Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | LUCAS COELHO | ||
Descritores: | PROCEDIMENTOS CAUTELARES RECURSO PARA O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA | ||
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Nº do Documento: | SJ200402190021162 | ||
Data do Acordão: | 02/19/2004 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | AGRAVO. | ||
Decisão: | DECIDIDO NÃO TOMAR CONHECIMENTO. | ||
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Sumário : | I - Segundo o artigo 387.º-A do Código de Processo Civil, introduzido pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 375.º-A/99, de 20 de Setembro, das decisões proferidas em procedimentos cautelares instaurados após a sua entrada em vigor, não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos, previstos nuclearmente nos n.os 2, 4 e 6 do artigo 678.º, em que o recurso é sempre admissível; II - A admissibilidade dos agravos para o Supremo nos procedimentos cautelares não se rege pelo regime geral dos agravos plasmado no artigo 754.º, mas pela norma especial do artigo 387.º-A; III - Fora das hipóteses configuradas nos n.os 2, 4, e 6 do artigo 678.º, é inadmissível agravo de acórdão da Relação que confirma despacho do relator julgando deserto por falta de alegação o agravo interposto na 1.ª instância de despacho proferido em procedimento cautelar. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. "A", instaurou no tribunal de Mondim de Basto, contra B e esposa C, em 2 de Novembro de 1999, procedimento cautelar de ratificação judicial de embargo de obra nova.O embargo veio a ser ratificado por acórdão da Relação do Porto, de 15 de Novembro de 2001 (fls. 226 e segs.), proferido em agravo do despacho da 1.ª instância que indeferira a providência. Mediante requerimento, de 27 de Dezembro de 2001 (fls. 247 e segs.), nos termos do artigo 420.º do Código de Processo Civil, alegando que os requeridos não haviam respeitado o embargo, continuando a obra, peticionou a requerente a destruição da parte inovada. O pedido foi despachado em 30 de Janeiro de 2002, determinando a realização de perícia para averiguar a existência da inovação (fls. 257), e os requeridos agravaram da decisão para a Relação do Porto, que, todavia, a confirmou inteiramente, negando provimento ao recurso - acórdão de 25 de Junho de 2002, a fls. 304 e seguintes. 2. Ao abrigo do artigo 754.º, n.º 2, do referido Código, os requeridos interpuseram de novo agravo para este Supremo Tribunal de Justiça (fls. 309 e segs.), sustentando existir oposição entre o acórdão recorrido e o acórdão da Relação de Coimbra, de 26 de Fevereiro de 1985 (1). Do mesmo passo, pediram no requerimento de interposição do recurso a atribuição do efeito suspensivo, à sombra do artigo 740.º, n.º 2, alínea d), procurando fundamentar a existência de prejuízo irreparável ou de difícil reparação resultante da execução imediata da decisão. Não obstante requerimento da requerente pronunciando-se sobre a inadmissibilidade do recurso, por inexistir a oposição de acórdãos prevista no n.º 4 do artigo 678.º (fls. 314), o agravo foi recebido, no efeito suspensivo (fls.317), vindo, porém, a ser julgado deserto por falta de alegação (fls. 317, verso). Reclamaram os recorrentes para a conferência (fls. 318), exprimindo o ponto de vista de que o requerimento de interposição do recurso já constituía a própria alegação de recurso, mas a tese foi rejeitada, indeferido-se a reclamação (fls. 329/330). Do acórdão adrede proferido, em 14 de Janeiro de 2003, agravam ainda os requeridos para este Supremo Tribunal, (fls. 333), tendo o recurso outrossim sido recebido, e, mais uma vez, no impetrado efeito suspensivo (fls. 344). 3. O despacho de admissão do recurso não vincula, porém, o tribunal ad quem (artigo 687.º, n.º 4) e, na perspectiva da inadmissibilidade do agravo, foram ouvidas as partes por 10 dias em conformidade com o disposto no artigo 704.º, n.º 1. Apenas os recorrentes se pronunciaram mediante requerimento de 15 de Outubro de 2003 (fls.363), sustentando a admissibilidade nos termos seguintes. O presente recurso «deve considerar-se incidental relativamente à questão principal», da «existência - ou não - de oposição de julgados» e de «qual das jurisprudências» deve prevalecer. «O recurso de agravo por oposição de julgados é admissível, nos termos da segunda parte do artigo 754.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.» É certo que neste momento não se discute o tema desse recurso, «mas o incidente processual de dirimir se o mesmo se encontra ou não deserto». Contudo, o não conhecimento no presente recurso, «por inadmissibilidade, da questão da deserção equivale, na verdade, à negação do conhecimento do recurso principal». Deve, pois, «o presente recurso considerar-se enquadrado na previsão da 2.ª parte do artigo 754.º, n.º 2», e assim ser admitido e apreciado «sob pena de denegação de direito que os recorrentes consideram ter exercido legal e tempestivamente». II Tudo visto, cumpre decidir.1. Segundo o artigo 387.º-A, introduzido no Código de Processo Civil pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 375-A/99, de 20 de Setembro (2), «das decisões proferidas nos procedimentos cautelares não cabe recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, sem prejuízo dos casos em que o recurso é sempre admissível». Consoante flui da nota preambular desse Decreto-Lei, visou esta solução, em conjugação com outras também inovadas em matéria de recursos, para além do escopo geral de orientação do diploma «no sentido da simplificação da lei processual», a preservação da preeminente natureza institucional do Supremo Tribunal de Justiça como tribunal de revista. Por isso se lê no breve exórdio, em motivação das alterações na matéria dos recursos, a intencional declaração que segue: «Importa, com efeito, restituir ao Supremo Tribunal de Justiça a sua fisionomia de tribunal vocacionado para a interpretação e aplicação da lei substantiva, salvaguardando, no entanto, e ao menos por ora, a sua intervenção quando a decisão sobre lei adjectiva puser termo ao processo.» E adiante, em remate: «Constrangendo a inadmissibilidade de recurso para o Supremo as cláusulas de salvaguarda contidas nos ns.º 2, 3, 4 e 6 do artigo 678.º do Código de Processo Civil, que enunciam os casos em que o recurso é sempre admissível.» Pois bem. Este derradeiro excerto preambular do Decreto-Lei n.º 375-A/99 aufere concretização na segunda parte do artigo 387.º-A, que ressalvando da regra da irrecorribilidade «os casos em que o recurso é sempre admissível», assim remete nuclearmente para os ns.º 2, 4 e 6 do artigo 678.º, quando se trate em especial de recursos para o Supremo nos procedimentos cautelares. Excluída, porém, manifestamente, qualquer das hipóteses configuradas nos n.os 2 e 6, então a admissibilidade do agravo sub iudicio dependeria em derradeiro termo de oposição de acórdãos sobre a mesma questão fundamental de direito, na hipótese delineada no n.º 4 - decerto na redacção anterior à actual, permita-se o aparte, dada pelo artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 38/2003, de 8 de Março, com início de vigência no dia 15 de Setembro de 2003 (artigo 23.º), a qual apenas se aplica aos processos instaurados a partir desta data (artigo 21.º). Verifica-se, todavia, que os recorrentes não alegaram a existência de uma semelhante oposição, como, aliás, impõe o n.º 1 do artigo 687.º, e sob pena de rejeição do recurso (3). O agravo é, pois, inadmissível nos termos do artigo 387.º-A, do Código de Processo Civil. 2. E não pode também concluir-se, se bem se pensa, pela admissibilidade do agravo com base no artigo 754.º - na redacção actual, obviamente, emergente do artigo 1.º do Decreto-Lei n.º 375-A/99, posto que o presente procedimento cautelar ainda não se encontrava pendente na data da sua entrada em vigor, como há pouco se viu. Por duas razões. Primeiro, porque, mesmo na óptica do artigo 754.º, o acórdão recorrido é mera decisão interlocutória - posto que o processo vai continuar, a despeito da deserção, com a perícia tendente à averiguação da obra inovada - e não foi, ademais, invocada oposição de acórdãos que permitisse considerá-lo enquadrado na previsão da segunda parte do seu n.º 2 Em segundo lugar, decisivamente, porque a admissibilidade dos agravos para o Supremo Tribunal de Justiça nos procedimentos cautelares não se rege pelo regime geral dos agravos plasmado no artigo 754.º, mas pela norma especial do artigo 387.º-A. 3. E não objectem os recorrentes que o presente agravo é um incidente do agravo julgado deserto, de forma que o não conhecimento do recurso incidental, por inadmissibilidade, prejudica necessariamente o conhecimento do denominado «recurso principal», a despeito da sua admissibilidade, em denegação de direitos dos recorrentes. Por nossa parte não somos efectivamente sensíveis a esta argumentação. Desde logo, é preciso não olvidar que o recurso dito «principal» só seria admissível, atento o disposto no artigo 387.º-A, caso se verificasse a contradição de acórdãos a que alude o n.º 4 do artigo 678.º, que os recorrentes afirmam, mas a recorrida contesta. Trata-se, aliás, de construção artificiosa, salvo o devido respeito, destituída de fundamento legal. Sem embargo da unidade do processo no iter dinâmico em que se traduz o seu curso, desde o acto genético da relação processual até à extinção desta mercê de uma decisão com trânsito em julgado - quiçá em última instância -, não obstante essa linearidade, assumem os recursos, pela sua teleológica vocação de reexame das decisões, uma autonomia própria, implicando mutações qualitativas da instância e a sujeição da lide a um órgão jurisdicional diferente, dotado justamente de poderes hierárquico-funcionais de reapreciação. Queiram os recorrentes assim reconhecer que na sua tese, todavia, qualquer recurso poderia merecer a qualificação de incidente, em menoscabo daquela autonomia, visto encontrar-se sempre em conexão mais ou menos estreita com determinada decisão ou com outro recurso. E, contudo, uma semelhante conexão de modo algum constitui critério legal de admissibilidade de recursos. Não se compreendendo, ultima ratio, como poderia a suposta natureza incidental do actual agravo introduzir derrogação à regra do artigo 387-A. III Pelas razões expostas, sendo o presente agravo, salvo o devido respeito, inadmissível, decide-se, ao abrigo dos artigos 700.º, n.º 1, alínea e), 701.º, n.º 1, e 704.º, n.º 1, não conhecer do seu objecto, julgando-se findo o recurso.Custas pelos requeridos recorrentes (artigo 446.º do Código de Processo Civil). Lisboa, 19 de Fevereiro de 2004 Lucas Coelho ------------------------------ (1) «Colectânea de Jurisprudência», ano X (1985), tomo I, págs. 81 e seguintes. (2) Em vigor «30 dias após a data da sua publicação» (artigo 9.º), - ou seja, a 21 de Outubro de 1999 -, estipulando do mesmo passo o artigo 8.º, n.º 2, a sua inaplicabilidade aos «processos pendentes», o que não é, de resto, a situação do presente procedimento, instaurado como se disse em 2 de Novembro de 1999. (3) Neste sentido, Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3.ª edição revista, actualizada e ampliada, Almedina, Coimbra, Março de 2002, págs. 105 e 142/143. |