidade e a justiça da solução alcançada pela primeira instância. 56. O argumento deduzido das disposições legais sobre a distribuição do ónus da prova é irrelevante. 57. O problema do ónus da prova consiste "na atribuição dos resultados da incerteza da prova; noutros termos, trata-se de decidir qual é a parte que perderá o processo se o juiz — que deve pronunciar uma decisão — não pôde formar a sua convicção por não dispor de provas suficientes” 20. 58. O sentido de uma teoria da atribuição / da distribuição do ónus da prova é, por isso, o de uma "teoria das consequências jurídicas da falta de prova” 21 — os critérios de atribuição / distribuição do ónus da prova dizem-nos qual a parte que corre o risco de perder o processo quando o juiz não possa formar a sua convicção 22. 59. Em termos em tudo semelhantes aos do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de Junho de 2021 — processo n.º 2998/11.4TVLSB.L1.L1.S1 —, dir-se-á que “no nosso direito processual, ter o ónus da prova significa sobretudo determinar qual a parte que suporta a falta de prova de determinado facto, mais do que saber qual a parte que tem de efectuar a prova de determinado facto”. 60. Ora, em concreto, o Tribunal da Relação considerou os meios de prova disponíveis suficientes para dar como provados os factos n.ºs III e IV. 61. O problema do ónus da prova pura e simplesmente não se põe — “não tendo ocorrido [uma] situação de dúvida insanável sobre a realidade dos factos e tendo sido feita prova efectiva […], não há que recorrer às regras de distribuição ou repartição do ónus da prova” 23. 62. Face à irrelevância do argumento deduzido das disposições legais sobre a distribuição do ónus da prova, deve apreciar-se o argumento deduzido das falácias lógicas das presunções judiciais. 63. O Supremo Tribunal de Justiça tem considerado constantemente que, “[f]ace à competência alargada da Relação em sede de reapreciação da decisão de facto, em conformidade com o preceituado no n.º 1 do artigo 662.º do CPC, é lícito à 2.ª instância […] reequacionar a avaliação probatória feita pela 1.ª instância no domínio das presunções judiciais, nos termos do n.º 4 do artigo 607.º, aplicável por via do artigo 663.º, n.º 2, do mesmo Código” 24. 64. Entre os corolários da competência alargada dos Tribunais da Relação para reequacionar a avaliação probatória feita pelo Tribunal de 1.ª instância atendendo a presunções judiciais estará a de que “o erro sobre a substância do juízo presuntivo formado com apelo às regras da experiência […] só será [só deverá ser] sindicável pelo tribunal de revista em casos de manifesta ilogicidade” 25 26. 65. O Tribunal da Relação alterou a matéria de facto, dando como provado sob o n.º 28 factos que o Tribunal de 1.ª instância dera como não provados sob os n.ºs III e IV: 28) Autora e Réu acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída à Autora até à sua venda ou partilha, comprometendo-se a Autora a pagar as prestações mensais referentes ao empréstimo bancário e demais despesas inerentes à morada de família, no que foi tido em conta que, saindo o réu de casa teria de custear a sua habitação. 66. Fundamentou a decisão de alterar a matéria de facto, dando como provado o n.º 28, nos seguintes termos: A prova documental pode dar-nos uma pista para a decisão, na medida em que ficou a constar da ata o seguinte (e que será aditado a diante como facto 16A): “Da ata da legal tentativa de conciliação, aos .../.../2012, no âmbito da qual foi decretado o divórcio entre as partes ficou a constar, entre o mais, o seguinte:
Ou seja, e como não podia deixar de ser, apesar de, dado o regime de bens (separação) não haver “bens comuns” propriamente ditos, as partes tinham presente serem comproprietários dos imóveis constituídos pelas frações BV (apartamento de tipo T2) e F (lugar de estacionamento na subcave) e que o acordo de atribuição à A. (e filhos) da casa de morada de família seria, dizemos, apenas e até à “partilha”, pois ficou a constar da ata, “como bens comuns a partilhar existem, pelo menos, o imóvel…”. […] A situação dos presentes autos é bastante incomum. Não existindo acordo, por que razão estaria a autora praticamente 10 anos (a separação ocorreu aos .../.../2011 e a sentença de divórcio foi proferida aos .../.../2012, sendo a petição inicial deste processo datada de 28/12/2021) sem interpor a ação para pedir o reembolso do que considerava ser-lhe devido a título solidário – tanto mais que, disse repetidamente nas suas declarações, vivia com dificuldades e a pedir dinheiro emprestado, designadamente ao pai? Ademais, e não menos pertinente, não existindo o acordo por que razão estaria o réu a onerar-se duplamente, pagando renda (no período de novembro de 2011 a março de 2014, ou seja, pelo menos, dois anos e quatro meses) e a deixar acumular uma dívida para com a A. emergente da responsabilidade solidária? Ou seja, de acordo com a lógica e com a experiência comum, com juízos de verosimilhança, a inércia demonstrada por ambas as partes só poderá ter ficado a dever-se à existência de acordo, o que é (bem) mais provável do que o contrário (inexistência), dado que a verdade processual não se confunde com a ôntica: é apenas aquela possível de atingir, em conformidade ao chamado standard, ou padrão, de prova exigível, o de ser mais provável um facto ter acontecido do que não. Assim, os factos não provados III e IV serão alterados, passando parte do III e do IV para os factos provados (mantendo-se o demais não provado – sendo patente que a não prova de um facto não corresponde ao que seria a prova do contrário), sob o n.º 28, com o seguinte teor: “28) Autora e Réu acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída à Autora até à sua venda ou partilha, comprometendo-se a Autora a pagar as prestações mensais referentes ao empréstimo bancário e demais despesas inerentes à morada de família, no que foi tido em conta que, saindo o réu de casa teria de custear a sua habitação”. A nova redação do ponto III dos factos não provados (sendo que o IV será eliminado) passa a ser: “Que o acordo entre A. e R. referido em 28) dos factos provados tivesse em conta também o acerto de contas relativas às transferências patrimoniais de rendimentos próprios do Réu para o pagamento de dívidas de ambos, ocorridas desde julho de 1995 a novembro de 2011”. 67. Ou seja: o Tribunal da Relação deduziu dos factos conhecidos — dos comportamentos, positivos e negativos, da Autora e do Réu em relação ao imóvel — um facto desconhecido — o acordo entre a Autora e o Réu sobre as despesas inerentes ao imóvel. 68. A Autora, agora Recorrente, admite que a existência de um acordo era uma das razões possíveis para a não propositura imediata de uma acção de divisão de coisa comum. 69. Critica o acórdão recorrido tão-só por considerar que a eistência de um acordo era “a única explicação plausível para o comportamento das partes, […] desconsiderando todas as outras possíveis razões para a não propositura imediata de uma ação de divisão de coisa comum”. 70. Ora, ao admitir que a existência de um acordo era uma das razões possíveis para a não propositura imediata de uma acção de divisão de coisa comum, a Autora, agora Recorrente, está a admitir que a ilação do Tribunal da Relação não é manifestamente ilógica. 71. O facto de a ilação não seja manifestamente ilógica significa, sem mais, que as alegadas falacias lógicas das presunções judiciais do Tribunal da Relação não podem ser sindicadas pelo Supremo Tribunal de Justiça. 72. A quarta questão suscitada consiste em determinar se a decisão do acórdão recorrido conflitua com o regime legal das relações entre os cônjuges 27. 73. A Autora, agora Recorrente, alega que K. […] nos termos do artigo 1676.º do Código Civil, […] ambos os cônjuges [têm] o dever de contribuir para os encargos da vida familiar de acordo com as suas possibilidades durante toda a constância do matrimónio. […] U. Relativamente ao período de vigência do casamento, as contribuições efetuadas por cada cônjuge para os encargos da vida familiar encontram causa jurídica no cumprimento do dever de contribuir para a economia comum do casal, plasmado no artigo 1676.º do Código Civil, não podendo ser assacadas retroativamente ao outro cônjuge a título de "compensação" ou “enriquecimento”. 74. Em correlação com os argumentos deduzidos nas conclusões K e L, a quinta questão suscitada consiste em determinar se a decisão do acórdão recorrido conflitua com o regime legal das relações entre os comproprietários. 75. A Autora, agora Recorrente, alega que V. No período pós-divórcio, mantendo-se a compropriedade, sobre ambos os comproprietários impendia o dever de contribuir para as despesas de conservação, não legitimando a utilização exclusiva do imóvel por um deles a sua desoneração de tal dever. W. É jurisprudência pacífica do Supremo Tribunal de Justiça que o uso exclusivo da coisa comum por um dos comproprietários não o obriga a pagar uma ‘compensação’ ao outro, nem o desonera do pagamento da sua parte nas despesas de conservação, salvo acordo das partes que in casu não se provou. 76. O artigo 1676.º do Código Civil é do seguinte teor: 1. — O dever de contribuir para os encargos da vida familiar incumbe a ambos os cônjuges, de harmonia com as possibilidades de cada um, e pode ser cumprido, por qualquer deles, pela afectação dos seus recursos àqueles encargos e pelo trabalho despendido no lar ou na manutenção e educação dos filhos. 2. — Se a contribuição de um dos cônjuges para os encargos da vida familiar for consideravelmente superior ao previsto no número anterior, porque renunciou de forma excessiva à satisfação dos seus interesses em favor da vida em comum, designadamente à sua vida profissional, com prejuízos patrimoniais importantes, esse cônjuge tem direito de exigir do outro a correspondente compensação. 3. — O crédito referido no número anterior só é exigível no momento da partilha dos bens do casal, a não ser que vigore o regime da separação. 4. — Não sendo prestada a contribuição devida, qualquer dos cônjuges pode exigir que lhe seja directamente entregue a parte dos rendimentos ou proventos do outro que o tribunal fixar 28. 77. Embora a Autora, agora Recorrente, não distinga, deve distinguir-se duas coisas — o dever de contribuir para as despesas necessárias a uma utilização em comum dos bens adquiridos e o dever de contribuir para as despesas necessárias a uma utilização em exclusivo dos bens adquiridos, antes ou depois do divórcio 29. 78. O acórdão recorrido não se pronuncia nunca sobre o dever de o Réu, agora Recorrido, contribuir para as despesas necessárias para uma utilização em comum dos imóveis — em vez de se pronunciar sobre as despesas necessárias para uma utilização em comum, pronuncia-se, tão-só, sobre o dever de contribuir para as despesas necessárias para uma utilização em exclusivo pela Autora, agora Recorrente. 79. Ora, ao pronunciar-se sobre o dever de o Réu, agora Recorrido, contribuir para uma utilização em exclusivo pela Autora, agora Recorrente, sustenta duas teses: I. — Em primeiro lugar, que o critério de distribuição das despesas com o imóvel devia deduzir-se do acordo descrito no facto dado como provado sob o n.º 28. II. — Em segundo lugar, que o acordo descrito no facto dado como provado sob o n.º 28 devia interpretar-se ou integrar-se de forma a alcançar o equilíbrio entre as atribuições patrimoniais da Autora e do Réu: Dado o sinalagma contratual, e a prossecução do seu equilíbrio, presente e futuro, o tribunal tem de assegurar a justa composição do litígio à luz do sentimento geral de Justiça – tal como definida por Ulpiano, a vontade constante e perpétua de dar a cada um o seu direito, o brocardo suum cuique tribuere, ou dar a cada um o que é seu. O Direito não é alheio à ética, pelo contrário: entre o mais, positiva-a. Assim sendo, há que assegurar o equilíbrio das pretensões; de outro modo, além de imoral, a decisão seria ilegal por patente violação do princípio da igualdade perante a lei: se a A. pretende receber metade de tudo que despendeu e despenderá, também o R. tem direito a receber o que é seu, neste caso metade do respetivo valor do uso, ou seja, metade do valor locativo do imóvel de que só aquela goza. A não ser assim, estaria o tribunal a conceder um enriquecimento sem causa. 80. A Autora, agora Recorrente, alega que o acordo sobre as despesas necessárias para uma utilização em exclusivo do imóvel pela Autora, agora Recorrente, conflitua com o dever de contribuir para os encargos da vida familiar. 81. Ora, o conteúdo do dever de contribuir para os encargos da vida familiar deve determinar-se considerando situação concreta do casal 30. 82. Os factos dados como provados sob os n.ºs 13, 14 e 15 dizem-nos que: 13) Desde .../.../2011 que o Réu deixou de habitar a casa de morada de família. 14) A partir de .../.../2011 e até à atualidade, a Autora habita na casa de morada de família com os três filhos do casal. 15) O casamento de AA e BB (ora Autora) com CC (ora Réu) foi dissolvido por divórcio decretado por sentença de .../.../2012, transitada em julgado no dia 18/10/2012. 83. Considerando à situação concreta do casal desde 25 de Novembro de 2011, dir-se-á que os critérios aplicados pelo acórdão recorrido são compatíveis com o princípio da proporcionalidade deduzido dos n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 1676.º do Código Civil 31. 84. O dever de o Réu, agora Recorrido, contribuir para as despesas inerentes ao imóvel estava limitado pela compressão das suas possibilidades de pagar, como consequência dos encargos adicionais ou suplementares relacionados com a sua habitação 32. 85. Os critérios aplicados pelo acórdão recorrido devem considerar-se compatíveis com o princípio da proporcionalidade deduzido dos n.ºs 1, 2 e 4 do artigo 1676.º do Código Civil 33. 86. O resultado só pode ser reforçado pela coordenação entre o regime das relações entre os cônjuges e o regime das relações entre os comprorietários. 87. Os artigos 1406.º, 1407.º e 1411.º do Código Civil são do seguinte teor: Artigo 1406.º — Uso da coisa comum 1. — Na falta de acordo sobre o uso da coisa comum, a qualquer dos comproprietários é lícito servir-se dela, contanto que a não empregue para fim diferente daquele a que a coisa se destina e não prive os outros consortes do uso a que igualmente têm direito. 2. — O uso da coisa comum por um dos comproprietários não constitui posse exclusiva ou posse de quota superior à dele, salvo se tiver havido inversão do título. Artigo 1411.º — Benfeitorias necessárias 1. — Os comproprietários devem contribuir, em proporção das respectivas quotas, para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum, sem prejuízo da faculdade de se eximirem do encargo renunciando ao seu direito. 2. — A renúncia, porém, não é válida sem o consentimento dos restantes consortes, quando a despesa tenha sido anteriormente aprovada pelo interessado, e é revogável sempre que as despesas previstas não venham a realizar-se. 3. — A renúncia do comproprietário está sujeita à forma prescrita para a doação e aproveita a todos os consortes, na proporção das respectivas quotas. 88. O acordo descrito na primeira parte facto dado como provado sob o n.º 28 — ou seja, na parte em que se diz que “Autora e Réu acordaram que a casa de morada de família ficaria atribuída à Autora até à sua venda ou partilha” — é um acordo sobre o uso da coisa em comum no sentido do n.º 1 do artigo 1406.º do Código Civil. 89. A Autora, agora Recorrente, alega que o acórdão recorrido conflitua com o artigo 1406.º do Código Civil por colocar a seu cargo uma compensação pelo uso exclusivo da coisa. 90. O argumento não procede — contrariamente àquilo que alega a Autora, agora Recorrente, deve admitir-se que o acordo sobre a utilização da coisa comum em que se atribua o uso exclusivo da totalidade da coisa a um dos consortes tenha como correlato comum, normal ou típico uma compensação do consorte excluído 34. 91. A Autora, agora Recorrente, não poderá sequer alegar que a compensação é desajustada, desproporcionada ou excessiva. 92. O montante da compensação, desde que não seja fixado pelas partes, poderá ser fixado pelo tribunal, por aplicação do n.º 2 do artigo 1407.º do Código Civil. 93. Em regra, a compensação justa corresponderá metade do valor locativo da coisa comum 35. 94. Em termos semelhantes aos do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 27 de Setembro de 2018 — processo n.º 10808/14.4T8PRT.P1.S1 — dir-se-á que, “[n]um caso como dos autos em que o réu é proprietário de fracção autónoma na proporção de metade e a autora é [proprietária] da outra metade, não sendo possível fazer funcionar o critério da maioria (cfr. art. 1407º, nº 1, do Código Civil) quanto à decisão sobre a forma de administrar a coisa comum, ao abrigo do nº 2 do mesmo artigo, que prevê que o tribunal decida segundo juízos de equidade, entende-se ser justo e adequado atribuir à autora uma compensação pelo uso exclusivo da coisa pelo réu por cada mês de ocupação da fracção autónoma, correspondente a metade do valor locativo da mesma”. 95. A Autora, agora Recorrente, alega ainda que o acórdão recorrido conflitua com o artigo 1411.º do Código Civil por dispensar o Réu, agora Recorrido, da obrigação de contribuir para as despesas necessárias à conservação e à fruição da coisa comum. 96 Em síntese, o seu argumento resumir-se-ia nos seguintes termos: O acordo descrito na segunda parte do facto dado como provado sob o n.º 28 — ou seja, na parte em que se diz que “a Autora [se comprometeu] a pagar as prestações mensais referentes ao empréstimo bancário e demais despesas inerentes à morada de família, no que foi tido em conta que, saindo o réu de casa teria de custear a sua habitação — seria contrário à norma imperativa do n.º 1 do artigo 1411.º do Código Civil — “[o]s comproprietários devem contribuir, em proporção das respectivas quotas, para as despesas necessárias à conservação ou fruição da coisa comum”. 97. O argumento não procede — contrariamente àquilo que alega a Autora, agora Recorente, deve admitir-se que, “… havendo uso exclusivo da coisa comum por um dos comproprietários, não só se podem estabelecer regras específicas nesta matéria, como, na sua falta, as circunstâncias do caso podem impor a repartição das despesas segundo critério diferente, até ao limite de as pôr plenamente a cargo de quem beneficia desse uso” 36 98. Finalmente, em relação à sexta questão, dir-se-á tão-só que os factos dados como provados não são suficientes para que se conclua que a Autora, agora Recorrente, incorreu em litigãncia de má fé. III. — DECISÃO Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido. Custas pela Recorrente AA e BB. Lisboa, 3 de Junho de 2025 Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator) Arlindo Oliveira Rui Manuel Duarte Amorim Machado e Moura _______
1. Conforme doc. 1 junto com a petição inicial. |