Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | ARMINDO MONTEIRO | ||
Descritores: | TRÁFICO DE ESTUPEFACIENTES CORREIO DE DROGA MEDIDA CONCRETA DA PENA CONFISSÃO ARREPENDIMENTO PREVENÇÃO GERAL PREVENÇÃO ESPECIAL CULPA ILICITUDE | ||
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Data do Acordão: | 02/06/2013 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | NEGADO O RECURSO | ||
Área Temática: | DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO/ ESCOLHA E MEDIDA DA PENA. | ||
Doutrina: | - Figueiredo Dias, Direito Penal Português –As Consequências Jurídicas do Crime, pp. 193,195, 196, 244 . - Paulo Pinto de Albuquerque, in Comentário do Código do Processo Penal, p. 1184. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGO 71.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -PROC. N.º 806/08; -DE 15.10.2009, PROC. N.º 24/09.2JELSB.S1 DA 5.ª SECÇÃO; -DE 10.02.2010, PROC. N.º 67/09.6JELSB.L1.S1 DA 3.ª SECÇÃO; -DE 25.02.2010, PROC. N.º 137/09.0JELSB DA 5.ª SECÇÃO; -DE 25.03.2010, PROC. N.º 312/09.8JELSB DA 3.ª SECÇÃO; -DE 15.04.2010, PROC. N.º 7/09.2ABPRT.S1 DA 3.ª SECÇÃO; -DE 16.5.2012, PROC. N.º 77/11 .3JELSB; -DE 13.1.2011, RECURSO N.º 369/09 1. JELSB L1. S1; -DE 19.02.2011, PROC. N.º 1049/96, 3ª SECÇÃO. | ||
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Sumário : | I - A medida concreta da pena é uma operação complexa porque se trata de converter em magnitudes penais factos, em traduzir os critérios legais de fixação da pena numa certa quantidade dela. II - A arguida é um «correio de droga», cidadã holandesa, que, do Brasil, transportava no interior de uma mala, dissimulada no interior de um casaco, 4,037950 kg de cocaína, apreendida no Aeroporto de Lisboa, em trânsito, para Bruxelas, a troco de uma remuneração de € 12 000, tendo-lhe sido entregue previamente a quantia de € 800 e 200 USD. III - Os «correios de droga» são uma peça fundamental no tráfico de estupefacientes concorrendo, de modo directo, para a sua disseminação, não merecendo um tratamento penal de favor. De facto, torna-se mais difícil a sua detenção e apreensão, não se deixando contra motivar pelas consequência perniciosas do seu acto, demonstrando arrojo, audácia e dolo intenso, insensibilidade e ganância, porquanto, a troco de uma compensação, se dispõem a fazer o transporte da droga até ao local da sua entrega, apesar de saberem da ilegalidade desse transporte. IV - A confissão é de valor reduzido, pois à arguida, detida em flagrante delito no controle policial alfandegário do Aeroporto de Lisboa, poucas alternativas de defesa lhe restavam. A declaração de arrependimento não se confunde com o verdadeiro arrependimento, que é a constatação pelo tribunal de que o arguido interiorizou os maus efeitos do crime, que se inadequa à sua personalidade, convencendo da acidentalidade do acto. V - A ilicitude da acção criminosa, ou seja o grau de contrariedade à lei, não pode deixar de reputar-se elevado, a atentar-se no modo de execução do transporte, por dissimulação do produto num casaco, na sua grande nocividade e elevada quantidade, nos sentimentos revelados pelo agente que, sabedor do mal que causa, não hesita em arriscar o transporte. VI - Deste modo, a pena aplicada de 5 anos e 8 meses de prisão – numa moldura de 4 anos a 12 anos de prisão – contém-se dentro de limites aceitáveis, obedecendo ao critério legal de formação, previsto no art. 71.º do CP, assente no binómio culpa e prevenção. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam em conferência na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça : O arguido , inconformado com o decidido , interpõs recurso , apresentando na motivação as seguintes CONCLUSÕES :
1. O presente recurso apenas incide sobre a MEDIDA DA PENA. 2. Não obstante considerarmos que se trata dum bom acórdão, não é menos verdade que o mesmo contém um pequeno lapso, que se prende com duas (2) omissões no Acordão recorrido, que têm a ver com o facto da arguida ter confessado os factos – TODOS E SEM EXCEPÇÃO, desde SEMPRE, concretamente, no primeiro interrogatório judicial, em interrogatório complementar, sendo que em audiência de julgamento o voltou a fazer. 3. A arguida falou VERDADE desde o primeiro dia em que foi detida, manteve essa VERDADE ao longo do inquérito e culminou as suas declarações, COM VERDADE, na audiência de julgamento, assumindo uma postura coerente e colaboradora com os OPC, e com o Tribunal a quo. 4. Na motivação de facto, não consta que a arguida demonstrou na audiência de julgamento, um manifesto ARREPENDIMENTO, pedindo desculpas pelo que fez, sendo certo que o mesmo está consagrado na parte do Acórdão correspondente à determinação da medida da pena. 5. Na motivação de facto e na determinação da medida da pena, o Tribunal “ a quo “, considerou que a arguida não tem antecedentes criminais , que confessou de modo livre, integral , e sem reservas, que a confissão foi credível e ainda, no tocante à sua situação pessoal, personalidade e modo de vida, que NADA EXISTE QUE POSSA PRESUMIR EM DESFAVOR DA MESMA. 6. O Douto Acórdão diz ainda que a ilicitude do facto concreto não se apresenta acentuado – fls 10 in fine, e que as necessidades de prevenção especial não se afiguram preocupantes. Fls 11, 3º parágrafo.
7. Dizendo-se, como consta do Acórdão recorrido, que neste processo haverá que ter em conta a confissão integral, livre e sem reservas por parte da arguida, as suas condições económicas à data da prática dos factos – a complementar com o ponto 16 da motivação de facto, vivendo uma situação financeiramente deficitária, com várias dívidas, com uma ilicitude do facto não acentuada, com necessidades de prevenção especial não preocupantes e ainda com um manifesto arrependimento demonstrado, não se consegue entender que lhe sejam aplicados cinco (5) anos e oito (8) meses de prisão, o que no modesto entender da defesa, é, manifestamente, um exagero. 8. Não se fundamenta no Acórdão recorrido, o porquê dessa medida da pena, sendo certo que da matéria de facto provada e dos outros elementos de direito já mencionados, impunha-se, a nosso ver, uma pena mais baixa, sempre abaixo dos cinco anos de prisão. 9. Em termos de Justiça relativa, basta atentar nas centenas de Acordãos proferidos anualmente pelas Varas Criminais de Lisboa, bem como pelos nossos Tribunais Superiores, em situação praticamente igual, e, sem qualquer esforço, constatamos que a medida da pena média aplicada nesses casos, é bem inferior a cinco (5) anos de prisão. 10. Isso é bem patente, nos exemplos de acórdãos citados e/ou juntos a esta motivação. 11. A pena em causa – cinco anos e oito meses de prisão, é por regra aplicada a situações de tráfico de rua, com práticas reiteradas, com lucros já significativos, a elementos que normalmente nada fazem para além desse ilícito, e que não raras as vezes são reincidentes, como resulta, por exemplo., do procº nº 119/09.2 PJAMD, em que o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, entendeu por bem aplicar a um arguido a pena de 5 anos e seis meses de prisão, numa situação em que ficou provado que o mesmo procedia a actos de venda de estupefacientes durante mais de seis meses, com lucros significativos. 12. O artº 71º nº 2 do Código Penal, consagra que na determinação da medida da pena, devem ser consideradas todas as circunstâncias atenuantes/agravantes, consagrando um elenco de situações possíveis de serem aplicadas. 13. Ainda que o Tribunal “ a quo “ o tenha feito, não o terá feito, pelo menos no nosso entender, com a extensão que a matéria de facto o permitia, ficando portanto a medida da pena, aquém daquilo que realmente deveria ter-se verificado. 14. O Tribunal “ a quo “ ao não actuar dessa forma, violou o disposto no artº 71º nº 2 do CP, bem como os artºs 127º e 355º do CPP.
NESTES TERMOS, deve ser dado provimento ao presente recurso, condenando-se a recorrente numa pena de prisão efectiva que se situe entre os quatro e os quatro anos e seis meses de prisão, medida de pena essa que realmente de coaduna com a prova produzida em sede de audiência de julgamento, efectiva, uma vez que in casu, não se justifica a aplicação do instituto da suspensão da pena, por inexistência dos respetivos fundamentos.
Factualismo provado , com relevo para a determinação do crime praticado---
1. - No dia 22 de Abril de 2012, pelas 14h40, a arguida chegou ao aeroporto de Lisboa procedente de Porto Alegre, em trânsito para Bruxelas, no voo ..., transportando consigo uma mala que ostentava a etiqueta .... 2. - O conteúdo da aludida mala suscitou dúvidas ao funcionário alfandegário que a sujeitou a exames radiológicos motivo pelo qual a arguida foi seleccionada para revisão de bagagem. 3. - No decurso da qual foi encontrado na posse da arguida dissimulada no interior de, um casaco, três pastas de documentos, uma mochila e de uma mala de senhora, que transportava na mala referida no ponto 1., um produto suspeito de ser cocaína com o peso bruto de 4606,100 gramas.--- 4. - Mais lhe foram apreendidos: - Um telemóvel marca Nokia, com o IMEI nº... e cartão SIM da operadora holandesa TeleSur, cujo PIN é ...; - Um Blackberry, de cor branca, com o IMEI ... e cartão SIM da operadora Vodafone, cujo PIN é 0000, incluindo um cartão Micro SD da marca San Disk; - Uma máquina fotográfica da marca Samsung, modelo E570, de cor cinza; - Um computador marca Asus, modelo X77v, com o nº de série 9ANoAS644355439; - 107 Reais brasileiros, em notas ; - Vinte e dois pesos argentinos, - Um cartão SIM da operadora holandesa Simyo com o número 45783813EORP; - Um cartão de embarque para o voo SN3816 com partida de Lisboa e destino a Bruxelas a 22.4.2012, - Um canhoto de um bilhete de passagem aérea para o percurso Porto Alegre – Lisboa, no voo TP48, - Um bilhete electrónico para vários percursos efectuados em várias datas; - Uma etiqueta de bagagem para Bruxelas, no voo SN 3816, com escala em Lisboa, no voo TP 48; - Uma etiqueta de bagagem para o percurso Lisboa Buenos Aires, com escala no Rio de Janeiro, na data de 12/04/2012; - Um canhoto de um bilhete de passagem aérea do voo AR 1257, percurso Rio de Janeiro – Buenos Aires, na data de 12/04/2012; - Um canhoto de um bilhete de passagem aérea no voo ... para o percurso Lisboa – Rio de Janeiro, na data de 12/04/2012; - Um canhoto de um bilhete de passagem aérea no voo ..., percurso Bruxelas – Lisboa, na data de 12/04/2012; - Um comprovativo de estadia no Hotel ..., situado em Buenos Aires, datado de 20104/2012, - Um recibo de câmbio de valores monetários datado de 17/04/2012; - Um cartão de entrada / saída em território brasileiro, emitido pelo Departamento de Policia Federal; - Uma declaração de entrada de bagagem em território brasileiro, emitida pela secretaria da receita federal do Brasil, - Uma declaração da Alfândega em língua espanhola, todos em nome da arguida; - Um comprovativo de compra de um cartão SIM da operadora Movistar, em nome de BB, que a arguida referiu ter-lhe sido entregue em Buenos Aires; - Um cartão SIM da operadora Movistar, que corresponde ao antes referido; - Um cartão de visita do Hotel ..., sito em Buenos Aires com a inscrição de um nome, número e mail de contacto e um papel manuscrito com a indicação de um local sito em Buenos Aires.
5. - O produto referido no ponto 3., foi submetido a exame laboratorial e identificado como sendo cocaína (cloridrato) tendo a amostra cofre e o remanescente, respectivamente os pesos líquidos de 587,860 e de 3450,090 gramas enquanto que a tara pesava 566,890 gramas.
6. - A arguida conhecia perfeitamente a natureza e características estupefacientes do produto que lhe foi apreendido.
7. - Produto que aceitara transportar por, para tanto, lhe ter sido prometida a quantia de 12000 euros, tendo-lhe ainda sido entregue previamente a quantia de 800 euros e 200 dólares.
8. - A importância em dinheiro apreendida era parte do lucro que a arguida iria obter com o transporte de tal produto.
9. - Os telemóveis apreendidos destinavam-se a permitir-lhe contactar e ser contactada pelo ulterior destinatário do estupefaciente.
10. - A arguida, é natural da Holanda e não possui residência, emprego estável ou qualquer outra ligação pessoal ou familiar no nosso país.
11. - A arguida agiu livre e voluntariamente.
12. - Bem sabendo que tal conduta lhe estava legalmente vedada.
b) Com relevo para a determinação da medida da pena---
13. - A arguida confessou integralmente e sem reservas os factos de que vinha acusada, mostrando-se arrependida.---
14. - A arguida encontra-se actualmente detida em prisão preventiva, desde 22 de Abril de 2012, à ordem destes autos, no Estabelecimento Prisional de Tires.---
15. – A arguida é cidadã holandesa, tendo sempre vivido no seu país, apesar de nos últimos anos equacionar emigrar para Espanha, dadas as dificuldades económicas e de emprego que vivenciava.---
16. – A arguida residia sozinha num apartamento arrendado, vivendo uma situação financeiramente deficitária, com várias dívidas.
17. – A arguida encontra-se presa há cerca de seis meses, não registando problemas de adaptação nem dificuldades em respeitar/cumprir as normas institucionais. Frequentou diversas aulas/sessões formativas, como bijutaria, guitarra e canto, sendo que de momento participa em reuniões do estudo da bíblia.---
18. – Expressa motivação para reconstruir a sua vida orientando-se sobretudo para as questões laborais, e nesse sentido, coloca a hipótese de emigrar para Espanha, onde afirma que terá melhores possibilidades de emprego/remuneração na sua profissão.
19. – A arguida necessita de aprender a recusar opções de vida desajustadas, resistindo à frustração e à pressão do exterior.---
20 - Não são conhecidos antecedentes criminais à arguida.--- A pretensão da arguida é a de ver reduzida a pena a um “ quantum “ próximo do seu limite mínimo , ou seja a 4 anos ou a 4 anos e 6 meses de prisão , a partir de um circunstancialismo atenuativo que concorre em seu favor e que o tribunal da condenação não valorou em toda a sua amplitude .
A medida concreta da pena é uma operação complexa porque se trata de converter em magnitudes penais factos , em traduzir os critérios legais de fixação da pena numa certa quantidade dela , o que pode conduzir , no dizer do Prof. Figueiredo Dias , in Direito Penal Português , As Consequências Jurídicas do Crime , pág. 195 , a distonias no seu “ quantum “ exacto , que à jurisprudência cumpre evitar , crescendo , um pouco por toda a parte , escreve aquele autor , a reivindicação da formalização , quanto não mesmo a “ matematização “ da pena , com auxílio informático , se bem que ensaios nesse sentido levados a efeito nos EUA se saldaram em insucesso . Essa formalização da pena deve , no entanto, considerar-se , segundo aquele autor, excluída , atendendo à convergência de factores pessoais , individualizando cada situação , face à sua ilimitada variedade ( cfr, , ainda , o eminente penalista , in op. cit. , pág 196 ) . A operação de fixação da pena concreta é toda ela juridicamente vinculada , sendo susceptível de revista o controle da falta de indicação de factores relevantes para a fixação da medida concreta da pena ou a sua irrelevância , mas não já, para alguns autores , o “ quantum “ em si , a não ser que viole as regras da experiência ou a quantificação se revelar de todo desproporcionada –Cfr. Prof. Figueiredo dias , in Direito Penal Português –As Consequências Jurídicas do Crime ,193 , reservando-se à pena função de um reduto irrevisível , de discricionaridade própria .enquanto que, para outros autores , entre os quais Claus Roxin e Fernanda Palma , são sindicáveis todos os critérios normativos em que assentam as premissas do silogismo judiciário , estes citados por Paulo Pinto de Albuquerque , in Comentário do Código do Processo Penal , 1184 .
O reparo que a arguida opõe vai , exactamente , no distanciamento excessivo da pena quando comparada com a aplicada em “ centenas de Acordãos proferidos anualmente pelas Varas Criminais de Lisboa, bem como pelos nossos Tribunais Superiores” , segundo palavras suas , em situação praticamente igual, sendo a pena inferior a 5 anos de prisão , aplicando-se a pena de cinco anos e oito meses de prisão, por regra a situações de tráfico de rua, com práticas reiteradas, com lucros já significativos, a elementos que normalmente nada fazem para além desse ilícito, e que não raras as vezes são reincidentes, como resulta, por exemplo., do procº nº 119/09.2 PJAMD. Vejamos :
A arguida , desde logo , não comprova essa afirmação ou seja que em situações perfeitamente iguais , de nem sempre fácil localização , atenta a especificidade de cada caso , a individualidade específica que lhes é própria , tenham sido em centenas delas aplicadas penas inferiores a 5 anos de prisão .
A arguida ´é um “ correio de droga “ , cidadã holandesa , que , do Brasil , com destino a Bruxelas transportava no interior de uma mala, dissimulada no interior de um casaco , 4, 037950 Kg de cocaína , apreendida no Aeroporto de Lisboa , em trânsito , para Bruxelas , a troco de uma remuneração de 12000 euros, tendo-lhe sido entregue previamente a quantia de 800 euros e 200 dólares. Este STJ tem sustentado, com geral uniformidade , que o “ correio “ de droga, oriundo , essencialmente , de países de continente sul americano , extensivos agora à Nigéria ; Guiné Bissau ; indonésia ; Paquistão, etc , é uma das peças fundamentais no tráfico de estupefacientes , concorrendo , de modo directo , para a sua disseminação , não merecendo um tratamento penal de favor . O “correio de droga “ não utiliza uma rota certa e frustra , ao máximo , o controle unitário das quantidades transportadas , tornando mais difícil a detecção e a apreensão , donde ser um perigo iminente , a todo o momento , no tráfico internacional , como se assinalou no AC. deste s O facto de a arguida ser um “ correio “ de droga não atenua a sua culpa , já que o transporte de droga a troco de uma remuneração pecuniária , é tão ou mesmo mais grave do que a sua venda directa-cfr., além do mais , o Ac. deste STJ , de 19/02/97 , Proc. n.º 1049/96, 3ª Sec. . O “ correio “ de droga não se deixa contramotivar pelas consequências perniciosos do seu acto , que sabe proibido , proibição essa de conhecimento universal e que já ninguém , de boa fé , ousa negar , estendendo-se os malefícios do seu acto não só à saúde do consumidor e colectiva , liberdade individual aquele daquele , afectando a coesão familiar e social pelo efeito disfuncional e criminógeno que , subsequentemente , desencadeia . Demonstra arrojo , audácia e dolo intenso , insensibilidade e ganância , logo uma personalidade defeituosa, alguém como a arguida que , a troco de uma compensação , se predispõe a fazer o transporte até ao local da entrega , sabendo da ilegalidade desse transporte e do muito mal que causaria . A cocaína enquanto estupefaciente transportado é dos mais perniciosos pelo grau de dependência a que conduz , dado o seu efeito perdurar por curtos períodos , reclamando sucessivo consumo , e as graves perturbações à saúde a que leva , isto por um lado , ;por outro lado , e discordando-se da decisão recorrida , a quantidade transportada de é de reputar elevada , a proporcionar , de resto , o seu consumo por alguns milhares de consumidores , pois o consumo individual de cocaína é estimado entre 1 e as 5 gr.diárias ( BMJ 399, pág. 229) , densificando, assim , a sua responsabilidade criminal . O acórdão recorrido valorou a confissão, dizendo e só , nada mais este STJ podendo , sobrepondo-se-lhe , como tribunal de revista , factualmente acrescer , que confessou integralmente e sem reservas , e que mostrou arrependimento , não figurando que haja pedido desculpas pelo que fez, A confissão é de valor reduzido, pois à arguida , detida em flagrante delito no controle policial alfandegário do Aeroporto de Lisboa , poucas alternativas de defesa lhe restavam , designadamente apresentando versão desculpabilizante; é a confissão do óbvio , do evidente , quantas vezes por mera “ táctica processual “ , de que fala Zipf. A declaração de arrependimento não se confunde com o verdadeiro arrependimento , que é a constatação pelo tribunal de que o arguido interiorizou os maus efeitos do crime , que se inadequa à sua personalidade , convencendo da acidentalidade do acto A ilicitude da acção criminosa , ou seja o grau de contrariedade à lei , não pode deixar de reputar-se elevado , a atentar-se no modo de execução do transporte, por dissimulação do produto num casaco , na sua grande nocividade e elevada quantidade , nos sentimentos revelados pelo agente que , sabedor do mal que causa , não hesita em arriscar o transporte . È certo que a arguida , natural da Holanda , atravessa dificuldades económicas , mas estas se auxiliam à compreensão do transporte , de forma alguma justificam o crime , dos mais graves previstos na ordem jurídico –penal portuguesa , a ter presente a sua moldura de punição de 4 a 12 anos de prisão . Provado ficou que não tem antecedentes criminais , mas isso não significa, sem mais tradução de bom comportamento anterior , que é uma postura muito mais ampla do que uma omissão fria num documento do confronto com a lei penal O seu bom comportamento prisional é o mínimo exigível a quem cumpre pena . A arguida reputa adequada a pena que lhe foi aplicada para quantidades de estupefacientes mais elevadas ou situações de reincidência , obtenção de lucros e tráfico de rua , reclamando uma pena no limite mínimo ou perto , que , como escreve o Prof. Figueiredo Dias in Direito Penal Português –As Consequências Jurídicas do Crime , pág. 244 ., deverá ter lugar nos casos em que a ressocialização do agente não seja necessária , caso em que , em termos de prevenção especial , haverà que conferir à pena , apenas , a função de advertência individual , o que permitirá que a medida da pena desça até perto do limite mínimo ou que com ele coincida Mas a arguida , que tem de fazer a aprender a recusar opções de vida desajustadas, resistindo à frustração e à pressão do exterior, escreveu-se no acórdão recorrido , carece da pena para servir de instrumento de interiorização do mal que iria fazer , chegando o estupefaciente ao seu destino último , onde dispunha de contactos com quem relacionar-se . Precisa , pois , de ser educada para o direito, à luz da prevenção especial, que é a finalidade particular da pena , do ponto de vista do arguido , em ordem a prevenir a reincidência e há risco dessa sucumbência , pois de outro modo se não adequaria a recomendação de aprendizagem a fazer , não se justificando , pois , que a pena se situasse ao nível mínimo da moldura ou perto , como ressalta do antes mencionado , igual conclusão se impondo por razões de prevenção geral , que , sob a modalidade positiva , é a última palavra sobre os fins das penas . Na forma negativa , com apoio na teoria psicológica da coacção de Feuerbach , a pena destina-se a intimidar potenciais delinquentes , pois todas as infracções tem um impulso psicológico , de nada valendo as pessoas praticarem delitos porque o gládio da lei acaba por se abater sobre elas Na forma positiva ou de integração a pena destina-se a afirmar a força e a validade da lei , estimulando as pessoas a agirem de acordo com o direito, levando-as a acreditar no sistema, sendo a intervenção punitiva a forma de assegurar a protecção das suas expectativas e a crença na validade da norma . Ora sendo o tráfico de estupefacientes uma actividade que está longe de atingir o seu termo , sequer dando mostras de abrandamento entre nós -e não só- , atenta a sua prática muito frequente , funcionando , até , o nosso país como placa giratória no tráfico com o norte europeu , gerando aquela enorme alvoroço e intranquilidade no tecido social, cujos membros lesa , em especial as suas camadas mais jovens e o seu ambiente familiar , a defesa comunitária não prescinde, antes reclama , no caso concreto , intervenção vigorosa do direito penal, que se não pode situar ao nível preconizado pela recorrente . O escasso quadro atenuativo vindo em seu favor em nada afecta a validade desta asserção , antes a reforçando . O Exm.º Magistado do M.º P.º em 1.ª instância procede a uma extensa recensão de decisões condenatórias de onde resulta, entre outros , que para quantidades inferiores à detida pela arguida -de 4, 037950 Kg- ., se cominaram penas de 5 anos - cfr., por ex.º no P.º n.º 806/08 , sendo a quantidade detida 1, 427.380 Kg, no Acórdão de 25.02.2010, proferido no Proc. n.º 137/09.0JELSB da 5.ª Secção, estando em causa o transporte de 3.116,400 gramas de cocaína ) 5 anos e 6 meses no Acórdão de 15.10.2009, proferido no Proc. n.º 24/09.2JELSB.S1 da 5.ª Secção, estando em causa o transporte de 2.507,870 gramas de cocaína, no Acórdão do STJ de 10.02.2010, proferido no Proc. n.º 67/09.6JELSB.L1.S1 da 3.ª Secção, estando em causa o transporte de 2.507,870 gramas de cocaína. No Acórdão do STJ de 25.03.2010, proferido no Proc. n.º 312/09.8JELSB da 3.ª Secção, estando em causa o transporte de 2.891,19 gramas de cocaína, foi confirmada a pena de 5 anos e 2 meses de prisão; - No Acórdão do STJ de 15.04.2010, proferido no Proc. n.º 7/09.2ABPRT.S1 da 3.ª Secção, estando em causa o transporte de cocaína com o peso de 1.690,83 gramas, foi reduzida para 5 anos a pena de 6 anos de prisão que havia sido imposta em 1ª instância; A pena de 6 anos , no P.º n.º 535/0./JELSB.S1 , foi cominada para uma quantidade inferior , de 3,352497 KG , mas no recente acórdão de 16.5.2012 , P.º n.º 77/11 .3JELSB, para 4,308681 KG. foi cominada a pena de 5 anos e 6 meses de prisão O acórdão junto , um de dois apenas , de resto ambos em evidente infracção ao momento oportuno da junção de documentos-art º 165.º n.º 1 , do CPP -extraído do P.º n.º 433/11.7JELSB, da 7.º Vara Criminal de Lisboa , respeitante a uma quantidade de estupefaciente de 4, 038556kg, em que à “ correio de droga “ foi aplicada 4 anos e 6 meses escapa à medida usual da pena aplicada , superior a 5 anos , não servindo de paradigma e o outro extraído do P.º n.º 119/09 2PJAMD, do Juízo de Grande Instância Criminal de Sintra, em que foi aplicada a pena de 6 anos de prisão contempla um quadro factual mais que não se identifica com o dos presentes autos , em que as quantidades de estupefacientes detidas –heroina e cocaína- são bastante inferiores , tendo o arguido vendido durante 6 meses heroína e cocaína , sem interrupção a terceiros . De sublinhar que os Tribunais de onde emanaram tais decisões não se posicionam num patamar hierárquico superior , desnecessário sequer sendo encarecer que o STJ lhes não deve acatamento Deste modo a pena aplicada de 5 anos e 8 meses de prisão -numa moldura de 4 a 12 -, considerando que o contexto atenuativo invocado na sentença se mostra bastante mais diluído do que aí foi considerado , tendo em apreço a necessidade premente de protecção de bens jurídicos, da maior importância , frequentemente lesados , fim primário da pena, bem como a emenda carecida em alto grau pela arguida, não põe em crise o princípio da igualdade, bastando atentar que não são diferenciais de escassos meses em molduras punitivas abstractas amplas , para situações análogas que põem em crise aquele princípio , de outro modo se coarctando , até , a liberdade de julgar e a especificidade de cada caso , cabendo naquela , por isso , uma margem mínima de liberdade de julgar, conhecendo como limite chocante excesso em relação ao que é usual cominar-se . E , como se disse , para quantidade inferior já foi cominada a pena de 6 anos de prisão , para um “ correio de droga “ , pelo que a pena aplicada se contém dentro de limites aceitáveis , obedecendo ao critério legal de formação , previsto no art.º 71.º, do CP , assente no binómio culpa , elevada , e prevenção, fortemente sentida e ainda em circunstâncias que não fazendo parte do tipo atenuam ou agravam a responsabilidade criminal do arguido , neste caso a ilicitude , sendo aquelas atenuantes de valor insignificante , superadas , de longe, pelas últimas . |