Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3.ª SECÇÃO | ||
Relator: | MARIA DO CARMO SILVA DIAS | ||
Descritores: | HABEAS CORPUS PRISÃO PREVENTIVA PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA TRÂNSITO EM JULGADO NULIDADE DE ACÓRDÃO INDEFERIMENTO | ||
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Data do Acordão: | 06/04/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | HABEAS CORPUS | ||
Decisão: | IMPROCEDÊNCIA / NÃO DECRETAMENTO | ||
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Sumário : |
I. A questão que se coloca é a de saber se, pelo facto do Ac. do STJ ter anulado parcialmente o acórdão da Relação que confirmara a condenação da 1ª instância, isso significa que o prazo da prisão preventiva vai retroagir, passando a valer o previsto no art. 215.º, n.º 1, al. d), e n.º 3, do CPP (neste caso, ter-se-ia então de ter em atenção o prazo máximo de 3 anos e 4 meses de prisão, eventualmente acrescido do prazo de 6 meses por haver recurso para o TC) ou se, pelo contrário, continua/mantém-se em vigor a elevação do prazo aludida no art. 215.º, n.º 6, do CPP. II. A verdade é que o processo está na fase dos recursos e, precisamente por a Relação em 12.09.2023 ter confirmado a decisão da 1ª instância é que, nessa altura, foi alargado o prazo nos termos aludidos no art. 215.º, n.º 6, do CPP. A elevação do prazo da prisão preventiva prevista no art. 215.º, n.º 6, do CPP, introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, é independente da interposição de posteriores recursos e, mesmo dessa decisão que confirma a sentença condenatória não transitar. III. O que se passa aqui é que com a anulação parcial do acórdão da Relação, temos uma decisão da Relação que não é definitiva, até porque tem de ser proferida uma nova (decisão) mas, apenas quanto às questões indicadas no Ac. do STJ, sendo certo, porém, que além do mais até já existe uma decisão condenatória da 1ª instância. IV. A sentença condenatória da 1ª instância mesmo que viesse a ser anulada pela Relação não levaria a que tudo ficasse sem efeito ou que se voltasse ao momento inicial. Tal como vem defendendo o Supremo Tribunal de Justiça, a anulação da sentença não envolve, “nem determina a irrelevância da atividade processual desenvolvida, consequência que só o vício da inexistência envolve.” Os efeitos do ato nulo ou anulável são distintos do ato inexistente, não implicando a anulação do acórdão da Relação que o processo regresse a fase anterior, como se não tivesse havido condenação. V. O facto do STJ ter anulado a decisão da Relação não significa que a decisão desta tivesse deixado de existir (tanto mais que foi em parte negado provimento aos recursos interpostos pelos arguidos e, oportunamente, quando for proferida a nova decisão sobre as questões em que há omissão de pronúncia o STJ irá então conhecer dos recursos, se os arguidos os voltarem a interpor) ainda que possa não produzir efeitos. VI. Pode-se, pois, concluir que, em fase de recurso, a anulação do acórdão da Relação, nos moldes em que ocorreu (por omissão de pronúncia quanto às questões indicadas no acórdão do STJ), ainda que respeite a uma decisão que não transitou em julgado (na medida em que se aguarda que seja proferida nova decisão conforme determinado pelo STJ, mas que, de todo o modo confirma a condenação da 1ª instância, ainda que de modo não definitivo), não invalida a atividade processual anteriormente desenvolvida, continuando para este efeito, de estabelecimento do prazo máximo da prisão preventiva aplicada aos arguidos, a ser aplicável o disposto no art. 215.º, n.º 6, do CPP, que já estava então em curso e que não é inutilizado, sendo oportunamente descontado - o que não se vislumbra ter por base qualquer interpretação dos arts. 215.º, n.º 6, 379.º, n.º 1, al. c) e 425.º, n.º 4, do CPP, contrária à Constituição da República Portuguesa. VII. Mas, ainda que assim não fosse, a prisão preventiva dos aqui peticionantes foi motivada por facto que a lei permite atento o crime pelo qual foram condenados em 1ª instância (tráfico de estupefacientes agravado, que integra a criminalidade altamente organizada) mantendo-se, mesmo atualmente, dentro do prazo legal (na sequência das decisões judiciais proferidas em 10.05.2024 e em 15.05.2024, nos termos legais). VIII. A discussão sobre a legalidade ou ilegalidade daquelas decisões (quer a proferida em 10.05.2024, que indeferiu requerimento que apresentaram a pedir a restituição à liberdade por alegadamente se ter esgotado o prazo da prisão preventiva, quer a proferida em 15.05.2024, que procedeu ao reexame da prisão preventiva) e sobre eventuais interpretações inconstitucionais, em rigor, deveriam/deverão ser colocadas em sede de recurso e não neste habeas corpus, que é providência inadequada para esse efeito (uma vez que não é um recurso), nem podem pretender, através dele, que o STJ se pronuncie sobre matérias que extravasam os seus fundamentos (nem essa matéria que invocam integra qualquer dos fundamentos do art. 222.º do CPP, que são taxativos). | ||
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Decisão Texto Integral: | Proc. n.º 41/20.1JAFAR-F.S1 Habeas corpus Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I Relatório 1. Os peticionantes AA, BB, CC, DD, EE, através do seu Advogado, requereram conjuntamente providência de habeas corpus (ao abrigo do art. 222.º, n.º 1 e n.º 2, al. c) do CPP), por entenderem estarem privados ilegalmente da sua liberdade, pedindo a sua imediata restituição à liberdade, pelos seguintes fundamentos (transcrição sem negritos, nem sublinhados): 1. Os arguidos estão presos preventivamente desde o dia 29-7-2020. 2. O artigo 215º nº1 al. d) do CPP prevê que a prisão preventiva se extingue quando, desde o seu início, tiverem decorrido um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado. 3. Prazo esse que é aumentado para 3 anos e 4 meses, face ao disposto no nº3 do artigo 215º do CPP. 4. Ora, por acórdão datado de 19-12-22, os arguidos foram condenados em 1ª instância. 5. Inconformados com a decisão, recorreram para o Tribunal da Relação de Évora, tendo esse tribunal proferido acórdão a confirmar a decisão recorrida. 6. Nesta sequência, os arguidos interpuseram recurso para o STJ que - por acórdão datado de 09-05-2024 - anulou o acórdão do Tribunal da Relação de Évora por omissão de pronúncia quanto às questões aí mais bem identificadas, ordenado a prolação de novo acórdão. 7. Por assim ser, vieram os arguidos - por requerimento datado de 10-5-2024 - requerer a sua libertação imediata uma vez que já decorreram 3 anos e 4 meses sem que tenha havido uma condenação com trânsito em julgado, nos termos do artigo 215º nº1 e nº3 do Código de Processo Penal. 8. Sucede que, veio o despacho datado de 10-05-2024 decidir que a anulação do aludido acórdão não implica que o prazo máximo de prisão preventiva seja encurtado para 3 anos e 4 meses como se não tivesse existido uma confirmação em 2ª instância, pelo que é de manter o prazo a que alude o disposto no n.º 6 do artigo 215º do Código de Processo Penal. 9. Ora, o nº 6 do artigo 215º do CPP estabelece que “No caso de o arguido ter sido condenado a pena de prisão em 1ª instância e a sentença condenatória ter sido confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo da prisão preventiva eleva-se para metade da pena que tiver sido fixada.” 10. Ora, não obstante, ter existido uma decisão confirmatória por parte do Tribunal da Relação de Lisboa, a mesma foi anulada por omissão de pronúncia quanto às questões identificadas nos pontos 3.2.2., 3.2.4. e 3.2.5., 3.3, 3.3.1, 3.4.1 e 3.5.2 do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça. 11. As questões sobre as quais o Tribunal da Relação de Évora deixou de se pronunciar são bastantes e assumem particular importância. 12. Note-se a título exemplificativo, que os arguidos - em sede de contestação - apresentaram uma versão diversa da que havia sido imputada pela acusação, em que intervém uma ação encoberta com participação da Polícia Judiciária. 13. O Tribunal de 1ª instância deu como provada a existência de uma ação encoberta, pelo que teria o Tribunal da Relação de proceder ao confronto dos factos alegados nas contestações dos arguidos/recorrentes com os factos provados e não provados e verificar se estes cobrem ou não e em que medida a matéria relevante quer foi alegada naquelas peças processuais. 14. Não consta da enumeração dos factos provados e não provados os alegados nas contestações, sendo que dúvidas não subsistem da sua relevância/prova como bem reconhece este Supremo Tribunal de Justiça no acórdão datado de 09-05-24. 15. Factos estes que assumem uma relevância extrema e que o acórdão recorrido não poderia simplesmente ter ignorado. 16. O que é certo é que as referidas questões que o tribunal omitiu conhecer, têm a maior relevância jurídica na medida em que a serem suportadas pela matéria de facto, poderiam importar a absolvição dos arguidos1. 17. Como já bem decidiu este Tribunal, no âmbito do processo nº 1126/06.2PEAMD-F.S1, por acórdão datado de 05-03-2009, em situação em tudo idêntica a esta: “A ausência de respostas às questões referidas e outras de natureza semelhante a estas impede uma correta decisão de direito. E não bastam as conjeturas que o tribunal recorrido fez quando apreciou a matéria de direito, especulando aí como teria ou não teria ocorrido determinado facto, pois a matéria de facto tem de ficar rigorosamente estabelecida no local próprio, como provada ou não provada, para depois se poderem retirar as respetivas conclusões jurídicas.” 18. A nulidade do Acórdão da Relação e a sua remissão, retira necessariamente o valor confirmativo ao acórdão da Relação. 19. O que foi pedido pelo recorrente em sede de recurso ordinário, foi o reexame da matéria de facto de pontos concretos da matéria de facto dada como provada, o que não aconteceu. 20. O TRE deixou de pronunciar-se sobre questões que devia apreciar, quando não decidiu expressamente da impugnação da matéria de facto que pode importar a absolvição dos arguidos. 21. O que tem forçosamente de significar - e como já bem decidiu este Tribunal2 - que não se pode ter, neste momento, por subsistente uma decisão condenatória confirmada por um tribunal superior, para efeitos de elevação do prazo da prisão preventiva. 22. O prazo deixou de ser objeto de elevação nos termos do artigo do nº6 do artigo 215º do CPP, a partir do trânsito em julgado da decisão deste Supremo Tribunal de Justiça datada de 9-5-24 que decidiu anular o acórdão da Relação de Évora. 23. Por outro lado, é indiscutível que existe uma condenação não transitada em julgado, pelo que o prazo máximo da prisão preventiva dos arguidos se fixa nos 3 anos e 4 meses, face ao disposto no artigo 215º nº1 al. d) e nº3 do CPP. 24. Este Tribunal tomou uma decisão (já transitada em julgado) declarando nulo o acórdão da TRE, no entanto, - com todo o respeito – o Tribunal de primeira instância não acatou as consequências jurídicas advenientes dessa decisão, designadamente, o retrocesso dos prazos da prisão preventiva. 25. Aliás, o próprio acórdão deste Tribunal, que declarou nulo o Acórdão do TRE refere a final (parecendo admitir que nulidade do Acórdão produz efeitos relativamente aos prazos da prisão preventiva): “Comunique-se, de imediato, ao tribunal de 1ªinstância, onde corre o translado de acompanhamento das prisões preventivas para os efeitos pertinentes quanto ao controlo dos respetivos prazos.” 26. Estando já ultrapassado este prazo - que se tem por esgotado a ...-...-2024, data do trânsito em julgado da decisão do STJ, devem os requerentes ser imediatamente restituídos à liberdade. 27. O artigo 28º nº4 da Constituição da República Portuguesa estabelece que a prisão preventiva está sujeita aos prazos previstos na lei. 28. Assim, suscita-se a inconstitucionalidade material das normas constantes dos artigos 215º nº6, 379.º, n.º 1, al. c), e 425.º, n.º 4, do CPP, na sua redação atual, se interpretada no sentido de que o acórdão proferido em sede de recurso ordinário sendo declarado nulo por omissão de pronúncia (pelo Supremo Tribunal de Justiça) continua a produzir efeitos para efeito da contagem do prazo da prisão preventiva previsto na norma supracitada, por violação dos artigos 26, 28º nº4 e 18.º, n.º 2, da CRP. 29. Nos mesmos termos e para os mesmos efeitos, suscita-se a inconstitucionalidade material da norma constante das normas constantes dos artigos 215º nº6, 379.º, n.º 1, al. c), e 425.º, n.º 4, do CPP, se interpretada no sentido de que o acórdão proferido em sede de recurso ordinário sendo declarado nulo por omissão de pronúncia (pelo Supremo Tribunal de Justiça) continua a ser confirmatório da decisão de 1ª instância, por violação dos artigos 26º, 28º nº4 e 18.º, n.º 2, da CRP. 30. Nos mesmos termos e para os mesmos efeitos, suscita-se a inconstitucionalidade material das normas constantes dos artigos 215º nº6, 379.º, n.º 1, al. c), e 425.º, n.º 4, do CPP, se interpretada no sentido de que o acórdão proferido em sede de recurso ordinário que foi anulado por omissão de pronúncia pelo Supremo Tribunal de Justiça por omissão de pronuncia de questões que assumem particular importância e podem, inclusivamente, ditar a absolvição dos arguidos, continua a ser confirmatório da decisão de 1ª instância, e consequentemente, produz efeitos para contagem do prazo de prisão preventiva previsto no nº6 do art. 215º do C.P.P, por violação dos artigos 26º, 28º nº4 e 18.º, n.º 2, da CRP. Terminam pedindo a sua imediata libertação. 2. No processo principal a Srª Juíza prestou a informação a que se refere o art. 223.º, n.º 1, do CPP, nos seguintes termos: Instrua com certidão: Do auto de primeiro interrogatório judicial Da Acusação publica, Da Decisão Instrutória Do Acórdão proferido em primeira instancia Do Acórdão do Douto Tribunal da Relação de Évora. Do Acórdão proferido no STJ Após envie imediatamente ao Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça. *** Excelentíssimo Senhor Juiz Conselheiro, Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 223º do CPP, informo Vossa Excelência do seguinte: a) Os arguidos AA, BB, CC, DD, e EE encontram-se presos preventivamente desde o dia ... de ... de 2020, na sequência de interrogatório judicial a que foram sujeitos. b) Foram os arguidos condenados por este Tribunal, em 1ª Instância, por Acórdão datado de ... de ... de 2022, pela prática de em co-autoria, de crime de trafico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21º, n.º 1, e 24º do DL 15/93, de ... nas penas de nove anos, doze anos e seis meses, nove anos, nove anos e nove anos de prisão, respectivamente. c) Por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora proferido a ... de ... de 2023, foi confirmado Acórdão da 1ª Instancia, na integra; d) De tal decisão, foi interporto recurso para o STJ pelos arguidos. e) Por Acórdão do STJ proferido a ... de ... de 2024 foi decidido: « Recursos apresentados conjuntamente por AA, CC, DD E EE: – negar provimento na parte em que invocam os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância, ao carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66, à questão do agente encoberto, e bem assim quanto ao excesso de pronúncia a propósito da aplicação do artigo 3.º, n.º6, da Lei n.º 101/2001, de ...; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas nos pontos 3.2.2. (relativamente aos arguidos AA, DD E EE), 3.2.4. (relativamente ao arguido EE) e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto – relativamente aos arguidos AA, CC, DD E EE), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. (…) Recurso apresentado por FF: – negar provimento na parte em que invoca os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância e carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas no ponto 3.5.2., com referência aos pontos 3.2.2. e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões.» É um facto que o Supremo Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso, anulando-se o acórdão do Tribunal da Relação de Évora quanto a algumas questões cabalmente identificadas. Porém, salvo melhor opinião, tal não implica que o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora seja inexistente e muito menos que conduza à consequência peticionada pelos arguidos. Pois que, a anulação do aludido acórdão não implica que o prazo máximo de prisão preventiva seja encurtado para 3 anos e 4 meses (repristinado) como se não tivesse existido uma confirmação em 2ª instância (acórdão do STJ de ........2003), pelo que, salvo melhor opinião, será de manter o prazo a que alude o disposto no n.º 6 do artigo 215º do Código de Processo Penal. Como se dá nota no acórdão do STJ de 10.2.2021 (proc. 4243/17.0T9PRT-J.S1, relator Exmª Cons. Conceição Gomes), o Supremo Tribunal vem uniformemente adoptando, desde há muito, o entendimento de que aquilo que o legislador pretendeu evitar ao fixar os prazos de duração máxima da prisão preventiva é que o arguido esteja preso preventivamente por mais de certo e determinado tempo sem nunca ter sido condenado por um tribunal. Destarte, salvo melhor opinião, inexiste qualquer detenção ilegal dos arguidos AA, BB, CC, DD, e EE. De todo o modo, sobre a questão suscitada melhor decidirão Vossas Excelências. * 3. Tendo entrado a petição neste Supremo Tribunal, após distribuição, teve lugar a audiência aludida no art. 223.º, n.º 3, do CPP, pelo que cumpre conhecer e decidir. II Fundamentação 4. Factos Extrai-se dos elementos constantes da petição, da informação prestada nos termos do art. 223.º, n.º 1, do CPP, bem como da certidão junta aos autos e da consulta do Citius, o seguinte: i- Os arguidos AA, BB, CC, DD, e EE encontram-se presos preventivamente desde ... de ... de 2020 nos autos principais de que este habeas corpus é apenso, na sequência de interrogatório judicial a que foram submetidos. ii- Os mesmos arguidos foram condenados, em 1ª Instância, por Acórdão de ........2022, pela prática de em coautoria, de crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. nos arts. 21.º, n.º 1, e 24.º do DL 15/93, de ..., nas penas respetivas de nove anos de prisão, de doze anos e seis meses de prisão, de nove anos de prisão, de nove anos de prisão e de nove anos de prisão. iii- Por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de ........2023, foi confirmado integralmente o Acórdão da 1ª instância; iv- Inconformados, os arguidos interpuseram recurso dessa decisão para o STJ. v- Por Acórdão do STJ de ........2024 foi decidido: «Recursos apresentados conjuntamente por AA, CC, DD E EE: - negar provimento na parte em que invocam os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância, ao carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66, à questão do agente encoberto, e bem assim quanto ao excesso de pronúncia a propósito da aplicação do artigo 3.º, n.º6, da Lei n.º 101/2001, de ...; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas nos pontos 3.2.2. (relativamente aos arguidos AA, DD E EE), 3.2.4. (relativamente ao arguido EE) e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto – relativamente aos arguidos AA, CC, DD E EE), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. (…) Recurso apresentado por FF: – negar provimento na parte em que invoca os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância e carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas no ponto 3.5.2., com referência aos pontos 3.2.2. e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. (…)» vi- Em ........2024 os mesmos arguidos apresentaram requerimento na 1ª instância pedindo a sua libertação imediata (cujo teor aqui se dá por reproduzido), uma vez que (resumidamente) já tinham decorrido 3 anos e 4 meses de prisão preventiva sem que tivesse havido uma condenação com trânsito em julgado, nos termos do art. 215.º, n.º 1 e n.º 3, do CPP. vii- tal requerimento veio a ser indeferido no mesmo dia, com a seguinte fundamentação: “Vêm os arguidos AA, CC, DD, EE E FF, vêm requerer a sua LIBERTAÇÃO IMEDIATA Pois que foram detidos no dia .../.../2020, pelo que, nos termos do n.º 3 do art. 215 do CPP a prisão preventiva extinguiu-se, após o decurso do prazo de 3 anos e 4 meses, sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado. Igualmente, Os arguidos GG E HH, peticionam que nos termos das disposições conjugadas do art.º 215º, nº 1 al. d) e n.º 3, e art. 217º do CPP, se digne julgar extinta, desde o dia ... de ... de 2023, e por força do decurso do prazo, a medida de coacção de prisão preventiva a que os Arguidos estão sujeitos, sendo que estão detidos ininterruptamente desde .../.../2020. Notificado para se pronunciar veio a Digna Magistrada do Ministério Púbico referir que «É certo que por douto acórdão, o S.T.J. concedeu provimento aos recursos, anulando o acórdão do Tribunal da Relação de Évora. Contudo, a anulação do acórdão do Tribunal da Relação de Évora não implica, de modo algum, que essa decisão seja inexistente, apenas não poderá produzir os seus efeitos. Na verdade, a anulação do aludido acórdão não implica que o prazo máximo de prisão preventiva seja encurtado para 3 anos e 4 meses, como se não tivesse existido uma confirmação em 2ª instância – cf. acórdão do STJ de 20.11.2003 (proc. 03P4029, relator Exmº Cons. Rodrigues da Costa, acessível em www.dgsi.pt ). Como se dá nota no acórdão do STJ de 10.2.2021 (proc. 4243/17.0T9PRT-J.S1, relator Exmª Cons. Conceição Gomes), o Supremo Tribunal vem uniformemente adoptando, desde há muito, o entendimento de que aquilo que o legislador pretendeu evitar ao fixar os prazos de duração máxima da prisão preventiva é que o arguido esteja preso preventivamente por mais de certo e determinado tempo sem nunca ter sido condenado por um tribunal, ou seja, sem que um tribunal, após contraditório, haja considerado o arguido culpado. Isso é que seria intolerável do ponto de vista legal. Já não assim quando houve uma condenação, não obstante a sentença ou o julgamento tenham sido anulados. Aplicando ao caso o que se deixa exposto, estando os arguidos sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva desde ........2020 não se mostram excedidos os prazos 4 máximos, previstos no art. 215º, nº6 do C.P.P., o que só ocorrerá em ........2025, ........2026 e ........2026.» Cumpre decidir. Consta do dispositivo do Douto Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça: «Nestes termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes do Supremo Tribunal de Justiça em A) Recursos apresentados conjuntamente por AA, CC, DD E EE: – negar provimento na parte em que invocam os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância, ao carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66, à questão do agente encoberto, e bem assim quanto ao excesso de pronúncia a propósito da aplicação do artigo 3.º, n.º6, da Lei n.º 101/2001, de ...; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas nos pontos 3.2.2. (relativamente aos arguidos AA, DD E EE), 3.2.4. (relativamente ao arguido EE) e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto – relativamente aos arguidos AA, CC, DD E EE), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. B) Recurso apresentado por II: - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas no ponto 3.3.1., com referência ao ponto 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. C) Recurso apresentado conjuntamente por GG e HH: - negar provimento na parte em que invocam os vícios de omissão de pronúncia relativamente à não valoração das declarações do arguido JJ e existência de agente provocador; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas no ponto 3.4.1., com referência ao ponto 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões. D) Recurso apresentado por FF: – negar provimento na parte em que invoca os vícios de omissão de pronúncia do acórdão recorrido relativamente à alegada falta de exame crítico por parte da 1.ª instância e carácter genérico dos factos provados nos pontos 65 e 66; - conceder parcial provimento, anulando-se o acórdão recorrido por omissão de pronúncia quanto às questões supra identificadas no ponto 3.5.2., com referência aos pontos 3.2.2. e 3.2.5. (impugnação ampla da decisão de facto), sobre as quais em novo acórdão se deverá tomar posição que tenha em conta o supra exposto; - fica prejudicado o conhecimento das demais questões.» Ora, certo é que o Supremo Tribunal de Justiça deu parcial provimento ao recurso, anulando-se o acórdão recorrido quanto a algumas questões cabalmente identificadas. Porem, tal não implica que o Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Évora seja inexistente e muito menos que conduza à consequência peticionada pelos arguidos. Pois que, a anulação do aludido acórdão não implica que o prazo máximo de prisão preventiva seja encurtado para 3 anos e 4 meses (repristinado) como se não tivesse existido uma confirmação em 2ª instância (acórdão do STJ de ........2003), pelo que é de manter o prazo a que alude o disposto no n.º 6 do artigo 215º do Código de Processo Penal. Em suma, não se encontram excedidos os prazos máximos da prisão preventiva, pelo que se indefere o requerido pelos arguidos. Notifique.” viii- Também em ........2024 a 1ª instância procedeu ao reexame da prisão preventiva (nos termos do art. 213.º do CPP) dos arguidos que se encontravam em tal situação desde ........2020 (a saber dos arguidos KK, AA, BB, CC, DD, GG, HH e EE), considerando “ser de manter a medida de coacção aplicada aos arguidos, por se manterem os pressupostos que determinaram a sua aplicação (artigos 215º, n.º 6, do Código de Processo Penal).”, tendo ainda consignado que “o Acórdão já transitou em julgado em relação ao arguido LL.” ix- Os arguidos/peticionantes deste habeas corpus AA, BB, CC, DD e EE mantém-se nesta data na situação de prisão preventiva. 5. Direito 5.1. Invocam os peticionantes, em resumo, que por o acórdão do STJ de 9.05.2024 ter anulado o acórdão do TRE (que confirmara a decisão condenatória da 1ª instância), por omissão de pronúncia quanto às questões aí bem identificadas, ordenando a prolação de novo acórdão (questões essas que pela sua importância até podem importar a sua absolvição), foi desse modo retirado o valor confirmativo ao acórdão da Relação, o que significa que não se pode ter como subsistente uma decisão condenatória confirmada por um tribunal superior, para efeitos de elevação do prazo de prisão preventiva, pelo que a partir do trânsito em julgado do ac. do STJ, deixou de poder subsistir a elevação do prazo da prisão preventiva nos termos do art. 215.º, n.º 6, do CPP, o que tem por consequência que o prazo máximo da prisão preventiva dos arguidos se fixou em 3 anos e 4 meses, face ao disposto no art. 215.º, n.º 1, al. d) e n.º 3, do CPP, o qual se esgotou em ........2024 (data do trânsito do ac. do STJ), devendo ser, assim, de imediato restituídos à liberdade. Suscitam ainda a inconstitucionalidade de interpretações que possam vir ser feitas contra o entendimento por si defendido e que lhes seja desfavorável, que indicam nos artigos 28.º a 30.º da petição deste habeas corpus. Pois bem. 5.2. Dispõe o artigo 222.º (habeas corpus em virtude de prisão ilegal) do CPP: 1 - A qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência de habeas corpus. 2 - A petição é formulada pelo preso ou por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos, é dirigida, em duplicado, ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, apresentada à autoridade à ordem da qual aquele se mantenha preso e deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de: a) Ter sido efetuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial. São taxativos os pressupostos do habeas corpus (que também tem assento no art. 31.º da CRP), o qual não se confunde com o recurso, nem com os fundamentos deste. Aliás, como diz Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, vol. II, Lisboa: Editorial Verbo, 1993, p. 260, o habeas corpus “não é um recurso, é uma providência extraordinária com a natureza de acção autónoma com fim cautelar, destinada a pôr termo em muito curto espaço de tempo a uma situação de ilegal privação de liberdade”. Convém ter presente, como se refere no art. 31.º, n.º 1 CRP, que “Haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.” Ou seja, esta providência, que inclusivamente pode ser interposta por qualquer cidadão no gozo dos seus direitos políticos (art. 31.º, n.º 2 CRP), tem apenas por finalidade libertar quem está preso ou detido ilegalmente e, por isso, é uma medida excecional e muito célere. De resto, quando se aprecia a providência de habeas corpus não se vai analisar o mérito da decisão que determina a prisão, aqui o mérito da decisão que determinou a detenção para extradição, ou que alargou o seu prazo, conforme previsto na lei, nem tão pouco erros procedimentais (cometidos pelo tribunal ou pelos sujeitos processuais) já que esses devem ser apreciados em sede de recurso, mas tão só incumbe decidir se ocorrem quaisquer dos fundamentos indicados no art. 222.º, n.º 2, do CPP. 5.3. Apreciação E, o que é que se passa neste caso concreto? Os peticionantes deste habeas corpus, que se encontram presos preventivamente desde ........2020 à ordem do processo principal de que esta providência é apenso, na sequência de interrogatório judicial a que foram submetidos, foram condenados em 1ª instância, em ........2022, pela prática em coautoria, de crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. nos arts. 21.º, n.º 1, e 24.º do DL 15/93, de 22.01, nas penas respetivas de nove anos de prisão, de doze anos e seis meses de prisão, de nove anos de prisão, de nove anos de prisão e de nove anos de prisão, condenação essa que foi confirmada integralmente por Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de ........2023, mas por Acórdão do STJ de ........2024, entretanto transitado em julgado, o referido acórdão da Relação veio parcialmente a ser anulado por omissão de pronúncia quanto às questões ali identificadas, sendo ordenada a prolação de novo acórdão para tomada de posição sobre as referidas questões cuja pronúncia foi omitida. A questão que se coloca é a de saber se, pelo facto do Ac. do STJ de ........2024 ter anulado parcialmente o acórdão da Relação de Évora que confirmara a condenação da 1ª instância, isso significa que o prazo da prisão preventiva vai retroagir, passando a valer o previsto no art. 215.º, n.º 1, al. d), e n.º 3, do CPP (neste caso, ter-se-ia então de ter em atenção o prazo máximo de 3 anos e 4 meses de prisão) ou se, pelo contrário, continua/mantém-se em vigor a elevação do prazo aludida no art. 215.º, n.º 6, do CPP. Trata-se de matéria que não é nova, uma vez que já anteriormente foi discutida e tem vindo a ser decidida de forma praticamente uniforme, nomeadamente, pelo Supremo Tribunal de Justiça. A verdade é que o processo está na fase dos recursos e, precisamente por a Relação em ........2023 ter confirmado a decisão da 1ª instância é que, nessa altura, foi alargado o prazo nos termos aludidos no art. 215.º, n.º 6, do CPP3. A elevação do prazo da prisão preventiva prevista no art. 215.º, n.º 6, do CPP, introduzida pela Lei n.º 48/2007, de 29.08, é independente da interposição de posteriores recursos e, mesmo dessa decisão que confirma a sentença condenatória não transitar. O que se passa aqui é que com a anulação parcial do acórdão da Relação, temos uma decisão da Relação que não é definitiva, até porque tem de ser proferida uma nova (decisão) mas, apenas quanto às questões indicadas no Ac. do STJ de ........2024, sendo certo, porém, que além do mais até já existe uma decisão condenatória da 1ª instância. A sentença condenatória da 1ª instância mesmo que viesse a ser anulada pela Relação não tinha como efeito que tudo ficasse sem efeito ou que se voltasse ao momento inicial. É preciso ter presente, como vem defendendo o Supremo Tribunal de Justiça4, que a anulação da sentença não envolve, “nem determina a irrelevância da atividade processual desenvolvida, consequência que só o vício da inexistência envolve.”5 Os efeitos do ato nulo ou anulável são distintos do ato inexistente, não implicando a anulação do acórdão da Relação que o processo regresse a fase anterior, como se não tivesse havido condenação. O facto do STJ ter anulado a decisão da Relação não significa que a decisão desta tivesse deixado de existir (tanto mais que foi em parte negado provimento aos recursos interpostos pelos arguidos e, oportunamente, quando for proferida a nova decisão sobre as questões em que há omissão de pronúncia o STJ irá então conhecer dos recursos, se os arguidos os voltarem a interpor) ainda que possa não produzir efeitos6. Além disso, o motivo da anulação foi a omissão de pronúncia quanto às questões identificadas no acórdão do STJ de ........2024, o que significa que se mantém no mais (em que não há omissão de pronúncia e, em que ainda não foram conhecidos os recursos, ressalvado, portanto, a parte em que já foram julgados improcedentes) a confirmação da condenação da 1ª instância, mesmo que não transitada. Pode-se, pois, concluir que, em fase de recurso, a anulação do acórdão da Relação, nos moldes em que ocorreu (por omissão de pronúncia quanto às questões indicadas no acórdão do STJ de ........2024), ainda que respeite a uma decisão que não transitou em julgado (na medida em que se aguarda que seja proferida nova decisão conforme determinado pelo STJ, mas que, de todo o modo confirma a condenação da 1ª instância, ainda que de modo ainda não definitivo), não invalida a atividade processual anteriormente desenvolvida, continuando para este efeito, de estabelecimento do prazo máximo da prisão preventiva aplicada aos arguidos, a ser aplicável o disposto no art. 215.º, n.º 6, do CPP, que já estava então em curso e que não é inutilizado, sendo oportunamente descontado7 - o que não se vislumbra ter por base qualquer interpretação dos arts. 215.º, n.º 6, 379.º, n.º 1, al. c) e 425.º, n.º 4, do CPP, contrária à Constituição da República Portuguesa. De resto, ao contrário do que sugerem os peticionantes, nem o STJ, no seu acórdão de ........2024, determinou o retrocesso dos prazos de prisão preventiva, pois, a comunicação de decisões que vão sendo produzidas pelos tribunais superiores (acórdãos da Relação e do STJ), mais não visa do que manter atualizados os elementos do traslado existente na 1ª instância. E, precisamente por a anulação da decisão da Relação não significar que tudo retroage a fase anterior é que não se pode aceitar a tese de que, a consequência, seria a de que o prazo máximo da prisão preventiva dos arguidos era de 3 anos e 4 meses, face ao disposto no art. 215.º, n.º 1, al. d) e n.º 3, do CPP. De igual modo, não se pode confundir este caso concreto, com o que foi apreciado no ac. do STJ de ........2009, citado pelos peticionantes, uma vez que, além do mais, se tratam de diferentes situações (estando, além do mais, neste último em causa um reenvio parcial do processo para ampliação da matéria de facto, o que não sucede no caso em apreciação nestes autos). Mas, ainda que assim não fosse, como acima já se viu, a prisão preventiva dos aqui peticionantes foi motivada por facto que a lei permite atento o crime pelo qual foram condenados em 1ª instância (tráfico de estupefacientes agravado, que integra a criminalidade altamente organizada) mantendo-se, mesmo atualmente, dentro do prazo legal (na sequência das decisões judiciais proferidas em ........2024 e em ........2024, nos termos legais). A discussão sobre a legalidade ou ilegalidade daquelas decisões (quer a proferida em ........2024, que indeferiu requerimento que apresentaram a pedir a restituição à liberdade por alegadamente se ter esgotado o prazo da prisão preventiva, quer a proferida em ........2024, que procedeu ao reexame da prisão preventiva) e sobre eventuais interpretações inconstitucionais, em rigor, deveriam/deverão, a nosso ver, ser colocadas em sede de recurso e não neste habeas corpus, que é providência inadequada para esse efeito (uma vez que não é um recurso), nem podem pretender, através dele, que o STJ se pronuncie sobre matérias que extravasam os seus fundamentos (nem essa matéria que invocam integra qualquer dos fundamentos do art. 222.º do CPP, que são taxativos). Assim, não foram violados os princípios e as disposições legais invocados pelos requerentes deste habeas corpus. III - Decisão Pelo exposto, acordam nesta Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em indeferir a providência de habeas corpus formulado por AA, BB, CC, DD, EE, por falta de fundamento bastante. Custas pelos peticionantes, fixando-se a taxa de justiça devida por cada um deles em 3 UC`s. * Processado em computador e elaborado e revisto integralmente pela Relatora (art. 94.º, n.º 2, do CPP), sendo assinado pela própria, pelas Senhoras Juízas Conselheiras Adjuntas e pelo Senhor Juiz Conselheiro Presidente da Secção. * Supremo Tribunal de Justiça, 04.06.2024 Maria do Carmo Silva Dias (Relatora) Eucária Maria Martins Vieira (Adjunta) Ana Barata Brito (Adjunta) Nuno Gonçalves (Presidente da Secção) ________________ 1. O TRE não esclareceu se o Estado português disponibilizou os meios logísticos necessários para a realização de um transporte de haxixe até território português, dispôs da embarcação, procedeu ao transporte do haxixe, transportou-o para terra, algures na Costa portuguesa; A embarcação era propriedade da Polícia Judiciária, tendo a mesma sido tripulada pela própria Polícia Judiciária; Num ponto previamente combinado entre a Polícia Judiciaria e indivíduos desconhecidos procedeu-se ao transbordo do produto estupefaciente: de uma embarcação tripulada por indivíduos desconhecidos para a embarcação da Polícia Judiciaria, uma vez na posse do produto estupefaciente a Polícia Judiciaria transportou-o para a Costa Portuguesa; por sua vez, a Polícia Judiciária procedeu ao desembarque do produto estupefaciente e transportou-o em veículos próprios para uma garagem de um prédio de habitação, sita na ... a fim de guardar o produto estupefaciente (local de exclusivo acesso da PJ); 2. Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, proferido no âmbito do processo nº 1126/06.2PEAMD-F.S1, datado de 05-03-2009. 3. Dispõe o art. 215.º, n.º 6, do CPP: No caso de o arguido ter sido condenado a pena de prisão em 1.ª instância e a sentença condenatória ter sido confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo da prisão preventiva eleva-se para metade da pena que tiver sido fixada. 4. V.g. acórdãos do STJ de 10.02.2021 (Maria da Conceição Gomes), de 29.09.2010 (Henriques Gaspar), 08.09.2011 (Arménio Sottomayor), 14.05.2008 (Raul Borges); ac. TRC de 10.09.2014 (Jorge Dias), todos disponíveis no site do ITIJ. 5. Ac. STJ de 6.03.2014 (Oliveira Mendes), disponível no site do ITIJ. 6. Ac. STJ de 20.11.2003 (Rodrigues da Costa), disponível no site do ITIJ. 7. Neste sentido, também, Elisabete Ferreira e Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal à luz da Constituição da República e da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, vol. I, 5ª edição atualizada, UCP editora, 2023, p. 944. |