Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
98P525
Nº Convencional: JSTJ00034900
Relator: JOSE GIRÃO
Descritores: ESCUTA TELEFÓNICA
FUNCIONÁRIO PÚBLICO
PRINCÍPIO DA LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
NULIDADE RELATIVA
Nº do Documento: SJ199810290005253
Data do Acordão: 10/29/1998
Votação: UNANIMIDADE
Referência de Publicação: BMJ N480 ANO1998 PAG292
Tribunal Recurso: T CIRC BRAGA
Processo no Tribunal Recurso: 112/97
Data: 02/27/1998
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: NEGADO PROVIMENTO.
Área Temática: DIR PROC PENAL.
DIR CRIM.
Legislação Nacional: CPP87 ARTIGO 120 ARTIGO 127 ARTIGO 187 ARTIGO 188.
CP95 ARTIGO 386.
Sumário : I - O meio de prova a que se refere o artigo 187, do Código de Processo Penal pode ser valorado pelo Tribunal em audiência de julgamento de harmonia com o princípio consignado no artigo 127 do mesmo Diploma.
II - A não observância do disposto no n. 1 do artigo 188, do Código de Processo Penal constitui nulidade sanável que, por conseguinte, depende de arguição.
III - Perante o disposto no artigo 386, do Código Penal, é funcionário público para efeitos penais todo aquele que é chamado a desempenhar e desempenha actividades compreendidas na função pública (administrativa ou jurisdicional).
Decisão Texto Integral: 1) Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal deJustiça.

2) No processo comum n. 112/97, do 2. Juízo do Tribunal de Círculo de Braga os arguidos A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L, M, N, O e P,, identificados, respectivamente, a folhas 3729 e 3730, foram submetidos a julgamento.
3) A final, o Tribunal Colectivo, deliberou:
- Julgar a acção penal improcedente por não provada relativamente aos arguidos E, F, G, H, I, J, L, M, P, N e O, absolvendo-os da prática dos crimes que lhes eram imputados no despacho de pronúncia.
- Julgar a mesma acção penal parcialmente procedente por provada, relativamente aos arguidos A, B, C e D, e, em consequência, condená-los pela prática dos seguintes crimes e nas seguintes penas:
- O arguido A: pela prática, em co-autoria, de 3 crimes de auxílio de funcionário à evasão, previstos e punidos pelo artigo 350, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de dois crimes de não promoção dolosa, previsto e punido pelo artigo 414, n. 1, do Código Penal de 1982, na pena de 7 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de peculato, previstos e punidos pelo artigo 375, n. 1, do Código Penal de 1995, nas penas, respectivamente, de 1 ano e 6 meses de prisão e 3 anos de prisão; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de tráfico de estupefacientes agravado, previstos e punidos pelos artigos 21 e 24, alínea b), do Decreto-Lei n. 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 8 anos de prisão, por cada um desses crimes.
- O arguido B: pela prática, em co-autoria, de 3 crimes de auxílio de funcionário à evasão, previstos e punidos pelo artigo 350, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de promoção não dolosa, previsto e punido pelo artigo 414, n. 1 do Código Penal de 1982, na pena de 7 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de peculato, previstos e punidos pelo artigo
375, n. 1, do Código Penal de 1995, nas penas, respectivamente, de 1 ano e 6 meses de prisão e 3 anos de prisão; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de tráfico de estupefacientes agravado, previstos e punidos pelos artigos 21 e 24, alínea d), do Decreto-Lei n. 15/93, de 22 de Janeiro, na pena de 8 anos de prisão por cada um desses crimes.
- O arguido C: pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de auxílio de funcionário à evasão, previstos e punidos pelo artigo 350, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de não promoção dolosa, previstos e punidos pelo artigo 414, n. 1 do Código Penal de 1982, na pena de 7 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de um crime de peculato, previsto e punido pelo artigo
375, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão.
- O arguido D: pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de auxílio de funcionário à evasão, previstos e punidos pelo artigo 350, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de 2 crimes de não promoção dolosa, previstos e punidos pelo artigo 414, n. 1, do Código Penal de 1982, na pena de 7 meses de prisão por cada um desses crimes; pela prática, em co-autoria, de um crime de peculato, previsto e punido pelo artigo 375, n. 1, do Código Penal de 1995, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão.
- Proceder ao cúmulo jurídico das aludidas penas e assim condenar:
O arguido A, na pena única de 13 anos de prisão;
O arguido B, na pena única de 13 anos de prisão;
O arguido C, na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão;
O arguido D, na pena única de 2 anos e 6 meses de prisão.
- Suspender a execução das penas aplicadas aos arguidos C e D pelo período de 3 anos.
- Condenar os arguidos A e B na pena acessória de proibição de exercício de funções pelo período de 4 anos.
- Julgar o pedido cível improcedente, por não provado, do mesmo se absolvendo a totalidade dos arguidos.
- Proceder à concernente condenação tributária.
4) Inconformados os arguidos A, B, C e D interpuseram recurso, como se verifica de folha 3857.
Na motivação, concluem:
- Dispondo a lei - artigo 188 do Código de Processo Penal, n. 1 - que da intercepção e agravação... é lavrado auto, o qual com as fitas gravadas... é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações;
- E no n. 2 do artigo 188 que: Se o juiz considerar os elementos recolhidos, ou alguns deles, relevantes para a prova...;
- Não estando os autos de transcrição das gravações das conversações telefónicas - constantes dos apensos ns. 1 e 2 oferecidos como prova documental -, redigidos em conformidade com o disposto no artigo 188 do Código de Processo Penal, e nos termos dos artigos 100 e 101 do
Código de Processo Penal, são nulas e não podem servir como meio de prova.
- Em consequência da nulidade das transcrições - por ser meio proibido de prova - não podem as mesmas ser produzidas ou examinadas em audiência - e por consequência servir como meio de prova.
- Do mesmo modo as cassetes escutadas em audiência foram nas partes e excertos e votações e dias e horas escolhidos pelo agente da polícia, pelo que devem ser declaradas nulas e, como tal, proibida a sua utilização, produção e exame em audiência, para prova da matéria dos artigos 125, 128, 133, 134, 135 (e curiosamente dos artigos 140 e 141), 142, 143, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 152, 161, 169, 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 179, 180, 181, 182, 184, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 203, 204, 205, 206, 207, 208, 209, 211 (artigo em que é feita expressa referência à escuta: volume I, folhas 21, 26 e 27), 212, 213, 214, 215, 216, 217, 218, 219, 220, 221, 222, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 229, 230, 231, 232, 233, 234 (onde também é feita expressa indicação da escuta - volume I, página 4), 235, 236, 237 (onde se volta à referência sob a escuta: volume I, 42; e escuta: volume 5, 42 verso), 238, 239, 240, 241, 242, 243, 267, 268, da douta pronúncia e constantes dos itens 70 a 146 da matéria provada (páginas 35 a 45) e da não provada (itens 66 a 151, páginas 57 a 67) do texto do acórdão.
- O douto colectivo de juizes ao utilizar em audiência as cassetes gravadas, ouvindo as partes escolhidas pelo agente investigador, nos dias e horas e rotações que aquele havia seleccionado por as considerar com interesse para a prova do crime que investigava, sem que tais elementos fossem considerados pelo juiz como relevantes para a prova, e ao acompanharem esta audição com a leitura das transcrições efectuadas, violou o disposto nos artigos 188, 189, 100, 101, 118, 122, 125 e 355, todos do Código de Processo Penal, o que integra o vício do artigo 410, n. 3, que deve ser reconhecido e declarado.
- Violou ainda o douto Tribunal os artigos 32 e 34 da C.R.P., na vertente das garantias de defesa e da presunção de inocência dos arguidos.
- A douta decisão do Tribunal Colectivo violou ainda, por errada integracção e aplicação, o disposto nos artigos 350, n. 1 e 375, n. 1, do Código Penal de 1995, e o artigo 414, n. 1, do Código Penal de 1982, e os artigos 21, e 24, alínea d) do Decreto-Lei n. 15/93, de 22 de Janeiro e artigo 66, n. 1, alíneas a), b) e c) do Código Penal.
- Verificam-se, ainda, pela matéria exposta no recurso, existirem no acórdão recorrido os vícios das alíneas a), b) e c), do n. 2 do artigo 410 do Código de Processo Penal que devem ser reconhecidos e declarados pelo Colendo Tribunal.
- Tais vícios constantes do texto da decisão recorrida, constam da exposição, quer da matéria de facto provada, quer da não provada e da indicação dos elementos da formação da convicção do tribunal, dos casos Q e R e S, devendo ser reconhecidos.
- Anulando-se o douto acórdão pelos vícios apontados, ou não procedendo esta posição, absolvendo-se todos os arguidos, será a solução correcta.
5) O Excelentíssimo Magistrado do Ministério Público junto da primeira instância, na sua resposta, conclue pelo improvimento dos recursos, com a manutenção do Acórdão recorrido.
6) O Excelentíssimo Procurador-Geral Adjunto teve vista dos autos.
7) Colheram-se os vistos.
8) Realizou-se a audiência.
9) Tudo visto, cumpre decidir.
11) FACTOS PROVADOS
1. A princípio denominado G.O.I. (Grupo de Operações Inopinadas), o G.E.A.P. (Grupo Especial de Acção e Pesquisa) foi uma unidade criada (sem cobertura legal, até à publicação do Decreto-Lei 81/95, de 22 de Abril) no seio da G.N.R. do Porto, em Janeiro de 1991, na dependência directa do Comando do Grupo Territorial (ou Comando Distrital) e sediada em Matosinhos, na Quinta da Conceição, Leça da Palmeira.
2. Os doze primeiros arguidos integraram o GEAP, sendo que em Maio de 1995 esse grupo fracturou-se: uma parte veio para Braga (na qual se incluíam os arguidos A e B) e a outra permaneceu em Matosinhos, acabando por ser deslocada para Penafiel.
3. Ao GEAP competia, para além de outras funções, vigiar, fiscalizar e reprimir todas as actividades relacionadas com o narcotráfico que ocorresse nas áreas territoriais dos distritos do Porto, Braga, Viana do
Castelo, Penafiel e Chaves.
4. No exercício de tais funções todos os primeiros doze arguidos estavam autorizados a usar traje civil e utilizar viaturas automóveis civis, competindo-lhes fazer as necessárias vigilâncias a indivíduos relacionados com o tráfico e consumo de estupefacientes, detê-los sempre que fossem encontrados na posse de estupefacientes ou fosse presenciado algum acto de cedência desse produto, noticiar esses factos e proceder à apresentação dos suspeitos a 1. interrogatório judicial.
Caso "U"
5. Em princípios de Novembro de 1993 a equipa do GEAP composta pelos arguidos A, C e B tomou conhecimento, através de vários consumidores de estupefacientes, que T vendia elevadas quantidades de estupefacientes fornecidas da Holanda.
6. Os arguidos A, C e B, esperaram o T no interior do prédio onde reside o U, junto ao café "Europa", sito em Folgosa, cidade da Maia.
7. Volvidos poucos minutos surgiu o T trazendo consigo, envolto num guarda-chuva, um embrulho, contendo 500 gramas de heroína e acto continuo, procederam à sua detenção.
8. Da detenção e da posse de heroína lavraram os arguidos A, C e B o competente auto de notícia para apresentação do T a 1. interrogatório judicial.
Caso "Q"
9. Durante o mês de Janeiro de 1994, os arguidos A, B, C e D, integrando na altura uma equipa do Grupo Especial de Acção e Pesquisa da G.N.R., comandada pelo primeiro, tomaram conhecimento que um indivíduo conhecido por Q, com oficina algures na freguesia de Cabanelas, comarca de Vila Verde, se dedicava à passagem de moeda falsa.
10. Por isso, no dia 1 de Fevereiro de 1994 os referidos arguidos, no exercício das suas funções policiais, abordaram o Q deram-lhe voz de detenção e algemaram-no.
11. Nesse momento, V, dirigia-se à oficina do Q, na companhia de um tal X, a fim de lhe devolver uma nota falsa de 10000 escudos que ele o incumbira de passar.
12. O V recebeu sinal gestual do Q de que deveria fugir, o que fez, mas acabou por ser perseguido e detido pelos arguidos A, B, C e D que integravam a força policial e introduzido na viatura por eles utilizada no exercício das suas funções de órgãos de policia criminal.
13. Logo de seguida os arguidos A, B, C e D efectuaram uma busca à residência do Q onde apreenderam duas espingardas caçadeiras e vários auto-rádios.
14. Mas, apesar dessa apreensão, não lavraram auto de notícia de tais factos para o exercício da acção penal, como aliás, sabiam ser obrigatório por lei, e apropriaram-se, em proveito de todos, do referido armamento e dos auto-rádios.
15. Sendo certo que umas das espingardas apreendidas ao Q, marca "António Zolli, n. 206123 pertencia e pertence ao Z, fora por aquele receptada ilicitamente e foi integrada no património do arguido A.
16. O Q e o V, ambos na situação de detidos e constituídos como arguidos, foram conduzidos pelos arguidos A, B, C e D ao posto da G.N.R. de Prado.
17. Já nesse posto, os referidos arguidos procederam à libertação do V.
18. Seguidamente, os mesmos elementos do GEAP propuseram ao Q a indicação da identidade e residência de alguém ligado à prática de actividades ilícitas, tendo o Q denunciado A', pessoa que na sequência de tal denúncia veio a ser condenado por Acórdão transitado em julgado em 20 de Julho de 1995 pela prática dos seguintes crimes:
- Três crimes de coacção de funcionário, previstos e punidos no artigo 384 e 386 do Código Penal, um crime de detenção de arma proibida previsto e punido no artigo 260 do Código Penal, um crime de aquisição de moeda falsa para ser posta em circulação previsto e punido no artigo 243 do Código Penal e ainda um crime de tráfico de estupefacientes previsto e punido no artigo 21 do Decreto-Lei 15/93, de 22 de Janeiro.
19. Não obstante saberem que estavam obrigados a participar criminalmente a conduta delituosa do Q e a mantê-lo detido até ser apresentado a 1. interrogatório judicial, os arguidos libertaram o Q.
Caso "R"
20. Em dia não determinado do mês de Fevereiro de 1994, os arguidos A, C, B e D, integrando uma patrulha do GEAP da G.N.R. no pleno exercício das suas funções policiais, averiguaram que A', de etnia cigana, residente num acampamento em Carvalhinhos, Prado, Vila Verde, se dedicava à venda continuada de estupefacientes.
21. Utilizando também como principal vendedor daquele produto estupefaciente B', que fora contratado como seu motorista, a troco de somas monetárias e heroína para seu consumo pessoal.
22. Em finais de Fevereiro do mesmo ano de 1994, os mencionados arguidos, sempre no exercício das suas funções de agentes da autoridade policial, cerca das 3 (três) horas da madrugada, abordaram o B' e ordenaram-lhe que os informasse sobre o local onde o
Domingos guardava as substâncias estupefacientes.
23. Em Abril de 1994, em Prado, comarca de Vila Verde, o B' foi abordado pelo arguido A, que, lhe disse que ele B', se encontrava em liberdade condicional, tinha que ajudar os GEAP's pois que, se não o fizesse o poderiam perseguir por drogas ou armas.
24. Assim, no dia 11 de Abril de 1994, os arguidos A, C, B e D, que estavam no exercício das suas funções de agentes da autoridade, cerca das 19 horas, junto ao acampamento de indivíduos de etnia cigana, sito em Carvalhinhos, Prado, Vila Verde, interceptaram o veículo automóvel em que se transportava o R e que era conduzido pelo B' e forçaram-nos a sair.
25. De seguida, o B e o D deslocaram-se, na qualidade de agentes da autoridade, à barraca onde morava o R, com o intuito de efectuarem uma busca domiciliária, e, eventualmente, apreenderem produtos estupefacientes e demais produtos e valores provenientes do narcotráfico, levando consigo o R e o B'.
26. Ali chegados, arrombaram as portas da barraca e penetraram no seu interior para efectuarem a aludida busca.
27. Em consequência dessa busca encontraram e apreenderam várias embalagens de heroína, cocaína, e várias quantias monetárias e objectos em ouro, pretensamente provenientes do narcotráfico.
28. Desta apreensão lavrou o arguido A, de comum acordo com os restantes elementos da patrulha, o competente auto de notícia - originando a instauração do Processo Comum Colectivo n. 19/95, 2. juízo do Tribunal de Círculo de Braga, já julgado - deram voz de detenção ao R e ao B', constituíram-nos arguidos e conduziram-nos, sob detenção, ao posto da G.N.R. de Prado, comarca de Vila Verde.
29. Já nesse posto, o B', com o intuito de vir a ser libertado, dispôs-se a indicar ao A e ao B a existência de outra quantidade de heroína pertencente ao R.
30. O que foi aceite pelo A e B, agentes da autoridade que com ele se deslocaram a um pinhal adjacente ao acampamento do Domingos, onde encontraram 95 (noventa e cinco) gramas de heroína, fraccionadas em embalagens de 5 (cinco) gramas, que estavam enterradas e pertenciam ao R.
31. Apesar da existência desta substância, do conhecimento da natureza e das características estupefacientes da mesma e da obrigatoriedade legal de procederem à sua apreensão para o processo-crime, o A e o B não o fizeram, nem mencionaram o facto no auto de notícia lavrado em consequência da detenção do Domingos e do B'.
32. Antes apropriaram-se, em proveito de ambos, das 95 gramas de heroína,
33. Poucos momentos após o regresso dos arguidos A e B ao posto da G.N.R. de Prado, perante o pedido insistente do B' de que necessitava urgentemente de um "fumo" de heroína, por estar a
"ressacar", um elemento não identificado do GEAP deu-lhe 5 gramas de heroína, parte da qual consumiu, de imediato, na casa-de-banho.
34. Algumas horas depois, cerca das 2 horas da madrugada do dia 12 de Abril de 1994, o B' sugeriu ao arguido A, por solicitação deste que lhe podia indicar o esconderijo de 3000 contos do R e de uma arma ao mesmo pertencente.
35. O A discutiu a proposta com o C e o B e então seguiram de novo na companhia do B' para o acampamento dos Carvalhinhos, onde, junto à barraca onde pernoitava o R, utilizando para o efeito ferramentas de uma obra de construção civil, desenterraram 3 sacos em plástico, contendo um cerca de 1000 contos pertencentes ao R.
36. Sabiam perfeitamente o A e o B que os três mil contos tinham indícios sérios de provir do tráfico ilícito de estupefacientes, de forma continuada, por parte do R e que,
37. por isso, tinham a obrigação legal de procederem à sua apreensão e de mencionar tal factualidade no auto de notícia que lavraram em consequência da detenção do R e do B' por fortes suspeitas da prática do crime de tráfico ilícito de estupefacientes.
38. Não obstante terem conhecimento dessa obrigação legal, os arguidos A e B apropriaram-se, em proveito de ambos, daquela quantia de 3000 contos, que integraram nos seus patrimónios, bem sabendo que lhes não pertencia e,
39. Aqueles agentes então procederam, à libertação do B' e transportaram-no até casa na viatura afecta ao serviço público, que estavam a efectuar a darem-lhe 1000 contos dos 3000 contos que haviam retirado do esconderijo do R.
40. Estavam os arguidos A e B encarregados da guarda do B', pois foram eles próprios que, momentos antes, procederam à sua detenção como suspeito da prática do crime de tráfico de droga, em co-autoria com o R, como aliás veio a ser condenado no Processo Comum Colectivo instaurado em consequência da detenção do R.
41. Sabiam ainda os ditos arguidos que o B' se encontrava legalmente privado da liberdade e que assim deveria obrigatoriamente manter-se até à sua apresentação a 1. interrogatório judicial.
42. Por outro lado, e apesar de voluntariamente terem libertado o B', mencionaram falsamente no auto de notícia elaborado que aquele, aproveitando a escuridão da noite, se escapara à sua vigilância, pondo-se em fuga, no momento em que procuravam o esconderijo do dinheiro do R.
43. Ao forjarem e assinarem o auto de notícia acima referido, agiram os arguidos A e B deliberada e conscientemente, com o propósito de ocultarem a sua ilícita actuação, faltando à verdade quanto às circunstâncias essenciais à prática dos crimes ali relatados, designadamente a quantidade e montantes monetários supostamente provenientes do tráfico de droga.
44. Bem sabendo também que o auto de notícia se destinava a documentar os factos por si presenciados no exercício das suas funções, designadamente os factos que constituem crime, circunstâncias que os rodearam e os meios de prova e bem assim que ao faltarem à verdade sobre tais elementos causavam prejuízo ao Estado, pondo em causa a realização da justiça.
45. E ao apoderarem-se dos 3000 contos atrás referidos e das 95 gramas de heroína, sem darem notícia dos mesmos no auto e sem os apresentarem com o respectivo expediente processual, bem sabiam os arguidos A e B que tal montante lhes não pertencia e que deveria legalmente ser apreendido e efectuado à administração da justiça.
Caso "E' Robalo"
46. No dia 19 de Maio de 1994 os arguidos C, B, D e N, integrando uma equipa do GEAP, comandada pelo C, em pleno exercício das suas funções de agentes de autoridade, averiguaram que no acampamento de etnia cigana situado junto do posto abastecedor de combustível "GALP", em Ponte de Lima, C', D' e E' se dedicavam à venda continuada de substâncias estupefacientes, designadamente heroína e cocaína.
47. Por isso, nesse mesmo dia 19 de Maio de 1994, interceptaram a D' e a E' quando estas se deslocavam de Viana do Castelo para Ponte de Lima e se dirigiam para o acampamento, revistaram-nas.
48. Em 26 de Maio de 1994, os mesmos arguidos (C, B, D e N), sempre no exercício das suas funções de agentes da autoridade policial, cerca das 24 horas, entraram nas barracas onde habitavam o C', a D' e a E', onde efectuaram buscas domiciliárias, em consequência das quais apreenderam substancias estupefacientes, montantes monetários e objectos em ouro.
49. Findas as buscas, os mesmos arguidos, abordaram e interceptaram cerca de oito indivíduos que se encontravam nas redondezas e que momentos antes tinham comprado heroína, para consumo pessoal, ao C', à D' e à E'.
50. Identificaram-se os arguidos como agentes de autoridade policial, qualidade essa que tinham na realidade, e revistaram todos os ditos consumidores, designadamente, F', seu companheiro "Tadeu", entretanto regressado ao Brasil, G', H', I' e J'.
51. O I' tinha entregue 5 mil escudos ao seu amigo conhecido por "Peruca", incumbindo-o de lhe trazer meia grama de heroína a adquirir aos referidos C', D' e E'.
52. O "Peruca" foi revistado pelos arguidos que lhe apreenderam os mencionados 5 mil escudos.
Caso "L'"
53. Os arguidos A, B, C, G, H e I no exercício das suas funções policiais, interceptaram o L', quando este transitava no Alto da Maia e levaram-no para o Posto da G.N.R. de Matosinhos, onde o retiveram desde o início da noite desse mesmo dia até às 6 horas da madrugada do dia seguinte.
54. No dia 20 de Maio de 1993, quando o L' se encontrava no café "Lúcio", em Vilar do Paraíso, Gaia, os mesmos arguidos conduziram-no ao aludido posto policial da G.N.R. de Matosinhos.
55. O arguido A, mencionou no auto de notícia como testemunhas daqueles factos os arguidos D, C e B, procedeu à detenção do L', à sua constituição como arguido e à sua apresentação como arguido detido a 1. interrogatório judicial, imputando-lhe a prática de conduta integradora de um crime de tráfico de estupefacientes.
56. Sendo que foi confirmada a detenção do arguido e procedeu-se ao seu julgamento com condenação em 7,5 anos de prisão, que ainda cumpre.
Caso "Caso M'"
57. Em dia não determinado, mas situado nos princípios de Abril de 1995 a patrulha do GEAP composta pelos arguidos A, C, E e D, em consequência das suas funções na repressão do tráfico de droga, tiveram conhecimento que M', identificado a folha 594, se dedicava de forma continuada, ao tráfico de heroína, trazendo tal estupefaciente desde o Norte de Espanha até à zona do Porto.
58. Os referidos elementos do GEAP, ora arguidos, interceptaram o M' na zona da Praia da Amorosa, Viana do Castelo, revistaram-no e verificaram que o mesmo tinha na sua posse dois embrulhos contendo heroína, vários cheques, um telemóvel, 81000 escudos em notas do Banco de Portugal e 1000 pesetas.
59. Os referidos arguidos procederam então à apreensão da heroína, do telemóvel e do dinheiro e à detenção do M' e à sua constituição como arguido pela posse de estupefacientes e valores resultantes do narcotráfico e lavraram o competente auto de notícia da factualidade descrita, com vista à instauração do competente processo criminal.
Caso "Ernesto"
60. Em meados de Setembro de 1995, a patrulha do GEAP da G.N.R., composta pelos arguidos A, B, L e M e comandada pelo primeiro, tiveram conhecimento que um casal de etnia cigana, formado por N' e O', se dedicava, de forma continuada, à venda de cocaína e heroína, na sua residência sita no Lugar do Galo, freguesia de Nogueira, concelho de Braga.
61. Assim, os referidos elementos do GEAP, no dia 20 de Setembro de 1995, efectuaram uma busca domiciliária à referida residência, com a finalidade de apreenderem, quer substâncias estupefacientes, quer bens e valores provenientes do narcotráfico e,
62. caso se confirmasse a posse de estupefacientes, deterem em flagrante delito os respectivos suspeitos - a referida N' e o O' - constituindo-os como arguidos e apresentando-os a 1. interrogatório judicial.
63. Em consequência da busca domiciliária efectuada, os referidos elementos da GEAP - ora arguidos - detectaram a posse, por parte dos suspeitos, de 3,253 gramas de cocaína e de 6,2 gramas de heroína e 0,21 gramas de haxixe, bem como da quantia total de 630000 escudos em dinheiro português.
64. Procederam, pois, os arguidos à detenção da N' e do O', bem como à respectiva constituição como arguidos pela posse dos estupefacientes e valores resultantes do narcotráfico e lavraram o auto de notícia da factualidade descrita com vista à instauração do competente processo criminal.
65. Retiraram também da posse da N' e do O' as substâncias estupefacientes e 630 contos que apreenderam.
66. Em busca domiciliária efectuada pela Polícia Judiciária verificou-se que o arguido E possuía na sua residência uma pistola Rhoner, calibre 8 milímetros, adaptada para calibre 6,35 milímetros com o respectivo carregador e 4 munições, sem qualquer manifesto ou registo.
67. Também na busca efectuada as instalações do GEAP possuía o arguido C no cacifo que lhe estava atribuído uma embalagem com 0,402 gramas que submetida a exame laboratorial revelou ratar-se de heroína.
68. No cacifo do GEAP atribuído ao arguido P foi encontrada uma pistola FN, modelo "Baby", calibre 6,35 milímetros com o n. 458763, que estava registada em nome de P'.
69. Na mesma busca foram encontradas no interior da caixa de pistola Walter PPK n. 405326, duas embalagens com o peso total de 0,497 gramas, que submetidas a exame laboratorial revelaram tratar-se de heroína.
Caso "Z"
70. Os arguidos B e A integraram desde 1992 a 1995 um grupo de elementos da G.N.R., superiormente criado, tendo como primordial função reprimir policialmente o tráfico ilícito de estupefacientes.
71. Esse grupo, denominado GEAP, era composto por 24 elementos, que por sua vez se agrupavam em equipas de 4 elementos.
72. Todos os elementos do GEAP conheciam-se muito bem e estavam ligados por laços de amizade, pois que nas várias operações de repressão do tráfico de droga participavam mais do que uma equipa e nas várias equipas era frequente a troca de elementos.
73. A área territorial da actividade policial dos GEAP's com as funções específicas descritas supra, situava-se nos distritos do Porto, Braga, Viana do Castelo, Penafiel e Chaves.
74. Estavam pois os arguidos B e A, através dos telemóveis próprios e do próprio sistema de comunicações internas, via rádio, em permanente contacto com todos os elementos das outras equipas, sabendo assim, a cada momento, quais as áreas territoriais em que cada equipa actuava e quais as operações destinadas a cada um deles.
75. O B e o A subscreveram os necessários contratos para a concessão de telemóveis, sendo certo que o B passou a utilizar o telemóvel n. 295781 e o A o n. 0931-583635 e, posteriormente, o telemóvel n. 0931-593465.
76. Por sua vez, o S, após conseguir os elementos identificativos de vários indivíduos, forjou as assinaturas de Q', R', S', T', U' e V'.
77. Assim conseguindo, ficticiamente, subscrever o contrato de mais seis telemóveis assim discriminados:
- n. 0931-56583, em nome de Q',
- n. 0936-720290, em nome de R',
- n. 0931-571684, em nome de S',
- n. 0931-504458, em nome de T',
- n. 0931-342480, em nome de U',
- n. 0931-502713, em nome de V'.
78. Durante todo o tempo em que perdurou a compra em Espanha, por intermédio de terceiros, e a posterior revenda a terceiros consumidores da heroína e da cocaína, estava o S em permanente contacto com os arguidos B e A, utilizando os telemóveis ns. 0931295781, 0931565836, 0936720280, 0931571684, 0931342480, 504458, 502713 e os restantes, respectivamente os telemóveis 295781 e 583635, sendo que o A, mais tarde, utilizou também o n. 593465.
79. Assim, só no verão de 1995, pelo telemóvel n. 0936-720280, o S contactou várias vezes a casa materna (telefone n. 078-97232), destacando-se ainda 12 chamadas para o telemóvel do arguido B (0931-295781).
80. Também pelo telemóvel n. 0931-565836 fez várias chamadas para o seu tio "Artur" (079-22553) e para o seu tio "Actor" (078-25118) e ainda muitas chamadas para o n. 052-493134, casa do seu sogro, X'.
81. Pelo telemóvel n. 0931-295781, usado pelo arguido B, fez este muitas chamadas para o 1. arguido A.
82. Também pelo telemóvel n. 0931-571684, fez o S inúmeras chamadas para a sua casa materna e ainda várias chamadas para o arguido B.
83. Ainda pelo telemóvel n. 0931-502713, fez o arguido S várias chamadas para o arguido B e ainda para os seus tios "Artur" e "Actor",
84. Também o arguido S através do seu telemóvel n. 0931-342480 fez inúmeras chamadas, destacando-se uma para o 2. arguido B.
85. E o A, por intermédio do telemóvel n. 0931-583635, para além das muitas chamadas para a sua residência e do B, fez muitas chamadas para os telemóveis usados pelo arguido S, bem como para a sua residência, assim discriminadas:
- telemóvel n. 0936-720280, folha 622 linhas 2 e 3;
- para a casa do S (078-97232), folha 628, 15 de Setembro;
- para o telemóvel do S (0931-571684), dias 8, 14 e 16 de Agosto;
- para outro telemóvel do S (0936-725801) em 29 de Setembro, 12 e 19 de Outubro.
86. Tais contactos pessoais e telefónicos visavam, para além do mais, pedir informações a todo o momento por parte do S ao arguido B no sentido de saber quais as zonas em que poderia proceder à venda de estupefacientes sem vigilância policial.
87. Por sua vez, os arguidos B e A, conhecedores de todas as movimentações policiais para a repressão do tráfico de droga na zona do Norte do país, durante o ano de 1995, através dos seus telemóveis ns. 295781 e 583635 e dos telefones das suas residências - o n. 619555 instalado na residência do B e o n. 601456 na residência do A comunicaram com o arguido S;
88. informando-o, o B de quais as zonas onde poderia efectuar impunemente o tráfico de droga e quais as zonas a evitar por nelas estarem ordenadas superiormente operações policiais com vista à repressão do narcotráfico.
89. Por isso, e na verdade, entre os dias 14 e 18 de Setembro de 1995, o arguido S, conhecido no seu meio como "Lau" ou "Lalo", recebeu no seu telemóvel uma chamada de seu sobrinho Z' e informa-o que devia o "beu" ao "Aa", o que entregava a "veia" por intermédio do "Bb".
90. Também entre os dias 21 e 25 de Setembro de 1995 um tal "Vergalho", primo do S, ligou para uma tia deste, uma tal "Soiza", perguntando se "iam buscar aquilo branconho, das camisolas brancas pois também queria um "Beu", obtendo como resposta que o "Lau" é que é nosso cliente. A gente a trazer aquele lote branco é para ele e que ele queria as camisolas todas brancas.
91. Ainda entre os dias 2 de Outubro de 1995 e 4 de Outubro de 1995 o S, aliás "Lau", comunicou telefonicamente com seu irmão Cc, aliás "Sá", dizendo-lhe que o tio de ambos, "Artur" comprara um Hyunday novo, porque "eles tiraram para aí 8 quilos", o que foi confirmado pela sobrinha "Biela", que ligou para a mãe do S, dizendo-lhe: "foram espanhiçar, trouxeram 5 ou 6 quilos de "veia"; "6 mil deu o "Artur" aos filhos, foi ele e o "Actor", ficaram milionários".
92. Por sua vez, na zona de Mirandela, Lamas de Orelhão, utilizava vários indivíduos de etnia cigana, nomeadamente um tal "Talim" e um tal"Lele".
93. Tanto o A, como o B tiveram em alturas localizadas no tempo conhecimento do modo e forma de abastecimento de estupefacientes ao S bem como o modo e locais de distribuição a terceiros consumidores.
94. Assim, entre os dias 4 de Setembro de 1995 e 6 de Setembro de 1995 o S telefonou a seu irmão para não atender o telefone de um tal "Nelo Currilho" pessoa que não se demonstrou ser o arguido N revendedor de heroína por conta daquele, pois fora preso com 500 gramas de heroína do S.
95. Entre os dias 21 de Setembro de 1995 e 25 de Setembro de 1995 o Cc telefonou para o S para o informar que eles (Artur e Actor) não trouxeram nada da branca, "veia" branca, era só castanha e que os mesmos "foram buscar 4 quilos dessa".
96. Ainda entre os dias 28 de Setembro de 1995 e 2 de Outubro de 1995 o Cc informa seu irmão S que eles (Artur e Actor) trouxeram aquilo as calças, ao que este lhe responde que só se vende da branca e mando-o enterrá-la num buraco fundo, com muitos sacos plásticos.
97. Entre os dias 31 de Outubro de 1995 e 3 de Novembro de 1995 o S (Lau) comunica a Cc "Sá" dizendo-lhe: "a veia castanha ma roubaram toda 750 veias, dá quase 7500 contos" e,
98. entre os dias 14 de Novembro de 1995 e 24 de Novembro de 1995 pede-lhe para informar os tios "Actor" e "Artur" (Artures) que "falteceiram 150 veias nos dois coisos", "são quase mil "beus".
99. Em dia não determinado, mas que se situa seguramente entre os dias 30 de Abril de 1995 e 3 de Maio de 1995, suspeitando que o cabo C, também elemento do GEAP a actuar na zona de Matosinhos, iria proceder a operações policiais de repressão do tráfico de droga na zona de Custóias, onde ele procedia com principal incidência à venda de heroína e cocaína, o S solicitou telefonicamente ao arguido B a confirmação desse facto, ao que este lhe respondeu que não estava programada qualquer intervenção policial naquela área, que estava tudo tranquilo e que aquele cabo não tinha ido trabalhar, pelo que podia continuar (impunemente) a venda de estupefacientes.
100. No mesmo contacto telefónico, o B disse ao S para lhe telefonar sempre que tivesse algumas dúvidas quanto aos locais onde podia livremente traficar os seus estupefacientes.
101. Assim, na aludida data o B ligou para o S e, quando este lhe perguntou se o cabo C estava em operações policiais na zona de Custóias, o B respondeu: "é mentira, podes ir à vontade que é mentira, não está nada, à vontade, quando tiveres algumas dúvidas ligas-me, então eu comprei isto para quê?".
102. Também durante o período de tempo 30 de Abril de 1995 a 3 de Maio de 1995 - o B contactou telefonicamente com o S perguntando-lhe se ele ou seu irmão Z' tinham vendido estupefaciente à Dd (naquela altura tinha sido detida na zona de Custóias na posse de heroína) e pedia-lhe para avisar o Z', pois tinha na frente uma informação policial no sentido de que iria haver uma operação policial e que a "Dd" iria denunciar um cigano como vendedor de droga, devendo por isso tomar cautela.
103. Também no período compreendido entre 30 de Abril de 1995 e 3 de Maio de 1995, o B comunicou telefonicamente com o S, dizendo-lhe que no domingo iria haver em Custóias uma operação policial de repressão do tráfico de droga, e,
104. assim, na aludida data, o B através do telefone n. 619555 ligou para o S, que atendeu o telemóvel n. 0931-565836 e, intitulando-se "Açoreano" (tratamento que utilizava unicamente quando se relacionava com o S para dissimular a sua ligação com este) disse-lhe: "que no fim de semana vai haver aí uma operação, vou estar aí, não te digo onde é, mas não há crise contigo".
105. Em dia não determinado, mas compreendido entre 20 de Abril de 1995 e 27 de Abril de 1995, procedeu-se a uma operação policial de repressão do tráfico de droga na zona de Custóias, mais precisamente na zona onde o S, por intermédio dos seus revendedores, da sua mulher, da sua cunhada e do seu cunhado, procedia à venda de estupefacientes, nomeadamente heroína e cocaína.
106. O arguido B, tendo conhecimento prévio dessa operação, impediu que em relação ao S e seus familiares fossem colhidos fortes indícios do seu envolvimento no tráfico de droga, livrando-os assim da respectiva detenção e posterior punição.
107. Por isso é que na aludida data, em conversa telefónica com sua esposa, diz "ainda agora lhe salvei da cadeia quatro. Ele, a mulher, o cunhado e a cunhada, o que é preciso é dinheiro", sendo certo que se referia inequivocamente aos familiares do S pois tal conversa ocorreu na sequência de uma ligação concomitante que o arguido S atendeu pelo telemóvel n. 0931-56836, sendo este o telemóvel utilizado para os contactos com os seus tios "Actor" e "Artur".
108. Todas as descritas informações visavam a protecção policial do arguido S e estavam de harmonia com o plano conjunto dos três, que visava a perduração no tempo do narcotráfico levado a cabo por este último.
109. Assim, em conversa telefónica mantida pelo B com sua esposa, a 27 de Julho de 1995, quando esta lhe pergunta se já tinha ido aonde era para ir, respondeu "Deu... cem", retorquindo aquela: "o mesmo, ou mais, ou?" e que tal?", ao que o marido respondeu "está tudo a correr bem", "... diz que está enrascado".
110. Em dia não determinado, mas situado entre 20 de Abril de 1995 e 2 de Maio de 1995, o arguido A através do seu telefone n. 601456, comunicou com o arguido B, dizendo-lhe, para além do mais, "que aquilo que fazia pelo S também tinha que vir".
111. Assim, em data não determinada, mas situada poucos dias antes de 20 de Abril de 1995, o B e o A entregaram ao S 145 (cento e quarenta e cinco) gramas de heroína para que este vendesse e lhes entregasse posteriormente o respectivo valor,
112. que estipularam em 1000000 escudos pela totalidade do estupefaciente entregue.
113. O S vendeu a terceiros consumidores os 145 gramas de heroína e, no dia 20 de Abril de 1995, tinha apurado o respectivo preço de venda, os 1.000 contos, conforme o combinado.
114. Assim, através de contacto telefónico, o S combinou com o B que a entrega dos 1000 contos, produto da venda da heroína, lhe seria entregue no dia 24 de Abril de 1996.
115. Na verdade, o B, em contacto telefónico mantido com o S, em 20 de Abril de 1995 Quinta-feira, identificando-se como o "Açoreano", marcou um encontro para 2. feira próxima (24 de Abril), sendo que esse contacto telefónico foi seguramente tido com o S, que atendeu pelo telemóvel n. 0931565836, usado habitualmente nos contactos com seus tios "Artur" e "Actor" e, no mesmo dia, na sequência desse telefonema, disse à sua mulher: "sábado já tem lá os mil contos", respondendo esta: "tenho medo a esses contratos..." ao que o marido retorquiu: "Foda-se ainda agora lhe salvei da cadeia quatro, ele e mulher, o cunhado e a cunhada".
116. No dia 28 de Abril de 1995, cerca das 10 horas da noite o B deslocou-se até perto do Estabelecimento Prisional de Custóias para receber dinheiro e, verificando que quem lhe ia pagar tardava, contactou telefonicamente com a sua mulher dizendo:
"ainda não apareceu, desmarquei com o outro, tinha tudo combinado para hoje, para as dez da noite, ele já tem aquilo para me dar".
117. O encontro referenciado no artigo 197 consumou-se no dia 24 de Abril de 1995 junto à cadeia de Custóias, mas o S só queria pagar 500000 escudos pela heroína recebida do B e do A, alegando que face ao estupefaciente recebido só tinha que devolver 750 mil escudos.
118. Então o B insistiu que a quantidade de estupefaciente entregue por ele e pelo Manuel A era de 145 gramas de heroína, pelo menos, e que fora acordado o pagamento de, pelo menos, 1000 contos juntos.
119. Ameaçou-o ainda de que, caso não lhes entregasse os mil contos juntos, na Sexta-feira próxima, dia 28 de Abril de 1995, deixava de lhe dar protecção policial, dizendo-lhe: "qualquer coisa que façam contra ti... eu nem sequer quero saber, nem sequer quero ter conhecimento".
120. Na verdade em contacto telefónico anterior que o arguido A manteve com o B, que atendeu pelo telemóvel n. 0931-29578, após perguntar se podia falar (o que só se compreende por receio de a conversa ser ouvida por terceiras pessoas, pois eram amigos de longa data), disse-lhe que já tinha falado para o S, estava à espera dele, dizendo o A que queria saber se ia a casa do B ou se o esperava a meio do caminho, em Famalicão.
121. Poucos momentos após, no dia 24 de Abril de 1995 o B comunicou telefonicamente para o A informando-o que se tinha confirmado o encontro com o S e que: "o gajo veio com a mesma ladainha, que trazia 500 contos disse-lhe (B) "o que é que foi o nosso contrato? o nosso contrato foi dás-me mil contos juntos; e começou-me com a treta de que me estava a dar duzentos e cinquenta a mais; disse-lhe: "ó pá, tu não estás a dar esmola nenhuma, caralho! Não eram cem gramas, eram aí 145 gramas, portanto se me estás a dar mil contos... estás-me a dar o valor delas, não me estás a dar nada teu, caralho... porque eu, se chego a um gajo qualquer, a um outro amigo teu, que ele passa-me essa merda, aos anos que eu tinha o dinheiro", significando tais expressões inequivocamente a entrega e a cobrança de 145 gramas de heroína ou cocaína, pois resulta que o S se dedicava ao tráfico de droga e os mil contos correspondiam ao valor da venda daquelas espécies de estupefacientes.
122. Na verdade, no dia 5 de Maio de 1995 o B comunicou telefonicamente com o S, acabando por marcar encontro entre ambos para o dia 8 de Agosto de 1995 segunda-feira.
123. No dia 12 de Maio de 1995 o B comunica telefonicamente com a sua mulher, dizendo: "estive a falar com o meu amigo", estou despachado mas triste, retorquindo-lhe esta:"não te deu aquilo?, ao que o marido lhe respondeu "oh, já sabes por que é que estou fodido da cabeça"
124. Então, o B, no dia 15 de Maio de 1995, deslocou-se à residência do S, em Mirandela, na tentativa de cobrar os 1000 contos correspondentes ao valor da heroína que ele e o A lhe haviam entregue.
125. Para o efeito e para impedir que o S o evitasse logo que visse o seu carro, tomou de empréstimo um de um seu amigo.
126. Assim, naquela data, o B ligou para a sua mulher, dizendo-lhe "... falei com ele, começou para ali a rezar e eu mandei-o para a puta que o pariu, que não mais me voltasse a chatear", ao que esta lhe retorquiu "mas assim perdeste tudo, que ele nunca mais to dá". Por sua vez, diz B: "agora vou metê-lo na cadeia, por portas travessas". E, prossegue a mulher: "então não te deu nenhum... então dizias! então dama". E novamente o B - "oh, oh! e eu queria? Foda-se".
127. No dia 16 de Maio de 1995 o B abordou o S para tentar cobrar os 1000 contos, mas apenas conseguiu deste a promessa de que iria pagar.
128. Na verdade, na referida data o B telefonou para sua mulher Ee dizendo: "Fui aonde o cigano (sempre que se referia ao arguido S dizia: "o outro, o meu amigo, o meu amigo S, o Joaquim, o S"), disse-me que não tinha". Perguntou-lhe Ee: "mas dá?". Respondeu B: "oh dá, eventualmente irá dar".
129. Também no dia 16 de Maio de 1995 "Ee", mulher do B, telefonou à sua mãe dizendo: "o (B) teve um acidente, saiu às cinco da manhã para ir onde ao cigano, a ver se lhe dava o dinheiro, mas o A paga metade", ao que a sua mãe lhe perguntou: "ele também era para os dois não era". Continuou "Ee" dizendo: "já viu, quando ia a sair, para... que é para eles não telefonarem à Polícia, nem nada".
130. Perante a recusa de devolução dos 1000 contos, o B ameaçou o S de que iria metê-lo na cadeia por portas travessas.
131. No dia 29 de Maio de 1996, o B perguntou telefonicamente ao Joaquim, ao que este lhe respondeu que estava à espera duma cobrança de venda de droga, mas que já tinha consigo metade do preço.
132. Assim, na verdade, na referida data, o B ligou para o S que atende pelo seu telemóvel n. 0936-720280 (telemóvel normalmente usado para as ligações para a sua casa materna) e disse-lhe: "eu estou aqui à espera de um gajo para receber uma grama... a metade tenho-a já". Respondeu-lhe o B: "olha lá, é que eu tenho aqui o "tabaco" (necessariamente heroína). Retorquiu-lhe o outro: "eu vou já aí buscar isso, tenho aqui a metade". E finaliza: "a que horas queres, na bomba" Oh, pá, não fales mais".
133. Combinou então o B encontrar-se com o S na bomba em causa às dez horas, dizendo-lhe que tinha mais uma remessa de heroína (que designou por "tabaco") para ele vender por conta e no interesse dele e do A.
134. Assim, o A no dia 7 de Agosto de 1995, através do seu telemóvel n. 0931-583635, telefonou para o posto telefónico 97232, instalado na residência do S.
135. Face à ausência do S, comunicou com a mãe deste, identificando-se, como fazia sempre, como "feirante", dizendo-lhe que tinha muita urgência em falar com o filho.
136. Pediu, insistentemente, o A à mãe dele para que o S lhe telefonasse com urgência para o seu telemóvel, e só para aquele número, visto que desde princípios de Julho de 1995 que suspeitava que o seu telemóvel estava sob escuta.
137. Também entre 14 de Setembro de 1995 a 18 de Setembro de 1995, o B Gonçalves, através do seu telemóvel 295781, telefonou para o posto telefónico instalado na residência do S, em Lamas de Orelhão, Mirandela.
138. Face à ausência do S, falou com a mãe deste, a quem se identificou novamente como "feirante", dizendo-lhe que tinha muita urgência em comunicar com o filho.
139. Mais pediu à sua interlocutora um contacto telefónico urgente para o seu telemóvel, dizendo-lhe que era para o telemóvel do "açoreano", sendo este o apelido usado habitualmente no relacionamento com o S e seus familiares, para ser distinguido do A.
140. No dia 29 de Setembro de 1995 o B comunicou pelo seu telemóvel para a sua mulher, dizendo-lhe que iriam nesse dia para a sua terra natal, mas teriam de regressar no dia seguinte, pois tinha de estar no
Porto, ir a um "coiso" e que depois regressavam a casa.
141. Na 2. feira, dia 2 de Outubro de 1995, o B, em comunicação telefónica com a sua mulher, disse: "tenho que ir lá abaixo falar com o outro" e, momentos depois, em novo contacto telefónico, informa-a de que esse encontro se daria no dia seguinte, 3 de Outubro de 1995, pelas 13 horas.
142. Em dia não determinado, mas que se situa entre 11 de Dezembro de 1995 e l4 de Dezembro de 1995, o B comunicou telefonicamente com o S a marcar um encontro em local não apurado, às 19 horas do dia 13 de Dezembro de 1995.
143. Por isso, no dia 15 de Janeiro de 1996, à noite, o A comunicou telefonicamente com o B dizendo-lhe: "eu vou aí, pões-te a pé, também é só para me dares isso. É só ir aí, entregas-me a coisa e venho".
144. Por isso, no dia 5 de Setembro de 1995, o S telefonou ao seu irmão O, de alcunha "Sá", que atende pelo telefone n. 97232, instalado na residência de S, em Lamas de Orelhão, dizendo-lhe para não atender eventuais telefonemas do "Nelo Currilho", pois ele foi preso ontem com "médio" meu, "a mim é que berraram agora meio", foi preso "lo currilho", três mil e quinhentos contos.
145. Bem sabiam os arguidos B e A que, conhecedores como eram do envolvimento do S no tráfico de droga e dos locais onde o mesmo a guardava, que estavam obrigados por lei a desencadear o respectivo procedimento criminal,
146. e não o fizeram conscientemente para receberem em troca, como receberam, proventos económicas por parte do arguido S.
147. Os arguidos A, B, C e D agiram livre, deliberada e conscientemente.
148. Sabiam que as suas condutas não eram permitidas e que eram punidas por lei.
149. Os arguidos A e B, bem como os respectivos agregados familiares, sempre viveram apenas do vencimento próprio de agentes da G.N.R., acrescido dos vencimentos das suas consortes,
150. Acresce ainda que ambos tinham e têm filhos a seu cargo, alguns dos quais em idade escolar.
151. O B estava até à sua detenção a reconstruir uma casa na sua terra natal (Ponteira-Montalegre).
152. O B vive desde 1991 numa habitação no Fujacal - Braga, a qual se encontra registada em nome do seu sogro, utilizando essa casa como sua morada (antes de preso) e de sua família. O B é dono de um Jeep "Opel Frontera" matrícula 38-77-FO e uma carrinha "Nissan" de matrícula GX-83-24.
153. O A adquiriu habitação própria na Aguçadoura, Póvoa de Varzim.
154. O A é dono de um "Opel Frontera" de matrícula 71-46-FQ, de um "Fiat Panda" de matrícula GB-34-24, um motociclo "Yamaha GTS 1000".
155. Tanto o arguido A, como o B, recebiam e recebem os respectivos vencimentos pela Caixa Geral de Depósitos.
156. O A procedia ao levantamento do seu vencimento logo a seguir ao respectivo depósito; ainda assim depositou 425000 escudos em 1994 e 100 contos em 1995.
157. Era, porém, titular de uma conta no B.C.P./Nova Rede na qual entre 1992-1995 depositou cerca de 10000000 escudos, sendo certo que há meses em que os depósitos efectuados são superiores aos vencimentos dele próprio e da esposa.
158. No dia da sua detenção foram levantados da referida conta do B.C.P./Nova Rede 1200 contos.
159. A conduta delituosa imputada aos arguidos A e B, nos termos supra descritos, é reveladora de uma manifesta e grave violação dos deveres que lhes cabiam em virtude das funções que lhes estavam atribuídas.
160. Os arguidos tinham como primordial função exercer a repressão do tráfico de estupefacientes, tendo abusado clara e conscientemente das suas funções para se apropriarem de valores apreendidos por suspeita de provirem do exercício do tráfico ilícito de estupefacientes.
161. Os arguidos B e A, com a prática dos factos integradores do crime de tráfico de droga, revelaram claro abuso das suas funções, na medida em que tinham a especial obrigação de não cometer tais factos pois lhes estava oficialmente atribuída a repressão policial do narcotráfico.
MAIS SE APUROU
Contestação do Arguido C:
162. O arguido C encontrou uma embalagem com 0,462 gramas de heroína no chão, no decorrer de uma operação policial.
163. O arguido deveria ter efectuado uma participação contra incertos para proceder à remessa da droga ao tribunal competente, não o tendo feito dada a falta de cofre na G.N.R. de Matosinhos e por ordem e com conhecimento do seu superior, foi o produto guardado no seu cacifo, para no dia imediato proceder às formalidades legais e sua entrega em juízo.
Contestação do arguido A
164. A equipa do arguido e demais arguidos do GEAP, sob o seu comando durante os quatro anos de actuação, detiveram diversos traficantes e consumidores, e respectivo produto bens e valores, que totalizaram quantidades não determinadas de droga, armas de fogo, dinheiro, viaturas, para além de outros bens e objectos de valor considerável, tendo efectuado diversas detenções;
165. No ano de 1992 o vencimento do A e sua esposa totalizou 2206000 escudos;
166. No ano de 1993 o vencimento do A e sua esposa totalizou 2454000 escudos;
167. No ano de 1994 o vencimento do A e sua esposa totalizou 2536000 escudos;
168. No ano de 1995 o vencimento do A e sua esposa totalizou 2793000 escudos;
169. Contraiu empréstimos bancários, além de ter recebido de tornas das partilhas do seu sogro, 1000000 escudos;
170. O arguido possui nas zonas ribeirinhas da Várzea da Póvoa de Varzim um pequeno campo, onde produz batatas, couves, cenouras e cebola;
171. O motociclo Yamaha foi adquirido pelo arguido no regime de aluguer de longa duração;
172. Por escritura pública de 25 de Novembro de 1985 o arguido e sua esposa receberam através de doação a casa de habitação na Aguçadoura, Póvoa de Varzim;
Contestação do arguido E:
173. O arguido cessou as funções nos GEAP em Maio de 1995.
Contestação do arguido P:
174. O arguido encontrou numa diligência de rotina num acampamento de ciganos em S. Gens, em Custóias, uma pistola marca FN "baby" calibre 6,35 milímetros com o n. 458763;
175. Que a pistola FN, modelo "Baby", calibre 6,35 foi furtada em 17 de Abril de 1991, a Ff, na residência em Cascais;
176. Segundo as instruções superiores para estas situações haveria de ser elaborado o expediente, com remessa da arma à PSP do Porto, o que só não aconteceu devido aos muitos afazeres do arguido e ainda porque as condições de trabalho eram bastante precárias, nomeadamente por disporem de uma única máquina de escrever para todo o grupo, o que impunha que os assuntos não considerados urgentes ficassem a aguardar vez para serem efectuados;
Contestação do arguido N:
177. Teor do Acórdão da 2. vara criminal do Círculo do Porto proferido em 05 de Junho de 1997.
RESULTOU AINDA PROVADO DA DISCUSSÃO:
178. Os arguidos A, B, C, D, E, F, G, H, I, J, L, P e M sempre viram reconhecido dentro da corporação militar em que prestam funções o seu trabalho e sempre foram bem considerados;
179. Os arguidos E, F, G, H, I, J, L, P e M são tidos como pessoas zelosas competentes e dedicadas no exercício das suas funções;
180. Os arguidos A e B desenvolveram a sua actividade desacompanhados em termos operacionais, encontrando-se, quando entraram para os GEAP's completamente impreparados;
181. O arguido G no desempenho da sua actividade foi esfaqueado e baleado;
182. Os arguidos A e B responderam no Tribunal Militar no Porto, tendo sido absolvidos; têm um processo pendente no qual lhes é imputado um crime de desobediência;
183. Os arguidos C, D, E, F, G, H, I, L, P, M, O nunca haviam respondido criminalmente;
184. O arguido J respondeu no Tribunal Militar pela prática de um crime tendo sido absolvido;
185. O arguido N encontra-se actualmente a cumprir uma pena de oito anos de prisão;
186. O Arguido A possui família, sendo a esposa enfermeira na clínica particular "Clipóvoa", possuindo três filhos com 8, 17 e 20 anos.
187. O Arguido B possui dois filhos com 5 e 13 anos; a mulher é empregada em jardim-escola.
PEDIDO CÍVEL
188. Os demandados A e B, enquanto elementos da G.N.R. no desempenho das funções que legalmente lhes estavam acometidas, no dia 11 de Abril de 1994 arrecadaram e integraram nos seus patrimónios pessoais 3000000 escudos, que constituíam parte da quantia apreendida na acção policial descrita nos artigos 44 a 60 da acusação.
189. Tais quantias como bem sabiam os demandados A e B faziam parte de apreensões resultantes de acções funcionais próprias e legítimas de agentes de autoridade e somente pelas suas qualidades funcionais lhes foram entregues.
190. Sabiam que delas não podiam dispor estavam obrigados à sua guarda e a proceder à sua apresentação no tribunal, juntamente com o expediente processual crime a que diziam respeito, porque o que também sabiam, desde a sua apreensão, era coisa pública e afecta à administração da justiça, de que eram participantes e de que é titular o estado.
191. Tinham perfeito conhecimento da ilícita proveniência de tais quantias, sabendo que não lhes eram devidas, pois que, coisa pública e afecta à administração da justiça de que é titular o estado.
12 - FACTOS NÃO PROVADOS
De relevante para a discussão da causa não logrou provar-se que:
1. A partir dos finais de 1993 os primeiros doze arguidos aperceberam-se de que no exercício das suas funções de prevenção ao narcotráfico apreendiam avultadas quantidades de estupefacientes e elevados montantes monetários provenientes do tráfico de droga, e formaram o desígnio de se apropriarem de algumas quantidades de estupefacientes e quantias monetárias que deveriam ser apreendidas para procedimento criminal, em consequência do exercício da acção policial.
CASO "U"
2. Que o T tinha como vendedores por sua conta para além de outros indivíduos, Gg e seu irmão "Hh".
3. Logo os referidos arguidos combinaram entre si assegurar a detenção e a constituição como arguidos do T, com a posse de meio quilograma de heroína, com o intuito de assim apreenderem para o processo-crime a instaurar uma parte daquela quantidade de estupefaciente e apropriarem-se, em proveito de todos, da parte restante
4. Sabedores de que o principal vendedor de substâncias estupefacientes por conta do T era "Gg", os mesmos arguidos, no dia 30 de Novembro de 1993, sempre actuando no exercício das suas funções já descritas nos artigos 1 e 4, interceptaram o U que trazia consigo uma certa quantidade de heroína.
5. Seguidamente, em vez de proceder à detenção e constituição como arguido do U, pela posse de heroína, o Sarg. A, em obediência ao plano traçado e aceite pelos restantes, propôs-lhe que atraísse o T até à sua residência e que trouxesse consigo 500 gramas de heroína e lhe fizesse crer (ao T) que a heroína era para ele U.
6. Ameaçando-o (o Sarg. A) de que se não fizesse a dita "encomenda", procederia à sua detenção pela posse de heroína.
7. Como não tinha nada a perder e não queria ser detido por posse de heroína, o U prestou-se a colaborar e telefonou ao T a propor-lhe a compra de 500 gr. de heroína.
8. Proposta que logo foi aceite e combinado o local da entrega do estupefaciente.
9. Não se provou que os arguidos A, C e B, ao esperarem o M junto ao "Café Europa" o hajam feito conforme o acordado; que o T ao trazer consigo as 500 gramas de heroína tenha actuado de harmonia com o acordo feito entre o U e os elementos da G.N.R.
10. Que decorridos três dias os arguidos A, C e B abordaram o U junto a um café, sito em S. Pedro de Fins, Maia, onde lhe exigiram a entrega de 1500 contos, dizendo-lhe que se o não fizesse procediam à sua detenção pela posse de heroína, conforme descrição feita no artigo 8 do despacho de pronúncia.
11. Que os arguidos A, B e C hajam prometido ao U que, em troca dos 1500 contos lhe dariam 100 gramas de heroína.
12. Que como o U alegasse grande dificuldade na obtenção dos 1500 contos, o arguido A propôs-lhe que solicitasse a seu irmão Gg e a um tal "Ii" a quotização de 500 contos cada um.
13. Proposta essa a que o U acedeu, disponibilizando 500 contos, aos quais juntou as quotas-partes do seu irmão e do H, perfazendo assim o total de 1500 contos exigidos pelos mencionados arguidos.
14. Que poucos dias decorridos manteve o U contacto telefónico com o arguido A e combinaram que a entrega dos 1500 contos ocorreria junto a um café, sito nas proximidades do Hipermercado
Jumbo, pelas 22 horas de certo dia, não determinado, daquele mês de Dezembro.
15. Que no dia e hora combinados, o U entregou aos arguidos A, C e B os 1500 contos, que momentos antes tinha escondidos num jardim próximo, e recebeu das mãos do A um saco com 100 gramas de heroína.
CASO "Q"
16. Que no dia 1 de Fevereiro de 1994 ao ser algemado o Q, o tenha sido junto ao portão da sua oficina.
17. Que o A, B, C e D, elementos da força policial hajam apreendido uma nota falsa de 10000 escudos.
18. Que quando o V foi libertado, os arguidos A, B, C e D lhe hajam pedido para fazer de conta que os factos justificativos da sua detenção não tinham ocorrido
19. Que os arguidos A, B, C e D, tenham proposta ao Q a sua libertação em troca da indicação e da identidade e residência do fornecedor de notas falsas.
CASO "R"
20. Que perante a recusa do B', os arguidos A, B e D, tenham entrado na barraca onde habitava o R, onde efectuaram uma busca domiciliária, sem para tal estarem autorizados, quer por mandado judicial, quer por qualquer das pessoas que habitavam a dita barraca.
21. Que enquanto o arguido A simulava uma revista ao B', o cabo C tenha revistado o R, apreendendo-lhe apenas o dinheiro.
22. Que os arguidos A e C se hajam deslocado à barraca do R, com o intuito de efectuar a busca domiciliária.
23. Que uma vez chegados à barraca do R os arguido A e C hajam entrado no seu interior sem para tal estarem autorizados quer por mandato quer por autorização.
24. Que na sequência dessa busca os arguidos A e C hajam apreendido 5 gramas de heroína ou Cocaína.
25. Que o arguido A tenha dado 5 gramas de heroína ao B' para este consumir.
CASO "E' "
26. Que no dia 19 de Maio de 1994 os arguidos C, B, D e E hajam tirado um avental da E' onde esta tinha 300 mil escudos em notas do Banco de Portugal.
27. Que seguidamente, os ditos arguidos procederam à revista e à apreensão do avental e do dinheiro porque tinham fortes suspeitas de que os 300 mil escudos provinham exclusivamente do tráfico ilícito de estupefacientes efectuado pela E'.
28. Que desses factos não lavraram auto de notícia nem procederam a apreensão do montante monetário para a instauração do competente processo-crime, antes se apropriaram do mesmo, em proveito de todos, bem sabendo que lhes não pertencia.
29. Que não estavam os arguidos B, C, D e E devidamente autorizados para realizar as buscas às barracas de C', D' e E', pois não possuíam mandado judicial, nem para tal estavam autorizados, de forma verbal ou escrita, por qualquer das pessoas que habitavam os locais buscados, as quais, na altura, se encontravam ausentes dos mesmos.
30. Que finda a operação policial, que redundou na detenção dos indivíduos de etnia cigana (C', D' e E'), o I' tenha pedido insistentemente a devolução dos 5000 escudos retirados no decurso da revista, e que a tenham integrado em proveito de todos, no seu património.
CASO "Jj"
31. Que no princípio de Setembro de 1994, os arguidos A, B e F, integrando uma patrulha do GEAP e em pleno exercício das suas funções de agentes de autoridade policial, averiguaram que uma cigana identificada como Jj, residente em Barrocas, Moreira de Cónegos, Guimarães, procedia à venda continuada a vários consumidores de substâncias estupefacientes, designadamente heroína.
32. Que tenham averiguado ainda os mesmos arguidos que a venda dos estupefacientes era efectuada, na ausência da Jj, por uma tal Kk, mas por conta daquela.
33. Que no dia 15 de Setembro de 1994 os referidos arguidos (A, B e F), sempre actuando na qualidade de agentes de autoridade, montaram vigilância à residência da Jj e verificaram que na mesma entraram vários indivíduos, para adquirirem heroína.
34. Que na sequência de tal vigilância, quando eram cerca de 23 horas, os três arguidos bateram à porta principal da residência da Jj, e sem esperar pela devida autorização, entraram de rompante na mesma residência, empunhando e exibindo o respectivo armamento de serviço.
35. Que bem sabiam os arguidos que para procederem à entrada e busca domiciliária na residência da Jj deviam estar devidamente autorizados, quer por mandado judicial, quer através de autorização de quem habitava a dita residência, ou dela fizesse o legítimo uso.
36. Que não tinham os arguidos o competente mandado judicial de busca domiciliária na residência da Jj, nem tinham a devida autorização da pessoa que na altura fruía do direito à habitação.
CASO "L'"
37. Que em dia indeterminado do ano de 1993, situado nos princípios desse ano, os arguidos A, B, C, G, H e I, tomaram conhecimento que o proprietário do café "Dragão", sito junto ao Hospital Joaquim Urbano, no Porto, cunhado de um elemento da G.N.R., tinha dificuldades em cobrar dum tal Ll uma determinada importância em dinheiro.
38. Que por isso, em pleno exercício das suas funções de agentes de autoridade policial, resolveram, através de ameaças e de agressões físicas nas pessoas do Ll e de seu genro forçar o primeiro a liquidar a quantia em dívida.
39. E por causa das descritas ameaças e agressões físicas, tanto o Ll, como seu genro L' tenham feito instaurar pela entidade competente as respectivas queixas-crime.
40. Que quando os arguidos levaram o L' para o posto da G.N.R. de Matosinhos o tenham retido sem qualquer possibilidade de sair para o exterior, intimidando-o a convencer o seu sogro a retirar todas as queixas-crime deduzidas contra os arguidos.
41. Que perante a recusa sistemática do L', urdiram os arguidos A, B, C, D, G e F um plano, por todos aceite, consistente em colocar no bolso do casaco do L' um (1) quilograma de haxixe, logrando assim obter, artificiosamente, uma razão legal para procederem à sua detenção em flagrante delito por posse ilegal de substância estupefaciente e fazer seguir o competente processo-crime.
42. Que os arguidos ao levarem o L' do Café "Lúcio" para o posto da G.N.R. tenha agido em execução de um qualquer plano.
43. Que no posto policial da G.N.R. de Matosinhos o arguido A, após solicitar e conseguir a entrega do casaco do L', tenha introduzido no bolso do mesmo casaco, sem o conhecimento do L', um quilograma de haxixe, que anteriormente apreendera em consequência de um outro serviço policial repressivo do tráfico de droga.
44. Bem sabendo da falsidade do facto - pretensa detenção por parte do L' do estupefaciente aludido no artigo anterior - o Sarg. A, em obediência ao plano traçado e aceite pelos arguidos B, C, D, G e F tenham lavrado auto de notícia relatando tal falsidade.
45. Que os arguidos tenham forjado e assinado o auto de notícia aquando da detenção do L', agindo deliberada e conscientemente.
46. Bem sabendo também que o auto de notícia se destinava a documentar os factos por si presenciados no exercício das suas funções e que ao faltarem à verdade sobre tais elementos causavam prejuízo ao Estado, pondo em causa a realização da justiça.
CASO "M'"
47. Que não obstante saberem os arguidos A, C, E e D que todo o dinheiro detido pelo M' resultava da prática do tráfico de estupefacientes e, consequentemente, da obrigatoriedade legal da manutenção da sua apreensão para o processo-crime, todos os mencionados arguidos tomaram o desígnio de se apropriarem em proveito deles próprios de parte do montante monetário detido por aquele.
48. Que em execução do plano traçado e aceite por todos, os mencionados arguidos se tenham apropriado em proveito de todos de parte do montante monetário detido pelo M', ou seja 60.000 escudos e 1000 pesetas.
49. Bem sabendo que tais montantes não lhes pertenciam, e que, desde a sua apreensão, eram coisa pública, afecta à administração da justiça, encontrando-se confiada à sua guarda.
CASO "ERNESTO"
50. Que em consequência da busca domiciliária efectuada em 20 de Setembro de 1995 à residência da N' e do O' os arguidos tenham detectado na posse dos referidos indivíduos a quantia de 1800 contos e avultada quantidade de dinheiro em moeda estrangeira.
51. Que os arguidos A, B, L e M tenham retirado à N' e ao O' 1800 contos e avultada quantidade de dinheiro em moeda estrangeira
52. Que não obstante saberem que todo o dinheiro detido pela N' e O' provinha do tráfico de droga e, consequentemente, da obrigatoriedade legal de o apreenderem para o processo-crime, todos os arguidos formaram o desígnio de se apropriarem, em proveito próprio, de parte daquele montante.
53. Que não obstante terem os arguidos apreendido, para além do mais, 1800 contos, o certo é que o arguido A autor e subscritor do auto de notícia relativo a tais factos, de comum acordo com os restantes elementos da patrulha só fez constar do mesmo a apreensão de 630 contos.
54. Que o remanescente do dinheiro - 1190000 escudos - não participado nem entregue ao Tribunal, ficou na posse dos arguidos - A, B, L e M - que dele se apropriaram em proveito de todos.
55. Que ao forjar e assinar o auto de notícia - atrás referido - agiu o arguido A deliberada e conscientemente, com o propósito de ocultar a sua ilícita actuação, faltando à verdade quanto às circunstâncias essenciais à prática dos crimes ali relatados, designadamente quanto aos montantes apreendidos.
56. Bem sabendo que o auto de notícia se destinava a documentar os factos por si presenciados no exercício das suas funções, designadamente os factos que constituíam o crime, circunstâncias que o rodearam e os meios de prova e que ao faltar à verdade sobre tais elementos causava prejuízo ao Estado, pondo em causa a realização da Justiça.
57. Que se hajam apoderado dos 1190 contos, sem do mesmo dar notícia no auto respectivo, e sem o apresentarem com o respectivo expediente processual, bem sabiam os arguidos que tal montante não lhes pertencia, e que, desde a sua apreensão, era coisa pública, afecta à administração da Justiça, encontrando-se confiada à sua guarda.
CASO "ACAMPAMENTO DE ALVARÃES"
58. Que em dia não determinado, mas que se situa na 1. quinzena de Maio de 1995, o arguido A, na companhia de um outro elemento do GEAP, decidiu colocar-se nas proximidades do acampamento de indivíduos de etnia cigana, sito em Alvarães, Viana do Castelo, para ilicitamente se apropriar das substâncias estupefacientes que encontrasse na posse dos consumidores daquele produto que se abasteciam no referido acampamento.
59. Que o arguido A e seu colega de serviço solicitaram e conseguiram a colaboração de um toxicodependente daquela zona, cuja identidade não foi possível apurar, que serviria para indicar quais os consumidores que normalmente se abasteciam no referido acampamento.
60. Que quando, nas circunstâncias de tempo e lugar já descritas, dois grupos de consumidores, regressavam do aludido acampamento na posse de 2 (duas) gramas de heroína para consumo colectivo, foram abordados pelos Sarg. A e acompanhante que,
61. Exibindo o respectivo armamento de serviço exigiram e conseguiram a entrega das duas gramas de heroína, as quais eram transportadas por 2 deles, Mm e pelo Nn.
62. Que o arguido A e seus acompanhantes se tenham apropriado em proveito de todos das duas gramas de heroína, bem sabendo, porém, que na qualidade de agente de autoridade deveria proceder à detenção dos portadores de heroína e participar criminalmente a conduta delituosa verificada.
63. Que o arguido A sabia que o recebimento e posterior detenção da já referida substância estupefaciente não era permitida por lei e que constituía crime de tráfico de estupefaciente, de cuja prevenção e repressão, dadas as suas funções, estava especialmente incumbido, o que também sabia.
64. Que o arguido P sabia da proveniência ilícita da pistola FN, modelo "baby".
65. Que a caixa da pistola Walter PPK, n. 405326, tenha sido distribuída até 2 de Maio de 1995 ao arguido E.
66. Através de permanentes contactos, quer através de reuniões pessoais, quer através de contactos telefónicos, assentaram o S o B e o A, que o primeiro encomendaria o fornecimento de grandes quantidades de heroína e cocaína a seus tios conhecidos respectivamente por "Artur" e "Actor", residentes em Mirandela, que para o efeito se deslocavam a Espanha onde compravam os referidos estupefacientes por conta do arguido S.
67. Assentaram ainda os referidos arguidos que a heroína e cocaína para o S vender no interesse dos três seria também encomendada a um indivíduo conhecido por "Bb" que se deslocava a Espanha, onde as comprava a um tal "Manolo", por conta daquele
(S), de quem recebia o dinheiro necessário à encomenda dos estupefacientes.
68. Foi ainda discutido e acordado que a heroína e a cocaína fornecida ao S seria por este vendida a terceiros através de vários revendedores por sua conta, entre eles um tal "Pp" e um "Oo", que actuariam na zona de Matosinhos, e o arguido Cc, irmão do S, e seus sobrinhos "Talim" e "Lele", que actuariam na zona de Mirandela.
69. Por último, foi acordado pelos três arguidos que como contrapartida da participação dos arguidos B e A na organização descrita, estes, na qualidade de agentes da autoridade policial, integrados numa força policial com o primordial objectivo de reprimir o tráfico de drogas, forneceriam, sempre que necessário, informações ao arguido S, indicativas de quais os locais onde diariamente poderia proceder à venda de estupefacientes sem perigo de essa actividade ser descoberta.
70. Para que o S levasse a cabo a actividade de tráfico de droga, desde que a recebia, quer dos seus tios (Artur e Actor), quer do Bb, até à entrega da mesma aos seus revendedores, com menores probabilidades de ser perseguido criminalmente, acordaram os arguidos S, B e A que estariam em permanente contacto entre si, através de telemóveis pessoais, desse modo conseguindo saber, a cada momento, onde poderiam ser traficados impunemente os estupefacientes por conta e no interesse dos três.
71. Em data não determinada mas que se situa seguramente nos princípios do ano de 1994, os arguidos S, B e A planearam entre si constituir uma estrutura organizada com vista a que o arguido S efectuasse, de forma prolongada no tempo e em várias zonas de Mirandela e Matosinhos, a venda de grandes quantidades de heroína e cocaína, venda essa cujos lucros seriam distribuídos pelos três arguidos.
72. Desde princípios do ano de 1993 até finais de 1995, o arguido S vendeu a terceiros consumidores diversas quantidades de heroína e cocaína, que perfaziam em média 1 (um) kg. de heroína e 1 (um) Kg. de cocaína por mês.
73. As quantidades de estupefacientes aludidas no artigo anterior eram encomendadas pelo S a seus tios "Artur" e "Actor" e ao "Bb", aos quais entregava previamente o valor correspondente ao preço de aquisição, que rondava os 6000 escudos por quilograma daquelas espécies de estupefacientes.
74. Que com base nos instrumentos interpretativos resultantes do bom senso experiência comum e dados da experiência conjugados com o próprio teor das conversações relatadas nas escutas telefónicas, em si mesmo considerado, ou pelo confronto com o contexto de secretismo em que são mantidas ou pela sua relação lógica com outras que as antecedem ou lhes sucedem, se entende que, sempre que houver referência: a) qualquer coisa, material, pó, objecto não determinado em si mesmo ou no seu conteúdo; b) a qualquer substituída por pronome isto isso aquilo; a qualquer coisa só referenciada pela quantidade; c) a qualquer objecto concreto e determinado em função da cor clara ou escura, nomeadamente fatos, fatos de treino, camisolas; d) ou ainda, quando se fala de qualquer objecto indeterminado só identificado pela respectiva cor, castanho escuro, pretendem os interlocutores referir os estupefacientes cocaína ou heroína.
75. Não se provou que no telemóvel 0936-725801 o arguido S alude chamadas transcritas na cassete 19 b, fls. 123, 078-97232
76. Que os contactos pessoais e telefónicos visavam para além do mais pedir informações a todo o momento por parte do S ao arguido A no sentido de saber quais as zonas em que poderia vender substâncias estupefacientes sem vigilância policial.
77. Que os arguidos B e A para além do ano de 1995 através dos seus telemóveis e dos telefones de suas residências hajam comunicado quase diariamente com o arguido S.
78. Desde os princípios do ano de 1992 até princípios de 1996, o arguido S recebeu durante todos os meses e uma vez por mês, em média, um quilograma de heroína e um quilograma de cocaína, através de prévias encomendas feitas aos aludidos "Artur" ou "Actor" ou "Bb", que, por sua vez, as transportavam desde Espanha.
79. Logo que recebia a heroína e a cocaína, o S escondia-as, enterrando em Lamas de Orelhão Mirandela, as que recebia dos seus tios "Artur" e "Actor" e, algures em Custóias, as que recebia do "Bb".
80. Que entre os dias 14 e 18 de Agosto de 1995 o S após receber uma chamada do Z' e ao referir-se a "Beu" tenha querido dizer meio quilo de heroína e ao referir-se a "Veia" tenha querido dizer heroína ou cocaína.
81. Que quando em Setembro de 1995 um tal Vergalho, primo do S ligou para uma tia deste, perguntando se iam buscar aquilo branconcho, obtendo como resposta que o "Lau" é que é nosso cliente. A gente a trazer aquele lote branco, queira significar inequivocamente cocaína.
82. Que na conversa telefónica tida entre o "Lau" e o seu irmão Cc, entre os dia 2 de Outubro de 1995 e 4 de Outubro de 1995 ao ser usada a expressão "eles tiraram para aí uns 8 quilos" tenham querido significar cocaína ou heroína necessariamente.
83. Na venda de heroína e cocaína, o S utilizou vários indivíduos por sua conta, indivíduos esses que se deslocavam aos esconderijos onde ele lhes entregava porções fraccionadas, que pagavam após a venda.
84. Na zona de Custóias, o S utilizava como seus vendedores dois indivíduos não ciganos, denominados na gíria "Currilhos", sendo um o Oo e o outro um tal "Pp " e,
85. Era o arguido Cc, seu irmão, que na zona de Lamas de Orelhão recebia a heroína e cocaína trazida pelos tios "Artur" e "Actor" para o S, procedia à sua dissimulação, enterrando-a nos vários esconderijos, e, 86. Através do telefone n. 97232, instalado na sua residência materna, recebia todos os contactos telefónicos do seu irmão S, no sentido de dar o destino às referidas substâncias estupefacientes, quer enterrando-as nos esconderijos, quer repartindo-as pelos vários revendedores por conta deste.
87. Que quando entre os dias 28 de Setembro de 1995 e 2 de Outubro de 1995 o Cc informou o seu irmão S dizendo "trouxeram aquilo as calças", tenham querido inequivocamente referir-se a heroína.
88. Que quando entre os dias 14 de Novembro de 1995 e 24 de Novembro de 1995 o "Lau" em comunicação pediu para informar os tios "Artures" que "falteceiram 150 veias nos dois coisos" tal expressão tenha necessariamente a ver com esconderijos.
89. Conhecedores de todas as intervenções policiais na repressão do narcotráfico que se exerciam em todo o Norte do país e de quais as zonas onde o S procedia ao depósito, transporte e venda de estupefacientes, os arguidos l A e B assumiram o compromisso de avisarem previamente o S sempre que tivessem informação da existência de qualquer operação policial na repressão do tráfico de droga a realizar nas zonas onde aquele actuava,
90. Compromisso que cumpriram totalmente desde princípios de 1993 até finais de l995.
91. Foram essas constantes e permanentes informações que permitiram que o S, durante o lapso de tempo já descrito, procedesse diariamente à venda de cocaína e heroína a terceiros consumidores totalmente à margem de qualquer intervenção policial, informações essas que só em cada mês do ano de 1995 custaram ao A e ao B, em média, 20000 escudos por mês e ao S um valor superior a 3000 contos durante o ano de 1995, para além das informações dadas pessoalmente ou pelos seus telefones fixos.
92. Em dia não determinado, mas que se situa entre os dias 10 de Novembro de 1995 e 14 de Novembro de 1995, os arguidos A e B souberam previamente que estava marcada para o dia seguinte uma operação policial visando apreender toda a droga que o S tinha escondida em Lamas de Orelhão, operação essa desencadeado por uma acusação anónima feita em relação ao tráfico de droga praticado pelo S.
93. A operação policial em causa tinha informações exactas e pormenorizadas dos esconderijos utilizados pelo S para dissimular a droga, o que era do perfeito conhecimento dos arguidos B e A.
94. Por isso, estes, com o intuito de impedir que aquele fosse detido em flagrante delito na posse de droga e assim cessasse a sua actividade delituosa, decidiram informá-lo previamente da operação policial e adverti-lo para desviar toda a droga que possuía em Lamas de Orelhão, pois houvera uma informação anónima indicativa dos sítios exactos onde a guardava.
95. Pondo em execução tal propósito, um dos arguidos (A ou B), de acordo com o outro, nas circunstâncias de tempo supra referidas, fez uma chamada telefónica para a residência do S, que foi atendida pela sua mãe, e,
96. após se identificar como "feirante", pediu-lhe que informasse o filho que no dia seguinte iria haver uma rusga policial desencadeada por uma denúncia anónima e que o advertisse para desviar toda a droga que tinha escondida em Lamas de Orelhão.
97. Com a referida informação os arguidos B e A impediram que em relação ao arguido S fossem recolhidos fortes indícios do seu envolvimento no tráfico de droga, protegendo-o assim da respectiva detenção e posterior punição,
98. Porque, efectivamente, este tinha várias quantidades de heroína e cocaína escondidas em Lamas de Orelhão e procedeu ao desvio das mesmas em função da informação dada por aqueles.
99. Na verdade, como contrapartida das informações policiais descritas nos artigos anteriores, o S pagou mensalmente aos arguidos A e B, desde data não determinada mas seguramente durante os anos de 1994 e 1995, uma soma monetária a cada um deles, não rigorosamente determinada, mas seguramente não inferior a 100 mil escudos mensais.
100. Que na conversa telefónica mantida pelo B com a sua esposa Ee a 27 de Julho de 1995 ao serem usadas as expressões "o mesmo, ou mais, ou? e que tal?", "está tudo a corre bem" e "diz que está enrascado", tais expressões signifiquem inequivocamente que o S havia dado 100000 escudos, sendo esta quantia a mesma que pagara em troca da alegada protecção policial.
101. Que quando o arguido A comunicou com o B telefonicamente utilizando as expressões "que aquilo que fazia pelo S também tinha que vir", tenha querido com tal expressão inequivocamente dizer que o S tinha que pagar a protecção policial por parte do Sarg. A.
102. Também como contrapartida das informações policiais aludidas fornecidas pelo A e pelo B, comprometeu-se o próprio S a vender a terceiros consumidores quantidades várias de cocaína e heroína pertencentes àqueles e a pagar-lhes o respectivo preço, que fixaram no valor aproximado de 7500 escudos por grama.
103. Tal heroína provém presumivelmente daquela que o B e o A apreenderam anteriormente em várias operações policiais no exercício das suas funções e não incluíram nas respectivas participações para o exercício da acção penal.
104. Que quando o S combinou com o B a entrega dos 1000 contos, tal entrega lhe seria feita no dia 28 de Abril de 1996, junto à Cadeia de Custóias às 10 horas da noite.
105. No mesmo contacto telefónico, o S e o B combinaram que no acto da entrega dos 1.000 contos este entregava àquele nova remessa 145 gramas de heroína, para que o S a vendesse por conta e no interesse conjunto dele, arguido B e do arguido A.
106. Que quando o B se deslocou a Custóias o fez para receber os 1.000 contos e que verificando que o S tardava efectuou contacto telefónico com sua mulher.
107. Em consequência da ameaça feita pelo B ao S, no dia 2 de Maio de 1995, o S entregou os 1000 contos ao B e, conforme o combinado, este entregou-lhe nova remessa de heroína, em quantitativo aproximado de 145 gramas, para que aquele a vendesse por 1000 contos por conta e no interesse dele e do A, até porque, entretanto, o B informou-o duas vezes no sentido de lhe garantir protecção policial.
108. Que combinaram que o S entregaria os 1000 contos correspondentes à venda da heroína nos dias 12 de Maio de 1995, junto à cadeia de Custóias, mas no dia aprazado o S faltou ao compromisso.
109. Que entre os dias 2 de Maio de 1995 e 12 de Maio de 1995 tanto o B como o A tenham comunicado telefonicamente para a residência do S, em Lamas de Orelhão, solicitando contactos telefónicos, acabando por marcar encontro para o dia 12 de Maio de 1995.
110. Que no dia 29 de Maio de 1996 o B haja perguntado telefonicamente ao S se já tinha os 1000 contos para devolver.
111. Que o encontro entre o B e o S se tenha concretizado na hora e local combinado, recebendo o B os 1000 contos correspondentes ao valor da heroína que ele e o A entregaram ao S.
112. No mesmo acto e momento, entregou o B ao S mais uma remessa de heroína, em quantitativo superior a 100 gramas, comprometendo-se este a vendê-la por conta e no interesse dos dois agentes da G.N.R., pelo quantitativo total de 1000 contos.
113. Como o S se atrasasse no pagamento dessa quantia, quer o B quer o A, comunicaram quase diariamente com ele a insistir pelo pagamento da mesma.
114. Que quando o A no dia 7 de Agosto de 1995 telefonou através do seu telemóvel para o posto telefónico 97232 instalado em casa do S, o haja feito na tentativa de obter a entrega dos 1000 contos.
115. Que quando o B telefonou para o posto telefónico instalado em casa do S entre 14 de Setembro de 1995 e 18 de Setembro de 1995 o haja feito na tentativa de obter também a cobrança dos 1000 contos.
116. Que finalmente, no dia 21 de Setembro de 1995, o S haja combinado telefonicamente com o B um encontro para as 5 ou 6 horas desse mesmo dia na mata que margina a E.N. que liga Santo Tirso a Vila do Conde, junto ao edifício da Brisa da Portagem para Famalicão.
117. Que nesse encontro, que se concretizou, o S pagou finalmente os mil contos (preço da venda da heroína entregue anteriormente pelo B e pelo A) e o B entregou-lhe no mesmo acto mais uma quantidade de heroína, não inferior a 100 gramas, pertencente a si e ao A, incumbindo-o de vender tal substância estupefaciente por conta e interesse de ambos.
118. Que para o efeito, o B, ao volante do seu Opel Frontera de matrícula 38-77-FQ, e o S, ao volante do seu SEAT IBIZA de matrícula 03-49-FR, estacionaram as respectivas viaturas na berma da E.N. que liga Santo Tirso a Vila do Conde, no local combinado, e embrenharam-se na floresta que margina a referida via.
119. Que o S se comprometeu a vender a heroína pertencente ao B e ao A e a pagar-lhes posteriormente o respectivo valor, ou seja mil contos,
120. Que logo combinaram que o pagamento da heroína se efectuaria no dia 29 daquele mesmo mês, pelas 20 horas, marcando encontro no Porto, junto à residência do S, onde o B se deslocou.
121. Que quando no dia 29 de Setembro de 1995 o B comunicou com a sua mulher dizendo-lhe que iriam nesse dia para a sua terra natal o haja feito na sequência de qualquer combinação entre ele o A e o S.
122. Que no dia seguinte, à hora designada para cobrar ao S o valor da venda da heroína, o B comunicou telefonicamente com o A e este logo o informou que o pagamento fora adiado para 2. feira próxima, dia 2 de Outubro, dizendo-lhe "nada feito hoje ... 2. feira à noite ... certeza".
123. Que na verdade, o A, momentos antes, comunicou telefonicamente com o S para saber da cobrança dos 1000 contos, recebendo do mesmo a informação supra.
124. Que através da comunicação telefónica feita com a sua mulher em 2 de Outubro de 1995, 2. feira, o B tenha confirmado que se ia encontrar com o Joaquim para receber deste o pagamento da heroína e que, momentos depois em novo contacto telefónico, a tenha informado que não podia ir ao encontro do Joaquim e que fá-lo-ia no dia seguinte.
125. Que finalmente, nesse dia 3 de Outubro de 1995, pelas 13 horas, o S lhe entregou os 1000 contos, que os dois agentes da G.N.R. dividiram entre si em proveito próprio.
126. Que o encontro marcado para local não apurado às 19 horas do dia 13 de Dezembro de 1995 entre o B e o S, se tenha concretizado no local e à hora acordados, tendo o B entregue ao S mais uma quantidade de heroína, não inferior a 100 gramas, pertencente a si e ao A.
127. Que para que este a vendesse, por conta e no interesse deles, por quantia não inferior a 1000 contos, comprometendo-se o mesmo a entregar-lhes o produto da venda no dia 11 de Janeiro de 1996, pelas 11 horas e um quarto.
128. Assim, no local e hora acordados, o S entregou ao B os 1.000 contos, que este posteriormente teria de dividir com o A.
129. Que no contacto telefónico de 15 de Janeiro de 1996 à noite o A tenha marcado com o B um encontro em casa deste para receber a sua quota parte do preço da venda da heroína.
130. Que em dia não apurado, mas que se situa entre os dias 4 e 6 de Setembro de 1995, o S, conhecido na gíria cigana pelo apelido de "Lau" ou "Lelo", entregou a um dos seus revendedores de droga, não cigano, na área de Custóias, apelidado na gíria como o "Pp", uma quantidade de heroína e cocaína superior a meio quilograma, designado na gíria própria como "médio ou meio beu".
131. Que no dia 4 de Setembro de 1995, o dito "Pp" foi detido pela P.S.P. do Porto pela posse de 23,59 gramas de heroína e 318,27 gramas de cocaína, substâncias essas que faziam parte daquelas que o S lhe entregara para vender a terceiros consumidores por sua conta.
132. Que um dos fornecedores de heroína do arguido S era um indivíduo alcunhado de "Corridas", que recebia as encomendas de substâncias estupefacientes para aquele e por intermédio dum indivíduo conhecido por Bb.
133. Que os fornecimentos de estupefacientes ao S aludidas e descritas no artigo anterior efectuaram-se ao longo de vários anos, com a frequência de algumas vezes por mês e em quantidades não inferiores a 150 gramas, quer de heroína, quer de cocaína.
134. Que em finais de Agosto de 1995 ou princípios de Setembro do mesmo ano, o mencionado "Corridas" faleceu, sendo certo que poucos dias antes tinha vendido ao arguido S cerca de 150 gramas de heroína ou cocaína por 1000 contos, mas este ficara-lhe a dever esta quantia.
135. Que por isso, no dia 4 de Setembro de 1995, o S comunicou telefonicamente com o seu irmão Cc, dizendo-lhe que o "Corridas" morrera e lhe devia a "veia", "o beu", significando inequivocamente que lhe devia 1000 contos (beu) de heroína (veia).
136. Que em dia não determinado de Setembro de 1995, mas que se situa entre 21 de Setembro de 1995 e 25 de Setembro de 1995, o arguido S comprou uma quantidade não determinada de heroína, não inferior a 300 gramas e enterrou-a nas proximidades da sua residência, para posteriormente revendê-la a terceiros consumidores, quer directamente, quer por intermédio dos seus revendedores.
137. Que, nos dias que se seguiram, pessoa não determinada desenterrou essa quantidade de heroína e apropriou-se dela contra a vontade do S.
138. Que em dia indeterminado, mas seguramente entre 21 de Setembro de 1995 e 25 de Setembro de 1995, o S encarregou os seus tios "Artur' e "Actor", já identificados, de lhe comprarem em Espanha uma grande quantidade de cocaína, não inferior a 4 quilogramas, e entregou-lhes para o efeito o dinheiro necessário.
139. Dessa remessa de cocaína, designada nos meios do tráfico de droga como "veia branca", um quilo destinava-se a um sobrinho, um tal "Vergalho", e o restante era para revender a terceiros consumidores.
140. Que, o fornecedor espanhol de cocaína, um tal "Manolo" não tinha de momento daquela espécie de estupefaciente e logo o arguido S fez nova encomenda de 5 quilos de cocaína para daí a 3 ou 4 dias,
141. compra essa que se efectuou na data e nas quantidades aludidas.
142. Que no entanto, verificando que a cocaína encomendada e comprada não era totalmente pura (referindo-se à mesma como "traçuncho" - heroína traçada com Nostan), ordenou ao seu irmão, o arguido Cc, que a enterrasse para dissimulação, num buraco bem fundo, com muitos sacos plásticos.
143. Que, o arguido Cc, através do posto telefónico n. 97232, instalado na residência do S, que atendeu num dos seus telemóveis - o n. 0936-725801 -, na data referida, confirmou-lhe a compra da cocaína e recebeu como resposta do S:
"isso não é veia, é um traçuncho", "mas é igual, enterrunches, enterrunches, num buraco fundo. Fundo.
Muitos sacos plásticos".
144. Que, na referida data, o arguido O enterrou aquela quantidade de heroína traçada - três ou quatro quilos - para assim dissimulá-la e posteriormente reparti-la para revenda a terceiros consumidores.
145. Que um dos revendedores de heroína e cocaína por conta do arguido S era um tal João "Currilhos", de Custóias, a quem o mesmo entregou semanalmente, desde princípios de 1993 a finais de 1995, diversas quantidades de estupefacientes, não inferiores a 100 gramas cada.
146. Que, em data anterior a 9 de Outubro de 1995, tinha o S entregue ao João "Currilhos" cerca de 100 gramas de heroína para vender por sua conta, com o encargo de, efectuada a venda, entregar-lhe o dinheiro apurado (pernó na gíria própria do narcotráfico).
147. Que no dia 9 de Outubro de 1995, o S através do telefone 97232 comunicou com seu cunhado, conhecido por "Calistra", que atendeu pelo telemóvel n. 0936-437439, dizendo-lhe que o "meu currilho, João
Currilhos, vai às 6, é para lhe agarrar o "pernô" e à noite ia-lhe dar aquilo", significando inequivocamente tais expressões para arrecadar o montante monetário apurado pelo seu revendedor de estupefacientes e que à noite lhe entregava nova remessa de heroína.
148. Que em dia não determinado, mas pouco antes de 31 de Outubro de 1995, o S enterrou num dos pinhais próximos da sua residência cerca de 800 gramas de heroína, que destinava à venda a terceiros consumidores.
149. Que poucos dias depois, em data aproximada de 31 de Outubro de 1995, desenterrou 50 das 800 gramas de heroína que havia enterrado e entregou-as a um seu familiar, designado por "Talim", para que este a revendesse por sua conta, o que efectivamente fez.
150. Que alguns dias depois, quando se preparava para retirar 100 gramas da restante heroína para entregar ao "Lele", também seu familiar, verificou que alguém se tinha apropriado ilicitamente da mesma.
151. Que, em dia não determinado mas que se situa entre 31 de Outubro de 1995 e 3 de Novembro de 1994, através do seu telefone 97232, comunicou ao seu irmão "Sá" a dita apropriação da heroína dizendo: "a veia castanha, ma roubaram toda, 750 veias".
152. Que os vencimento do A e B acrescidos das suas consortes totalizem um quantitativo inferior a 200 contos mensais.
153. Que o B tenha utilizado na reconstrução da sua casa em Ponteira - Montalegre, materiais de luxo, e que tenha gasto na cozinha 970000 escudos, e que tenha gasto até ao momento um quantitativo não inferior a 20000000 escudos.
154. Que o B nos anos de 1992-1994 tenha adquirido móveis no valor de 2713000 escudos.
155. Que a habitação própria na Aguçadoura - Póvoa do Varzim do A, tenha valor não inferior a 40000000 escudos.
156. Que o A tenha adquirido e seja dono de um veículo "Alfa Romeo".
157. Que, o arguido S nunca teve outra actividade remunerada para além de se dedicar continuadamente ao tráfico de droga nos termos acima expostos.
158. Que, em 17 de Janeiro de 1996, o S tenha adquirido a viatura Ford Galaxy de matrícula 16-39-GZ, no valor de 4000 contos e uma Ford Transit de matrícula 62-57-GJ, no valor de 2750000 escudos, sendo ainda possuidor de vários artefactos em ouro de valor não inferior a 500000 escudos.
159. Que, o S no momento da sua detenção, tinha 6860 contos em numerário, que apenas se justificava em consequência das avultadas e diárias cadências de heroína e cocaína e face à necessidade de grande liquidez para, a todo o momento, adquirir, por junto, avultadas quantidades daqueles estupefacientes.
160. Que, os rendimentos de que dispunham os arguidos B e A são insuficientes para justificar o património adquirido por ambos, nomeadamente as viaturas de luxo supra descritas, bem como os movimentos bancários registados, também já assinalados.
161. Que, todos os veículos automóveis, objectos em ouro e numerário apreendidos aos arguidos A, B e S foram adquiridos com os produtos advenientes da actividade delituosa que atrás se descreveu.
DAS CONTESTAÇÕES:
162. que emaranhando-se pelo pinhal, o B', conseguiu fugir apesar de terem sido feitas diligências de perseguição para a sua captura, nomeadamente tenha sido procurado até às duas horas da manhã do dia 12 de Abril;
163. a espingarda apreendida na casa do arguido A foi recebida do espólio de seu pai;
164. o arguido A possuía telemóvel activado desde 14 de Junho de 1995 e devido a telefonemas anónimos, ameaças e outros, o arguido A mudou o número do telemóvel e colocou em confidencial;
DO PEDIDO CÍVEL
165. Os demandados C, B, D e E como elementos da G.N.R. no desempenho das funções que lhes estavam acometidas, no dia 19 de Abril de 1994 arrecadaram e integraram nos seus patrimónios pessoais 300000 escudos, que constituíam o montante monetário retirado na operação policial descrita nos artigos 68 a 71 da acusação;
166. os demandados C, B, D e E como elementos da G.N.R. no desempenho das funções que lhes estavam acometidas, no dia 7 de Abril de 1995 arrecadaram e integraram nos seus patrimónios pessoais 60000 escudos e 1000 pesetas, que constituíam o montante monetário retirado na operação policial descrita nos artigos 92 a 103 da acusação;
167. os demandados A, B, L e M como elementos da G.N.R. no desempenho das funções que lhes estavam acometidas, no dia 20 de Setembro de 1995 arrecadaram e integraram, nos seus patrimónios pessoais 1190000 escudos, que constituíam o montante monetário retirado na operação policial descrita nos artigos 104 a 112 da acusação;
11) - Passemos à resolução das questões englobadas nas conclusões extraídas pelos recorrentes da respectiva motivação, por o âmbito do recurso nelas ser definido, como vem sendo orientação deste Supremo Tribunal.
E são elas as seguintes:
- A alegada nulidade dos autos de gravação e transcrição das escutas telefónicas e sua natureza de prova proibida.
- A apontada existência dos vícios previstos no artigo 410, n. 2, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Penal: insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação e erro notório na apreciação da prova.
- A alegada existência de incorrecta aplicação da lei tendo-se em conta a factualidade provada, ou seja, se os factos provados são integradores de cada um dos crimes em que os recorrentes foram condenados.
12) - Apreciação da primeira questão.
Como se verifica dos autos, a intercepção e gravação das escutas telefónicas foi ordenada por despacho do Meritíssimo Juiz competente, tendo sido assinalado o preenchimento de todos os pressupostos necessários, ou seja, os requisitos legais da sua admissibilidade, em consonância com o disposto no artigo 187 do Código de Processo Penal.
Realizada a apontada diligência foi lavrado auto que, juntamente com as cassetes foi levado ao conhecimento do Meritíssimo Juiz da Instrução Criminal, o qual ordenou a correspondente junção aos autos, por entender serem os elementos recolhidos relevantes para a prova.
Por conseguinte houve o cuidado de dar cumprimento ao estatuído nos artigos 187 e 188 do Código de Processo Penal, relativamente aos aspectos relacionados com a admissibilidade e formalidades de tal operação.
E incidindo-se mais sobre a filosofia inerente ao disposto no aludido artigo 188, e fazendo-se o cotejo com o legislado no artigo 101, n. 1, do Código de
Processo Penal - aqui faz-se referência ao registo e transcrição -, constata-se que o auto referido no primeiro normativo não é o auto de transcrição, mas apenas um auto em que se "testemunhará apenas a ocorrência que não o conteúdo da matéria interceptada, além do mais porque seria um acto inútil, uma vez que o juiz, por lei, tem imediato acesso às gravações através dos respectivos instrumentos de registo! Dele "constará o lugar, o tempo e o modo de intercepção, a indicação do telefone a que se dirigiu e a identificação de quem a ela procedeu" (cfr. Simas Santos, Leal Henriques e Borges de Pinho, in "Código de Processo Penal", 1. volume, 1996, página 719).
O auto de transcrição, constata-se foi levado a efeito por funcionário da Polícia Judiciária de acordo com o disposto no artigo 101 do Código de Processo Penal; e não se vislumbra ter havido infracção ao estatuído no n. 2 deste citado artigo, na medida em que não se constata excessivo lapso de tempo entre a realização total da diligência de escuta telefónica e a sua transcrição. E a exigência da transcrição no prazo mais curto possível, mais não é do que o afloramento de necessidade de celeridade processual, aliada ao facto de assim ser restringida a operação ao essencial e necessário, para ser preservada o mais possível a intimidade das pessoas, evitando-se, deste modo, uma devassa desnecessária das suas vidas.
Mas tudo deve ser encarado numa perspectiva de realidade atinente às dificuldades da tarefa, aos meios utilizados no caso, inclusive no tocante aos meios humanos disponíveis e respectiva interligação a estabelecer entre o investigador ou investigados e a entidade judicial instrutória.
Por outro lado constata-se que tal operação esteve sempre sob o controlo judicial, desde a sua autorização, à elaboração dos respectivos autos de ocorrência e de transcrição, sendo certo que as cassetes foram presentes ao Meritíssimo Juiz de Instrução aos autos das que continham matéria com interesse e destruição do desnecessários, como, aliás sucedeu.
O que tudo revela, sem sombra para dúvidas, que existiu sempre um controlo efectivo de todo o processamento ligado às escutas telefónicas e actividades processuais a elas inerentes, por parte do poder judicial, mesmo quando se aceitavam sugestões do agente encarregado da concernente tarefa, como bem aponta o Excelentíssimo Representante do Ministério Público na primeira instância. Na verdade, a última palavra em sede de controlo, fundamentação e decisão coube sempre ao Meritíssimo Juiz da Instrução Criminal.
Donde, e em conclusão, se afirma não ter havido qualquer violação de dispositivo legal atinente ao caso, mormente do estatuído nos artigos 187, 188, 100 e 101 do Código de Processo Penal, caindo por base a existência da invocada nulidade e seus efeitos, relacionada com o disposto nos artigos 189, 118, 122, 125 e 355, todos do Código de Processo Penal.
Constata-se, assim, que o Tribunal ao valorar em audiência de julgamento o meio de prova que vem sendo afirmado e referenciado, agiu em perfeita sintonia com a lei, exercendo tal actividade de harmonia com o disposto no artigo 127 do Código de Processo Penal, na medida em que as gravações referidas funcionam como meio legal de prova, deste modo podendo ser objecto de valoração, de acordo com as regras plasmadas neste referido quesito. Pelo que não é possível ser-lhe dirigida qualquer censura.
E mesmo que se considerasse, o que não é o caso, que o artigo 188 do Código de Processo Penal impusesse a realização de "auto de transcrição", com a obrigação de ser lavrado de imediato, para juntamente com os mais dados ser "imediatamente" levado ao conhecimento do
Juiz, a configurar-se nulidade esta constituiria nulidade sanável e, por conseguinte, dependente de arguição (cf. Simas Santos, Leal Henriques e Borges de Pinho, in obra citada, página 721).
Como não houve arguição em devido tempo, sempre se deveria ter como sanada (cf. o que decorre do disposto no artigo 121, n. 3, alínea c) do Código de Processo Penal), situação que se alargaria sempre a qualquer nulidade sanável ocorrida no período do processamento do inquérito ou da instrução.
Pelo que, mesmo em tais hipóteses, a posição dos recorrentes não teria razão de ser.
Donde também de tudo resulta inexistir qualquer atropelado ao disposto nos artigos 32 e 34 da Constituição da República Portuguesa.
13) Apreciação da segunda questão.
Pretendem os recorrentes infirmar a factualidade vertida no acórdão. E para tanto fazem-no invocando os vícios previstos no artigo 410, n. 2, alíneas a), b) e c) do Código de Processo Penal, ou seja: apontam a existência de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, contradição insanável da fundamentação e erro notório na apreciação da prova.
Como é verdade inelutável, os apontados vícios têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou em conjugação com as regras da experiência comum; e deve tal apreciação ser feita oficiosamente por este Supremo Tribunal, o que consubstancia o chamado caso de revista alargada (cf. o que decorre do artigo 433 do Código de Processo Penal).
A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada ocorre quando da factualidade vertida na sentença se colher faltarem elementos que podendo e devendo ser indagados, são necessários para se poder formular um juízo seguro de condenação ou absolvição.
A contradição insanável da fundamentação verifica-se quando se dá como provado e não provado o mesmo facto, quando se afirma e nega a mesma coisa ao mesmo tempo, quando simultaneamente se dão como provados factos contraditórios ou quando se constata oposição entre a fundamentação probatória da matéria de facto.
O erro notório na apreciação da prova existe quando, no uso de um processo racional e lógico se extrai de um facto dado como provado uma conclusão ilógica, irracional, arbitrária ou notoriamente violadora das regras da experiência comum.
No primeiro caso impõe-se uma correcção ampliativa e nos restantes modificativa.
Perante a maneira como os recorrentes estruturam a sua argumentação na motivação, importa realçar que o Tribunal apreciou a prova carreada a julgamento de acordo com o normado no artigo 127 do Código de
Processo Penal (livre apreciação da prova), sendo certo que se tenha usado para isso um sistema de motivação e controle, evidenciador do carácter racional da apreciação da prova, com afloramento da consagração de um sistema que impõe uma correcta fundamentação fáctica das decisões, por modo a permitir, a final, um conhecimento cabal do processo, e a ser permitido um real controle da respectiva motivação. De salientar também a obrigação de serem registados os casos de prova legal ou tarifada (cfr. o que decorre dos artigos 84, 163, 169 e 344, todos do Código de Processo Penal).
Os recorrentes, de modo sistemático, insurgem-se contra o Colectivo, pela maneira como apreciou os elementos de prova trazidos a julgamento. Mas aqui, este Supremo Tribunal, como Tribunal de revista, não pode imiscuir-se (cfr. o que decorre do disposto no artigo 433 do Código de Processo Penal), salvo se houver motivos para uma revista alargada, apreciação a fazer à luz do citado preceito em conjugação com o estatuído no artigo 410 n. 2, do mesmo Código.
Como não se mostra haver afrontamento à prova vinculada ou tarifada, há que respeitar o decidido quanto à matéria de facto, salvo se ocorrer situação abrangida pelo disposto no artigo 410, n. 2, já citado.
Por razões de metodologia começa-se por fazer uma apreciação quanto à alegada existência de contradição insanável da fundamentação, para depois se alongar o problema ao alegado erro notório na apreciação da prova, devendo-se depois aflorar a alegada insuficiência para a decisão da matéria de facto provada. Mas ter-se-á sempre em linha de conta a escalpelização dos problemas confinada à essencialidade das questões.
E para balizar questões refere-se que a actividade do Tribunal levada a efeito sob o comando do disposto no artigo 374, n. 2 do Código de Processo Penal e respeitante aos factos provados e não provados, não impõe a obrigação de serem desenvolvidamente indicados os meios de prova, mas somente as fontes das provas, embora deva haver uma motivação que permita aos sujeitos processuais e ao Tribunal Superior constatar que os julgadores na decisão não se socorreram de meios ilegais de prova e que a sua convicção resultou de um processo racional e lógico, Eerçado em dados concretos, não sendo uma decisão arbitrária.
Ora segundo o que consta, quanto a este aspecto no acórdão recorrido, o Colectivo cumpriu o disposto no referido artigo 374, n. 2.
Aproveitando-se o ensejo e dado que nesta questão tudo se confina na abrangência da matéria de facto provada e não provada contida no Acórdão recorrido, interessa focar o contido no artigo 1, alínea f) do Código de Processo Penal relativamente à definição e conceitualização da "alteração substancial dos factos".
Esta realidade tem de ser entendida como uma afirmação implícita de noção de facto processual, nem exclusivamente normativa, nem exclusivamente naturalística, e que é uma realidade ligada a um bocado ou pedaço da vida social, cultural e jurídica de um sujeito (do agente), porção real ou hipotética, com uma unidade que deriva do próprio evento em causa, apreciado sob o ponto de vista da experiência social da vida e numa perspectiva jurídico-penal, relativamente ao qual é possível sustentar justificadamente a pretensão de submeter o acontecimento a uma decisão judicial (cf. Soares da Veiga, in prefácio da obra de F. Isasca, "Alteração Substancial dos Factos e Sua Relevância no Processo Penal Português".
Considerando-se o conteúdo da pronúncia e a matéria dada como assente no Acórdão recorrido, e fazendo-se a hermeneutização correspondente, de harmonia com a conceitualização jurídico-penal que se deixa explicitada, entende-se que a actuação do Colectivo não é de molde a considerar-se verificada qualquer alteração substancial dos factos.
Posto isto, e retomando a linha de pensamento atrás encetada, temos a dizer que na motivação do recurso se apontam como realidades relevantes a posição do Tribunal "a quo", no concernente com o depoimento do B' e do R, e o que se deu como assente nos itens 34 a 36 e 38 do Acórdão. Contradição que se poderia estabelecer quanto ao valor e à maneira como fora guardado o dinheiro, isto em conexão intrínseca com o vertido na "fundamentação". Só que quer o montante, quer o local referenciados em relação ao dinheiro são aspectos ligados à actividade do Colectivo, em sede de apreciação de prova, realizada de acordo com a lei (artigo 127 do Código de Processo
Penal), e com toda a certeza feita em liberdade, mas esta subordinada à consecução da verdade material, num livre convencimento lógico e motivado, sempre redutível a critérios objectivos.
A mesma argumentação se deve utilizar quanto à invocada contradição entre a factualidade plasmada nos itens 29 e 30 e a "fundamentação" relativa à mesma.
Como refere o Digno Magistrado do Ministério Público, os recorrentes A e B encontraram "droga" num pinhal adjacente ao acampamento do R.
Dissecando-se a respectiva fundamentação (ver folha 707, alínea c)), não se vislumbra qualquer anomalia contraditória, quer quanto ao local, quer quanto ao número de embalagens. O que se pretende é infirmar, isso sim, a operação analítico-dedutiva do Colectivo, na apreciação da prova concernente, o que não tem qualquer razão de ser.
Nem contradição insanável da fundamentação se vislumbra relativamente ao número de arguidos, em termos de qualificação e punição. Também o A e o B intervieram na localização da "droga" e foram estes que se apropriaram da mesma, a detiveram e guardaram. A conduta do restantes recorrentes não se mostra eivada de ilicitude. Aqui também se pretende, ao fim e ao cabo, atacar a maneira como o Tribunal apreciou e valorou a prova, o que não é legalmente correcto, nos moldes em que se faz, como já se deixou assinalado.
No concernente com a matéria de facto vertida no item 27, também é de referenciar que o Colectivo ali verteu a factualidade que em seu entender, e de acordo com a realidade, ficou claramente demonstrada. Se existe contradição, essa não é detectável através do texto da decisão por si ou em conjugação com as regras da experiência comum.
Uma referência, ainda, à matéria vertida no item 17, de folha 51. Aqui se referencia não ter sido provado "que o A, B, C e D, elementos da força policial hajam apreendido uma nota falsa de 10000 escudos".
Mas uma coisa é não se ter dado como provada esta matéria e outra a afirmação de que a nota não existiria, pois a existir, seria apreendida. Ora uma asserção como a contida no item 17 não pode levar a concluir, como se afirma na motivação, que a nota falsa não existia, porque a existir seria apreendida. Uma coisa é dar-se como não provada certa factualidade e outra é a realidade material que pode existir e não ser detectada pelo Tribunal ao analisar os elementos probatórios fornecidos em audiência.
Pelo que nem se configura contradição insanável da fundamentação, nem erro notório na apreciação da prova, como pretendem os recorrentes.
Resta acrescentar que numa área livre de toda a factualidade provada e não provada e ainda da "fundamentação probatória", não se vislumbra haver contradição insanável da fundamentação.
O mesmo se pode afirmar relativamente ao invocado erro notório na apreciação da prova.
Assim sendo não há suporte para correcção modificativa, por inexistirem os apontados vícios.
Também analisando a matéria de facto não se alcança proceder a afirmação de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada.
Pelo que se impõe a conclusão de que os recorrentes carecem de razão quanto às questões focadas.
14) Apreciação da terceira questão.
- No recurso levanta-se, de modo "unicamente conclusivo", a questão da subsunção jurídico-penal dos factos provados. Lançando-se mão da respectiva materialidade verifica-se que os recorrentes detiveram
(prenderam) pessoas, constituíram-nas arguidos e mesmo assim libertaram-nas, actividades que foram levadas a cabo na sua qualidade de elementos da Guarda Nacional Republicana (G.N.R.) e do Grupo Especial de Acção e Pesquisa (G.E.A.P.), estando em exercício de funções para as quais foram incumbidos, relevando aqui, sem sombra de dúvida, a correspondente qualidade de funcionários, tal como vem plasmada no artigo 386 do Código Penal - é funcionário público para efeitos penais todo aquele que é chamado a desempenhar e desempenha actividades compreendidas na função pública (administrativa ou jurisdicional), conforme o expandido por Maia Gonçalves (cfr. "Código Penal Português", 10. edição, página 950) e Leal Henriques e Simas Santos (cf. "Código Penal Anotado", 2. volume, 1996, página 1234).
Dos factos provados ainda resulta evidente que os recorrentes tinham pleno conhecimento da obrigatoriedade da apresentação das pessoas detidas ao Tribunal e aos Magistrados competentes, do dever de os manter detidos até ser feita a aludida apresentação e que lhes não assistia competência para os libertar, por ausência de poderes para tanto (cf. o que decorre, entre o mais, do itens 9, 10, 11, 12, 16, 17, 19, 24, 28, 39, 40 e 41).
Assim sendo, constata-se os arguidos A e B cometeram 3 crimes previstos e punidos pelo artigo 350, n. 1, do Código Penal revisto (ver o que decorre do artigo 2 n. 4 do Código Penal) e que os arguidos C e D cometeram a idênticos crimes.
- Também da matéria de facto provada (cfr. o que flui, entre o mais, dos itens 14, 19) se verifica que todos os recorrentes cometeram 2 crimes previstos e punidos pelo artigo 414, n. 1 do Código Penal de 1982 (ver o que se extrai do artigo 2, n. 4, do Código Penal).
- Do mesmo modo (cf. os itens 14, 29, 30, 31, 32, 36, 37, 38, 43 e 45 respeitantes à matéria de facto provada) se alcança que os arguidos A e B cometeram 2 crimes previstos e punidos pelo artigo 375, n. 1, do Código Penal revisto (cf. o disposto no artigo 2, n. 4 do Código Penal) e os arguidos C e D um crime idêntico.
- Os arguidos A e B (cf. o que decorre dos itens 30, 31, 32, 70 e seguintes e 111, 112, 113 e seguintes) cometeram dois crimes de tráfico de estupefacientes agravado, previstos e punidos pelos artigos 21 e 24, alínea d) do Decreto-Lei n. 15/93, de 22 de Janeiro.
- A aplicação do disposto no artigo 66, n. 1, alíneas a), b) e c) do Código Penal resulta correcta, por inequívoca.
Donde de tudo decorre quer aos recorrentes não assiste razão quanto à matéria versada nesta questão.
Decisão:
Por todo o exposto nega-se provimento aos recursos dos arguidos A, B, C e D, confirmando-se o acórdão recorrido.
Cada um dos recorrentes fica condenado na taxa de justiça de 10 Uccs, com procuradoria fixada em 1/3.
Lisboa, 29 de Outubro de 1998.
Dias Girão,
Carlindo Costa,
Abranches Martins,
Oliveira Guimarães,
Tribunal de Círculo de Braga - 2. Juízo - Processo n. 112/97
Acórdão de 27 de Fevereiro de 1998.