Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | BORGES DE PINHO | ||
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Nº do Documento: | SJ200212110031993 | ||
Data do Acordão: | 12/11/2002 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REC PENAL. | ||
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Sumário : | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça: 1. "A", devidamente identificado nos autos, condenado na pena de 3 anos e 4 meses de prisão pela prática de um crime de furto qualificado p. p. pelo art. 204, nº 2, e) do C.P. (Ac. de fls. 9 a 17), e em cúmulo jurídico na pena única de 3 anos e 10 meses de prisão e 210 dias de multa à taxa diária de 4 Euros (vide fls. 2), veio interpor recurso extraordinário de revisão de sentença nos termos dos arts. 449, nº 1, d) e 450, nº 1, c) do CPP, tendo apresentado as motivações que se estendem de fls. 2 a 7, tendo concluído: 1- O arguido não praticou os factos de que foi acusado e condenado, não se conformando com a decisão da sua condenação. 2- A testemunha que em Audiência de Julgamento reconheceu o arguido, fez, naturalmente confusão. 3- O arguido aqui recorrente, ainda em liberdade tomou conhecimento de factos que permitiam concluir que o Sr. B e o Sr. C foram os autores de um furto de uma residência junto aos liceus, em Aveiro, donde furtaram muitos objectos em ouro. Porém, o arguido não tinha elementos concretos que pudesse apresentar ao Tribunal. 4- Só depois de confrontado com os factos do presente processo é que o arguido agora recorrente associou a conversa que os dois indivíduos identificados em 3 das presentes conclusões tiveram consigo, altura em que lhe admitiram os factos. 5- Já a cumprir pena à ordem do presente processo, tomou conhecimento que uma outra pessoa - o Sr. D tinha assistido à confissão dos Sr. C e B relativamente aos factos pelos quais o agora arguido foi condenado. 6- A testemunha indicada no presente recurso pelo arguido e recorda-se da fisionomia das pessoas indicadas - o Sr. B e o Sr. C está em condições para os reconhecer no Tribunal. 7- Uma das pessoas que efectivamente praticou os factos pelo quais o arguido foi condenado - o Sr. B - apresenta muitas semelhanças físicas com o arguido aqui recorrente o que poderá ser comprovado pelo Sr. D em reconhecimento a realizar. 8 - O arguido está convencido que, se confrontados com os factos o Sr. B e o Sr. C, admitem a prática dos mesmos. 9 - O arguido recorrente tomou conhecimento de novos elementos de prova posteriormente à sua condenação. 10 - Está inocente pelo que deve ser absolvido. TERMOS EM QUE SE REQUER A V.EXA seja autorizada a revisão do acórdão no sentido de absolver o arguido. 2. Juntou o recorrente certidão do Acórdão cuja decisão se põe em crise, e ainda três documentos, tendo-se procedido às diligências da instrução consignada no art. 453 do CPP. No seu desenvolvimento, e como se alcança dos autos, procedeu-se não só à audição do recorrente mas ainda à inquirição de B e de seu irmão C (fls. 36 e 37), e ainda da testemunha D (fls. 38), havendo-se igualmente processado um auto de reconhecimento, aí tendo intervindo a testemunha E para tal fim (fls. 39). 3. No termo da instrução levada a efeito, o MP, como se alcança de fls. 42, limitou-se a apor um visto, tendo o Mmº Juiz prestado a informação a que se reporta o art. 454 do CPP (fls. 42 e 43), concluindo ser do parecer "que o pedido do arguido deverá ser negado", e ordenando que os autos subissem a este STJ. 4. Neste Supremo Tribunal, a Exmª Procuradora Geral Adjunta, tendo tido vista dos autos nos termos do disposto no art. 455, nº 1, do CPP, posicionou-se no sentido da negação da revisão, tendo tecido os considerandos que se estendem de fls. 55 a 57, concluindo: "Assim e por não terem sido descobertos novos factos ou meios de prova que, combinados com os que foram apreciados em sentença, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação do arguido A somos de parecer que deverá ser negada a revisão da sentença condenatória". Foram colhidos os vistos legais, pelo que cumpre agora apreciar e decidir. Apreciando. 5. De harmonia com os elementos trazidos aos autos, a prova recolhida nada de útil e de credível trouxe à prova produzida, em nada alterando ou prejudicando os fundamentos da condenação, não os infirmando nem os pondo em crise, por fazerem suscitar graves dúvidas sobre a sua justiça. Aliás importará reter-se que da inquirição da testemunha D apenas resulta que num fim de semana do Verão de 1998 teria ele acompanhado o arguido a uma pastelaria, tendo ambos se sentado numa mesa próxima da que era ocupada por C (id. a fls 36), com o qual o arguido teria tido uma conversa, ao que se deduz de mesa para mesa, tendo ouvido "o C que tinha feito um assalto e roubado ouro numa casa sita no bairro do Liceu e sido surpreendido nas escadas, pelo dono". Uma conversa, refira-se, que o recorrente agora também refere, falando ainda numas motas que teriam sido adquiridas por parte do C e seu irmão B, explicando (?!) não ter relatado tais factos no inquérito nem na instrução porque "não se lembrou de referir isso e que apenas mais tarde, quando reparou que o B e o C estavam presos é que se lembrou da conversa tida na pastelaria" (?!). Conversa e prática do aludido furto que os dois referidos indivíduos B e C, ouvidos a fls. 36 e 37, negam, como aliás negam a compra das motas nos termos referenciados pelo recorrente, e também referida pela testemunha D como ouvida em tal conversa, importando reter-se que os mencionados irmãos B e C teriam conhecido o recorrente em 1996, quando todos se encontraram no E.P. de Aveiro. Ora, como resulta dos autos, o facto que se aponta como novo resume-se a uma conversa tida em 1998, que a testemunha D refere ter ouvido entre o C e o recorrente, numa pastelaria, num fim de semana de Verão, mas uma conversa "esquecida" pelo próprio recorrente aquando do desenvolvimento investigatório e tramitual do seu processo, não obstante se afirmar inocente, mas uma conversa que teria resultado da abordagem feita pelo próprio recorrente indagando (?!) do C se tinha um cordão de ouro para vender. C que não era conhecido do D, como diz o recorrente, muito embora o D refira que "já tinha visto o C por algumas 10 vezes embora não tivesse confiança com o mesmo" e não ter a certeza se lá na altura "estaria o seu irmão B, mas é provável que tal tivesse acontecido". Uma conversa perdida na lonjura do tempo, agora oportunamente evocada e testemunhada, mas que não passa disso mesmo, isto é, de uma conversa não admitida pelos irmãos B e C, e de todo em todo envolta num circunstancialismo um tanto ou quanto surrealista. Como refere o MP, "qualquer dos irmãos (...) nega qualquer confissão ou comentário sobre assaltos e o D é que só agora se lembra de uma conversa numa pastelaria há pelo menos 4 anos em que um dos irmãos teria dito que "tinha feito um assalto e roubado ouro numa casa ... no bairro do Liceu..."". Mas uma "conversa" que curiosamente nem sequer directamente é entre a testemunha D e qualquer dos irmãos, mas que oportunamente é recordada numa das frequentes visitas da testemunha ao recorrente no E.P., sendo que curiosamente também surge só depois de conversas no E.P. entre o recorrente e outros reclusos sobre os dois irmãos, e após ter tido conhecimento de que ambos se encontravam presos à ordem de outros processos. Conversa de presos, mais uma história gerada e alimentada nas cadeias, enquadrada nas usuais estórias de todo um espaço prisional, porque peculiar, onde tudo se fala, se diz e se comenta no habitual "jogo" de encontros, passagens, conhecimentos, visitas e contactos entre reclusos, aqui e ali a desenvolverem-se em conversas de meias palavras, com falhas e lacunas de conhecimento, além a emergirem do desenrolar sugestivo de uma e outra "fala" encomendada, na corrente de uma amizade, de um favor que se intenta pagar ou mesmo de uma vingança que se vem alimentando. Mas factos e histórias que por norma não se apresentam com consistência e relevância bastantes para infirmarem, minando, toda uma convicção, e assim abalar o juízo efectuado no julgamento. Até porque da nova prova de reconhecimento a que se procedeu, com obediência às regras prevenidas no art. 147 do CPP, encontrando-se presentes o arguido, os dois irmãos, a testemunha D e ainda o funcionário F, todos vestidos de maneira normal, aparentando idade inferior a 30 anos e todos de estatura média, resultou ter a testemunha E voltado a reconhecer, e sem qualquer dúvida, o arguido recorrente como a pessoa que encontrara no interior da casa de família e que até lhe dirigira a palavra. Sem qualquer dúvida, anote-se, como aliás flui de fls. 39 a 41 dos autos, sendo que, além do arguido e da 1ª pessoa da esquerda (o F), nunca a testemunha vira anteriormente qualquer dos três restantes indivíduos, entre os quais, consequentemente, se encontravam os dois irmãos B e C, actualmente também detidos no E.P. de Coimbra e no E.P. de Santa Cruz do Bispo, respectivamente. Um reconhecimento, aliás confirmativo do ocorrido a 18.9.2001 (fls. 47 a 49), que natural e consequentemente não deixou de infirmar, e de todo em todo anular, qualquer eventual sinalética que pudesse emergir da conversa testemunhada, pondo em crise a justiça da condenação. O testemunho recolhido, na verdade, apresenta-se de todo em todo inócuo, irrelevante e nada significativo para o caso em análise, sendo que de modo nenhum infirmou ou pôs em crise a própria condenação, e a justiça da mesma, que de modo nenhum foram abaladas. Pelo que, decidindo. 6. Acordam em conferência os Juízes da Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça, face ao exposto, em negar a revisão, por não ocorrer o circunstancialismo prevenido no art. 449, nº 1, al. d) do CPP, dado que na verdade não se descobriram quaisquer "novos factos ou meios de prova que, de per si ou combinados com os que foram apreciados no processo, suscitem graves dúvidas sobre a justiça da condenação". Custas: Pagará 4 UCs de taxa de justiça. Lisboa, 11 de Dezembro de 2002 Borges de Pinho Franco de Sá Armando Leandro |