Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
05S2134
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: MÁRIO PEREIRA
Descritores: TRANSFERÊNCIA DE TRABALHADOR
CONTRATO COLECTIVO DE TRABALHO
PRÉMIO DE PRODUTIVIDADE
SUBSÍDIO DE FÉRIAS
SUBSÍDIO DE NATAL
Nº do Documento: SJ200605240021344
Data do Acordão: 05/24/2006
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - É ilegítima a transferência do trabalhador de posto de trabalho quando, embora admissível a sua mudança de categoria profissional face ao CCT aplicável, o empregador não observa o requisito imposto pelo mesmo CCT de audição prévia dos delegados sindicais.
II - Apesar de a resposta dos delegados sindicais não ser vinculativa para o empregador, a audição prévia e a ponderação dos argumentos da resposta constituíam itens necessários à formação e prolação da decisão final do empregador.
III - A remuneração variável mensal - prémio de produção atribuído face aos resultados mensais obtidos pelos trabalhadores comerciais em produtos definidos pela empresa e conforme o grau de cumprimento dos objectivos, pretendendo constituir um incentivo de animação às redes comerciais - paga regular e periodicamente ao trabalhador (entre 1996 e 2001, com excepção de 13 meses num total de 65), subsume-se à previsão do art. 88.º, n.º 2, 2.ª parte da LCT e integra a retribuição devida ao trabalhador.
IV - A atribuição patrimonial designada rappel paga anualmente aos trabalhadores comerciais externos em função dos resultados anuais obtidos pela rede comercial, quantificada com base em taxas pré-definidas, que o autor auferiu entre 1996 e 2001, com excepção apenas do ano de 1997, integra nos mesmos moldes a retribuição que lhe é devida.
V - O facto de ambas as atribuições dependerem do cumprimento de determinados objectivos individuais não infirma esta conclusão na medida em que o carácter regular e periódico do seu pagamento é, por si só, apto a conferir-lhes natureza retributiva.
VI - Estas prestações, recondutíveis à figura genérica do prémio de produtividade e destinadas a retribuir o condicionalismo da prestação do trabalho na vertente dos bons resultados conseguidos pelo trabalhador, são de computar nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal.
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça:


I - A Autora AA pediu com a presente acção sob a forma de processo comum intentada contra a Empresa-A que
a) Fosse declarada a ilicitude da mudança de funções e a R. condenada a atribuir-lhe a categoria de técnica comercial e funções próprias dessa categoria profissional, tal como está definida no CCT para a Indústria Seguradora;
b) A pagar-lhe a remuneração variável, no valor mensal de € 539,09 de que a A. se viu privada por força da mudança de funções e até reassumir as funções de técnica comercial, sendo as remunerações variáveis vencidas no valor de € 5 390,90;
c) Entendendo-se que não tem direito ao pedido formulado na alínea anterior, ser a R. condenada a pagar-lhe a retribuição global (fixa + variável) que recebia à data da transferência (1.746,59 euros) até que das sucessivas actualizações da tabela salarial resulte uma remuneração fixa superior àquela, sendo que até ao presente as diferenças salariais devidas a esse título ascendem € 4 987,40;
d) Condenada a R. a manter o subsídio de deslocação no valor mensal de € 192,28 e a pagar-lhe as diferenças devidas a esse título, no montante de € 1 174,60;
e) Declarar-se a não obrigação de a A. pagar as prestações do mútuo enquanto se mantiver sem exercer as funções externas que lhe estavam subjacentes e condenar a R. a restituir à A. as quantias que a esse título descontou na remuneração no valor de € 2 745,40;
f) Condenada a R. a pagar à A. a remuneração de férias e subsídios de férias e de Natal com base na retribuição total da A. (fixa+variável), e a pagar-lhe as diferenças salariais já devidas a esse título, devido ao facto de terem sido pagas apenas com base na remuneração fixa, e que ascendem a € 6 175,79.
Para tanto alega, em síntese, na parte que aqui interessa:
Exerceu as funções de técnica comercial, a que foi promovida, até Abril de 2001.
Em Fevereiro de 2002, a R. informou-a verbalmente de que lhe alterava as funções, passando a A. a partir daí e sem o seu acordo, a exercer as funções de escriturária, o que reputa de ilícito por traduzir o desempenho de funções diferentes daquelas que correspondem à categoria que detinha, sem audição prévia dos delegados sindicais, porque, ainda que com fundamento na cláusula 23ª do CCT, viola manifestamente o disposto nos art.os 21º nº 1 al. d) e 22º da LCT.
Acresce que, em qualquer dos casos, sempre lhe foi diminuída a retribuição, já que enquanto técnica comercial auferia além da parte fixa da remuneração, uma parte variável composta por "remuneração variável mensal" e "rappel", recebendo apenas enquanto escriturária a remuneração fixa de € 1 247,85.
As remunerações relativas aos períodos de férias sempre lhe foram pagas tendo apenas em conta a parte fixa da remuneração e a remuneração variável mensal, e não já o rappel que anualmente recebia, e os subsídios de férias e de Natal sempre foram calculados com base na parte fixa da remuneração, não tendo em conta quer a remuneração variável mensal, quer o rappel.
Assim, pretende que as diferenças daí resultantes lhe sejam pagas desde 1996.

A Ré contestou.
Impugnou factos da p.i., concluindo no sentido da sua absolvição do pedido.

A A. respondeu à contestação, tendo concluído como na p.i..

Saneada, condensada e discutida a causa, foi proferida sentença que julgou a acção parcialmente procedente e:
- declarou ilícita a mudança de funções da Autora de técnica comercial para escriturária;
- condenou a Ré a atribuir à Autora a categoria de técnica comercial e as funções próprias dessa categoria;
- condenou a Ré a pagar à Autora a remuneração variável no valor mensal de € 501,68 (quinhentos e um euros e sessenta e oito cêntimos), até que esta volte a assumir as funções de técnica comercial, perfazendo as vencidas desde 01/02/2002 até Dezembro de 2003, € 11 538,64 (onze mil, quinhentos e trinta e oito euros e sessenta e quatro cêntimos);
- condenou a Ré a pagar à Autora a quantia de € 5 770,38 (cinco mil setecentos e setenta euros e trinta e oito cêntimos) a título de diferenças salariais relativas ao cálculo da remuneração de férias, subsídio de férias e de Natal, com base na parte variável da remuneração;
- absolveu a Ré na parte restante destes e dos demais pedidos contra ela formulados.

Inconformadas, dela apelaram a R., a título principal, e a A., subordinadamente.

Por seu douto acórdão, o Tribunal da Relação julgou improcedentes as apelações, tendo confirmado a sentença.

II - De novo inconformada, a R. interpôs a presente revista em que apresentou as seguintes conclusões:
1 - A transferência da A. de posto de trabalho é legítima, não podendo julgar-se, por inexistência de suporte legal, que a falta de audição prévia dos delegados sindicais implique a nulidade desse acto da Ré.
Decidindo como decidiu, a Meritíssima Juiz deu errada interpretação às cláusulas 22ª e 23ª do CCT de Seguros.
2 - A "RVM - Remuneração Variável Mensal" e o designado "Rappel" ou "Prémio de Desempenho" não integram o conceito de retribuição, no sentido legal do termo.
Decidindo em contrário, o acórdão recorrido deu errada interpretação aos artigos 82º e seguintes da LCT.
2.1 - Admitindo-se que a "RVM" constitui retribuição, com a transferência, a retribuição global média da A. Recorrida, não deveria ser reduzida, mas a parte daquela RVM deveria ser absorvida pelos futuros e sucessivos aumentos salariais.
3 - Pelos mesmos motivos expostos em 2, essas prestações não devem integrar a remuneração do período de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal.
4 - A admitir-se que o "Prémio de Desempenho" também é retribuição, ele não devia, mesmo assim, acrescer à remuneração mensal do A. enquanto esta não retomasse as funções de Técnica Comercial, pelo simples facto de que a A., enquanto trabalhadora interna também o recebia e recebeu nos anos de 2002 e 2003. A decisão recorrida já determinou o pagamento em duplicado de tal prémio, no que se refere a estes anos.
Pede que seja revogado o Acórdão recorrido, absolvendo-se a Recorrente dos pedidos em que foi condenada, ou, considerando-se que a "RVM" constitui retribuição, deve aquele acórdão ser alterado, no sentido de que a "RVM" deve ser absorvida pelos aumentos salariais posteriores à mudança de funções da A..

A A. contra-alegou, tendo pedido a confirmação do acórdão recorrido ou, assim não se entendendo, e em ampliação do objecto do recurso, nos termos do art.º 684º- A do CPC, que a R. seja condenada a manter-lhe a retribuição de 1.746,59 euros até que das sucessivas actualizações da tabela resulte uma retribuição fixa superior àquela, e a pagar-lhe as diferenças salariais devidas a esse título, sendo as vencidas à data da propositura da acção no valor de 4.987,40 euros.
Apresentou no que respeita à ampliação do âmbito do recurso, as seguintes conclusões:
A) O art.º 21º al. c) da LCT proibia a diminuição da retribuição;
B) A retribuição compreende quer a parte fixa quer a variável, e no caso da Recorrida era no valor de 1.746,59 euros;
C) A Recorrente violou aquele preceito legal, ao diminuir-lhe a retribuição para 1.247,85 euros;
D) Mesmo entendendo-se que foi legítima a alteração imposta à Recorrida, teria de ser respeitado o citado art.º 21º;
E) E nessa hipótese deverá a Recorrente ser condenada a manter-lhe a retribuição de 1.746,59 euros até que das sucessivas actualizações da tabela resulte uma retribuição fixa superior àquela, e a pagar-lhe as diferenças salariais devidas a esse título, sendo as vencidas à data da propositura da acção no valor de 4.987,40 euros.

No seu douto Parecer, não objecto de resposta das partes, o Ex.mo Procurador-Geral neste Supremo pronunciou-se no sentido de ser concedida parcialmente a revista, com a declaração da legitimidade da transferência da A. para as funções de escriturária, e do seu direito à remuneração variável mensal mas não ao rappel ou prémio de desempenho, confirmando-se, no mais, o acórdão recorrido.

III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.
No douto acórdão recorrido, foram dados como provados os seguintes factos, que aqui se aceitam por não haver fundamento legal para os alterar:
1) A A. foi admitida ao serviço da Ré em 3 de Agosto de 1981 para, sob as suas ordens e direcção, exercer as funções próprias da categoria profissional de escriturária estagiária.
2) Foi promovida a escriturária , nível IX, em Agosto de 1983, e transferida para a direcção comercial, no Porto, em 1 de Junho de 1988, com funções de técnica comercial, sujeita a um período de tirocínio de 2 meses.
3) Em 7 de Fevereiro de 1994, foi transferida para a dependência da Ré, em Matosinhos onde permaneceu até 02/04/2001, data em que a Ré procedeu ao encerramento daquele Balcão.
4) Nessa data foi transferida, com o seu acordo, para a zona da dependência da Maia.
5) A partir de 1/2/2002, por ordem da Ré, a A. cessou as funções comerciais e externas e começou a exercer funções administrativas e internas de escriturária.
6) A A. manifestou de imediato o seu desacordo, e exigiu a redução a escrito dessa ordem, a qual, e após muitas resistências, só lhe foi entregue a 22 de Julho de 2002, embora datada de 02/07/2002.
7) Enquanto técnica comercial a A. auferia uma remuneração constituída por uma parte fixa, acrescida de "remuneração variável mensal" e de "rappel".
8) A título de rappel a A. auferiu em 2001 o total de 2.167,81 €.
9) A remuneração variável mensal é um prémio de produção atribuído face aos resultados mensais obtidos pelos trabalhadores comerciais em produtos definidos pela empresa.
10) A A. auferia a remuneração fixa de 1.207,50 €.
11) Agora a A. recebe apenas a remuneração fixa no valor de 1.247,85 € (superior à remuneração fixa de 2001 por força da actualização salarial).
12) O exercício da actividade comercial exige a utilização de veículo automóvel, pois é exercida fora das instalações e com deslocações diárias e constantes.
13) A Ré optou por não ter frota própria de veículos para pôr ao dispor dos trabalhadores.
14) A Ré emprestou à A. 2.500 contos (12.469,95 euros), para aquisição de veículo, em Novembro de 2001
15) A A. está a pagar mensalmente à Ré uma prestação de 55.000$00 ( 274,34 euros) do empréstimo para aquisição de viatura que a Ré lhe desconta nas remunerações mensais.
16) A remuneração de férias, os subsídios de férias e de Natal eram calculados com base na parte fixa da remuneração com excepção da remuneração de férias, na qual a Ré também incluía a " remuneração variável mensal ".
17) A título de " remuneração variável mensal a A. recebeu:
a) 1996 - 1.321,82 euros
b) 1997 - 3.436,72 euros
c) 1998 - 2.339,36 euros
d) 1999 - 1,945,32 euros
e) 2000 - 4.489,20 euros
18) A título de " rappel " a A. recebeu:
a) 1996 - 1.571,21 euros
b) 1997 - 0.000,00 euros
c) 1998 - 2.072,80 euros
d) 1999 - 3.219,64 euros
e) 2000 - 3.342,34 euros
f) 2001 - 2.167,81 euros
19) A A. é sócia do SINAPSA - Sindicato Nacional dos Profissionais de Seguros e Afins, e a Ré associada da A. P. S. - Associação Portuguesa de Seguradores.
20) A "remuneração variável mensal" é atribuída conforme o grau de cumprimento dos objectivos e pretende constituir um incentivo de animação às redes comerciais.
21) Os parâmetros de atribuição variam com frequência ou podem não existir.
22) Os objectivos, podiam, como aconteceu com a A., atingir-se independentemente dos períodos de férias desta, pois que também dependiam da produção dos mediadores por si assistidos.
23) Antes da transferência da A. para a dependência da Maia, e até à alteração das respectivas funções em 01/02/2002 a R. sempre pagou à A. os quilómetros percorridos desde a residência até à dependência em que exercia funções.
24) Os delegados sindicais não foram ouvidos prévia e relativamente à alteração de funções da A.
25) Até ao ano 2000 o "rappel" constituía uma atribuição patrimonial paga aos trabalhadores comerciais externos em função dos resultados anuais obtidos pela rede comercial de mediação subordinada a cada trabalhador e quantificado com base em taxas pré definidas.
26) No ano de 2001 a A. recebeu a título de "remuneração variável mensal" a quantia global de € 3 852,36.
27) A A. percorria mensalmente, em média, entre a residência e a dependência da Maia, 836 Kms.
28) A partir da alteração de funções da A., a R. passou a pagar-lhe a quantia mensal de € 74,82 a título de subsídio de mobilidade, equivalendo a compensação pelas despesas de deslocação inerentes à transferência de Matosinhos para a Maia, calculado com base na distância entre aquelas duas dependências.
29) A colocação pelos trabalhadores externos de veículos próprios ao serviço da empresa era compensada com o pagamento do factor quilómetro estabelecido no C.C.T.
30) No âmbito dos benefícios sociais da R. se inclui o empréstimo aos trabalhadores externos das quantias necessárias à aquisição de viatura a uma taxa de juro baixa e com um plano de pagamento em prestações.
31) Depois de a R. ter deixado de ter frota de veículos, os trabalhadores externos passaram a utilizar veículos próprios ao serviço da empresa.
32) A A. e R. acordaram que esta emprestava àquela dinheiro para adquirir uma viatura, que a A. passou a utilizar ao serviço da R.
33) A A. escolheu o veículo tendo também em vista a sua utilização ao serviço da empresa.
34) A partir de finais de Outubro, inícios de Novembro de 2001 a A. e todos os seus colegas, passaram a ter conhecimento da intenção da R. implementar um plano de reestruturação que passava pela redução do número de mediadores e consequentemente de trabalhadores externos e sua passagem para trabalhadores internos e que envolveria, além de outros, o balcão da Maia, ainda que só no decurso do mês de Janeiro de 2002 lhe tenha sido formalmente comunicada a alteração das respectivas funções de externas para internas a partir de 01/02/2002.
35) A partir de 2001 o "rappel" passou a ser designado de prémio de desempenho e a ser pago aos trabalhadores externos e chefias em função do grau de cumprimento de objectivos individuais anualmente fixados (contratos de objectivos individuais) e aos trabalhadores internos em função do grau de cumprimento de objectivos de grupo anualmente fixados (contratos de objectivos de grupo) e da avaliação hierárquica, sendo em ambos os casos pago anualmente e quantificado em salários, podendo os trabalhadores externos alcançar mais um salário que os internos.

IV - A sentença, a cuja fundamentação e decisão o acórdão recorrido aderiu, nos termos do art.º 713º, n.º 5 do CPC, entendeu, em síntese:
A mudança da A., do quadro comercial e da categoria de técnica comercial, para o quadro administrativo e para a categoria de escriturária, ordenada, unilateralmente, pela R., foi, no caso, ilegítima, por não ter sido precedida da audição dos delegados sindicais, como o impunham as cláusulas 22ª e 23ª do CCT aplicável.
O que confere à A. o direito de exigir que a R. lhe atribua, de novo, as funções e categoria de técnica comercial, bem como a reposição da sua situação no estado em que estaria se não tivesse ocorrido aquela modificação ilícita de funções.
Sendo que as quantias recebidas pela A., ao longo do tempo, a título de remuneração variável mensal (RVM) e de rappel (posteriormente designado por prémio de desempenho), subsumíveis à previsão do art.º 88º da LCT, integram a sua retribuição no sentido estrito a que se reporta o art.º 82º e, consequentemente, o respectivo núcleo irredutível - art.º 21º, n.º 1, al. c).
A parte variável a considerar, a esse título, é determinada nos termos do art.º 84º, n.º 2 da LCT, ou seja, tomando em conta a média dos valores recebidos nos últimos 12 meses de execução do contrato.
E essas retribuições (remuneração variável mensal e rappel, depois prémio de desempenho) devem ser contabilizadas também no cálculo das remunerações de férias e subsídios de férias e de Natal.
E daí o decidido na sentença e confirmado no acórdão recorrido.

Na revista, a R. impugna a bondade do decidido, na parte em que julgou procedente a acção, defendendo que a falta de audição prévia dos delegados sindicais não gera a ilegitimidade da transferência de posto de trabalho da A., que a remuneração variável mensal e o "rappel" (depois prémio de desempenho) não integram o conceito de retribuição, pelo que a A. não tem direito aos mesmos nem que eles sejam contabilizados nas remunerações de férias e nos subsídios de férias e de Natal.
Defende também que, em qualquer caso, a RVM sempre deveria ser absorvida pelos futuros e sucessivos aumentos salariais da A. e que a decisão recorrida determinou o pagamento em duplicado do prémio de desempenho, porque a A. também o recebia e recebeu nos anos de 2002 e 2003.
São, pois, estas as questões que, levadas às conclusões, constituem objecto do recurso (art.ºs 684º, n.º 3 e 690º, n.º 1 do CPC), sem prejuízo também da apreciação , se for caso disso, do pedido subsidiário da A., que havia ficado prejudicado com a decretada procedência do seu pedido principal.

Conhecendo:
A 1ª questão suscitada consiste na legitimidade ou não da decisão unilateral da R. em ter feito cessar as funções comerciais da A., como técnica comercial, e a ter colocado a exercer funções administrativas e internas de escriturária.
Como foi entendido nas instâncias, sem discordância das partes, ao caso é aplicável o Contrato Colectivo de Trabalho entre a APS - Associação Portuguesa de Seguradores e o Sindicato dos Trabalhadores de Seguros do Sul e Regiões Autónomas e outros, publicado no BTE, 1ª série, n.º 23, de 22.6.1995, que teve, depois, as alterações referidas, na sentença, a fls. 199.
Estabelece a sua cláusula 22ª:
" 1. Salvo estipulação em contrário e sem prejuízo do disposto na cláusula 26ª, a empresa pode transferir qualquer trabalhador para outro posto ou local de trabalho, dentro da mesma localidade ou para a localidade onde reside.
2. A transferência será precedida de audição dos delegados sindicais e, quando dela resulte mudança de categoria, só poderá ser feita para categoria de ordenado base igual ou superior ao da categoria de onde o trabalhador foi transferido.
(...)
4. Se da transferência resultar mudança significativa do seu conteúdo funcional, será garantido ao trabalhador formação adequada".
E, por sua vez, prescreve a cláusula 23ª, na parte que aqui interessa:
"1. A empresa pode transferir qualquer trabalhador com funções externas ou do quadro comercial para outro quadro e vice-versa.
2. Quando da transferência resultar alteração da categoria profissional do trabalhador, a empresa fica obrigada a reclassificá-lo de acordo com as novas funções".
E preceitua-se ainda na cláusula 26ª:
"1. A transferência de qualquer trabalhador para outra localidade só poderá efectuar-se com a concordância escrita do mesmo, sendo previamente ouvidos os delegados sindicais, salvo se se tratar de transferência total da sede ou de qualquer dependência onde o trabalhador preste serviço ou se a empresa deixar de ter serviços na localidade".
Há que ter ainda em consideração que, nos termos do Anexo III do citado C.C.T., a categoria de escriturário, pertencente ao quadro técnico-administrativo, é assim definida:
"É o trabalhador que executa serviços técnicos ou administrativos sem funções de coordenação do ponto de vista hierárquico".
Por seu turno, a categoria de técnico comercial, pertencente ao quadro de serviços comerciais, está definida da seguinte forma:
"É a categoria mínima que deve ser atribuída ao trabalhador cuja actividade, exercida predominantemente fora do escritório da empresa, consiste em visitar e inspeccionar as representações das sociedades, apoiar tecnicamente os mediadores, promover e ou divulgar e ou vender o seguro, tendo em conta a sua função social, podendo dar apoio às cobranças e também, quando para tal tiver essa formação técnica e específica, vistoriar e classificar riscos, proceder à avaliação e ou liquidação e peritagem de sinistros".
E, com as instâncias e pelas razões referidas na sentença, que subscrevemos e damos por reproduzidas, entendemos que a cláusula 23ª não padece de ilegalidade, não violando o disposto nos art.ºs 21º, n.º 1, d), 22º, n.º 1 e 23º, n.º 1 da LCT, o que, aliás, não surge impugnado pelas partes, na revista.
E, assim sendo, a R. podia, ao abrigo dela, observados que fossem os condicionalismos previstos no CCT, operar tal mudança de categoria e de quadro da A..
E como as instâncias também entenderam, pelas razões constantes da sentença, com as quais concordamos, tal mudança não envolveu baixa de categoria da A., nem, consequentemente, violação da norma imperativa do art.º 23º da LCT, segundo o qual "o trabalhador só pode ser colocado em categoria inferior àquela para que foi contratado ou a que foi promovido quando tal mudança, imposta por necessidades prementes da empresa ou por estrita necessidade do trabalhador, seja por este aceite e autorizada pelo Instituto Nacional do Trabalho e Previdência, bem como quando o trabalhador retome a categoria para que foi contratado após haver substituído outro colega de categoria superior, cujo contrato se encontrava suspenso".
É que, como aí se consignou, embora tenha havido modificação de categoria, não houve baixa de categoria, porque "resulta claramente dos Anexos I e II, do C.C.T. que vem sendo mencionado, que aquelas duas categorias se encontram ao mesmo nível, sendo ambas igualmente qualificadas de acordo com a estrutura de qualificação de funções e correspondendo-lhes os mesmos níveis salariais de base (nível IX e X)".

Mas terá a R. observado os condicionalismos impostos pelo CCT para a operada mudança de situação da A.?
Também aqui concordamos com a sentença - a que o acórdão recorrido aderiu - ao entender que a R. não observou o requisito imposto pela cláusula 22ª, n.ºs 1 e 2, de audição prévia dos delegados sindicais.
É que, como aí se deixou dito, a modificação operada, "além de implicar a alteração da categoria profissional, implicava simultaneamente a alteração do posto de trabalho da A. e a sua transferência do quadro comercial para o quadro administrativo".
Como referem Luís M. Monteiro e Pedro Madeira de Brito (in Código do Trabalho Anotado, 2003, P. R. Martinez e outros, p. 238), no conceito de posto de trabalho está em causa "o exercício de determinadas funções numa dada organização empresarial, isto é, a delimitação da prestação concreta quando integrada numa estrutura de meios dirigida pelo empregador e servindo idêntico objectivo produtivo".
Deixando de exercer as funções comerciais externas que lhe incumbiam enquanto técnica comercial e passando a exercer as funções administrativas internas enquanto escriturária, a A., além de passar a ter a seu cargo um feixe de tarefas completamente diferentes e direccionadas à satisfação de necessidades diversas da R., passou a ter uma outra posição concreta no contexto da organização empresarial do seu empregador: passou a ocupar outro posto de trabalho.
Ora, a transferência da A. para outro posto de trabalho exigia tal audição, cuja noção e efeitos vêm previstos, em termos gerais, na cláusula 82ª, aqui aplicável, por não excepcionada por diversa regulamentação e do seguinte teor:
"1. Por audição dos trabalhadores ou dos seus órgãos representativos entende-se a comunicação prévia de um projecto de decisão.
2. Esse projecto pode ou não ser modificado após a recepção, em tempo útil e devidamente fundamentada, da posição dos trabalhadores ou do órgão ouvido.
3. Em qualquer caso, o órgão de gestão deve tomar em consideração os argumentos apresentados, reflectindo devidamente sobre a pertinência dos mesmos".
Tal audição destina-se, nomeadamente, a acautelar os interesses dos trabalhadores visados pela decisão projectada pela entidade patronal, estabelecendo-se a obrigação de esta reflectir sobre os argumentos apresentados pelo órgão representativo e sua pertinência, por forma a que seja proferida uma decisão mais esclarecida e, porventura, mais equilibrada, face aos vários interesses em presença, porventura conflituantes.
Do exposto resulta que, no caso, era obrigatória a audição dos delegados sindicais da R. sobre a projectada transferência de posto de trabalho da A., em resultado da sua mudança de quadro e de categoria, e era obrigatória a ponderação dos argumentos que constassem de eventual resposta na sequência dessa audição.
Ou seja, embora tal resposta não fosse vinculativa para a R., como resulta do n.º 2 da cláusula em apreço, a referida audição prévia e a ponderação dos argumentos da resposta que fosse apresentada constituíam itens necessários à formação e prolação da respectiva decisão final por parte da R., o que significa que, ao contrário do defendido por esta, a falta de audição não constituía uma mera irregularidade, sem virtualidade para inquinar a decisão tomada, antes representava a preterição de uma formalidade indispensável, essencial, no processo de decisão, que afectava a perfeição e validade desta.
Por isso, com as instâncias, entendemos que a transferência da A. de posto de trabalho é ilegítima e que, como tal, lhe assiste o direito de exigir que a R. lhe atribua de novo as funções e a categoria de técnica comercial, com a reposição da sua situação no estado em que estaria se não tivesse ocorrido aquela modificação ilícita de funções.

No que toca às 2ª e 3ª questões - a de saber se a A. tem ou não direito a haver da R., a contar de Fevereiro de 2002 (data da alteração das suas funções para escriturária) e até que reassuma as funções de técnica comercial, as quantias que, no exercício destas funções, auferia a título de remuneração variável mensal (RVM) e de "rappel"; e a de saber se tem ou não direito a haver a quantia de 5.770,38 €, em que a R. foi também condenada, a título de diferenças salariais relativas ao cálculo da remuneração de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal , com base em tais RVM e "rappel":

Dispõe o art.º 82º da LCT:
"1. Só se considera retribuição aquilo a que, nos termos do contrato, das normas que o regem ou dos usos, o trabalhador tem direito como contrapartida do seu trabalho.
2. A retribuição compreende a remuneração de base e todas as outras prestações regulares e periódicas feitas, directa ou indirectamente, em dinheiro ou em espécie.
3. Até prova em contrário, presume-se constituir retribuição toda e qualquer prestação da entidade patronal ao trabalhador".
E é de referir que, como tem sido entendido, a regularidade e periodicidade previstas no n.º 2 se reportam à íntima ligação da retribuição à satisfação das necessidades do trabalhador, opondo-se à arbitrariedade na atribuição da prestação pelo empregador, facto este que frustraria qualquer legítima expectativa do trabalhador no sentido de com ela poder contar para a satisfação das suas necessidades.
Assim se excluindo do conceito de retribuição todas as prestações de carácter esporádico.
Ou, como se disse na sentença, abordando a previsão do transcrito n.º 2, "para se determinar o carácter retributivo das prestações da entidade patronal é necessário que se verifique uma certa regularidade no seu pagamento, isto é, que o pagamento seja efectuado de forma constante, denunciando a existência de uma regra, e uma certa periodicidade, ou seja que a prestação seja paga em períodos certos de tempo de modo a inserir-se na própria periodicidade típica do contrato de trabalho - neste sentido AC. STJ de 08/05/96, CJ STJ, Ano IV, Tomo II, pag. 252".
Há ainda que ter presente o disposto no art.º 88º da LCT, do seguinte teor:
"1. Não se consideram retribuição as gratificações extraordinárias concedidas pela entidade patronal como recompensa ou prémio pelos bons serviços do trabalhador.
2. O disposto no número anterior não se aplica às gratificações que sejam devidas por força do contrato ou das normas que o regem, ainda que a sua atribuição esteja condicionada aos bons serviços do trabalhador, nem àquelas que, pela sua importância e carácter regular e permanente, devam, segundo os usos, considerar-se como elemento integrante da remuneração daquele".

Feitas estas considerações introdutórias, vejamos o que se passa com as prestações que ora estão em causa.
Está provado que, enquanto técnica comercial, a A. auferia uma remuneração constituída por uma parte fixa, no valor de € 1 207,50, acrescida de "remuneração variável mensal" e "rappel".
A remuneração variável mensal é um prémio de produção atribuído face aos resultados mensais obtidos pelos trabalhadores comerciais em produtos definidos pela empresa, sendo atribuída conforme o grau de cumprimento dos objectivos, pretendendo constituir um incentivo de animação às redes comerciais.
E tais objectivos podiam, como aconteceu com a A., atingir-se independentemente dos períodos de férias desta, pois que também dependiam da produção dos mediadores por ela assistidos, sendo certo também que os parâmetros de atribuição da remuneração variável mensal variam com frequência, ou podem não existir.
E está provado que, a título de remuneração variável mensal, a A. recebeu em 1996, 1.321,82 euros; em 1997, 3.436,72 euros; em 1998, 2.339,36 euros; em 1999, 1,945,32 euros; em 2000, 4.489,20 euros e em 2001, 3 852,36 euros.
Sendo que os respectivos valores parcelares mensais são os que constam do mapa junto pela R. a fls. 39 e 40, do qual resulta que, no período de Agosto de 1996 - mês em que, ao que se deduz, foi iniciada a sua atribuição - a Dezembro de 2001, a A. só não recebeu prestações, a esse título, nos meses de Julho a Novembro de 1998, de Janeiro, Março, Abril, Agosto, Setembro e Dezembro de 1999, de Junho de 2000, e de Dezembro de 2001, ou seja não as recebeu em 13 desses 65 meses.

Por seu turno, o denominado "rappel" constituía, até ao ano de 2000, uma atribuição patrimonial paga aos trabalhadores comerciais externos em função dos resultados anuais obtidos pela rede comercial de mediação subordinada a cada trabalhador e quantificado com base em taxas pré definidas.
A partir de 2001, passou a ser designado de prémio de desempenho e a ser pago aos trabalhadores externos e chefias em função do grau de cumprimento de objectivos individuais anualmente fixados (contratos de objectivos individuais) e aos trabalhadores internos em função do grau de cumprimento de objectivos de grupo anualmente fixados (contratos de objectivos de grupo) e da avaliação hierárquico, sendo em ambos os casos pago anualmente e quantificado em salários, podendo os trabalhadores externos alcançar mais um salário que os internos.
E, a título de "rappel", a A. recebeu em 1996, 1.571,21 euros; em 1998, 2.072,80 euros; em 1999, 3.219,64 euros; em 2000, 3.342,34 euros e em 2001, 2.167,81 euros, sendo que, em 1997, nada recebeu.

Face ao apontado quadro factual, concordamos com a sentença, a que o acórdão recorrido aderiu, ao entender que:
- As atribuições patrimoniais em causa são de subsumir à previsão da 2ª parte do n.º 2 do acima transcrito art.º 88º da LCT e, em consequência, integram a retribuição devida pela R. à A., dado o seu conteúdo, objectivos, regularidade e permanência.
Como nela se referiu, a cadência (mensal quanto à RVM e anual quanto ao "rappel" (1), depois designado por prémio de desempenho) com que eram pagas, o lapso de tempo durante o qual foram pagas (pelo menos desde 1996), os respectivos valores que assumem um peso significativo susceptível de influenciar em larga medida o orçamento familiar da A., são suficientes para, justificar a convicção por parte da A. de inclusão no seu vencimento, considerando a respectiva regularidade e periodicidade, isto é, para que a A. tenha passado a contar com os respectivos valores.
Cabe aqui notar que o facto de ambas as atribuições dependerem do cumprimento de determinados objectivos, também individuais, anualmente pré-determinados pela R., não infirma esta conclusão na medida em que o carácter regular e periódico do seu pagamento, segundo os usos da empresa, que se retira da factualidade apurada é, por si só, apto a conferir-lhes a aludida natureza retributiva (2) .
- Por isso, a R. está obrigada a pagá-las à A., desde a alteração das funções desta em Fevereiro de 2002 e até à data em que ressuma as funções de técnica comercial.
- Tal retribuição variável deve ser determinada nos termos do art. 84º, nº 2 da L.C.T., ou seja tomando em conta a média dos valores recebidos nos últimos doze meses de execução do contrato.
E, assim, a média mensal a considerar é de € 501,68 (321,03 de RVM+180,65 de rappel).

Na revista, a R. suscita também a questão de que, a admitir-se que o actual "prémio de desempenho" também é retribuição, ele não deve acrescer à remuneração mensal da A., enquanto esta não retome as funções de Técnica Comercial, pelo facto de a A., enquanto trabalhadora interna, também o receber, o que aconteceu já nos anos de 2002 e 2003.
Isto sob pena de duplicação de retribuições.
Como vimos, subscrevemos a posição das instâncias sobre o carácter retributivo das atribuições em causa, sobre a consequente obrigação de a R. as pagar à A. e sobre o modo de determinar o montante atendível para o efeito, tendo-se apurado a referida média mensal global de € 501,68, correspondendo 321,03 à RVM e 180,65 ao rappel.
Conhecendo:
O acolhimento da posição defendida pela R. pressupunha a alegação e prova, que lhe cabia, em sede da presente acção declarativa (por se tratar de facto impeditivo do direito da A. - art.º 342º, n.º 2 do CC), de que a A. recebera, nos aludidos anos de 2002 e 2003 (mais precisamente, até ao encerramento da discussão em 1ª instância), como escriturária, verbas a título de prémio de desempenho que houvesse de deduzir-se, até como forma de evitar uma duplicação que redundaria num enriquecimento sem causa, à média mensal - que foi ponderada - do rappel de 2001 e que, como vimos, é de € 180,65.
Ora, a R. não fez tal alegação, oportunamente e em sede própria, nos autos (na contestação ou em articulado superveniente), o que compromete, desde logo, a sua pretensão, por não se estar perante factualidade de conhecimento oficioso.
Sendo que não supre essa não alegação a mera junção, a fls. 111 e 161 - em fase ulterior ao despacho de condensação - de recibos dos quais resultaria o recebimento pela A., em Abril de 2002 e de 2003, do prémio de desempenho.
Improcede, assim, a posição da R., a este respeito.

A sentença mandou atender também à referida média mensal global da RVM e do rappel no cálculo dos subsídios de férias e de Natal e à média mensal do rappel no cálculo das remunerações de férias, tendo obtido, a esse título, o valor total de € 5.770,38, em que condenou a R..
Esta insurge-se contra essa condenação, defendendo que tais atribuições patrimoniais não revestem a natureza de retribuição e que, por isso, não podem entrar em tais cálculos.
Conhecendo:
Já vimos acima que tais atribuições integram a parte variável da retribuição da A..
Mas entrarão nos ditos cálculos?
Segundo o art. 2º-1 do DL nº 874/76, de 28/12, "os trabalhadores terão direito a um período de férias remuneradas por cada ano civil".
Sendo que, de acordo com o disposto no seu art. 6º-1, "a retribuição correspondente ao período de férias não pode ser inferior à que os trabalhadores receberiam se estivessem ao serviço efectivo".
E determina, por sua vez o nº 2 deste art.º, que "além da retribuição mencionada no número anterior, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição".
Sendo que o n.º 3 da cláusula 35ª do CCT que vem sendo mencionado estabelece que "o subsídio de férias corresponde ao ordenado efectivo do trabalhador em 31 de Outubro do ano em que as férias são gozadas"
Por sua vez, dispõe o n.º 1 do art.º 2º do DL n.º 88/96, de 3 de Julho:
"Os trabalhadores têm direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição, que será pago até 15 de Dezembro de cada ano".
Sendo que o n.º 1 da cláusula 44ª do dito CCT preceitua:
"O trabalhador tem direito a uma importância correspondente ao seu ordenado efectivo, pagável conjuntamente com o ordenado do mês de Novembro".
Entendemos que, não obstante a diversa formulação literal, o sentido e alcance do n.º 3 da cláusula 35ª coincide, essencialmente, com a previsão do n.º 2 do art.º 6º do DL n.º 874/76, e do n.º 1 da cláusula 44ª com a previsão do n.º 1 do art.º 2º do DL n.º 88/96.

Como tem vindo a ser entendido, nem todas as retribuições entram no cálculo da remuneração de férias e dos subsídios de férias e de Natal.
A jurisprudência deste Supremo vem defendendo, de forma praticamente pacífica, face aos acima transcritos normativos legais - entendimento que não é abalado pelas mencionadas cláusulas do CCT - que, na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal, devem incluir-se todas as prestações regulares e periódicas pagas ao trabalhador como se ele estivesse em serviço efectivo, ou seja, como se ele estivesse a desempenhar o seu trabalho no concreto condicionalismo em que o costuma desempenhar (nomeadamente, condicionalismo de tempo e de risco, sem esquecer a sua antiguidade).
E que devem excluir-se de tal cômputo as prestações que são atribuídas ao trabalhador, não para retribuir o trabalho no condicionalismo em que é prestado, mas para o compensar de despesas que se presume que tenha que realizar por não se encontrar no seu domicílio, ou por ter que se deslocar deste e para este para executar o contrato de trabalho.
É o que sucede, por exemplo, com o subsídio de refeição, o subsídio especial de refeição, o subsídio de pequeno-almoço e o subsídio de transporte pessoal, que estão em correlação estrita com o tempo de trabalho efectivo (excluindo-se do seu ciclo anual a retribuição de férias e os subsídios de férias e de Natal).
Esses subsídios visam cobrir ou minorar as despesas que o trabalhador tem que suportar com a aquisição de almoço e pequeno-almoço, fora do seu domicílio, por virtude da prestação de trabalho e com o transporte do domicílio de e para o local de trabalho.
Destinam-se, pois, a fazer face a despesas concretas que o trabalhador presumivelmente tem que efectuar para executar o contrato, para "ir trabalhar", não constituindo um ganho acrescido para o mesmo, uma mais valia resultante da sua prestação laboral, razão pela qual não se justifica a sua inclusão na retribuição de férias e nos subsídios de férias e de Natal.

Aplicando este quadro ao caso dos autos, entendemos à semelhança das instâncias, que as prestações em causa, RVM e rappel, recondutíveis à figura genérica de prémios de produtividade e destinadas a premiar um bom desempenho profissional, são de computar nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal.
Isto porque se destinavam a retribuir o condicionalismo da prestação do trabalho, mais concretamente, na vertente dos bons resultados conseguidos pelo trabalhador e respectiva rede de mediação, acrescendo que, como se retira dos factos 22 e 25, os objectivos em causa podiam atingir-se independentemente dos períodos de férias da A., por também dependerem da produção dos mediadores por ela assistidos.
A sua finalidade não era, pois, compensar o A. de despesas que tivesse de efectuar em função do efectivo trabalho prestado.
Neste quadro, e face ao critério acima definido, é de atender a tais prestações no cômputo da retribuição de férias e dos subsídios de férias e de Natal, como decidiram as instâncias (3).
De todo o exposto, resulta que improcede o recurso da R., o que dita que não tenha de se conhecer da ampliação do objecto do recurso, requerida pela A..

V - Assim, acorda-se em negar a revista da R. e em confirmar o douto acórdão recorrido.
Custas da revista a cargo da R..

Lisboa, 24 de Maio de 2006
Mário Pereira (Relator)
Maria Laura Leonardo
Sousa Peixoto
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(1) - Refira-se que não afecta o carácter regular e permanente das atribuições em causa o facto de a RVM não ter sido paga à A. apenas em 13 meses de um total de 65 e o rappel em 1997, o que, certamente, se ficou a dever ao facto de, nos respectivos períodos, não terem sido obtidos os resultados de que dependia a sua atribuição.
(2) - No sentido defendido da natureza retributiva de tais atribuições, podem ver-se os acórdãos do STJ, 4ª Secção, de 8 de Maio de 1996, na CJ, STJ, ano IV, tomo II, 251, e de 8.7.2003, no Recurso n.º 1695/03, cujo sumário consta dos "Sumários da Secção Social do STJ, ano de 2003".
Cabe aqui referir que, face a pressupostos de facto diferentes, não é de chamar à colação, no sentido de se defender posição contrária à acima perfilhada, o acórdão deste Supremo, 4ª Secção, de 14.12.2005, proferido na Revista n.º 4126/04, cujo sumário consta dos referidos "Sumários", ano de 2005, a propósito de um denominado "rappel" ou prémio de produção, pago por uma empresa seguradora, aí R..
Nesse acórdão, rejeitou-se o carácter retributivo dessa atribuição patrimonial com fundamento, no essencial, na consideração de que os usos da empresa, consubstanciados na prática seguida, depois formalizada em Ordem de Serviço, afastavam a expectativa ou convicção do trabalhador da inclusão dessa prestação na sua retribuição, levando a concluir que ela era paga como uma efectiva gratificação., uma liberalidade remuneratória.
Ora, do que deixamos dito, tal circunstancialismo não se verifica no caso dos autos e daí, pelas razões apontadas, a posição perfilhada.

(3) - Nesse sentido, veja-se o já citado ac. do STJ de 8.7.2003.