Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | 7.ª SECÇÃO | ||
Relator: | NUNO PINTO OLIVEIRA | ||
Descritores: | PROTEÇÃO DA CRIANÇA CONVENÇÃO DE HAIA RESIDÊNCIA HABITUAL INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA TRIBUNAL COMPETENTE | ||
![]() | ![]() | ||
Data do Acordão: | 09/14/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | NEGADA | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | O conceito de residência habitual relevante para efeitos do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, corresponde ao lugar do centro efectivo da vida da criança / do menor. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1. No processo de promoção e protecção relativo ao menor AA, filho de BB e de CC, nascido a ... de Fevereiro de 2008, titular do passaporte NP...K3, o Tribunal de 1.ª instância proferiu a decisão seguinte: Tendo presente o conjunto de declarações hoje ouvidas, o enunciado pelo Ministério Público e o exposto pelas partes, temos que a situação processual criada nos autos se reporta a uma pretensão de que o menor regresse aos Países Baixos, expressa, que mais não seja, na decisão já junta aos autos proferida pelo Tribunal de Roterdão. Nessa linha, partindo de um princípio de confiança e cooperação entre Estados e ante a ausência de elementos concretos que indiciem que o menor em instituições Holandesas seja sujeito a situações que o coloquem em perigo, não descortina o Tribunal motivos para não determinar o regresso do menor (pese embora o enunciado pelo menor sobre eventuais situações de pornografia, sucedendo que tudo parece evidenciar que o perigo para o menor resultará do relacionamento do mesmo com o Sr. DD o que estará acautelado pela intervenção das autoridades dos Países Baixos). Assim sendo, aderindo à posição do Ministério Público que aqui se dá por reproduzida, determina-se o regresso do menor aos Países Baixos, em data a ser ulteriormente acordada após o trânsito em julgado desta decisão, posto que estando a situação do menor acautelada em Portugal o Tribunal não pode deixar de ter presente a oposição do mesmo que poderá conduzir a um recurso o qual resultaria inutilizado caso se tivesse determinado o regresso imediato do menor. Notifique e por via da autoridade central, oficie ao Tribunal de Roterdão com cópia da decisão hoje tomada informando que uma vez transitada tal decisão este Tribunal solicitará aquele a designação de dia para regresso do menor, bem como solicitará ainda a identificação de pessoa a indicar por esse Tribunal que o deverá acompanhar nesse regresso. 2. Inconformado, o menor AA interpôs recurso de apelação. 3. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. Recorre-se do presente Despacho/Decisão, na medida em que a mesma decorre na aplicação de uma medida de promoção definitiva ao abrigo do art. 35.º, n.º 1 al. g) e 38.º A, ambos da LPCJP para o Menor AA 2. Pelo facto do Mmo Juiz a quo ter decidido que o Menor AA deveria regressar ao seu país de origem – os Países Baixos; 3. Pois os Países Baixos, mediante decisão do Tribunal de Roterdão, “reivindicam” o seu regresso para dar continuidade às medidas de proteção que lhe vem sendo aplicadas nesse país; 4. Que passa pela residência com a mãe e frequência de instituição /Centro de dia em regime aberto. 5. O Tribunal a quo nunca invocou oficiosamente a sua incompetência 6. Pelo que assumiu a sua competência para decidir sobre o presente/futuro do Menor AA e dada a sua eminente necessidade de proteção – Art. 5.º da Convenção de Haia (Proteção de Menores) 7. E tem decidido e intervindo desde que o menor se encontra em Portugal, há dois meses 8. As decisões têm passado pela CPCJ de ... que, num primeiro tempo anuiu e aplicou uma medida no sentido do Menor se manterá residir com o Sr DD em ..., 9. E posteriormente o Tribunal na medida de acolhimento, dado que o Sr DD teve de regressar (ainda que temporariamente e de forma forçada) aos Países Baixos para ser ouvido no processo que lhe foi movido pela Sra BB – mãe do Menor 10. A Mãe do Menor nunca aceitou a relação de proximidade que o AA tem mantido com o Sr DD, pese embora tenham todos vividos juntos em 2021, como uma família; após a rutura dessa “união”, a mãe do AA tem “perseguido” o Sr DD e em sucessivos processos judiciais. 11. No encalce de acautelar e proteger o menor, as instâncias portuguesas assumiram a sua proteção e acolhimento. 12. O Menor sente-se bem e protegido em Portugal; e quer ficar em Portugal para estudar, quando o Sr DD voltar a residir com o mesmo. 13. O Menor AA sofreu maus tratos físicos e psicológicos por parte da mãe; e sente-se totalmente desprotegido nas instituições onde foi sujeito a exposição, com outros jovens, a pornografia infantil; 14. Perante este processo, o Mmo Juiz a quo em sede de audiência, decidiu produzir prova - ouviu o menor, os pais, e as instâncias neerlandesas; 15. Munido de prova tomou uma decisão, assumindo competência e jurisdição para decidir pois nunca invocou qualquer incompetência ao longo do processo; 16. A Decisão tomada baseou-se nas declarações das partes ouvidas e documentação junto aos autos. 17. Por um lado, as alegações do menor e da mãe e das técnicas deveriam ser tidos em conta, violando o Art. 6.º al. c) da Convenção Europeia sobre Exercício dos Direitos faz Crianças. 18. O Jovem apelou a proteção no seu país, mas o mesmo lá não é ouvido e não se sente protegido; 19. O Jovem que, tendo uma inteligência superior, apenas apelou á sua proteção e segurança – direito que lhe assiste; 20. Pretende manter- se em Portugal, e estudar; já fez amigos e está a aprender a língua; 21. Não pretende voltar para os países Baixos e instituições onde não se sente bem, nem seguro. 22. O Tribunal a quo deveria ter-se insurgido e ter elevado o superior interesse do menor, face a uma decisão de uma instituição – proteção de menores, 23. Está em causa o presente e futuro do Menor AA, jovem que merece e tem direito de ser ouvido e suas alegações serem tidas em conta. Art. 6.º al. c) da Convenção Europeia sobre Exercício dos Direitos faz Crianças. 24. Pois o Tribunal a quo não andou bem na medida que decidiu sem se apoiar com a informação pertinente e relevante que poderia ter solicitado ás Instituições neerlandesas para se inteirar da real situação de perigo do Menor – Art. 34.º, n.º 1 da Convenção de Haia. 25. O tribunal a quo, e em prol e defesa e proteção do Menor AA e no encalce do seu superior interesse e proteção, deveria ter decidido aplicar a medida de acolhimento numa Instituição até serem devidamente averiguadas as situações de perigo pelo qual o Menor tem sido sujeito e alvo no seu país de origem. 26. Não o tendo feito, o Tribunal a quo omitiu um procedimento legal em prol da defesa e proteção do menor AA e, consequentemente violou os art. 34.º, n.º 1 da Convenção de Haia e o artigo 6.º da Convenção dos Direitos da Criança. Termos em que deve o presente recurso ser recebido e julgado procedente, revogando- se a decisão recorrida, proferindo uma nova que aplique uma medida de acolhimento do Menor AA em Portugal, ainda que sujeita a regime de prova. 4. O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso. 5. O Tribunal da Relação de Évora julgou improcedente o recurso, confirmando a decisão proferida pelo Tribunal de 1.ª instância. 6. Inconformado, o menor AA interpôs recurso de revista, “ao abrigo do art. 671.º, n.º 1, do Código de Processo Civil”. 7. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. O Menor AA vem interpor o presente Recurso de Revista por não concordar e não se conformar com o Acórdão proferido pela Relação de Évora que decidiu pela manutenção da decisão proferida em Ia Instância. 2. Na qual se decidiu peio regresso do Menor AA ao seu país de naturalidade - Países Baixos - para aí lhe ser aplicada a medida de acolhimento em Instituição - decisão proferida pelo tribunal de Roterdão. 3. O Tribunal a quo não efectuou uma análise critica ás questões suscitadas no Recurso. 4. Por outro, não foi apreciado de forma correta a questão da Competência dos Tribunais Portugueses para decidir, no âmbito e com alcance das normas internacionais-Convenção Haia, Convenção sobre o Direito das Crianças, e Regulamento da UE. 5. Acresce ainda que não foi dado a devida relevância aos factos provados, nem aplicada as normas adequadas, quanto á apreciação dos fundamentos invocados pelo Menor AA, na sua oposição ao regresso aos Países Baixos. 6. Os Tribunais e instâncias portugueses deveriam ter sido considerados competentes; 7. Aliás, desde a entrada do menor em Portugal até á presente data que as instâncias e Tribunais portugueses têm tomado decisões sobre o projeto de vida e futuro do Menor AA 8. As decisões, contrariamente ao defendido não foram tomadas a título cautelar ou provisório; Senão vejamos; 9. O Tribunal de 1 .a instância ouviu intervenientes e produziu prova para decidir, a título definitivo, se o Menor AA permanecia em Portugal ou se regressaria aos Países Baixos; 10. Tal facto contraditório foi levantado em sede de recurso do Menor AA 11. Mas não obteve pronuncia do Tribunal a quo. 12. Bastando-se o Acórdão recorrido em re-transcrever a decisão e alegações de resposta ao recurso do Ministério publico, 13. Reitera-se, ao tomar esta posição, não se descortina onde poderá não ter sido considerada a competência territorial dos Tribunais Portugueses para decidir a medida a aplicar ao Menor AA; 14. O Tribunal de Ia Instância assim o fez, o recurso assim o denunciou e a Relação em nada se manifestou nem pronunciou quanto a essa questão. 15. Ora foi decidido o regresso do Menor, não por existir uma Sentença do tribuna! de Roterdão que assim o ditava, mas porque o.Tribunal de Ia Instância considerou não existirem elementos suficientes e "concretos que indiciem que o menor em instituições Holandesas seja sujeito a situações que o coloquem em perigo” 16. Mas também não se diligenciou no sentido de saber se existia esse perigo... pese embora os vários indícios evidentes. 17. Por outro lado, e por essa lógica, se existissem concretos elementos - como refere -teria o Tribunal a quo decidido diferentemente no sentido de decretar a medida de acolhimento definitivo em Portugal; 18. Num Segundo Julgamento, e Junto da Relação de Évora, os Digníssimo Juízes Desembargadores limitaram-se perante esta ausência de prova, decidir no mesmo sentido. 19. Concluiu a Magistrada do Ministério Público, com anuência do Tribunal da Reiaçâo "que a situação do Menor está acautelada por lhe ter sido nomeada advogada e tutores nos Países Baixos. 20. Como se tal facto fosse um escudo defensor ou impeditivo do Menor correr perigo ou se encontrar em situação de desproteção ou insegurança no seu país de origem. 21. Não existindo uma análise crítica quanto á matéria posta em crise nas alegações de Recurso, matéria dada como provada e ao Direito aplicado. 22. Dúvidas não subsistem que a decisão do Tribunal de 1.a Instância e de seguida da Relação em segundo julgamento deveriam ser diversas. 23. O Tribunal recorrido não se debruçou de forma crítica sobre a matéria excecional que foi abordada da situação de perigo iminente e de desproteção em que se encontra o jovem perante as entidades neerlandesas. 24. Não tendo sido aplicada e por isso violada a norma excecional da Convenção Relativa à Competência e a Lei Aplicável em Matéria de Proteção de Menores, no qual se prevê que em situações de ameaça ou perigo sério, o Estado da Residência do Menor poderá decretar medidas de proteção, ainda que não aceites pelos outros Estados-Contratantes, por um lado, 25. Por outro, deveria ter sido aplicado o art. 13.° da Convenção e Haia, na qual o tribunal deveria se recusar a ordenar o regresso da criança, quando esta se opõe e quando "a criança atingiu já uma idade e um grau de maturidade tais que levem a tomar em consideração as suas opiniões sobre o assunto.” 26. E ainda que assim não se considerasse, sempre o menor teria o direito a proteção do Estado Português na medida em que encontrando-se o mesmo internacionalmente deslocado devidos a uma situação de perturbação no seu país - como é o caso 27. Pelo que o país competente para decidir sobre a sua proteção será o estado onde o Menor se encontra - segundo Regulamento (CE) e a Convenção de Haia. 28. Posto isto, sendo a competência assumida e reconhecida pelos Tribunais Portugueses, deveria ter decidido em aplicar a medida de acolhimento numa Instituição até serem devidamente averiguadas as situações de perigo pelo qual o Menor tem sido sujeito e alvo no seu país de origem. 29. As alegações do Menor AA, dos progenitores e demais intervenientes não foram cabalmente tidos em conta para a boa decisão da causa. 30. Sendo que o Menor, um jovem de 15 anos já com elevado nível de maturidade que, ao abrigo do art. 21.° do Regulamento e art. 13.° da Convenção e Haia - tem a sua relevância jurídico-processual; 31. O Menor como pelo próprio referido, manifesta uma total desproteção pelo seu pais. 32. E que dada a sua clarividência apenas quer ser uma criança normal e viver uma vida estável, segura e normal, e pretende a proteção permanecer em Portugal por se sentir seguro e protegido. 33. Atualmente encontra-se e a estudar em equipamento educativo em ... - concelho de ..., já fez amizades e estuda português. 34. Posto isto, o Tribunal a quo deveria ter aplicado/mantido a medida de acolhimento ao menor AA - no que tange à competência dos tribunais, o art. 13.° Conferência de Haia. 35. Por outro lado, e dado a situação de perigo eminente do Menor, deveria ter sido aplicado a regra internacional do o art. 13.° Conferência de Haia. 36. Não o tendo feito o tribunal a quo violou a aplicação do art. 13.° da Convenção de Haia e art. 15.° do Regulamento UE - 2019/1111; 37. E também não foi solicitada qualquer informação adicional - como refere o Artigo 34.°, n.°1 da Convenção de Haia (1996). 38. Bem como, de apesar e acautelado o direito de audição do menor, não foram devidamente tidas em conta as alegações do mesmo, apesar de terem um teor pesado e carregado de moléstia, como o impunha a al. c) do art. 6.° da Convenção Europeia sobre Exercício dos Direitos das Crianças - 25-01-1996. 39. Pelo que se pugna pela Reforma do acórdão recorrido, e na substituição de outro que proteja e defenda o superior interesse do Menor AA, neste caso, a sua paz, Segurança e integridade, 40. Devendo ser aplicado, pelos Tribunais Portugueses, uma medida de acolhimento numa Instituição até serem devidamente averiguadas as situações de perigo pelo qual o Menor tem sido sujeito e alvo no seu país de origem. Assim se fará a costumada JUSTIÇA! 8. O Ministério Público contra-alegou, pugnando pela inadmissibilidade e, subsidiariamente, pela procedência do recurso. 9. Finalizou a sua contra-alegação com as seguintes conclusões: A. — Objeto do recurso (Ir)recorribilidade da decisão 1.ª- Tendo em conta que o processo judicial de promoção de direitos e proteção de crianças e jovens em perigo é um processo de jurisdição voluntária, conforme dispõe o artigo 100.º da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP) não é admitido recurso de acórdãos da Relação proferidos em processos dessa natureza quando estejam em causa resoluções fundadas em critérios de conveniência ou de oportunidade (cf. artigo 988.º, do Código de Processo Civil). 2.ª- O Tribunal da Relação de Évora ponderou, no acórdão recorrido, decidir manter a decisão de 1.ª instância, concluindo que a decisão de regresso do menor aos Países Baixos seria de manter por não existir qualquer justificação ou motivo que coloque em causa a sua saúde ou segurança, suscetível de inviabilizar o retorno ao país de origem, para aí ser executada a medida aplicada de acolhimento em instituição adequada às suas caraterísticas e necessidades, parece-nos evidenciado que a ponderação decisória assentou em critérios de conveniência e oportunidade. 3.ª- Por outro lado, existe uma restrição de âmbito geral ao recurso interposto, pois existe dupla conformidade das decisões de 1.ª e 2.ª instância, nos termos dos artigos 671.º, n.º 3, e 672.º, do Código de Processo Civil. 4.ª- Sem embargo, a revista é eventualmente admissível nos termos da revista excecional, conforme artigo 672.º do Código de Processo Civil. 5.ª- Porém, para o cumprimento dos requisitos do artigo 672.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código de Processo Civil, não basta afirmar de uma forma genérica e vaga, que a questão tem relevância jurídica e que a sua apreciação é claramente necessária para uma melhor aplicação do Direito ou envolve interesses de particular relevância social, sendo necessário explicitar, com argumentação sólida e convincente, as razões concretas e objetivas, suscetíveis de revelar a alegada relevância jurídica e social. 6.ª- Por outro lado, cabendo às conclusões de recurso, incluindo o recurso de revista excecional, fixar o objeto do recurso e nelas refletir os fundamentos jurídicos que habilitam o acesso ao Supremo Tribunal de Justiça através da revista excecional, não consta das que foram apresentadas pelo recorrente a mínima justificação dos motivos para a admissibilidade da revista excecional nos termos da alínea a) e b) do artigo 672.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, sendo esse um ónus inultrapassável que se impunha ao recorrente. Sem prejuízo, 7.ª- Caso as razões expostas não levem à rejeição do recurso interposto, por não verificação ou demonstração dos requisitos formais e substanciais exigidos (artigos 637.º, n.º 2, 672.º, n.º 2 e 3, do Código de Processo Civil), julgamos que existem fatores a ponderar pelo Supremo Tribunal de Justiça que se prendem com as questões fundamentais em debate, i.e., a competência dos tribunais portugueses para decidirem sobre a guarda do menor e a relevância da vontade deste, expressa nos autos, em permanecer no nosso país, tudo no quadro do direito aplicável, designadamente do regulamentar da UE. B. — Objeto e mérito do recurso. 8.ª- Dos factos relevantes apurados resulta que o jovem AA tem 15 anos de idade, é natural dos Países Baixos; deslocou-se sozinho para Portugal onde chegou a ...-1-2022; a CPCJ de ... instaurou PPP e confiou-o a um ex-..., que entretanto foi detido e entregue às autoridades judiciárias dos Países Baixos no cumprimento de um MDE; o jovem beneficiava de uma medida de institucionalização decidida pelo tribunal de Menores de Roterdão, ainda que a recusasse aceitar; a título cautelar, o TFM de ... aplicou ao jovem uma medida de acolhimento residencial. Ouvido o jovem, manifestou a vontade de permanecer no nosso país, tendo o tribunal apelado, apesar disso, decidido que competente para aplicar uma medida protetiva ou outra a título definitivo seria o Tribunal de Roterdão e desatendeu à vontade do jovem. 9.ª- Tal decisão foi mantida pelo Tribunal da Relação de Évora, que em sentido consonante resolveu as duas questões que se colocavam: (1) a de saber se o tribunal recorrido podia aplicar uma medida de acolhimento residencial a título definitivo e (2) a de saber se os fundamentos invocados pelo jovem para evitar o regresso ao país de origem mereciam ser atendidos. 10.ª- Uma vez que o jovem veio sozinho para o nosso país e que não está evidenciada intervenção ilícita de terceiro, importa começar por considerar que não está em causa nos autos um qualquer apto internacional de menor ou deslocação/retenção ilícita do país de residência do menor, pelo que não são aplicáveis as disposições da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980, Sobre os Aspetos Civis do Rapto Internacional de Crianças, nem são aplicáveis as disposições que no REGULAMENTO (UE) 2019/1111 DO CONSELHO de 25 de junho de 2019 (Bruxelas II, ter), vigente desde 01-08-2022, plenamente eficaz no território de todos os Estados da União Europeia, (doravante, Regulamento) se reportam ao rapto internacional de crianças. 11.ª- Porém, tal não significa que pelo menos o Regulamento não deva ser tido em consideração, quer quanto à competência dos tribunais portugueses, quer quanto à relevância e validação decisória da vontade expressa do menor no que se refere às matérias relacionadas com a residência e guarda do menor e às medidas de promoção e proteção, já que esse Regulamento define regras gerais sobre a competência jurisdicional em matéria de responsabilidade parental, designadamente no seu artigo 7.º, regras que se aplicam independentemente de uma qualquer relação jurídica que envolva vários Estados-Membros, pelo que as regras de competência se aplicam inclusivamente a litígios que impliquem relações entre órgãos jurisdicionais de um único Estado-Membro (cf. Ac. TJUE, C-393/18 PPU, § 32 e §41). C — -1.ª Questão: quanto à competência. 12.ª- O Regulamento estabelece no seu artigo 1.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2, alínea d), que se aplica “…d) À colocação de uma criança ao cuidado de uma instituição ou de uma família de acolhimento;…”. 13.ª- O Regulamento tem por pedra angular o princípio do superior interesse da criança ou jovem, que só em concreto pode ser aferido, em função da sua idade, nacionalidade, laços familiares e sobretudo afetivos, enquadramento social e assistencial, domínio da língua, inserção escolar, estabilidade habitacional, etc. 14.ª- A interpretação do Regulamento deve ser efetuada em consonância com o disposto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (CDFUE), designadamente com o seu artigo 24.º, como resulta do Considerando 19 do Regulamento. 15.ª- A salvaguarda do superior interesse da criança e do jovem impõe-se como critério retor até na determinação da competência jurisdicional, conforme resulta do Considerando 20 do Regulamento: “Para salvaguardar o superior interesse da criança, a competência jurisdicional deverá, em primeiro lugar, ser determinada em função do critério da proximidade…. 16.ª- As matérias relacionadas com a guarda, colocação de menor ou atribuição de titularidade da responsabilidade parental a pessoa, instituição ou organismo são da competência do tribunal da residência habitual da criança ou jovem, conforme artigo 7.º do Regulamento. 17.ª- O conceito de residência habitual (conceito autónomo de Direito da UE, conforme entendimento do TJUE) é essencial na configuração da competência jurisdicional para decidir da atribuição das responsabilidades parentais, guarda ou colocação de criança ou jovem. 18.ª- O Regulamento, além de atender aos graus de estabilidade e regularidade necessários ao preenchimento do conceito de residência habitual, faz assentar na proximidade da criança ou jovem com o Estado-Membro o critério privilegiado para responder ao seu superior interesse e à definição da competência do órgão jurisdicional para decidir (cf. Ac. TJUE, C-393/18 PPU, § 48). 19.ª- Daí que o reconhecimento da residência habitual de uma criança ou jovem num dado Estado-membro exija e pressuponha, no mínimo, que a criança ou jovem tenha estado ou esteja fisicamente presente nesse Estado-Membro. 20.ª- Ou seja, além de vínculos qualitativos a aferir em função do caso concreto e sobretudo em função do superior interesse da criança ou do jovem, a determinação da residência habitual e da competência jurisdicional não prescinde da presença física da criança ou do jovem, por ser condição prévia à apreciação da estabilidade dessa presença, precisamente para assegurar que seja tido em conta o interesse superior da criança ou do jovem (cf. Ac. TJUE, C-393/18 PPU, § 52, 53 e 63). 21.ª- E incumbe ao órgão jurisdicional nacional encontrar os fatores relevantes ao preenchimento desse conceito, em função das circunstâncias concretas do caso, ou seja, em função do superior interesse da criança ou do jovem, sem perder de vista a jurisprudência do TJUE e o âmbito interpretativo que lhe tem dado na sua aplicação. 22.ª- Atendendo a essa jurisprudência e ao esforço amplo que tem sido efetuado para integrar o conceito de residência habitual segundo o critério da proximidade, integra o conceito de residência habitual e de proximidade e, portanto, a definição da competência jurisdicional, a eleição e propósito do interessado em fixar determinada residência em determinado local ou país. É isso que resulta e se pode constatar no parágrafo 51.º do Ac. do TJUE, C-497/10 PPU. 23.ª- Ou seja, é relevante para aferir da competência jurisdicional, no quadro do Regulamento, não só a presença física da criança ou jovem, como condição prévia à apreciação da estabilidade dessa presença, como o elemento volitivo do interessado, segundo as circunstâncias do caso, pelo que não pode ser ignorada a vontade de um jovem de 15 anos se tivermos que salvaguardar o superior interesse do jovem AA em concreto. 24.ª- Como bem resulta dos presentes autos, o jovem foi ouvido e manifestou expressamente, justificando-a, a sua vontade em permanecer e viver no nosso país. 25.ª- Ora, o artigo 10.º, n.º 1, alínea c), do Regulamento, dispõe que os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental se o exercício da competência for no superior interesse da criança, sem prejuízo do reforço que o artigo 11.º pode ainda acrescentar, sendo esse superior interesse de preenchimento casuístico, mas que sugere primacialmente a existência de um interesse próprio da criança, por um lado, e a primazia desse interesse relativamente ao interesse de outra categoria de pessoas (os adultos), por outro lado” – cf. Jorge Duarte Pinheiro. Limites ao exercício das responsabilidades parentais em matéria de saúde da criança. Coimbra, Gestelegal, 2020, p. 31. 26.ª- Vale por dizer que, sem prejuízo de melhor apreciarmos de seguida esse superior interesse, em concreto e à luz da vontade do jovem, não nos parece que fosse de excluir a competência dos tribunais portugueses e do tribunal recorrido para aplicar uma medida de acolhimento residencial em instituição portuguesa a título definitivo, já que tal competência jurisdicional não é excluída pelo Regulamento, antes pelo contrário, pois a presença física do jovem no nosso país e a sua vontade em aqui viver não podiam ser ignoradas, à luz do Regulamento e das regras que nele definem a competência jurisdicional, segundo os critérios da residência habitual, da proximidade e, sobretudo, da salvaguarda do superior interesse do jovem. D. — 2.ª Questão: quanto à valoração e relevância da vontade do jovem. 27.ª- O Regulamento estabelece no seu artigo 21.º uma disposição geral sobre o direito da criança ou jovem expressar a sua opinião e, como já referido, a interpretação do Regulamento deve ser efetuada em consonância com o disposto na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia, designadamente com o seu artigo 24.º, que é juridicamente vinculativa desde a entrada em vigor do Tratado de Lisboa. 28.ª- Portanto, decorre desses normativos que a criança ou o jovem deve ter a oportunidade de ser ouvida, qualquer que seja a natureza do procedimento que o vise enquanto sujeito de direitos; também para salvaguarda do direito a um processo equitativo, contraditório e com igualdade de armas, como tem sido acolhido na jurisprudência do TEDH e do TJUE e é ponto assente pelo Comité dos Direitos das Crianças das Nações Unidas. 29.ª- Expressando livremente os seus pontos de vista e preferências sobre o projeto de vida que é seu, devem ser adequadamente tidos em conta em função da sua idade, maturidade e discernimento, por lhe respeitarem pessoalmente. 30.ª- Ora, não nos parece possível ignorar a oposição do menor ao regresso aos Países Baixos, atendendo à vontade que manifestou e à idade que tem, a par com uma firmeza de decisão que o levou a viajar desde os Países Baixos até ao nosso país, onde continua a querer residir e viver. 31.ª- A vontade de um jovem de 15 anos, cuja maturidade e discernimento, não foi posta em causa nos autos, não deve ser desconsiderada. Os argumentos e a vontade do jovem deviam e devem ser pesados, senão acatados. Vejamos em que termos: 32.ª- Como ficou demonstrado nas alegações, ao jovem não foi apenas pedida uma opinião. O formalismo com que se rodeou a audição do jovem implica que, mais do que uma opinião, seja tida como prova de factos e de vontade, tendo sido respeitado o contraditório. 33.ª- E essa prova impõe que a decisão fique vinculada a respeitá–la, a tê–la em conta enquanto verdade processual. 34.ª- Mas mais do que verdade processual, essa prova vincula o decisor à aplicação da lei conforme. 35.ª- Dispõe o artigo 4.º, n.º 1 do Regime Geral do Processo Tutelar Cível (RGPTC) que “Os processos tutelares cíveis regulados no RGPTC se regem pelos princípios orientadores de intervenção estabelecidos na lei de proteção de crianças e jovens em perigo”, acrescentando o seu artigo 5.º, n.º 1, que “A criança tem direito a ser ouvida, sendo a sua opinião tida em consideração pelas autoridades judiciárias na determinação do seu superior interesse.”. 36.ª- A decisão teria que avaliar e ponderar a vontade do jovem AA, à luz deste normativo e dos princípios constantes do artigo 4.º da LPCJP, orientada, portanto, pela prossecução do seu superior interesse de acordo com esse e com os demais princípios constantes da LPCJP, designadamente o da Proporcionalidade e atualidade; o do Primado da continuidade das relações psicológicas profundas; e o da Audição obrigatória e participação. 37.ª- É do superior interesse deste jovem, em concreto, salvaguardar e respeitar a sua vontade, já que para tal há fundamento de facto e de Direito, sendo a jurisprudência dos nossos tribunais superiores consonante quanto à relevância do direito de ser ouvida e de ser respeitada a sua vontade; além de que se mostra em conformidade com instrumentos normativos internacionais, v.g., a Convenção Europeia Sobre o Exercício dos Direitos da Criança (cf., em especial, os artigos 3.º e 4.º), onde destacamos o teor do 6.º (processo de tomada de decisão); a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, no seu artigo 12.º; a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (cf. artigo 24.º); o Regulamento (UE) n.º 2019/1111, Bruxelas II ter (cf. artigo 21.º). 38.ª- É, portanto, imperioso tratar a audição deste jovem, em concreto, e da criança ou jovem, em geral, não como uma “mera diligência formal, mas antes como uma autêntica peça–chave que contribuirá para deslindar o objetivo principal: aferir o superior interesse da criança.”. Cf. Regime Geral do Processo Tutelar Cível anotado. Cristina Araújo Dias, João Nuno Barros, Rossana Martingo Cruz (Coords.). Coimbra: Almedina, 2021, p. 104. 39.ª- O jovem AA tem direitos que entram em conflito com os direitos dos demais interessados, sejam familiares, sejam as intuições assistenciais dos Países Baixos, devendo prevalecer os direitos deste jovem, pois não há razões suficientemente fortes para o fazer retornar a um local onde ele se recusa a viver. 40.ª- Se não é para respeitar os direitos deste jovem, nem para respeitar a sua vontade ou para a ter em conta quando se decide sobre a sua vida num processo onde este jovem é o centro da decisão, então de nada serve conferir-lhes o direito de audição e reconhecer-lhe o direito de participação, só coerentes com o reconhecimento de uma autonomia como sujeito de direitos, dotado de capacidade de formar os seus próprios pontos de vista e de manifestar uma opinião autónoma, de forma razoável e independente, que por isso justifica, então, o direito à nomeação de advogado no caso de interesses conflituantes com os dos progenitores e o direito à informação e ao contraditório - cf. artigos 18.º e 25.º ambos do RGPTC ou 88.º, n.º 4 da LPCJP – e até a legitimidade para a iniciativa processual – artigo 17.º, n.º 1, do RGPTC. 41.ª- Ouvido este jovem foi clara a manifestação da sua vontade e essa vontade não parece estar condicionada por distorções externas, nem revelou falta de perceção adequada de riscos que possam ser, porventura, visíveis para o julgador – isto é, depois de devidamente valorada essa vontade no contexto em que foi assumida e em função do seu superior interesse –, pelo que podia e devia ter sido acolhida na decisão proferida. 42.ª- O jovem manifesta uma vinculação segura com o nosso país, em detrimento de uma vinculação insegura com os familiares e instituições do país de origem. 43.ª- A vontade deste jovem, constante e coincidente nas várias oportunidades em que foi manifestada, por si ou pela sua defensora, revelou–se certa sobre o que queria para o seu futuro, confiante quanto às opções em jogo, pelo que não pode deixar de ser merecedora de crédito. 44.ª- Dir–se–á, pois, que em termos de convicção judiciária, o reconhecimento dos factos de contexto relativos à vivência deste jovem e da vontade que manifestou quando ao seu destino adquiriu o valor suficiente de verdade, ainda que provisória, que deveria ter levado a uma decisão diversa daquela que foi proferida e que é objeto deste recurso. 45.ª- Daí que se impusesse decisão diversa da recorrida, pois seria essa a adequada ratificação da verdade processual e, por via disso, não deixa de merecer censura e eventual revogação a decisão recorrida Em suma, 46.ª- As questões identificadas no douto acórdão recorrido, [1.ª - Pode o tribunal recorrido aplicar uma medida de acolhimento residencial em instituição portuguesa a título definitivo; 2.ª - Quanto ao mérito da decisão, saber se os fundamentos invocados pelo menor para evitar o regresso ao país de origem, merecem ser atendidos] poderiam e deveriam ter tido uma resposta afirmativa. É o que deve, em última instância, ser decidido pelo tribunal ad quem. Contudo, a superior apreciação de V. Exas. fará a devida JUSTIÇA. 10. Em ... de Julho de 2023, a Exma. Senhora Juíza Conselheira relatora de turno proferiu despacho com o seguinte teor: 1. O menor AA, nascido a ... .02.2023, de nacionalidade holandesa, titular do passaporte NP .....K3, filho de BB e de CC, por intermédio da sua patrona nomeada, inconformado com o acórdão do TRE proferido nos presentes autos, que confirmou a decisão da primeira instância, interpôs o presente recurso de revista, invocando o art.671º, n.1 do CPC. 2. Embora esteja em causa um processo judicial da Promoção e Proteção relativo a um menor, não se afigura que as decisões tenham sido tomadas exclusivamente com base em critérios de conveniência ou oportunidade, pelo que o eventual acesso ao STJ não estará liminarmente afastado pelo disposto no n.2 do art.988º do CPC. Porém, tal não significa que, em concreto, a revista seja admissível. 3. O tribunal de primeira instância determinou o regresso do menor aos Países Baixos. O acórdão agora recorrido confirmou essa decisão, sem voto de vencido e sem fundamentação diversa. Nestes termos, a revista prevista no art.671º, n.1 do CPC não é admissível por a tal obstar o limite da denominada “dupla conforme”, previsto no n.3 deste artigo. 4. Por outro lado, sem se referir expressamente à hipótese de admissibilidade do recurso como revista excecional, e sem invocar, sequer, o respetivo fundamento legal, o recorrente alega ainda que o recurso teria como fundamento: «A apreciação de questões que pela sua relevância Jurídica é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito. Estão ainda em causa interesses de particular relevância Social e Pessoal pois está em causa a defesa do superior interesse de um Menor, a aplicação de uma medida definitiva de acolhimento residencial e o projeto de vida do Menor, o aqui Recorrente, em Portugal.» Para que o recurso possa ser submetido à apreciação da Formação a que alude o art.672º, n.3 do CPC (à qual pertence a competência para aferir os pressupostos específicos de admissibilidade da revista excecional), o recorrente deve indicar, sob pena de rejeição, os requisitos exigidos pelo n.2 do art.762º: «a) As razões pelas quais a apreciação da questão é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito; b) As razões pelas quais os interesses são de particular relevância social.» Afigura-se que o recorrente não cumpriu o ónus que lhe era imposto por estas disposições, limitando-se a uma alegação genérica, sem configuração objetiva. Pelo exposto, não sendo de tomar conhecimento do objeto do recurso, tem aplicação o at.655º do CPC (ex vi do art.679º). Assim, nos termos do art.652º, n.1, alínea b) e art.655º, n.1 do CPC, notifiquem-se as partes para, no prazo de 10 dias, se pronunciarem, caso pretendam. 11. O menor AA respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil nos seguintes termos: 1. O Menor desde já se penitencia, pois as alegações apresentadas deveriam ter seguido pela via da Revista excecional 2. Ao abrigo do artigo 672.º do CPC 3. Na verdade, e como alegado, o menor tem razões para que sejam apreciadas questões que pela sua relevância Jurídica, são claramente necessárias para uma melhor aplicação do direito. 4. Estão ainda em causa interesses de particular relevância Social e Pessoal pois está em causa a defesa e o superior interesse de um Menor, 5. A aplicação de uma medida definitiva de acolhimento residencial e o projeto de vida do Menor, o aqui Recorrente, em Portugal; 6. Por um lado, e reitera-se, não foi apreciado de forma correta a questão da Competência dos Tribunais Portugueses para decidir, no âmbito e com alcance das normas internacionais – Convenção Haia, Convenção sobre o Direito das Crianças, e Regulamento da EU 7. Os Tribunais e Instâncias portuguesas até aqui têm tomado as medidas e decisões sobre o projeto de vida e o iter do menor AA em Portugal 8. Assumindo, desde a 1.ª Instância, a Competência para decidir, 9. Tal não pode ser negado ou olvidado 10. O Tribunal de Família e Menores – de 1.ª Instância decidiu ouvir as partes e obter provas para tomar uma decisão, envergando as vestes de poder e competência que assumiu, perante o caso do Menor AA Fransen. 11. E não foi uma decisão tomada a título urgente, cautelar nem provisório, mas sim definitivo 12. Tomando o Tribunal posição e assumindo competência para decidir sobre o futuro e projeto de vida do menor AA; decidir se o menor AA ficava em Portugal ou se regressaria ao seu país de origem; 13. Nunca se tendo considerado, oficiosamente, incompetente para decidir 14. Pelo que os Tribunais Portugueses se consideraram, desde o início, e são os competentes para decidir sobre o projeto de vida do menor AA. 15. Quanto às razões de particular relevância social 16. Estamos perante um caso de um Menor, que revela uma particular importância desde já pela natureza do processo; 17. Um menor deslocado do seu pais de origem , com um propósito de residência e proteção 18. Inicialmente com o Sr DD 19. Cujas instâncias e autoridades tiveram conhecimento e anuíram com a sua manutenção de residência (CPCJ e Ministério Publico) 20. NesteseguimentofoiditoeprovadoqueoMenorestavasujeitoasituaçõesqueocolocam em perigo, quer junto dos progenitores (cuja guarda lhes foi retirada) quer junto das instituições públicas nos Países Baixos. 21. Tendo sido feito diversos apelos pelo Menor nessas matérias. 22. Ora foi decidido o regresso do Menor, não por existir uma Sentença do tribunal de Roterdão que assim o ditava, mas porque o Tribunal a quo considerou não existirem elementos suficientes e “concretos que indiciem que o menor em instituições Holandesas seja sujeito a situações que o coloquem em perigo” 23. Mas também não se diligenciou no sentido de saber se existia esse perigo…pese embora os vários indícios evidentes. 24. Por outro lado, e por essa lógica, se existissem concretos elementos – como refere– teria o Tribunal a quo decidido diferentemente no sentido de decretara medida de acolhimento definitivo em Portugal; 25. Num Segundo Julgamento, e junto da Relação de Évora, os Digníssimo Juízes Desembargadores limitaram-se perante esta ausência de prova, decidir no mesmo sentido, com a reprodução das alegações da Digníssima Procuradora da 1.ª instância. 26. A verdade porem é que o menor se encontra atualmente a frequentar equipamento educativo e encontra-se a estudar; 27. Pretende ficar em Portugal. 28. Sente-se seguro e apoiado como nunca. 29. Que se encontra a aprender o português 30. Reitera-se que os Tribunais Portugueses desde a chegada do Menor AA que assumiram as vestes de autoridade decisora sobre o iter do Menor; 31. Ao tomar todas as decisões que tomaram, as entidades e autoridades judiciais portugueses tomaram decisões importantes de forma definitiva e não só a título cautelar ou provisório. 32. Ao se descartar a competência do Tribunal, que até então, assumiu competências para decidir, foram violadas as normas de direito internacional sobre a competência do Tribunal para decidir sobre a medida a aplicar ao menor AA., 33. Designadamente na norma excecional da Convenção Relativa à Competência e a Lei Aplicável em Matéria de Proteção de Menores, no qual se prevê que em situações de ameaça ou perigo sério, o Estado da Residência do Menor poderá decretar medidas de proteção, ainda que não aceites pelos outros Estados-Contratantes, por um lado, 34. Por outro, deveria ter sido aplicado o art. 13.º da Convenção de Haia, na qual o tribunal deveria se recusar a ordenar o regresso da criança, quando esta se opõe e quando “a criança atingiu já uma idade e um grau de maturidade tais que levem a tomar em consideração as suas opiniões sobre o assunto.” Reitera-se, assim: 35. O País competente para decidir sobre a sua proteção será o estado onde o Menor se encontra – segundo Regulamento (CE) e a Convenção de Haia. 36. Posto isto, sendo a competência assumida e reconhecida pelos Tribunais Portugueses, deveria ter apreciado e decidido aplicar a medida de acolhimento numa Instituição até serem devidamente averiguadas as situações de perigo pelo qual o Menor tem sido sujeito e alvo no seu país de origem. 37. Nestes moldes supra enunciados, encontram-se aclarados, na nossa modesta opinião, os requisitos para que seja dado o devido provimento ao Recurso de Revista Excecional, por preenchidos os requisitos legais da sua admissão, designadamente os requisitos previstos no n.º 2 do art. 672.º do C.P.C. 12. O Ministério Público respondeu ao despacho previsto no art. 655.º do Código de Processo Civil nos seguinte termos: I — Admissibilidade do recurso. 1. Conforme o epigrafado e se extraiu do cabeçalho respectivo, o presente recurso (de revista) foi expressamente interposto ao abrigo da disposição do art. 672º/1 do Código de Processo Civil. 2. E, concretamente, de um Acórdão da Relação de Évora que, em recurso de apelação, com os mesmos fundamentos, no essencial, e sem voto de vencido – é o que se extrai da análise da fundamentação das duas decisões, que aqui não vamos reproduzir, sob puro exercício do inútil –, confirmou o Despacho proferido na 1ª Instância em Processo de Promoção e Protecção de Menores que decidiu que o menor, AA, deve regressar ao país de origem (Países-Baixos), para ser executada a medida judicial ali aplicada. 3. Ou seja: Revela-se uma clara situação de dupla conforme, motivo por que, efectivamente, o Acórdão em questão não é passível de recurso de revista,pelo que não deveserconhecido o seu objecto (cfr, os arts. 652º/1-b), 655º/1, 671º/1 e 3 e 988º/2, este a contrario sensu, do Código de Processo Civil). 4. Por outro lado, conquanto o recorrente faça apelo a critérios de ponderação atinentes: À “relevância jurídica… claramente necessária para uma melhor aplicação do Direito”; A “interesses de particular relevância Social e Pessoal”; O certo é que se fica pela mera alegação abstracta, sem especificar as concretas razões que sustentam a matéria conceitual invocada. 5 Mas, mais do que isso: Omite também a referência a qualquer Acórdão Fundamento, da Relação ou do Supremo Tribunal de Justiça, transitado em julgado, que esteja em contradição com a decisão recorrida, assim como a caracterização do desencontro decisório entre ambas. 6 Donde: Não se mostraria, também, processualmente viável convolar o recurso interposto para a tipologia da revista excepcional (cfr, art. 672/1 e 2 do Código de Processo Civil). II. Em síntese: Não deve ser conhecido, por inadmissibilidade legal, o objecto do presente recurso de revista interposto de Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, porque proferido em situação de dupla conforme, ou seja, confirmando por via de fundamentação no essencial idêntica e sem voto de vencido a decisão da 1ª Instância. III Em conclusão: Motivo por que o Ministério Público p. que, em Decisão Sumária: -Seja decidido não conhecer o objecto do presente recurso. 13. Como o objecto do recurso é delimitado pelas conclusões do recorrente (cf. arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões de conhecimento oficioso (cf. art. 608.º, n.º 2, por remissão do art. 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil), a questão a decidir, in casu, é, no essencial, a questão da competência internacional dos tribunais portugueses para aplicarem ao menor AA as medidas de protecção adequadas. II. — FUNDAMENTAÇÃO OS FACTOS 14. O acórdão recorrido deu como provados os factos seguintes: 1. O menor tem 15 anos de idade e é natural da Holanda. 2. É filho de BB e de CC, nacionais daHolanda e ali residentes. 3. O menor deslocou-se da Holanda para Portugal, sozinho, para passar a viver com um ex-... (DD), que estava a morar em ..., onde chegou a ... de Janeiro de 2023. 4. Deslocou-se de imediato à CPCJ de ..., entidade a quem deu conta da fuga, alegadamente, porque não se sentia seguro na Holanda, por ter sido vítima de abusos e maus tratos. 5. O menor informou ainda que tinha um processo pendente no Tribunal de Roterdão, onde lhe havia sido aplicada medida de acolhimento em instituição e deu o contacto de uma advogada que lhe teria sido nomeada no processo em causa. 6. A CPCJ instaurou processo de promoção e proteção, dada a situação de desproteção em que o menor se encontrava (num país estrangeiro para onde tinha viajado sozinho, desacompanhado de qualquer responsável). 7. Nas diligências que efetuou, a CPCJ apurou que o ex-... do jovem, tinha condições para o receber e estava disposto a acolhê-lo, tendo deliberado aplicar a favor do menor, a título cautelar, dado não ter consentimento dos pais, a medida de apoio junto de pessoa idónea, tendo o menor sido entregue à guarda e cuidados do referido ... DD, no dia ... de Janeiro de 2023. 8. Este comprometeu-se, além do mais, a prestar ao jovem todos os cuidados necessários e a colaborar com as entidades portuguesas e holandesas no acompanhamento e regularização da sua situação. 9. Entretanto, a CPCJ conseguiu apurar, através da advogada do menor na Holanda, que o Tribunal de Menores de Roterdão, a ... de Janeiro de 2023, deferiu um pedido de colocação do jovem em instituição fechada, apresentado pelos Serviços de Acompanhamento Juvenil, tendo agendado a audição do jovem e das partes interessadas para o dia ... de Janeiro de 2023, diligência a que o jovem faltou. 10. Em face da informação recolhida de que existia processo no Tribunal de Menores de Roterdão, bem como, ao facto de não ter qualquer consentimento dos pais para desencadear a intervenção, a CPCJ de ... decidiu remeter o processo ao Ministério Público, de acordo com o previsto no art. 11 nº 1 als. c) e f) da LPCJP. 11. O processo deu entrada nos Serviços do Ministério Público a ... .02.2023. tendo, após a sua receção, a CPCJ, informado via telefone, que o ... a cuja guarda e cuidados o menor fora entregue, teria sido detido pelas autoridades portuguesas, e que apresentado para interrogatório no Tribunal da Relação de Évora, ia ficado detido, não estando prevista data para a sua libertação. 12. Nessa sequência, encontrando-se o menor entregue a si próprio, num país estrangeiro, desacompanhado dos pais ou de qualquer outro responsável que lhe pudesse prestar os cuidados de que carecia, e em situação que comprometia de forma grave a sua integridade física, saúde, segurança e desenvolvimento, legitimadora de intervenção para a promoção dos seus direitos, foi requerida pelo Ministério Público, a aplicação ao menor AA, a título cautelar, a medida de acolhimento residencial, de acordo com o previsto no art. 3.º, n.º 1 e 2, alíneas a), e c), 35º nº 1 al. f), 37º, 49º e 50º nº 1 da LPCJP. 13. Por despacho judicial proferido a ... .02.2023. foi deferida a aplicação da medida, a título cautelar, tendo o jovem sido acolhido na instituição “ A .......”, sita em ..., nessa mesma data. 14. Nos termos do referido despacho, foram efetuadas diligências junto do tribunal de Roterdão, bem como, da Autoridade Central Portuguesa, tendo em vista o cabal apuramento da situação (algumas das quais ainda sem resultado) e foi designada data para audição do menor (sendo- lhe nomeado defensor), pais e técnicos que o acompanharam na Holanda. 15. A mãe do menor formulou nos autos pedido de regresso do menor ao país de origem, o mesmo sucedendo, por parte dos técnicos do Serviço Juvenil encarregados do acompanhamento da medida aplicada nos Países Baixos. 16. Ouvidos os intervenientes (conforme resulta da gravação e ata de fls. 164 a 168), esclarecida a situação no que se reporta à pendência de processo no Tribunal de Roterdão, junta a decisão de aplicação de medida de acolhimento a executar em instituição aberta sita naquele país, foi proferido o despacho recorrido. O DIREITO 15. A questão da admissibilidade do recurso é uma questão prévia. 16. Embora a controvérsia se tenha polarizado em torno da dupla conforme — art. 671.º, n.º 3 — e dos requisitos da revista excepcional — art. 672.º do Código de Processo Civil —, o caso poderá relacionar-se com o art. 629.º, n.º 2, alínea a), do Código de Processo Civil: “Independentemente do valor da causa e da sucumbência, é sempre admissível recurso […] (c]om fundamento na violação das regras de competência internacional, das regras de competência em razão da matéria ou da hierarquia, ou na ofensa de caso julgado” 17. O Recorrente invoca a violação das regras de competência internacional. 18. Fá-lo, designadamente, na conclusão 4:º do recurso de revista, em que expressamente diz que 4. […] não foi apreciado de forma correta a questão da Competência dos Tribunais Portugueses para decidir, no âmbito e com alcance das normas internacionais-Convenção Haia, Convenção sobre o Direito das Crianças, e Regulamento da UE. 19. O facto de o recurso de revista ter como fundamento a violação das regras de competência internacional determina que a dupla conforme seja, em concreto, irrelevante 1. 20. Entrando agora na apreciação do mérito do recurso: 21. O menor, agora Recorrente, AA tem actualmente 15 anos de idade 2 — logo, é uma criança, no sentido da Convenção da Haia de 19 de Outubro de 1996, relativa à protecção de menores, e no sentido do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental 3. 22. Embora o Recorrente seja natural da Holanda 4, encontra-se em Portugal 5. Em consequência, o caso tem contacto com duas ordens jurídicas 6. Em abstracto, os tribunais competentes para apreciar e decidir o caso podem ser os tribunais holandeses, atendendo a que o menor é natural da Holanda, ou podem ser os tribunais portugueses, atendendo a que o menor se encontra em Portugal. 23. Estando em causa uma decisão 7 compreendida no âmbito de aplicação da Convenção da Haia de 19 de Outubro de 1996 8 e do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019 9 10, as instâncias aplicaram ao caso o art. 5.º da Convenção e o art. 7.º do Regulamento. I. — O art. 5.º da Convenção da Haia de 19 de Outubro de 1996 determina que 1 - As autoridades jurídicas ou administrativas do Estado Contratante no qual a criança tem a sua residência habitual possuem competência para tomar as medidas necessárias à protecção da pessoa ou bens da criança. 2 - Com ressalva do artigo 7.º, em caso de mudança da residência habitual da criança para outro Estado Contratante, as autoridades do Estado da nova residência habitual terão a competência. II. — Em consonância com o art. 5.º da Convenção, o art. 7.º do Regulamento UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, sob a epígrafe Competência geral, dispõe que 1. — Os tribunais de um Estado-Membro são competentes em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data em que o processo é instaurado no tribunal. 2. — O n.o 1 do presente artigo é aplicável sob reserva dos artigos 8.º a 10.º. 24. O acórdão recorrido chama a atenção para o paralelismo entre o conceito de residência da criança do art. 9.º do Regime geral do processo tutelar cível e o conceito de residência habitual do art. 5.º da Convenção e do art. 7.º do Regulamento, para concluir que a residência habitual é o “local onde se encontrava organizada a […] vida [do menor], em termos de maior estabilidade e permanência, onde desenvolve habitualmente a sua vida, onde está radicado”. 25. Ora, desde que ao termo residência habitual fosse dado o sentido que lhe deu o acórdão recorrido, “[seria] pacifico que a residência do menor é nos Países Baixos, na área de jurisdição do Tribunal de Roterdão, sendo este o tribunal internacionalmente competente, de acordo com as disposições da Convenção adotada na Haia em 19 de Outubro de 1996, aprovada pelo Decreto n.º 52/2008 de 13 de Novembro (arts. 1º, 2º, 3º 5º e 7º) e do Regulamento (UE) -2019/1111 do Conselho de 25 de junho de 2019, para decidir da aplicação de medidas em matéria de responsabilidade parental, bem como, de medidas de promoção e proteção (arts. 1º nº 1, 2º, 7º, 9º)”. 26. O Ministério Público alega que a aplicação do critério da residência habitual do art. 5.º da Convenção e do art. 7.º do Regulamento deve atender ao superior interesse da criança e que, atendendo ao superior interesse da criança, deve conformar-se com a vontade do menor: 27. Ora decisão determinada pelo interesse do menor, pelo superior interesse do menor, deve distinguir-se de uma decisão determinada pela vontade do menor. Os factos dados como provados são suficientes para que se conclua que a decisão proferida pelo Tribunal de Roterdão é contrária à vontade do menor; são suficientes para que se conclua que o menor, agora Recorrente, não quer cumprir a medida de acolhimento em instituição, que lhe tinha sido aplicada pelo Tribunal de Roterdão; não são, de forma nenhuma, suficiente para que se conclua que a decisão proferida pelo Tribunal de Roterdão é contrária ao interesse do menor — ao superior interesse do menor. 28. Independentemente dos argumentos relacionados com o interesse ou com a vontade do menor, o Ministério Público alega que o conceito de residência habitual deve atender à vontade do interessado: 22.ª- […] integra o conceito de residência habitual e de proximidade e, portanto, a definição da competência jurisdicional, a eleição e propósito do interessado em fixar determinada residência em determinado local ou país. É isso que resulta e se pode constatar no parágrafo 51.º do Ac. do TJUE, C-497/10 PPU. 23.ª- Ou seja, é relevante para aferir da competência jurisdicional, no quadro do Regulamento, não só a presença física da criança ou jovem, como condição prévia à apreciação da estabilidade dessa presença, como o elemento volitivo do interessado, segundo as circunstâncias do caso, pelo que não pode ser ignorada a vontade de um jovem de 15 anos se tivermos que salvaguardar o superior interesse do jovem AA em concreto. 29. O conceito de residência habitual relevante para efeitos do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, foi interpretado pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, pelo Supremo Tribunal de Justiça e pelos Tribunais da Relação no sentido de que corresponde ao lugar do centro efectivo da vida da criança / do menor, “encontrado de acordo com os elementos disponíveis no momento da entrada do processo em tribunal, por ser esse que releva para a fixação da competência” 11. 30. Ora o critério do centro efectivo da vida da criança / do menor “traduz uma certa integração da criança num ambiente social e familiar” 12. 31. O acórdão recorrido, aplicando ao caso o critério em tudo coincidente com o critério da integração num ambiente social e familiar, chegou à conclusão de que a residência habitual do menor era na Holanda: “O menor tem 15 anos de idade, sempre viveu na Holanda, não tem qualquer ligação a Portugal, onde não possui qualquer familiar ou amigo, não conhece a língua, e, «ao contrário do que alega, não está a frequentar qualquer equipamento educativo, nem fez amigos, passando a maior parte do tempo dentro da instituição, fechado no seu quarto», conforme resulta do relatório junto aos autos (cfr. fls. 111/ 112)”. 32. O Ministério Público invoca expressamente o parágrafo 51 do acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Dezembro de 2010 — processo C-497/10 PPU —, cujo teor é o seguinte: “A este respeito, deve sublinhar‑se que, para distinguir a residência habitual de uma simples presença temporária, a residência habitual deve, em princípio, ter uma certa duração para traduzir uma estabilidade suficiente. No entanto, o regulamento não prevê uma duração mínima. Com efeito, para a transferência da residência habitual para o Estado de acolhimento, importa sobretudo a vontade do interessado de aí fixar, com intenção de lhe conferir um carácter estável, o centro permanente ou habitual dos seus interesses. Assim, a duração de uma estada apenas pode servir de indício na avaliação da estabilidade da residência, devendo essa avaliação ser feita à luz de todas as circunstâncias de facto específicas do caso concreto”. 33. Face ao texto do parágrafo 51 do acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Dezembro de 2010, chega-se a uma conclusão algo diferente do Ministério Público: O Tribunal de Justiça diz, tão-só, que a avaliação do carácter habitual da residência “[deve] ser feita à luz de todas as circunstâncias de facto específicas do caso concreto” e que, entre as circunstâncias de facto específicas do caso concreto, está (pode estar) a vontade do interessado; ora, ainda que a vontade do menor seja no sentido de fixar a sua residência em Portugal, as circunstâncias específicas do caso concreto descritas no acórdão recorrido são suficientes para que se conclua que o menor tem residência habitual na Holanda. 34. O facto de ao menor, agora Recorrente, ter sido aplicada pelos tribunais portugueses a medida de acolhimento em instituição 13 em nada conflitua com a conclusão de que o menor tem residência habitual na Holanda e de que os tribunais holandeses são os tribunais competentes segundo o art. 5.º da Convenção e o art. 7.º do Regulamento. A medida de acolhimento em instituição foi, tão-só, uma medida provisória no sentido do art. 11.º da Convenção 14 e do art. 15.º do Regulamento 15. 35. O menor, agora Recorrente, pretende que o caso seja apreciado de acordo com as disposições da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças 16 e que, ao ser apreciado de acordo com as disposições da Convenção da Haia, fique sujeito às disposições relativas ao regresso da criança dos arts. 8.º ss da Convenção e dos arts. 22.º ss. do Regulamento (UE) 2019/1111. I. — Em primeiro lugar, alega que os tribunais portugueses sempre se consideraram competentes para apreciar a questão do regresso da criança / do menor à Holanda. II. — Em segundo lugar, alega que, ainda que não se tivessem considerado competentes, sempre os tribunais portugueses teriam de se pronunciar sobre as excepções do art. 13.º da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980. 36. O menor, agora Recorrente, considera que está preenchida a previsão do primeiro parágrafo do art. 13.º, por haver um “risco grave de a criança, no seu regresso, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, a ficar numa situação intolerável” e que, ainda que não estivesse preenchida a previsão do primeiro parágrafo do art. 13.º, o menor, agora Recorrente, considera que sempre estaria preenchida a previsão do segundo parágrafo: “A autoridade judicial ou administrativa pode também recusar-se a ordenar o regresso da criança se verificar que esta se opõe a ele e que a criança atingiu já uma idade e um grau de maturidade tais que levem a tomar em consideração as suas opiniões sobre o assunto”. 37. Os argumentos deduzidos fazem com que deva perguntar-se se estão preenchidos os pressupostos ou requisitos de aplicação da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 — e, em especial, fazem com que deva perguntar-se se está preenchido o requisito da ilicitude da deslocação. 38. O art. 3.º da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 enuncia o critério da ilicitude da deslocação ou da retenção de uma criança / de um menor nos seguintes termos: A deslocação ou a retenção de uma criança é considerada ilícita quando: a) Tenha sido efectivada em violação de um direito de custódia atribuído a uma pessoa ou a uma instituição ou a qualquer outro organismo, individual ou conjuntamente, pela lei do Estado onde a criança tenha a sua residência habitual imediatamente antes da sua transferência ou da sua retenção; e b) Este direito estiver a ser exercido de maneira efectiva, individualmente ou em conjunto, no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido. O direito de custódia referido na alínea a) pode designadamente resultar quer de uma atribuição de pleno direito, quer de uma decisão judicial ou administrativa, quer de um acordo vigente segundo o direito deste Estado. 40. O caso típico de deslocação ilícita é o de uma deslocação em que a criança / em que o menor desempenha um papel essencialmente passivo, acompanhando algum dos progenitores 17; ora, do facto dado como provado sob o n.º 3 resulta que o menor desempenhou um papel activo, deslocando-se desacompanhado de qualquer dos progenitores; excluída a hipótese de se dar o caso típico, deve averiguar-se se se dá um caso atípico. I. — O Supremo Tribunal de Justiça tem chamado a atenção para que “[a] exigência da ilicitude da deslocação ou retenção de crianças realizadas, na previsão do art. 3 da Convenção de Haia sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, de 25 de Outubro de 1980, e o art. 11 nº2 do Regulamento CE nº 2021/2003, impõe a certificação de que o direito de custódia atribuído pelo direito do estado onde a criança tem residência habitual estivesse atribuído e a ser exercido no momento da transferência ou da retenção, ou o devesse estar se tais acontecimentos não tivessem ocorrido” 18. II. — Ora, dos factos dados como provados resulta tão-só que o menor chegou a Portugal no dia exacto em que o Tribunal de Menores de Roterdão deferiu o pedido de colocação do jovem em instituição fechada, apresentado pelos Serviços de Acompanhamento Juvenil 19 — não resulta que a deslocação tenha sido efectivada em violação de um direito de custódia que estivesse a ser efectivamente exercido, ou que devesse estar a ser efectivamente exercido se a deslocação não se tivesse verificado. 41. Em todo o caso, ainda que a deslocação fosse ilícita, os factos dados como provados não são suficientes para que se dê por preenchidos os pressupostos ou requisitos de qualquer das excepções prevista no art. 13.º da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980. 42. Em primeiro lugar, a alegação de que o menor se opôs ao regresso e de que a sua oposição deve ser tomada em consideração, atendendo à sua idade e à sua maturidade, só poderá proceder em casos de oposição consistente e verdadeira 20 21. O requisito de que a oposição seja consistente pretende excluir a relevância de simples preferências e o requisito de que a oposição seja verdadeira, a relevância de oposições condicionadas, não plenamente livres ou não plenamente esclarecidas 22. 43. Os factos dados como provados depõem no sentido de que a oposição do menor, agora Recorrente, ao regresso à Holanda tem como justificação exclusiva ou, em todo o caso, essencial a alegação de que estão preenchidos os pressupostos da excepção prevista no art. 13.º, primeiro parágrafo, alínea b), da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980. Em consequência, os argumentos deduzidos pelo menor, agora Recorrente, serão considerados em seguida, ao apreciar-se o preenchimento da excepção do primeiro parágrafo. 44. Em todo o caso, ainda que as instâncias porventura pudessem aplicar ao caso concreto a excepção prevista no art. 13.º, segundo parágrafo, da Convenção da Haia, nunca a decisão proferida pelas instâncias seria susceptível de recurso de revista. A decisão que tomasse em consideração a oposição do menor para efeitos de regresso sempre seria uma decisão determinada por critérios de conveniência ou oportunidade — logo, sujeita à restrição do art. 988.º, n.º 2, do Código de Processo Civil 23. 45. Em segundo lugar, a alegação de que há um risco grave de a criança, no seu regresso, ficar sujeita a perigos de ordem física ou psíquica, ou, de qualquer outro modo, a ficar numa situação intolerável só poderá proceder em casos muito excepcionais 24. Ora os factos dados como provados não contêm nenhum indício de um risco grave de o menor, agora Recorrente, ficar sujeito a perigos de ordem física ou psíquica. 46. Em terceiro lugar, ainda que o tribunal ponderasse aplicar a excepção prevista no art. 13.º, primeiro parágrafo, alínea b), da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980, sempre relevaria o art. 27.º, n.º 3, do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019: “Se um tribunal ponderar recusar o regresso de uma criança apenas com base no artigo 13.º, primeiro parágrafo, alínea b), da Convenção da Haia de 1980, não pode recusar o regresso da criança se a parte que pretende o regresso da criança der garantias ao tribunal, apresentando meios de prova suficientes, ou se o tribunal tiver de outro qualquer modo essa convicção, de que foram tomadas providências adequadas para garantir a proteção da criança após o seu regresso”. Ora, os termos em que está redigida a fundamentação das decisões impugnadas são elucidativos no sentido de que os tribunais portugueses ficaram convencidos de que foram tomadas providências adequadas para garantir a protecção do menor após o seu regresso 25. 47. O menor, agora Recorrente, sustenta que os factos considerados pelas instâncias não eram suficientes para que formassem a convicção de que tinham sido tomadas providências adequadas para garantir a protecção do menor após o seu regresso. O problema está em que, como se diz. no acórdão do STJ de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 1735/06.OTMPRT.S1 —, “[e]stá fora do âmbito possível do recurso de revista o controlo de uma decisão de recusa ou de entrega com fundamento na maior adequação à protecção dos interesses da criança, apenas susceptível de recurso até à Relação” 26. III. — DECISÃO Face ao exposto, nega-se provimento ao recurso e confirma-se o acórdão recorrido. Sem custas — art. 4.º, n.º 1, alínea i), do Regulamento das Custas Processuais. Lisboa, 14 de Setembro de 2023 Nuno Manuel Pinto Oliveira (relator) Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Manuel Pires Capelo ______
1. Cf. art. 671.º, n.º 3, do Código de Processo Civil: “Sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível…”. 2. Cf. facto dado como provado sob o n.º 1. 3. Cf. art. 2.º da Convenção da Haia de 19 de Outubro de 1996, relativa à protecção de menores, e art. 2.º, n.º 2, alínea 6, do Regulamento UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019 — em que se define criança como “qualquer pessoa com menos de 18 anos”.↩︎ 4. Cf. factos dados como provados sob os n.º 1 e 2. 5. Cf. factos dados como provados sob os n.º 3 ss. 6. Cf. acórdão do STJ de 20 de Janeiro de 2009 — processo n.º 08B2777 —: “A questão de competência internacional surge quando no pleito se desenham elementos em conexão com outra ordem jurídica, para além da portuguesa. Trata-se de saber se a questão submetida a tribunal deve ser resolvida pelos tribunais portugueses ou se pelos tribunais estrangeiro” 7. O art. 2.º do Regulamento UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental, define decisão como “uma decisão proferida por um tribunal de um Estado-Membro, incluindo qualquer acórdão, sentença ou despacho judicial que decreta o divórcio, a separação ou a anulação do casamento ou relativa à responsabilidade parental”, esclarecendo duas coisas: Em primeiro lugar, que, “[p]ara efeitos do capítulo IV, o termo ‘decisão’ inclui também: a) As decisões proferidas num Estado-Membro que ordenem o regresso de uma criança a outro Estado-Membro nos termos da Convenção da Haia de 1980 que devam ser executadas num Estado-Membro diferente do Estado-Membro onde a decisão foi proferida; b) As medidas provisórias e cautelares decretadas por um tribunal que, por força do presente regulamento, tenha competência quanto ao mérito da causa ou as medidas decretadas em conformidade com o artigo 27.o, n.o 5, em conjugação com o artigo 15.º”. Em segundo lugar, que, “[p]ara efeitos do capítulo IV, o termo ‘decisão’ não inclui as medidas provisórias e cautelares decretadas por esse tribunal sem que o requerido tenha sido notificado a comparecer, salvo se a decisão que ordena a medida tiver sido notificada ao requerido antes da execução2. 8. Cf. art. 1.º da Convenção da Haia de 19 de Outubro de 1996, relativa à protecção de menores, aprovada pelo Decreto n.º 52/2008, de 13 de Novembro: “1.— A presente Convenção tem por objecto: a) Determinar qual o Estado cujas autoridades têm competência para tomar as medidas orientadas à protecção da pessoa ou bens da criança; b) Determinar qual a lei aplicável por estas autoridades no exercício da sua competência; c) Determinar a lei aplicável à responsabilidade parental; d) Assegurar o reconhecimento e a execução de tais medidas de protecção em todos os Estados Contratantes; e) Estabelecer entre as autoridades dos Estados Contratantes a cooperação necessária para realizar os objectivos da Convenção. 2. — Para os efeitos desta Convenção, a expressão «responsabilidade parental» designa a autoridade parental ou qualquer outra relação análoga de autoridade que determine os direitos, poderes e responsabilidades dos pais, tutores ou outros representantes legais relativamente à pessoa ou bens da criança”. 9. Cf. art. 1.º do Regulamento UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental: “1. — O presente regulamento aplica-se em matéria civil relativamente: a) Ao divórcio, à separação e à anulação do casamento; b) À atribuição, ao exercício, à delegação, à limitação ou à cessação da responsabilidade parental. 2. — As matérias referidas no n.o 1, alínea b), dizem, nomeadamente, respeito: a) Ao direito de guarda e ao direito de visita; b) À tutela, à curatela e a outras instituições análogas; c) À designação e às funções de qualquer pessoa ou organismo encarregado da pessoa ou dos bens de uma criança, de a representar ou assistir; d) À colocação de uma criança ao cuidado de uma instituição ou de uma família de acolhimento; e) Às medidas de proteção da criança relacionadas com a administração, conservação ou disposição dos bens de uma criança”. 10. Sobre a interpretação do Regulamento (CE) n.º 2201/2003, de 27 de Novembro de 2003, cujos conceitos e estruturas fundamentais correspondem, em substância, aos do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, vide, por todos, Maria Helena Brito, “O Regulamento (CE) n.º 2201/2003, do Conselho, de 27 de Novembro de 2003, relativo à competência, ao reconhecimento e à execução de decisões em matéria matrimonial e em matéria de responsabilidade parental”, in: Estudos em memória do Professor Doutor António Marques dos Santos, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 2005, págs. 305-356. 11. Cf. Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, “Jurisprudência sobre rapto internacional de crianças”, in. Julgar, n.º 24 — 2014, págs. 67-87 (73-74) — com indicação da jurisprudência relevante. 12. Cf. designadamente o acórdão do Tribunal de Justiça de 22 de Dezembro de 2010 — processo C-497/10 PPU. 13. Cf. facto dado como provado sob o n.º 13. “Por despacho judicial proferido a ... .02.2023. foi deferida a aplicação da medida, a título cautelar, tendo o jovem sido acolhido na instituição ‘A .......’, sita em ..., nessa mesma data”. 14. Cujo teor é o seguinte: 1. — Em todos os casos de urgência, as autoridades de um Estado Contratante, em cujo território se encontra a criança, ou os bens que lhe pertencem, têm competência para tomar as medidas de protecção necessárias. 2. — As medidas tomadas, ao abrigo do número precedente relativamente a uma criança com residência habitual num Estado Contratante, prescrevem logo que as autoridades com competência, ao abrigo dos artigos 5.º e 10.º, tenham tomado as medidas exigidas pela situação. 3. — As medidas tomadas ao abrigo do n.º 1, relativamente a uma criança com residência habitual num Estado não Contratante, prescreverão em cada Estado Contratante logo que as medidas necessárias pela situação, e tomadas pelas autoridades do outro Estado, sejam reconhecidas pelo Estado Contratante em questão”. 15. Cujo teor é o seguinte: “1. — Em casos urgentes, mesmo que o tribunal de outro Estado-Membro seja competente para conhecer do mérito da causa, os tribunais de um Estado-Membro são competentes para tomar medidas provisórias ou cautelares, que possam estar previstas no direito desse Estado-Membro, no que respeita: a) A uma criança que esteja presente nesse Estado-Membro; ou b) A bens pertencentes a uma criança, que se encontrem nesse Estado-Membro. 2. — Na medida em que o exija a proteção do superior interesse da criança, o tribunal que tiver decretado as medidas a que se refere o n.o 1 do presente artigo informa sem demora desse facto o tribunal ou a autoridade competente do Estado-Membro que tem competência nos termos do artigo 7.o ou, se for caso disso, qualquer tribunal de um Estado-Membro competente quanto ao mérito ao abrigo do presente regulamento, quer diretamente, em conformidade com o artigo 86.o, quer por intermédio das autoridades centrais designadas nos termos do artigo 76.o. 3. — As medidas tomadas por força do n.o 1 deixam de ter efeito logo que o tribunal do Estado-Membro competente quanto ao mérito ao abrigo do presente regulamento tiver tomado as medidas que considerar adequadas. 4. — Se for caso disso, esse tribunal pode informar da sua decisão o tribunal que tiver tomado medidas provisórias ou cautelares, quer diretamente, em conformidade com o artigo 86.o, quer por intermédio das autoridades centrais designadas nos termos do artigo 76.o”. 16. Aprovada pelo Decreto do Governo n.º 33/83, de 11 de Maio. 17. Como se diz, p. ex., no acórdão do STJ de 18 de Dezembro de 2002 — processo n.º 03B2507 —, “[é] objectivo da Convenção sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, concluída em 25/10/80 pela Conferência da Haia de Direito Internacional Privado e aprovada pelo Estado Português pelo Decreto do Governo nº. 33/83, de 11/5, contrariar o uso de meios de auto-tutela em matéria de exercício do poder paternal”. 18. Cf. acórdão do STJ de 8 de Abril de 2021 — processo n.º 5403/20.1T8LSB-A.L1.S1. 19. Cf. factos dados como provados sob os n.ºs 3 e 9. 20. Cf. Nuno Gonçalo de Ascensão Silva, “A Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças”, in: Estudos em memória do Professor Doutor António Marques dos Santos, vol. I, Livraria Almedina, Coimbra, 2005, págs. 443-556 (535). 21. Em conexão com o art. 13.º, segundo parágrafo, da Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980, o menor, agora Recorrente, invoca a violação do art. 21.º do Regulamento (UE) 2019/1111, de 25 de Junho de 2019, em que se diz. “1. — No exercício da sua competência ao abrigo da secção 2 do presente capítulo, os tribunais dos Estados-Membros devem, em conformidade com o direito e os procedimentos nacionais, dar a uma criança que seja capaz de formar as suas próprias opiniões a oportunidade real e efetiva de as expressar, diretamente ou através de um representante ou de um organismo adequado. 2. — Se o tribunal, em conformidade com o direito e os procedimentos nacionais, der à criança a oportunidade de expressar as suas opiniões nos termos do presente artigo, deve ter devidamente em conta as opiniões da criança, em função da sua idade e maturidade”. 22. Cf. Nuno Gonçalo de Ascensão Silva, “A Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças”, cit., pág. 535. 23. Cf. designadamente os acórdãos do STJ de acórdão do STJ de 5 de Novembro de 2009 — processo n.º 1735/06.OTMPRT.S1 — e de 4 de Maio de 2021 — processo n.º 7603/20.5T8PRT-C.P1.S1 —, em que se diz que, “[n]os termos do artigo 13.º da Convenção sobre Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças (Convenção de Haia, de 25-10-1980), que determina que a autoridade judicial ou administrativa pode também recusar-se a ordenar o regresso da criança se verificar que esta se opõe a ele e que a criança atingiu já uma idade e um grau de maturidade tais que levem a tomar em consideração as suas opiniões sobre o assunto, tendo o tribunal recorrido decidido pelo não regresso com base em juízos de conveniência e oportunidade, não se coloca uma questão de legalidade estrita que possa ser conhecida pelo STJ, por força do artigo 988.º, n.º 2 do Código de Processo Civil2. 24. Cf. Nuno Gonçalo de Ascensão Silva, “A Convenção da Haia de 25 de Outubro de 1980 sobre os aspectos civis do rapto internacional de crianças”, cit., págs. 522-533. 25. O acórdão recorrido diz, explicitamente, que, “tendo-lhe sido aplicada pelo Tribunal de Roterdão, a medida de acolhimento em instituição adequada às suas caraterísticas e necessidades, tendo-lhe sido nomeado, não só advogado, como dois tutores, para em articulação com os técnicos do Gabinete Intervenção Juvenil dos Países Baixos, acompanharem a sua situação, não existe qualquer justificação ou motivo que coloque em causa a sua saúde ou segurança, suscetível de inviabilizar o retorno ao país de origem, para aí ser executada a medida aplicada”. 26. Sobre o tema, vide, com algum desenvolvimento, Maria dos Prazeres Pizarro Beleza, “Jurisprudência sobre rapto internacional de crianças”, cit., págs. 76-77. |