Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | BRAVO SERRA | ||
Descritores: | ALEGAÇÕES DE RECURSO CONTRA-ALEGAÇÕES DE RECURSO MATÉRIA DE FACTO ANULAÇÃO DE ACÓRDÃO BAIXA DO PROCESSO AO TRIBUNAL RECORRIDO | ||
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Nº do Documento: | SJ200811260024714 | ||
Data do Acordão: | 11/26/2008 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | ANULADA A DECISÃO | ||
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Sumário : | I – De harmonia com o que se prescreve no nº 2 do artº 684º-A do Código de Processo Civil, pode o recorrido, na respectiva alegação e a título subsidiário, impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas. II – Em acção de impugnação de despedimento, incorre em nulidade, por omissão de pronúncia [artigo 668º, nº 1, alínea d), 1ª parte, do referido diploma legal], o acórdão da Relação que não se pronuncia sobre a impugnação fáctica ocorrida numa situação em que, tendo o autor, no recurso de apelação, suscitado a questão de a sentença apelada se não poder manter pelo facto de da matéria provada se extrair tão-somente factos que foram dados por apurados no processo disciplinar, a ré, nas contra-alegações, ter suscitado a questão de que aquilo que constava de determinados factos tidos por apurados na sentença não corresponder à realidade, pois o que se teria demonstrado seria a prova, em julgamento, desses factos (e não apenas no processo disciplinar), assim impugnando essa matéria. III – Nesta circunstância, postando-se uma situação inserível na ocorrência de uma nulidade fundada na circunstância de a decisão recorrida ter deixado de se pronunciar sobre questão que devesse apreciar, impõe-se a baixa do Processo à Relação, a fim de se fazer a reforma da decisão anulada (nº 2 do artigo 732º do Código de Processo Civil). | ||
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Decisão Texto Integral: | I 1. AA intentou, em 3 de Abril de 2003, pelo Tribunal do Trabalho de Lisboa e contra BB, acção de processo comum, pedindo que fosse declarada improcedente a justa causa de despedimento de que ele, autor, foi alvo, e que a ré fosse condenada a proceder à sua reintegração, sem prejuízo da sua antiguidade e categoria ou, em alternativa, pagar-lhe a indemnização por despedimento no montante de € 9.696,66, todas as remunerações desde o despedimento até à sua reintegração ou até à decisão final, € 62.401,04, a título de trabalho suplementar prestado e não pago, e € 19.540,16, a título de indemnização por não ter beneficiado de descansos compensatórios, e juros. Alegou, em síntese, que: – – foi admitido pela ré em 1 de Dezembro de 1998, a fim de, sob as suas ordens e instruções, exercer a actividade de técnico de construção civil, tendo-lhe sido instaurado processo disciplinar em Novembro de 2002, no qual lhe foram imputados actos e intenções criminosas não correspondentes à verdade, vindo tal processo a culminar com a decisão de despedimento; – nesse processo disciplinar o autor foi suspenso preventivamente sem que lhe fosse efectuada a comunicação a que se refere o nº 1 do artº 10º do Decreto-Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro; – aquando da admissão, ficou estipulado que o horário de trabalho do autor era de quarenta horas semanais, vindo ele, após o período experimental, a beneficiar de isenção de horário, embora entrando diariamente às 8 horas e nunca saindo antes das 17 horas, tendo, na sequência de ordens da ré, prestado um número de horas semanais muito superior às quarenta horas, e prestado trabalho em dias de descanso, nunca lhe tendo sido pagas essas horas e, bem assim, o equivalente ao descanso compensatório remunerado (165 horas em 1998, sendo 30 prestadas em dias de descanso semanal, 1.146 horas em 1999, sendo 292 prestadas em dias de descanso semanal, 1.287 horas em 2000, sendo 367 prestadas em dias de descanso semanal, 628 horas em 2001, sendo 116 prestadas em dias de descanso semanal, 421 horas em 2002, sendo 113 prestadas em dias de descanso semanal); – em consequência do despedimento que sofreu, o autor ficou com graves problemas de saúde, sofrendo de insónias, desequilíbrios, entrando em profunda depressão, tendo tido necessidade de recorrer a apoio médico e a medicamentos, não se encontrando em condições físicas e psicológicas para voltar trabalhar, o que motivou que se visse forçado a vender a viatura automóvel que possuía e que o seu filho tivesse, por dificuldades económicas advenientes da circunstância de o autor se encontrar em tal estado, deixado de estudar. Contestou a ré, que sustentou ter ocorrido justa causa de despedimento e que não era devida remuneração pelo trabalho suplementar invocado pelo autor, já que não só ele desfrutava de isenção de horário, como os dias de descanso semanal, quer obrigatórios, quer complementares, nem sempre podiam coincidir com os fins de semana ou serem estabelecidos em dias fixos, tendo-lhe sido dadas as «folgas» correspondentes àqueles dias de descanso e paga uma gratificação anual (igual, em 1999, à retribuição de dois meses e meio, igual, em 2000, à retribuição de um mês e meio, e igual, em 2002, à retribuição de dois meses). A dado passo, veio o autor ampliar o pedido, solicitando a condenação da ré a pagar-lhe as despesas médicas efectuadas desde o seu despedimento até à data em que formulou a ampliação do pedido, despesas essas que ascendiam a € 1.495, a pagar à Segurança Social os descontos devidos desde a data do despedimento até aos 65 anos de idade do autor, no quantitativo de € 59.109,80, e a quantia de € 40.000, a título de indemnização por danos não patrimoniais. A esta pretensão opôs-se a ré, aduzindo que a requerida ampliação não poderia ser admitida, pois que ela não constituía um desenvolvimento ou consequência do pedido inicial, estando prescritos os créditos reclamados a esse título. Por despacho lavrado em 19 de Outubro de 2004, foi indeferida a ampliação do pedido, o que motivou o autor a, do assim decidido, agravar para o Tribunal da Relação de Lisboa. Prosseguindo os autos seus termos, veio, em 13 de Julho de 2005, a ser proferida sentença que, julgando improcedente a acção, absolveu a ré dos pedidos contra ela deduzidos. Inconformado, apelou o autor, tendo igualmente arguido nulidades da sentença e impugnado a matéria de facto. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 8 de Novembro de 2006, decidiu: – – negar provimento ao recurso de agravo; – não tomar conhecimento, por extemporaneidade, das arguidas nulidades da sentença; – alterar a decisão da matéria de facto, acrescentando à que foi assente pela primeira instância dois items, e dando como não provado um item; – julgar a apelação parcialmente procedente, declarando ilícito o despedimento do autor, por inexistência de justa causa, e condenando a ré a pagar-lhe a quantia global de € 125.472,99, correspondendo € 12.928,88, a título de indemnização por antiguidade, € 112.544,11, a título de retribuições vencidas desde 3 de Março de 2003 até à data do acórdão, incluindo férias e subsídios de férias e de Natal – sendo que, nesta última quantia, deveriam ser deduzidas as importâncias relativas a rendimentos de trabalho auferidos pelo autor em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento – e juros, devidos na forma que no aresto foi discriminada. 2. Inconformada, pediu a ré revista, solicitando, no requerimento de interposição de recurso, que: – – fosse suprida uma nulidade do acórdão revidendo, consistente em se ter ele pronunciado no sentido de que não ficou provada a matéria pela qual foi despedido o autor ou, assim se não entendendo, que os autos fossem enviados à 1ª instância, a fim de ser efectuada pronúncia sobre a falsidade da acta da sessão de julgamento ocorrida em 1 de Março de 2005 (na qual foi respondida à matéria de facto constante dos articulados), ou que o Tribunal de 2ª instância procedesse à audição dos depoimentos gravados quanto a tal matéria; – fosse anulado o acórdão por omissão de pronúncia. Reza assim o referido requerimento: – “(…) Antes, porém, e nos termos do disposto no artº 77º, nº 1 do CPT, vem arguir a nulidade do mesmo, na parte em que julgou a apelação procedente e nos termos do disposto no artº 668º, nº 1, al. d) do CPC, aplicável por força do disposto no artº 716º, nº 1 do mesmo Código. Com efeito, 1- Diz-se a fls. 448: ‘Foi perante os factos apurados no processo disciplinar e descritos sob o nº 24, que o Senhor Juiz a quo apurou a existência da justa causa ... ’ 2- Toda a gente sabe que a prova constante do Processo Disciplinar não tem relevância em Tribunal: Em Tribunal, é à entidade patronal que cabe fazer prova dos factos pelos quais procedeu ao despedimento do trabalhador – cfr. último segmento do nº 4 do artº 12º da LCCT (regime jurídico aprovado pelo Dec.Lei 64-A/89 de 27.02) – que é o aplicável aos presentes autos, uma vez que o despedimento ocorreu em 03.04.2003. 3- E a Ré, em audiência de julgamento, fez prova cabal de que os factos que foram levados às diferentes alíneas do nº 24 da matéria de facto ocorreram realmente. Para provar que no processo disciplinar foram dados como provados os factos que constam da ‘Decisão’ do mesmo PD, a Ré não necessitava de arrolar testemunhas: bastava juntar aos autos, como o fez, o Processo Disciplinar. Deste, como aliás se pode verificar da providência cautelar apensa, já consta que a Ré procedeu ao despedimento do Autor pelos factos que na Decisão refere. Mas, em sede de audiência de discussão e julgamento, a Ré provou com as testemunhas que arrolou, – o que, até, foi confirmado pelas testemunhas arroladas pelo Autor – que, na realidade, os factos ocorreram como vêm descritos no Processo Disciplinar e mais concretamente na Decisão em que aquele culminou, foram na realidade praticados pelo Autor. 4- Aliás, o Autor, nas suas alegações, não diz que não ficaram provados os factos alegados pelo Ré para o despedimento. O que diz é que ele, Autor, nunca teve intenção de se apropriar das caixas de garrafas de vinho em causa. É certo que a sentença, numa tirada infeliz, porque equívoca, diz, repetindo ‘ipsis verbis’ o despacho de fls. 320 a 322: ‘24- No processo disciplinar instaurado ao autor, foram dados como provados os seguintes factos’, e depois, refere os factos que a Ré deu como provados no P.D. e que, repita-se, ficaram provados em audiência de julgamento. 5- Trata-se de uma formulação, admite-se, infeliz. Mas a verdade é que a Ré provou em julgamento – não apenas no P.D., mas na audiência de julgamento – todos os factos que constam daquele nº 24. Basta ouvir os depoimentos das testemunhas: 5.1- CC – cassete 5 – lado A do registo nº 950 à volta nº 2368 – cfr. fls. 300 e cassete 8 – lado A, registo 191 até ao fim e cassete 9 – lado A, até ao registo 220 – cfr. fls. 304. 5.2- DD – cassete 7 e cassete 8, lado A, até ao registo 190. E até o da testemunha do Autor: 5.3- EE – cassete 5, lado A registo 2368 e cassete 5 – Lado A e Lado B até o registo 2712 – cfr. 301 6- Aliás, como se pode constatar a fls. 304, as testemunhas da Ré e, nomeadamente, a testemunha FF, pronunciaram-se longa e convincentemente sobre toda a matéria que levou ao despedimento do Autor. Como se vê, o próprio Autor requereu que as declarações prestadas no P.D. pela testemunha FF fossem juntas aos autos. Donde que o próprio Autor aceita que a testemunha em causa estava a depor sobre factos que lhe não eram favoráveis. 7- E também a sentença da 1ª Instância sempre parte do pressuposto de que o que ficou provado foi, de facto, os comportamentos em si adoptados pelo Autor que não apenas que a Ré acusou o Autor de ... Nela se diz, nomeadamente: ‘ – E, na verdade, tratou-se de um comportamento (o do Autor) que, em substância, é ofensiva das normas regulamentares da Ré ... ’ – fls. 333 – Por isso, inegavelmente, de acentuada gravidade, na medida em que, independentemente da eventual lesão de interesses patrimoniais da demandada e por virtude do carácter absoluto dos valores subjacentes ....’ – idem fls. 333 – Estamos perante situações em que a decisão de despedimento é justificada ...’ – fls. 334. - No caso presente a actuação em causa assumida pelo Autor ...’ – ‘Recusar-se a cumprir uma ordem da entidade patronal…’ – ‘ Nestes termos, tal desobediência ...’ São tudo expressões de onde decorre à evidência que o que o Mº Juiz da 1ª Instância considerou provado foram os factos em si – que foram debatidos à exaustão na audiência de julgamento – e não tão só que a Empresa Ré despediu por tais factos. 8- Assim, ao não considerar como provada em audiência de discussão e julgamento a matéria constante das diferentes alienas do nº 24, o douto Acórdão proferido não se pronunciou sobre matéria que devia apreciar, incorrendo na nulidade prevista na 1ª parte do nº 1 do artº 668º do Cód. Proc. Civil. Mas mais: 9- A douta sentença posta em crise pelo Autor, ao referir sob o nº 24 da matéria de facto que: ‘No processo disciplinar instaurado ao autor foram dados como provados os seguintes factos: (factos esses que enuncia, depois nas alienas a) a q)) repete o despacho de fls. 319 a 321, onde se lê que: Da Contestação ficaram provados os artºs. 3º, 6º, 7º a 23, 53º, 54º, 56º, 57º, 58º, 60º, 63º, 64º, 75º, 93º, 94º, 96º, 97º[,] 98º e 101º. Nos artºs. 7º a 23º da Contestação diz-se que não só os factos que se seguiam foram dados como provados no P[.]D., mas também que a Ré propunha-se prová-los nos autos, nomeadamente na audiência de discussão e julgamento. 10- Verifica agora a Ré que o que o Mº Juiz da 1ª Instância julgou como provado e que fez constar da Acta de audiência de discussão e julgamento pode ser interpretado como podendo querer significar que a Ré procedeu ao despedimento do Autor pelos factos que fez constar da Decisão Disciplinar, mas que não provou em julgamento, a realidade de tais factos, que levou aos artºs. 7º a 23° da Contestação. O que de todo em todo é falso: a Ré mau grado a expressão admite-se que infeliz – que o Mº Juiz utilizou, provou, na audiência de discussão e julgamento, como, aliás, se pode constatar da simples audição das respectivas cassetes – que o Autor praticou os factos que vêm descritos nos artºs. 7º a 23º da Contestação. 11- Na medida em que da Acta de fls. 319 a 322, se possa retirar a conclusão de que a Ré não logrou provar na audiência de julgamento os factos pelos quais despediu o Autor, então tal acta é falsa – porque não corresponde ao que de facto se passou na mesma – o que se invoca nos termos e para os efeitos do disposto no nº 2 do artº 551º-A do Cód. Proc. Civil. A Ré só agora, com a notificação do douto Acórdão, se apercebeu de que a Acta de fls. 319 podia comportar um sentido que em nada correspondia à verdade dos factos. E, por isso, está em tempo de arguir a falsidade da mesma, o que pelo presente se faz. Tanto mais que tendo vencido totalmente na 1ª Instância estava impedida de recorrer para reapreciação da matéria de facto, o que se traduz agora numa tremenda injustiça, até em ofensa do princípio da igualdade de armas. Mas, mais: 12- No articulado em que pretendeu ampliar o pedido, – a fls. 265 – o Autor vem dizer que ‘ficou com problemas graves de saúde’, de tal sorte que ‘não está em condições, nem físicas, nem psicológicas, para voltar a trabalhar, seja ao serviço da Ré, seja em qualquer outra actividade’ e pede que ‘para poder beneficiar da sua pensão de reforma, aos 65 anos, a Ré proceda ao pagamento à Segurança Social da TSU sobre as suas retribuições até essa idade’ – cfr. fls. 265, 266 e 267. E, depois, nas alegações de recurso – a fls. 294 – vem dizer que, após o despedimento, desenvolveu uma doença do foro psiquiátrico que o impedia de retomar o trabalho. E mais à frente: ‘A partir do momento em que o Autor, devido aos problemas de saúde de que passou a sofrer se vê constrangido a optar pela indemnização de antiguidade, em lugar da reintegração, por não ter condições físicas e psicológicas para retomar o seu trabalho’. Independentemente, pois, do sucesso do requerimento da ampliação do pedido, a verdade é que é o próprio Autor, que vem informar o Tribunal e a Ré – que aceitou tal declaração, – que está impedido, em virtude de doença, definitiva e absolutamente de continuar a prestar o seu trabalho à Ré. Porque tal factualidade é relevante para a decisão de mérito, de acordo com uma das soluções plausíveis da questão de direito, deve a Relação dar como provado que: – O Autor, logo após o despedimento, adoeceu ficando afectado de doença que o impossibilitava para o trabalho, e – Em 04.10.2006 – cfr. fls. 269, o Autor encontrava-se com uma doença do foro psiquiátrico que o impossibilitava absoluta e definitivamente para o trabalho até aos 65 anos de idade Tal matéria é imprescindível, nomeadamente para se apurar da eventual caducidade do contrato e do cálculo do valor das retribuições intercalares – isto a vingar a tese (o que se não aceita) da não prova da justa causa de despedimento. Por isso deve a mesma ser julgada provada. Ao nem sequer se debruçar sobre o problema, o douto Acórdão não conheceu de questão que devia apreciar, e, com isso, incorreu na nulidade prevista na al. d) – 1ª parte – do nº 1 do artº 668º do CPC. E a Ré, insiste-se, estava impedida de suscitar esta questão, uma vez que venceu integralmente a acção Nestes termos requer-se: 1- A admissão do recurso de revista para o STJ. Mas, antes 2- Que seja suprida a nulidade que decorre do facto de o douto Acórdão se pronunciar no sentido de que não ficou provado nos autos a matéria pela qual a Ré despediu o Autor e constante dos nºs. 7º a 23º da Contestação; Se assim se não entender, então, 3- Serem os autos enviados à 1ª Instância para que o Mº Juiz se pronuncie sobre a falsidade da acta de audiência de discussão do dia 01 de Março, – a de fls. 320 a 322 dos autos – esclarecendo se, de facto, na audiência de julgamento ficaram provados os factos constantes dos artºs. 7º a 23º da Contestação, ou se, pelo contrário, apenas ficou provado que a Ré despediu o Autor pelos factos que constam da decisão final por ela proferida no Processo Disciplinar. Ou, então, 4- Que esse Tribunal proceda à audição das cassetes, em que foram gravados os depoimentos das testemunhas mormente daquelas que acima se indicaram e, suprindo a nulidade, julgue em conformidade, reformulando o douto Acórdão. 5- Que, de qualquer modo, seja anulado o douto Acórdão por omissão de pronúncia, pois encontra-se provado que: 1- O Autor, logo após o despedimento, adoeceu ficando afectado de doença que o impossibilitou para o trabalho; e 2- Em 04.10.2006 – cfr. f1s. 269 – o Autor encontrava- -se com uma doença do foro psiquiátrico que o impossibilitava absoluta e definitivamente para o trabalho até aos 65 anos de idade, Matéria que não pode deixar de se considerar admitida por acordo. E o Acórdão reformulado atendendo à matéria em causa, concluindo-se pela caducidade do contrato a partir [do momento?] em que o Autor pediu a substituição da reintegração pela indemnização de antiguidade em virtude de se encontrar definitiva e absolutamente incapaz para o trabalho.” Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 28 de Fevereiro de 2007, indeferido as arguidas nulidades, veio a ré peticionar que, relativamente à arguida falsidade, fosse esse incidente admitido, dado cumprimento ao disposto no artº 551º-A do Código de Processo Civil, fossem suspensos os termos do recurso, e se ordenasse a «baixa» do processo à 1ª instância, para aí ser instruído e julgado tal incidente. Porque o Desembargador Relator, por despacho de 18 de Abril de 2007, indeferiu o requerido, e porque a ré solicitou que sobre ele recaísse acórdão, a Relação de Lisboa, por aresto de 23 de Maio de 2007, veio a confirmar aquele despacho. Desse acórdão agravou a ré para este Supremo Tribunal, o qual, por acórdão de 9 de Janeiro de 2008, negou provimento ao agravo, determinando que os autos voltassem à Relação, a fim de o recurso de revista aí seguir seus termos, uma vez que os mesmos haviam ficado suspensos nos termos do nº 3 do artº 550º do Código de Processo Civil, e isso porque, em súmula, foi entendido que, ao ter a Relação, no anterior acórdão de 28 de Fevereiro de 2007, decidido que não iria conhecer da arguida falsidade, e por desse aresto não ter sido interposto recurso, a decisão ali contida tinha assumido foros de caso julgado formal. 3. Apresentou então a ré alegação respeitante à vertente revista, a qual rematou com o seguinte núcleo conclusivo: – “A- Ao transpor a matéria de facto provada da acta de fls. 320 a 322 para a sentença, o Mº Juiz da 1ª Instância alterou-lhe o sentido: – Na audiência de discussão e julgamento foram dados como provados os factos consubstanciadores da justa causa – artºs. 7º a 23º da Contestação; – Na sentença ficou escrito que no processo disciplinar instaurado ao Autor foram dados como provados os seguintes factos (enumerando-se de seguida os factos levados àqueles artigos da Contestação). B- Porque foi oportunamente suscitada a questão da não correspondência entre os factos que ficaram provados tal como constam da Acta de fls. 320 a 322 e a sua transcrição para a sentença, impunha-se ao Tribunal da Relação: – ou mandar baixar os autos à 1ª Instância para esclarecimento do assunto; – ou ele próprio desfazer o equívoco pela audição dos depoimento das testemunhas que foram gravados. C- Não o tendo feito, o Tribunal da Relação, além de denegar justiça, violou os nºs. 1 e 2 do artº 667º, 666º/2 e última parte do nº 2 do artº 712º todos do Cód. Proc. Civil. D- Impõe-se pois que no nº 24 da matéria de facto que consta da sentença, se acrescente a expressão ‘que também ficaram provados nos presentes autos’ ou outra semelhante, por modo a que a sentença traduza o que na realidade foi dado como provado nos termos da Acta de fls. 320/322. De qualquer modo, E- A fls. 265, o Autor, em 06 de Outubro de 2004 – no decurso da audiência de julgamento – confessa que não está em condições, nem físicas, nem psicológicas para voltar a trabalhar, seja ao serviço da Ré, seja em qualquer outra actividade. Assim sendo, F- O contrato de trabalho caducou, nos termos do disposto na al. b) do artº 4º da LCCT aprovada pelo Dec.-Lei 64-A/89 de 27.02. Pelo que, G- O Autor não tem direito: – nem à indemnização de antiguidade; – nem às retribuições intercalares vencidas posteriormente a 06.10.2004. H- A decisão recorrida, além de violar o artº 4, al. b) da LCCT, violou os artºs. 663º/1 e 567º do Cód. Proc. Civil e os artºs. 352º, 355º/1, 2 e 3, 356º/1 e 358º/1 do Código Civil. De qualquer modo, ainda I- O douto Acórdão recorrido não podia condenar nas retribuições intercalares que se venceram posteriormente à data do encerramento da audiência de discussão e julgamento – 31.01.2005. (fls. 302) J- Uma vez que a Ré, a partir dessa data, não podia alegar e provar que o Autor tinha auferido rendimentos em actividades iniciadas posteriormente ao despedimento. K- Ao fazer a liquidação das retribuições intercalares que se venceram posteriormente a 31.01.2005 e até 08.11.2006, a decisão recorrida violou as normas do artº 13º/1, conjugado com o nº 2, al. b) do mesmo artigo, artº 661º/2 e artº 379º do CPC. Termos em que deverá: a) Ser julgado procedente o presente recurso e ordenar-se que o Tribunal da Relação – ou proceda à rectificação da matéria de facto que consta da sentença, quer fazendo baixar os autos à 1ª Instância para que aqui seja dilucidada a inexactidão entre a matéria de facto que ficou provada e a matéria de facto tal como a mesma foi transposta para a sentença, por forma a tornar-se inequívoco que a Ré provou em julgamento os factos consubstanciadores de justa causa que invocou para o despedimento; quer, ela própria, fazendo a rectificação que se impõe, pelo recurso à audição da gravação dos depoimentos das testemunhas e, a final, julgar-se que o despedimento não foi ilícito Se assim se não entender: b) Julgar-se que o contrato de trabalho cessou por caducidade em 06.10.2004; com as legais consequências; Se ainda assim se não entender – o que se não aceita – c) Então, decidir-se que as retribuições intercalares apenas podiam ser liquidadas até 06.01.2005, data em que se encerrou a discussão da causa em 1ª Instância” Respondeu o autor à alegação da ré, sustentando o acerto da decisão impugnada, formulando, a final, as seguintes «conclusões»: – “1. A Recorrente, contrariamente ao alegado, não suscitou oportunamente a questão da ‘não correspondência entre os factos que ficaram provados (...) e a sua transcrição para a sentença’ Ao contrário, 2. Sempre a Recorrente aplaudiu a douta sentença da primeira instância, que, nas suas palavras ‘aplicou impecavelmente o direito aos factos que nos autos ficaram provados’ 3. Não se verifica no douto Acórdão qualquer violação das normas aplicáveis e muito menos denegação da justiça. 4. A ‘correcção’ do nº 24 da matéria de facto que a Recorrente pretende que seja efectuada não tem qualquer razão de ser, nem foi suscitada no momento e sede próprias. 5. A Recorrente opôs-se à ampliação do pedido formulado pelo Autor, tal ampliação do pedido não foi admitida, logo nenhuma prova se fez quanto aos factos que a Ré pretende agora ver provados e que, a seu ver, conduziriam à caducidade do contrato de trabalho do Autor por ‘impossibilidade absoluta e definitiva para o trabalho’. 6. Foi a própria Recorrente que, com a sua actuação, imputando ao Recorrido comportamentos e intenções que este nunca cometeu ou sequer pensou, o veio a colocar numa situação de grande ansiedade e depressão nervosas que o levaram a optar pela indemnização em vez da reintegração. 7. A Recorrente, ao suscitar a caducidade do contrato do Recorrido pelos motivos que invoca, age de abuso de direito, em ‘venire contra factum proprium" 8. Deve improceder o Recurso interposto pela Recorrente, confirmando-se integralmente o Acórdão recorrido porque não merece qualquer censura, não violou quaisquer normas e aplicou de forma justa o direito aos factos provados em audiência de julgamento.” A Ex.ma Magistrada do Ministério Público neste Supremo exarou «parecer» em que propugnou pela remessa dos autos “ao tribunal recorrido a fim de proceder à reapreciação das provas gravadas e, em função do seu exame, proferir decisão sobre os pontos de facto impugnados, julgando, depois, a causa conforme o direito” Notificado esse «parecer» às partes, tão-somente se pronunciou o autor, que, em súmula, veio sustentar que, como a “ora Recorrente, nas suas contra-alegações, em sede d[e] recurso da Sentença do Tribunal do Trabalho de Lisboa, apenas se limitou a pretender que o significado do preâmbulo do nº 24 dos factos provados (sentença) fosse outro: isto é, ‘que o que se deu como provado na acção foi o conteúdo daqueles artigos na contestação’” e como não foi esse o entendimento que resultou da sentença então apelada, como ficou explicado no acórdão agora recorrido, deveria este manter-se. Corridos os «vistos», cumpre decidir. II 1. Como resulta do mui extenso «relato» acima efectuado, a ora impugnante, aquando da interposição do recurso de revista, veio, expressa e separadamente, arguir a nulidade do acórdão recorrido, sustentando que o fazia nos termos prescritos na alínea d) do nº 1 do artº 668º do Código de Processo Civil, e aduzindo que aquele aresto não considerou como provada a matéria constante das diversas alíneas do item 24 dos factos enunciados na sentença e que o mesmo acórdão omitiu pronúncia quanto aos factos que se deveriam considerar admitidos por acordo (segundo os quais o autor, logo após o despedimento, adoeceu, ficando afectado de doença que o impossibilitou para o trabalho e que em 4 de Outubro de 2006 o autor se encontrava com uma doença do foro psiquiátrico que o impossibilitava absoluta e definitivamente para o trabalho até aos 65 anos), factos esses que tinham interesse para a decisão da causa. Nesse mesmo requerimento, como se viu, a recorrente ainda veio suscitar a questão da falsidade da acta de uma das sessões de julgamento (aquela em que foi lido o despacho do Juiz de 1ª instância que respondeu à matéria de facto constante dos articulados). Todavia, esta concreta questão está já resolvida nos autos, não tendo, pois, de ser equacionada no aresto em presença. No tocante às nulidades arguidas, o Tribunal da Relação de Lisboa, como se viu, veio a indeferi-las. Pelo que concerne à primeira, porque foi seu entendimento que “se o tribunal considerou como não provada determinada matéria de facto, foi porque sobre ela se pronunciou”, sendo questão diferente a da “justeza dessa pronúncia”, sendo que isso não constituía nulidade do acórdão de que cumprisse emitir pronúncia no momento. No que se refere à segunda arguida nulidade, a Relação perfilhou a óptica de harmonia com a qual se tratava de uma questão totalmente nova, não invocada, nem na 1ª instância, nem em sede de recurso, razão pela qual, não se tratando de matéria de conhecimento oficioso, não tinha o acórdão arguido de nulo que, sobre ela se pronunciar. Vejamos. 2. Como se deixou nota, o acórdão da Relação de Lisboa tirado em 28 de Fevereiro de 2007, na parte em que não considerou como procedente a arguição de nulidade do seu anterior aresto de 8 de Novembro de 2006 – no que respeita à invocada circunstância de, neste último referido acórdão, não ter sido considerada provada em audiência de julgamento a matéria constante das diversas alíneas do item 24 dos factos provados elencados na sentença da 1ª instância, circunstância essa que, segundo a recorrente, consubstanciaria a nulidade por omissão de pronúncia prevista na alínea d) do nº 1 do artº 668º do Código de Processo Civil –, entendeu que a alegada nulidade se não verificava, pois que, ao ter considerado determinada matéria de facto como não provada, isso significava que sobre ela se tinha pronunciado. Se, em mera tese e em abstracto, é certa a consideração efectuada neste particular pelo acórdão de 28 de Fevereiro de 2007, menos certo não é que, referentemente à concreta situação dos autos, haverão que se pesquisar os respectivos contornos. Na verdade, aquando da apelação do autor, o mesmo, inter alia, veio impugnar determinada matéria de facto que a sentença apelada deu como provada. Simplesmente, o desiderato impugnatório incidente sobre a matéria de facto levado a efeito pelo autor não se reportou sobre o item 24 do elenco dos factos dados como demonstrados na sentença da 1ª instância. Efectivamente, o autor, na apelação, veio sustentar (cfr. «conclusão» 23 da alegação então produzida) que “A par de ser ilegal, por inovação inadmissível, à luz do ordenamento jurídico português, não pode o tribunal aferir da justa causa de despedimento de um trabalhador sustentada na fundamentação de ‘No processo disciplinar instaurado ao autor foram dados como provados os seguintes factos …’, em vez de aferir se esses mesmos factos foram ou não provados no tribunal a quo. E, no caso dos autos, essa prova não foi conseguida pela Apelada, como resulta dos factos provados.” Contudo, na resposta à alegação do autor, a ré, no que ora releva, veio, a dado passo, dizer: – “(…) 2 – Toda a matéria de facto dada como provada resulta linear e cristalinamente dos depoimentos daquelas duas testemunhas. [reportava-se aos depoimentos, um pouco atrás indicados, das testemunhas, “CC – cfr. depoimentos gravados: o primeiro, na Cassete nº 5 – Lado A, registo 950 a 2368; e o segundo, na Cassete 8 – Lado A, registo 191 até ao fim e na 9ª Cassete Lado A, até ao registo 220 – e da D. DD – cujo depoimento se encontra gravado na 7ª Cassete e na 8ª até ao registo 190 Lado A –“] III – Dos factos que consubstanciam justa causa de despedimento: I.1 – Em sede de matéria de facto, o tribunal deu como provados os seguintes factos da contestação: 6º, e 7º[ ] a 23. 2 – Na douta sentença diz-se: 24 – No processo disciplinar instaurado ao Autor, foram dados como provados os seguintes factos: (e, depois, passa a enumerar-se, por alíneas, a matéria dos artºs. 7º a 23º da Contestação) 3 – Numa primeira leitura até poderia parecer que ‘no processo disciplinar … foram dados como provados os factos que a seguir se enumeram’, o que não significa que, na acção, se tivessem dado como provados tais factos. De que poderia resultar ter que se anular o julgamento para que o Tribunal ampliasse a matéria de facto. Mas não. O que se deu como provado na acção foi o conteúdo daqueles artigos da Contestação. E não apenas o facto de no processo disciplinar terem ficado provados tais factos. O que ficou provado na acção foram os factos em si. Basta ouvir o depoimento daquelas duas referidas testemunhas, que se encontra gravado nos locais acima citados. II – Esclarecido este aspecto, não pode duvidar-se que os factos praticados pelo Autor e que ficaram provados na acção, não podem, de modo algum, deixar de serem considerados como justa causa de despedimento. (…)”. Ora, o acórdão revidendo, que, quer no seu «relatório» (no qual, relativamente à postura da então apelada, se limitou a consignar que “A ré contra- -alegou, pugnando pela manutenção da decisão recorrida”), quer em todo o seu teor, nunca se pronunciou sobre o que fora dito pela ré na resposta à alegação e que acima se encontra extractado, veio, tocantemente ao ponto em apreço, discorrer assim: – “(…) Entende o apelante que não há qualquer fundamento legal para, face aos factos provados, considerar a existência de justa causa do despedimento, limitando-se a sentença recorrida, a referir que ‘a actuação em causa assumida pelo autor nas circunstâncias descritas em 24, supra, que não resultaram infirmados (?), consubstanciou uma inequívoca desobediência (…) não podendo daqui extrair-se a prova em audiência de quaisquer das circunstâncias descritas em 24, bem pelo contrario. E o apelante tem razão. Dando como assentes os factos apurados em julgamento e fazendo-os constar sob os n.ºs 1 a 23, o senhor juiz fez constar dos factos assentes, sob o n.º 24, todos os factos dados como provados no processo disciplinar, do seguinte modo: 24 – No processo disciplinar instaurado ao autor, foram dados como provados os seguintes factos: a) – o autor estava afecto à Divisão de Manutenção e Assistência; b) – No fim de semana de 9 e 10 de Novembro de 2002, teve lugar, na Sala Tejo o IX Encontro Internacional de Turismo, que foi organizado pela ....., cliente já habitual da BB; c) – O autor e o Sr. LFB foram escalados para ajudarem na desmontagem dos stands que haviam sido montados naquela sala: madeiras, mesas e estrados utilizados naquele evento; d) – Quando no dia 11/11/02, os dois procediam à desmontagem, como lhes havia sido ordenado, vendo que se encontravam oito caixas de vinho no ‘hall’ de acesso àquela sala, de comum acordo e em comunhão de esforços, decidiram apropriarem-se das ditas caixas e fizeram-nas suas; e) – O autor e o Sr. LFB sabiam que tal mercadoria lhes não pertencia, pois a mesma era propriedade da Sociedade ....., que, aliás, era proprietária de outras caixas de vinho que se encontravam ainda no meio da Sala Tejo; f) – Na execução do seu plano de apropriação, o autor e aquele seu colega, dirigiram-se ao Sr. GG da ..... – empresa que prestava serviços de vigilância e guarda à BB, SA – e, pediram-lhes se ‘podiam levar’ um caixote de lixo, pois precisavam dele para desmontarem umas mesas na Sala Tejo, segundo disseram; g) – De posse desse caixote de lixo, o autor e o Sr. LFB, entre as 9,30 e as 10,00 horas, desse dia 11/11/02, dirigiram-se ao hall da Sala Tejo, pegaram em 4 caixas de vinho, meteram-nas no caixote de lixo que tinham pedido ao Sr. GG e transportaram-nas para o Armazém n° 5, que se situa a uma distância de cerca de 150m daquela sala e que estava sob a responsabilidade do autor que é quem tinha a respectiva chave; h) – Depois, voltaram à Sala Tejo e, no mesmo caixote, transportaram as outras 4 caixas; i) – Escondendo, então, as 8 caixas de vinho – 4 de Carmim 2002 Vinho Novo Branco e 4 de Vinho Tinto Reguengos Reserva 1999, no valor total de 245,00 euros – por detrás de umas paletes de cartão no Armazém n° 5; j) – Dando pela falta de tais caixas, a Dra HH, representante da ......, foi ter com a D. II, a responsável operacional pela desmontagem, a quem informou do facto, apresentando a correspondente reclamação; k) – A D.II informou da reclamação a D. DD, que, de imediato, se dirigiu à Sala Tejo, onde falou com o Sr. GG, que lhe disse que a Dra HH, que lhe tinha pedido para vigiar a Sala Tejo, mas que, afinal, tinham daí desaparecido ‘umas’ caixas de vinho; l) – Alertado telefonicamente pela D. DD, o Sr. FF – responsável pela Divisão de Manutenção e Assistência e que nesse dia 11 até se encontrava de folga – contactou o Sr. GG a quem disse que, se fosse necessário, ele desselasse a chave do armazém n° 5, para verem se as ditas caixas aí se encontravam; m) – Isto porque o Sr. GG na conversa havida, lhe tinha dito que o autor e o Sr. LFB lhe haviam pedido um caixote de lixo para desmontar umas mesas e ele achou isso estranho; n) – Então, durante a hora de almoço, o Sr. GGdesselou as chaves do Armazém n° 5 e constatou que, de facto, as referidas caixas de vinho se encontravam aí, escondidas atrás de uma palete de cartão; o) – Tendo convocado os 5 elementos da Manutenção, entre os quais o autor e o Sr. LFB, o Sr. FF instou estes a explicarem-se; p) – Os mesmos disseram, então, que, como era dia de S. ..... e tinham combinado um magusto, lembraram-se de pegar nas referidas caixas de vinho para beberem no magusto; q) – Tanto o autor como o Sr. LFB sabiam que as referidas caixas lhes não pertenciam, mas pertenciam à ..... e sabiam que o seu comportamento era proibido por lei; Foi perante os factos apurados no processo disciplinar e descritos sob o n.º 24 que o senhor juiz a quo apurou a existência de justa causa conforme se pode ler da sentença que, neste aspecto, é esclarecedora quando refere: ‘No caso presente, a actuação em causa assumida pelo autor nas circunstâncias descritas em 24, supra, que não resultaram infirmadas, (sublinhado nosso), consubstanciou uma inequívoca desobediência ao dever de velar pela conservação e boa utilização dos bens relacionados com o seu trabalho, que lhe foram confiados pela entidade patronal’. Entendeu, pois, o tribunal a quo que incumbia ao trabalhador a prova da inverdade dos factos que lhe eram apontados no processo disciplinar e, não tendo o trabalhador efectuado essa prova, decidiu contra ele. Mas não é ao trabalhador que incumbe a prova da não verificação dos factos que lhe são imputados pela entidade patronal mas, antes, a esta que, querendo ver julgada, como justa, a causa pela qual despediu o trabalhador, tem de alegar e provar os factos que constituem a invocada justa causa, tudo nos termos do art.º 12.º n.º 4 do DL 64-A/89 de 27.02. Muito mal andou, nesta parte, o tribunal a quo que ‘misturou’ a prova produzida em julgamento com os factos apurados num processo (o processo disciplinar) que, por ser levado a cabo por uma das partes contra a outra, não oferece as mínimas garantias de isenção, não podendo servir como prova dos factos em julgamento. Mas o tribunal a quo andou mal ainda noutros aspectos no que se refere à apreciação da justa causa. É que, vindo o trabalhador acusado de lesar interesses patrimoniais sérios da empresa quebrando a confiança que o contrato de trabalho supõe (v. art.º 26.º da contestação e parte final do relatório do processo disciplinar) o senhor juiz discerniu, na sentença que proferiu, sobre uma não alegada nem demonstrada violação de dever de desobediência que, salvo o devido respeito, não é chamada para o presente processo. Ora, uma vez que os factos apurados no processo disciplinar não podem servir como prova de justa causa, resta-nos, apenas, para apreciação da alegada justa causa, os factos constantes dos n.ºs 1 a 23. E destes apenas resulta que o trabalhador, ora apelante, e outro trabalhador da recorrida, quando procediam à arrumação dos materiais deslocados no exercício das sua funções, após terminado o IX Encontro Internacional de Turismo, organizado pela ..............s, encontraram oito caixas de vinho sem indicação da proveniência e transportaram-nas para o Armazém n.º 5 (factos sob os n.ºs 4 a 7). Não existe nos factos assentes qualquer indício de que o apelante tivesse intenção de se apropriar de tais caixas de vinho. Tendo em conta os factos apurados em julgamento, inexiste qualquer infracção praticada pelo trabalhador, ora recorrente, e, por isso, inexiste justa causa para o seu despedimento. (…)” Da transcrição vinda de fazer torna-se inequívoco que o acórdão em sindicância enfrentou a questão colocada na apelação pelo autor e que consistia em, na acção de impugnação de despedimento, se dever este considerar como ilícito se, nessa acção, apenas fosse dado como provado que no processo disciplinar foram demonstrados determinados factos. E, no enfrentamento dessa questão, o aresto em causa respondeu-lhe negativamente, pois que entendeu que a sentença proferida em 1ª instância «misturara» a prova produzida em julgamento com os factos apurados no processo disciplinar. Todavia, como se viu, aquando da resposta à alegação do autor produzida no recurso de apelação, a ré, a montante dessa questão, colocou uma outra: justamente a de impugnar a prova daquilo que deu origem ao item 24 do elenco fáctico constante da sentença, para tanto se acobertando em depoimentos de testemunhas, que identificou, além de indicar, ainda, os meios fonográficos em que esses depoimentos ficaram transcritos. 2.1. De harmonia com o que se prescreve no nº 2 do artº 684º-A do Código de Processo Civil, na parte agora relevante, pode ainda o recorrido, na respectiva alegação e a título subsidiário, impugnar a decisão proferida sobre pontos determinados da matéria de facto, não impugnados pelo recorrente, prevenindo a hipótese de procedência das questões por este suscitadas. Por outro lado, comandam os números 1, 2 e 4 do artº 690º-A do mesmo corpo de leis que: – 1 – Quando se impugne a decisão proferida sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição: a) Quais os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados; b) Quais os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida. 2 – No caso previsto na alínea b) do número anterior, quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ainda ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, indicar os depoimentos em que se funda, por referência ao assinalado na acta, nos termos do disposto no n.º 2 do artigo 522.º-C. (…) 4 – O disposto no n.ºs 1 e 2 é aplicável ao caso de o recorrido pretender alargar o âmbito do recurso, nos termos do n.º 2 do artigo 684.º-A. É fora de causa que, no concreto dos autos, no recurso de apelação, o autor suscitou, na parte agora útil, a questão de a sentença apelada se não poder manter pelo facto de da matéria provada se extrair tão-somente que no processo disciplinar foram dados por demonstrados determinados factos. Ora, no que concerne a esta equacionada questão, a ré, ora recorrente, veio sustentar que aquilo que constava no primeiro trecho do item 24 dos factos tidos por apurados na sentença não correspondia à realidade, pois o que se teria demonstrado seria a prova, em julgamento, da factualidade constante das várias alíneas de tal item, ancorando essa sustentação com meios de prova produzidos em audiência, devidamente identificados e com reporte específico aos registos fonográficos. Porventura a forma como a ré veio a colocar este problema não foi a mais ortodoxa. Simplesmente, de um ponto de vista substancial e sem arredar os requisitos formais exigidos pelas normas adjectivas acima indicadas, torna-se patente que, com o modo de dizer que utilizou, a mesma ré veio impugnar a matéria de facto constante de parte do já mencionado item 24, não tendo deixado de assinalar a eventualidade de, «numa primeira leitura», se poder ser levado à conclusão de que daquela matéria de facto se retiraria que fora somente provado que no processo disciplinar foram dados por apurados certos factos. Esse assinalar, na visão deste Supremo, não pode deixar de representar a figuração da hipótese de o Tribunal ad quem dar procedência à questão suscitada pelo autor na apelação e a que, no ponto em causa, já fizemos menção. 2.3. Num tal contexto, impunha-se à Relação que se pronunciasse sobre a impugnação fáctica incidente sobre parte do item 24 do elenco dos factos apurados pela 1ª instância. Só após essa pronúncia, e, obviamente, de acordo com o que nela fosse decidido, é que haveria de ser ponderada (caso se justificasse, de harmonia com o que viesse a ser decidido) a particular questão colocada na apelação pelo autor e relativamente à qual, na pressuposição do respectivo acolhimento, a ré impugnou parte da decisão da matéria fáctica. Não tendo efectuado a pronúncia a que nos reportámos, incorreu o acórdão recorrido no vício desenhado pela primeira parte da alínea d) do nº 1 do artº 668º do Código de Processo Civil. 2.4. De acordo com o que resulta dos números 1 e 2 do artº 731º do citado diploma adjectivo, postando-se uma situação inserível na ocorrência de uma nulidade fundada na circunstância de a decisão recorrida ter deixado de se pronunciar sobre questão que devesse apreciar, não deverá cobrar aplicação o que é prescrito no nº 1, ou seja, não deverá este Supremo suprir a nulidade, declarando em que sentido a decisão se deve considerar modificada, conhecendo dos outros fundamentos do recurso. Cobrará aplicação, isso sim, o disposto no nº 2, que determina a baixa do processo, a fim de se fazer a reforma da decisão anulada. III Em face do que se deixa exposto, declara-se nulo o acórdão impugnado, por se não ter pronunciado sobre o pedido de reapreciação da prova formulado na resposta à alegação do autor na apelação, consequentemente se determinado a remessa dos autos ao Tribunal a quo, a fim de proceder a tal reapreciação e, na sequência dela, proferir nova decisão. Custas pelo vencido a final. Lisboa, 26 de Novembro de 2008 Bravo Serra (Relator) Mário Pereira Sousa Peixoto |