Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1079/08.2TYLSB-X.L1-A.S1
Nº Convencional: 6.ª SECÇÃO
Relator: RICARDO COSTA
Descritores: RECURSO DE REVISÃO
INDEFERIMENTO LIMINAR
RECURSO DE ACÓRDÃO DA RELAÇÃO
RECURSO DE APELAÇÃO
DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
ADMISSIBILIDADE DE RECURSO
DOCUMENTO
MEIOS DE PROVA
LITIGÂNCIA DE MÁ FÉ
PRESSUPOSTOS
DOLO
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS
Data do Acordão: 11/30/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA (COMÉRCIO)
Decisão: IMPROCEDENTE A APELAÇÃO JUNTO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA.
Sumário :
I - Não é de admitir liminarmente recurso extraordinário de revisão, tendo como fundamento a al. c) do art. 696.º do CPC (“Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.”), condicionados cumulativamente aos requisitos da novidade (objectiva e subjectiva) e da suficiência, se, tendo em vista inverter a decisão transitada em julgado de qualificação como subordinados de créditos sobre a insolvência, a parte não demonstra nem alega ter empregue a diligência devida na obtenção prévia dos documentos invocados, preexistentes e cuja localização era conhecida, e se tais documentos trazidos a juízo não são suficientes para permitir a conclusão de que, se previamente apresentados, levariam o tribunal a uma decisão diversa da atingida na decisão cuja revisão se pretende.
II - Apresenta litigância de má-fé quem apresenta em juízo, através da actuação conjunta no apenso de reclamação de créditos insolvenciais e na pretensão extraordinária e residual de atacar a intangibilidade do caso julgado em saneador sentença proferido nesse apenso através do art. 696.º do CPC, uma actuação dolosa, por ser intencional, em referência a qualquer das condutas(-manifestações) de má-fé processual qualificada previstas nas als. a), b) e d) do art. 542.º, n.º 2, do CPC.
Decisão Texto Integral:

Processo n.º 1079/08.2TYLSB-X.L1-A.S1


Apelação sob a forma de revista (art. 215º, 4ª, CPC) – Tribunal recorrido: Relação de Lisboa, ... Secção


Recurso de revisão (arts. 696º e ss, CPC)


Acordam na 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça


I) RELATÓRIO


1. AA veio interpor recurso extraordinário de revisão do acórdão proferido nestes autos pelo Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) em 26/4/2022, transitado em julgado, com fundamento na al. c) do art. 696º do CPC:


«[ser objeto de revisão quando] Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida.».


Requer a final que se revogue a decisão proferida e se ordene a tramitação para a causa ser novamente instruída e julgada.


2. No presente processo, foi declarada nos autos principais a insolvência de «H..., C.R.L.», por sentença proferida em 24/5/2001, transitada em julgado.


3. No correspondente apenso de reclamação, verificação e graduação de créditos (“I”), foi proferido saneador sentença (21/10/2021, art. 136º CIRE) pelo Juiz ... do Juízo de Comércio de ..., no qual se reconheceram créditos não impugnados e reconhecidos nas acções de verificação ulterior de créditos e na tentativa de conciliação e se julgaram as impugnações deduzidas cuja decisão não foi relegada para momento posterior.


Foram dele interpostos recursos de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa (TRL), na parte em que foram qualificados créditos como subordinados (alínea E) do dispositivo) e se decidiram os requerimentos probatórios.


Elencadas as questões decidendas – a admissibilidade dos recursos, nulidade da decisão recorrida e “pressupostos da qualificação dos créditos reclamados pelos recorrentes como subordinados” –, foi proferido o acórdão revivendo, transitado em julgado, que assim julgou no dispositivo:


“a) Declarar a ilegitimidade dos apelantes BB, CC, DD e EE para recorrer da parte da decisão proferida quanto aos requerimentos probatórios (ponto IV) que indeferiu a audição, requerida por outros credores, na qualidade de testemunhas, de pessoas que revestem a qualidade de administradores e, em consequência, declarar findos os recursos interpostos por estes credores, nesta parte;


b) Julgando a apelação interposta por BB (nº 134) parcialmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 37.164.67, reconhecidos a BB;


c) Julgando a apelação interposta por CC (nº 57) parcialmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 110.268,78 reconhecidos a CC;


d) Julgando a apelação interposta por DD (nº 66) parcialmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 34.275,45 reconhecidos a DD;


e) Julgando a apelação interposta por EE (nº 145) parcialmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 100.000,00, reconhecidos a EE;


f) Julgando a apelação interposta por LX Investment Partners III, SARL integralmente procedente, manter a decisão recorrida na parte em que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 666.751,72 reconhecidos a AA (nº 125);


g) Julgando a apelação interposta por FF (nº 78) integralmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 95.863,29 reconhecidos a FF;


h) Julgando a apelação interposta por AA (nº 126) integralmente procedente, revogar a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 145.659,01 reconhecidos a AA;


i) Determinar o prosseguimento dos autos com elaboração dos respetivos temas de prova e conhecimento dos respetivos requerimentos probatórios relativamente aos seguintes credores e créditos:


- 57 – CC – € 110.268,78;


- 66 – DD – € 34.275,45;


- 78 – FF – € 95.863,29;


- 126 – AA – € 145.659,01;


- 134 – BB – € 37.164.67;


- 145 – EE – € 100.000,00.”


(Sublinhado nosso.)


4. Tramitada a instância para exercício do contraditório quanto à eventual condenação em litigância de má fé, o TRL proferiu acórdão (5/9/2023) no qual decidiu:


a) Indeferir o recurso de revisão interposto por AA da decisão proferida por este Tribunal da Relação em acórdão de 26/04/2022 que, julgando procedente a apelação interposta por LX Investment Partners III, SARL, manteve a decisão recorrida na parte em que considerou de natureza subordinada os créditos no montante de € 666.751,72 reconhecidos a AA (n.º 125);


b) Condenar o recorrente AA como litigante de má-fé, na multa de 30 (trinta) UCs.


5. A finalizar as suas alegações, o Recorrente de Revisão apresentou as seguintes Conclusões:


1 – O Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão datado de 5 de Setembro de 2023, considerou que o recurso extraordinário de revisão deve ser liminarmente indeferido, não cabendo prévio contraditório ou proferir qualquer tipo de convite ao aperfeiçoamento, motivo pelo qual, indeferiu o mesmo, de imediato. Por outro lado, o ora recorrente foi condenado como litigante de má fé, na multa de 30 (trinta) UCs.


2 – Entende o Recorrente que a decisão proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa não é materialmente justa nem equilibrada e parte de pressupostos que não parecem ser adequados ao caso concreto.


3 – Por outro lado, “Para que, nos termos do art 699º, nº 1, 2ª parte, do CPC/2013, se verifique o indeferimento liminar do recurso extraordinário de revisão deverá ser manifesta a improcedência do fundamento invocado.” – Ac. do TRPde 11-04-2018 (Pº 402/12.0...) – o que não parece acontecer no caso dos autos, conforme melhor a seguir se detalhará.


4 – OTribunal da Relaçãode Lisboa, nesteseu Acórdão de 05 deSetembro de 2023, enquadrou, bem,aalegaçãodorequerente:orequerentesabiadaexistênciadosdocumentos,estava ciente deles, mas não teve possibilidade de os obter senão em março de 2023.” (pág. 24 do Acórdão).


5 – O Tribunal da Relação de Lisboa, naquele seu Acórdão, entende que impende sobre o requerente, que invocaa novidade subjetiva, um ónusacrescido, “no sentido de alegar e provar que diligenciou pela obtenção do documento e que a impossibilidade da sua apresentação não lhe é imputável.”


6 – Por referência ao caso concreto, o Tribunal da Relação de Lisboa considera, neste seu Acórdão, que “não está verificado o requisito da novidade em sentido subjetivo, dado que a parte não demonstrouou sequer alegou– terempregue de toda adiligênciana obtenção prévia dos documentos em causa, preexistentes e cuja localização era conhecida.”


7 – Salvo o devido respeito por outro e melhor entendimento, entende-se que o requerente do recurso de revisão alegou, como lhe competia, os factos indispensáveis à previsão constante da al. c) do art. 696.º do CPC. É entendimento do recorrente, por referência ao caso concreto, que deveria alegar que, apesar de ter usado da normal e devida diligência, não foi possível obter e usar os documentos ou que empregou todos os esforços que estavam ao seu alcance para o conseguir, o que considera ter feito. Embora alguma prova consiga carrear para os autos, afigura-se que os factos que, quanto a esta temática, o recorrente trouxe aos autos, terão que ser naturalmente provados em tribunal, nomeadamente com o recurso a depoimentos e declarações.


8 – Resulta, nomeadamente, da alegação do Recorrente, que não dispunha da documentação; que a Cooperativa lhe prometeu a entrega dos originais e cópias de documentos mas este nunca lhe vieram a ser entregues; foram inúmeras as solicitações à Cooperativa e, assim que lhe foi permitido, inúmeras as buscas efetuadas em dossiers da Cooperativa, sem sucesso; até ao período compreendido entre 14 e 30/03/2023, os únicos documentos de que dispunha, tinha acesso e mantinha na sua posse eram certidão de uma escritura de compra e venda, projeto e licenças de construção e utilização do prédio que veio a ser implantado nos terrenos originariamente da propriedade do Recorrente, minutas e cópias dispersas e incompletas de algunsdocumentos que não lhe permitiam fazeraprova;tesoureirose elementosdas diversas direções daCooperativa confirmaram a existência, em arquivo, de originaise cópias de muitos destes documentos (contratos, acordos e outros); especificou que no Verão de 2022 obteve autorização do Senhor Administrador de Insolvência para consultar as pastas em arquivo na sede da insolvente; encontrou alguns documentos (certidões e cópias de pagamentos efetuados) mas não conseguiu encontrar documentos comprovativos da assinatura de contratos e acordos em período anterior aquele em que fez parte da Direção da Cooperativa, que sabia existir; no entanto confirmou, junto de elementos das diversas direções da Cooperativa Insolvente que os documentos existiam e não teriam sido destruídos ou inutilizados, o que deu ânimo para a continuação das buscas; o recorrente não desistiu e, a partir de 14 de Março de 2023, com a autorização do Senhor Administrador de Insolvência e com a ajuda de seu filho, GG, o recorrente conseguiu encontrar uma pastacommuitos dosdocumentos que procurava, queali discrimina; em30 demarço de2023 encontra o documento que vem a juntar como doc. n.º 6; os documentos juntos sob os n.º 1 a 6 foram obtidos, após consulta autorizada ao acervo documental da Insolvente, que se encontra sob a alçada do Sr. Administrador de Insolvência e que ocorreu no período de 14 a 30deMarçode2023–ver,apropósito,factosalegadossobosartigos18a28e46econclusões 10 a 15 e 31 do requerimento de recurso de revisão.


9 – O Recorrente demonstrou as dificuldades que teve, as diligências que realizou e a forma e a data em que conseguiu obter a documentação, o que assume relevância também para demonstrar o cumprimento do prazo para interposição do recurso, que se encontra previsto no n.º 2 do artigo 697 do CPCe que é de60 dias contadosdesde a dataem queo recorrenteobteve o documento.


10 – Entendendo-se que as explicações e factos apresentados pelo recorrente estão insuficientemente desenvolvidos ou ainda carecem de alguns esclarecimentos ou desenvolvimentos, como parece resultar do Acórdão em apreciação, entendemos que não se deveria optar pelo indeferimento liminar mas sim ser determinado o aperfeiçoamento do requerimento de revisão.


11 – Neste particular, seguimos de perto José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, os quais, em anotação ao artigo 774.º do antigo CPC, referiram o seguinte:


“3. Além de nas situações de falta de pressupostos processuais específicos dos recursos ordinários, aplicáveis a este recurso extraordinário por força da remissão do n.º 2 para o art. 687-3 (querendo tal significar que o recurso pode ser imediatamente indeferido se estiver extinto por caducidade o prazo para recorrer ou se o recorrente carecer de legitimidade para o efeito), o requerimento será ainda indeferido se não vier deduzido ou instruído nos termos previstos no art. 773 ou não houver manifestamente motivo para revisão. Apesar de o artigo sob anotação não referir o despacho de aperfeiçoamento, deve ele ter-se por admitido, em aplicação das normas gerais (ver o n.º 7 da anotação ao art. 234-A).”, José Lebre de Freitas e Armindo Ribeiro Mendes, In Código Processo Civil anotado, volume 3.º, artigos 676.º a 943.º, Coimbra Editora, 2003, pág. 204.


Continuando, os mesmos autores referem o seguinte: “Nos casos em que há lugar a despacho liminar, é possível o juiz proferir despacho de aperfeiçoamento?


“Omomentonormaldoconviteaoaperfeiçoamentodosarticuladoséhojeododespachopré-saneador (art. 508).”, José Lebre de Freitas, João Redinha, Rui Pinto, Código Processo Civil anotado,volume I,artigos1.ºa 380.º,Coimbra Editora,1999,anotação 7 ao artigo 234-A,pág. 402.


12 – Ao optar pelo indeferimento liminar, o Tribunal da Relação de Lisboa, no seu Acórdão de 5 de Setembro, fez uma incorreta interpretação dos artigos 696 c) e 590.º do CPC.


13 – Do Acórdão recorrido resulta ainda que “… não se verifica nenhum dos requisitos necessários à procedência do presente recurso de revisão, nos termos da alínea c) do art. 696.º doCPC,dadoqueosfactosalegadosnãopreenchemospressupostosdarevisão:osdocumentos invocados não são dotados de novidade, objetiva ou subjetiva e não são suficientes para permitir a conclusão de que, previamente apresentados, levariam o tribunal a uma decisão diversa da atingida na decisão cuja revisão ora se pretende.”


14 – Precisando que o documento “terá que ser suficiente para proporcionar vencimento de causa ao vencido”.


15 – Ainda de acordo com esta temática, … “O documento deve visar a demonstração ou a impugnação de factos alegados pelas partes ou adquiridos para o processo que tenham sido essenciaisparaadecisãodeméritocolocadaemcrise,nãopodendoemcasoalgumvisaraprova de factos novos requisito da pré-alegação.”(…)


16 – O Tribunal daRelaçãode Lisboa, no Acórdão impugnado, considerouqueosfactosalegados pelo recorrente eram, todos eles, factos novos, que não foram considerados nem julgados ao longo do processo, pelo que não são fundamento de recurso de revisão.


17 – Pese embora ser verdade que o Recorrente fez o enquadramento do recurso, com a apresentação de alguns factos novos e desenvolvimento de factos considerados no processo, não deixou de querer demonstrar factos alegados na instância, conforme melhor adiante se verá.


18 – No Acórdão cuja revisão foi requerida, quanto ao crédito n.º 125, refere-se o seguinte: (…)


“- a reclamação de créditos n.º 125 reporta-se aos créditos relativos ao sinal em dobro pelos contratospromessa das frações B, Q e S do prédio urbano sito no Largo ..., celebrado em 17/11/2008.”


19 – Conforme resulta do excerto transcrito daquele Acórdão de 26 de Abril de 2022, o facto relevanteé a constituição daqueles créditos, que otribunal refere decorrerem dacelebração de três contratos promessa em 17/11/2008.


20 – Assim sendo, afigura-se-nos que a causa comporta a discussão da data em que os créditos reclamados foram constituídos, nomeadamente se o foram na data da formalização dos contratos promessa (17/11/2008) ou em data anterior.


21 – Por outro lado, tanto a reclamação de créditos do Recorrente como o Acórdão de 26 de Abril de 2022, se referem e fazem apelo aos contratos promessa datados de 17/11/2008, que foram juntos à reclamação de créditos como docs. 1 a 3.


22 – Analisados os aludidos contratos, verifica-se que, na cláusula 4ª dos contratos promessa de compra e venda das frações (e já não assim no que concerne aos lotes do ..., que não foram pagos desta forma), a Cooperativa declara ter recebido o valor com relação ao preço do terreno que adquiriu ao ora recorrente por escritura notarial datada de 9 de outubro de 2002.


23 – Entendemos, assim, que também por aqui os autos comportam a discussão da data em que os créditos se constituíram mesmo que só tenham sido formalizados em 2008, como resulta daqueles contratos promessa.


24 – O documento que o recorrente juntou visa a demonstração de factos alegados pela parte ou, de qualquer forma, adquiridos no processo e que, como se viu, foram essenciais para a decisão de mérito colocada em crise (o momento da constituição destes créditos, que assim foi definido pelo Tribunal da Relação de Lisboa, resulta daqueles contratos promessa e foi determinante para a qualificação dos créditos como subordinados).


25 – Mais se refere no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Setembro de 2023 que “Sejáumacombinaçãodedocumentosnovos(que,comovimos,naverdadenãorevestiamessa característica) é de duvidosa integração na alínea c) do art. 696.º do CPC, a conjugação de documentos novos e não novos (na própria alegação do requerente da revisão) permite afastar a verificação da suficiência nesta vertente.”


26 – Entende o Recorrente que não parece haver limitação, no âmbito da al. c) do art. 696.º do CPC, para a junção de documentos novos, ainda para mais quando se assumiu a relevância do doc.6 junto, parecendo que, apesar das dúvidas,tal terá sido admitido pelo Tribunal da Relação de Lisboa.


27 – O fundamento da discórdia parece ser a conjugação de documentos novos com outros documentos.


28 – Ora, pressupondo que o processo prosseguirá, parece não haver limitação à indicação de outro tipo de prova, documental ou testemunhal, cuja produção dependerá sempre de decisão dotribunal,sendoeste(apetição/requerimentoinicialemquesealegamosfactos)omomento adequado para o efeito – a este propósito veja-se o já citado Ac. da RL, de 24.2.1994: Col. Jur.,1994, 1.º-134.


29 – Também vem referido no Acórdão de 05 de Setembro de 2023 não parecer possível “… que a decisão a rever pudesse ter desqualificado o crédito n.º 125 por forma a permitir a discussão de se seria um crédito garantido por direito de retenção.


O que tem na seguinte sede esta consequência: o recorrente pretende obter com o recurso de revisão um efeito jurídico que não poderia obter com a decisão revidenda, exclusivamente por inércia da sua parte – podia ter ele próprio recorrido do despacho saneador sentença, ciente de que havia reclamado dois créditos, ou lançado mão do disposto no art. 636.º do CPC relativamente ao recurso interposto por LX Investment Partners.”


30 – No Acórdão de 26 de Abril de 2022oscréditosrelacionadossobre oartigo125foram objeto de análise pelo Tribunal. Suscitava-se a dúvida se teria havido um lapso na sentença de graduação de créditos e se estes créditos ali teriam também sido considerados como créditos subordinados. Um dos credores entendeu recorrer desta decisão, quanto aos créditos relacionados sob o n.º 125, por entender que seria legítimo defender que estes créditos não teriam sido considerados, na sentença, como créditos subordinadose pretendendo que uma tal questão ficasse sanada, quanto mais não fosse, mediante retificação.


31 – O tribunal a quo, neste mesmo Acórdão, refere mesmo que “A decisão recorrida não qualificou como subordinados apenas os créditos reconhecidos a este credor sob o n.º 126, embora pudesse ser interpretado dessa forma. O recurso em causa não afirma aliás que a decisão não abranja todosos créditos, apenas se alegando que pode ser assim interpretado.”


32 – Dizendo que “A apelação apresentada por LX Investment Partners III, SARL é integralmente procedente, tendo em conta que o pedido formulado era de consideração como subordinado também do crédito listado sob o nº 125, sendo que, quanto ao crédito nº 126, era objeto do recurso interposto por AA, ao qual esta apelante respondeu.”


33 – Em face da decisão proferida em 26 de Abril de 2022, parece-nos claro que é este Tribunal da Relação de Lisboa que se pronuncia decisiva e definitivamente sobre este crédito, pelo que seria quantoà decisãoproferidaem26 de Abrilde2022 que deveriaincidiro recurso derevisão.


Etal,independentementede,aíeafinal,seterconcluídopelaretificaçãodosegmentodecisório constante da sentença da 1.ª instância. E parece-nos que, apesar de suscitar a questão, o tribunal da Relação de Lisboa assim acaba por considerar.


34– Referetambémotribunalaquoque“nenhumdestesdocumentosaltera,deformaessencial oudecisivaofactodadocomoprovadodequeforamcelebradoscontratospromessadecompra e venda em novembro de 2008, quando o recorrente era membro da direção da cooperativa. A antiguidade do crédito, não define o negócio jurídico que o recorrente escolheu invocar como causa de pedir da sua reclamação de créditos nem altera essa causa de pedir.”


35 – Conforme referimos, do Acórdão de 26 de Abril de 2022 resulta o seguinte:


“Já não assim quanto ao segundo grupo de créditos reclamados pelo credor AA, listados sob o nº 125, que se referem a créditos constituídos com a celebração de três contratos promessaem 17/11/2008, como já se apontou. No tocante a estes créditos estão preenchidas as três condições acima apontadas: não gozam de privilégio creditório ou hipoteca legal e foram constituídos no período em que o credor era membro efetivo da direção da cooperativa insolvente, existindo, assim, a essa data, especial relação com a devedora.”


36 – Conforme resulta do excerto transcrito daquele Acórdão de 26 de Abril de 2022, o facto relevanteé a constituição daqueles créditos, que otribunal refere decorrerem dacelebração de três contratos promessa em 17/11/2008.


37 – Assim sendo, afigura-se-nos que a causa comporta a discussão da data em que os créditos reclamados foram constituídos, nomeadamente se o foram na data da formalização dos contratos promessa (17/11/2008) ou em data anterior.


38 – Por outro lado, e como também já se referiu em 22 das presentes conclusões, verifica-se que, na cláusula 4ª dos contratos promessa de compra e venda juntos com a reclamação atinente ao crédito 125, a Cooperativa declara ter recebido o valor com relação ao preço do terreno que adquiriu ao ora recorrente por escritura notarial datada de 9 de outubro de 2002.


39 – Entendemos, assim, que também por aqui os autos comportam a discussão da data em que os créditos se constituíram mesmo que só tenham sido formalizados em 2008, como resulta daqueles contratos promessa.


40 – O documento que o recorrente juntou visa a demonstração de factos alegados pela parte ou, de qualquer forma, adquiridos no processo e que, como se viu, foram essenciais para a decisão de mérito colocada em crise (o momento da constituição destes créditos foi determinante para a qualificação dos créditos como subordinados).


41 – Se atentarmos no doc. n.º 6, junto com o recurso de revisão, verificamos que descreve o histórico do crédito até à sua composição na data de 5 de Junho de 2006, definindo os valores entregues para compra de cada uma das frações autónomas – valores por fração que são coincidentes com os valores expressos nos contratos promessa: deste documento datado de 05 de Junho de 2006 decorre que o Recorrente era titular de um crédito sobre a insolvente, de montante não inferior ao somatório dos seguintes créditos:€ 99.719,68, por referência à fração autónoma A (rés-do-chão esquerdo), €: 114.379,35, por referência à fração autónoma correspondente ao R/C Direito do Bloco C e € 119.826,22, por referência ao 1.º andar direito do Bloco C.


42 – Se confrontarmos os valores expressos no doc. n.º 6 junto com o recurso de revisão com os valores constantes dos contratos promessa, facilmente chegamos à conclusão que se trata do mesmo crédito, evidenciando o doc. n.º 6 que estes créditos se constituíram, se não antes, pelomenos em 2006.


43 – À semelhança do que já avançámos quanto ao ónus de alegar e provar que diligenciou pela obtenção do documento e que a impossibilidade da sua não apresentação não lhe é imputável, estamos em crer que toda esta matéria deveria ser objeto de despacho de aperfeiçoamento, aqui dando por reproduzido o que, quanto a este assunto, deixámos expresso nos artigos 10 a 12 das presentes conclusões.


44 – Perpassa do Acórdão recorrido toda uma atuação grosseira do Recorrente, fazendo-se crer que este definiu, com precisão, toda uma estratégia processual em que adequou factos, documentos, comportamentos e momentos, de forma que quase se pode qualificar como ardilosa, o que não só não nos parece resultar dos autos, como o recorrente não teria capacidade para a implementar e o mandatário permitiria que tal acontecesse.


45 – Assim, e quanto à má fé do recorrente, o Acórdão proferido em 5 de Setembro de 2023 refere:


“Resultam, quanto a nós do acervo de documentos e alegações produzidas, limpidamente as seguintes conclusões:


-Em2011,quandoapresentouduasreclamaçõesdecréditosdistintas,ocredorsabiaqueestava a reclamarcréditosa que não tinha direitoe, com ousem documentos,omitiu factos relevantes para adecisãodas reclamaçõesdecréditos queapresentou,preenchendo,assim, aprevisão das alíneas a) e b) do nº 2 do art. 542º do CPC;


- Em 2023, quando viu reconhecido, por sentença transitada em julgado (48 – apesar da descobertadosdocumentosseterdado,naalegaçãodorecorrente,emmarço,arevisãoapenas vem a ser pedida em 04/05/2023) como parcialmente garantido um crédito a que sabia não ter direito, lança mão deste instrumento excecional, um recurso extraordinário de revisão, para tentar ainda discutir apenas o segundo crédito reclamado, já definitivamente reconhecido e qualificado como subordinado, o que corresponde a um uso manifestamente reprovável do processo, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, preenchendo, assim, também a título doloso, a al. d) do nº 2 do art. 542º do CPC” (…)


46 – Parece resultar do Acórdão de 5 de Setembro de 2023, as seguintes imputações ao Recorrente:

a) As reclamações correspondiam a créditos a que não tinha direito e omitiu factos relevantes para a decisão das reclamações que apresentou – previsão das alíneas a) e b) do n.º 2 do art. 542.º do CPC;

b) Apesar de ver reconhecido, por sentença transitada em julgado, um crédito (parcialmente garantido) um crédito a que sabia não ter direito, lança mão do recurso extraordinário de revisão para discutir o 2.º crédito, já definitivamente reconhecido e qualificadocomosubordinado,oquecorrespondeaumusomanifestamentereprovável do processo, com o fim de conseguir um objetivo ilegal – previsão da al. d) do n.º 2 do art. 542.º do CPC. Mais à frente vem concretizado como “revelação nos autos, para tentar obter um pagamento superior por via de outro crédito, de documentos que o demonstram apenas após trânsito em julgado da decisão que verificou e graduou aqueles primeiros créditos”;

c) O prejuízo dos demais credores, que este conhecia pessoalmente, atentas as funções exercidas (“especial indiferença para com o resultado das suas ações e para com o prejuízo que delas poderia resultar para os demais credores”;

d) Logrou parcialmente os seus intentos.

47– Comosereferiuno requerimentoderecurso de revisão, tudocomeçounoano civilde2001, altura em que a Insolvente propôs ao recorrente a permuta de 2 prédios do recorrente (um rústico e um urbano) – com projeto e licenciamento em curso, posteriormente aprovado – por outros bens, que iriam ser objeto de construção pela Cooperativa Insolvente para posterior entregaaocredorrecorrente:naqueleanocivilapropostaincidiuem2dasmoradiasqueaquela iria edificar na Quinta ..., em ...; mais tarde o pagamento em espécie incidiria em 3 frações autónomas dos prédios em construção na ....


48 – Naquele recurso se referiu:

a) Em 11 de Junho de 2001, celebraram um contrato de permuta em que as partes atribuíram aos imóveis objeto do acordo de permuta o valor de Esc.: 85.000.000$00 (oitenta e cinco milhões de escudos);

b) Por não estarem reunidas as condições para o financiamento bancário, a Insolvente solicitou então ao Recorrente que celebrasse escritura de comprae venda dos seus dois prédios (o rústico e o urbano), o que o recorrente, de boa fé, aceitou fazer, declarando, na escritura, ter recebido um preço que não recebeu;

c) Em 25 de Junho de 2001, a Insolvente elaborou conta corrente, onde expressava as contas dos negócios realizados com o Recorrente, a saber: o valor dos terrenos (lote 23 e 51 da Quinta ...), as taxas e licenças,o valor dos projetose da construção perfaziam Esc.: 87.978.248$00; o valor total da permuta (valor dos terrenos entregues pelo recorrente) e os valores já por este pagos ascendiam a Esc.: 92.021.816$00, pelo que o Recorrente recebeu a diferença, paga em excesso, de Esc.: 4.43.568$00.

d) Em 26 de Setembro de 2002 é celebrado um acordo em que se clarifica a natureza da permutarealizada,considerando-seencerradasascontascomaentrega,aoRecorrente, das 2 moradias que a Insolvente iria construir.

e) No dia 9 de Outubro de 2002, AA e mulher, HH declaram vender, pelo preço de €: 44.500,00 (quarenta e quatro mil e quinhentos euros) que declaram já ter recebido, à Cooperativa Insolvente os seus 2 prédios (prédio rústico composto de terra de semeadura, com a área de 937m2, denominado “...”, inscrito na matriz sob o artigo 52 da Secção E, descrito na CRP de ... sob o n.º ...97 do livro ...-68; prédio urbano destinado a habitação, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 164, descrito na CRP de ... sob o n.º ...48 do livro ...-...00) – doc. 8, junto com o recurso de revisão.

f) Em05deJunhode2006aInsolventecelebracomocredorrecorrenteeesposaumnovo acordo,emqueaInsolventereconheceasuaincapacidadeparaconstruiras2moradias, fazendo substituir as moradias por três frações autónomas da Urbanização ..., na ..., a saber: do bloco A, fração correspondente ao R/C Esq., a que atribuem o valor de € 99.719,68; do bloco C, fração correspondente ao R/C Dto., a que atribuem o valor de€ 114.379,35; do bloco C, a fração correspondente ao 1.ºandar direito, a que atribuem o valor de € 119.826,22 e da Urbanização ... (lote 4, loja n.º 2, com a área de 79,20), em relação à qual consideram já ter sido pago o valor de € 26.544,32 (doc 6, junto com o recurso de revisão).

49 – Os contratos promessa de compra e venda que são juntos à reclamação de créditos do credorrecorrente, referentes ao crédito125,maisnãosão do queaexpressãoe aconcretização aproximada, porventura com deficiente formalização e desnecessária, dos valores que se encontravam já definidos neste acordo de 2006 – do acordo resulta um valor global, de capital, de € 360.469,57 e da reclamação de créditos o valor de € 333.375,86 (se retirarmos ao valor de € 360.469,57ovalorda lojan.º 2, de €26.544,32,quenão foiobjetode reclamação,ovalorfinal é de € 333.925,25, ou seja, praticamente igual nos dois documentos).


50 – Pelo seu interesse para a resolução da presente questão, há que notar que, como resulta da cláusula 4.ª dos contratos promessa, faz-se alusão precisa ao pagamento dos prédios objeto de escrituraem2002, quenão forampagosnaquele ato nemposteriormente(alideclara-se“ter recebido como preço do terreno que adquiriu ao 2.º outorgante por escritura notarial datada de 09 de Outubro de 2002”) – ver, a propósito, doc. 6 e contratos promessa de compra e venda juntos, como docs 1 a 3, com a reclamação de créditos deste credor (a reclamação de créditos e documentos juntos à mesma foi apresentada pelo Senhor Administrador de Insolvência no apenso de reclamação de créditos por requerimento eletrónico datado de 17/06/2021, com a referência citius ...47 – ver doc. 12).


51 –Dos documentosjuntos com o recurso de revisãoresulta inequivocamenteque o crédito do credor recorrente é muito anterior à data em que veio a fazer parte da Direção da Insolvente (23/01/2007), tendo sido constituído em 25 de Junho de 2001 (ver, a propósito, docs. 1 a 3, ora juntos),confirmado em acordo de26.09.2002 (doc4) e reiterado em acordo de05.06.2006 (doc 6). É também isso que, de alguma forma, se alude na cláusula 4ª dos contratos promessa juntos com a reclamação do crédito reconhecido sob o n.º 125.


52 – Parece-nos claro que os créditos existem (provando-se ou não que foram constituídos em 2008 ou muito antes disso, como defende o recorrente), podendo discutir-se (no nosso entendimento terá necessariamente que ser objeto de prova), quanto aos créditos reclamados sob o n.º125, se são créditos garantidosoucomuns (se se der como provado quesão anteriores a 2008 não poderão, no nosso entendimento, ser qualificados como subordinados).


53 – Por outro lado, e como se referiu na conclusão 10 do requerimento de recurso de revisão, “até ao período compreendido entre 14 e 30/03/2023, os únicos documentos a que o credor recorrentetinhaacessoemantinhanasuaposseeramumacertidãodeumaescrituradecompra e venda, projeto e licenças de construção e utilização do prédio que veio a ser implantado no prédio vendido,minutase cópias dispersas e incompletas de alguns documentos, sem que, com eles, conseguisse fazer a prova que lhe incumbia.”, ouseja, na nossa perspetiva seria impossível alegar e fazer a prova de quaisquer outros factos.


54 – E, à data das reclamações de créditos, o Recorrente não estaria em condições de alegar outros factos ou, quando muito, a omissão, a existir, não decorre de culpa sua / é censurável para efeitos de qualificação como má fé processual, pelo que, e quanto a este fundamento, entendemos que não assiste razão ao tribunal a quo.


55 – Entende aindao Tribunal daRelação deLisboa, no seu Acórdão de 05 de Setembro de2023, queoRecorrentelitigoudemáfédadoque,“apesardeverreconhecido,porsentençatransitada em julgado, um crédito (parcialmente garantido) a que sabia não ter direito, lança mão do recurso extraordinário de revisão para discutir o 2.º crédito, já definitivamente reconhecido e qualificado como subordinado, o que corresponde a um uso manifestamente reprovável do processo, com o fim de conseguir um objetivo ilegal – previsão da al. d) do n.º 2 do art. 542.º do CPC. Mais à frente vem concretizado como “revelação nos autos, para tentar obter um pagamento superior por via de outro crédito, de documentos que o demonstram apenasapóstrânsito em julgado da decisão queverificoue graduou aquelesprimeiroscréditos”.


56 – Parece resultar daqui que é entendimento do tribunal que o recorrente não tem direito ao crédito reconhecido como n.º 126, o que, com o devido respeito, não resulta dos autos e não corresponde à verdade material. Este crédito (chamemos-lhe 126) tem, na sua origem, um crédito diferente, que não o que está na origem do crédito 125 e que originou o recurso de revisão. Por outro lado, foi objeto de negociações entre as partes e implicou cedências e perda de parte substancial do investimento feito pelo recorrente para obter uma solução negociada. Não nos parece fazer qualquer sentido a sua colação ao presente assunto.


57 –Se analisarmosbem oscontratospromessadecadaum doscréditos,é possível verificarque o crédito reconhecido sob o n.º 126 não faz qualquer referência ao pagamento decorrente da escritura de 2002, ao contrário do que acontece com o crédito 125.


58 – O pagamento, por referência a cada um dos créditos, foi feito pelo recorrente de forma diferente: o crédito 125 foi a contrapartida pela venda dos 2 prédios (urbano e rústico) à cooperativa; o 126 corresponde a pagamento efetuado pelo recorrente à Cooperativa.


59 – O crédito reclamado sob o n.º 125 não esteve a aguardar pela prolação de uma qualquer sentença (será que faz sentido falar-se, quanto ao crédito reclamado sob o n.º 126, que esteve a aguardar o seu reconhecimento como crédito parcialmente garantido dado que, fruto da transação celebrada entre as partes, já tinha havido homologação, por sentença, da transação quanto a este mesmo crédito?) mas apenas que o Senhor Administrador de Insolvência, após convergência com a empresa onde se encontram depositadas as inúmeras pastas, lhe desse autorização para novas buscas.


60– Deacordocomon.º15dafundamentaçãodefactoconstantedoAcórdãode5deSetembro de 2023, asentençade graduação decréditosemapreçoterásido notificada entre 3e4de Abril de 2023.


61 – Ora, o recorrente pediu autorização ao Senhor Administrador de Insolvência para aceder e consultar o arquivo documental em data muito anterior a Fevereiro de 2023. O Senhor Administrador de Insolvência, por email datado de 01/02/2023, enviou listagem das pastas armazenadasparaqueoRecorrentepudesseselecionarasquepretendiaconsultar–doc.1,que se junta e se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais.


62 –Nodia04 deFevereirode 2023 (cercade2mesesantes danotificaçãodaaludida sentença), oRecorrenteindicaao SenhorAdministrador deInsolvênciaaspastasquepretenderiaconsultar – doc. n.º 2 que se junta e se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais.


63 – No dia 07 de Março de 2023 (sensivelmente um mês antes da notificação da sentença) a empresa onde se encontram armazenadas as pastas referiu que estas já estariam disponíveis para levantamento, informação que veioa ser disponibilizada ao Recorrente – doc. n.º 3, que se junta e se dá por reproduzido para os devidos efeitos legais.


64 – Os documentos foram encontrados no período compreendido entre 14 e 30/03/2023 –ver, a propósito, n.º 10 das conclusões de recurso de revisão.


65 – Subjacente a esta “desconfiança” quanto à atuação do recorrente, parece estar o facto de, nas palavras do Acórdão recorrido, “apesar da descoberta dos documentos se ter dado, na alegação do recorrente, em março, a revisão apenas vem a ser pedida em 04/05/2023.”


66 – Quantoa isto,há adizerque, peseembora ter sidosolicitada autorização emperíodomuito anterior, só foi dado acesso às pastas em março de 2023. Ao recorrente, até tendo em conta a disponibilidade e o trabalho a desenvolver pelo seu mandatário, incumbia respeitar o prazo de 60 dias contados da data em que o recorrente obteve o documento – n.º 2, al. c) do art. 697.º do CPC – o que implicaria a apresentação do recurso de revisão até 14 ou 30 de Maio de 2023.


O recurso de revisão é apresentado em 04/05/2023 (de acordo com a nota 48 do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Setembro de 2023, “… a revisão apenas vem a ser pedida em 04/05/2023.”), ou seja, ainda assim bem antes do final do prazo.


67 – O Recorrente era (e é) credor – com fundamentos e génese diversa para cada um dos créditos – não parecendo, ao longo do histórico do presente processo, ter causado qualquer prejuízo a alguém, credorou não.Pelo contrário, resulta claramente dosautos que o recorrente não iráreceber uma parte substancial dosseus créditos, por estesterem sido qualificadoscomo subordinados, situação que se considera ser injusta e que motivou o presente recurso de revisão.


68 – Como resulta claramente dos autos, no que concerne aos créditos relacionados sob o n.º 126, a sua origem é distinta dos créditos ora em apreço (relacionados sob o n.º 125), não havendo razão, por isso, para que possam ser objeto de um mesmo tipo de apreciação. Não se consegue perceber a razão que determinou a análise, pelo Tribunal da Relação de Lisboa, dos créditosrelacionadossobon.º126comosetivessemamesmagénesedoscréditosrelacionados sob o n.º125, ora em apreciação, até porque o recorrente em nada contribuiu para isso. Não se vê que intentos é que o recorrente logrou conseguir que não sejam os decorrentes dos pagamentos que fez e dos documentos que assinou.


69 – Por isso e em conclusão, entende o Recorrente que não litigou de má fé e que o Tribunal da Relação de Lisboa fez uma incorreta interpretação do artigo 542.º do CPC.


70 – Os documentos ora juntos destinam-se a fazer prova dos factos alegados pelo Recorrente, tendentes a infirmar os factosou argumentos que conduziram à sua condenação como litigante de má fé. Só agora são juntos pois só com o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 5 de Setembro surgiu, pela primeira vez, factos e interpretações que conduziram à condenação do recorrente como litigante de má fé e que justificaram a apresentação, neste momento, de tais documentos.





Mantendo-se regular a instância, foram colhidos os vistos e cumpre apreciar e decidir.


II) APRECIAÇÃO DO RECURSO E FUNDAMENTOS


1. Admissibilidade e objecto do recurso


1.1. Proferido o acórdão em 1.º grau de jurisdição na Relação, perante o recurso de revisão interposto junto do tribunal que proferiu a decisão a rever no apenso “I” (art. 697º, 1, CPC), é admissível recurso para o 2.º grau de jurisdição de acordo com o art. 697º, 6, do CPC.


Trata-se de um recurso de apelação para o STJ (funcionando este como tribunal de 2.ª instância)1, de acordo com a espécie 4.ª do art. 215º do CPC, em referência ao art. 644º, 1, a), do CPC («cabe recurso de apelação: a) Da decisão, proferida em 1ª instância, que ponha termo à causa ou a procedimento cautelar ou incidente processado autonomamente;»), sem prejuízo de ser interposto, expedido e julgado como recurso de revista.2


1.2. Em face das conclusões que delimitam o recurso em 2.º grau, cumpre decidir:


— sobre a correcção na interpretação e aplicação da lei na decisão de indeferimento – e, portanto, não admissão – do recurso de revisão, à luz do art. 699º, 1, do CPC;


— sobre a condenação em litigância de má fé do Recorrente de revisão.


1.3. Para a reapreciação da primeira questão, não se aplica o regime do art. 643º do CPC, antes o regime dos recursos ordinários, aqui determinado e aplicado.


2. Factualidade


2.1. Releva o que consta do relatório supra.


2.2. No despacho saneador sentença, no tocante à impugnação relativa à “natureza subordinada dos créditos dos cooperadores (identificados na lista definitiva de créditos sob os números: 8, 39, 57, 59, 66, 78, 89, 124, 126, 134, 142, 143, 145, 149 e 159)”, foram considerados assentes os seguintes factos, apropriados em 2.ª instância:


“1. A insolvente é uma cooperativa de habitação económica


2. À data da declaração de insolvência o Conselho de Administração da insolvente era constituído por:


– CC,


– DD,


– FF,


– II,


– AA,


– BB,


– EE,


– JJ.


3. À data da declaração de insolvência o Conselho Fiscal da insolvente era constituído por:


– KK,


– LL,


– MM,


– NN, e


– OO.”


2.3. Ao abrigo do art. 662º, 1, do CPC, o acórdão proferido em 2.ª instância aditou a seguinte materialidade dada como provada:


“A – AA reclamou um crédito sobre a insolvência de € 145.659,01, relativo a contratos promessa celebrados com a insolvente em 12 de Maio de 2006, tendo por objeto os lotes 51 e 23 da Quinta ...,..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração dos contratos.


B – Juntou cópia certificada dos dois contratos datados de 12 de maio de 2006.


C – AA reclamou um crédito sobre a insolvência de € 666.751,72, relativo a contratos promessa celebrados com a insolvente em 17 de novembro de 2008, tendo por objeto as frações B, Q e S do prédio urbano sito no Largo ..., na..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros.


D – Juntou cópia certificada dos três contratos datados de 17 de novembro de 2008.


E – DD reclamou um crédito sobre a insolvência de € 52.637,35, relativo a contrato promessa celebrado com a insolvente em 12 de maio de 2006, tendo por objeto o lote 49 da Quinta ...,..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração do contrato.


F – Juntou cópia certificada do contrato promessa datado de 12 de maio de 2006.


G – CC reclamou um crédito sobre a insolvência de € 110.268,78, relativo a contrato promessa celebrado com a insolvente em 12 de maio de 2006, tendo por objeto o lote 65 da Quinta ..., ..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração do contrato.


H – Juntou cópia certificada do contrato promessa datado de 12 de maio de 2006.


I – BB reclamou um crédito sobre a insolvência de € 37.164,67, relativo a contrato promessa celebrado com a insolvente em 12 de maio de 2006, tendo por objeto o lote 44 da Quinta ..., ..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração do contrato.


J – Juntou cópia certificada do contrato promessa datado de 12 de maio de 2006.


K – FF reclamou um crédito sobre a insolvência de € 410.127,00, relativo a contrato promessa celebrado com a insolvente em 12 de maio de 2006, tendo por objeto o lote 35 da Quinta ..., ..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros.


L – Juntou cópia certificada do contrato promessa datado de 12 de maio de 2006.


M – EE reclamou um crédito sobre a insolvência de € 100.000,00, relativo a contrato promessa celebrado com a insolvente em 12 de maio de 2006, tendo por objeto o lote 31 da Quinta ..., ..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração do contrato.


N – Juntou cópia certificada do contrato promessa datado de 12 de maio de 2006.


O – A declaração de insolvência da Cooperativa H..., C.R.L. foi pedida em juízo em 19/09/2008.


P – A insolvência da Cooperativa H..., C.R.L. foi decretada por sentença de 24/05/2011, transitada em julgado.


Q – Por deliberação de 08/11/2003 foi nomeada a Direção da cooperativa insolvente para o triénio 2004/2006, com a seguinte composição:


PP – Presidente


QQ – Secretário


RR – Tesoureiro


SS - Vogal


TT – Vogal


UU – Vogal


VV – Vogal


WW – 1º suplente


XX – 2º suplente


YY – 3º suplente.


R – Foi registada em 23/01/2007 a deliberação de 02/01/2007, de designação de órgãos sociais da cooperativa insolvente para o triénio 2007/2009, que nomeou a Direção da Cooperativa com a seguinte composição:


BB – Presidente


II – Secretário


DD – Tesoureiro


CC – Vogal


AA – Vogal


EE – Vogal


JJ – Vogal


ZZ – 1º suplente


FF – 2º suplente


AAA – 3º suplente.”


2.4. Chegados ao processo de revisão, o acórdão recorrido elencou a seguinte matéria de facto relevante:

“1 – A declaração de insolvência da Cooperativa H..., C.R.L.foi pedida em juízo em 19/09/2008.

2 – A insolvência da Cooperativa H..., C.R.L. foi decretada por sentença de 24/05/2011, transitada em julgado.

3 – Por deliberação de 08/11/2003 foi nomeada a Direção da cooperativa insolvente para o triénio 2004/2006, com a seguinte composição:

PP – Presidente

QQ – Secretário

RR – Tesoureiro

SS – Vogal

TT – Vogal

UU – Vogal

VV – Vogal

WW – 1º suplente

XX – 2º suplente

YY – 3º suplente.

4 – Foi registada em 23/01/2007 a deliberação de 02/01/2007, de designação de órgãos sociais da cooperativa insolvente para o triénio 2007/2009, que nomeou a Direção da Cooperativa com a seguinte composição:

BB – Presidente

II – Secretário

DD – Tesoureiro

CC – Vogal

AA – Vogal

EE – Vogal

JJ – Vogal

ZZ – 1º suplente

FF – 2º suplente

AAA – 3º suplente.

5 – AA reclamou, em data não concretamente apurada, mas posterior a 07/07/2011 e anterior a 29/09/2011, um crédito sobre a insolvência de € 145.659,01, relativo a contratos promessa celebrados com a insolvente em 12 de Maio de 2006, tendo por objeto os lotes 51 e 23 da Quinta ..., ... reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, à data da celebração dos contratos, conforme requerimento constante como doc. nº 13 do requerimento apresentado pelo Sr. Administrador da Insolvência em 17/06/2021 (refª 39201597), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

6 – Juntou cópia certificada dos dois contratos datados de 12 de maio de 2006.

7 – AA reclamou em data não concretamente apurada, mas posterior a 07/07/2011 e anterior a 29/09/2011, um crédito sobre a insolvência de € 666.751,72, relativo a contratos promessa celebrados com a insolvente em 17 de novembro de 2008, tendo por objeto as frações B, Q e S do prédio urbano sito no Largo ..., na ..., reclamando, com garantia real, correspondente ao dobro das quantias entregues a título de sinal e juros, conforme requerimento constante como doc. nº 12 do requerimento apresentado pelo Sr. Administrador da Insolvência em 17/06/2021 (refª ...97), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.

8 – Juntou cópia certificada dos três contratos datados de 17 de novembro de 2008.

9 – O Sr. Administrador da Insolvência apresentou, no apenso I (reclamação de créditos), em 10/01/2023, o seguinte requerimento (refª ...23):

BBB, na qualidade de Administrador da Insolvência nomeado no âmbito da Insolvência de H..., C.R.L., e o credor AA, vêm informar que alcançaram um acordo com vista à resolução da impugnação dos créditos reclamados por AA.

O acordo prevê que seja reconhecido ao credor AA, um crédito garantido com direito de retenção no valor de € 64.122,85 (sessenta e quatro mil, cento e vinte e dois euros e oitenta e cinco cêntimos), sobre a verba 71 do Auto de Arrolamento e Apreensão, correspondente ao prédio urbano situado na Quinta ... designado por lote 51 descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o n o ...83 da freguesia de ... e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 658.

Quanto ao restante valor reclamado e não considerado como garantido, deverá ser reconhecido como crédito comum.”

Juntou comprovativos do consentimento da comissão de credores.

10 – O ora recorrente AA apresentou, no apenso I (reclamação de créditos), em 11/01/2023, o seguinte requerimento (refª ...79):

“AA, Credor nos autos supra e à margem identificados, vem informar V. Exa. que adere ao requerimento (acordo) apresentado pelo Senhor Administrador de Insolvência quanto ao seu crédito, assim também requerendo a homologação da transação alcançada.”

11 – Em 12/01/2023 foi proferido no apenso I (reclamação de créditos) o seguinte despacho: “Refª ...81 e ...06:

“O Sr. AI, com a anuência da comissão de credores, e o reclamante AA, informam ter chegado a acordo para por termo ao litígio existente entre aquele e a massa, nos termos da transacção que antecede.

Ante o exposto, atento ao objecto da transacção e dos presentes autos, que consubstancia direitos disponíveis, a qualidade dos intervenientes, que para o efeito têm legitimidade, julga-se válida a sobredita transacção e, em consequência, homologa-se a mesma por sentença (cf. artigo 290º, nº4, do Código de Processo Civil), absolvendo-se e condenando-se as partes nos seus precisos termos.

Sem tributação.

Registe e notifique.”

12 – Não foi interposto recurso da decisão referida em 11.

13 – Em 29/03/2023 foi proferida no apenso I (reclamação de créditos), sentença de verificação e graduação de créditos (refª ...78), cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, de cujo relatório consta:

“Por transação homologada a 12.01.2023 no apenso I (reclamação de créditos), celebrada entre o impugnante AA, e a impugnada massa insolvente, foi reconhecido ao identificado credor um direito de retenção no valor de € 64.122,85 sob a verba 71 do auto de apreensão, e um crédito no montante de € 602.628,87, de natureza comum.”

14 – Constando da graduação da mesma sentença:

“W) Pelo produto da venda do bem identificado na verba 71) do auto de apreensão devem pagar-se:

1. Em primeiro lugar, o crédito garantido da Fazenda Nacional referente a IMI.

2. Em segundo lugar, os créditos garantidos por direito de retenção de AA.

3. Em terceiro lugar, o crédito hipotecário.

4. Em quarto lugar, o crédito privilegiado da Segurança Social.

5. Em quinto lugar, rateadamente, os créditos comuns (incluindo o remanescente dos créditos garantidos e privilegiados quanto aos bens sobre os quais não incide a garantia ou privilégio).

6. Em sexto lugar, os créditos subordinados.”

15 – A sentença referida em 13 e 14 foi notificada entre 03/04/2023 e 04/04/2023, não tendo sido, até 23/05/2023, interposto qualquer recurso da mesma.

16 – Foram juntos com o requerimento de recurso extraordinário de revisão, os seguintes documentos, cujo teor aqui se dá por reproduzido:

Doc. n.º 1 – Com certificação de 14/03/2023, fotocópia de contrato de permuta celebrado entre H..., C.R.L., como primeira outorgante e AA e HH, como segundos outorgantes, datado de 11/06/2001, com reconhecimento de assinatura na qualidade de 03/07/2001, nos termos do qual:

- os segundos outorgantes prometem transmitir à primeira outorgante, livre de ónus e encargos um prédio urbano e um prédio rústico, inscritos na Conservatória do Registo Predial de...sob as fichas nº ...48 e ...97 – ... e inscritos na matriz predial urbana sob os arts. 164 e 52-E ..., com pedido de licenciamento para construção de prédios multifamiliares no processo nº 01-528/98 da Câmara Municipal de ..., aprovado por despacho de 16/03/2000; a primeira outorgante comprometeu-se, em contrapartida, a entregar aos segundos outorgantes, livre de ónus e encargos, duas vivendas com três pisos cada, identificadas como vivenda nº 23 e vivenda nº 51, a construir pela primeira outorgante no prédio rústico denominado ..., sito na freguesia do ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha nº ...01 e inscrito na matriz predial respetiva sob o art. 10-D, com pedido de licenciamento de urbanização e construção aprovado no processo nº 02-34/98, conforme oficio nº ...73 de 22/11/2000; mais foi consignado que a escritura de transmissão propriedade dos segundos outorgantes seria efetuada logo que o primeiro outorgante o exija, e que a escritura de transmissão para os segundos outorgantes, das frações a construir serão realizadas no prazo máximo de 90 dias após a obtenção da licença de habitabilidade ou a partir da primeira escritura que seja realizada relativamente às vivendas contíguas, mas nunca depois de cinco anos após a

assinatura deste contrato; convencionaram, finalmente, atribuir ao acordo de permuta a natureza de execução específica de acordo com o art. 830º do CC;

Doc. n.º 2 – Com certificação de 14/03/2023, fotocópia de contrato de permuta celebrado entre H..., C.R.L., como primeira outorgante e AA e HH, como segundos outorgantes, datado de 11/06/2001, com reconhecimento de assinatura na qualidade em data ilegível, nos termos do qual:

- os segundos outorgantes prometem transmitir à primeira outorgante, livre de ónus e encargos um prédio urbano e um prédio rústico, inscritos na Conservatória do Registo Predial de ...sob as fichas nº ...48 e ...97 – ... e inscritos na matriz predial urbana sob os arts. 164 e 52-E ..., com pedido de licenciamento para construção de prédios multifamiliares no processo nº 01-528/98 da Câmara Municipal de..., aprovado por despacho de 16/03/2000; a primeiro outorgante comprometeu-se, em contrapartida, a entregar aos segundos outorgantes, livre de ónus e encargos, e de acordo com a planta e caderno de encargos anexados, duas vivendas com três pisos cada, identificadas como vivenda nº 23 e vivenda nº 51, a construir pela primeira outorgante no prédio rústico denominado ..., sito na freguesia do ..., concelho de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob a ficha nº ...01 e inscrito na matriz predial respetiva sob o art. 10-D, com pedido de licenciamento de urbanização e construção aprovado no processo nº 02-34/98, conforme oficio nº ...73 de 22/11/2000; mais foi consignado que o preço atribuído pelas partes aos imóveis objeto do acordo de permuta é de Esc: 85.000.000$00 (oitenta e cinco milhões de escudos, que a escritura de transmissão propriedade dos segundos outorgantes seria efetuada logo que o primeiro outorgante o exija, e que a escritura de transmissão para os segundos outorgantes, das frações a construir serão realizadas no prazo máximo de 90 dias após a obtenção da licença de habitabilidade ou a partir da primeira escritura que seja realizada relativamente às vivendas contíguas, mas nunca depois de cinco anos após a assinatura deste contrato; convencionaram, finalmente, atribuir ao acordo de permuta a natureza de execução específica de acordo com o art. 830º do CC;

Doc. n.º 3 – Com certificação de 14/03/2023, fotocópia de documento designado “Conta Corrente – Aldeamento da Quinta ..., AA, associado nº ...32, lotes adquiridos lote 51 em 08/10/98, lote 23 em 07/12/99”, do qual constam duas cópias, uma dela contendo rubricas sob o lado superior direito, com o seguinte conteúdo:

(Gráfico constante do acórdão)

Mais constando uma declaração datada de 17/07/2001, com assinatura aposta e não reconhecida, com o seguinte teor:

“Eu abaixo assinado AA sócio nº ...32 da Cooperativa H..., C.R.L., declaro que recebi o valor de Esc: 4.043.568$00 (quatro milhões e quarenta e três mil escudos), referente a devolução relacionada com acerto de contas de acordo com o documento anexo.”

E constando ainda uma cópia da frente de um cheque sacado sobre o Banif, emitido por H..., C.R.L., a favor de AA, no valor de Esc: 4.043.568$00.

Doc. n.º 4 – Com certificação de 14/03/2023, fotocópia de acordo celebrado entre H..., C.R.L., como primeira acordante e AA e HH, como segundos acordantes, datado de 26/09/2002, nos termos do qual:

- para concretizar a permuta acordada no contrato de 11/06/2001 está já marcada escritura de compra e venda dos terrenos propriedade dos segundos acordantes, sendo o preço constante da escritura de € 44.500,00; mais constando que, posteriormente, e nos termos do clausulado no contrato de permuta, a primeira acordante celebrará com os segundos acordantes a escritura da compra e venda das vivendas propriedade da primeira outorgante “sendo certo que nada terá a pagar e que o preço constante em tal escritura será, apenas, uma questão formal.”

Doc. n.º 5 – Com certificação de 14/03/2023, fotocópia de ata nº 83 da assembleia geral de H..., C.R.L. e da respetiva certificação, datada de 01/08/2002, da qual consta:

- ter sido realizada no dia 31 de julho de 2001, tendo como ordem de trabalhos:

Ponto 1 – Leitura e votação da ata da última assembleia geral;

Ponto 2 - Informações a prestar pela direção;

Ponto 3 – Discussão e aprovação das condições em que a cooperativa poderá celebrar um contrato de permuta para aquisição de um lote para a construção de três edifícios;

Ponto 4 – Discussão e aprovação das condições em que a Cooperativa poderá celebrar um contrato de permuta para a aquisição de um lote, digo, de um contrato de financiamento para a construção de 17 fogos na ..., e não um contrato de permuta para aquisição de um lote;

Ponto 5 – Nomeação dos representantes que em nome da Cooperativa outorgarão os contratos de permuta, escritura de aquisição, contratos de financiamento, escrituras notariais, hipotecas e respetivos registos.

Constando da ata terem sido aprovados todos os pontos da ordem de trabalhos, com propostas da direção formuladas quanto aos pontos 4 e 5.

Doc. n.º 6 – Com certificação de 30/03/2023, fotocópia de acordo celebrado entre H..., C.R.L., como primeira outorgante e AA e HH, como segundos outorgantes, datado de 05/06/2006, do qual consta:

“1º

Ambos os outorgantes celebraram em 11 de Junho de 2001 um contrato de permuta pelo qual os segundos outorgantes se comprometeram a transmitir à primeira outorgante o prédio urbano e o prédio rústico inscritos na Conservatória do Registo Predial de... sob as fichas nº ...28 e ...97/..., inscritos na matriz predial urbana, respectivamente, sob o art. 164º e 52-E da freguesia da ....

E, efectivamente, em 9 de Outubro de 2002, no 1º Cartório Notarial de ..., os segundos outorgantes transmitiram para a primeira outorgante, mediante escritura de compra e venda, os referidos prédios.

Porém, o preço não foi pago aos segundos outorgantes, pois que a contrapartida da transmissão de tais terrenos não era qualquer valor monetário, mas sim, conforme estipulado no contrato referido na cláusula 1ª do presente acordo, as vivendas nº 23 e nº 51 a construir pela 1ª outorgante na Urbanização ....

Porém, devido a alteração das circunstâncias nas obras da Urbanização ..., nomeadamente no que se refere ao financiamento para construção, ambos os outorgantes acordam em substituir as ditas vivendas, como contrapartida da transmissão dos terrenos, pela entrega aos segundos outorgantes dos seguintes imóveis:

I – Da Urbanização da Senhora dos Remédios na ...:

a) Do Bloco A, a fração autónoma que vier a corresponder ao rés do chão esquerdo, a que atribuem o valor de 99.719,68 €;

b) Do Bloco C, a fração autónoma que vier a corresponder ao rés do chão direito, a que atribuem o valor de € 114.379,35;

c) Do mesmo Bloco C, a fração autónoma que vir a corresponder ao 1º andar direito, a que atribuem o valor de € 119.826,22.

II – Da Urbanização ...:

Do Lote 4, a loja nº2, com uma área de 79,20 m2, que será vendida aos segundos outorgantes pelo preço que vier a ser acordado em contrato promessa de compra e venda, mas sobre o qual se considera já pago, a título de sinal, a quantia de € 26.544,32.

Os imóveis referidos na cláusula anterior serão entregues aos segundos outorgantes, mediante escrituras de compra e venda, a celebrar no prazo máximo de seis meses após a emissão das respectivas licenças de utilização.

Celebrado em ..., no dia 5 de Junho de 2006 em dois exemplares devidamente assinados e distribuídos pelas partes.”

Doc. n.º 7 – Alvará de licenciamento nº .../2002, emitido pela Câmara Municipal de...

“Nos termos do artigo 21.° do Decreto-Lei n.° 445/91, de 20 de Novembro, é emitido o alvará n.° .../2002 respeitante ao Processo .../1998. em nome de AA, portador do bilhete de identidade n.° ...71, emitido pelos Serviços de Identificação Civil de Lisboa, com o número fiscal de contribuinte ...31, residente em RUA ..., através do qual é licenciada a construção do EDIFÍCIO MULTIFAMILIAR E GARAGENS, que incide sobre o prédio sito em ..., da freguesia de ..., descrito na Conservatória do Registo Predial de ..., sob os n.os ...97, livro B-68, folha 199 e ...48,Jivro 8-100, folha 24v, e inscrito na matriz Cadastral Rústica sob o artigo n.° 52-SECÇÃO E e na matriz Predial Urbana sob o artigo n.° 164 da respectiva freguesia, devendo observar as posturas e regulamentos camarários, a par dos preceitos legais aplicáveis, sob pena de autuação e de o presente alvará lhe ser cassado.

A construção, aprovada por despacho de 27 de MARÇO de 2001, do vereador CCC, exarado no uso da competência subdelegada, e apresenta as seguintes características, conforme projecto anexo, não estando o pedido de licenciamento abrangido pelo n.° 3 do artigo 15.° do Decreto-Lei n.° 445/91, de 20/11.

* N.° de Fogos: 17;

* N.° de Pisos: 3 acima e 1 abaixo da cota de soleira;

* Área de construção: 2737.45m2;

* Volume de Construção: 9620m3;

* Cércea autorizada: Alçados: Principal: 8m; Lateral Esquerdo: 6.8m; Posterior: 8m.

Uso a que se destina a construção: EDIFÍCIO MULTIFAMILIAR E GARAGENS.

Condicionantes de licenciamento: Deverá dar cumprimento aos condicionamentos da Lisboagás. Serviços de Esgotos e CGE(P)-Compagnie Generale des Eaux, conforme fotocópias em anexo.

ESTA LICENÇA É VÁLIDA ATÉ: 16 de Maio de 2003, tendo início nesta data.

Dado e passado para que sirva de título ao requerente e para todos os efeitos prescritos no Decreto-Lei n.° 445/91, de 20 de Novembro, na sua redacção vigente.

(DDD, Arq.)

Registado na Câmara Municipal de..., no livro n.° ..., a folha(s) 83, em ...0.../03.”

Constando do documento a prorrogação até 10/05/2004 e até 06/11/2004, bem como o aditamento do mesmo em 20/04/2005, 04/01/2007 e 10/08/2007.

Doc. n.º 8

Com certificação de 09/10/2002, escritura pública de compra e venda, outorgada em 09/10/2002 no ...º Cartório Notarial de ... por AA e mulher, HH, residentes na Rua ..., como primeiro outorgante e por PP e EEE, como segundo outorgante, na qualidade de presidente e tesoureira e em representação da cooperativa de responsabilidade limitada H..., C.R.L., constando como declarado pelos Primeiros Outorgantes:

“Que, pela presente escritura e pelo preço global de quarenta e quatro mil e quinhentos euros, que já receberam, vendem à Cooperativa, representada pelos segundos outorgantes, os seguintes bens, sitos no lugar e freguesia da ..., concelho de ...:

- Nº1 – Pelo preço de trinta mil euros o prédio rústico composto de terra de semeadura, com a área de novecentos e trinta e sete metros quadrados, denominado “...”, inscrito na respectiva matriz cadastral sob o artigo 52 da Secção E, descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...97, do livro B-sessenta e oito, onde se mostra registada a aquisição a seu favor conforme inscrição número...48 do livro G-cento e dois, sendo de 10,31 € o seu valor patrimonial; e

- Nº2 – Pelo preço de catorze mil e quinhentos euros o prédio urbano destinado a habitação, inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo 164, descrito na dita Conservatória sob o número ...48 do livro B-cem, onde se mostra registada a aquisição a seu favor conforme inscrição cinquenta e nove mil setecentos e quarenta do livro G-cento e dois, sendo de 58,88 € o seu valor patrimonial.”

Mais declararam que não possuem quaisquer prédios rústicos aptos para cultura confinantes com o ora vendido.

Pelos segundos outorgantes foi dito:

“Que para a Cooperativa sua representada aceitam a presente venda nos termos exarados e que os imóveis ora adquiridos se destinam à prossecução dos seus fins sociais.”

3. Fundamentação de direito


3.1. Não admissão do recurso de revisão


3.1.1. No saneador sentença antes referido, o Juiz... do Juízo de Comércio de ... argumentou e fundamentou no sentido de decidir:


“E) Julgo parcialmente procedente a impugnação apresentada por Massa Insolvente de B..., Lda. e em consequência considero os créditos reconhecidos a:


– CC,


– DD,


– FF,


– II,


– AA,


– BB,


– EE,


– JJ,


como créditos com natureza subordinada.”


Fundamentou-se para aqui chegar:


“Alega a impugnante que os créditos dos cooperadores (sócios da insolvente), que exerciam a administração, devem ser reconhecidos com natureza subordinada, por se tratarem de pessoas especialmente relacionadas com a devedora, nos termos do artigo 49º, n.º2, als. a), b) e c) do CIRE.


O artigo 48º do CIRE, define os créditos subordinados, considerando como tal, nomeadamente: a) Os créditos detidos por pessoas especialmente relacionadas com o devedor, desde que a relação especial existisse já aquando da respectiva aquisição, e por aqueles a quem eles tenham sido transmitidos nos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência.


Por sua vez, o artigo 49º do CIRE concretiza quem são as pessoas especialmente relacionadas com o devedor. A explicação para a classificação destes créditos como subordinados consta do preambulo do CIRE “É inteiramente nova entre nós a figura dos créditos subordinados. Trata-se de créditos cujo pagamento tem lugar apenas depois de integralmente pagos os créditos comuns. Tal graduação deve-se à consideração, por exemplo, do carácter meramente acessório do crédito (é o caso dos juros), ou de ser assimilável a capital social (é o que sucede com os créditos por suprimentos), ou ainda de se apresentar desprovido de contrapartida por parte do credor. A categoria dos créditos subordinados abrange ainda, em particular, aqueles cujos titulares sejam ‘pessoas especialmente relacionadas com o devedor’ (seja ele pessoa singular ou colectiva, ou património autónomo), as quais são criteriosamente indicadas no artigo 49.º do diploma. Não se afigura desproporcionada, situando-nos na perspectiva de tais pessoas, a sujeição dos seus créditos ao regime de subordinação, face à situação de superioridade informativa sobre a situação do devedor, relativamente aos demais credores. (…).


Sufragando o entendimento preconizado pelo Acórdão Uniformizador de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça n.º 15/2014, entendemos que a enunciação das circunstâncias que constituem a especial relação com o credor causadoras da subordinação do crédito é taxativa e não meramente exemplificativa, bem como que tais circunstâncias constituem presunções inilidíveis.


No caso, a impugnante invoca o preenchimento das alíneas a), b) e c) do n.º 2 do artigo 49º para qualificar os créditos em causa como subordinados.


A alínea a) considera pessoas especialmente relacionadas com a insolvente pessoa colectiva, “os sócios, associados ou membros que respondam legalmente pelas suas dívidas, e as pessoas que tenham tido esse estatuto nos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência”.


Sendo que, nos termos do artigo 6º, n.º2 do CIRE,“são considerados responsáveis legais as pessoas que, nos termos da lei, respondam pessoal e ilimitadamente pela generalidade das dívidas do insolvente, ainda que a título subsidiário.”


Estas normas devem se conjugadas, concluindo-se que apenas o sócio que responda ilimitadamente pelas dívidas da sociedade em função dessa qualidade, deve ver o seu crédito qualificado como subordinado.


A alínea b) aponta como especialmente relacionadas “as pessoas que, se for o caso, tenham estado com a sociedade insolvente em relação de domínio ou de grupo, nos termos do artigo 21.º do Código dos Valores Mobiliários, em período situado dentro dos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência”.


Finalmente, a alínea c) estipula que são pessoas especialmente relacionadas “os administradores, de direito ou de facto, do devedor e aqueles que o tenham sido em algum momento nos dois anos anteriores ao início do processo de insolvência.”


Para efeitos do CIRE, são considerados administradores, ao abrigo do disposto no artigo 6º, nº 1 “aqueles a quem incumba a administração ou liquidação da entidade ou património em causa, designadamente os titulares do órgão social que para o efeito for competente”


Os créditos expressamente impugnados com este fundamento correspondem aos n.os 8 – KK, 39 – LL, 57 – CC, 66 – DD, 78 – FF, 89 – MM, 124 – II, 126 – AA, 134 – BB, 143 – NN e FFF, 145 – EE, 149 – OO, 159 – JJ.


Estes credores são todos cooperadores da insolvente.


Sendo que, os credores identificados sob os n.os: 57 – CC, 66 – DD, 78 – FF,124 – II, 126 – AA, 134 – BB, 145 – EE, 159 – JJ, eram membros do Conselho de Administração à data da entrada em juízo do processo de insolvência.


E os credores identificados sob os n.os: 8 – KK, 39 – LL, 89 – MM, 143 – NN, e 149 – OO eram membros do Conselho Fiscal.


Apesar da qualidade de cooperadores, e ainda que membros de órgãos da cooperativa, entendemos que não lhes é aplicável, nem a previsão da alínea a), nem a previsão da alínea b).


De facto, conforme estipula o artigo 23º do Código Cooperativo, a responsabilidade dos cooperadores não é ilimitada, pelo que, ainda que estes credores possam ser considerados sócios da insolvente, não respondem ilimitadamente pelas dívidas da sociedade em função dessa qualidade, logo não reúnem os dois pressupostos para que se considerem pessoas especialmente relacionadas com a insolvente nos termos da alínea a).


Quanto à alínea b), reporta-se às relações de domínio, as quais não têm qualquer aplicação ao caso, pelo que não também não poderão ser qualificados como pessoa especialmente relacionada com a insolvente com base nesta norma.


Já quanto ao preenchimento da alínea c), imporá verificar se a estes credores pode ser imputada a qualidade de administradores da insolvente, entendidos como aqueles a quem incumba a administração ou liquidação da entidade ou património em causa, designadamente os titulares do órgão social que para o efeito for competente.”


Nos termos do artigo 27.º do Código Cooperativo são órgãos das cooperativas: “a) a assembleia geral; b) o órgão de administração; c) os órgãos de fiscalização.”


Por sua vez, determina o artigo 47º que “o conselho de administração é o órgão de administração e representação da cooperativa.”


Desta forma, entende-se que os membros do Conselho de Administração da insolvente, a quem incumbia a sua administração, são necessariamente considerados administradores para efeitos do artigo 6º, n.º1 e da alínea c) do artigo 49º, n.º2, do CIRE.


Já aos membros do Conselho Fiscal ou aos demais cooperadores não lhes podem ser imputadas competências de administração, pelo que não integram igualmente esta alínea.


Conclui-se, pois, que os créditos dos credores n.os 57 – CC, 66 – DD, 78 – FF,124 – II, 126 – AA, 134 – BB, 145 – EE, 159 – JJ, membros do Conselho de Administração à data da entrada em juízo do processo de insolvência, devem ser considerados subordinados, ao abrigo da alínea c) do n.º2 do artigo 49º do CIRE.


Já os créditos dos demais cooperadores não são considerados subordinados. (cfr., neste sentido, o Acórdão da Relação de Guimarães, de 07.02.2019, 425/17.2T8VRL-E.G1, in www.dgsi.pt).


Em face do exposto, julga-se, nesta parte, a impugnação de Massa Insolvente deB..., Lda. parcialmente procedente, e consequentemente, consideram-se os créditos de: 57 – CC, 66 – DD, 78 – FF,124 – II, 126 – AA, 134 – BB, 145 – EE, 159 – JJ, como subordinados.”


3.1.2. No acórdão do TRL proferido em 26/4/2022, na parcela pertinente do recurso interposto por «LX Investment Partners III, SARL», que visava reconhecer todos os créditos reclamados nos autos pelo credor AA como subordinados, e não apenas os identificados na lista de credores sob o n.º 126, adicionando-se para esse efeito o crédito n.º 125, foi julgada integralmente procedente tal apelação, mantendo a decisão recorrida “na parte em que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 666.751,72 reconhecidos a AA (nº 125).3


Fundamentou-se para este resultado:


“Para interpretar a decisão recorrida no respetivo contexto, necessitamos de olhar aos elementos dos autos neste particular, deles resultando:


- AA reclamou dois créditos distintos, ambos referentes ao dobro do sinal pago no âmbito de diferentes contratos promessa celebrados com a insolvente (cfr. reclamações juntas pelo Administrador da Insolvência em 17/06/2021),


- os créditos foram listados como comuns (e parte subordinada) na relação do art. 129º do CIRE sob os nos 125 e 126,


- o credor apresentou duas impugnações à lista, sem elementos distintivos entre si (requerimentos ref.as ...78e ...07 de 07/10/2011),


- a impugnação apresentada por massa insolvente de B..., Lda. impugnou a qualificação dos créditos reconhecidos aos cooperadores especialmente relacionados com a insolvente, o que inclui AA, mas sem especificar nomes ou números por referência à lista do art. 129º do CIRE (nº 20 do requerimento ref.ª ...20 de 14/10/2011).


Pese embora as duas referências na fundamentação da decisão recorrida, apenas ao crédito nº 126, pensamos que tal se tratou de um lapso de escrita, certamente causado pela extensão dos autos e que, ponderando a fundamentação de direito, a qual assenta exclusivamente nas funções desempenhadas pela pessoa titular dos créditos, com a decisão que, textualmente classifica (todos) os créditos reconhecidos ao credor como subordinados, sem qualquer discriminação, não sendo de uma clareza cristalina, é seguro que foram qualificados como subordinados todos os créditos reconhecidos ao credor AA, ou seja, sejam os créditos listados sob o nº 125, quer os listados sob o nº 126.” (Sublinhado neste acórdão.)


(…)


“Passando ao recurso interposto por LX Investment Partners III, SARL, a alegação é dirigida no sentido de que todos os créditos reconhecidos ao credor AA, 125 e 126, devem ser considerados subordinados (…).


E o pedido formulado é de que a sentença recorrida seja substituída por outra que reconheça como subordinados todos os créditos reclamados nos autos pelo credor AA, e não apenas os identificados na lista de credores sob o nº 126, mas após conclusão de que a “A decisão recorrida deve, assim, ser substituída por outra que, de forma clara e inequívoca, reconheça como subordinados todos os créditos reclamados nos autos pelo credor AA, e não apenas os identificados na lista de credores sob o n.º 126” – cfr. cls. 6.


Como vimos acima, a decisão recorrida não qualificou como subordinados apenas os créditos reconhecidos a este credor sob o nº 126, embora pudesse ser interpretada dessa forma. O recurso em causa não afirma aliás, que a decisão não abranja todos os créditos, apenas se alegando que pode ser assim interpretada.


Estamos, assim, no limite entre uma apelação e uma retificação, nos termos do art. 614º nºs 1 e 2 do CPC.


Admitindo, como já o fizemos, que a decisão proferida podia ser interpretada como apenas visando o crédito nº 126, embora não seja essa a interpretação mais correta e contextualizada para um destinatário da mesma (nomeadamente o credor que sabe ter reclamado dois créditos e todos os demais que tiveram acesso à lista) compreendemos que a atitude mais cautelosa por parte de um credor com a posição assumida por esta apelante seria sempre a de interpor recurso.


O recurso interposto pode e deve ser apreciado, dado que o recurso do próprio credor AA, como supra explicitado, apenas versou o crédito nº 126, apreciando-se as circunstâncias de facto concretas em relação ao crédito nº 125 e, em sede de mérito apreciando se, neste ponto, a sentença deve ser mantida ou “substituída”.


Teremos em consideração o facto de não ser pedida a revogação da decisão proferida, sendo a substituição peticionada apenas no sentido de mantendo-se o decidido (quanto ao crédito 126) se adicionar expressamente o crédito nº 125.


(…)


Assim, os credores BB, CC, DD, EE e AA, porque membros efetivos da Direção da Cooperativa insolvente desde 02/01/2007, tendo o processo tido início em 19/09/2008 (facto O) da matéria de facto aditada), são para os efeitos do CIRE, pessoas especialmente relacionadas com o devedor.


(…)


Passando aos demais apelantes temos duas situações distintas: os recorrentes BB, CC, DD, EE e AA reclamaram créditos relativos ao dobro do sinal pago em contratos promessa celebrados com a insolvente em 12/05/2006; o credor e apelado AA reclamou também, além daqueles créditos, um crédito relativo ao dobro do sinal pago em contratos promessa celebrados com a insolvente em 17/11/2008, ou seja, durante o período em que era membro efetivo da Direção (e enquanto já pendia o processo de insolvência).


Quanto aos primeiros, BB, CC, DD, EE e AA, este apenas quanto ao crédito nº 126, ficou provado que os respetivos créditos foram constituídos num momento anterior à existência de especial relação com a devedora.


Como melhor referem GGG e HHH “Quanto à al. a), o seu alcance é complementado com o disposto no artigo seguinte que define o leque de pessoas que a lei considera especialmente relacionadas com o devedor tanto nos casos em que este é pessoa singular, como pessoa coletiva, património autónomo ou herança jacente. O que está aqui em causa é, precisamente, a presunção de os atos praticados pelo insolvente, para mais num período vizinho da abertura do processo de insolvência, com pessoas que, por uma razão ou outra, lhe são próximas, tenderem a beneficiá-las. Daí que, se de tais atos resultam créditos, estes, em caso de consumação da insolvência, devem ficar sujeitos a um tratamento menos favorável que a generalidade dos demais. Compreende-se, isso, sem dificuldade, a exigência legal de a relação especial com o devedor insolvente, para ser relevante, ter de existir já à data em que os créditos atingidos são adquiridos.” (sublinhado nosso).


É exatamente, como defendido pelos apelantes, uma exigência legal que, no caso não está preenchida. Os créditos referidos não podem, assim, ser qualificados como subordinados nos termos da al. a) do art. 48º e da al. c) do nº2 do art. 49º do CIRE.


Já não assim quanto ao segundo grupo de créditos reclamados pelo credor AA, listados sob o nº 125, que se referem a créditos constituídos com a celebração de três contratos promessa em 17/11/2008, como já se apontou. No tocante a estes créditos estão preenchidas as três condições acima apontadas: não gozam de privilégio creditório ou hipoteca legal e foram constituídos no período em que o credor era membro efetivo da direção da cooperativa insolvente, existindo, assim, a essa data, especial relação com a devedora.


Relativamente a este crédito deve ser mantido o despacho recorrido, já que se trata de um crédito subordinado.


(…)


A apelação apresentada por LX Investment Partners III, SARL é integralmente procedente, tendo em conta que o pedido formulado era de consideração como subordinado também do crédito listado sob o nº 125, sendo que, quanto ao crédito nº 126, era objeto do recurso interposto por AA, ao qual esta apelante respondeu.


Face à conclusão atingida de que os créditos dos credores recorrentes, à exceção do crédito no montante de € 666.751,72, reconhecido ao credor AA, que reveste a natureza de subordinado, não são créditos subordinados nos termos da al. a) do art. 48º e al. c) do nº2 do art. 49º do CIRE, a revogação da decisão recorrida coloca estes créditos na situação dos demais reclamados como garantidos por direito de retenção, sendo, em consequência, necessária a elaboração dos respetivos temas de prova e conhecimento dos respetivos requerimentos probatórios, o que se determina.”


3.1.3. É sobre este segmento do decidido pelo acórdão do TRL que incide o pedido de revisão por parte do Recorrente, visando a revogação de tal segmento que o desfavorece em relação à natureza subordinada do crédito reconhecido sob o n.º 125.


Debruçando-se sobre ele, o acórdão recorrido não encontrou motivo para revisão, indeferindo, liminarmente e de imediato, o recurso de acordo com o art. 699º, 1, in fine, do CPC.


Vejamos a sua longa fundamentação, com sublinhado no que se considera mais relevante para a argumentação a ter em conta na interpretação da al. c) do art. 696º e na sua aplicação ao caso concreto da pretensão extraordinária do Recorrente.

“Nos termos do disposto no art. 696º nº1 do Código de Processo Civil o recurso extraordinário de revisão interpõe-se de decisões transitadas em julgado – o qual visa combater um vício ou anomalia processual de especial gravidade de entre um elenco taxativamente previsto nas alíneas deste preceito.

Como já ensinava o prof. Alberto dos Reis, “O recurso de revisão apresenta, à primeira vista, o aspecto duma aberração judicial: o aspecto de atentado contra a autoridade do caso julgado. Há uma sentença transitada em julgado, cercada, portanto, da força, do prestígio e do respeito que merecem as decisões que atingiram tal grau de segurança.” [Em Código de Processo Civil Anotado, vol. VI (reimpressão), Coimbra Editora, 1985, pg. 335.]

E buscando a justificação do instituto, prosseguia o saudoso Professor, que estamos perante uma das revelações do conflito entre as exigências de justiça e a necessidade de segurança ou certeza. A sentença pode “ter nascido em circunstâncias tão estranhas e anómalas, que seja de aconselhar fazer prevalecer o princípio da justiça sobre o princípio da segurança.” [Local citado na nota anterior, pg. 336.]

(…)

O recurso extraordinário de revisão visa, assim, reparar um vício ou anomalia processual especialmente grave, de um elenco taxativo, sendo limitados os fundamentos pelos quais se pode atacar uma sentença coberta pelo caso julgado.

Estrutura-se, em fase rescindente, na qual se visa afastar a decisão transitada em julgado, e a fase rescisória, que se segue à anulação daquela decisão.

Os fundamentos do recurso de revisão encontram-se taxativamente [Neste exato sentido cfr. João de Castro Mendes e Miguel Teixeira de Sousa em Manual de Processo Civil, II vol., AAFDL Editora, 2022, pg. 213, Ac. TRG de 11710/2018 (Margarida Sousa) e Ac. STJ de 19/10/2017 (Fernanda Isabel Pereira), disponível em www.dgsi.pt] enumerados no art. 696º do CPC, no qual se estabelece, com interesse para o caso sob apreciação:

«A decisão transitada em julgado pode ser objeto de revisão quando: (…)

c) Se apresente documento de que a parte não tivesse conhecimento, ou de que não tivesse podido fazer uso, no processo em que foi proferida a decisão a rever e que, por si só, seja suficiente para modificar a decisão em sentido mais favorável à parte vencida;»

Percorrendo o requerimento de recurso de revisão verificamos que foi, formal e materialmente invocada como fundamento, a situação prevista nesta alínea c), não cabendo, a demais matéria invocada, em qualquer das demais previsões das várias alíneas do art. 696º do CPC.

Assim, é irrelevante o alegado na primeira parte de 3 da motivação, ou seja, que a decisão revidenda é materialmente injusta, dado que esse não é fundamento de revisão.

Irreleva, igualmente, qualquer putativo incumprimento do princípio do inquisitório, sobre o qual o recorrente elabora profusamente a partir do nº 8 da motivação, tanto porque o art. 11º do CIRE não se aplica no apenso de verificação de créditos como porque esse não é um fundamento de revisão previsto em qualquer das alíneas do art. 696º do CPC.

É, finalmente, totalmente irrelevante como fundamento de revisão o alegado nos nos 48 a 73 do requerimento de recurso de revisão, onde o recorrente, aparentemente de forma subsidiária, alega uma completamente nova causa de pedir, a simulação do negócio de compra e venda celebrado em 2002, aparentemente desistindo da verificação do sinal em dobro e pedindo apenas o valor singelo de € 360.469,56.

Basta percorrer as alíneas do art. 696º do CPC para compreender que o que é ora alegado não encontra ali correspondência – nomeadamente não releva uma eventual falsidade da escritura pública de compra e venda, dado que o documento não baseou a convicção do tribunal e o litigio não assentou sobre ato simulado das partes[;] o recorrente apresentou-se a reclamar créditos que, sob uma perspetiva ou outra, considera ter direito, não sendo a simulação incidente sobre o litigio em causa, uma reclamação de créditos em processo de insolvência, mas antes sobre uma compra e venda que não foi, por qualquer forma, apreciada ou invocada nos autos.

Retomando, como melhor se escreveu no Ac. STJ de 19/10/17 (relatora Fernanda Isabel Pereira):

“O documento a que alude a al. c) do art. 696.º do CPC, para fundamentar a revisão, tem que revestir dois requisitos cumulativos: (i) a novidade (que significa que o documento não foi apresentado no processo onde se proferiu a decisão em causa, seja porque ainda não existia, seja porque, existindo, a parte não pôde dele socorrer-se); e (ii) a suficiência (que implica que o documento constitua um meio de prova susceptível de, por si só, demonstrar ou infirmar facto ou factos relevantes por forma a conduzir a decisão mais favorável ao recorrente).”

O acesso ao recurso de revisão só é, assim, possível quanto não tenha sido possível à parte, objetiva ou subjetivamente, apresentar o documento a tempo de influenciar a decisão revidenda. Já Alberto dos Reis referia serem três as hipóteses:

1ª o documento já existia, mas a parte não tinha conhecimento dele;

2ª o documento já existia, a parte sabia da existência dele, mas não teve possibilidade de o obter;

3ª o documento não existia, formou-se posteriormente ao termo do processo anterior.

No caso concreto, na alegação do requerente, situamo-nos no segundo caso: o requerente sabia da existência dos documentos, estava ciente deles, mas não teve possibilidade de os obter senão em março de 2023 [Cfr. nos 18 a 27 do requerimento de revisão.].

Tendo em conta, desde logo, o facto de terem sido juntos vários documentos, começaremos por analisar os mesmos e o alegado na perspetiva da aferição da novidade.

O cenário fáctico geral traçado é o de que o ora requerente foi membro da Direção da Cooperativa insolvente entre janeiro de 2007, data em que foi eleito e nomeado, e maio de 2011, quando foi declarada, de forma definitiva, a insolvência da sociedade, avultando, ainda que a declaração de insolvência foi requerida em juízo, por credor, em 19/09/2008 (factos nº 1, 2 e 4).

Ainda em sede geral resulta dos factos apurados que reuniu os elementos e reclamou os seus créditos entre maio de 2011 e julho de 2011, ou seja, logo imediatamente após ter perdido a livre disposição e acesso aos bens e arquivos da insolvente, com a respetiva declaração de insolvência (factos nos 5 e 7).

Passemos agora à análise mais detalhada.

Há dois dos documentos juntos – os documentos nos 7 e 8, uma licença de construção emitida em nome do ora requerente e uma escritura pública de compra e venda – que o próprio requerente assume não serem revestidos de novidade.

Assim, a licença emitida em seu nome, o documento nº 7 é assumida como estando na posse do requerente [Cfr. nº31 do requerimento de revisão.] e a escritura pública de compra e venda igualmente [Cfr. nº 39 do requerimento de revisão.], o que aliás confere com o facto de muito dificilmente se poder considerar o requisito de novidade quanto a documentos arquivados em repartições públicas, como as Câmaras Municipais ou os Cartórios Notariais, tal como decidido nos Acs. TRL de 21/10/2021 (Teresa Sandiães) e de 21/02/017 (Manuel Marques).

O facto de virem a ser presentes documentos alegadamente revestidos de novidade combinados com documentos assumidamente não revestidos de novidade como fundamento do presente recurso de revisão será analisado a propósito do requisito da suficiência.

Voltando aos demais documentos (1 a 6) apresentados como existindo previamente, a parte tendo deles conhecimento e não podendo deles fazer uso, deve recordar-se que, dada a natureza excecional do recurso de revisão, tem sido unanimemente considerado, quanto à invocação da al. c) do art. 696º que apenas “quando a parte empregou todos os esforços que estavam ao seu alcance para obter o documento e não conseguiu o seu desideratum” [Alberto dos Reis em Código de Processo Civil anotado, vol. VI, Coimbra Editora, 1985, pgs. 354 e 355.] se verifica a impossibilidade que justifica a revisão.

Assim sendo exige-se ao requerente, que invoca a novidade subjetiva, um ónus acrescido: “no sentido de alegar e provar que diligenciou pela obtenção do documento e que a impossibilidade da sua apresentação não lhe é imputável”. [Ac. TRL de 21/10/2021, já citado, bem como Ac. TRP de 08/06/2022 (Fátima Andrade) e TRP de 30/01/2017 (Nelson Fernandes).] Como se escreveu no Ac. TRC de 07/03/2017 (Jaime Carlos Ferreira) “Na base deste dispositivo está este pensamento: a revisão só é admissível quando não possa imputar-se à parte vencida a falta de produção do documento no processo em que sucumbiu.” Neste exato sentido podemos ainda citar os Acórdãos TRP de 08/06/2022 (Fátima Andrade), de 21/04/2022 (Aristides Rodrigues de Almeida), de 30/01/2017 (Nelson Fernandes), TRL de 21/10/2021 (Teresa Sandiães), TRC de 17/12/2014 (Albertina Pedroso), TRG de 22/04/2021 (Helena Melo), TRG de 24/09/2020 (Maria João Matos), bem como Ac. STJ de 08/06/2021 (Chambel Mourisco).

É a natureza excecional do instituto e o valor da certeza jurídica como pedra angular do sistema de justiça que explicam, não só a natureza taxativa dos fundamentos de recurso, extraordinário de revisão, como o standard de exigência na respetiva apreciação, patente nesta e na demais doutrina e jurisprudência sobre o tema.

Impressiona, desde logo, a total ausência de explicação para a não obtenção dos documentos 1 a 6 – datados de entre junho de 2001 e junho de 2006 e, nas palavras do recorrente, encontradas nos arquivos da insolvente – no larguíssimo período que mediou entre o pedido de declaração de insolvência e a sua declaração (praticamente três anos) e no decurso de todo o qual o recorrente fazia parte da direção da cooperativa insolvente.

Mas, determinante, é o facto de não ser sequer tentada qualquer explicação – cujo ónus lhe cabia – para o não acesso aos documentos no período subsequente à insolvência e até à prolação da decisão revidenda. [O Acórdão revidendo, relativamente aos créditos do ora recorrente qualificados como subordinados, foi proferido em 26/04/2022 e confirmou decisão da 1ª instância de 21/10/2021.]

Compulsado o requerimento de revisão encontramos a seguinte alegação:

“18 Embora desde sempre o Recorrente tenha considerado injusta esta solução, porque sabia estar a partir de premissas e considerações erradas, nomeadamente quanto ao momento da aquisição do seu crédito, o que é verdade é que o Recorrente não conseguia demonstrar uma realidade diversa, nomeadamente por não dispor de prova documental para o efeito.

19 O credor recorrente tinha consciência de ter participado e assinado acordos e outros documentos relevantes mas, embora com a promessa de lhe virem a ser entregues posteriormente pela Cooperativa insolvente, os documentos originais (ou suas cópias) nunca lhe vieram a ser entregues e deles não pôde dispor anteriormente.

20 Ao longo destes anos foram inúmeras as solicitações efetuadas à Cooperativa e, assim que lhe foi permitido, foram inúmeras as buscas efetuadas em dossiers da Cooperativa, infelizmente sem sucesso.

21 De facto, e até ao período compreendido entre 14 e 30/03/2023, os únicos documentos a que tinha acesso e mantinha na sua posse eram uma certidão de uma escritura de compra e venda, projeto e licenças de construção e utilização do prédio que veio a ser implantado nos prédios vendidos, minutas e cópias dispersas e incompletas de alguns documentos, sem que, com eles, conseguisse fazer a prova que lhe incumbia.

22 O Recorrente sabia que originais e cópias de muitos destes documentos (contratos, acordos e outros) existiriam, em arquivo, na sede da sociedade insolvente, o que lhe foi também confirmado por tesoureiros e elementos das diversas direções da Cooperativa.

23 No período de Verão de 2022, o Recorrente obteve autorização do Senhor Administrador de Insolvência para consultar as pastas em arquivo na sede da Insolvente.

24 Pese embora tenha encontrado alguns documentos, como certidões e cópias de pagamentos efetuados, não conseguiu encontrar os documentos comprovativos da assinatura de contratos e acordos em período anterior aquele em que fez parte da direção da Cooperativa, que sabia existir.

25 No entanto, o Recorrente confirmou, junto de elementos das diversas direções da Cooperativa Insolvente que os documentos existiam e não teriam sido destruídos ou inutilizados, o que deu ânimo para a continuação das buscas.

26 Por isso, o Recorrente não desistiu e, a partir de 14 de Março de 2023, com a autorização para o efeito do Senhor Administrador de Insolvência e com a ajuda de seu filho, GG, o recorrente conseguiu encontrar uma pasta com muitos dos documentos que procurava, nomeadamente os seguintes que se afiguram ser de extrema relevância para o que se discute nos presentes autos:

a) Contrato de permuta datado de 11 de Junho de 2001, assinado pela primeiro outorgante cópia certificada que se junta como doc. 1 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais;

b) Contrato de permuta datado de 11 de Junho de 2001, com emenda e anexos (caderno de encargos e projeto de loteamento), assinado pelo segundo outorgante cópia certificada que se junta como doc. 2 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais;

c) Conta corrente aldeamento da Quinta ..., datada de 25 de Junho de 2001, referente a AA Associado n.º ...32 cópia certificada que se junta como doc. 3 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais;

d) Cópia certificada de Acordo datado de 26 de Setembro de 2002 cópia certificada que se junta como doc. 4 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais;

e) Cópia certificada de ata da Assembleia Geral da sociedade insolvente, de 31 de Julho de 2001 cópia certificada que se junta como doc. 5 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais.

27 Em 30 de Março de 2023, o credor recorrente logrou encontrar um outro documento que, na sua ótica, é fundamental para demonstrar a bondade da sua pretensão e a verdade material, o acordo datado de 05 de Junho de 2006 cópia certificada que se junta como doc. 6 e se por reproduzido para os devidos efeitos legais.

28 Documentos estes que, no entendimento do Recorrente, permitem, por si só, a modificação da decisão em sentido que lhe é mais favorável, dado que demonstram, de forma inequívoca, que o crédito do Recorrente é muito anterior ao início das suas funções na Direção da Cooperativa.”

Não é sequer ensaiada qualquer explicação para, em primeiro lugar, não ter consigo cópia de documentos tão relevantes – afinal, o recorrente invoca ter entregue um valioso património, contra uma promessa que desmentiu em documento oficial (a escritura de 2002 na qual declarou ter recebido integralmente um preço que sequer correspondia ao que as partes tinham atribuído aos imóveis), sendo muito pouco crível que não tivesse consigo ao menos uma cópia da promessa inicial de permuta e da conta corrente e declaração de quitação nela inserida.

Quanto ao documento que refere como essencial, o documento nº 6, o acordo de junho de 2006, consta do mesmo, expressamente, que foi “Celebrado em ..., no dia 5 de Junho de 2006 em dois exemplares devidamente assinados e distribuídos pelas partes.”, o que deixa sem explicação a inexistência do segundo exemplar na posse do recorrente, face ao facto de este ter assinado o acordo contendo esta expressa declaração.

É alegado de forma genérica quanto ao período anterior à decisão revidenda que “foram inúmeras as solicitações efetuadas à Cooperativa e, assim que lhe foi permitido, foram inúmeras as buscas efetuadas em dossiers da Cooperativa, infelizmente sem sucesso”. Para o período decorrido entre 2011 e 2021 é tudo o que é alegado.

O recorrente refere que no Verão de 2022 (depois de notificado o acórdão revidendo), o Sr. Administrador da Insolvência deu autorização para a consulta das pastas de arquivo da insolvente, sem nunca referir se antes tal acesso lhe foi pedido e negado ou restringido de alguma forma.

E, a final, os documentos foram encontrados onde o recorrente pensava estarem, pelo menos segundo o que alega, dando-se apenas o caso de só terem sido encontrados no mês de março de 2023, quase um ano depois da prolação da decisão revidenda e no exato mês em que foi proferida a sentença final no apenso de reclamação de créditos [A sentença foi proferida em 29/03/2023.].

Assim, a justificação apresentada reduz-se a os documentos não estarem na sua posse – a cooperativa nunca lhe terá entregue os originais ou cópias (mesmo quando o recorrente fazia parte da direção da cooperativa, em 2008, note-se).

Trata-se de situação a que já Alberto dos Reis aludia [Local citado, pg. 354.], a respeito da hipótese de os documentos já existirem, a parte saber da sua existência e não ter possibilidade de os obter: “A este respeito convém ter presente o disposto nos arts. 552.º e 553.º Se o documento estava em poder da parte contrária devia o interessado socorrer-se do meio facultado pelo artigo 552.º

Se não lançou mão dele, não poderá requerer a revisão;”

É exatamente a situação tratada no ac. TRP de 05/10/2015 (Paula Maria Roberto) “Se os documentos apresentados pelo recorrente com o requerimento de interposição do recurso extraordinário de revisão têm datas anteriores à da propositura da ação principal, o facto de não se encontrarem na sua posse não constitui fundamento ou justificação para a sua não apresentação naquela ação. Se os documentos não se encontravam na sua posse, o recorrente devia ter diligenciado para que os mesmos fossem juntos ao processo pela ora recorrida, conforme lhe é facultado pelo disposto nos artigos 417.º, n.º 1 e 429.º, ambos do C.P.C.”

No caso concreto, o recorrente sabia da existência dos documentos, sabia quem os tinha e onde estavam e limitou-se a alegar que não lhe foram entregues cópias ou os originais (sendo todos eles datados de antes da declaração de insolvência ou mesmo de antes de ela ter sido requerida). Nada fez ao longo de todo o processo, nomeadamente requerendo a apresentação de documento em poder da parte contrária (no caso, da insolvente) para os apresentar ou fazer apresentar.

Aliás, na verdade, no caso concreto resulta que o recorrente não procurou sequer os documentos antes de ter sido proferida a decisão revidenda. Trata-se, verdadeiramente de negligência da sua parte – se eram relevantes e essenciais à sua pretensão, foram muito poucos ou nenhuns os esforços para os produzir (o que poderá estar relacionado com o facto de se tratarem de documentos que demonstrariam factos que não foram alegados, tema que se abordará seguidamente). Como se decidiu, lapidarmente no ac. TRG de 24/09/2020 (Maria João Matos), citando o Ac. STJ de 19/12/2018 (Ferreira Pinto) “Exige-se, para o efeito, «que a parte demonstre que, apesar de ter empregue todos os esforços que estavam ao seu alcance para (…) obter» o documento agora novo, «mesmo assim, não o conseguiu»; e, fazendo-o, concluir-se-á «que se a parte agiu com a devida diligência, com a que lhe era exigível, na obtenção do documento, e não o tendo conseguido, não lhe pode ser imputada a sua não apresentação na ação em que foi proferida a decisão a rever».

Ou, e nas palavras do Ac. STJ de 15/02/2023 (Graça Amaral) “Não se verifica o requisito novidade do documento, na sua vertente subjectiva, se resultar evidenciado no processo que a parte só se dispôs a obtê-lo após o trânsito em julgado da decisão objecto de revisão.”

Em remate, quer em geral, quer em relação a cada um dos documentos, não está verificado o requisito da novidade em sentido subjetivo, dado que a parte não demonstrou – ou sequer alegou – ter empregue de toda a diligência na obtenção prévia dos documentos em causa, preexistentes e cuja localização era conhecida.”.

Mas não só, prosseguindo-se.

“Não deixaremos, ainda assim, de analisar o requisito da suficiência.

Como já se referiu, o documento terá que, por si só, ter a virtualidade de alterar em favor do recorrente o sentido decisório do trânsito em julgado, isto é, terá que ser suficiente para proporcionar vencimento de causa ao vencido.

Como refere Rui Pinto [Em Código de Processo Civil Anotado, Vol. II, Almedina, 2018, pg. 405] isto tem um significado múltiplo: “Em primeiro lugar, o objecto documentado há-de ser composto por factos que integrem a matéria de facto que foi oportunamente alegada em sede de causa de pedir ou de excepção. Não podem, por isso, ser factos alheios ao objecto processual julgado pelo juiz, mas também não podem (ser) factos subjectivamente ou objectivamente supervenientes, ainda que relativos ao litígio (…)”.

O que se prevê na alínea c), previne, citando o Ac. STJ de 19/09/2013 (Fernando Bento) “é a apresentação de um documento novo, não alegação de factos novos e respectiva comprovação documental.”

Trata-se de entendimento uniforme da jurisprudência [Entre outros, podemos citar os Acs. TRC de 20/01/2014 (Arlindo Oliveira), TRG de 10/10/2019 (Amílcar Andrade) e STJ de 22/06/2023 (Maria da Graça Trigo) e STJ de 15/02/2023 (Graça Amaral).] e da doutrina [Ver também João Espírito Santo em Documento e Recurso Cível, 2ª edição, Almedina, 2011, pg. 81] no que tem sido denominado como “requisito de pré-alegação”, assim descrito no Ac. STJ de 22/06/2023 (Maria da Graça Trigo) “a jurisprudência deste Supremo Tribunal tem vindo a propugnar o entendimento, que se acolhe, de que o documento deve visar a demonstração ou a impugnação de factos alegados pelas partes ou adquiridos para o processo que tenham sido essenciais para a decisão de mérito colocada em crise, não podendo em caso algum visar a prova de factos novos – requisito da pré-alegação. Neste sentido, vejam-se os acórdãos de 24-05-2018 (proc. n.º 412/12.7TBBRG-C.S1), de 19-01-2017 (proc. n.º 39/16.4YFLSB) e de 19-09-2013 (proc. n.º 663/09.1TVLSB.S1), disponíveis em www.dgsi.pt.

A impugnação ou a demonstração de factos pré-alegados deve, assim, impor uma alteração da decisão em crise, sendo de rejeitar o recurso sempre que da prova de um facto ou da sua exclusão não resulte uma decisão mais favorável ao recorrente.”

Ou seja, numa primeira aceção o documento novo junto tem que visar a demonstração de factos que haviam sido alegados na instância, não a prova de factos novos.

Estamos ante um apenso declarativo de processo de insolvência, visando a verificação e graduação de créditos sobre a insolvente pelo que o pedido e respetiva causa de pedir constam das respetivas reclamações de créditos.

Nos termos do disposto no artigo 128º do CIRE, no prazo fixado para o efeito na sentença que declara a insolvência, todos os credores da insolvência devem reclamar a verificação dos seus créditos por meio de requerimento, que deve cumprir alguns requisitos de conteúdo e ser acompanhado de todos os documentos probatórios, dirigido ao Administrador da Insolvência e apresentado por transmissão eletrónica de dados, correio registado ou correio eletrónico – nos 1, 2 e 3 do art. 128º do CIRE (na sua redação atual).

O nº 5 do art. 128º do CIRE [Correspondente ao nº3 do art. 128º do CIRE à data do decurso do prazo de reclamação de créditos.] estabelece que «A verificação tem por objeto todos os créditos sobre a insolvência, qualquer que seja a sua natureza e fundamento, e mesmo o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento.»

Da conjugação destas regras com o disposto no art. 90º resulta que a reclamação de créditos é um ónus do credor da insolvência, dado que “do seu exercício depende a satisfação do credor no processo de insolvência.” [Catarina Serra em Lições de Direito da Insolvência, Almedina, 2018, pg. 267.]

(…)

Do regime legal resulta, assim, que o credor pode reclamar ou não reclamar os seus créditos, conformando-se, na hipótese de não os reclamar, com a possibilidade de não serem considerados no processo de insolvência e não poder, neste obter pagamento.

O âmbito do ónus que impende sobre o credor da insolvência abrange quer o pedido, quer a causa de pedir da reclamação de créditos. Ou seja, o credor reclama o crédito que entende deter, com a qualificação que pretende lhe seja atribuída, para tanto alegando os factos que lhe permitam, provados, obter os efeitos pretendidos, verificação de determinado crédito, com uma determinada qualificação e a final, de acordo com aqueles montante e classificação, rateio e pagamento de parte do produto da liquidação da massa insolvente.

Os dados relevantes são, assim, as reclamações de créditos apresentadas pelo requerente e credor nos autos de reclamação.

O credor e ora requerente de revisão escolheu invocar como causa de pedir para a sua reclamação de créditos o incumprimento definitivo de contrato promessa de compra e venda de vários imóveis e absolutamente nada mais. Aliás, era essa a causa de pedir que o habilitava a pedir, como pediu, um crédito correspondente ao dobro do sinal e gozando de direito de retenção.

Recorde-se o que se escreveu no aresto cuja revisão é ora pretendida:

O que podemos verificar das reclamações de créditos apresentadas pelo credor, é o que resulta dos factos elencados sob as letras A a D dos factos aditados:

- a reclamação 126 reporta-se aos créditos relativos ao sinal em dobro pelos contratos promessa dos lotes 51 e 23, sitos na Rua ..., freguesia de ..., datado de 12/05/2006;

- a reclamação de créditos 125 reporta-se aos créditos relativos ao sinal em dobro pelos contratos promessa das frações B, Q e S do prédio urbano sito no Largo ..., na ..., celebrado em 17/11/2008.

Ou seja, o credor não alude, em momento algum das suas alegações à reclamação de créditos que veio a ser listada sob o 125, pelo que o respetivo recurso se delimita à decisão tomada quanto à fração 126.

E nem se diga que ao alegar que todos os pagamentos foram anteriores e apenas os contratos foram formalizados pelos contratos promessa se está a alegar que também quanto aos contratos de 17/11/2008 os pagamentos foram anteriores ao início da especial relação: o credor não reclamou a restituição dos pagamentos feitos ao longo do tempo, o credor reclamou o sinal em dobro devido por incumprimento de contratos promessa celebrados em determinada data. Além disso tal matéria pura e simplesmente nunca foi antes alegada, como resulta dos requerimentos de reclamação de créditos, de impugnação da lista e de resposta à impugnação que o credor apresentou nos autos.”

Foi apenas no recurso que deu origem ao acórdão cuja revisão ora se pretende que, pela primeira vez, são mencionados pagamentos ao longo do tempo e apenas quanto ao contrato promessa outorgado em 12/05/2016.

Vejamos agora os factos resultantes dos documentos ora juntos, na versão do requerimento de revisão (pontos 28 a 45 do referido requerimento):

- no ano de 2001 o recorrente celebrou com a insolvente um contrato de permuta de dois prédios de que era proprietário, prometendo transmitir para esta os referidos dois prédios e esta a entregar-lhe duas vivendas construídas, definidas como as nos 23 e 51;

- como a insolvente não conseguisse financiamento bancário solicitou ao recorrente a realização da escritura de compra e venda dos dois terrenos, declarando recebido o preço;

- foi elaborada uma conta corrente determinando o valor dos terrenos, as contribuições entregues pelo recorrente e este recebeu o excesso que havia pago; ficou estabelecido que a conta seria encerrada com a entrega das duas moradias;

- a insolvente pediu um empréstimo dando como garantia os terrenos em causa, cuja escritura de compra e venda se deu em outubro de 2002, declarando o recorrente o recebimento integral do preço;

- em maio de 2006 são celebrados os contratos promessa relativo às duas moradias com o recorrente e a generalidade dos demais contratos promessa com os cooperantes [Trata-se de matéria resultante dos autos e que para facilidade de compreensão se intercala na matéria alegada pelo recorrente, que omitiu, no requerimento de revisão, este facto.];

- em junho de 2006, porque a recorrente não construiu as moradias, é celebrado com o recorrente um novo acordo “em que a Insolvente reconhece a sua incapacidade para construir as 2 moradias, fazendo substituir as moradias por três frações autónomas da Urbanização ..., na ..., a saber: do bloco A, fração correspondente ao R/C Esq., a que atribuem o valor de 99.719,68; do bloco C, fração correspondente ao R/C Dto., a que atribuem o valor de 114.379,35; do bloco C, a fração correspondente ao 1.º andar direito, a que atribuem o valor de 119.826,22” [Nº 41 do requerimento de revisão.] “E da Urbanização ... (lote 4, loja n.º 2, com a área de 79,20), em relação à qual consideram ter sido pago o valor de 26.544,32.” [Nº 42 do requerimento de revisão.]

- em 17 de novembro de 2008 foram celebrados entre a insolvente e o recorrente três contratos promessa, tendo por objeto as frações B, Q e S do prédio urbano sito no Largo ..., na ... [Trata-se de matéria resultante dos autos e que para facilidade de compreensão se intercala na matéria alegada pelo recorrente, que omitiu, no requerimento de revisão, este facto.]

- as escrituras de compra e venda não vieram a ser realizadas.

Da comparação entre os factos alegados na reclamação de créditos com os factos agora alegados como resultantes dos documentos resulta com clareza que se tratam, todos estes, de factos novos, que nunca foram alegados em qualquer momento enquanto o processo pendeu em primeira instância.

Pretende agora o recorrente que o crédito que reclamou é o crédito relativo ao contrato promessa de 2008, mas que a sua contraprestação tem origem em negócio celebrado antes de revestir a qualidade de membro da direção da cooperativa insolvente.

A opção a tomar era ao tempo da reclamação de créditos e não agora, depois de transitadas em julgado todas as decisões relativas ao crédito que reclamou. O aqui recorrente tinha, em 2011, duas opções: ou reclamava o seu crédito adveniente do contrato promessa de permuta de 2001, explicando todo o percurso, incluindo a declaração de recebimento do preço da escritura de 2002 e pedia que a insolvente apresentasse os documentos, se deles não dispunha; ou reclamava um crédito relativo ao contrato promessa de 2008, reclamação mais linear e cujas hipóteses de sucesso quanto ao reconhecimento do sinal em dobro eram bastante mais altas.

Tomou uma das opções e não pode ora desfazê-la mediante a alegação de todo um acervo de novos factos, que nunca foram considerados nem julgados ao longo de todo o processo que, enquanto tal, não são fundamento de recurso de revisão.

Num segundo sentido do requisito da suficiência, e continuando a seguir a lição de Rui Pinto [Local citado, pg. 406.], “o novo meio de prova há-de ser suficiente para alterar a decisão sem a necessidade de outros meios de prova para alterar a situação de facto emergente da sentença a rever.

Terá que se tratar de um documento que em si tenha tal força probatória que, por si só, altere a decisão a rever. Neste sentido, se pronunciou o STJ no acórdão de 02-06-2019 (proc. n.º 13262/14.7...), afirmando, a este propósito, que “o fundamento previsto na al. c) do art. 696.º do NCPC refere-se a um documento escrito dotado de força probatória plena que seja suficiente para, por si só (alheando-se assim da margem de apreciação do julgador – trata-se de um julgamento produzido pela lei, embora com reflexo na matéria de facto), destruir a prova em que se fundou a decisão.”.

No caso concreto o recorrente invoca uma conjugação de quatro documentos que alega serem subjetivamente novos e de dois documentos que não são novos, objetiva ou subjetivamente. Mais invoca factos que não resultam de qualquer dos documentos por si só – por exemplo, que não recebeu o preço declarado como recebido na escritura pública de 2002. Se já uma combinação de documentos novos (que, como vimos, na verdade não revestiam essa caraterística) é de duvidosa integração na alínea c) do art. 696º do CPC, a conjugação de documentos novos e não novos (na própria alegação do requerente da revisão) permite afastar a verificação da suficiência nesta vertente.

Finalmente, “o documento há-de ser relevante de modo essencial ou decisivo para a pretensão do vencido.” [Rui Pinto, local citado.]

Neste ponto há dois aspetos a realçar.

Em primeiro lugar, sendo certo que o ora recorrente foi vencido no recurso que deu origem à decisão revidenda, não havendo dúvidas sobre a respetiva legitimidade para o presente recurso extraordinário de revisão, há que notar as circunstâncias especiais do recurso em causa, explicitadas no acórdão revidendo e transcritas pelo próprio recorrente no requerimento de revisão.

A alínea f) da decisão, única em causa neste recurso de revisão, julgou procedente um recurso interposto por LX Investment Partners III, SARL pedindo seja a sentença recorrida substituída por outra que reconheça como subordinados todos os créditos reclamados nos autos pelo credor AA, e não apenas os identificados na lista de credores sob o n.º 126.

O credor havia reclamado dois créditos diversos, listados na relação do art. 129º como nos 125 e 126.

O tribunal, delimitando o âmbito do recurso e também do recurso interposto pelo próprio recorrente concluiu que a decisão recorrida havia qualificado ambos os créditos reconhecidos ao credor AA como subordinados, que o credor AA apenas tinha recorrido da decisão proferida quanto ao crédito nº 126 e que o recurso de LX, SA se continha no pedido de manutenção da decisão recorrida quanto ao crédito n°125, com expressa menção.

O que significa – e pensou-se ter ficado claro com a passagem transcrita pelo ora recorrente – que ninguém pediu, quanto ao crédito nº 125, aquele que foi objeto da decisão constante da alínea f) da decisão revidenda e que ora se pretende rever, que o crédito fosse qualificado como comum, privilegiado ou garantido. Ao julgar procedente o recurso o tribunal declarou expressamente ser o crédito subordinado (tendo fundamentado de mérito tal decisão), mas, se julgasse o recurso improcedente tal acarretaria que se mantinha a decisão recorrida quanto ao crédito nº 125 (quanto ao crédito 126 houve decisão expressa quanto a outro recurso) ou seja, o crédito era subordinado, havendo, porém, que, para atingir tal conclusão, interpretar os respetivos fundamentos.

Não nos parece que no âmbito do recurso que deu origem à decisão revidenda, face ao disposto no art. 635º nº5 do CPC, fosse possível que a decisão a rever pudesse ter “desqualificado” o crédito nº 125 por forma a permitir a discussão de se seria um crédito garantido por direito de retenção.

O que, tem na seguinte sede esta consequência: o recorrente pretende obter com o recurso de revisão um efeito jurídico que não poderia obter com a decisão revidenda, exclusivamente por inércia da sua parte – podia ter ele próprio recorrido do despacho saneador sentença, ciente de que havia reclamado dois créditos, ou lançado mão do disposto no art. 636º do CPC relativamente ao recurso interposto por LX Investment Partners.

O segundo aspeto, e que já referimos ad nauseam dado que os requisitos que vimos enunciando são cumulativos, deriva diretamente do facto de os documentos se reportarem a factos não previamente alegados: tendo o recorrente apenas alegado, porque assim o escolheu fazer, ter celebrado três contratos promessa em 17/11/2008 e o respetivo incumprimento definitivo, nenhum destes documentos altera qualquer dos factos dados como provados porque não se referem a nenhum deles. Nenhum destes documentos altera, de forma essencial ou decisiva o facto dado como provado de que foram celebrados contratos promessa de compra e venda em novembro de 2008, quando o recorrente era membro da direção da cooperativa.

A antiguidade do crédito não define o negócio jurídico que o recorrente escolheu invocar como causa de pedir da sua reclamação de créditos nem altera essa causa de pedir.

Ou seja, o recorrente, provavelmente ciente que só por via dos contratos promessa de 2008 poderia continuar a pretender ter um crédito correspondente ao sinal em dobro e garantido por direito de retenção (e consequentemente discutir tal matéria) pretende, por via do recurso de revisão atingir dois objetivos inconciliáveis entre si: ter um crédito originado em contrato promessa celebrado em 2008, mas valorar, não o contrato promessa de 2008, mas antes a antiguidade da respetiva prestação, originada num negócio de 2001, concretizado em 2002.

Concluindo-se:

“(…) não se verifica nenhum dos requisitos necessários à procedência do presente recurso de revisão, nos termos da alínea c) do art. 696º do CPC, dado que os factos alegados não preenchem os pressupostos da revisão: os documentos invocados não são dotados de novidade, objetiva ou subjetiva e não são suficientes para permitir a conclusão de que, previamente apresentados, levariam o tribunal a uma decisão diversa da atingida na decisão cuja revisão ora se pretende.

Resta referir que, face ao disposto no art. 699º nº1 do CPC, atingida a conclusão supra, o recurso extraordinário de revisão deve ser liminarmente indeferido, não cabendo prévio contraditório ou proferir qualquer tipo de convite ao aperfeiçoamento.”

3.1.4. Pela bondade e completude do que se exarou no acórdão recorrido, em especial no que toca aos requisitos de preenchimento da al. c) do art. 696º do CPC, relativos à novidade (objectiva e subjectiva) e à suficiência, com acolhimento da doutrina mais autorizada e da jurisprudência a seguir (nomeadamente do STJ), não vemos como deixar de sufragar o acórdão recorrido, remetendo para a sua fundamentação nos termos do art. 663º, 5, do CPC, ex vi arts. 679º e 697º, 6, do CPC.


Nomeadamente, é de salientar a coerência com os critérios de decisão no (recentemente) julgado pelo Ac. do STJ de 15/2/2023, proferido nesta 6.ª Secção4:


“(…) o STJ tem vindo a considerar que a apresentação de documento só será admissível quando o mesmo, por si só e sem o apelo a demais elementos de prova, seja capaz de destruir o juízo probatório realizado em sede da decisão revidenda, impondo uma decisão mais favorável ao recorrente, sempre que este não tenha podido fazer uso dele por desconhecimento da sua existência, ou pela sua objectiva inexistência.


Este fundamento exige, assim, a presença de dois requisitos de verificação cumulativa: a novidade do documento (não ter sido apresentado no processo no qual foi proferida a decisão, quer por não existir, quer por a parte não poder dele dispor) e a suficiência do mesmo (ser susceptível de levar a uma alteração do decidido objecto de revisão, impondo decisão mais favorável).


Tem vindo a ser igualmente entendido por este tribunal, que tal documento se reporte à demonstração ou a impugnação de factos pré-alegados pelas partes, ou adquiridos para o processo (não podendo visar a prova de factos novos), que tenham sido essenciais para a decisão de mérito colocada em crise e imponham a sua alteração, sendo de rejeitar o recurso sempre que da prova de um facto ou da sua exclusão não resulte, por si só, uma decisão mais favorável ao recorrente.”


Não resta dúvida que o acórdão recorrido seguiu estes princípios de interpretação e aplicou adequadamente o apertado regime que permitiria afastar o primado da intangibilidade do caso julgado neste processo, com rigor no exame da sucessão negocial que eclodiu na celebração dos contratos-promessa de 17/11/2008.


É quanto basta para fazer decair as Conclusões 1. a 54. do Recorrente.


3.2. Da litigância de má fé do Recorrente


3.2.1. O acórdão recorrido condenou oficiosamente o Recorrente por litigância de má fé na interposição da presente revisão extraordinária de acórdão transitado, o que mereceu, incidentalmente, a impugnação do Recorrente; o que é assegurado pelo art. 542º, 3, do CPC5.


Após descrição do regime legal do art. 542º do CPC, discorreu assim o acórdão recorrido:

“Resulta de todo o recurso de revisão, em especial de 10, 11, 12, 26 e 44 que o credor sabia, quando reclamou créditos neste processo de insolvência, que tinha celebrados dois contratos promessa de compra e venda em 12/05/06 e que em 05/06/2006 acordou substituir os bens prometidos vender por outros, relativamente aos quais celebrou novos contratos promessa, em 2008, quando já fazia parte da direção da cooperativa (e já pendia em tribunal o pedido de declaração de insolvência da mesma).

Alega agora o credor, para efeitos de recurso extraordinário de revisão, que sabia, desde 5 de junho de 2006, que os contratos promessa celebrados em 12 de maio de 2006, correspondentes a “execução” de um primeiro contrato promessa nunca alegado (o contrato inicial de promessa de permuta celebrado em 2001) que tinham por objeto as vivendas 51 e 23 da urbanização ..., foram “substituídos” pela promessa de compra e venda de três frações autónomas e uma loja da urbanização ..., na ....

Provavelmente apercebendo-se da fraca consistência jurídica do acordo constante do doc. n° 6, em 17/11/2008, dois meses depois de ter sido pedida em juízo a insolvência da cooperativa e quando o recorrente era membro da respetiva direção, celebra novo contrato promessa de compra e venda tendo por objeto aquelas três frações autónomas da urbanização ... (B, Q e S), sem qualquer menção ao contrato promessa de 12/05/2006 e à “substituição” acordada em 05/06/2006.

Em 2011, ciente do acordo de 05/06/2006, o credor opta por reclamar dois créditos distintos, baseados nos dois grupos de contratos promessa de compra e venda, pedindo, por cada um deles, sinal em dobro e o reconhecimento como garantido por direito de retenção, respetivamente sobre as vivendas nos 51 e 23 e sobre as três frações autónomas da urbanização ....

Para nós é bastante evidente que é esta a verdadeira razão para que estes documentos, nomeadamente o documento nº 6, apenas tenham sido trazidos a juízo após o trânsito em julgado da sentença proferida em 1a instância.

Este documento, que o recorrente admite expressamente conhecer e cujo acordo admite ter celebrado, não lhe permitia reclamar qualquer crédito relativo ao contrato promessa de compra e venda de 12/05/06 (vivendas n°51 e 23), dado que o "sinal" passou a assumir essa função em relação à promessa de compra e venda de três frações (e uma loja), pelo que, no mínimo, dificilmente haveria detenção e direito de retenção por parte do recorrente relativamente às vivendas 51 e 23, dois imóveis que já não eram os que lhe tinham sido prometidos vender, porque substituídos.

É indiscutível que os contratos promessa de compra e venda de 2008 não contêm qualquer referência aos contratos promessa de 12/05/2006. Mas é também claro que tudo o que vem exposto agora, assumidamente, não permitiria que fossem reclamados, verificados e graduados dois créditos "somados" pelos contratos promessa de maio e pelos contratos promessa de junho de 2006.

Note-se que, independentemente da respetiva qualificação como garantidos, comuns ou subordinados, todos os créditos reclamados foram verificados.

Só depois de transitada em julgado a sentença que lhe reconheceu parcialmente um crédito garantido com base num dos contratos promessa de 12/05/2006 é que o recorrente junta estes documentos e alega estes factos que implicam a insubsistência dos contratos promessa de 12 de maio de 2006.

Aliás, não deixa de ser significativa a total ausência de explicação, nas alegações de recurso de revisão, para a opção tomada quanto à reclamação de créditos com base nos contratos de maio de 2006, que veio a ser julgada procedente em parte quanto à qualificação dos créditos como garantidos.

Resultam, quanto a nós do acervo de documentos e alegações produzidas, limpidamente as seguintes conclusões:

- Em 2011, quando apresentou duas reclamações de créditos distintas, o credor sabia que estava a reclamar créditos a que não tinha direito e, com ou sem documentos, omitiu factos relevantes para a decisão das reclamações de créditos que apresentou, preenchendo, assim, a previsão das alíneas a) e b) do n°2 do art. 542° do CPC;

- Em 2023, quando viu reconhecido, por sentença transitada em julgado [Apesar da descoberta dos documentos se ter dado, na alegação do recorrente, em março, a revisão apenas vem a ser pedida em 04/05/2023.] como parcialmente garantido um crédito a que sabia não ter direito, lança mão deste instrumento excecional, um recurso extraordinário de revisão, para tentar ainda discutir apenas o segundo crédito reclamado, já definitivamente reconhecido e qualificado como subordinado, o que corresponde a um uso manifestamente reprovável do processo, com o fim de conseguir um objetivo ilegal, preenchendo, assim, também a título doloso, a al. d) do n°2 do art. 542° do CPC.

Consequência da conceção da litigância de má fé como análise da integralidade do comportamento da parte é a de que pode este tribunal, na presente sede (e observado que foi o contraditório), oficiosamente conhecer da litigância de má fé que tenha sido cometida e não censurada no processado em 1ª instância.


(…)

Diríamos mesmo que o caso presente é exemplar, no sentido em que, apenas com a interposição do recurso de revisão foi possível alcançar a situação de litigância de má fé anterior, ou seja, a apresentação de reclamações de créditos pela forma como foram efetuadas.

Aqui chegados resta determinar o montante da multa a aplicar ao recorrente, nos termos do disposto no nº 1 do art. 542º do CPC e dos nos 3 e 4 do art. 27º do RCP.

Porque se trata de uma condenação oficiosa, em procedimento que terminou por indeferimento liminar, não há lugar a indemnização à parte contrária, que sequer chegou a ter intervenção nos autos.

Estabelece-se naquele último preceito citado que, nos casos de condenação por litigância de má-fé a multa é fixada entre 2 e 100 UCs, devendo ser fixada pelo juiz tendo em consideração os reflexos da violação da lei na regular tramitação do processo e na correta decisão da causa, a situação económica do agente e a repercussão da condenação no património deste.

Pese embora observado o contraditório relativamente à possibilidade de condenação do recorrente como litigante de má-fé, este optou por nada alegar, quanto às suas condições económicas específicas, pelo que a decisão será tomada com respeito pelos demais critérios previstos por lei.

A conduta surpreendida – reclamação de crédito a que sabia não ter direito e revelação nos autos, para tentar obter um pagamento superior por via de outro crédito, de documentos que o demonstram apenas após trânsito em julgado da decisão que verificou e graduou aqueles primeiros créditos – não teve efeitos nefastos na tramitação do apenso de reclamação de créditos e, na presente sede, apenas originou a tramitação patente nos autos: – contraditório e decisão do coletivo.

A gravidade da conduta e o elevado grau de ilicitude patenteia-se na circunstância de que, em reclamação de créditos em insolvência, sendo, por definição, o produto da liquidação insuficiente para satisfazer todos os créditos de todos os credores, cada cêntimo que se logre verificar e graduar injustamente para um credor, corresponde a um cêntimo a menos para todos os demais e legítimos credores.

A insolvente era uma cooperativa de habitação e o recorrente foi mesmo membro da respetiva direção e cooperante por largos anos, pelo que estava subjetivamente ciente desta realidade e de que, ao agir como agiu prejudicava os demais cooperantes e todos os demais credores. Queremos com isto significar que não se tratava, para o recorrente, de uma realidade abstrata e distante. O recorrente conhece pessoalmente vários dos demais credores e conhecerá, dadas as funções que exerceu, a posição dos demais.

Alcançou, em parte, os seus intentos, ao lograr o reconhecimento parcial, como garantido sobre imóvel prometido vender posteriormente substituído, de um crédito originado por contrato promessa insubsistente.

Não temos notícia nestes autos que tenha sido requerida a correção do aparente lapso da sentença proferida no apenso de verificação e graduação de créditos, quanto à menção da graduação como comum de crédito já considerado verificado por acórdão desta relação, transitado em julgado.

Mas uma vez que tal sentença transitou em julgado sem recurso, trata-se de questão que pode ser apreciada a qualquer momento, oficiosamente, nos termos do disposto no art. 614º nº 3 do CPC, pelo que este tribunal irá transmitir os elementos necessários para que o tribunal de primeira instância, caso o entenda, valore os elementos dos autos e a posição assumida pelo aqui recorrente no contraditório exercido quanto à litigância de má-fé.

De resto, vistos os termos da transação, não sendo expressos, referem-se apenas a "um acordo com vista à resolução da impugnação dos créditos reclamados por AA", que não abrange os créditos cuja impugnação já não subsistia, por ter sido definitivamente decidida pelo despacho saneador sentença confirmado por acórdão desta Relação, que os havia classificado como subordinados.

Assim, nesta parte, não se surpreende na conduta do requerente qualquer indício de má fé, dado que, pese embora devesse, notificado da sentença, ter requerido a respetiva retificação, tal omissão está em condições de ser suprida como já se referiu.

Tudo visto e ponderado, atendendo a que o requerente agiu com dolo, preencheu, com a sua conduta, três das tipificações previstas no art. 542° nº 2 do CPC, logrou parcialmente os seus intentos e revelou uma especial indiferença para com o resultado das suas ações e para com o prejuízo que delas poderia resultar para os demais credores, entende-se adequado a aplicação de uma multa no valor correspondente a 30 UCs.”

3.2.2. Também aqui vemos que o acórdão recorrido aplicou com acerto o regime do art. 542º do CPC, uma vez que, em consonância com o antes argumentado, se vê de forma manifesta e flagrante uma actuação processual dolosa por parte do Recorrente ao lançar mão deste recurso extraordinário e ao evidenciar neste recurso a sua actuação processual no anterior âmbito da reclamação de créditos.


Com efeito, afigura-se-nos que, no seu conjunto de actuações – no apenso “I” e neste recurso de revisão –, litiga substancialmente com a culpa qualificada que a lei exige, com violação grave dos deveres de cooperação, boa fé processual e correcção recíproca (arts. 7º, 1, 8º e 9º, 1, CPC) na sua relação com as partes e com o Tribunal, susceptível de desencadear a forte sanção punitiva que o CPC reserva para comportamentos abusivos e ilegítimos em sede adjectivo-processual6 e – inclusivamente no caso – mobilizada oficiosamente pelo tribunal recorrido.


O Recorrente infringiu com desconsideração manifesta e grosseira esses deveres, de forma pré-ordenada a violar a lisura processual em aproveitamento da aparelhagem legal que considerou poder acudir às suas pretensões creditórias, tal como foi surpreendido pelo acórdão recorrido com detalhe e pormenor reveladores de uma censura manifesta.


Assim, sufragamos a fundamentação, nos termos do art. 663º, 5, do CPC, ex vi art. 679º, e julgamos adequada e razoável a multa arbitrada (de acordo com os critérios do art. 27º, 4, do RCP).


Falecem, pelo exposto, as Conclusões 55. a 70.


III) DECISÃO


Em conformidade, acorda-se em julgar totalmente improcedente a apelação junto do STJ, tanto quanto ao indeferimento liminar da revisão, como quanto à condenação em litigância de má fé do Recorrente, confirmando-se na íntegra o acórdão recorrido.


Custas da apelação pelo Recorrente, determinando-se o montante devido pelo incidente da condenação da litigância em má fé em taxa de justiça no valor correspondente a 3 UCs.


STJ/Lisboa, 30/11/2023


Ricardo Costa (Relator)


António Barateiro Martins


Maria Olinda Garcia


SUMÁRIO DO RELATOR (arts. 663º, 7, 679º, CPC).

_____________________________________________

1. Para “lugar paralelo”, com analogia recursiva evidente, ver o previsto para as acções de indemnização/regresso contra magistrados judiciais (arts. 967º e ss do CPC), em que, tratando-se de juiz desembargador e competindo à Relação julgar em 1.ª instância, há recurso de apelação para o STJ, nos termos do art. 974º, 1, do CPC (neste sentido, v. AMÂNCIO FERREIRA, Manual dos recursos em processo civil, 9ª ed., Almedina, Coimbra, 2009, págs. 197-199, PINTO FURTADO, Recursos em processo civil (de acordo com o CPC de 2013), Nova Causa – Edições Jurídicas, Braga, 2017, pág. 68, FRANCISCO FERREIRA DE ALMEIDA, Direito Processual Civil, Volume II, 2ª ed., Almedina, Coimbra, 2019, págs. 517, 592 e nt. 1171).↩︎

2. Em suma, com sintetizam JOSÉ LEBRE DE FREITAS/ISABEL ALEXANDRE, “Artigo 215º”, Código de Processo Civil anotado, Volume 1.º, Artigos 1.º a 361.º, 4.ª ed., Almedina, Coimbra, 2018, pág. 426: “[o] Supremo julga em apelação o recurso das decisões proferidas pela Relação em 1.ª instância (art. 644-1)”.↩︎

3. Simultaneamente, o recurso de apelação interposto por Mário Luís Reis Gonçalves quanto ao crédito relacionado sob o n.º 126 foi julgado integralmente procedente, revogando-se a decisão recorrida que considerou como créditos de natureza subordinada os créditos no montante de € 145.659,01 reconhecidos a Mário Luís Reis Gonçalves e fazendo prosseguir os autos para a determinação da natureza desse crédito (alíneas h) e i)).↩︎

4. Processo n.º 25776/19.8T8LBS.L1-A.S1, Rel. GRAÇA AMARAL, in www.dgsi.pt.↩︎

5. V. Ac. do STJ de 11/7/2023, processo n.º 10972/10.1TBVNG.P2.S1, Rel. RICARDO COSTA, in www.dgsi.pt.↩︎

6. ANTÓNIO MENEZES CORDEIRO, Litigância de má-fé, abuso do direito de ação e culpa in agendo, 3.ª ed., Almedina, Coimbra, 2016, pág. 207, ABRANTES GERALDES/PAULO PIMENTA/LUÍS PIRES DE SOUSA, “Artigo 542º”, Código de Processo Civil anotado, Vol. I, Parte geral e processo de declaração, Artigos 1.º a 702.º, Almedina, Coimbra, 2018, págs. 593, 594.↩︎