Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
27/20.6YFLSB
Nº Convencional: SECÇÃO DO CONTENCIOSO
Relator: ROSA TCHING
Descritores: DELIBERAÇÃO DO PLENÁRIO DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
VICE-PRESIDENTE DO CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA
AUDIÊNCIA PRÉVIA
ANULABILIDADE
ACUMULAÇÃO DE FUNÇÕES
REMUNERAÇÃO
JUIZ
VIOLAÇÃO DE LEI
ERRO NOS PRESSUPOSTOS DE FACTO
PRINCÍPIO DA IGUALDADE
TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL
PRINCÍPIO DA CONFIANÇA
Data do Acordão: 02/24/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: AÇÃO ADMINISTRATIVA
Decisão: JULGADA IMPROCEDENTE A ACÇÃO.
Indicações Eventuais: TRANSITADO EM JULGADO
Sumário :

I. O direito à audição dos interessados, previamente à tomada de decisões administrativas suscetíveis de afetar os seus interesses, funda-se no princípio constitucional da participação dos cidadãos, ínsito no nº 5 do artigo 267º da Constituição da República Portuguesa, tem consagração expressa no artigo 121º do Código do Procedimento Administrativo.

II. A falta de audiência prévia, quando não seja legalmente dispensada, constitui preterição de formalidade essencial conducente, em regra, à anulabilidade da decisão administrativa,  nos termos do artigo 163º, nº 1 do Código do Procedimento Administrativo.

III. Sendo  a decisão  do Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura  objeto de impugnação administrativa  para o Plenário do Conselho Superior da Magistratura, a decisão administrativa final corresponde à deliberação do Plenário, pelo que, nesta situação, é  em relação a este ato final que deverá aferir-se se o interessado  teve, ou não, oportunidade de pronunciar-se sobre as questões relativamente às quais  foi omitida a audiência no  procedimento de primeiro grau.

IV. Apesar de, previamente à  decisão  do Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura, não ter sido facultada à autora a oportunidade para se pronunciar em sede de audiência prévia,  não ter sido  proferido qualquer despacho a justificar a dispensa da sua audiência prévia nem ter sido dado à autora prévio conhecimento  do provável teor da  decisão  do Senhor Vice-Presidente do CSM, se a autora, em sede de impugnação daquela decisão para o  plenário do CSM, pronunciou-se expressamente  sobre as questões relativamente  às quais era necessário assegurar a sua audição, impõe-se concluir que se mostra preenchida a situação prevista na alínea  b) do nº 5 do  art. 163º, do Código de Procedimento Administrativo, não operando, por força do “  princípio do aproveitamento do ato administrativo ”, o efeito anulatório  decorrente da preterição da audiência  prévia.

V. Não tendo a autora invocado, na impugnação, fundamentos diferentes daqueles que apresentou  na presente ação e não conduzindo os mesmos  à atendibilidade da sua pretensão,  é ainda de considerar  que a decisão administrativa impugnada  era a única concretamente possível, pelo que, nos termos do disposto na alínea c), do nº 5 do artigo 163º do CPA, fica também afastada a produção  do efeito anulatório  decorrente da preterição da audiência  prévia.

VI. Característica da situação dos juízes do Quadro Complementar é a sua disponibilidade para, em função de necessidades de serviço que possam surgir, poderem exercer funções em qualquer dos tribunais da respetiva área territorial de referência,  mediante decisão do C.S.M., pelo que, mesmo que tais necessidades impliquem a prestação de serviço simultaneamente em mais de um juízo ou tribunal, não há, nestes casos, trabalho “acrescido”. 

VII. A circunstância da autora, integrada  no Quadro Complementar de Juízes da Relação .....,  ter passado a exercer, por afetação  do Conselho Superior da Magistratura,  funções em mais do que um juízo ou tribunal da área territorial do respetivo Tribunal da Relação,  não lhe confere o direito à remuneração suplementar a que alude o  artigo 29º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, por, neste caso, não haver “acumulação de funções”  mas apenas e tão só trabalho compreendido na afetação a que foi sujeita.

VIII. O princípio da igualdade, contemplado no artigo no artigo 13º da Constituição da República Portuguesa não impede que se possa estabelecer diferenciações de tratamento desde que objetivamente justificadas por diferentes situações de facto.

IX. Nem o princípio da igualdade, na vertente trabalho igual salário igual, nem o princípio da tutela confiança, ínsito no artigo 2º da Constituição da República Portuguesa,  podem servir de fonte à ilegalidade, não constituindo, por isso, fundamento para reconhecimento  aos juízes colocados  no Quadro Complementar de Juízes do direito a uma  remuneração por “acumulação de funções”, que a lei não lhes confere.

Decisão Texto Integral:

Processo n.º 27/20.6YFLSB

***



ACORDAM NA SECÇÃO  DE CONTENCIOSO  DO

SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA

I.  Relatório

1.  AA, Juíza de Direito, veio, ao abrigo do disposto nos artigos 169º e seguintes do Estatuto dos Magistrados Judiciais  (EMJ) instaurar a presente ação contra o Conselho Superior da Magistratura (CSM).

Impugna a autora a Deliberação do Conselho Plenário do Conselho Superior da Magistratura de 07/07/2020, que decidiu negar provimento à reclamação apresentada pela Exmª Senhora Juíza de Direito Drª AA ao despacho proferido pelo Exmo. Senhor Vice-Presidente de 17 de março de 2020, que negou o pedido de pagamento da remuneração que a Srª Juíza reclamante entendeu ser-lhe devida por, no âmbito do Quadro Complementar de Juízes da Relação ......., ter exercido funções, em regime que reputou de “acumulação”, em mais do que um tribunal.

Pede que a ação seja julgada procedente e, em consequência, seja anulada a sobredita   deliberação anulada, com as legais consequências.

2. O Conselho Superior da Magistratura, contestou,  sustentando  a legalidade da deliberação em causa, que a finalidade visada com a  audiência prévia da autora, que foi preterida,  foi assegurada pela reclamação apresentada pela autora e a inexistência de violação de lei, por erro  nos pressupostos de facto e de direito, e dos princípios da retribuição, da igualdade e da proteção da confiança, concluindo pela improcedência da ação por falta de fundamento legal.

3. Findos os articulados, foi proferido despacho que, considerando que o  processo   já continha os elementos suficientes para o Tribunal, com segurança, conhecer de imediato da questão de facto e de direito da causa e que, no caso dos autos, já se mostrava plenamente assegurada a discussão de facto e de direito, dispensou a realização de audiência prévia, ao abrigo  do disposto nos arts. 27º, nº 1, al. a) e 87-B, nº 2, ambos do CPTA.

   

4.  Dados os vistos, cumpre apreciar e decidir.

***

II. Delimitação do objeto da ação

São as seguintes as questões suscitadas pela autora:

1ª-  Da preterição do direito de audiência prévia

2ª. Violação de lei, por erro nos seus pressupostos de factos, por violação do disposto nos artigos 29º e 45º-A do EMJ;

3ª. Violação dos princípios da igualdade  e da retribuição;

4ª- Violação do princípio da proteção da confiança.

***

III. Fundamentação

3.1. Fundamentação de facto

Tendo em atenção a posição das partes expressas nos seus articulados e  o acervo documental junto aos autos, está provada, com relevância para a decisão a proferir nos presentes autos e de acordo com as várias soluções de direito plausíveis, a seguinte matéria de facto:

1- Por deliberação do Plenário Ordinário do Conselho Superior da Magistratura, de 11/07/2018, que aprovou o movimento judicial ordinário de 2018, a Exma. Juíza de Direito AA, ora autora, foi colocada como efetiva no Quadro Complementar de Juízes (QCJ) ....... (Renovação de Comissão de Serviço em Quadro Complementar de Juízes .......), tendo tomado posse nesse lugar, em 05/09/2018.

2 - No âmbito da sua colocação no Quadro Complementar de Juízes do Distrito Judicial ....... e na sequência do movimento judicial ordinário de 2019, aprovado pela deliberação do Plenário do CSM de 09/07/2019, a autora, que nisso anuiu, foi afeta, desde 02/09/2019, ao Juízo Central de Família e Menores ......., Juiz …, e ao Juízo Central Cível ......., Juiz …, ambos da Comarca ......., em “substituição dos titulares por período ainda não determinado, realizando o serviço que resultar da distribuição a concertar com os demais juízes da comarca, com Sr. Juiz Presidente da Comarca ....... e se necessário, com a concertação da vogal do respectivo distrito”.

3 - De acordo com a distribuição do serviço efetivamente realizada, a autora passou a exercer funções no Juízo Central Cível ......., Juiz..., e, bem assim, a assegurar 50% do serviço do Juízo de Família e Menores ......., Juiz....

4 - Entretanto, desde 21/10/2019, na sequência de despacho do Ex.mo Senhor Vice-Presidente do C.S.M. de 25/10/2019, a autora passou a assegurar integralmente o serviço do Juiz... do Juízo Central de Família e Menores ......., bem como a tramitação e decisão de ¼ dos processos do Juiz... do Juízo Central Cível ........

5 - Em 14/01/2020, a autora dirigiu requerimento ao CSM requerendo o pagamento de remuneração pelo exercício de funções em regime de acumulação, ao abrigo do disposto no art. 29º do EMJ, na redação conferida pela Lei nº 67/2019, de 27 de agosto, nos seguintes moldes:

“Termos em que requer a V. Exa.

a) o pagamento de remuneração devida pela acumulação, na proporção de ¼ da remuneração devida ao Colega colocado no Juízo Central Cível .......,

b) sem prejuízo de imediato e desde Janeiro de 2020 ser remunerada já em 1/5, operando-se oportunamente os acertos para a remuneração de ¼, com efeitos retroactivos.”

- Em 17/03/2020 o Exmo. Senhor Vice-Presidente do CSM proferiu o seguinte despacho, do qual foi dado conhecimento à autora, através de email de 18/03/2020:

“Veio a Exm.ª Sr.ª Dr.ª NN requerer o pagamento de remuneração nos termos do seu requerimento que aqui se dá por inteiramente reproduzido.

Foi solicitado parecer ao GAVPM, que igualmente se dá por integralmente reproduzido.

Decidindo

Concorda-se inteiramente com o Parecer do GAVPM fazendo nossas as suas conclusões e fundamentos.

Deste modo e porque não assiste qualquer direito à Exm.ª Sr. Juíza em obter o pagamento que pretende vai indeferida a sua pretensão.

Notifique.”

6 - Tal despacho sustentou-se no Parecer do GAVPM de 25/02/2020, elaborado no procedimento n.º ……24, que teve o seu início no requerimento apresentado pela Ex.ma Juíza BB, colocada no Quadro Complementar do Distrito ......., através do qual pediu o pagamento da remuneração pelo exercício de funções em acumulação.

7 - Naquele Parecer, identificando-se como questão solvenda a de saber se um Juiz colocado no Quadro Complementar pode receber remuneração por acumulação de funções nos termos do art.° 29.° do EMJ, fez-se constar:

“2.2. Apreciando.

Como já referimos, a questão ora em análise prende-se em averiguar se a ora requerente tem direito a receber remuneração por acumulação nos termos do art.° 29.° do Estatuto dos Magistrados Judiciais (Lei n.° 21/85, de 30 de julho, na versão mais recente dada pela Lei n.° 67/2019, de 27 de agosto), o qual dispõe que: "Pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição que se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou 90 dias interpolados no mesmo ano judicial, ê devida remuneração, em montante a fixar pelo Conselho Superior da Magistratura, em função do grau de concretização dos objetivos estabelecidos para cada acumulação, tendo como limites um quinto e a totalidade da remuneração devida a magistrado judicial colocado no juízo ou tribunal em causa".

Da letra do art.° 29.°, do citado diploma legal, podemos, antecipadamente, concluir que apenas é devida remuneração pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição (sublinhado nosso).

Neste conspecto, o art.° 45.°-A, do EMJ, cuja epígrafe é "Reafetação de juízes, afetação de processos e acumulação de funções", dispõe o seguinte: "1 - O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente da comarca, e mediante concordância dos juízes, pode determinar:

a) A. reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca;

b) A afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços.

2- O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente de comarca, e mediante concordância do juiz pode determinar o exercício de funções de magistrados judiciais em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização, ponderadas as necessidades dos serviços e o volume processual existente.

3- As medidas referidas nos números anteriores não podem implicar prejuízo sério para a vida pessoal ou familiar do juiz têm como finalidade responder a necessidades de serviço, pontuais e transitórias, e devem ser fundadas em critérios gerais regulamentados pelo Conselho Superior da Magistratura, respeitando os princípios de proporcionalidade, equilíbrio de serviço e aleatoriedade na distribuição ".

Do preceito legal em análise resulta que tanto a reafectação de juízes a outro tribunal ou juízo, como a afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular (tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços), ou, ainda, o exercício de funções de magistrado judicial em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca, pressupõe previamente que o CSM obtenha a concordância do juiz visado e ter sido sob proposta ou ouvido o presidente da comarca (sublinhado nosso).

No que concerne à circunstância de a afetação, reafectação e acumulação de funções ser proposta ao CSM pelo Presidente do Tribunal, a Lei Orgânica do Sistema Judiciário (LOSJ, aprovada pela Lei n.° 62/2013, de 26.08) no art.° 94.°/4, als. f) e g) regula esta matéria da seguinte forma:

"(...) 4 -O presidente do tribunal possui as seguintes competências de gestão processual, que exerce com observância do disposto nos artigos 90.° e 91.°:f) Propor ao Conselho Superior da Magistratura a reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca ou a afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços; g) Propor ao Conselho Superior da Magistratura o exercício de funções de juízes em mais do que um tribunal ou juízo da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, ponderadas as necessidades dos serviços e o volume processual existente (...) ".

Por sua vez, para regulamentação dos princípios, critérios, requisitos e procedimentos a que deve obedecer a promoção pelo juiz presidente da comarca, de acordo com a competência prevista no artigo 94.°, n.° 4, alíneas f) e g), da Lei da Organização do Sistema Judiciário, o Conselho Superior de Magistratura, na sessão plenária de 15 de Julho de 2014, aprovou o «Regulamento do artigo 94.°, n.° 4, alíneas f) e g), da Lei n.° 62/2013», o qual sofreu alterações que vieram a ser aprovadas no Plenário de 24.04.2018, cuja deliberação (n.° 756/2018) foi publicada no Diário da República de 06.07.2018

O mencionado Regulamento, no seu art.° 2.°, define o que, para efeitos do mesmo, deve ser entendido por reafetação, afetação de processos e acumulação de funções da seguinte forma:

“Para efeitos deste regulamento considera-se:

a) Reafetação de juízes a tribunal ou juízo diverso da mesma comarca: O exercício de funções em tribunal ou juízo diverso da mesma comarca, com a interrupção das funções exercidas no tribunal ou juízo em que o juiz foi colocado ou para a qual foi destacado no movimento judicial;

b) Afetação de processos a juízo diverso do seu titular inicial: a atribuição de processos, para tramitação e despacho, que não decorra da distribuição inicial do processo na unidade orgânica ou de distribuição subsequente determinada por despacho judicial proferido nos autos, quer a mesma se reporte a juízes efetivos ou auxiliares;

c) Exercício de funções em mais de um tribunal ou juízo: a afetação do juiz a tribunal ou juízo no qual não foi colocado ou para a qual não foi destacado no movimento judicial, com a manutenção do exercício de funções no tribunal ou juízo onde foi colocado ou para a qual foi destacado no movimento; (...) ".

Mas, para além da reafetação de juízes, afetação de processos e acumulação de funções a que vimos fazendo referência, a lei prevê, ainda, o regime de substituição de juízes, o qual se encontra regulado na Lei Orgânica do Sistema Judiciário (LOSJ, aprovada pela Lei n.° 62/2013, de 26.08), no art.° 86.°, nos termos do qual "1 - Os juízes de direito são substituídos, nas suas faltas e impedimentos, por juiz ou juízes de direito da mesma comarca, por determinação do presidente do tribunal de comarca, de acordo com orientações genéricas do Conselho Superior da Magistratura".

A substituição dos juízes de direito é, assim, regulada, de forma geral e abstrata, na Lei de Organização do Sistema Judiciário, atribuindo-se aos presidentes dos tribunais de comarca o poder-dever de, na respetiva comarca e em função de orientações genéricas do CSM, designarem os juízes substitutos — art.° 94.°, n.° 3, al. d).

E no que tange a estas "orientações genéricas" do CSM, cumpre referir que na Sessão Plenária Extraordinária de 27 de Maio de 2014, o Conselho Superior da Magistratura deliberou quanto às orientações genéricas a estabelecer, mediante definição final do Exmo. Vice-Presidente (que aqui damos por inteiramente reproduzidas).

Em jeito de ponto de situação e analisados os regimes da afetação, reafetação, acumulação de funções e substituição de juízes, passamos agora para a análise do regime dos Juízes colocados no Quadro Complementar em geral, após o que nos deteremos a deslindar o caso em concreto. Relembrando, porém, que o art.° 29.° do EMJ apenas faz referência a situações de substituição e acumulação de funções, sendo que a ora requerente se encontra colocada no Quadro Complementar de Juízes (doravante apenas QCJ por razões de facilidade).

Avancemos, então.

O regime dos juízes que são nomeados para o quadro complementar de magistrados judiciais encontra-se regulado no art.° 45.°-B do EMJ, com a epígrafe "Quadro complementar de magistrados judiciais", o qual dispõe o seguinte:

"1 - Nas sedes dos tribunais da Relação pode ser criado um quadro complementar de magistrados judiciais para destacamento em tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar, ou quando o número ou a complexidade dos processos existentes o justifique.

2 - O quadro de magistrados judiciais referido no número anterior pode ser desdobrado ao nível de cada uma das comarcas.

3 - Os magistrados judiciais nomeados para o quadro, quando destacados para juízo situado em concelho diverso daquele em que se situa a sede do respetivo tribunal da Relação ou o domicílio autorizado, auferem ajudas de custo relativas aos dias em que prestam serviço efetivo, nos termos da lei geral.

4 - O número de magistrados judiciais a que se referem os n.ºs 1 e 2 é fixado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura.

5 - Cabe ao Conselho Superior da Magistratura efetuar a gestão do quadro referido nos n.ºs 1 e 2 e regular o destacamento dos respetivos magistrados judiciais".

A colocação dos Juízes no QCJ tem como unidade orgânica de referência a área territorial de cada um dos Tribunais da Relação, conforme resulta do Regulamento do Quadro Complementar de Juízes aprovado na sessão plenária do Conselho Superior da Magistratura de 17.01.2012, no domínio das Leis 3/99, de 13.01, e 52/2008, de 28.08.

Tal quadro de juízes tem como finalidade a afetação dos mesmos a tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes o justifiquem (n.° 1 do art.° 2.° do Regulamento citado).

Por sua vez, o QCJ da área de cada um dos Tribunais da Relação é preenchido na sequência de concurso, o qual terá lugar anualmente, aquando do movimento judicial e nele integrado, constituindo no concurso uma unidade orgânica à qual podem candidatar-se juízes de direito com, pelo menos, um ano de serviço efetivo e que tenham exercido funções em lugares de primeiro acesso (art.° 4.° do Regulamento citado). Sendo os juízes efetivos do QCJ nomeados em comissão de serviço pelo período de três anos, sucessivamente renováveis por períodos de igual duração (art.° 5.°/l).

Por outro lado, e no que respeita à sua remuneração, o Regulamento acima identificado, prescreve no art.° 10.°, n.° 1, que "Os juízes do Quadro Complementar nomeados auferem o vencimento correspondente ao que lhes competiria se exercessem funções como efetivos nos lugares a que são afetados e recebem ajudas de custo (...)".

Quanto à gestão dos Quadros Complementares rege o art.° 13.°, do Regulamento a que vimos fazendo referência, no sentido de que cabe ao Conselho Superior da Magistratura distribuir equitativamente os recursos existentes pelas diversas secções e tribunais de competência territorial alargada da área de cada Tribunal de Relação, com os critérios de afetação previstos no art ° 14.°.

Todavia, tal afetação dos juízes do quadro complementar pressupõe que a superação da situação em causa com recurso aos regimes de substituição, de afetação de processos ou de reafectação de juízes não se mostre adequada (n.° 2 do art.° 3.° do citado Regulamento).

Ou seja, sempre que se verifique uma situação de falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes o justifiquem, deve ser suprida nos termos do art.° 45.°-A do EMJ, por juízes não colocados no QCJ, através da reafectação de juízes a outro tribunal ou juízo da mesma comarca (al. a) do n.° 1 deste preceito); afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular (al. b) do n.° 1 do art.° 45.°-A do EMJ); acumulação do exercício de funções de magistrado judicial em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca nos termos previstos no n.° 2 do art.° 45.°-A do EMJ ou pelo regime de substituição previsto no art.° 86.°, n.° 1, da Lei 62/2013, de 26 de Agosto.

Assim, só se um desses mecanismos não for adequado a suprir a falta, é que será afetado um juiz colocado no QCJ.

Do cotejo dos vários regimes a que vimos fazendo referência - afetação, reafectação, acumulação, substituição e afetação dos juízes do QCJ — podemos dizer que cada um deles tem uma regulamentação diversa, com um campo de aplicação própria que não se pode confundir.

Para o que agora interessa e conforme já o referimos, o art.° 29.° do EMJ especifica que apenas o exercício de funções em regime de acumulação e de substituição, que se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou a 90 interpolados no mesmo ano judicial, dão lugar a remuneração.

Donde, apenas se se entender que a situação em análise, em que a ora requerente, colocada no QCJ, está afeta à totalidade de um juízo e a parte de outro, integra o regime de "acumulação de funções", nos termos e para os efeitos das disposições legais citadas, é que terá direito à remuneração prevista no art.° 29.° do EMJ.

Na verdade, a "acumulação de funções" a que se referem os art°s. 45.°-A do EMJ, 87.° da LOSJ e a Deliberação do CSM n.° 756/2018, pressupõe que o juiz exerça funções em mais de um tribunal ou juízo no qual não foi colocado ou para a qual não foi destacado no movimento judicial, com a consequente manutenção do exercício de funções no tribunal ou juízo onde foi colocado ou para a qual foi destacado no movimento.

Inversamente, como vimos, os juízes do QCJ são afetos a tribunais judiciais de primeira instância da área territorial do respetivo Tribunal da Relação onde foram colocados (sublinhado nosso).

Mais, nas situações de "acumulação" nos termos e para os efeitos definidos na lei, exige-se a concordância do juiz visado (sublinhado nosso). Circunstância não exigível para os juízes do QCJ, cuja afetação aos tribunais judiciais de primeira instância da área territorial do respetivo Tribunal da Relação onde foram colocados é feita de acordo com os critérios previstos no seu Regulamento e acima mencionados.

Por fim, não é de olvidar, a previsão do art.° 10.° do Regulamento do QCJP - Deliberação n.° 1729/2015, respeitante à remuneração e ajudas de custo específicas apenas para os juízes colocados no Quadro Complementar.

Isto posto, parece-nos não restarem dúvidas de que o regime da "acumulação de funções", nos termos e para os efeitos acima mencionados, não abrange as situações em que um juiz do QCJ esteja afeto à totalidade de um juízo e a parte de outro, dentro da área territorial do Tribunal da Relação onde se encontra colocado, como é o caso.

Donde, não estando a ora requerente numa situação de "acumulação de funções", mas tão só no exercício das funções inerentes ao lugar para o qual concorreu e foi nomeada — QCJ, não há lugar a qualquer suplemento remuneratório de acordo com o art.° 29.° do EMJ.

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3. Conclusão

De acordo com o exposto, sempre sem prejuízo de Superior entendimento, emite-se parecer no seguinte sentido:

- O art.º 29.º do EMJ apenas abrange as situações de “acumulação de funções” e “substituição de juízes”.

- Os juízes colocados no Quadro Complementar de Juízes quando afetos a mais de um juízo ou tribunal da área territorial do Tribunal da Relação onde estão colocados não estão a exercer funções em “acumulação de funções” nos termos e para os efeitos dos arts.45.º -A do EMJ, 87.º da LOSJ e da Deliberação do CSM n.º 756/2018, mas sim no exercício de funções inerentes ao lugar onde estão colocados;

- Tais conclusões permitem-nos sugerir, assim, o indeferimento da remuneração pedida”.

- A autora não foi notificada para se pronunciar sobre o Parecer que serviu de base à fundamentação do despacho do Ex.mo Senhor Vice-Presidente do CSM de 17/03/2020, nem sobre o sentido provável da decisão que veio a recair sobre o seu requerimento.

- Em 22/04/2020, a autora apresentou reclamação do despacho do Ex.mo Senhor Vice-Presidente do CSM de 17/03/2020 para o Conselho Plenário do CSM, contestando o teor do Parecer e alegando, em suma, a preterição do direito de audiência prévia, o vício de violação de lei, por violação, entre o mais, dos artigos 29º e 45º-A, do EMJ, e a violação dos princípios da retribuição, igualdade e da proteção da confiança.

- Por deliberação de 07/07/2020, pronunciou-se o Conselho Plenário do CSM sobre aquela reclamação, decidindo nos seguintes termos:

“II.- De direito

- São as seguintes as questões a decidir nesta impugnação:

i.- saber se o despacho impugnado padece de vício decorrente da preterição do direito de audiência prévia da Sr.ª Juíza impugnante;

ii.- saber se a Sr.ª Juíza de Direito tem direito à remuneração por acumulação de funções, por, apesar de integrada no Q.C.J., ter exercido funções em mais do que um tribunal.

*

I.- Da violação do direito da audiência prévia

O princípio da audiência prévia constitui uma dimensão do princípio da participação consagrado no art.º 12.º do C.P.A., nos termos do qual, em concretização da diretriz constitucional prevista no art.º 267.º, n.º 1 da C.R.P., os órgãos da administração pública devem assegurar a participação dos interessados na formação das decisões que lhes digam respeito.

Traduz, assim, o desiderato do legislador de, como refere J. Andrade da Silva, “criar expedientes jurídicos viabilizadores da participação dos administrados na tomada de decisões e deliberações”, consistindo “numa espécie de exercício de contraditório por parte dos particulares no procedimento tendente à tomada de uma decisão ou deliberação (…)”. Por via dele, “os interessados têm o direito de ser ouvidos, devendo, para isso, ser informados do sentido provável da decisão” (in Regime Jurídico das Empreitadas de Obras Públicas Anotado, Coimbra, Almedina, 7.ª ed., p. 287 e 288).

 Dispõe, a propósito do direito de audiência prévia, o art.º 121.º, n.º 1 do C.P.A. que os interessados têm o direito de ser ouvidos no procedimento antes de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.

De acordo com o n.º 2 deste preceito, os interessados podem pronunciar-se sobre todas as questões com interesse para a decisão, em matéria de facto e de direito, bem como requerer diligências e juntar documentos, sendo que, nos termos do n.º 3, a audiência suspende a contagem dos prazos em todos os procedimentos administrativos.

Para o efeito, de harmonia com o n.º 1 do art.º 122.º, o órgão responsável pela direção do procedimento determina, em cada caso, se a audiência se processa por forma escrita ou oral e manda notificar os interessados para, em prazo não inferior a 10 dias, dizerem o que se lhes oferecer.

Tal notificação, nos termos do n.º 2, fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito, indicando também as horas e o local onde o processo pode ser consultado.

No caso em apreço, invoca a Sr.ª Juíza que, na prolação do despacho alvo da sua impugnação, houve violação do direito de audiência prévia, por não ter sido precedido de notificação do respetivo projeto, assim se lhe coartando o direito de o contradizer e de se bater pela sua alteração.

Analisados os elementos constantes dos autos, conclui-se que, de facto, assim foi, uma vez que à Sr.ª Juíza não foi dado conhecimento prévio do despacho do Ex.mo Sr. Vice-Presidente do C.S.M., que indeferiu o seu pedido de pagamento da remuneração devida por aquilo que a Sr.ª Juíza considerou um exercício de funções em acumulação de serviço.

Pode-se considerar, assim, que houve, de facto, preterição de uma formalidade que deveria ter sido observada, o que, no caso, surge acentuado pelo facto de o despacho alvo da impugnação se ter estribado num parecer do GAVPM-CSM elaborado a propósito de um pedido congénere ao da Sr.ª Juíza formulado em procedimento diverso e, portanto, num elemento novo que não era do seu conhecimento.

A questão que se coloca é de saber se, constatada essa omissão, a mesma deve implicar a anulação do despacho alvo da impugnação ou se, pelo contrário, este deve ter-se por convalidado ou aproveitado.

E o certo é que se entende que, no caso, deve ser esta última – a da convalidação ou a do aproveitamento do despacho – a solução a dar à questão.

Assim, e em primeiro lugar, a violação do direito de audiência prévia acarreta a anulabilidade e não a nulidade do ato.

Com efeito, os atos nulos são os expressamente previstos no catálogo de atos que geram nulidade previsto nos n.ºs 1 e 2 do art.º 161.º do C.P.A. e dele não consta o da violação do direito de audiência prévia, pelo que o vício decorrente da violação desta formalidade é, por exclusão, nos termos do disposto no art.º 163.º, n.º 1 do mesmo código, o da anulabilidade.

Trata-se aqui de conclusão maioritariamente sufragada pela doutrina e pela jurisprudência, destacando-se, na doutrina, as posições de Freitas do Amaral (in Direito Administrativo, Vol. II, p. 233) e de P. Machete (in A audiência dos interessados no Procedimento Administrativo, Universidade Católica Editora, 2.ª ed. 1996, pp. 512 e seguintes) e, na jurisprudência, os Acórdãos do S.T.J. de 28-02-2018 e de 24-10-2019, proferidos nos processos n.º 81/17.8YFLSB e n.º 89/18.6YFLSB, respetivamente, bem como do S.T.A. de 26-09-2018, proferido no processo n.º 1506/17.8, todos disponíveis na internet, no sítio com o endereço www.dgsi.pt).

Enquanto ato anulável, pode o mesmo, por decorrência do denominado princípio do aproveitamento do ato, não produzir o efeito anulatório a que, à partida, tendia, o que ocorrerá uma vez verificada alguma das hipóteses previstas no n.º 5 do art.º 163.º do C.P.A..

Ora, um desses casos em que o efeito anulatório da anulabilidade se não produz é, de acordo com a alínea c) do preceito em consideração, aquele em que se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo.

Trata-se, neste caso, como se referiu no acórdão do S.T.J. de 24-10-2019 supra mencionado, de “realizar um juízo de prognose póstuma de acordo com o qual se conclui que, caso o demandante tivesse sido ouvido sobre todas as questões relevantes para a decisão a tomar, a deliberação do Plenário do C.S.M. seria tomada com o mesmo conteúdo”.

E será esse o caso do despacho do Ex.mo Sr. Vice-Presidente do C.S.M. aqui em apreciação.

Na verdade, o despacho em apreço, como decorre do seu teor literal, estribou-se, quanto aos fundamentos invocados para sustentar o indeferimento da pretensão da Sr.ª Juíza impugnante, no teor do parecer do GAVPM-CSM, que apreciou exatamente a mesma questão suscitada pela Sr.ª Juíza.

Subjacente à emissão de tal parecer, emitido a propósito de pedido congénere ao da Sr.ª Juíza, esteve o desiderato, não só de substanciar a apreciação jurídica da questão por forma a habilitar o C.S.M. a tomar a decisão mais acertada do ponto de vista do direito aplicável, como o de obter um critério orientador e, sobretudo, uniformizador das decisões a proferir sobre a questão.

O despacho sob impugnação assentou, assim, num critério decisório reforçado, em linha com aquela que, assente na especial autoridade do parecer enquanto documento técnico, constitui a orientação do C.S.M. sobre o tratamento jurídico a dar à questão, não só em específicos casos concretos como é o da Sr.ª Juíza, como em todos aqueles em que se suscite a mesma questão.

Ora, como se viu, a convalidação ou o aproveitamento do ato originariamente anulável verifica-se quando, realizado um juízo de prognose póstuma, se conclua que a decisão a tomar pelo Ex.mo Sr. Vice-Presidente do C.S.M. quanto ao pedido da Sr.ª Juíza impugnante sempre seria a mesma, independentemente da audição prévia desta.

No caso dos autos, havendo um parecer do GAVPM-CSM elaborado sobre a questão e que já instruíra a decisão a proferir num outro procedimento em que se debatia um pedido congénere ao da Sr.ª Juíza, resulta manifesto que, independentemente de qual fosse a tomada de posição da Sr.ª Juíza a respeito do parecer, sempre este, pelas razões expostas, seria acolhido no despacho impugnado, tal como veio a ocorrer.

Temos, pois, por comprovado, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo e, como tal, que o mesmo se tem por convalidado ou, dito de outro modo, deve ser aproveitado.

O vício da preterição do direito da audiência prévia também não teria um efeito invalidante do despacho alvo da impugnação pelas razões que, de seguida, serão expostas.

Como se viu, o n.º 5 do art.º 163.º do C.P.A. prevê um conjunto de situações em que a violação de formalidades legais na tomada de decisões pela autoridade administrativa não acarreta o efeito anulatório do ato que, à partida, esse vício acarretaria.

Trata-se, no fundo, do acolhimento em sede legal do denominado “princípio do aproveitamento do ato administrativo”, subjacente ao qual está, como refere Carlos José Batalhão, a ideia da “desconsideração de uma certa ilegalidade, de modo a que se possa aproveitar o ato praticado sob a sua invocação, nos casos em que se pode concluir sem margem para dúvidas que tal ilegalidade acabou por ser irrelevante para o sentido do ato, isto é, se pode concluir, com toda a segurança, que, de qualquer modo, e arredada a ilegalidade em casa, o ato sempre teria o mesmo conteúdo” (in Novo Código de Procedimento Administrativo - Notas Práticas e Jurisprudência, Porto Editora, p. 253).

Uma das situações em que esse efeito anulatório se não verifica é, como se viu, aquela em que o fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via (v. a alínea b) do n.º 5 do art.º 163.º).

Será o caso, de acordo com o Supremo Tribunal Administrativo, no seu acórdão STA-Pleno SCT, de 26 setembro 2018, proferido no processo n.º 1506/17, das situações em que “tendo sido omitida a audiência no procedimento de primeiro grau, o interessado teve a oportunidade de se pronunciar em procedimento de segundo grau”.

Ou seja, de acordo com o mesmo aresto, citando-se Diogo Leite de Campos, Benjamim Rodrigues e Jorge Lopes de Sousa, será “convalidado o acto primário que enferme de vício de violação do direito de audição se o interessado veio a utilizar meios de impugnação administrativa (reclamação graciosa ou recurso hierárquico) e neles acabou por ter oportunidade de se pronunciar sobre questões sobre as quais foi indevidamente omitida a audiência no procedimento de primeiro grau”.

Ora, no caso em apreço, ainda que a Sr.ª Juíza reclamante não tenha tido conhecimento do parecer que serviu de base à fundamentação do despacho alvo da presente impugnação e não lhe tenha sido notificado o projeto desse despacho, o certo é que, através da presente reclamação, inteirada já sobre o teor do parecer e o sentido do despacho, teve a oportunidade de esgrimir todos os argumentos que, na sua perspetiva, conduziriam à sua revogação.

O fim que, com a formalidade da audiência prévia da Sr.ª Juíza impugnante, se pretendia assegurar no que tange ao despacho sob impugnação, ou seja, o de lhe permitir exercer o contraditório sobre o sentido, que se antevia desfavorável, do despacho impugnado, veio, deste modo, a ser alcançado por outra via, designadamente, pelo da presente reclamação, no quadro da qual a Sr.ª Juíza de Direito, sem qualquer prejuízo para a sua esfera jurídica (note-se que a impugnação, nos termos do art.º 167.º-A do E.M.J., suspendeu os efeitos do despacho impugnado), teve a oportunidade de invocar todos os argumentos que, na sua perspetiva, conduziriam a decisão diversa da impugnada.

Ou seja, o despacho sob impugnação, deve ter-se, também por força da alínea b) do n.º 5 do art.º 163.º do C.P.A., por convalidado ou aproveitado.

Não há, pois, em suma, vício do ato a atender, assim improcedendo a reclamação da Sr.ª Juíza de Direito, no que diz respeito ao vício do despacho impugnado.

A Sr.ª Juíza invoca, também, como vício do despacho impugnado, o da violação da lei.

Os argumentos que invoca para sustentar tal alegação contendem, porém, com a análise do mérito da sua pretensão, pelo que será nessa sede que levaremos a cabo a sua apreciação.

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II.- Do direito da Sr.ª Juíza reclamante à remuneração por acumulação de funções

A questão que importa apreciar e decidir nesta impugnação é a de saber se o facto de a Sr.ª Juíza impugnante, integrada no Quadro Complementar de Juízes ......., exercer funções no Juízo de Família e Menores ......., Juiz... – assumindo a totalidade do serviço do Juízo – e, bem assim, no Juízo Central Cível ......., Juiz... – assumindo a tramitação e decisão de ¼ dos processos do Juízo – constitui um exercício de funções “em acumulação” que, nos termos do disposto no art.º 29.º do E.M.J., lhe confira direito à remuneração nele prevista.

De acordo com tal normativo (resultante da alteração do E.M.J. introduzida pela Lei n.º 67/2019, de 27/08), pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição que se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou a 90 dias interpolados no mesmo ano judicial, é devida remuneração, em montante a fixar pelo Conselho Superior da Magistratura, em função do grau de concretização dos objetivos estabelecidos para cada acumulação, tendo como limites um quinto e a totalidade da remuneração devida a magistrado judicial colocado no juízo ou tribunal da causa.

Da leitura de tal normativo resulta que o direito à remuneração nele prevista pressupõe o exercício de funções em regime de “acumulação” ou de “substituição”, pelo que saber se a Sr.ª Juíza de Direito tem direito à remuneração em causa pressuporá saber se as funções por si exercidas no Juízo de Família e Menores ....... e no Juízo Central Cível ....... o foram sob a veste de alguma destas figuras jurídicas.

Que o não foram a título de “substituição” é algo que se nos afigura poder ser dado por adquirido, uma vez que o serviço assegurado pela Sr.ª Juíza não se destinou, manifestamente, a substituir os juízes titulares, temporariamente, nas suas faltas e impedimentos (cfr. art.º 86.º, n.º 1 da Lei n.º 62/2013, de 26/08 - L.O.S.J.).

A resolução da questão que nos ocupa pressuporá, assim - aliás, em linha com a própria estrutura dada à reclamação pela Sr.ª Juíza impugnante, ao aludir única e exclusivamente à figura da “acumulação” para sustentar o seu pedido - saber se a execução do serviço nos dois tribunais consubstanciou uma “acumulação” de funções.

O regime da acumulação de funções está previsto no art.º 87.º da L.O.S.J., nos termos do qual, para além dos casos previstos na lei, pode o Conselho Superior da Magistratura determinar, sob proposta do presidente do tribunal de comarca, que um juiz exerça funções em mais de um tribunal ou juízo da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, ponderadas as necessidades do serviço e o volume processual existente. 

Tal preceito corresponde ao art.º 69.º, n.º 1 do diploma legal que, anteriormente à L.O.S.J., estabelecia a organização judiciária portuguesa (a Lei n.º 3/99, de 13/01 - LOFTJ), preceito este que, precisamente sob a epígrafe “acumulação de funções”, cometia ao Conselho Superior da Magistratura o poder de, a título excecional, determinar que um juiz, obtida a sua anuência, exercesse funções em mais de um juízo ou em mais de um tribunal, ainda que de circunscrição diferente.

 Este último normativo, por seu turno, correspondia ao art.º 84.º, n.º 3 da lei da organização judiciária nacional anteriormente vigente (a Lei n.º 38/87, de 23/12 – LOTJ), que já previa a possibilidade de o Conselho Superior da Magistratura, nos mesmos moldes anteriormente referidos, determinar o exercício de funções por juiz em mais do que um juízo ou tribunal.

Ora, do que acaba de ser exposto, podemos concluir que, mesmo do ponto de vista “histórico”, o instituto jurídico da “acumulação de funções” tem e sempre teve como nota dominante a possibilidade de um juiz, verificados determinados requisitos, exercer funções em mais de um tribunal ou juízo, além do seu próprio tribunal ou juízo.

Exercício de funções em acumulação por parte de juiz de direito existirá, assim, quando o mesmo juiz, a par do serviço que lhe incumbe executar no tribunal onde se encontra colocado e sobre o qual, em razão da colocação, detém jurisdição e competência, seja incumbido de executar, também, o serviço ou parte do serviço de outro tribunal, relativamente ao qual, não fora a respetiva afetação, não tinha jurisdição nem competência.

Considerada a acumulação de funções nesta perspetiva, importa agora ponderar se se pode subsumir à mesma o exercício de funções em mais do que um tribunal por juiz do Quadro Complementar.

O regime do Quadro Complementar de Juízes está previsto no art.º 88.º da L.O.S.J..

De acordo com o n.º 1 deste preceito, nas sedes dos tribunais da Relação podem ser criadas bolsas de juízes para destacamento em tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes o justifiquem, bolsas essas que, nos termos do n.º 2, podem ser desdobradas ao nível de cada uma das comarcas.

Uma vez criadas as bolsas, cabe ao Conselho Superior da Magistratura, de harmonia com o n.º 5 do mesmo preceito, efetuar a respetiva gestão e regular o seu destacamento.

O regime fixado em tal normativo, que corresponde ao do art.º 71.º, n.ºs 1 e 5 da anterior L.O.F.T.J., mostra-se replicado no art.º 45.º-B do E.M.J. e está refletido no art.º 2.º do Regulamento do Quadro Complementar de Juízes, aprovado pelo C.S.M. através da sua deliberação n.º 1729/2015 (publicada no D.R. 2.ª Série, n.º 174, de 07-09-2015).

Ora, da análise dos preceitos que acabam de ser referidos resulta, desde logo, que os juízes que integram o Quadro Complementar não estão adstritos a um concreto tribunal e, consequentemente, à tramitação e decisão dos processos nele pendentes, mas sim a um conjunto abstrato de juízes – uma bolsa –, destinado a colmatar necessidades de serviço que possam surgir, mediante a sua afetação, a realizar pelo C.S.M., ao concreto tribunal que dele careça.

Os Juízes do Quadro Complementar, pelo simples facto de pertencerem ao Quadro Complementar, não têm, assim, processos concretos sob a sua titularidade, sendo que só em função da sua alocação a um concreto tribunal pelo C.S.M., após constatação da sua necessidade por razões de serviço, é que passarão a ter jurisdição sobre os processos pendentes no tribunal ao qual sejam afetos.

Resulta, ainda, do mesmo regime que, tendo a bolsa que constitui o Quadro Complementar como área territorial de referência a do tribunal da Relação ou, em caso de desdobramento, a da Comarca, muito mais ampla se mostra a esfera territorial de intervenção dos juízes que o integram.

Estes, colocados que estão numa bolsa destinada a colmatar necessidades de serviço numa área correspondente ao tribunal da Relação ou da Comarca, como que têm uma competência potencial correspondente à da generalidade dos tribunais dessa área territorial, competência potencial essa que se concretizará a partir do momento em que o C.S.M., verificada uma concreta necessidade de serviço, o afete ao tribunal onde essa necessidade se verifique.

Característica da situação dos juízes do Quadro Complementar é, assim, a sua disponibilidade para, em função de necessidades de serviço que possam surgir, poderem exercer funções em qualquer dos tribunais da respetiva área territorial de referência, de acordo com aquilo que o C.S.M. decida a esse propósito, em função dos critérios legal e regulamentarmente fixados para o efeito.

Ora, partindo deste princípio, afigura-se-nos inelutável que o exercício de funções em mais de um tribunal por juiz do Quadro Complementar nunca poderá assumir a veste da acumulação de funções.

Na verdade, a acumulação de funções pressupõe, como se viu, que um juiz, além do serviço que lhe cumpre executar no tribunal onde está colocado, execute serviço doutro tribunal que, não fora a acumulação, não lhe competia executar.

Justifica-se, por isso, em se tratando de serviço acrescido ao seu, que lhe seja assegurada uma remuneração suplementar pela acumulação.

Ora, o juiz do Quadro Complementar, a partir do momento em que integra o Quadro Complementar, passa a estar numa situação de disponibilidade para, em função de necessidades de serviço que surjam, exercer funções, mediante decisão do C.S.M., em qualquer dos tribunais da respetiva área territorial de referência.

Deste modo, mesmo que tais necessidades impliquem a prestação de serviço simultaneamente em mais de um tribunal, tal facto mais não constituirá, como se concluiu no parecer do GAVPM-CSM que serviu de base à prolação do despacho impugnado, do que “o exercício de funções inerentes ao lugar onde estão colocados”.

Nesses casos não haverá trabalho “acrescido” relativamente àquele que ao juiz cumpria assegurar, mas sim trabalho compreendido na afetação a que foi sujeito, não fazendo sentido, por esse motivo, que lhe corresponda uma remuneração suplementar.

Volvendo ao caso em apreço, a Sr.ª Juíza reclamante, integrada que estava no Quadro Complementar de Juízes da Relação ......., foi afeta pelo C.S.M., no que aqui importa considerar, ao Juízo de Família e Menores ......., Juiz... e, bem assim, relativamente a ¼ do serviço correspondente, ao Juízo Central Cível ......., Juiz....

Sucede que, ao executar o serviço resultante dessa afetação, a Sr.ª Juíza mais não executou o serviço inerente ao lugar que ocupava, não havendo, assim, acumulação de funções que, à luz do disposto no art.º 29.º do E.M.J., justifique o pagamento de uma remuneração suplementar por esse facto.

Resta dizer que a tal conclusão não obsta qualquer dos argumentos expendidos pela Sr.ª Juíza na sua impugnação.

Na verdade, o art.º 29.º do E.M.J. não faz distinção entre o juiz que está e aquele que não está integrado no Quadro Complementar de Juízes, não porque com isso pretendesse dizer que também o primeiro teria direito à remuneração pela acumulação de serviço, mas porque tal distinção careceria de sentido, já que, tratando-se do exercício de funções inerentes ao lugar que ocupa, nunca a prestação de serviço em mais de um tribunal pelo mesmo consubstanciaria uma situação de acumulação de funções.

Por outro lado, tratando-se de funções inerentes ao lugar que ocupa, o serviço executado pelo juiz do Quadro Complementar em mais de um tribunal não corresponde a serviço acrescido, pelo que, mesmo que as ajudas de custo a que tem direito não assumam valor remuneratório, estará sempre assegurada a devida remuneração pelo serviço prestado, mediante o pagamento do vencimento correspondente ao lugar a que o juiz esteja afetado (v. art.º 10.º, n.º 1 do R.Q.C.J.).

Acresce que a afetação dos juízes do Quadro Complementar a determinado tribunal é, como se viu, tarefa da competência do C.S.M., que decide de acordo com critérios pré-determinados para o efeito (v. o art.º 3.º do R.Q.C.J.), pelo que se mostra irrelevante que o juiz dê ou não a sua anuência, não tendo aplicação ao caso o regime previsto no art.º 45.º-A do E.M.J..

De referir, ainda, que o regime do Quadro Complementar de Juízes é exaustivo e, dada a sua natureza, afasta, em função de tudo quanto foi dito, o exercício de funções em acumulação por juiz a ele pertencente, não havendo, por isso, lacuna que justifique a necessidade de recurso, por analogia, a qualquer outro preceito, nomeadamente ao art.º 21.º, n.º 2 da L.G.T.F.P., que preveja a respetiva remuneração.

Finalmente, ao exercício de funções por juiz do Quadro Complementar, mesmo que tal incida sobre serviço de mais de um tribunal, corresponde, como se viu, uma remuneração e uma compensação; o regime de fixação de tais contrapartidas é o mesmo para todos os juízes que integram o Quadro Complementar e que, por isso, estão em posição idêntica; e os termos do exercício de funções no âmbito do Quadro Complementar estão legal e regulamentarmente fixados de antemão, tratando-se, por isso, de regime com o qual os juízes que a ele acedem têm de contar.

Não há, por isso, com a solução perfilhada a propósito da questão em apreço, violação dos princípios constitucionais da retribuição, da igualdade e da proteção da confiança.

Improcederá, por conseguinte, a impugnação, com a consequente manutenção do despacho impugnado.

**

*

III.- Dispositivo

Termos em que o Plenário do Conselho Superior da Magistratura delibera negar provimento à presente impugnação, mantendo, consequentemente, na íntegra, o despacho do Ex.mo Sr. Vice-Presidente do C.S.M. impugnado.

Notifique.”.

7 - Com data de 11/04/2020, a Ex.ma Vogal do CSM emitiu a seguinte proposta:

“O estado de emergência em matéria de saúde pública (pandemia) decretado pela Organização Mundial de Saúde, em razão da propagação de infecções do aparelho respiratório de origem viral, causadas pelo agente Coronavírus (SARS-Cov-2 e COVID19), as recomendações daquela organização, o teor do Despacho 2836-A/2020, de 2.3.2020, dos Gabinetes das Ministras da Modernização do Estado e da Administração Pública, do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social e da Saúde, as orientações da Direcção Geral da Saúde (DGS) e a da Direcção Geral da Administração da Justiça (DGAJ), levaram à tomada de medidas de gestão excepcionais por parte do Conselho Superior da Magistratura no passado dia 11 de Março de 2020 (cfr. Divulgação n.° 69/2020 e respectivo aditamento)

(…)

Desta forma, auscultados os Senhores Juízes Presidentes Comarcas ...., ...., …., …., …. e …… e realizado o levantamento o número de diligências que foram realizadas neste período, conclui-se que as acumulações que têm em vista o reforço dos quadros e/ou a recuperação de pendências não se justificam enquanto durar o estado de emergência devendo, por isso, ficar suspensas até que seja declarada o termo da situação excepcional.

Por outro lado, é de concluir, pelos mesmos motivos, pela necessidade de um menor números de juízes, no caso em que os Exmos Senhores Juízes se encontrem a assegurar os Juízos em que o/a titular está ausente do serviço, por motivo de doença, gravidez de risco ou gozo de licença parental, bem como, aqueles em que os mesmos se encontrem em comissão de serviço. Na redução sugerida teve-se em consideração a carga processual suportada pelos Exmos Senhores Juízos, tendo por referência o serviço a assegurar nos termos das citadas leis e, bem assim, a data do início da acumulação continuando a ser assegurada pelos Senhores juízes que a iniciaram há mais tempo e/ou pelos Exmos Senhores Juízos do Quadro Complementar.

Em face do supra exposto, sugere-se que sejam suspensas, com efeitos a 14 de Abril de 2020 e enquanto vigorar o presente estado de emergência ou não for restabelecida a normal execução do serviço, as acumulações infra descritas sendo o serviço a ser assegurado da seguinte forma:

1. Comarca ....

-Juízo de competência Genérica .......:

Senhores Juízes CC (Juízo central cível e criminal .... -juiz ...), DD (Juízo central cível e criminal .... - Juiz...) e EE (Juízo Local Cível .... - Juiz...);

O serviço será assegurado pelo substituto legal Senhor Juiz FF, juiz do juízo de competência genérica ....., juiz …;

2. Comarca .......

-Juízo de Execução…..:

Senhora Juíza GG (Juízo Local Cível …. - juiz ..);

3. Comarca .......

-Juízo de Competência Genérica .....: 2/4 Senhora Juíza HH (juízo local cível ..... -Juiz...);

-Juízo de competência genérica .....:

Senhoras Juízas II (Juízo Central Cível ....... - Juiz...) e JJ (Juízo Local Cível ....... - Juiz...);

O serviço será assegurado pelo Exmo. Senhor Juiz KK (Juízo Local Cível ..... - juiz …);

- Juízo Central Cível .......:

Exmo Senhor Juiz LL (Juízo Central Cível ....... - juiz …), MM (Juízo Central Cível ....... - juiz … e Exma. Senhor Juíza NN; (juíza do Quadro Complementar afecta ao Juízo de Família e Menores .......)

O serviço será assegurado pela Exma. Senhora Juíza do Quadro Complementar OO.

4. Comarca ……

-Juízo de Competência Genérica …. – Juiz..:

PP (Juízo de Competência Genérica …..- Juiz...),

-Juízo Local Cível …… - Juiz …:

QQ (Juízo Competência Genérica …..)

5. Comarca ……

-Juízo local Cível …. - juiz …:

RR (juízo de competência genérica …..- Juiz...),

O serviço será assegurado pelas Exmas Senhoras Juízas SS e TT na proporção de metade,

- Juízo de execução …. - juiz … e …:

UU e  VV (juízo de comércio…., respectivamente, juiz 1 e 2).

Mais se sugere a cessação da acumulação de funções da Exma. Senhora Juíza WW (juízo competência genérica…..), com efeitos a 07 de Abril, uma vez que a mesma se encontra de baixa por gravidez de risco. Atenda-se às suspensões e cessação das acumulações para efeitos da remuneração a ser processada.”.

8 - Por despacho de 11/04/2020, o Ex.mo Senhor Vice-Presidente do CSM proferiu despacho de concordância com a proposta apresentada pela Ex.ma Vogal, de 11/04/2020, determinando que se procedesse em conformidade.

*

Motivação

A convicção do Tribunal quanto aos factos provados formou-se com base na análise crítica da documentação não impugnada junta aos autos e na factualidade  alegada e não  impugnada pela entidade demandada.

***

3.2. Fundamentação de direito

 Posto que o tribunal é o competente, não há nulidades que invalidem todo o processo, sendo este o próprio, as partes são legítimas, dotadas de personalidade e capacidade judiciárias e estão devidamente representadas em juízo e que inexistem outras exceções ou questões prévias que importe conhecer, impõe-se decidir as questões suscitadas pelo autora e que, tal como já se deixou  dito,  consistem em saber se:

1ª-  Da preterição do direito de audiência prévia;

2ª. Violação de lei, por erro nos seus pressupostos de factos, por violação do disposto nos artigos 29º e 45º-A do EMJ;

3ª. Violação dos princípios da igualdade e da retribuição;

4ª- Violação do princípio da proteção da confiança.

*

3.2.1. Da preterição do direito de audiência prévia.

Insurge-se  a autora  contra a deliberação impugnada na parte em que decidiu pela aplicabilidade, ao caso, do princípio do aproveitamento do ato, por considerar que, mesmo que tivesse sido concedido o direito de audiência prévia, a decisão  teria sido a mesma  e que o vício sempre ficaria sanado,  à luz do disposto no artigo 163º, nº 5, alínea b), do CPA, uma vez que  a mesma  exerceu o contraditório em sede de reclamação.

Assim, reiterando que não foi  ouvida  antes do indeferimento do seu requerimento  pelo SR. Vice-Presidente do CSM, persiste  na defesa de que foi  preterida a garantia de audiência prévia à deliberação  impugnada, que, por padecer de vício de lei,  não pode deixar de ser anulada, nos termos  do disposto no art. 163.º, n.º 1 do CPA.

Mais sustenta que, contrariamente ao decidido, não pode entender-se que o ato a praticar seria sempre  o mesmo, pois, à data, o projeto de regulamento dos critérios gerais  para a afetação de processos, para a reafectação de juízes e para a acumulação de funções pelos juízes,  previsto no art. 45º-A, da Lei nº 67/2019, de  27 de agosto ( que procedeu à alteração da Lei nº 21/85, de 30 de julho e aprovou o Estatuto dos Magistrados Judicias), encontrava-se  em fase de preparação, para posterior discussão, a 26.06.2020, pelo que o parecer emitido pelo GAVPM-CSM não se revelava  ser suficientemente  ser suficientemente sólido no que respeita à definição dos  critérios gerais para a acumulação de funções pelos juízes.

E sustenta  ainda que  a presente situação  também não se enquadra  na previsão  na al. c), do nº 5 do art. 163º do CPA, porquanto,  definindo a lei no que consiste a acumulação do exercício de funções, estamos perante o exercício de poderes vinculados ainda que  com margem de discricionariedade e, neste caso, só se pode lançar mão  do princípio do aproveitamento  do ato se se puder concluir, com inteira segurança, num juízo de prognose póstuma, que a decisão administrativa impugnada  era a única concretamente possível.      

Diferentemente e não obstante reconhecer, como se afirma na deliberação impugnada,  que à autora « não foi dado conhecimento prévio do despacho do Ex.mo Sr. Vice-Presidente do C.S.M. que indeferiu o seu pedido de pagamento da remuneração devida por aquilo que a Sr.ª Juíza considerou um exercício de funções em acumulação de serviço» e que « houve, de facto, preterição de uma formalidade que deveria ter sido observada, o que, no caso, surge acentuado pelo facto de o despacho alvo da impugnação se ter estribado num parecer do GAVPM-CSM elaborado a propósito de um pedido congénere ao da Sr.ª Juíza formulado em procedimento diverso e, portanto, num elemento novo que não era do seu conhecimento»,   persiste o CSM na defesa de que, in casu, deve ser rejeitado o efeito anulatório da deliberação impugnada por aplicação do princípio do aproveitamento do ato administrativo previsto nas als. b) e c)  do  n.º 5  do art. 163º do CPA.

Vejamos

O direito à audição dos interessados, previamente à tomada de decisões administrativas suscetíveis de afetar os seus interesses, funda-se no princípio constitucional da participação dos cidadãos, consagrado no nº 5 do artigo 267º da Constituição da República Portuguesa, que determina que «o processamento da atividade administrativa será objeto de lei especial, que assegurará […] a participação dos cidadãos na formação das decisões ou deliberações que lhes disserem respeito».

Este  princípio da participação  tem também  consagração expressa no artigo 12.º do CPA, que impõe aos órgãos da  Administração Pública a obrigação de assegurar «[…] a participação dos particulares, bem como das associações que tenham por objeto a defesa dos seus interesses, na formação das decisões que lhes disserem respeito, designadamente através da respetiva audiência nos termos deste Código».

Em consonância com este princípio, o artigo 121º do CPA, consagra o direito de audiência prévia, estabelecendo:

« 1. Sem prejuízo do disposto no artigo 124º, os interessados têm o direito a ser ouvidos  no procedimento antes  de ser tomada a decisão final, devendo ser informados, nomeadamente, sobre o sentido provável desta.

2. No exercício do direito de audiência, os interessados podem pronunciar-se sobre todas as questões com interesse para a decisão, em matéria de facto  e de direito bem como requerer diligências complementares e juntar documentos.

(…) ».

E, para efeitos do disposto neste artigo, dispõe o art. 122º do CPA, no seu nº 1 que « (…)  o órgão responsável pela direção do procedimento determina, em cada caso, se a audiência se processa por forma escrita ou oral e manda notificar os interessados para, em prazo não inferior a 10 dias, dizerem o que se lhes oferecer», estipulando o  nº 2 deste mesmo artigo que  «a notificação fornece o projeto de decisão e demais elementos necessários para que os interessados possam conhecer todos os aspetos relevantes para a decisão, em matéria de facto e de direito, indicando também as horas e o local onde o processo pode ser consultado.”.

Como referem Fernanda Paula Oliveira e José Eduardo Figueiredo Dias[1], « (…) a Administração está hoje obrigada a elaborar um projeto de decisão devidamente fundamentado, projeto esse que será comunicado ao interessado para que este se pronuncie sobre ele, só depois devendo a Administração tomar a decisão final».

O objetivo subjacente à consagração desta formalidade legal, autonomizada na estrutura do procedimento pelo CPA (artigos 121.º a 125º ), é, segundo Pedro Machete[2], o de «  proporcionar aos interessados a possibilidade de se pronunciarem sobre o objeto do procedimento, a fim de chamarem a atenção do órgão competente para a decisão da relevância de certos interesses ou pontos de vista », pelo que « sempre que a decisão final resulte de uma escolha entre alternativas, de atuação de um “ espaço de conformação administrativa” e que, portanto, não seja a única decisão concretamente possível, há de reconhecer-se aos interessados a possibilidade de, através da respetiva audiência, influírem  na determinação do seu sentido» .

Para a maioria da doutrina,  sufragada pela jurisprudência dos tribunais superiores desta jurisdição e da jurisdição administrativa, os «direitos» de audiência prévia e de participação dos interessados constituem afloramentos de um princípio estruturante da lei especial sobre o processamento da atividade administrativa, traduzindo a intenção legislativa de atribuição de um «direito subjetivo procedimental»[3].

Assim, salvo os casos de dispensa da sua realização  previstas  no  n.º 1 do artigo 124.º do CPA[4] e que, nos termos do nº 2 deste mesmo artigo, a Administração fica obrigada  a justificar, a audiência dos interessados traduz-se numa garantia transversal a todos os procedimentos administrativos,  constituindo a sua omissão, no dizer de  Luís Cabral de Moncada[5], violação de uma formalidade essencial do ato e nada impede  que a decisão final que foi tomada sem audiência prévia seja impugnada  com fundamento em vício de forma.

Ora, resultando claro da factualidade provada que a decisão  do Senhor Vice-Presidente do CSM   que indeferiu  o pedido formulado pela autora de pagamento  da remuneração devida pelo  exercício de funções em acumulação de serviço não foi precedida da formalidade a que alude o art. 121º do CPA, que não foi  proferido, em qualquer momento, despacho fundamentado a dispensar a audiência prévia da autora e que não foi dado a esta prévio conhecimento  do provável teor daquela  decisão, evidente se torna, como, aliás,  reconhece o próprio CSM, que houve preterição do direito de audição prévia.

E se é certo estar a doutrina dividida quanto à questão de saber se a violação do direito de audiência prévia  constitui fundamento  de nulidade ou de anulabilidade do procedimento,  a verdade é que, no caso dos autos, não se vislumbra qualquer interesse em aprofundar esta problemática  posto que quer a autora, quer a entidade demandada perfilham, tal como nós,  o entendimento seguido maioritariamente pela jurisprudência da Secção do Contencioso deste Supremo Tribunal[6] e do Supremo Tribunal Administrativo[7],  que a violação do direito de audiência prévia  não acarreta a nulidade da decisão administrativa, determinando, antes, a sua anulabilidade,  nos termos do art. 163º, nº1 do CPA.

Assente, no caso dos autos, que, previamente à decisão do Sr. Vice-Presidente  do CSM não foi respeitada a exigência de audiência prévia da autora, nos termos do nº 1 do artigo 121º do CPA, nem foi cumprida a exigência de fundamentação para a dispensa da audiência prévia, prevista no nº 2 deste mesmo  artigo e que a preterição destas formalidades tornariam o ato anulável, vejamos, então, se, tal como pretende a autora, há lugar à produção desse efeito anulatório.

Dispõe o artº 163º, nº 2, do CPA, que « o ato anulável produz efeitos jurídicos, que podem ser destruídos com eficácia retroativa se o ato vier a ser anulado por decisão proferida pelos tribunais administrativos ou pela própria Administração».

Decorre, assim, do preceituado neste artigo que o ato anulável, embora inválido, é juridicamente eficaz, produzindo efeitos jurídicos como se fosse válido até ao momento em que venha a ser anulado[8].

E, por outro lado, que a anulação contenciosa de um ato administrativo tem efeitos retroativos, tudo se passando na ordem jurídica como se o ato nunca tivesse sido praticado[9].

Mas, à parte esta regra, situações excecionais  existem em que o legislador permite que tais efeitos anulatórios não se produzam.

É o que acontece  nas situações  previstas no nº 5  deste mesmo  art. 163º, que estabelece que « Não se produz o efeito anulatório quando:

a) O conteúdo do ato anulável não possa ser outro, por o ato ser de conteúdo vinculado ou a apreciação do caso concreto permita identificar apenas uma solução como legalmente possível;

b) O fim visado pela exigência procedimental ou formal preterida tenha sido alcançado por outra via;

c) Se comprove, sem margem para dúvidas, que, mesmo sem o vício, o ato teria sido praticado com o mesmo conteúdo».

No dizer  de  Eliana de Almeida Pinto, Isabel Silva e Jorge Costa[10], consagra esta norma  “ o princípio do aproveitamento do ato administrativo ”, evitando-se  o efeito anulatório do ato:

i) sempre que a Administração, no uso de poderes vinculados, ou no exercício de poderes discricionários, mas cuja discricionariedade esteja reduzida a zero, pratique um ato inválido, mas cujo conteúdo não possa ser diferente [alínea a)];

ii) se o ato inválido o for por preterição de formalidades legais, mas se se demonstrar que no caso concreto o fim último que aquelas formalidades visam assegurar tiver sido assegurado por outro meio, a Administração pode degradar essa(s) formalidade(s) essencial(ais) em formalidade(s) não essencial(ais) [alínea b)];

iii) se a Administração no uso de poderes discricionários praticou um ato inválido, mas que, ainda que respeitasse o bloco de legalidade atingido que gerou a anulabilidade do ato, o ato seria exatamente o mesmo [alínea c)].

É, assim, perante este quadro legal que importa  verificar  se assiste razão ao CSM quando afirma que o efeito anulatório do ato deve ser rejeitado, por se mostrar verificado  o regime excecional previsto nas alíneas b) e c)  do nº 5 do citado   art. 163º, ou seja, por o direito de audiência prévia do interessado/autora ter sido assegurado mediante a própria reclamação por si apresentada e/ou por o exercício desse direito  não poder influenciar de modo algum a decisão, o que tudo exige um exame casuístico, de análise das circunstâncias particulares e concretas de cada caso.

Começando por abordar o regime contido na al. b) do nº 5 do citado art. 163º, importa realçar que, conforme  resulta do disposto nos arts. 153º, nº 1, al. b), 154º, nº 1 e 158º, todos do EMJ, o Vice-Presidente do Conselho Superior da Magistratura exerce as funções que, por subdelegação do Presidente, o CSM tenha delegado neste e que, nos termos do estabelecido nos arts. 164, nº1 e  166º, nºs 1 e 2, al. c) do mesmo diploma legal, as decisões do Vice‑Presidente são passíveis de impugnação administrativa  para o Plenário do CSM, sendo certo que, de harmonia com o estabelecido no art. 169º do EMJ,  apenas as deliberações deste órgão são impugnáveis contenciosamente, por via de ação administrativa  prevista no CPTA.

Podemos assim dizer, na esteira dos ensinamento de  Diogo Freitas do Amaral[11],  que, nas situações deste tipo, estamos perante um procedimento  administrativo de 1º grau, “tendente à prática de um ato primário”, ou seja, de uma  decisão de 1º grau – no caso o despacho proferido pelo Sr. Vice-Presidente do CSM, em 17.03.2020 e que  indeferiu o pedido  formulado pela autora de pagamento da remuneração devida por aquilo que a Sr.ª Juíza considerou um exercício de funções em acumulação de serviço – a que se seguiu, por força da impugnação apresentada pela autora em 22.04.2020, um procedimento administrativo de 2º grau, que culminou  com a deliberação do Plenário do CSM, de 07.07.2020 que decidiu  negar provimento àquela impugnação, mantendo, na íntegra, o despacho impugnado, o que tudo significa que, no caso dos autos, o ato administrativo apenas se tornou definitivo  com a deliberação do Plenário do CSM.

E se é certo, tal como já se deixou dito, que, em momento algum do procedimento administrativo de 1º grau  foi facultada à autora a oportunidade para se pronunciar em sede de audiência prévia e que  não  foi  proferido qualquer despacho a justificar a dispensar a audiência prévia da autora nem  foi dado a esta prévio conhecimento  do provável teor da  decisão  do Senhor Vice-Presidente do CSM   que indeferiu  o pedido formulado pela autora de pagamento  da remuneração devida pelo  exercício de funções em acumulação de serviço, certo é também, ter a autora, em sede de procedimento administrativo de 2º grau, contestado o  teor do parecer  do GAVPM-CSM e invocado a preterição do direito de audiência prévia, o vício de violação  da lei, designadamente, do arts. 29º e 45º-A, do EMJ, e a violação dos princípios da retribuição, igualdade da proteção da confiança, questões estas  que foram apreciadas e decididas na  deliberação do Plenário do CSM, de 07.07.2020 e que são as mesmas invocadas na presente ação.

Dito de outro modo,  na sua impugnação, a ora autora contrapôs as suas razões de facto e de direito quanto ao teor da decisão do Vice-Presidente do CSM, pronunciando-se expressamente  sobre as questões relativamente  às quais era necessário assegurar a sua audição, tendo tido, por isso, a oportunidade de participar  na formação  da decisão administrativa final, ou seja, na deliberação do Plenário do CSM, de 07.07.2020,  atingindo dessa forma o fim visado com o direito de audiência prévia que lhe havia sido preterido.

E sendo assim, impõe-se concluir que se mostra preenchida a situação prevista na al. b) do nº 5 do citado art. 163º, visto que a exigência procedimental de audiência prévia  foi alcançada  com a impugnação.

De acordo com a orientação consolidada quer da  doutrina[12], quer a jurisprudência  da  Secção de Contencioso deste Supremo Tribunal[13] e do Supremo Tribunal Administrativo[14], estamos perante uma situação  em que, por força do “  princípio do aproveitamento do ato administrativo ”, é de  admitir  que não  se produz  o efeito anulatório da preterição do direito de audiência prévia, por esta se tornado numa formalidade não essencial na medida em que foi dada satisfação aos interesses que a lei tinha em vista ao prevê-la.

Mas, a verdade é que, no caso dos autos, o efeito anulatório decorrente da preterição da audiência  prévia da autora  ficaria também  afastado nos termos da al. c) do nº 5 do  art. 163º do CPA, pois, tal como se demonstrará no ponto 3.2.2, face aos  regimes jurídicos do QCJ e da acumulação de serviço expressamente previstos no EMJ e na LOSJ, a decisão do CSM a incidir sobre o requerido pela autora só poderia ser  a do seu indeferimento,  ou seja, a de considerar, como considerou, que ao executar o serviço resultante da sua  afetação  ao Juízo de Família e Menores ......., Juiz... e relativamente a ¼ do serviço correspondente, ao Juízo Central Cível ......., Juiz..., a ora autora  « mais não executou do que  o serviço inerente ao lugar que ocupava, não havendo, assim, acumulação de funções  que, à luz do disposto no art.º 29.º do E.M.J., justifique o  pagamento de uma  remuneração suplementar por esse facto».   

 

Daí ser de concluir que, mesmo que a autora tivesse sido ouvida antes do despacho de indeferimento proferido pelo Sr. Vice-Presidente do CSM, este  teria, sem dúvida,  o mesmo conteúdo, improcedendo, neste segmento, a pretensão impugnatória da demandante.

***

3.2.2. Do vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos de factos, por violação do disposto nos artigos 29º e 45º-A do EMJ.

Alega a autora que a deliberação impugnada padece de vício de violação de lei, por erro nos seus pressupostos de factos e por violação do disposto nos artigos 29º e 45º-A do EMJ, devendo ser anulada nos termos do disposto no art. 163.º do CPA.

A este respeito, ensina Diogo Freitas do Amaral[15], que  o vício de “violação de lei”  consistente na discrepância entre o conteúdo ou objeto do ato e as normas jurídicas que lhe são aplicáveis, configura uma ilegalidade de natureza material, na medida em que é a própria substância do ato administrativo que contraria a lei, e   produz-se normalmente quando, no exercício de poderes vinculados, a Administração decide coisa diversa do que a lei estabelece ou nada decide quando a lei manda decidir.

Integram-se neste vício, quer o erro nos pressupostos de facto, definido na jurisprudência[16],  como sendo o vício consistente  na discrepância entre os pressupostos factuais que se revelarem determinantes para a decisão e aqueles que efetivamente se verificam, quer o erro de direito, que, no dizer de Marcela Caetano[17], consiste na interpretação ou aplicação indevida da regra de direito.

Daí que o vício de  erro nos pressupostos de facto não seja suscetível de ser confundido com o erro de direito  nem com a diferente perspetiva que o demandante tenha acerca dos factos comprovados, pois tal como constitui entendimento consolidado  na jurisprudência[18], para que proceda a sua invocação, «o impugnante tem o ónus de invocar os factos que compõem a realidade que tem como verdadeira e demonstrar que os factos nos quais a administração se baseou não existiam ou não tinham a dimensão por ela suposta, havendo ainda que averiguar a concreta relevância do erro para a decisão que veio a ser tomada».

Sustenta a autora que a circunstância de ter assegurado integralmente o serviço do Juiz... do Juízo Central de Família e Menores ......., bem como a tramitação e decisão de ¼ dos processos do Juiz... do Juízo Central Cível ......., constitui exercício de funções em acumulação, o que lhe confere o direito à remuneração prevista no art. 29.º do EMJ (Lei n.º 21/85, de 30 de julho, na redação da Lei n.º 67/2019, de 27 de agosto).

Mas, em nosso entender, sem razão

Senão vejamos.

Dispõe o citado art. 29º  que « Pelo exercício de funções em regime de acumulação ou de substituição que se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou 90 dias interpolados no mesmo ano judicial, é devida remuneração, em montante a fixar pelo Conselho Superior da Magistratura, em função do grau de concretização dos objetivos estabelecidos para cada acumulação, tendo como limites um quinto e a totalidade da remuneração devida a magistrado judicial colocado no juízo ou tribunal em causa».

Por sua vez, o regime da acumulação de funções, encontra-se previsto nos artigos 87.º e 94.º, n.º 4, alíneas f) e g) da Lei de Organização do Sistema Judiciário (LOSJ - Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto).

Na parte que aqui releva, estabelece  o citado art. 87.º,  que:

«1 - Para além dos casos previstos na lei, o Conselho Superior da Magistratura pode determinar, sob proposta do presidente do tribunal de comarca, que um juiz exerça funções em mais de um tribunal ou juízo da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, ponderadas as necessidades do serviço e o volume processual existente.

2 - O exercício de funções a que alude o número anterior confere apenas direito a ajudas de custo e ao reembolso das despesas de transporte em função das necessidades de deslocação nos termos da lei geral.

(…)»

E preceitua o  referido art. 94.º que :

« (…)

4 - O presidente do tribunal possui as seguintes competências de gestão processual, que exerce com observância do disposto nos artigos 90.º e 91.º:

(…)

f) Propor ao Conselho Superior da Magistratura a reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca ou a afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços;

g) Propor ao Conselho Superior da Magistratura o exercício de funções de juízes em mais do que um tribunal ou juízo da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, ponderadas as necessidades dos serviços e o volume processual existente».

Na sessão Plenária de 15/07/2014 do CSM foi aprovado o Regulamento do artigo 94.º, n.º 4, alíneas f) e g), da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto (LOSJ), que viria a ser alterado por deliberação do Conselho Plenário do CSM de 24/04/2018 (Deliberação (extrato) n.º 756/2018), cujo  art. 2.º, alíneas a) a c), estipula que:

« Para efeitos deste regulamento considera-se:

a) Reafetação de juízes a tribunal ou juízo diverso da mesma comarca: O exercício de funções em tribunal ou juízo diverso da mesma comarca, com a interrupção das funções exercidas no tribunal ou juízo em que o juiz foi colocado ou para a qual foi destacado no movimento judicial;

b) Afetação de processos a juiz diverso do seu titular inicial: a atribuição de processos, para tramitação e despacho, que não decorra da distribuição inicial do processo na unidade orgânica ou de distribuição subsequente determinada por despacho judicial proferido nos autos, quer a mesma se reporte a juízes efetivos ou auxiliares;

c) Exercício de funções em mais de um tribunal ou juízo: a afetação do juiz a tribunal ou juízo no qual não foi colocado ou para a qual não foi destacado no movimento judicial, com a manutenção do exercício de funções no tribunal ou juízo onde foi colocado ou para a qual foi destacado no movimento».

Com a entrada em vigor da revisão introduzida ao EMJ pela Lei n.º 67/2019, de 27 de agosto, o aditado art. 45.º-A, sob a epígrafe “Reafetação de juízes, afetação de processos e acumulação de funções”, passou a dispor:

« 1 - O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente da comarca, e mediante concordância dos juízes, pode determinar:

a) A reafetação de juízes, respeitado o princípio da especialização dos magistrados, a outro tribunal ou juízo da mesma comarca;

b) A afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, tendo em vista o equilíbrio da carga processual e a eficiência dos serviços.

2 - O Conselho Superior da Magistratura, sob proposta ou ouvido o presidente de comarca, e mediante concordância do juiz, pode determinar o exercício de funções de magistrados judiciais em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca, respeitado o princípio da especialização, ponderadas as necessidades dos serviços e o volume processual existente.

3 - As medidas referidas nos números anteriores não podem implicar prejuízo sério para a vida pessoal ou familiar do juiz, têm como finalidade responder a necessidades de serviço, pontuais e transitórias, e devem ser fundadas em critérios gerais regulamentados pelo Conselho Superior da Magistratura, respeitando os princípios de proporcionalidade, equilíbrio de serviço e aleatoriedade na distribuição.».

Em 05.09.2018 ( data da colocação da autora como efetiva no Quadro Complementar de Juízes (QCJ) .......) a regulação dos quadros complementares encontrava-se prevista no art. 88.º da LOSJ e no Regulamento do Quadro Complementar de Juízes (RQCJ), no domínio das Leis n.º 3/99, de 13 de janeiro, e 52/2008, de 28 de agosto, aprovado na sessão plenária do Conselho Superior da Magistratura de 17 de janeiro de 2012 (Deliberação (extrato) n.º 1729/2015).

Dispõe o  citado  art. 88.º que :

«1 - Nas sedes dos tribunais da Relação podem ser criadas bolsas de juízes para destacamento em tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes o justifiquem.

2 - A bolsa de juízes referida no número anterior pode ser desdobrada ao nível de cada uma das comarcas.

3 - Os juízes nomeados para as bolsas de juízes auferem, quando destacados, ajudas de custo nos termos da lei geral.

4 - O número de juízes é fixado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura.

5 - Cabe ao Conselho Superior da Magistratura efetuar a gestão das bolsas referidas nos n.ºs 1 e 2 e regular o seu destacamento.»

Com a entrada em vigor da mencionada revisão ao EMJ, o respetivo art 45.º-B passou a consagrar expressamente o quadro complementar de magistrados judiciais, da seguinte forma:

«1 - Nas sedes dos tribunais da Relação pode ser criado um quadro complementar de magistrados judiciais para destacamento em tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar, ou quando o número ou a complexidade dos processos existentes o justifique.

2 - O quadro de magistrados judiciais referido no número anterior pode ser desdobrado ao nível de cada uma das comarcas.

3 - Os magistrados judiciais nomeados para o quadro, quando destacados para juízo situado em concelho diverso daquele em que se situa a sede do respetivo tribunal da Relação ou o domicílio autorizado, auferem ajudas de custo relativas aos dias em que prestam serviço efetivo, nos termos da lei geral.

4 - O número de magistrados judiciais a que se referem os n.ºs 1 e 2 é fixado por portaria dos membros do Governo responsáveis pelas áreas das finanças e da justiça, sob proposta do Conselho Superior da Magistratura.

5 - Cabe ao Conselho Superior da Magistratura efetuar a gestão do quadro referido nos n.os 1 e 2 e regular o destacamento dos respetivos magistrados judiciais.»

 Por outro lado, estipula o art. 2.º, nº 1 do RQCJ, que « Na sede de cada um dos Tribunais de Relação há um Quadro Complementar de Juízes para afetação a tribunais judiciais de primeira instância em que se verifique a falta ou o impedimento dos seus titulares, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes o justifiquem ».

E de acordo com o disposto no  art. 4º deste  Regulamento, o Quadro Complementar de Juízes é preenchido na sequência de concurso, que terá lugar anualmente, aquando do movimento judicial e nele integrado (n.ºs 1 e 2º ) e o  Quadro Complementar de Juízes da área de cada um dos Tribunais de Relação constitui, no concurso, uma unidade orgânica, podendo candidatar-se os juízes de direito com, pelo menos, um ano de serviço efetivo e que tenham exercido funções em lugares de primeiro acesso. (n.º 3 ), estabelecendo ainda o seu art. 5º, nº1 que  os juízes efetivos do Quadro Complementar são nomeados em comissão de serviço, pelo período de três anos, sucessivamente renováveis por períodos de igual duração, mediante apresentação a movimento judicial.

E, em matéria de remuneração e ajudas de custo, dispõe o art. 10.º deste mesmo  RQCJ, que:

« 1 - Os juízes do Quadro Complementar nomeados auferem o vencimento correspondente ao que lhes competiria se exercessem funções como efetivos nos lugares a que são afetados e recebem ajudas de custo, calculadas nos termos da lei geral, sem limite de tempo, no período em que se encontrarem afetados a uma secção com sede na área de município diverso do município da sede do respetivo Tribunal da Relação, sem prejuízo do disposto nos números seguintes.

2 - Não há lugar ao abono de ajudas de custo no período de afetação do juiz a secção com sede na área do município em que se situe a sua residência habitual.

3 - Não se considera residência habitual, para os efeitos do número anterior, aquela em que o juiz se fixar em virtude da afetação

Por sua vez, de acordo com o  art. 13.º, n.º 1, deste Regulamento, cabe ao Conselho Superior da Magistratura assegurar a gestão dos Quadros Complementares segundo critérios de razoabilidade, objetividade e transparência de forma a distribuírem-se equitativamente os recursos existentes pelas diversas secções e tribunais de competência territorial alargada da área de cada Tribunal de Relação, segundo os critérios de afetação previstos no art. 14.º do mesmo diploma.

E  estabelece ainda o art. 3.º  deste RQCJ, que:

« 1 - Em qualquer das situações previstas no artigo 2.º, a afetação deve atender ao tempo previsível da falta, impedimento ou vacatura, assim como ao volume ou complexidade de serviço existente na secção ou tribunal de competência territorial alargada e dos outros sedeados na área do respetivo Tribunal da Relação.

2 - Em qualquer daquelas situações, a afetação pressupõe que a superação da situação em causa com recurso aos regimes de substituição, de afetação de processos ou de reafetação de juízes não se mostre adequada». (sublinhado nosso).

Expostos, ainda que em traços gerais, estes dois regimes, temos por seguro  deles resultar, por um lado, que  a "acumulação de funções" a que se referem os art°s. 45.°-A do EMJ, 87.° da LOSJ, pressupõe que um juiz, além do exercício  de funções  no tribunal ou juízo  onde está colocado, execute serviço doutro tribunal ou juízo, para o qual não foi destacado no movimento judicial e que, por isso,  não lhe competia prestar, pelo que, havendo, nestes caso,  trabalho “acrescido”, justifica-se que lhe seja assegurado o suplemento remuneratório estabelecido no art. 29º do EMJ  quando a acumulação se prolongue por período superior a 30 dias seguidos ou a 90 interpolados no mesmo ano judicial.

 E. por outro lado, que, diversamente e de harmonia com o  disposto nos arts. 2º, nº1 e 3º do do RQCJ, os juízes do Quadro Complementar fazem parte de  “uma bolsa de juízes”, destinada a colmatar necessidades  de serviço numa área correspondente ao tribunal da Relação  ou, em caso de desdobramento, a da Comarca, tendo uma competência, potencialmente, correspondente à da generalidade dos tribunais dessa área territorial e que se concretiza apenas  a partir do momento em que o CSM, constada uma concreta necessidade de serviço, os afetem a um tribunal ou tribunais daquela área territorial onde essa necessidade se verifique.

Característica da situação dos juízes do Quadro Complementar é, assim, a sua disponibilidade para, em função de necessidades de serviço que possam surgir, poderem exercer funções em qualquer dos tribunais da respetiva área territorial de referência,  mediante decisão do C.S.M., pelo que, mesmo que tais necessidades impliquem a prestação de serviço simultaneamente em mais de um juízo ou tribunal, não há, nestes casos, trabalho “acrescido”  mas apenas e tão só trabalho compreendido na afetação a que foi sujeito, não existindo, por isso, fundamento legal a atribuição de remuneração suplementar.

Vale tudo isto por dizer que juízes do Quadro Complementar, mesmo quando exerçam funções  em mais do que um juízo ou  tribunal  da área territorial do respetivo Tribunal da Relação onde foram colocados,   não estão  numa situação de "acumulação de funções" .

De resto  é precisamente este o  sentido que se retira  do disposto no art. 3º, nº 2 do RQCJ, segundo o qual  a afetação de juízes do Quadro Complementar deverá  ter lugar quando a falta ou o impedimento dos titulares dos tribunais judiciais de primeira instância, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes não possa ser superada adequadamente com recurso ao regime de reafectação de juízes a outro tribunal ou juízo da mesma comarca, previsto na  al. a), do nº1 do art. 45º-A-do EMJ; de afetação de processos para tramitação e decisão a outro juiz que não o seu titular, a que alude a  al. b), do nº1 do art. 45º-A-do EMJ; de acumulação do exercício de funções  de magistrado judicial em mais do que um juízo ou tribunal da mesma comarca nos termos  do  nº 2 do art. 45º-A-do EMJ ou de substituição  previsto no art. 86º, nº 1, da Lei 62/2013, de 26 de agosto.

E nem se diga, como o faz a autora, que no “Regulamento do QCJ, em parte alguma é referido que os respetivos magistrados são necessariamente afetos em simultâneo a mais que um Tribunal ou Juízo”, pois se isso é certo, certo é também que ali se não diz que não possam ser afetos em simultâneo a mais de um Tribunal ou Juízo.

Do mesmo modo não colhe o argumento por ela avançado  de que o facto de as funções que veio a desempenhar terem resultado de proposta do Sr. Juiz Presidente da Comarca, seguida da sua auscultação e anuência, é revelador de que se encontrou em acumulação de funções, na medida em que foi respeitada a tramitação prevista no n.º 2 do art. 45.º - A do EMJ.

Desde logo porque, conforme resulta do disposto no art. 45º-B, do EMJ,  a afetação  dos juízes do Quadro Complementar a determinado tribunal é da competência do C.S.M., que decide de acordo com critérios pré-determinados para o efeito  no art.º 3.º do R.Q.C.J. pelo que se mostra irrelevante que a afetação tenha resultado de proposta feita pelo Sr. Juiz Presidente da Comarca e que o  juiz dê ou não a sua anuência, não tendo aplicação ao caso o regime previsto no art.º 45.º-A do E.M.J., que como já se deixou dito, determina que a falta ou o impedimento dos titulares dos tribunais judiciais de primeira instância, a vacatura do lugar ou o número ou a complexidade dos processos existentes deve, por regra, ser suprida  por juízes  não colocados  no QCJ.

E o mesmo vale dizer  quanto ao argumento  de que o despacho  do Senhor Vice-Presidente do CSM, de 11.04.2020, que determinou a suspensão de acumulações e que se atendesse à suspensão e cessação das mesmas para efeitos da remuneração a ser processada, demonstra que se encontrava em acumulação de funções a par dos demais juízes que, embora também visados naquele despacho, não figuravam do QCJ.

É que  o facto de naquele despacho ter sido feita alusão à “acumulação” de funções, determinando-se que se atendesse à suspensão e cessação das acumulações para efeitos da remuneração a ser processada, não altera o regime jurídico a que a autora se encontrava sujeita enquanto efetiva do QCJ.

Acresce que tal despacho não está especificamente direcionado aos juízes colocados em efetividade de funções no QCJ e, embora ali se determine que se atenda à suspensão e cessação de acumulações para efeitos de remuneração a ser processada, à autora não foi processado qualquer vencimento a esse título, como a própria refere.

Finalmente, sustenta a autora que  não fazendo o  art.º 29.º do E.M.J. qualquer distinção entre o juiz que está e aquele que não está integrado no Quadro Complementar de Juízes,  tal preceito carece de ser interpretado à luz  do art. 9º do C. Civil, por forma a  abranger as situações em que os juízes que fazem parte do QCJ exercem funções em mais do que um juízo ou tribunal, por essa ser a solução mais acertada.

Mas, em nosso entender, este argumento também não é de acolher, porquanto não só se nos afigura que o legislador se expressou de forma clara e inequívoca, como nem faria qualquer sentido fazer uma tal inclusão, pois estando em causa,  como já se disse, o exercício de funções inerentes ao lugar que ocupam,  não se vê que  a prestação de serviço em mais de um juízo ou  tribunal possa consubstanciar uma situação de acumulação de funções.

Finalmente, pugna a autora pela aplicação subsidiária do art. 21.º da Lei Geral de Trabalho em Funções Públicas (LGTFP), ex vi art. 188.º do EMJ, defendendo que  “ se é certo que o caso em apreço não encontra ali previsão legal expressa, não é menos certo que este regime jurídico deverá ser devidamente adaptado em função das diversas carreiras públicas.”.

O art. 21.º da LGTFP sob a epígrafe “Acumulação com outras funções públicas”, versa sobre o exercício de funções públicas em acumulação com outras funções públicas remuneradas e não remuneradas.

Ora, mostrando-se o regime jurídico do QCJ e da acumulação de serviço expressamente previsto no EMJ e na LOSJ, nos moldes já expostos, afastada fica a aplicação subsidiária daquele art. 21.º, por inexistência de lacuna.

Com efeito, à  luz daqueles regimes  afigura-se-nos fora de dúvida que, estando a  Sr.ª Juíza, ora autora, integrada  no Quadro Complementar de Juízes da Relação ....... e tendo sido afeta pelo C.S.M.,  ao Juízo de Família e Menores ......., Juiz... e, bem assim, relativamente a ¼ do serviço correspondente, ao Juízo Central Cível ......., Juiz...,  ao executar o serviço resultante dessa afetação, a Sr.ª Juíza mais não executou do que o serviço inerente ao lugar que ocupava, não havendo, assim, acumulação de funções  que justifique, nos termos  do disposto no art.º 29.º do E.M.J., o pagamento da  peticionada  remuneração suplementar por esse facto.

Daí impor-se  concluir que, tendo a deliberação posta em crise efetuado um correto enquadramento jurídico da atividade desenvolvida pela autora e decidido em conformidade com a factualidade dada por assente e com a lei, a mesma não enferma de qualquer  erro sobre  os pressupostos de facto nem de direito, improcedendo, por isso, a invocada verificação do vício de violação de lei.

***

3.2.3.  Da violação do princípio da igualdade e da retribuição.

Sustenta a autora  que se a lei permitir que um juiz do QCJ não seja remunerado pelo trabalho adicional, resultante da acumulação de funções em dois tribunais ou juízos, ainda quando essa acumulação não decorra de decisão anterior ao concurso que ditou a sua colocação, então o que estará a fazer é tratá-lo de maneira desigual, quer  em relação a qualquer outro cidadão que exerça trabalho em funções públicas,  nos termos do artigo 21º, nº 2, da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, pode auferir remuneração por acumulação em outras funções públicas, desde que a acumulação revista manifesto interesse público, quer em relação aos juízes que  não façam parte do QCJ e que, em caso de “acumulação de funções” têm direito a remuneração, nos termos do art. 29º do EMJ.

*

O princípio da igualdade encontra-se acolhido pelo artigo 13.º da Constituição que, no seu n.º 1, dispõe, genericamente, terem todos os cidadãos a mesma dignidade social, sendo iguais perante a lei, especificando o n.º 2, por sua vez, que «[n]inguém pode ser privilegiado, beneficiado, prejudicado, privado de qualquer direito ou isento de qualquer dever em razão de ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica ou condição social».

Princípio estruturante do Estado de Direito democrático e do sistema constitucional global, o princípio da igualdade vincula diretamente os poderes públicos, tenham eles competência legislativa, administrativa ou jurisdicional[19], o que no dizer do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 186/90, publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 12.09.1990), resulta, por um lado, da sua consagração como direito fundamental dos cidadãos e, por outro lado, da «[…] atribuição aos preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias de uma força jurídica própria, traduzida na sua aplicabilidade direta, sem necessidade de qualquer lei regulamentadora, e da sua vinculatividade imediata para todas as entidades públicas, tenham elas competência legislativa, administrativa ou jurisdicional (artigo 18.º, n.º 1, da Constituição) […]».

Segundo a generalidade da doutrina[20] e a jurisprudência do Tribunal Constitucional[21], o princípio postula que se dê tratamento igual a situações de facto essencialmente iguais e tratamento desigual para as situações de facto desiguais. Inversamente, o princípio proíbe o tratamento desigual de situações iguais e o tratamento igual das situações desiguais.

Daqui decorre, como se afirma no Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 335/94 publicados no DR 2.ª Série, de  30.08.1994, que o princípio não impede que, tendo em conta a liberdade de conformação do legislador, se possam estabelecer diferenciações de tratamento, «razoável, racional e objetivamente fundadas», sob pena de, assim não sucedendo, «estar o legislador a incorrer em arbítrio, por preterição do acatamento de soluções objetivamente justificadas por valores constitucionalmente relevantes».

Ponto é que haja fundamento material suficiente que neutralize o arbítrio e afaste a discriminação infundada, o que pressupõe averiguação e valoração casuísticas da «diferença», de modo que recebam tratamento semelhante os que se encontrem em situações semelhantes e diferenciado os que se achem em situações legitimadoras da diferenciação.

Ensina Gomes Canotilho[22] que  o  conteúdo do princípio da igualdade desdobra-se na:

«(a) proibição do arbítrio, sendo inadmissíveis, quer diferenciações de tratamento sem qualquer justificação razoável, de acordo com critérios de valor objetivos, constitucionalmente relevantes, quer a identidade de tratamento para situações manifestamente desiguais; (b) proibição de discriminação, não sendo legítimas quaisquer diferenciações de tratamento entre cidadãos baseadas em categorias meramente subjetivas ou em razão dessas categorias […]; (c) obrigação de diferenciação, como forma de compensar a desigualdade de oportunidades, o que pressupõe a eliminação, pelos poderes públicos, de desigualdades fácticas de natureza social, económica e cultural […]»

Da vinculação dos poderes públicos a este princípio da igualdade resulta, ainda nas palavras do mesmo autor, a «[…] autovinculação da administração no âmbito dos seus poderes discricionários, devendo ela utilizar critérios substancialmente idênticos para a resolução de casos idênticos, sendo a mudança de critérios, sem qualquer fundamento material, violadora do princípio da igualdade (não existindo, porém, um “direito à igualdade na ilegalidade” […]»[23], salientando ainda  que « o princípio da igualdade, quanto à criação do direito, “não garante a igualdade ao não direito”»[24].

Nesta mesma linha, afirmou-se, entre outros, no Acórdão do Tribunal Constitucional   nº 437/2006 ( processo nº 349/05)[25] que «  o princípio da igualdade, entendido como limite objectivo da discricionariedade legislativa, não veda à lei a adopção de medidas que estabeleçam distinções. Todavia, proíbe a criação de medidas que estabeleçam distinções discriminatórias, isto é, desigualdades de tratamento materialmente não fundadas ou sem qualquer fundamentação razoável, objectiva e racional. O princípio da igualdade, enquanto princípio vinculativo da lei, traduz-se numa ideia geral de proibição do arbítrio».

O princípio da igualdade, na perspetiva salarial, encontra suporte no art. 59.º, n.º1, a), da CRP,  segundo o qual « Todos os trabalhadores, sem distinção de idade, sexo, raça, cidadania, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, têm direito à retribuição do trabalho, segundo a quantidade, natureza e qualidade, observando-se o princípio de que para trabalho igual salário igual, de forma a garantir uma existência condigna».

Mas tudo isto, na certeza, de que, como se refere no Acórdão do STJ, de 12/10/2011 ( processo n.º 343/04.4TTBCL.P1.S1)[26] ,« o princípio do “trabalho igual, salário igual”, corolário daquele, pressupõe a mesma retribuição para trabalho prestado em condições de igual natureza, qualidade e quantidade, com proibição da diferenciação arbitrária, materialmente infundada, só existindo violação do princípio quando a diferenciação salarial assente em critérios apenas subjectivos» e de que, como  se sublinha no Acórdão do STA, de 04.09.2014 ( processo nº 1117/13)[27] e  no Acórdão  da Secção do Contencioso do STJ,  de 28.02.2018 ( processo nº 81/17.8YFLSB)[28],  « o princípio da igualdade, na sua  vertente de  “trabalho igual, salário igual”, não poderá servir de fonte à ilegalidade ».

Ora, o que ressalta da questionada  deliberação do CSM  é que o tratamento desigual  dado à autora, em matéria de remuneração por “acumulação de funções”, estribou-se na circunstância de a mesma estar colocada no QCJ, estando, por isso tal como acontece com todos os juízes que integram este Quadro, sob a alçada de regras diferentes  das vigentes para os  juízes que  não fazem parte do Quadro Complementar  e para os  funcionários públicos,  por se tratarem de realidades distintas.

Daí termos por seguro que a deliberação impugnada não adotou qualquer diferenciação arbitrária ou materialmente infundada em matéria de retribuição e, consequentemente, não violou os princípios da igualdade e da justa remuneração, consagrados nos arts. 13º e  59º, nº1, ambos da Constituição da República Portuguesa.

*

3.2.4. Da violação do princípio da confiança:

Por último, alega a autora ter adquirido, por via da legislação aplicável, a expetativa e a confiança de que ao exercer funções em exclusividade no Juiz... do Juízo Central de Família e Menores ......., em substituição da titular, iria auferir uma remuneração como se neste lugar fosse efetiva, e que ao “acumular” funções com o Juiz... Juízo Central Cível ....... (sendo responsável pela tramitação e decisão de ¼ de processos) teria direito à remuneração prevista no art. 29.º do EMJ pelo “acréscimo de trabalho”.

Mais invoca que a  deliberação do Plenário do Conselho Superior da Magistratura, que agora impugna, viola o princípio da tutela da confiança, pois o modo de atuação anterior da entidade demandada, materializada  na decisão  do Senhor Vice-Presidente do CSM de 11/04/2020 que determinou a suspensão de acumulações e que se atendesse à suspensão e cessação das mesmas para efeitos da remuneração a ser processada,  não só  constitui um ato de auto vinculação do CSM  como criou nela a  confiança de que, tal como os demais juízes visados naquele despacho e que não  figuravam  do QCJ,  teria direito  a  remuneração por “acumulação de funções”.

*

O princípio do Estado de direito democrático, consagrado, após a revisão constitucional de 1982, no artigo 2.º da Constituição, no dizer  dos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 303/90 [29] e n.º 4/2003 [30], «postula uma ideia de proteção da confiança dos cidadãos e da comunidade na ordem jurídica e na atuação do Estado, o que implica um mínimo de certeza e de segurança no direito das pessoas e nas expectativas que a elas são juridicamente criadas [razão pela qual] a normação que, por sua natureza, obvie de forma intolerável, arbitrária ou demasiado opressiva àqueles mínimos de certeza e segurança que as pessoas, a comunidade e o direito têm de respeitar, como dimensões essenciais do Estado de direito democrático, terá de ser entendida como não consentida pela lei básica».

Dito de outro modo e segundo o entendimento  da doutrina da especialidade[31]  e dos  tribunais superiores das diversas ordens jurisdicionais, o princípio da confiança, ínsito na ideia de Estado de direito democrático, «[…] postula um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhes são juridicamente criadas, censurando as afetações inadmissíveis, arbitrárias ou excessivamente onerosas, com as quais não se poderia razoavelmente contar […]»[32], implicando «[…] um mínimo de certeza nos direitos das pessoas e nas expectativas que lhe são juridicamente criadas, censurando as afetações inadmissíveis, arbitrárias ou excessivamente onerosas, com as quais não se poderia moral e razoavelmente contar […]»[33] .

Nesta mesma linha de entendimento,  sublinha António Menezes Cordeiro[34],  que a tutela da confiança, para além de ser protegida através de disposições legais específicas, também é protegida mesmo  quando não haja um dispositivo específico, mas «[…] os valores fundamentais do ordenamento, expressos como boa fé ou sob outra designação, assim o imponham […]».

É o que ocorre no procedimento administrativo, quando o art. 10.º do CPA estabelecendo, no seu nº 1,  que «no exercício da atividade administrativa e em todas as suas formas e fases, a Administração Pública e os particulares devem agir e relacionar-se segundo as regras da boa fé» e, no seu nº 2,  que «no cumprimento do disposto no número anterior, devem ponderar-se os valores fundamentais do Direito, relevantes em face das situações consideradas, e, em especial, a confiança suscitada na contraparte pela atuação em causa e o objetivo a alcançar com a atuação empreendida», impõe, conjugado com o art. 266º, nº 2 da CRP,  um relacionamento entre a Administração e os particulares segundo as regras da boa fé, tutelando a confiança criada.

E pese embora os conceitos de “proteção da confiança” e “boa fé” consubstanciarem  conceitos genéricos, quer a doutrina[35], quer a jurisprudência[36] têm admitido o preenchimento do conceito de boa  fé, na sua vertente da tutela da confiança, através  da verificação dos seguintes pressupostos:

 i) situação de confiança;

 ii) justificação para essa confiança;

 iii) investimento de confiança;

e iv) imputação da situação de confiança à pessoa que vai ser atingida pela proteção dada ao confiante.
Ora, analisando, neste  contexto e no quadro jurídico e factual supra traçados, diremos, desde logo, que contrariamente ao sustentado pela autora  não se vislumbra que a  atuação da entidade demandada,  indicie  que a mesma  tenha, de algum modo, violado os princípios da boa fé e da confiança da  autora.

É que,  tal como já se deixou  dito no ponto 3.2.2, nem o regime legal aplicável ao presente litígio permite  à autora   criar uma legítima expetativa de que o exercício de funções de um juiz colocado no QCJ em mais de um Tribunal ou juízo da mesma área territorial consubstanciava uma “acumulação de serviço” remunerada nos termos do art. 29.º do EMJ nem a   alusão feita naquele despacho à “acumulação” de funções tem a virtualidade de vincular o CSM e de alterar o regime jurídico a que a autora se encontrava sujeita enquanto efetiva do QCJ, de nada valendo as convicções pessoais da autora.

De resto sempre se dirá, também contrariando o defendido pela autora, que  o pagamento de remuneração a título de acumulação de serviço previsto no art. 29.º do EMJ ( redação foi introduzida pela Lei n.º 67/2019, de 27 de agosto) não constitui um direito adquirido, nem consubstanciava uma situação jurídica estabilizada aquando da sua colocação no QCJ ......., pois nessa data  ( 05.09.2018)  aquele normativo ainda não se encontrava em vigor.
Concluímos, assim,  não ter ocorrido qualquer  violação do invocado princípio da tutela da confiança,  ínsito no art. 2º da CRP.

***

Termos em que, tudo visto e sopesado, se impõe concluir pela total improcedência da ação.

***

IV. Decisão

Face ao exposto, acordam os juízes que constituem a Secção de Contencioso em julgar a  presente ação improcedente.

Valor da ação: € 30. 000,01 (cf. artigos 34.º, n.os 1 e 2, do CPTA).

Custas pela autora (artigos 527.º, n.º 1, do CPC), fixando-se a taxa de justiça em 6 unidades de conta, de acordo com o artigo 7.º, n.º 1, e Tabela I-A, ambos do Regulamento das Custas Processuais.

***

Nos termos do art. 15º-A do Decreto-Lei nº 10-A/2020, de 13 de Março, aditado pelo Decreto-Lei nº 20/2020, de 1 de Maio, declaro que o presente acórdão tem o voto de conformidade das Exmas Senhoras Conselheiras, Maria dos Prazeres Beleza, Maria de Fátima Gomes, Maria da Conceição Gomes, Paula Sá Fernandes e Maria Olinda Garcia e  dos Exmos Senhores Conselheiros, Ilídio Sacarrão Martins e António Clemente Lima, que compõem este Coletivo.

Supremo Tribunal de Justiça, 24 de fevereiro de 2021

Maria Rosa Oliveira Tching (Relatora)

Sumário (art.º 663º n.º 7 do Código Processo Civil).

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[1] “Noções Fundamentais de Direito Administrativo”, 5.ª Edição – Reimpressão, Almedina, 2018, pág. 237.
[2] In “ A audiência dos interessados no procedimento administrativo”, Lisboa, Universidade Católica Editora, 1995, págs. 528, 529.

[3] Cfr. Vieira de Andrade, in “A Justiça Administrativa”, 8.ª edição, 2006, Coimbra, Almedina, pág. 192; Mário Esteves de Oliveira / Pedro Costa Gonçalves / João Pacheco Amorim, in “Código de Procedimento Administrativo Comentado”, 2.ª edição, reimpressão, 2010, Coimbra, Almedina, pág. 452;  Diogo Freitas do Amaral / João Caupers / João Martins Claro / João Raposo / Maria da Glória Dias Garcia / Pedro Siza Vieira / Vasco Pereira da Silva, in “ Código de Procedimento Administrativo Anotado, 3.ª edição, reimpressão, 1998,  Coimbra, Almedina, pág. 421, nota 14.

[4] Ou seja, quando:

« a) A decisão seja urgente;

b) Os interessados tenham solicitado o adiamento a que se refere o n.º 2 do artigo anterior e, por facto imputável a eles, não tenha sido possível fixar-se nova data nos termos do n.º 3 do mesmo artigo;

c) Seja razoavelmente de prever que a diligência possa comprometer a execução ou a utilidade da decisão;

d) O número de interessados a ouvir seja de tal forma elevado que a audiência se torne impraticável, devendo nesse caso proceder-se a consulta pública, quando possível, pela forma mais adequada;

e) Os interessados já se tiverem pronunciado no procedimento sobre as questões que importem à decisão e sobre as provas produzidas;

f) Os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão inteiramente favorável aos interessados».
[5] In “Código do Procedimento Administrativo Anotado”, 3ª edição, Quid Iuris, Lisboa, 2019, págs.396 a  398. 
[6] Cfr., entre outros, Acórdãos de 28.02.2018 ( processo nº 81/17.8YFLSB); de 24/10/2019 ( processo n.º 89/18.6YFLSB) e de 29/10/2020 ( processo n.º 5/20.5YFLSB), acessíveis in www.dgsi.pt/stj.
[7] Cfr., entre outros, o Acórdão do STA de 26/09/2018 (processo nº 1506/17), acessível in wwwdgsi.pt/sta.
[8] Cfr. Diogo Freitas do Amaral, “Curso de Direito Administrativo”, volume II, 3ª edição, 2016, pág. 358.
[9] Cfr. Marcello Caetano, Manual I, pág. 518 – ob. Cit. a fls. 359 do mencionado “Curso de Direito Administrativo”, volume II, 3ª edição, 2016 – nota 6)
[10] In “Código do Procedimento Administrativo Comentado”, Quid Juris Sociedade Editora, 2018, pág. 395.
[11] “Direito Administrativo”, Vol. III, Lisboa, 1989, págs.8, 25, 26, 189, 197 e 198.
[12] Neste sentido, Eliana de Almeida Pinto, Isabel Silva e Jorge Costa, in “Código do Procedimento Administrativo Comentado”, Quid Juris Sociedade Editora, 2018, pág. 395.
[13] Cfr., entre outros, Acórdão de 28.02.2018 ( processo nº 81/17.8YFLSB), acessível in www.dgsi/stj.pt.
[14] Cfr., ente outros, Acórdãos de 30.10.2019 ( processo nº 01238/08.8BEPRT0492/18) acessível in www.dgsi/sta.pt.
[15] In “Direto Administrativo”, Vol. III, Lisboa 1989, págs. 303 e 304.
[16] Cfr, entre ouros, os Acórdãos da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, de 23.02.2016 ( processo nº 126/14.3YFLSB) e de 24.10.2019 ( processo nº 67/18.5YFLSB), acessíveis in wwwdgsi/stj.pt.
[17] In “ Manual de Direito Administrativo”, Almedina, volume I, páginas 502 e seguintes.

[18] Cfr, entre outros, o Acórdão do STA, de 12.02.2009 (processo nº 091008), acessível in wwdgsi/sta.pt  e  no Acórdão  da Secção do Contencioso do Supremo Tribunal de Justiça, de 23.02.2016 ( processo nº 126/14.3YFLSB), acessível in www.dgsi/stj.pt.

[19] Cfr. Gomes Canotilho/Vital Moreira, in “ Constituição da República Portuguesa Anotada, 3ª edição revista, Coimbra, Coimbra Editora, 1993, págs. 129 e130.
[20] Cfr. Jorge Miranda, in  « O Regime dos Direitos, Liberdades e Garantias», AA.VV., Estudos Sobre a Constituição,– volume iii, Coimbra, Almedina, 1979, pág. 50.

[21] Cfr., entre tantos outros, e além do já citado acórdão nº 186/90, os Acórdãos n.os 39/88, 187/90, 188/90, 330/93, 381/93 e 335/94, publicados no referido jornal oficial, 1.ª série, de 03.03.1988, e 2.ª Série, de 12.09.1990, 30.07.1993, 06.10.1993, 19.01.1994 e 30.08.1994, respetivamente.
[22] In “ Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais”, Coimbra, Coimbra Editora, 1982, pág. 127.
[23] In “ Constituição Dirigente e Vinculação do Legislador. Contributo para a Compreensão das Normas Constitucionais”, Coimbra, Coimbra Editora, 1982, pág. 130.
[24] Direito Constitucional, Teoria da Constituição, 7ª edição, página 427
[25] Acessível in www.dgsi/tc.pt.
[26] Acessível in www.dgsi/stj.pt.
[27] Acessível in www.dgsi/sta.pt.
[28] Acessível in www.dgsi/stj.pt.
[29] Publicado no Diário da República, 1.ª Série, de 26.12.1990.
[30] Publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 13.02.2003.
[31] Cfr., entre muitos outros,  Jorge Reis Novais, in “ Os Princípios Constitucionais Estruturantes da República Portuguesa, 2011, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, págs. 263-267.
[32] Acórdão do STA de 30-04-2003, proferido no processo n.º 47275/02, acessível em http://www.dgsi.pt/jsta.

[33] Acórdãos do Tribunal Constitucional n.º 287/90, de 30.10.1990, in Boletim do Ministério da Justiça, 400, p. 214; n.º 302/90, de 14.11.1990, processo n.º 107/89, in Boletim do Ministério da Justiça, 401, p. 130; n.º 03/90, de 21.11.1990, processo n.º 129/89, in Boletim do Ministério da Justiça, 401, p. 139; n.º 365/91, de 07.08.1991, processo n.º 368/91, in Diário da República, 2.ª Série, de 27.08.1991; n.º 70/92, de 24.02.1992, processo n.º 89/90, in Boletim do Ministério da Justiça, 414, p. 130; n.º 410/95, de 28.06.1995, processo n.º 248/94, in Diário da República, 2.ª Série, de 16.11.1995; n.º 625/98, de 03.11.1998, processo n.º 816/96, in Acórdãos do Tribunal Constitucional, Vol. 41º, p. 293; n.º 648/98, de 15.12.1998, processo n.º 639/97; n.º 160/00, de 22.03.2000, processo n.º 843/98, in Diário da República, 2.ª Série, de 10.10.2000; n.º 109/02, de 05.03.2002, processo n.º 381/01 e n.º 128/02, de 14.03.2002, processo n.º 382/01, estes acessíveis em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/).
[34] In “Tratado de Direito Civil Português”. I. Parte Geral. Tomo I, 2011, 3.ª edição, Reimpressão, Almedina, pág. 185.
[35] Cfr. Menezes Cordeiro, in Tratado de Direito Civil Português”. I. Parte Geral. Tomo I, 2011, 3.ª edição, Reimpressão, Almedina, págs. 186-187; Marcelo Rebelo de Sousa, in “  Lições de Direito Administrativo”, 1999, Lisboa, Lex, págs. 117-118; Diogo Freitas do Amaral, in “ Direito Administrativo”, Volume iii, 1990, Lisboa, impressão da Associação Académica da Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, pág. 136 e passim
[36] Cfr., entre outros, Acórdãos da Secção do Contencioso do STJ, de 19.02.2013 ( processo nº 120/12.9YFLSB) e de 23.01.2018 (processo nº 43/17.5YFLSB), acessíveis in www.dgsi/stj.pt e o  Acórdãos do STA de 05-12-2007 ( processo n.º 0653/07) e de 21.09.2011 ( processo nº 0753/11), acessível in  http://www.dgsi.pt/jsta