Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 2.ª SECÇÃO (CÍVEL) | ||
Relator: | CATARINA SERRA | ||
Descritores: | MEDIDA DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO ACOLHIMENTO RESIDENCIAL PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE PRINCÍPIO DA ATUALIDADE PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTEÇÃO INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA | ||
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Data do Acordão: | 10/29/2020 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO | ||
Indicações Eventuais: | TRANSITADO EM JULGADO | ||
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Sumário : | I. Quando esteja em perigo a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança ou do jovem é legítima uma intervenção para a promoção dos seus direitos e para a sua protecção (artigo 3.º, n.º 1, da LPCJ).
II. Nestas situações, por mais desejável que seja a prevalência da família [cfr. artigo 4.º, al. h), da LPCJ], o mais importante é o interesse superior da criança ou do jovem [cfr. artigo 4.º, al. a)], devendo, em qualquer caso, a medida a aplicar ser a necessária e a adequada a salvaguardar a criança ou o jovem do perigo em que se encontra no momento da aplicação da medida [cfr. artigo 4.º, al. e)]. III. Quando se frustram as tentativas de aplicação de medidas no meio natural da vida da criança ou do jovem, torna-se necessária a aplicação de uma medida distinta / alternativa a esta. IV. Acarretando a medida de acolhimento residencial, expressamente prevista no artigo 35.º, n.º 1, al. f), da LPCJ, um certo sacrifício para o interesse da família, mas sendo o rigor da medida atenuado com a autorização das visitas e dos contactos entre o jovem e a sua mãe e, sobretudo, com a limitação da medida no tempo e a sua susceptilidade de revisão a curto prazo, não há dúvidas de que ela respeita os princípios da proporcionalidade (necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito) e da actualidade impostos no artigo 4.º, al. e), da LPCJ. | ||
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Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
1. No processo de promoção e protecção relativo ao menor, AA, nascido em … .02.2005, filho de BB e de CC, foi, em 20.04.2020, após diversas vicissitudes que os autos documentam e uma vez realizada a instrução, proferida sentença. Nesta sentença foi decidido o seguinte: a) “aplicar ao menor AA a medida de acolhimento residencial pelo período de um ano, com revisão trimestral, de acordo com o plano de execução junto aos autos pelo EMAT a 24/01/2020 e elaborado pela Casa de Acolhimento a 20/01/2020”; b) “autoriza[r] as visitas e contactos entre progenitora e menor AA na medida em que, após o levantamento do estado de emergência, a casa de acolhimento em articulação com a pedopsiquiatra do menor, Drª DD, assim o entenda”; c) “a presente medida será acompanhada pela técnica da Segurança Social, na qualidade de gestora do processo naquela entidade relativamente ao menor”; e d) “a medida aplicada tem a duração de um ano e será revista decorrido o período de três meses”.
2. Inconformada, recorreu a mãe do menor, CC, pedindo que se revogasse a sentença e se fossem adoptadas medidas de promoção e protecção do menor no seu meio natural de vida e não de colocação em acolhimento residencial.
3. Em 16.06.2020, proferiu o Tribunal da Relação do Porto um Acórdão, com a seguinte decisão: “Pelas razões expostas, acorda-se em negar provimento ao presente recurso e, consequentemente, confirma-se a decisão recorrida”.
4. Ainda inconformada, vem agora CC interpor recurso excepcional de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando, entre outros, o artigo 672.º n.º 1, als. a), b) e c), do CPC e pedindo que aquele Acórdão seja declarado sem efeito e substituído por outro que “permita ao menor que as adequadas e pertinentes medidas de promoção e protecção necessárias o devam ser em meio natural de vida e não em instituição ou acolhimento”. A terminar as suas alegações, formula as seguintes conclusões: “I – O Acórdão recorrido que negou provimento ao presente recurso e, consequentemente, confirmou- a decisão recorrida, aplicou erradamente as normas relativas à Lei nº 147/99 de 1 de Setembro artº. 34º, artº 35º nº 1 a e nº 2, artº 39º artº 41º, artº 45º, artº 60 (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo,) ao disposto no artº. 205º, nº1 da CRP, aº13º e 38º da Constituição da Republica Portuguesa e artº 67º,68º.69ºe 70º da lei constitucional nº1/2004, e demais legislação aplicável. II - São bem antigos e longínquos, desproporcionados e desatualizados os factos dados como provados da sentença que se recorre nos itens 56, 54, 49, 47, 46, 35, 34, 33, 32, 31, (26, 27, 25), 23, 22, 21, 19, 20, 18, 17, 16, 14, 13, 12, 11, 10, 9, 8, 2, 3, 4, 5, 6, 7. III – Afastar o jovem AA da família e institucionaliza-lo como foi teria que ser o último recurso e o único possível e adequado á situação concreta de perigo e não o foi… IV – O menor tentou pôr termo à vida porque soube que ia ser novamente institucionalizado. VI – Em sítio algum se pode dar como provado que o menor tentou pôr termo à vida por causa da mãe… VIII - A realidade do menor AA e da mãe do menor hoje em fins de abril de 2020 são muito diferentes das de há dez anos atras ou há cinco anos atrás o sequer do ano passado… IX - São bem antigos e longínquos, desproporcionados e desatualizados os factos dados como provados da sentença que se recorre nos itens 56, 54, 49, 47, 46, 35, 34, 33, 32, 31, (26, 27, 25), 23, 22, 21, 19, 20, 18, 17, 16, 14, 13, 12, 11, 10, 9, 8, 2, 3, 4, 5, 6, 7. XI - Nos termos do artº 62º da lei 147/99(LPCJP)aquela medida de institucionalização é hoje desnecessária e é excessiva ter aquela medida a duração de um ano XII - Os fundamentos motivacionais da sentença de que se recorre são antigos e não oportunos, não são atuais nem hoje convenientes XIII - A intervenção de medidas restritivas no seio da família deve ser a necessária e adequada à situação concreta de perigo no momento em que a decisão é tomada em obediência aos princípios da proporcionalidade e actualidade. XIV - Deve o menor regressar ao seio de sua família nuclear o mais breve possível e frequentar estabelecimento de ensino adequado próximo da sua residência familiar nomeadamente a escola … em … onde fez amigos e se integrou melhor. Os processos judicias de promoção dos direitos e protecção das crianças e jovens em perigo são de jurisdição voluntária-artº 100º LPCJP e são orientados por critérios de oportunidade e conveniência. XV - Os suicídios e as respectivas tentativas acontecem em qualquer meio de vida, e em qualquer lugar … são infelizmente inúmeras as situações e de notório conhecimento. XVI - Não basta dizer-se que o principio da prevalência da família deve ceder quando a referida prevalência for contrária ao interesse do menor, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, sadio e harmonioso … É preciso que se prove que tal é a única solução possível, que não existe hoje outra ou outras actuais e frescas com fundamentos actuais e frescos. XVII - A situação do infortúnio do menor AA seria melhor resolvida de acordo com as normas do disposto do DL nº 12/2008 de 17 de Janeiro XVIII - Foram violadas as normas do disposto nos artº. 34º,artº35º nº 1 a e nº 2, artº 39º artº 41º, artº 45º, artº 60ºda lei nº 147/99, disposto no artº. 205º, nº1 da CRP, aº13º e 38º da Constituição da Republica Portuguesa e artº 67º,68º.69ºe 70º da lei constitucional nº1/2004 e demais legislação e interpretado erradamente o disposto nos artigos 34º, 35º e 52º da Lei nº 147/99 de 1 de Setembro (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo) além de outras interpretações e imprecisões legais … XVIII – Deve a sentença de que aqui se recorre ser substituída por outra ser que permita ao menor AA serem aplicadas as adequadas e pertinentes medidas de promoção e protecção e que o devam ser em meio natural de vida e não em instituição ou acolhimento… XIX - Tudo o mais que se possa apurar e no superior interesse do menor AA e/ou de relevante importância social”.
5. Por sua vez, o Ministério Público apresentou as seguintes contra-alegações: “1.º O processo de promoção e proteção é um processo de jurisdição voluntária – Artigo 100.º da Lei n.º 147/99, de 1 de setembro. 2.º Segundo se dispõe no n.º 2, do artigo 988.º, do CPC, das resoluções proferidas neste tipo de processos, segundo critérios de conveniência ou oportunidade, não é admissível recurso para o STJ. 3.º No douto acórdão sob recurso foi confirmada, sem qualquer voto de vencido, a resolução tomada na 1.ª instância de aplicar ao menor a medida de acolhimento residencial pelo período de um ano. 4.º Essa decisão foi confirmada segundo critérios de conveniência ou oportunidade, assim sumariados: “I – No âmbito do regime jurídico de promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens em perigo, deve dar-se, por regra, prevalência à família. II – Esse princípio, no entanto, deve ceder quando a referida prevalência for contrária aos interesses do menor, tendo em vista o seu desenvolvimento integral, sadio e harmonioso”. 5.º Tendo sido mantida a decisão proferida pela 1.ª instância, no tribunal recorrido. 6.º O acórdão sob recurso, pelos seus termos genéricos, não pode estar em oposição com qualquer outro acórdão proferido pelos tribunais superiores 7.º Termos em que se conclui que o presente recurso não deve ser admitido, assim sendo feita a costumada, JUSTIÇA”.
6. Em 30.06.2020, proferiu o Exmo. Senhor Desembargador do Tribunal da Relação do Porto o seguinte despacho: “Tendo sido interposto recurso de revista excecional, dado o disposto no artigo 672.º, n.º 1, do CPC, remeta os autos ao Supremo Tribunal de Justiça para apreciação e decisão”.
7. Distribuídos os autos neste Supremo Tribunal, proferiu, em 7.09.2020, a ora Relatora uma despacho em que pode ler-se o seguinte: “Não se encontrando impedimentos à admissibilidade do presente recurso relacionados com os requisitos gerais de recorribilidade (cfr., designadamente, artigos 629.º, n.º 1, 631.º e 638.º do CPC) nem com o requisito específico do recurso de revista (cfr. artigo 671.º, n.º 1, do CPC), cabe, no entanto, destacar o disposto no artigo 671.º, n.º 3, do CPC: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível, não é admitida revista do acórdão da Relação que confirme, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida na 1.ª instância, salvo nos casos previstos no artigo seguinte”. No caso presente, é visível que o Acórdão recorrido confirma, sem voto de vencido e sem fundamentação essencialmente diferente, a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância. Ocorre, portanto, o obstáculo recursivo designado como dupla conforme. Por esta razão, não se configurando a presente situação como uma das situações ressalvadas na norma (em que o recurso é sempre admissível), o recurso por via normal não será admissível. Mas, dado que o recurso é interposto com fundamento no disposto no artigo 672.º, n.º 1, als. a), b) e c), do CPC, há ainda que considerar a hipótese de o recurso ser admitido por via excepcional, como permite esta norma. Antes disso, porém, porque o presente processo é um processo de promoção e protecção de menor, logo, um processo de jurisdição voluntária[1], cumpre apreciar se estão preenchidos os requisitos específicos da admissibilidade da revista em processos de jurisdição voluntária. Trata-se, mais precisamente, de apreciar se obsta à admissibilidade da revista (nos termos gerais) o disposto no artigo 988.º, n.º 2, do CPC: “Das resoluções proferidas segundo critérios de conveniência e oportunidade não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça”. Verificando-se que, como decorre do excerto do Acórdão acima reproduzido, o Tribunal recorrido se orientou por critérios de legalidade e que, como decorre das conclusões das alegações da recorrente, igualmente transcritas, o presente recurso se prende, no essencial, com a interpretação (e a conformidade à Constituição) das normas jurídicas aplicáveis ao caso, conclui-se que não existe aquele impedimento à apreciação dos pressupostos da admissibilidade excepcional do recurso. A apreciação preliminar sumária de tais pressupostos cabe à Formação prevista no n.º 3 do artigo 672.º do CPC. Em face do exposto, remetam-se os autos à Formação, para os efeitos previstos no n.º 3 do artigo 672.º do CPC. Notifique”.
8. A Formação proferiu um Acórdão em que o recurso foi julgado admissível por via excepcional e o recurso retornou à ora relatora, cabendo agora a este Colectivo apreciar do seu mérito.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente (cfr. artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do CPC), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cfr. artigos 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do CPC), a única questão a decidir, in casu, é a de saber se, ao decidir as medidas de promoção e de protecção que decidiu, o Tribunal recorrido incorreu em violação da lei. * II. FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS São os seguintes os factos dados como provados no Acórdão recorrido: 1. AA, nasceu no …, e é filho de BB e de CC (fls. 94); 2. No Verão de 2007, o menor passou a residir com a progenitora e a irmã uterina, EE; 3. A situação de risco do menor foi sinalizada à CPCJ de …, pela própria mãe, em Janeiro de 2008, pelo facto de esta ser incapaz de lhe impor limites e regras[2]; 4. Nessa data, a progenitora estava desempregada, não tinha retaguarda familiar, apresentava alterações frequentes de humor, com marcados comportamentos agressivos para com os filhos, que respondiam do mesmo modo, sendo que a EE agredia a mãe, assumia um papel ascende sobre esta e agredia a irmã, que, por sua vez, agredia a mãe; 5. No dia 22/02/2008, por acordo homologado judicialmente, o AA foi acolhido na “Casa do …”, onde permaneceu até ao dia 27/07/2009; 6. Durante este período a mãe do menor visitava-o e parecia que a sua situação psiquiátrica tinha evoluído favoravelmente, razão pelo que a medida de acolhimento institucional foi substituída pela medida de apoio junto dos pais, a executar junto da progenitora; 7. No dia 23/10/2010, o processo foi arquivado, por se ter entendido que a situação de perigo tinha sido superada; 8. O processo foi reaberto por ter sido sinalizado que o menor ia para a escola sem tomar o pequeno almoço, faltava as consultas de pedopsiquiatria e havia a suspeita de ficar sozinho em casa; 9. No dia 18/03/2011, a mãe pediu ajuda as Técnicas da CPCJ pelo facto de o AA se recusar a ir para o infantário; 10. No infantário o AA agredia verbal e fisicamente colegas e funcionários, atirando objetos ao chão e gritando sempre que recebia ordens ou era contrariado; 11. Como causa direta da personalidade e exercício da parentalidade da mãe, o AA manifesta problemas de comportamento agressivos, com grande intolerância a frustração, conforme consta da avaliação psicológica de Abril de 2011 (fls. 25); 12. Na avaliação psicológica da progenitora, de fls. 32, concluiu que esta “possui uma desordem de personalidade, o que poderá ter um impacto bastante negativo no desenvolvimento dos menores”; “o desligamento afectivo e a vinculação insegura dos filhos, tem vindo a apresentar consequências nefastas no comportamento destes, bem como dificuldades graves na sua modelação emocional”; 13. Proposto um novo acolhimento institucional, a mãe não deu o seu consentimento, tendo sido aberta a fase judicial do Processo de Promoção e Protecção no dia 06/06/2011; 14. Por acordo, no dia 02/11/2011, foi aplicada ao menor, a medida de apoio junto de outro familiar, a tia materna, FF; 15. Na execução dessa medida o AA foi acompanhado em consultas de terapia da fala e terapia familiar, na Unidade de Fisiatria na Santa Casa da Misericórdia da … e em consultas de Pedopsiquiatria, no Hospital da …, pela Drª GG; 16. A progenitora passou a visitar o menor em casa da irmã e a interferir na vida desta, tendo acabado por conseguir ficar com o filho, em Agosto de 2012, sem o conhecimento ou autorização do Tribunal; 17. No dia 16/08/2012, a progenitora compareceu no Serviço da Segurança Social de …, dizendo que o filho tinha riscado o carro e atirado uma pedra, necessitando este de uma avaliação psiquiátrica urgente; 18. Assim a favor do AA foi novamente aplicada a medida de acolhimento residencial, tendo ficado acolhido no “…”, onde permaneceu, desde Agosto de 2012 ate ao dia 19/08/2015; 19. Nessa última data, passados dois anos do seu acolhimento residencial, o AA estava cada vez mais integrado no contexto institucional, reportando-se cada vez menos a sua família de origem e as memórias do passado e quando foi proposta a medida de confiança do menor a instituição, com vista a futura adoção, a tia materna mostrou-se disponível para receber o sobrinho, tendo sido aplicada a medida de apoio junto de outro familiar, no dia 19/08/2015; 20. Posteriormente, no dia 28/12/2015, o AA mordeu a tia, recusou-se a acompanhá-la a uma consulta de pedopsiquiatria e fugiu para casa da mãe depois de vir a manifestar problemas de comportamento, rejeitando a escola, de onde fugia, rasgando os livros; 21. A tia materna manifestou não querer o regresso do sobrinho a sua casa; 22. Por a progenitora não garantir a segurança do menor, face ao distúrbio de personalidade que padece, no dia 29/12/2015, o AA foi acolhido no “…”, no âmbito da aplicação de uma medida cautelar; 23. A progenitora encontra-se de relações cortadas com a filha EE, sendo frequentes os episódios de conflito/agressão entre as mesmas, estendido a outros elementos do agregado familiar; 24. As relações do AA quer quando esteve com a mãe quer quando esteve ao cuidado da tia eram pautadas falta de tolerância à frustração, com reações agressivas quando contrariado, descontrolando-se e pontapeando tudo à sua volta, e agredindo as pessoas que o tentassem acalmar; 25. O menor tem evidenciado uma postura serena e tranquila no CAT, e tem obedecido as regras; 26. Está inscrito na Escola EB 2/3 de …, onde já teve problemas disciplinares por desrespeito das regras de sala e não cumprimento das ordens do professor; 27. Ao contrário do que acontecia quando estava integrado na família natural, não falta às aulas, cumpre os trabalhos de casa e revela interesse pelo estudo; 28. E a seu pedido foi aí incluído no desporto escolar de “Badminton e no Clube de Xadrez; 29. O AA foi na altura ser acompanhado em pedopsiquiatria, cumprindo prescrição médica, tendo visitas da progenitora na Instituição. 30. A progenitora aquando dessas visitas tendia a centrar-se no que o menor tem vestido, o que comeu, se lhe doí alguma coisa, centrando a conversação em problemas e doenças trazidas pela progenitora e que o menor não reporta a nenhum cuidador nos restantes dias; 31. O AA foi encaminhado para o PIAC (programa integrado de Apoio à Comunidade) para acompanhamento na área da psicologia, estando-se a aguardar o resultado da avaliação psicológica do mesmo, importante para a definição do seu projeto de vida; 32. A progenitora encontrava a procurar inserção laboral, estando a realizar duas horas por dia numa lavandaria; 33. Vivia sozinha num apartamento, pelo qual pagava 200 euros de renda mensais, não mantendo relações familiares com a filha, a irmã; 34. A progenitora da mesma encontra-se a trabalhar em Inglaterra; 35. A progenitora do AA estava, à data, a ser acompanhada, pela Dr.ª HH, psicóloga Clínica, devido a sintomatologia depressiva; 36. Quer do relatório desta Clínica quer da avaliação psicológica efetuada à progenitora resultava a recomendação de uma maior aproximação de forma gradual e progressiva entre a mesma e o filho; 37. Os autos prosseguiram para debate judicial e por decisão datada de 14/07/2016 foi determinado o acolhimento residencial do AA. 38. Posteriormente por decisão datada de 08/01/2018 foi determinada a substituição da medida de acolhimento residencial pela medida de apoio junto da mãe, pelo período de 6 (seis) meses, devendo o AA continuar a frequentar a mesma escola e providenciando a progenitora pela deslocação da criança à escola e da escola para casa, devendo ser apresentado um plano de execução desta medida que contemple a continuação do acompanhamento psicológico que vem sendo efetuado ao menor e com a intervenção do CAFAP com o objetivo de ser trabalhada a relação mãe/filho, tal como vem proposto pelo PIAC. 39. Por decisão datada de 13/07/2018 foi determinada a prorrogação da medida de apoio junto a mãe com as obrigações constantes do plano de execução. 40. Por decisão datada de 13/02/2019 foi determinada a prorrogação da medida de apoio junto a mãe com as obrigações constantes do plano de execução, com as seguintes obrigações: a. se providencie pela transferência do menor para escola …, em …, escola que frequentou quando esteve acolhido na Casa da … . Para o efeito, oficie à DGESTE …. informação sobre a possibilidade de transferência do menor para a Escola …, informando-se que já frequentou essa escola e que tal transferência será importante para o retirar da situação de perigo em que se encontra actualmente nomeadamente ao nível emocional; b. se oficie via confidencial à Câmara Municipal da …, sector da habitação social, para que avalie da possibilidade de o agregado familiar alterar a habitação social para local mais adequado aos interesses do menor, nomeadamente tendo em conta a escola da sua preferência e a situação de perigo em que se encontra; c. se providencie pela inscrição do menor em actividade desportiva, extracurricular, após auscultação da actividade pretendida pelo menor, devendo o apoio económico ser carreado para a frequência de tal actividade. d. se realize uma avaliação completa do AA ao nível da psicologia a ser efectuada pelo GEAV- Gabinete de Estudos e de Atendimento a Agressores e Vítimas da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade …., tendo por objecto todas as dificuldades de sociabilização que o menor demonstra bem como a interacção deste com a progenitora e o relatório da perícia médico-legal de psicologia realizada à progenitora, datado de 12 de Julho de 2017, que conclui que a progenitora deverá beneficiar de um apoio educativo/ terapêutico promotor da aquisição e consolidação de estratégias adequadas ao efectivo perfil e idade do menor e as mesmas têm sido levadas a cabo. Deverá tal avaliação apontar formas alternativas de actuação além das já encetadas quer junto do AA, por forma a afastar a criança do perigo em que se encontra, quer junto da progenitora, devendo ainda tal perícia esclarecer se na situação em apreço o novo acolhimento residencial seria uma alternativa mais eficaz dada a aparente ineficácia das medidas encetadas junto do meio natural de vida. 41. Por decisão datada de 10/10/2019 foi determinada a substituição a título cautelar da medida de apoio junto da mãe pela medida de acolhimento residencial, com as seguintes obrigações: a. Promover o sucesso escolar, nomeadamente: b. Acompanhamento por parte da Casa de Acolhimento no sentido de responsabilizar o jovem pela frequência assídua e pontual da Escola; c. Promover a saúde e o bem-estar do menor, designadamente: d. Cumprir com a calendarização das consultas de rotina e de especialidade, nomeadamente com a consulta de pedopsiquiatria, bem como da respectiva terapêutica prescrita; e. Estabelecer regras e limites apropriados: f. Orientando o jovem ao nível das regras e limites dentro e fora da Casa de Acolhimento. 42. Foi agendada conferência a que se refere o art.º 112º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo. 43. Foi carreada para os autos a informação intercalar de fls. 1971 que dá conta que no dia 12/10/2019 o AA tentou o suicídio através da ingestão de fármacos da progenitora, tendo sido transferido para o CMIN … onde esteve internado de 12 a 14/10 apos ter dado entrada nas urgências do Cento Hospitalar da …, tendo sido transferido para a ala psiquiátrica do Hospital … 44. Foi realizada conferência a que alude o art. 112º da LPPCJP sendo que apenas a progenitora não concordou com o projecto de vida de acolhimento residencial. 45. Após a prolação da decisão datada de 08/01/2018, em que o menor foi sujeito à medida de apoio junto da mãe, referida no ponto 38) da factualidade provada, o AA regrediu nos seus progressos e deixou de comparecer à escola sendo que no ano lectivo 2018/2019 reprovou de ano. 46. O AA abandonou o acompanhamento médico e recusou-se a efetuar análises clínicas prescritas pelo médico. 47. Deixou também de frequentar qualquer atividade desportiva. 48. O AA cada vez se isolava mais, não querendo sair de casa. 49. Por sua vez, a progenitora mostrava-se incapaz de lidar com os comportamentos do jovem não obstante de se mostrar uma progenitora presente e preocupada mas não receptiva às orientações dos técnicos. 50. Durante o dia o AA não saía de casa e mantinha-se em casa a jogar no computador. 51. Por isso, foi aplicada em 10/10/2019 ao AA a título cautelar a medida mencionada sob o ponto 41) 52. Entretanto o jovem 12/10/2019 deu entrada no Hospital após uma tentativa de suicídio através da ingestão de fármacos da progenitora. 53. O AA encontra-se bem integrado na casa de acolhimento “Obra do …” onde foi integrado após reunião de técnicos, médicos pedopsiquiatras o que ocorreu em 4/11/2019. 54. Não se encontram reunidas as condições necessárias para que o menor possa regressar ao agregado familiar da sua progenitora. 55. Existe vínculo emocional entre o menor e a progenitora. 56. A progenitora não reúne ainda as condições necessárias para que possa acolher o menor, necessitando de supervisão e orientação, atendendo a sua situação psicológica sendo que a mesma não se mostra colaborante e recetiva às orientações das técnicas. 57. A mesma apresenta sempre uma atitude de rejeição ativa em cumprir com o plano estabelecido no âmbito dos presentes autos bem como as orientações médicas que lhe foram outrora transmitidas, bem como a continuidade de acompanhamento em consultas médicas da especialidade, não demonstrando, ainda, disponibilidade para se envolver ativamente em qualquer das propostas das técnicas que acompanham o menor no âmbito dos presentes autos. 58. O AA necessita de continuar a beneficiar de apoio médico e psicológico que lhe está a ser disponibilizado de modo a garantir a sua saúde e bem estar e também para promover a aquisição de competências funcionais essenciais à sua preparação para o exercício autónomo das suas tarefas do quotidiano, sendo essencial o mesmo ter estabilidade emocional bastante que lhe permitam gerir as suas emoções e sentimentos e perceber, como já está a assimilar aos poucos, que não se pode isolar da sociedade, devendo promover laços de convívio com amigos e colegas. 59. O AA mostra-se um jovem mais maduro e não obstante de ter demonstrado o desejo de voltar a viver com a sua mãe precisa de melhorar o seu modo de estar e ser. 60. Apesar do empenho dos técnicos que têm acompanhado este agregado familiar ao longo deste tempo, a resistência da progenitora à intervenção protetiva é muito relevante, não aceitando as orientações dos técnicos e não fazendo um acompanhamento médico adequado e isolando-se, também da intervenção técnica. 61. Sendo que conforme se refere a fls. 2157 dos autos: “ apesar da evolução positiva que o AA tem exibido em termos comportamentais a nível do seu discurso (…) pode-se inferir que ainda detém uma imagem idealizada da figura materna, assim como ausência de distanciamento e capacidade critica relativamente ao registo materno; embora sejam referidos progressos em termos de autonomia funcional a mesma não parece ter (ainda) correspondência com a autonomia psicológica e a aquisição destas capacidades constitui um requisito essencial para o seu desenvolvimento normativo.” 62. Não podem recair apenas sobre o AA as responsabilidades para o sucesso desta intervenção, que depende muito da colaboração da sua progenitora, o que não tem ocorrido, sendo que tem o mesmo que ser protegido face às pressões, sugestões maternas e que possam pôr causa o seu bem estar emocional e constituir um retrocesso no seu percurso de vida que agora está a estabilizar. 63. Antes da declaração do estado de emergência decorrente do surto pandémico que assola o nosso país, o AA mantinha-se assíduo às atividades letivas e tinha prosseguido com acompanhamento médico regular e já praticava uma atividade desportiva. 64. O menor tentou o suicídio após ter tomado conhecimento pela progenitora de que iria ser acolhido em meio residencial. 65. Desde o surto pandémico que assola o nosso país o AA deixou de frequentar a escola e deixou de ir a consultas de especialidade. 66. Consta dos autos a folhas 2119 que o menor tem um “Histórico de comportamentos auto lesivos, arranhões e cortes e ideação suicida, e tal não é de agora já vem do tempo da sua anterior institucionalização”. 67. Encontra-se junto aos autos a folhas 1569 informação elaborada pelo psicólogo clínico Dr. II datado de 25/08/2017 e que aqui se dá por reproduzido. O DIREITO Deve começar-se por dizer que não é fácil ao tribunal – a qualquer tribunal – apreciar casos como o presente, envolvendo menores. Por um lado, a consciência de que a decisão terá repercussões directas e inelutáveis na vida e no bem-estar de uma pessoa humana numa fase crucial do seu crescimento aumenta o sentido de responsabilidade do julgador. Por outro lado, a natureza especial dos interesses em causa torna insuficiente ou mesmo desadequada a aplicação dos típicos raciocínios jurídicos, lógico-subsuntivos, e isso perturba a impressão de segurança associada ao processo de decisão. As dificuldades agravam-se quando é reclamada a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça. A distância relativamente aos pressupostos de facto, primeiro, e as restrições inerentes ao recurso de revista, depois – a regra de que o Supremo Tribunal apenas aprecia questões de direito ou está inibido de apreciar a matéria de facto, salvo em casos excepcionais (cfr. artigos 674.º, n.º 3, e 683.º, n.º 3, do CPC)[3] –, tornam a tarefa de decidir estes casos particularmente penosa para o julgador. Acresce que, como se diz no Acórdão da Formação, o presente recurso se caracteriza por algum “laconismo” e por alguma “imprecisão”, não enunciando a recorrente propriamente uma questão com relevo jurídico e limitando-se a invocar violação ou erro na aplicação de certas normas e sem sequer indicar o sentido com que, no seu entender, as normas que constituem fundamento jurídico da decisão deviam ter sido interpretadas e aplicadas, ou seja, sem observar, em rigor, a exigência do artigo 639.º, n.º 2, al. b), do CPC. Retirando as devidas consequências destes dados, significa isto, no mínimo, que nem todas as pretensões recursórias poderão ser apreciadas. Não poderão ser apreciadas, designadamente, as alegações de que “[s]ão bem antigos e longínquos, desproporcionados e desatualizados os factos dados como provados da sentença que se recorre (…)” (cfr. conclusões II e IX), de que “[a] realidade do menor AA e da mãe do menor hoje em fins de abril de 2020 são muito diferentes das de há dez anos atras ou há cinco anos atrás o sequer do ano passado” (cfr. conclusão VIII), de que “[o]s fundamentos motivacionais da sentença de que se recorre são antigos e não oportunos, não são atuais (…)” (cfr. conclusão XII) ou de que “[é] preciso que se prove que tal é a única solução possível, que não existe hoje outra ou outras actuais e frescas com fundamentos actuais e frescos” (cfr. conclusão XVI). Tudo quanto compete a este Supremo Tribunal é, tão-somente, verificar se, ao decidir a aplicação da medida de promoção e de protecção, nomeadamente de acolhimento residencial do menor, AA, em detrimento de outras medidas, tendentes a assegurar o regresso ao meio natural de vida, o Tribunal recorrido interpretou e aplicou correctamente as disposições legais aplicáveis ou, pelo contrário, incorreu na sua violação. Veja-se, então. A decisão do Acórdão recorrido foi – recorde-se – a de confirmar a sentença, em que se decidiu: a) “aplicar ao menor AA a medida de acolhimento residencial pelo período de um ano, com revisão trimestral, de acordo com o plano de execução junto aos autos pelo EMAT a 24/01/2020 e elaborado pela Casa de Acolhimento a 20/01/2020”; b) “autoriza[r] as visitas e contactos entre progenitora e menor AA na medida em que, após o levantamento do estado de emergência, a casa de acolhimento em articulação com a pedopsiquiatra do menor, Drª DD, assim o entenda”; c) “a presente medida será acompanhada pela técnica da Segurança Social, na qualidade de gestora do processo naquela entidade relativamente ao menor”; e d) “a medida aplicada tem a duração de um ano e será revista decorrido o período de três meses”. A decisão do Tribunal recorrido está fundamentada nos seguintes termos: Reproduz-se ainda por adquirir particular importância a respectiva fundamentação: “Resume-se este recurso, como vimos, à questão de saber se, em vez do acolhimento residencial decretado na sentença recorrida, devem ser adotadas outras medidas tendentes à permanência do menor, AA, no seu meio natural de vida. Isto porque a sua mãe, a ora Apelante, pretende essa solução por ser aquela que, a seu ver, melhor se adequa aos interesses daquele seu filho e às normas legais que regem esta matéria. Ora, o que deve dizer-se, antes de mais, é que seja qual for o projeto de vida que venha a ser decidido para o futuro deste menor, nunca esse plano pode, neste momento, partir de outros pressupostos de facto que não sejam aqueles que foram julgados provados. Os testemunhos e opiniões técnicas produzidos nos autos são, todos eles (e, portanto, também aqueles que são referidos pela Apelante), merecedores de atenção, mas nunca podem, só por si, determinar uma solução que contrarie a factualidade que foi julgada provada. Até porque essa factualidade não foi impugnada em conformidade com as exigências legais (artigo 640.º, n.ºs 1 e 2, al. a), do CPC) e, por conseguinte, é ela que delimita a aplicação do direito. Ora, no contexto desses factos – podemos adiantá-lo desde já – entendemos que a instância recorrida decidiu acertadamente. Não está em causa que, no âmbito do regime jurídico de promoção dos direitos e proteção das crianças e jovens em perigo, não deva dar-se, por regra, prevalência à família. O artigo 4.º, al. h), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP)[4], é bem claro a este propósito quando define esse princípio: “na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável”. Mas este princípio não é incompatível com outro que se define no mesmo normativo [al. a)] e que até se lhe sobrepõe. Isto é, o princípio de que, nesse âmbito, toda a intervenção social do Estado e da comunidade em geral deve ser orientada pelo interesse do menor. Interesse num desenvolvimento integral, sadio e harmonioso[5] seu desenvolvimento físico, mental, espiritual, moral e social”[6]. É esse o principal escopo nesta matéria. E, assim, sempre que esse interesse seja posto em causa, designadamente “quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de ação ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo”, deve ser desencadeada a dita intervenção (artigo 3.º, n.º 1, da LPCJP). Intervenção que, no limite, pode passar pela retirada do menor do seu meio natural de vida, seja através de acolhimento residencial, seja mediante a confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção. Ponto é que qualquer uma destas medidas seja proporcional e adequada à salvaguarda dos interesses atuais do menor, afastando-o do perigo em que se encontra e proporcionando-lhe as condições que permitam proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral (artigos 4.º, al. e), 34.º, als. a) e b) e 35.º, n.º 1, als. f) e g), da LPCJP). Mas, reunidas essas condições, a referida intervenção deve ser inequívoca e rápida. Ora o que verificamos no caso presente é que essa intervenção, neste momento, se peca é por tardia e até por ter sido inoportunamente interrompida. Com efeito, o que verificamos, através dos factos provados, é que a Apelante desde cedo se revelou incapaz de desempenhar as suas funções parentais tal como a lei e o interesse do filho ora em causa exigiam e exigem. Designadamente, promovendo o seu desenvolvimento físico, intelectual e moral (artigo 1885.º, n.º1, do Código Civil). Assim, não obstante o AA tivesse nascido no dia …/02/2005, logo em Janeiro de 2008, a mãe do menor reportou à CPCJ da … a incapacidade de lhe impor regras e limites. E, nessa sequência, este menor, no dia 22/02/2008, foi acolhido na “Casa …”, onde permaneceu até ao dia 27/07/2009. Durante este período a mãe do menor visitava-o e parecia que a sua situação psiquiátrica tinha evoluído favoravelmente, razão pela qual a medida de acolhimento institucional foi substituída pelo regresso ao meio natural, junto da progenitora. Esta experiência, no entanto, foi desastrosa. O menor ia para a escola sem tomar o pequeno almoço, faltava as consultas de pedopsiquiatria e havia a suspeita de ficar sozinho em casa. Até que a ora Apelante pediu, de novo ajuda às Técnicas da CPCJ, já que o filho se recusava a ir para o infantário. Isto, além de, uma vez aí, agredir verbal e fisicamente colegas e funcionários, atirando objetos ao chão e gritando sempre que recebia ordens ou era contrariado. O que foi diagnosticado na altura como resultado da personalidade do menor e da parentalidade que era exercida pela sua mãe. Proposto um novo acolhimento institucional, a mãe não deu o seu consentimento, o que levou à abertura da fase judicial do processo de promoção e proteção, no dia 06/06/2011. Até que, por acordo, no dia 02/11/2011, foi aplicada ao menor, a medida de apoio junto de outro familiar, ou seja, a tia materna, FF. Mas, mais uma vez, sem sucesso. A ora Apelante visitava-o e passou a interferir na vida da irmã, tendo acabado por conseguir que o filho fosse consigo para o seu lar, em Agosto de 2012, sem o conhecimento ou autorização do Tribunal. Só que, nesse mesmo mês, começaram a surgir, de novo, os problemas com o menor. No dia 16/08/2012, a progenitora compareceu no Serviço da Segurança Social de …, dizendo que o filho tinha riscado o carro e atirado uma pedra, estando a necessitar de uma avaliação psiquiátrica urgente. Assim, a favor do dito menor foi novamente aplicada a medida de acolhimento residencial, tendo ficado acolhido no “…”, onde permaneceu, desde Agosto de 2012 ate ao dia 19/08/2015; Nessa última data, ou seja, passados dois anos do seu acolhimento residencial, o menor estava cada vez mais integrado no contexto institucional, reportando-se cada vez menos a sua família de origem e as memorias do passado e quando foi proposta a medida de confiança do menor a instituição, com vista a futura adoção, a tia materna mostrou-se disponível para receber o sobrinho, tendo sido aplicada a medida de apoio junto de outro familiar, no dia 19/08/2015; Sucede que, no dia 28/12/2015, o AA, mordeu a tia, recusou-se a acompanhá-la a uma consulta de pedopsiquiatria e fugiu para casa da mãe depois de vir a manifestar problemas de comportamento, rejeitando a escola, de onde fugia, rasgando os livros. O que levou esta tia a recusar-se a continuar com o sobrinho em sua casa e, nessa sequência, nova institucionalização foi determinada. Durante essa institucionalização alguns progressos foram conseguidos no que diz respeito ao bem estar e aproveitamento escolar do menor. Mas, novamente, em 08/01/2018, nova experiência de regresso ao meio natural de vida do menor foi tentada. Foi decidido, na verdade, fazê-lo regressar para junto da ora Apelante. No entanto, também desta vez, sem qualquer êxito. O menor regrediu nos aspetos em que tinha progredido e deixou de comparecer à escola, sendo que no ano letivo 2018/2019 ficou retido. Mais: abandonou o acompanhamento médico e recusou-se a efetuar análises clínicas prescritas pelo médico; deixou também de frequentar qualquer atividade desportiva e cada vez se isolava mais, não querendo sair de casa, onde permanecia a jogar no computador. Por sua vez, a Apelante mostrava-se incapaz de lidar com os comportamentos do jovem, não obstante se mostrar uma progenitora presente e preocupada, mas não recetiva às orientações dos técnicos. Até que, perante este cenário de vida, foi aplicada ao menor, no dia 10/10/2019, a título cautelar, a medida de acolhimento residencial. A Apelante deu disso conhecimento ao menor. E antes que a institucionalização se desse o menor tentou suicidar-se. Concretizada a institucionalização, sabemos hoje, ainda pelos factos provados, que o menor se encontra melhor. Necessita, ainda assim, de continuar a beneficiar de apoio médico e psicológico que lhe está a ser disponibilizado de modo a garantir a sua saúde e bem estar e também para promover a aquisição de competências funcionais essenciais à sua preparação para o exercício autónomo das suas tarefas do quotidiano, sendo essencial que o mesmo tenha estabilidade emocional bastante que lhe permitam gerir as suas emoções e sentimentos e perceber, como já está a assimilar aos poucos, que não se pode isolar da sociedade, devendo promover laços de convívio com amigos e colegas. Mostra-se “um jovem mais maduro e não obstante de ter demonstrado o desejo de voltar a viver com a sua mãe precisa de melhorar o seu modo de estar e ser”. Por sua vez, a Apelante “não reúne ainda as condições necessárias para que possa acolher o menor, necessitando de supervisão e orientação, atendendo a sua situação psicológica sendo que a mesma não se mostra colaborante e recetiva às orientações das técnicas”. Mais: “apresenta sempre uma atitude de rejeição ativa em cumprir com o plano estabelecido no âmbito dos presentes autos bem como as orientações médicas que lhe foram outrora transmitidas, bem como a continuidade de acompanhamento em consultas médicas da especialidade, não demonstrando, ainda, disponibilidade para se envolver ativamente em qualquer das propostas das técnicas que acompanham o menor no âmbito dos presentes autos”. Ora, perante tudo o que acaba de ser dito e consta dos factos provados, outra não podia ser a solução senão a institucionalização deste menor. Como se refere a fls. 2157, o menor “detém uma imagem idealizada da figura materna, assim como ausência de distanciamento e capacidade critica relativamente ao registo materno; embora sejam referidos progressos em termos de autonomia funcional a mesma não parece ter (ainda) correspondência com a autonomia psicológica e a aquisição destas capacidades constitui um requisito essencial para o seu desenvolvimento normativo”. Ou seja, não estão reunidas as condições para o regresso do menor ao seu meio natural de vida. Daí que, em suma, outra alternativa não reste, nesta altura, que não seja a institucionalização do menor. Será pelo período de um ano, com revisão trimestral e sempre assegurando as visitas da Apelante, pois que o objetivo não é retirar-lhe o filho, mas, antes e só, protegê-lo e capacitá-lo para o exercício dos seus direitos e deveres, promovendo, o mais possível, as suas competências pessoais e escolares. A sentença recorrida, pois, porque assim decidiu, deve ser confirmada, improcedendo na íntegra o presente recurso”. Aprecie-se se o Tribunal recorrido podia decidir como decidiu, isto é, no sentido da manutenção da medida de promoção e protecção decidida pelo Tribunal de 1.ª instância. O artigo 3.º, n.º 1, da LPCJ, com a epígrafe “legitimidade da intervenção”, determina que “[a] intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de acção ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo”. Ora, como o Tribunal demonstrou, é indiscutível que se verifica o pressuposto fundamental de uma intervenção deste tipo: a existência de perigo para a segurança, a saúde, a formação, a educação e o desenvolvimento do AA. Veja-se, desde logo, o que resulta dos factos provados quanto ao, ainda curto mas já muito conturbado, período da vida do jovem AA: - CC, a mãe do AA, desde cedo se revelou incapaz de desempenhar as funções parentais, tendo reportado à CPCJ da …, logo em 2008, portanto, quando o AA era ainda muito pequeno (cerca de três anos), a incapacidade de lhe impor regras e limites (cfr. facto 3), na sequência do que o AA foi acolhido na “Casa …” (cfr. facto 5); - em 2009 (pouco mais de um ano), a medida de acolhimento institucional foi substituída pelo regresso ao meio natural junto da mãe e, em 2010, o processo foi arquivado, parecendo ter sido superada a situação de perigo (cfr. factos 6 e 7), mas tal não se confirmou: o AA ia para a escola sem tomar o pequeno almoço, faltava as consultas de pedopsiquiatria e havia a suspeita de ficar sozinho em casa (cfr. facto 8); - em 2011 (apenas alguns meses depois), a mãe pediu novamente ajuda às técnicas da CPCJ (cfr. facto 9), já que o filho se recusava a ir para o infantário, agredia verbal e fisicamente colegas e funcionários, atirando objetos ao chão e gritando sempre que recebia ordens ou era contrariado (cfr. facto 10); - identificou-se como causa directa do comportamento genericamente agressivo e intolerante do AA, na altura, a personalidade do menor e a parentalidade que era exercida pela sua mãe (cfr. facto 11), sendo que a esta foi diagnosticada uma desordem de personalidade com potencial impacto negativo junto dos filhos (cfr. facto 12); - em 2011, foi aberta a fase judicial do processo de promoção e protecção, tendo, por acordo, acabado por ser aplicada ao AA, a medida de apoio junto de outro familiar (a tia materna) (cfr. factos 13 e 14), o que tão-pouco correu bem (cfr. factos 16 e 17); - em 2012, foi novamente aplicada ao AA a medida de acolhimento residencial no “…”, onde permaneceu até 2015 (cfr. facto 18), altura em que, revelando este maior integração no contexto institucional lhe foi aplicada a medida de apoio junto da tia materna (cfr. facto 19); - poucos meses depois, tendo AA mordido a tia e adoptado, mais uma vez, comportamento agressivos, a tia recusou-se a continuar com o sobrinho em sua casa (cfr. factos 20 e 21) e, na sequência disto, nova institucionalização foi determinada, ainda no ano de 2015, no “…” (cfr. facto 22), onde foram conseguidos alguns progressos no que respeita ao bem estar e aproveitamento escolar do AA (cfr. factos 25, 26, 27 e 28): - em 2018, foi tentada uma nova experiência de regresso do AA ao meio natural de vida junto da mãe (cfr. facto 45), mas, após algum tempo, também ela se frustrou: o AA regrediu nos aspectos em que tinha progredido; deixou de comparecer à escola; abandonou o acompanhamento médico; deixou de frequentar qualquer actividade desportiva e cada vez se isolava mais, não querendo sair de casa, onde permanecia a jogar no computador; por sua vez, a mãe mostrava-se incapaz de lidar com os comportamentos do filho (cfr. factos 46, 47, 48, 49 e 50); - em 2019, foi decidida a substituição a título cautelar da medida de apoio junto da mãe pela medida de acolhimento residencial (cfr. factos 41 e 51); - antes desta institucionalização e ao saber dela, o AA tentou suicidar-se (cfr. factos 43, 52 e 64); - o AA tem um “histórico de comportamentos auto lesivos, arranhões e cortes e ideação suicida, e tal não é de agora já vem do tempo da sua anterior institucionalização” (cfr. facto 66). Quanto à situação actual do AA, a matéria de facto demonstra que, uma vez concretizada, em 2019, a institucionalização na casa de acolhimento “Obra do …”, o AA se encontra aí bem integrado (cfr. facto 53) e, continuando embora a necessitar do apoio médico e psicológico que lhe está a ser disponibilizado, começa a compreender que não se pode isolar da sociedade e que deve promover laços de convívio com amigos e colegas, mostrando-se, enfim, um jovem mais maduro, assíduo às atividades lectivas e praticante de uma atividade desportiva (cfr. factos 58, 59 e 63). Em contrapartida, no que toca à situação actual de CC e às condições para um possível regresso do AA para junto da mãe, apurou-se que, atendendo à sua situação psicológica, CC ainda não reúne as condições necessárias para acolher o filho, necessitando de supervisão e orientação, dado que não se mostra colaborante e receptiva às orientações das técnicas (cfr. factos 56, 57 e 60), não se encontrando, em suma, reunidas as condições necessárias para que o menor possa regressar ao agregado familiar da sua mãe (cfr. facto 54) e sendo, aliás, necessário incutir no AA alguma autonomia relativamente à figura materna e protegê-lo de eventuais pressões da mãe (cfr. factos 61 e 62). Ante a situação patenteada na factualidade descrita, tornava-se imperativo, com efeito, aplicar uma medida de promoção e protecção, com a finalidade de afastar o perigo em que o AA se encontrava e proporcionar-lhe as condições que permitissem proteger e promover a sua segurança, saúde, formação, educação, bem-estar e desenvolvimento integral, como manda o artigo 34.º, nas als. a) e b), da LPCJ. A medida concretamente aplicada pelo Tribunal foi a do acolhimento residencial. A recorrente insurge-se contra a aplicação desta medida, sustentando, no essencial, que “a intervenção de medidas restritivas no seio da família deve ser a necessária e adequada à situação concreta de perigo no momento em que a decisão é tomada em obediência aos princípios da proporcionalidade e actualidade” (cfr. conclusão XIII) e que são “adequadas e pertinentes medidas de promoção e protecção […] em meio natural de vida e não em instituição ou acolhimento” (cfr. conclusão XVIII). O artigo 4.º da LPCJ, que elenca os “princípios orientadores”, estabelece que: “[a] intervenção para a promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios: a) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto (…); e) Proporcionalidade e actualidade - a intervenção deve ser a necessária e a adequada à situação de perigo em que a criança ou o jovem se encontram no momento em que a decisão é tomada e só pode interferir na sua vida e na da sua família na medida do que for estritamente necessário a essa finalidade (…); h) Prevalência da família - na promoção dos direitos e na proteção da criança e do jovem deve ser dada prevalência às medidas que os integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável”. De uma leitura articulada das normas resulta o seguinte: por mais desejável que seja a prevalência da família [cfr. artigo 4.º, al. h)], o mais importante, nestas situações, é o interesse superior da criança ou do jovem [cfr. artigo 4.º, al. a)], devendo, em qualquer caso, a medida a aplicar ser a necessária e a adequada a salvaguardar a criança ou o jovem do perigo em que se encontra no momento da aplicação da medida [cfr. artigo 4.º, al. e)]. Provados que estavam o perigo que consistia para o AA regressar ao meio natural de vida bem como a frustração das tentativas de aplicação de medidas de apoio junto da mãe e da tia materna, tornava-se necessária a aplicação de uma medida distinta ou alternativa. A medida aplicada, de acolhimento residencial, está expressamente prevista no artigo 35.º, n.º 1, al. f), da LPCJ. Como se consigna no artigo 49.º, n.ºs 1 e 2, da LPCJ, consiste ela “na colocação da criança ou jovem aos cuidados de uma entidade que disponha de instalações, equipamento de acolhimento e recursos humanos permanentes, devidamente dimensionados e habilitados, que lhes garantam os cuidados adequados” e tem “como finalidade contribuir para a criação de condições que garantam a adequada satisfação de necessidades físicas, psíquicas, emocionais e sociais das crianças e jovens e o efetivo exercício dos seus direitos, favorecendo a sua integração em contexto sociofamiliar seguro e promovendo a sua educação, bem-estar e desenvolvimento integral”. É certo que existe um vínculo emocional entre mãe e filho (cfr. facto 55) e o AA demonstrou o desejo de viver com a sua mãe (cfr. facto 59, 1.ª parte) e que esta medida acarreta algum sacrifício para o interesse da família, impedindo o regresso imediato do AA para junto da mãe. Mas a verdade é que isto não pode acontecer antes de o AA adquirir a estabilidade emocional bastante que lhe permita gerir as suas emoções e sentimentos e melhorar o seu modo de ser e de estar (cfr., entre outros, factos 58 e 59, 2.ª parte). De qualquer forma, é visível que o rigor da medida (principal) do acolhimento residencial é atenuado através da previsão de outras medidas. Estão, desde logo, autorizadas as visitas e os contactos entre o AA e a sua mãe. A execução da medida será acompanhada pela técnica da Segurança Social. E, muito importante, a medida tem a duração de um ano e é susceptível de ser revista ao fim de três meses. Não há dúvidas, pois, que a decisão do Tribunal recorrido respeita os princípios da proporcionalidade (necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito) e da actualidade impostos no artigo 4.º, al. e), da LPCJ. A recorrente imputa a esta decisão, em particular, a violação de determinadas normas, alegando, mais precisamente, que: - “[o] Acórdão recorrido que negou provimento ao presente recurso e, consequentemente, confirmou- a decisão recorrida, aplicou erradamente as normas relativas à Lei nº 147/99 de 1 de Setembro artº. 34º, artº 35º nº 1 a e nº 2, artº 39º artº 41º, artº 45º, artº 60 (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo,) ao disposto no artº. 205º, nº1 da CRP, aº13º e 38º da Constituição da Republica Portuguesa e artº 67º,68º.69ºe 70º da lei constitucional nº1/2004, e demais legislação aplicável.” (cfr. conclusão I); ou, numa fórmula apenas ligeiramente diferente[7], - “[f]oram violadas as normas do disposto nos artº. 34º,artº35º nº 1 a e nº 2, artº 39º artº 41º, artº 45º, artº 60ºda lei nº 147/99, disposto no artº. 205º, nº1 da CRP, aº13º e 38º da Constituição da Republica Portuguesa e artº 67º,68º.69ºe 70º da lei constitucional nº1/2004 e demais legislação e interpretado erradamente o disposto nos artigos 34º, 35º e 52º da Lei nº 147/99 de 1 de Setembro (Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo) além de outras interpretações e imprecisões legais” (cfr. conclusão XVIII). Antes de mais, há que introduzir algumas precisões, para adequar as normas indicadas àquela que, segundo se entende, é a pretensão da recorrente. Por um lado, atendendo a que o artigo 38.º da CRP respeita à liberdade de imprensa e dos meios de comunicação social e que, nas suas alegações, a recorrente se refere ao artigo 36.º da CRP, presume-se que só por lapso se referiu, nas conclusões, àquela norma e que pretende, sim, referir-se a esta última. Por outro lado, atendendo a que a Lei Constitucional referida – a Lei Constitucional n.º 1/2004, de 24 de Julho – procedeu à 6.ª alteração da CRP e compreende apenas 47 artigos, presume-se que as normas a que a recorrente pretende referir-se são, de facto, as dos artigos 67.º, 68.º, 69.º e 70.º da CRP. Em conclusão, cumpre apreciar se o Tribunal a quo incorreu em violação dos artigos 34.º, 35.º, n.ºs 1 e 2, 39.º, 41.º, 45.º, 52.º e 60.º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, aprovada pela Lei n.º 147/99, de 1 de Setembro (doravante: LPCJ) e dos artigos 13.º, 36.º e 205.º, n.º 1, da CRP, bem como dos artigos 67.º, 68.º, 69.º e 70.º da CRP. Já se demonstrou que não há violação do disposto nos artigos 34.º e 35.º da LPCJ[8], tendo, pelo contrário, os seus requisitos sido plenamente observados. Quanto aos artigos 39.º, 41.º, 45.º e 60.º da LPCJ, eles respeitam todos a medidas de promoção e protecção no meio natural de vida, versando, respectivamente, apoio junto dos pais, educação parental, apoio para a autonomia de vida, duração das medidas no meio natural de vida. O Tribunal recorrido não fez menção a elas. Nem tinha de o fazer. Não são medidas deste tipo que estão em causa e que foram decididas, logo as normas não são aplicáveis. Por último, o artigo 52.º da LPCJ prende-se com a natureza da instituição de acolhimento e estabelece que as instituições de acolhimento podem ser públicas ou cooperativas, sociais ou privadas com acordo de cooperação com o Estado. Não se vislumbra em que é a decisão do Tribunal recorrido é susceptível de contender com este preceito. Passando agora ao grupo de normas constitucionais cuja violação se invoca, veja-se, antes de mais, o artigo 13.º da CRP, respeitante ao por demais conhecido princípio geral da igualdade. Não dizendo a recorrente como este princípio teria sido violado só pode adivinhar-se que pretende dizer que noutras situações envolvendo menores foram decididas medidas distintas, mas não as indica. Diga-se, de todo o modo, que sempre seria difícil encontrar uma situação deste tipo, isto é, respeitante a menores, que fosse exactamente igual. Ora, o princípio da igualdade apenas impõe o tratamento igual para situações iguais ou, dito de outro modo, a desigualdade de tratamento não viola o princípio da igualdade quando existe uma desigualdade de facto. Por seu turno, o artigo 36.º da CRP, integrado no capítulo dos direitos, liberdades e garantias pessoais, fixa regras sobre família, casamento e filiação. Não obstante a recorrente não o precisar, calcula-se que a sua atenção se centre, em especial, no disposto nos n.ºs 5 e 6. Asseguram estes preceitos, respectivamente, que os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos e que os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial. E manifesto que a decisão encontrada é compatível com estas normas. Quanto ao artigo 205.º, n.º 1, da CRP, que determina que as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei., é indiscutível que o Tribunal recorrido cumpriu o requisito da fundamentação imposto, apresentando, incisiva e clara os pressupostos de facto e os fundamentos normativos em que se baseou para decidir o que decidiu. Finalmente, no que toca aos artigos 67.º. 68.º. 69.º e 70.º da CRP, respeitam todos a direitos e deveres sociais e estabelecem que são valores sociais, dignos de protecção da sociedade e do Estado, respectivamente, a família, a paternidade e a maternidade, a infância e a juventude. Aquilo que resulta destas normas não é de forma alguma posto em causa pela decisão recorrida. Tudo analisado, conclui-se que nada há a censurar ao Acórdão recorrido. *** III. DECISÃO
Pelo exposto, nega-se provimento à revista e confirma-se o Acórdão recorrido.
* Custas pela recorrente.
* Catarina Serra (Relatora) Bernardo Domingos Rijo Ferreira
Nos termos do artigo 15.º-A do DL n.º 10-A/2020, de 13.03, aditado pelo DL n.º 20/2020, de 1.05, declaro que o presente Acórdão tem o voto de conformidade dos restantes Exmos. Senhores Juízes Conselheiros que compõem este Colectivo. __________ |