Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
2702/15.8T8VNG-C.P1.S3
Nº Convencional: 2.ª SECÇÃO
Relator: ISABEL SALGADO
Descritores: MATÉRIA DE FACTO
PODERES DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA
LIVRE APRECIAÇÃO DA PROVA
PROCESSO DE PROMOÇÃO E PROTECÇÃO
MEDIDA DE CONFIANÇA COM VISTA À FUTURA ADOÇÃO
INTERESSE SUPERIOR DA CRIANÇA
FILIAÇÃO BIOLÓGICA
PROGENITOR
LEI DE PROTEÇÃO DE CRIANÇAS E JOVENS EM PERIGO
RESPONSABILIDADES PARENTAIS
PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE
PRINCÍPIO DA ATUALIDADE
Data do Acordão: 07/04/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA
Sumário :
I. A mãe da BB beneficiou de sucessivas oportunidades para assumir a maternidade responsável e, a construção de condições de vida para assegurar a confiança da filha; não tendo logrado inverter o quadro inicial de perigo para a menor, durante seis anos, não se antevê provável que tal suceda no futuro.

II. Não pode o tempo da menor, que “não é o tempo dos adultos”, parar até que a mãe altere o seu padrão de vida, sem a sujeitar à permanente instabilidade, ou à revelada incapacidade parental para constituir uma família que integre e proteja a filha.

III. Na adopção, em ordem à satisfação do interesse superior da criança, na articulação entre a preservação da criança em perigo no seio da família biológica e, o princípio da prevalência da família, terá de ceder quando se configurar situação em que os progenitores, por acção ou omissão, colocam em causa e fazem perigar a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o são desenvolvimento da criança.

Decisão Texto Integral:

Acordam os Juízes no Supremo Tribunal de Justiça

I. Relatório

1. O Ministério Público intentou processo para promoção dos direitos e proteção da criança BB, nascida em ... de ... de 2013, filha de CC e de AA, por a mesma se encontrar em situação de perigo.

2. Por decisão proferida em 15 de julho de 2016, foi aplicada a favor da menor BB a medida, provisória, de confiança da mesma à Segurança Social ..., com vista a seu encaminhamento familiar, pelo período de seis meses e a executar de imediato, até à identificação de família idónea.

3. Não tendo sido possível obter o acordo dos pais da criança, encerrada a instrução, procederam-se às notificações de lei. Realizado o debate judicial, produzida as provas, o tribunal, integrando juízes sociais, proferiu em 29.06.2017, o acórdão com o seguinte dispositivo: “A) - Aplicar à criança BB, a medida de promoção e de protecção de "acolhimento familiar", pelo período de seis meses, prevista no artigo 35. °, n.º 1, alínea e), da LPCJP.B) - Paralelamente à medida de "acolhimento familiar", o CDSS, através da EMAT, em colaboração com a Equipa local de RSI e outras entidades de proximidade (eventualmente o CAFAP ...), desenvolverá um plano, o qual contemplará as seguintes áreas:- a realização de um trabalho de educação parental junto da mãe e da avó da menor, tendo em vista o reforço da sua autonomia e a aprendizagem de competências pessoais, familiares e sociais para o melhor exercício da função parental, incidindo nos cuidados básicos de saúde, alimentares, de higiene, de afecto, de segurança, de estimulação e de imposição de regras e acompanhamento psicológico da progenitora e da avó".

A medida foi sucessivamente prorrogada em sede revisão.

4. Nos relatórios elaborados pelos serviços da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, de acompanhamento da execução da medida, foi sugerido a sua substituição pela medida de confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção, ao abrigo do estatuído nos artigos 35.°, n.º 1, alínea g), 38.°-A, 62.°, n.ºs 1 e 3, alínea b) e 62.°- da LPCJP , por se considerar que os pais da criança não constituírem garante da promoção dos direitos e proteção de BB e inexistente alternativa na família alargada.

5. Os pais da menor opuseram-se à aplicação da medida proposta pela EMAT. Social.

Realizado o debate judicial com produção de prova, o tribunal proferiu o acórdão datado de 16.03.2023, com o seguinte dispositivo -«Acordam os Juízes que constituem este Tribunal Coletivo Misto, ao abrigo das disposições supra citadas: A)- Aplicar à criança BB, a medida de promoção e de protecção de "acolhimento familiar", a executar junto de DD e EE, pelo período de 1 (um) ano, prevista no artigo 35.°, n.° 1, alínea e), da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo)- De forma a garantir a estabilidade da BB, no seu superior interesse, decide-se que apenas deverão ocorrer visitas e contactos telefónicos entre a criança e os progenitores e/ou a avó materna, se essa for a vontade da BB.(…).

6. Foram apresentadas duas apelações, a saber, pela mãe da menor, que pugnou pela revogação da decisão de primeira instância e consequente entrega da filha aos seus próprios cuidados; e pela menor BB que no prosseguimento da medida de acolhimento vigente, pugnou pela sua futura adopção.

O Ministério Público na resposta afirmou a improcedência total de ambos os recursos.

Apreciados, o Tribunal da Relação do Porto proferiu acórdão em 5.06.2023, vindo a decidir-se, julgar “i) -improcedente o recurso da progenitora; e, ii) procedente a apelação da menor BB e, revogando a decisão recorrida, decidem aplicar à criança a medida de promoção e proteção de confiança a família de acolhimento familiar com vista a futura adoção, sendo tal medida executada na família de acolhimento identificada nos autos, onde a mesma já se encontra. Deve, pois, ser solicitado à Segurança Social, o acompanhamento da medida, mediante prévia definição do plano de intervenção junto desta criança, e, sendo o caso, da sua família.”

7. Inconformada com o acórdão da Relação, a mãe pediu revista, pedindo que se mantendo o acórdão na parte em que ordena a saída da menor o mais urgentemente possível do acolhimento provisório onde está, e sendo ilegal a medida de confiança com vista a adopção, deverá ser ordenada a entrega à recorrente da criança à mãe.

O Ministério Público pugnou pela integral improcedência do recurso.

8. Na decisão da relatora de 27.09.2023, consta- «(..)A impugnação da matéria de facto e os ónus legais. (…). Ambas as recorrentes impugnaram a decisão de facto do tribunal a quo tendo por objecto distintos segmentos, e, motivação e conclusões, também, diversas. (..). Sucede que, s. d.r, não acompanhamos os motivos da rejeição da impugnação da decisão de facto provada constante da apelação da progenitora, sendo que, ao que se extrai, o tribunal a quo entendeu, não obstante as apontadas deficiências, reapreciar os pontos impugnados da matéria de facto não provada, que indeferiu. (…) Posto isto, analisada a peça do recurso de apelação apresentada pela ora recorrente AA, não acompanhamos o sentido decisório prosseguido pela Relação, ao rejeitar a impugnação da decisão da matéria de facto. A recorrente identifica nas conclusões de forma directa e clara, primeiro, quais os pontos da matéria de facto provada que pretende submeter à reapreciação da Relação; segundo, qual o juízo probatório alternativo que propõe; terceiro, os elementos de prova que, no seu entender, atestam tal juízo; e, por último sumaria as (suas) razões da divergência, em coerência com a argumentação que desenvolveu no corpo das alegações. Assim, o retiramos em suficiência das conclusões - “1ª- A recorrente impugna os factos provados nos Pontos 6 e 8 da Sentença por terem como fonte a avó da menor que não é credível, já que sempre prejudicou a sua filha, sendo causadora da sua institucionalização aquando adolescente. A recorrente impugna o provado no Ponto 15, tendo sido o motivo de institucionalização da recorrente quando adolescente o que está no Ponto 18 ii) dos factos provados.2ª Os Pontos 27 e 28 dos factos provados não representam a actualidade dos autos e reportam-se há mais de seis anos quando a recorrente ainda era uma jovem adolescente por isso se impugnam. O último parágrafo da página 10 dos factos provados também se impugna por se basear em factos falsos contra a recorrente, nunca a recorrente esteve em casa de prostituição ou foi apanhada a roubar, se tal fosse verdade constaria no seu cadastro criminal e nada consta. 3ª Impugna-se o que está no 2º parágrafo da página 27 dos factos provados, porque nunca a família de acolhimento enviou quaisquer fotos da menina para a mãe e, muitas vezes, impede a própria menina de enviar fotos para a mãe como o depoimento do marido da família de acolhimento atesta. (…)” Por outro lado, não sendo a peça “ideal,” quanto à “análise crítica “da motivação do tribunal de primeira instância, certo é que constam nas alegações da recorrente (e parte nas conclusões) amplas transcrições dos depoimentos que identifica e destaca, naturalmente no interesse da sua posição e interesse que defende. A recorrente não se limitou, de forma genérica e conclusiva, a discordar da apreciação das provas e do sentido da decisão, satisfazendo em suficiência os ónus legais da impugnação da decisão de facto, em termos que viabiliza a reapreciação e valoração da prova produzida adrede, segundo o critério a sua livre e prudente convicção. Cremos, s.m.o., não estarmos, pois, perante simples alegação do inconformismo da recorrente perante a versão dos factos da sentença. Não se verificando a falta de especificação dos requisitos previstos no nº1, alíneas a), b) e c) do artigo 640º , do CPC, a falta ou imprecisão nas conclusões da indicação das passagens da gravação dos depoimentos a que alude o nº 2, alínea a) do mesmo artigo, e a proverbial análise critica das provas, estando afinal em causa o conjunto de 6 pontos da decisão de facto, não justifica no caso dificuldade grave para o tribunal a quo exercer os poderes deveres constantes do artigo 662º do CPC ou o exercício do contraditório pelos demais intervenientes. Daí concluir-se, que o acórdão em recurso errou na interpretação e aplicação dos parâmetros processuais que disciplinam os poderes de cognição da decisão de facto impugnada, e, por conseguinte, resulta prejudicado o conhecimento do segundo fundamento do recurso de revista.

III. Decisão: Pelo exposto, decide-se: a) Anular o acórdão recorrido na parte em que rejeitou a impugnação da decisão de facto da ora recorrente; b) E, baixando os autos ao Tribunal da Relação, determinar a reapreciação da matéria de facto rejeitada, procedendo às alterações que entender ajustadas e eventual alcance na solução de mérito. Custas a atender a final.»

9. O Tribunal da Relação do Porto, julgando o mesmo Colectivo, proferiu Acórdão em 13.11.2023, conforme dispositivo - «Destarte, tendo já sido julgadas improcedentes, no demais, as impugnações da decisão da matéria de facto, da menor e da progenitora, como decido no anterior Acórdão, a reafirmar, também, quanto a impugnação de factos provados tem a impugnação da progenitora de improceder. Neste conspecto, improcede, na totalidade, a impugnação da decisão de facto efetuada pela progenitora, assim se mantendo da decisão de facto.»

10. A recorrente AA interpôs recurso de revista, mantendo o pedido de revogação do acórdão da Relação nos termos da posição assumida anteriormente, suscitando no segmento da impugnação da matéria de facto a recusa na Reapreciação da Prova.

11. Proferido despacho de admissão do recurso naquela instância, remeteram-se os autos a este Supremo Tribunal que por acórdão proferido em 14.03.2024, deliberou em conformidade com o seguinte dispositivo - « Pelo exposto, anula-se o acórdão recorrido, determinando a baixa dos autos ao Tribunal da Relação do Porto, a fim de dar cumprimento ao anteriormente determinado por este Supremo, i.e. -Apreciar a impugnação da matéria de facto provada formulada pela recorrente AA pontos 6, 8, 15, 27, 28, último parágrafo da página 10 dos factos provados e 2.º parágrafo da página 27 dos Factos Provados constantes da decisão recorrida; Decidir de mérito em conformidade.»

12. A Relação proferiu acórdão datado de 22.04.2024, culminando no dispositivo que se transcreve -« Pelos fundamentos expostos, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar: i) improcedente a apelação da progenitora; ii) procedente a apelação da menor BB e, revogando a decisão recorrida, decidem aplicar à criança a medida de promoção e proteção de confiança a família de acolhimento familiar com vista a futura adoção, sendo tal medida executada na família de acolhimento identificada nos autos, onde a mesma já se encontra.

Deve, pois, ser solicitado à Segurança Social, o acompanhamento da medida, mediante prévia definição do plano de intervenção junto desta criança, e, sendo o caso, da sua família.».

II - Renovando a recorrente o propósito de impugnação do acórdão da Relação, apresentou alegações que terminam com as conclusões que se transcrevem:

1ª A ofensa das regras e dos princípios que disciplinam a apreciação das provas e a elaboração da matéria provada constituem questões de direito. Com bem se refere no Acórdão do STJ sob procº 14732/20.3TSPRT.P1. S1, não constitui nenhum facto novo darem-se por provados os depoimentos das testemunhas inquiridas para deles retirar conclusões, sem se darem por provados os factos relatados por essas testemunhas. Dar-se por provado nos autos que a avó da menor e as técnicas sociais dizem mal da recorrente não tem valor jurídico nenhum, sem se darem por provados os factos que elas afirmam contra a recorrente. Para se darem por provados tais factos, teriam esses depoimentos, com o mesmo conteúdo, de ser confirmados em audiência de julgamento e sujeitos ao princípio do contraditório, o que não foi o caso nestes autos.

2ª A instituição particular de solidariedade social, APAV, é composta por técnicos sociais para apoio às vítimas, não tendo nenhuma das suas técnicas competências para afirmar com valor científico que a recorrente era toxicodependente e bipolar, o que só pode ser atestado por médicos de psiquiatria, padecendo o acórdão recorrido de falta de rigor científico e de dar por provados meros rumores.

3ª Quando o acórdão recorrido escreve, como prova da toxicodependência, que a recorrente esteve internada num centro para desintoxicação da droga e se verifica, por factos notórios e do conhecimento público, que essa instituição não se destina à desintoxicação da droga, mas ao internamento de jovens, demonstra-se a sua displicência na elaboração da matéria da facto provada e o incumprimento do princípio da instrução da prova, em que se exige a indagação dos factos, violando a lei o acórdão recorrido ao dar por provado quem dizia mal da recorrente, sem uma análise crítica das provas.

4ªAadesão que o acórdão recorrido fez às informações e relatórios sociais com vista à adopção da filha da recorrente nunca poderia acontecer sem se submeterem todas essas informações e relatórios ao princípio do contraditório, carecendo o acórdão recorrido de sentido crítico em relação a todos esses relatórios e informações, violando a lei que impõe ao julgador um exame rigoroso das provas. Uma mãe não pode perder uma filha com base em rumores ou no que dizem de si, tem de haver rigor e imparcialidade na avaliação da prova. 5ª Tendo a recorrente 28 anos, é desumano e perverso querer tirar-lhe a filha, no presente, por alegados comportamentos do tempo em que era menor, sendo a principal fonte de prova, do acórdão recorrido, contra a recorrente, a mãe desta que foi condenada criminalmente por maus-tratos à recorrente, no tempo em que esta era menor. Naturalmente, a mãe da recorrente continua a querer desculpabilizar-se dos seus actos criminosos em relação à recorrente quando era menor e que determinaram a institucionalização desta, não podendo o acórdão recorrido dar-lhe credibilidade depois da condenação criminal por maus-tratos que infligiu à recorrente quando era menor.

6ª É jurisprudência maioritária no STJ que o encaminhamento duma criança para a adopção deve ser precedido de todas as medidas de apoio à família natural para poder acolher a criança, constituindo o encaminhamento para a adopção uma medida de “ultima ratio “depois de serem aplicadas outras de apoio à família natural. No caso em recurso, em nenhum momento recebeu a recorrente qualquer medida de apoio sequer para as viagens de centenas de quilómetros para poder visitar a sua filha. Se compararmos o caso da aqui recorrente com o caso de outra mãe julgada no ano passado, pela 1ª Secção Cível do STJ, a aqui recorrente nunca teve problemas de alcoolismo ou foi suspeita de lesar fisicamente a sua filha em brigas familiares ou ter posto em causa o desenvolvimento do seu cariótipo. Ninguém irá compreender que se tenham dado oportunidades a outras mães em circunstâncias mais difíceis e não se dê agora à aqui recorrente a oportunidade de ficar com a sua filha com uma medida de apoio.

7ª Aacusação que o acórdão faz à aqui recorrente de não ter condições para receber a filha não implica, por força da lei, que seja encaminhada para a adopção, implica apenas competir aos serviços sociais proporcionar essas condições à recorrente que o tribunal julgue necessárias.

8ª O dinheiro gasto, ao longo de tantos anos, com a família de acolhimento e com os serviços da IPSS que lhe serve de rectaguarda, já teria dado para adquirir uma habitação em que a mãe pudesse receber a filha nas condições exigidas.

9ª Os serviços sociais nunca se dignaram, como é sua obrigação legal, escolher uma instituição e família de acolhimento próximas da mãe da criança e, além disso, nunca lhe ofereceram qualquer subsídio ou ajuda de custo para percorrer as centenas de quilómetros de distância. Necessitando a aqui recorrente de fazer cerca de 700 quilómetros de ida e volta com elevados custos totalmente a seu cargo, não se cumpriu o fim legal de preparar o regresso da criança à sua família de origem.

10ª Desde o momento em que conseguiu arrendar uma habitação, a recorrente vem declarando nos autos que quer que lhe seja entregue a filha, nunca tendo ninguém dos serviços sociais feito qualquer esforço para visitar a referida habitação depois disso, porque a intenção deles sempre foi e continuará a ser o encaminhamento da criança para a adopção. Não é a mãe que tem de procurar ajuda na Segurança Social para melhorar as suas condições, são os mesmos agentes sociais que tratam do caso da menor que têm de coordenar os seus esforços para propor junto do Tribunal a medida de apoio junto da mãe, prevista na alínea a) do nº1 do artº 35º da LPCJP.

11ª Os processos de adopção implicam gastos muito avultados do Estado, ao longo de anos, que permitem a todos aqueles que são pagos por esses serviços tirar daí o seu ganha-pão. Os tribunais não podem ignorar essa circunstância na avaliação que fazem dos relatórios sociais que propõem a adopção.

12ª Constitui danosa violação da lei a falta de juízo crítico pelos senhores magistrados dos relatórios sociais, cabendo-lhes ordenar o contraditório, continuando a aqui recorrente a desconhecer tais relatórios contra si elaborados que nunca lhe foram notificados, com a cominação do artº 117º da LPCJP.

13ªArecorrente foi, telefonicamente, informada pelos serviços sociais de que todos os contactos com a sua filha estavam proibidos a partir da prolação do acórdão que ordenou a confiança com vista à adopção e que, também, lhes foi notificado.

14ª Resulta, inequivocamente, da Lei que as decisões judiciais de encaminhamento de crianças para a adopção só têm força legal após o trânsito em julgado, visto que o seu recurso tem efeito suspensivo.

15ª Constitui princípio geral do direito processual que uma decisão cujo possível recurso tenha efeito suspensivo só poderá ser executada após o seu trânsito em julgado.

16ª É, assim, ilegal a ordem de notificação dos serviços sociais pelo acórdão em revista antes do trânsito, não só porque estes não são sujeitos processuais com capacidade de recurso, como ainda o acórdão só será executável por esses serviços após o seu trânsito em julgado.

17ª Não resulta do acórdão em recurso, muito pelo contrário, qualquer proibição de contactos, tendo sido declaradas procedentes as conclusões do recurso em nome da menor, onde se lê a preservação de contactos da menor com a aqui recorrente pela futura família adoptiva. 18ªAo declarar totalmente procedente o recurso em nome da menor, o acórdão comete uma omissão grave ao não notificar os serviços sociais da manutenção dos contactos da filha menor com a sua mãe, independentemente do encaminhamento da criança para adopção.

19ª O Direito de Protecção de Menores não consente que as crianças sejam tiradas aos pais e enviadas para a adopção com base em conceitos tecnocráticos como “handicap “, disfuncionalidades “, “securizante “ou “referência afetiva “. A gravidade de tirar uma filha a uma mãe é tanta que o princípio da segurança jurídica se impõe nestes casos. O que importa saber para o Direito é se a criança gosta ou não gosta da sua mãe e, em diversos factos provados, lemos que a filha gosta da mãe, aqui recorrente, é o que basta para o Direito atestar os vínculos afectivos.

20ª A Escola de Direito de Coimbra foi a escolhida pelo legislador para preparar e redigir a formulação actual do Código Civil quanto aos pressupostos de encaminhamento para a adopção. Não há motivos para suspeitar que a doutrina dos professores de Coimbra sobre esta matéria não seja a defendida pelo nosso legislador; ao afastar-se radicalmente dela em direcção a um pensamento malthusiano de que os pobres não podem ter os filhos por deles não saberem nem poderem cuidar, o acórdão em recurso viola o mais sagrado princípio do primado da família natural.

21ª De acordo com os dois mais eminentes professores de Coimbra em Direito de Família, a prova da ruptura definitiva dos vínculos afectivos é autónoma e cumulativa com a prova de alguma das verificações objectivas das alíneas do artº 1978º do Código Civil. Se é o próprio acórdão em recurso que não põe em causa, na matéria provada, a filha gostar da mãe, é quanto basta para impossibilitar a aplicação da medida de confiança com vista a futura adopção prevista no artº 1978º do Código Civil.

22ª Não foi por acaso que o Colectivo em 1ª Instância escreveu que seria uma “crueldade “para a menor encaminhá-la para adopção.

23ª Tendo-se apresentado o avô materno da menor em tribunal disponível para a receber, não poderia o acórdão em recurso, de acordo com o primado da família natural, mandar a neta para a adopção. Não tem qualquer base jurídica excluir o avô da menor por ser septuagenário, motorista de táxi e não ver a neta desde os dois anos. Uma família adoptiva, quando é seleccionada para começar os contactos com a criança para adopção, nunca a viu desde que nasceu, se fosse por isso só as pessoas de convívio duradouro com as crianças é que as poderiam adoptar.

24ª Não havendo nada nos autos contra o avô materno da menor, só não lhe foi entregue a neta por ele ser pobre, violando assim o acórdão o princípio da dignidade humana por haver preconceito contra as pessoas pobres ficarem com filhos e netos a seu cargo. Não é por acaso que o acórdão refere quatro vezes as vantagens patrimoniais para a menor com o seu encaminhamento para a adopção, não se vislumbrando na lei que as pessoas pobres não possam adoptar crianças por não lhes poderem proporcionar as ditas vantagens patrimoniais.

25ª Havendo oposição da menor por si declarada nos autos ao encaminhamento para a adopção, constitui um acto cruel a medida de confiança com vista à adopção. No nosso ordenamento, não são permitidas adopções forçadas contra a vontade das crianças, violando a lei o acórdão quando escreve “não se impõe ao julgador que na decisão que venha a tomar acolha a posição assumida pelo menor, bem podendo afastar-se dela “.

26ª É inconstitucional o artº 1978º do Código Civil com a interpretação de que pode ser aplicada a medida de confiança com vista a futura adopção contra a posição assumida pelo menor relativamente a essa medida, por violar o Estado de direito democrático consagrado no artº 2º da Constituição da República Portuguesa.

27ª Pelas estatísticas publicadas do Conselho Nacional da Adopção, a faixa etária onde se insere a menor tem elevada probabilidade de insucesso no processo de adopção, fazendo-se um juízo de prognose de acordo com dados oficiais, a adopção nos autos estará votada ao insucesso, sendo do superior interesse da menor, conceito jurídico e não discricionário, que esta seja poupada a tal processo doloroso.

28ª O acórdão em recurso viola o artº 1978º do Código Civil por não estar preenchido nenhum dos seus pressupostos legais para ser aplicada a medida de confiança com vista a adopção da menor. O encaminhamento para a adopção não é nenhuma medida que garanta o superior interesse da menor, como é argumento do acórdão recorrido, porquanto, apesar de tantos profissionais intervirem na escolha do candidato a adoptar, ocorrem imensos falhanços como aquele descrito no recente acórdão sob revista nº 802/20.1... em que a filha de 18 anos engravidou do pai adoptivo.

29ª O pensamento de que cabe ao Estado, aos seus serviços e aos seus poderes, decidir qual a melhor família onde se deve educar uma criança, em vez de ajudar as famílias naturais a ter melhores condições para educar as suas crianças, não é mais do que uma nacionalização da educação dos menores só possível em regimes totalitários.

30º Os pressupostos legais para retirar os filhos aos pais, contra a vontade destes, são vinculativos, não podendo ser derrogados por uma suposta jurisdição voluntária de que uma família adoptiva é o melhor para o futuro da menor. Um processo de jurisdição voluntária, apesar de não estar sujeito a uma legalidade estrita, não pode ser um processo de julgamento ilegal contra aquilo que o legislador proíbe ou ordena à jurisdição voluntária.

31º A medida de acolhimento familiar tem como finalidade legal a reintegração da criança na sua família de origem, não é uma medida de acolhimento provisório até à adopção como escreve o acórdão recorrido, violando assim o Regime de Execução do Acolhimento Familiar (DL139/2019 com as alterações da Lei nº13/2023).

32º O acórdão recorrido também viola o Artigo 9.º nº1 da Convenção Sobre os Direitos da Criança quando escreve que “o princípio da prevalência da família aponta para a implementação das medidas que promovam a adoção da criança “.

33º Ao incluir como matéria não provada o envio de fotos, a família de acolhimento não deixava a mãe e a filha trocarem fotos entre si, onde se demonstra a clara intenção da família de acolhimento em apagar a lembrança da mãe na criança e negar o direito à própria mãe de conviver com a filha, frustrando aquilo que é o regime legal da medida de acolhimento familiar.

34º O acórdão recorrido indicou em seu apoio um acórdão do STJ contrário ao seu. No caso aqui em recurso, a avó a quem estava entregue a menor ligou aos serviços sociais a pedir ajuda; no outro caso jurisprudencial, a mãe tinha entregado a filha no tribunal, dizendo que não podia tomar conta dela. É esse acórdão do STJ que diz o seguinte: - Não afirmou a progenitora que precisava de ajuda, que precisava que lhe fosse concedida uma vaga em creche ou que precisava de bens alimentares ou outros, para assegurar o bem-estar da AA. Afirmou, tão-só, que não tinha onde “meter esta criança”, deixando-a no tribunal com os seus pertences.

30ª Mantendo-se o acórdão na parte – de que não se recorre - em que ordena a saída o mais urgentemente possível do acolhimento provisório e sendo ilegal a medida de confiança com vista a adopção, deverá ser ordenada a entrega da criança à mãe.»


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A Menor BB apesentou contra-alegações e sustenta a final «(..)48. assume especial relevo, no presente caso da criança, BB, o regime consagrado no nº3 Artigo 1986º Cód. Civil , nº3 –“ Excecionalmente, ponderada a idade do adotado, a sua situação familiar ou qualquer outra circunstância atendível, pode ser estabelecida a manutenção de alguma forma de contacto pessoal entre aquele e algum elemento da família biológica ou, sendo caso disso, entre aquele e a respetiva família adotiva e algum elemento da família biológica, favorecendo-se especialmente o relacionamento entre irmãos, desde que, em qualquer caso, os pais adotivos consintam na referida manutenção e tal corresponda ao superior interesse do adotado.”)49. Existindo uma família – orientada por razões puramente altruístas - com capacidade intelectual, afetiva, emocional e económica para se avaliar as possibilidades reais do adotando encontrar no novo lar o equilíbrio e a normalidade familiar de que ela necessita. É, em nosso entender, o que melhor (mal menor), salvaguarda, preenche, o superior interesse da criança, BB.»

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O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal da Relação apresentou contra-alegações que remata com as conclusões seguintes:

«1) Não estão verificados os pressupostos relativos à interposição de recurso de revista para esse Supremo Tribunal de Justiça, nos termos do art.º 671.º n.º 3 do CPC., o que é causa de sua rejeição imediata.

2) Caso os autos hajam de prosseguir, o aresto deste TRPorto impugnado é irrepreensível, tendo interpretado e aplicado correctamente a legislação aplicável, designadamente, o regime decorrente dos art. ºs 20º. nº.1 da CRP, 35. °, n.° 1, alínea g), 38. °-A, 62. °, n.°s 1 e 3, alínea b) e 62. °-A, 104º. da LPCJP e 1978º. do Código Civil.

3) Tendo este Tribunal cominado à criança “a medida de promoção e proteção de confiança a família de acolhimento familiar com vista a futura adoção”, teve em atenção o seu superior interesse.

4) A recorrente não pede, ainda que tacitamente, a revogação, anulação ou modificação do acórdão recorrido, incumprindo o Artº. 639º. Nº. 1 do CPC, o que, consequentemente, implica a deserção do recurso, o que pressupõe o trânsito em julgado do decidido.

5) Caso assim se não entenda, foi emitida pronúncia sobre todas as questões de mérito suscitadas, sem que se vislumbre qualquer vício de inconstitucionalidade ou ilegalidade.

6) Carece o recurso em apreço, em absoluto, de qualquer fundamento, pelo que, lhe deve ser negado provimento.»


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III. Admissão e Objecto do Recurso

Mantêm-se os pressupostos de admissão da revista.


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Posto isto, cumpre ponderar e decidir se, o acórdão impugnado prosseguiu os parâmetros legais, que à luz da situação integrada da criança BB e que resultou provada, ditaram a medida de promoção e protecção de confiança com vista à sua futura adopção

IV. Fundamentação

A. Os factos

Vem provado das instâncias:

1 - A menor BB, nascida em ... de ... de 2013, é filha de CC e de AA.

2 - O exercício das suas responsabilidades parentais foi regulado no processo principal, por acordo judicialmente homologado por sentença proferida em 03/11/2015, transitada em julgado, que fixou a residência da criança junto da mãe, a qual ficou também com o poder decisório sobre as matérias da vida corrente da filha, enquanto as responsabilidades parentais sobre os assuntos de particular importância foram atribuídas conjuntamente a ambos os pais.

3 - Por decisão proferida em 26-09-2017 (referência .......27) em sede de debate judicial, foram dados como provados os seguintes factos:

"3 - Desde Abril de 2015 que a BB vive com a avó materna, FF, a qual era a primeira responsável pelos cuidados prestados no seu dia-a-dia, porquanto a mãe da menor ora residia nessa mesma morada, ora se autonomizava por se incompatibilizar com a mãe, em quem delegava a prestação de cuidados à filha.

4 - O pai da menor residia nos ... e estava alheado dos problemas, das necessidades e do processo de crescimento da filha, situação que se mantém actualmente.

5 - Em 07/04/2016, após iniciativa da avó materna da menor na secretaria do Ministério Público junto deste tribunal a reivindicar a guarda da neta escorando-se nas circunstâncias fácticas referidas em 3, foi intentada pelo Ministério Público uma acção de limitação das responsabilidades parentais - que deu origem ao apenso "B" - peticionando que a guarda e cuidados da menor BB passassem a caber formalmente à avó materna, que era quem na prática já assumia essas tarefas e exercia os poderes-deveres concomitantes, que ficou suspenso em virtude da pendência deste processo de promoção e protecção.

6 - Desde 22/12/2015 corria termos na CPCJ de ... um Processo de Promoção e Protecção desencadeado por uma comunicação presencial feita pela avó materna e por si assinada, referindo que:

i) a menor BB estava aos seus cuidados e não corria riscos, mas que passaria a corrê-los caso a mãe a levasse consigo; falta da documentação necessária e o seu ex-marido, GG, com quem ainda habitava embora em economia separada (por falta de rendimentos próprios para arrendar habitação autónoma), alegadamente batia na neta,

9 - Em sede de atendimento realizado na CPCJ a 07/04/2016, a avó materna da menor disse que:

- não pretende ficar com a neta para sempre, espera que a sua filha refaça a sua vida e tenha condições para criá-la, pois sente-se cansada uma vez que criou quatro filhos;

- pensa que a BB é hiperactiva pois é muito irrequieta, sendo preciso estar sempre com atenção e supervisão para não acontecerem acidentes;

- que a BB é uma criança que precisa de muita atenção e carinho;

- admitiu que andava muito cansada e depressiva, estando a tomar medicação, sentindo- se contudo com capacidade para tomar conta da neta;

- quando a BB veio viver consigo não tinha horários para dormir, nem para tomar refeições; - actualmente tem horários para dormir e para as refeições;

- confirmou a existência dos problemas financeiros que invocara e informou que requereu o RSI e uma ajuda para a BB na Segurança Social e que recebia cabazes de alimentos de instituições de solidariedade social.

10 - Em 14/04/2016, as Técnicas da CPCJ fizeram visita domiciliária à habitação onde residiam a BB e a avó materna, tendo constatado que se tratava de um apartamento de tipologia T3 devidamente organizado e higienizado, provido de electrodomésticos e mobiliário. O frigorífico estava fornecido de alimentos, em quantidade e variedade, designadamente para o consumo da menina, a qual dormia com a avó num dos quartos, enquanto o Sr. GG ocupava outro e o terceiro quarto era usado para arrumos.

11 - O Sr. GG, mostrava-se enfadado com a presença da BB, que considerava muito irrequieta e fazendo "muitas asneiras".

12 - Nessa altura, a menor referiu às Técnicas que era "feia e má" e mostrou carinho pela avó, a quem tratava por "mãe".

13 - Em virtude de a CPCJ não ter conseguido obter o consentimento da mãe da menor para a continuação da sua intervenção no caso o processo de promoção e protecção foi remetido para tribunal.

14 - Na sequência de um telefonema da D. FF para a APAV dando conta que não tinha dinheiro para comprar alimentos para a neta, nem medicação foi, em 04/05/2016, feita uma visita ao seu domicílio onde foi constatado que havia alimentos no frigorífico, na arca congeladora e na despensa, trocaram impressões com o Sr. GG, que fez várias queixas da ex-mulher, designadamente que gastava descontroladamente em "luxos" (produtos alimentares caros, cabeleireiros) e passava o tempo a ver televisão e ao telefone, sendo ele quem brincava e entretinha a BB.

15 - A mãe da menor, tem um percurso de vida conturbado, que incluiu um acolhimento residencial executado em comunidade terapêutica para desintoxicação à toxicodependência, onde conhecera o pai da BB, que tinha o mesmo problema e com o qual casou; depois do divórcio, na sequência de alegados maus-tratos de que era vítima nos ... e do período em que esteve acolhida em casa do companheiro da D. FF até ser por ele expulsa, reincidiu nos consumos passados, mudou de residência e de namorado por várias vezes e teve vários empregos de curta duração na área de restauração.

17 - Numa deslocação que a avó da menor fez ao Serviço Local de ... da Segurança Social, no dia 06/04/2016, a fim de obter apoios materiais, mostrou-se muito exaltada e agitada, fazendo com que a BB ficasse, igualmente, agitada.

18 - Em 21/06/2016, a equipa da EMAT para além do mais, concluiu que:

i) em face da instabilidade económica, profissional e habitacional, a mãe da menor não apresentava projecto de vida que lhe permitisse assumir e prestar os cuidados de segurança básicos ao seu desenvolvimento harmonioso tanto mais que revela um historial de agressividade, não se inibindo de a manifestar à frente da filha.

ii) a D. FF revelou dificuldade em acompanhar o projecto de vida dos seus filhos, sendo que os três filhos mais novos desta tiveram um Processo de Promoção e Protecção.

iii) a D. FF assume historial de depressões, desde o nascimento da sua filha AA;

iv) na interacção com a mesma é visível que a mesma revela algum cansaço e, por vezes, dificuldade em organizar o seu discurso. Na observação da sua interação com a BB constatam- se algumas oscilações temperamentais, já observadas por outros técnicos. A mesma já teve processos de violência doméstica sendo a mesma acusada de prática perpetuada relativamente ao ex-marido, Sr. GG. Do ponto de vista económico a D. FF revela fragilidades por apresentar rendimentos muito baixos.

Para além de ajudas alimentares e de vestuário que tem recebido, nomeadamente da Associação C..., tem tido o apoio económico dos seus companheiros, primeiramente do ex-marido, Sr. GG e actualmente do Sr. HH.

A D. FF mudou recentemente de residência, levando consigo a neta, estando a viver com o namorado, Sr. HH em casa deste. A casa reúne boas condições e o Sr. HH manifesta afectividade para com a BB referindo está disponível para apoiar a D, FF na educação da neta, tal como o fez anteriormente com os seus netos. As visitas da D. AA em casa do Sr. HH não são possíveis uma vez que esta está impedida de entrar no condomínio, por conflitualidade ocorrida em 2015 neste local.

Em suma, consta-se que o contexto familiar da avó materna tem fatores de perigo que são estruturais, anteriormente identificados, e que a estabilidade que se observa no momento está condicionada à evolução da relação afectiva da avó, dado que esta vive na dependência habitacional e económica do actual companheiro, pelo que a definição do projecto de vida da BB junto desta figura nos parece muito vulnerável. 19- Em 12/07/2016, a equipa da EMAT para além do mais, concluiu que a menor estaria em situação de perigo junto da avó materna e do companheiro, perante o contínuo adicionar de informações e indícios de falta de capacidades cuidadoras por parte daquela e do companheiro.

20 - Foram feitas denúncias ao "Instituto de Apoio à Criança" por vizinhos de que a menor passava muito tempo a chorar alto.

21 - Por despacho judicial proferido a 15/07/2016 foi aplicada uma medida de acolhimento familiar a favor da menor BB, para salvaguarda da sua integridade e assegurar que doravante lhe fossem prestados, com constância, os cuidados de carece ao nível material, afectivo e educacional, num contexto de tranquilidade, assertividade e carinho.

22 - Tal medida foi executada a partir de 19/07/2016, com a integração da BB numa família seleccionada pela Segurança Social ao abrigo de um protocolo celebrado com a "Associação...IPSS".

23 - A menor adaptou-se bem à família de acolhimento e a Jardim de Infância para onde foi transferida.

24 - Na sequência de lesões detectadas pela avó no corpo da BB aquando de uma visita, o tribunal diligenciou pelo esclarecimento da origem das mesmas e, mesmo depois da Segurança Social ter asseverado que se tratara de uma queda acidental, pôs-se seriamente a hipótese de transferir a menina da família de acolhimento para acolhimento residencial a executar em instituição, ao que a avó materna se opôs pois o que queria era reaver a custódia da neta e não que fosse simplesmente retirada da família de acolhimento para ser institucionalizada.

25 - A menor foi sujeita a avaliação psicológica no INML, evidenciando um desenvolvimento cognitivo e psicomotor adequado para a sua faixa etária.

Durante a avaliação a menor identificou os elementos da família de acolhimento e referiu-se a eles de forma muito positiva como igualmente o fez sobre a avó materna, ao seu companheiro e à mãe.

26 - A avó materna da menor foi também sujeita a avaliação psicológica no INML, que concluiu que a mesma:

"evidencia um funcionamento psicológico sobretudo caracterizado pelo narcisismo, a superficialidade dos afetos, baixa tolerância à frustração, e desconfiança e hostilidade perante interlocutores (sobretudo em caso de conflito). Entendemos que estas características do seu funcionamento psicológico são compatíveis com um quadro de perturbação da personalidade.

A presença de um quadro de perturbação da personalidade, de acordo com literatura da especialidade, constitui um risco para o exercício da parentalidade.

No caso concreto, entendemos que o funcionamento psicológico da examinada poderá criar limitações ao exercício da parentalidade de forma adequada e adaptada, sobretudo no que diz respeito à estabilidade e qualidade do suporte emocional, e interacção relacional com a criança. Para além disso, a permanente centralidade das suas próprias necessidades poderá prejudicar o exercício da parentalidade, de forma eficaz e adequada, no caso desta função entrar em conflito com os seus objectivos e projectos pessoais.

Devemos também referir que a examinada apresenta um conhecimento adequado sobre as necessidades da criança e das estratégias necessárias para as suprimir. No entanto, a implementação destas estratégias poderá ser prejudicada pelo funcionamento da personalidade da examinada já descrita.

De salientar também que a representação tendencialmente negativa que a examinada apresenta dos seus interlocutores e, em situações de conflito (onde existe um obstáculo percebido à prossecução dos seus objectivos), a demonstração de uma forte animosidade e antagonismo em relação a eles, constituem fortes limitações à aceitação de ajuda externa.

Sendo assim, entendemos que a examinada apresenta, do ponto de vista psicológico, importantes limitações para o exercício da parentalidade de forma adequada e promotora de um desenvolvimento integrado da sua neta.

27 - A mãe esteve a trabalhar no ... e, actualmente, vive em casa da mãe, não trabalhando.

28 - A progenitora não se sente capaz de por si só cuidar da menor, entendendo que a mesma deve ficar aos cuidados da sua mãe.

4 - Em 12-10-2017 (referência ......68), o pai da criança, CC, após notificação do acórdão supra referido em 3, informou os autos que conseguira trabalho em ... continental, requerendo a reaproximação à criança, solicitando que lhe fosse facultada a morada da família onde BB estava acolhida e que fosse ordenada a realização de um relatório social a fim de demonstrar nos autos a sua real situação pessoal e profissional, de forma a provar que a mesma era suficiente para poder exercer as responsabilidades parentais.

5 - Em 14-12-2017 (referência ......48), foi prestada informação intercalar conjunta da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, com o seguinte teor:

"O Serviço de Acolhimento Familiar de Crianças e Jovens da ..., instituição de enquadramento a quem cabe a execução dos atos materiais da medida de acolhimento familiar aplicada à menor BB, no âmbito do Processo de Promoção e Proteção supracitado e de acordo com o solicitado nos V/ ofícios n° .......20 de 28-11 -2017 e .......46 de 22-11-2017, vem por este meio informar que:

♦ Na visita quinzenal que decorreu no dia 30 de outubro de 2017, a D. FF comunicou a esta equipa técnica que seria a última visita que efetuava, na medida em que, já não estaria a residir com o companheiro (Sr. HH) e que iria trabalhar para uma casa particular (como empregada doméstica interna a tempo inteiro). . Nesta sequência, a D. AA pediu para falar a sós com a equipa técnica para informar que iria comunicar ao tribunal que não quer que a sua mãe seja considerada como alternativa familiar para a BB. Entende que a D. FF "...não está bem (psicologicamente)9 .. .uma pessoa em condições não dizia as coisas que ela diz.. diz coisas que não são verdade, ... poderei trazê-la uma vez ou outra para a BB não sentir muito, ... ela agora vai estar ocupada... "

. A D. FF, em contacto telefónico efetuado no dia 15 novembro de 2017 transmitiu inicialmente que "...vou sair do processo da BB... tenho mais netos... acho que a mãe deve ficar com ela... " Para além disso, no desenvolvimento do telefonema verbalizou evidências da rutura da relação com a sua filha e com o Sr. HH apresentando no discurso argumentos que colocavam em causa a idoneidade destes: ...a AA não quer a filha mais comigo...ela não para em trabalho nenhum, ...trabalhou num bar de streep tease,... esteve numa casa de prostituição ... no algarve trabalhou em três sítios, ... foi despedida, ... já foi apanhada a roubar, ...deve-me dinheiro, ...a AA sempre foi uma cruz, ... o Sr. HH...ft chamava estúpida à BB,... a BB tem medo dele, do palavreado dele... não tomava banho...

. No seguimento de novo contacto telefónico, no dia 17 de novembro, a D. FF mostrou vontade em realizar visita com a BB e referiu que "...eu estou bem, tenho um quarto para a BB... a AA está com consumos outra vez... ofendeu-me e à minha amiga por telefone.„sei que a BB está bem cuidada... mais vale ela estar mais 6 meses na família de acolhimento até resolvermos isto... "

. Perante as alterações sócio familiares e habitacionais descritas pela D. FF, esta foi aconselhada a atualizar a sua situação pessoal, bem como a alteração de morada junto do tribunal.

. Na visita que ocorreu no dia 15 de novembro de 2017, a progenitora fez-se acompanhar pelo Sr. HH, afirmando que mantém residência em casa deste e que exerce atividade profissional num restaurante (a servir ao balcão), sem proteção social. No entanto, reafirma que mantém procura ativa de emprego noutra área. Reiterou que não pretende que a sua mãe efetue visitas à BB, por considerar que é um elemento desestabilizador para a neta. Mais refere que, atualmente, considera ser a única solução para o projeto de vida da BB.

Ambos relataram que a D. FF só está bem se as pessoas fizerem o que pretende, caso contrário é "uma pessoa conflituosa..., fazia barulho para o prédio todo..., ameaça que se matava.„foi morar para casa de um senhor e foi despejada ao fim de uma semana...agora está em casa de outra pessoa... "

, Neste sentido, a D. AA foi aconselhada a comunicar a sua intenção/opinião ao tribunal.

. Na última visita, realizada no dia 29 de novembro de 2017, estiveram presentes a progenitora e o Sr. HH. Decorre que na manhã que antecedeu a visita, a D, FF, através de contacto telefónico com esta equipa, transmitiu vontade em participar na mesma, contudo referiu que, após contacto com a filha, esta "ainda estava descontrolada, arrogante e como não está o melhor clima, não viria a esta visita e que tentaria estar na próxima... De salientar que a D. AA afirmou à filha e à equipa técnica, em contexto de visita, que a avó viria na próxima visita.

. Nesta sequência, a D. AA pediu para falar a sós com a equipa técnica para informar que iria comunicar ao tribunal que não quer que a sua mãe seja considerada como alternativa familiar para a BB. Entende que a D. FF "...não está bem (psicologicamente)9. uma pessoa em condições não dizia as coisas que ela diz. diz coisas que não são verdade, ... poderei trazê-la uma vez ou outra para a BB não sentir muito, ... ela agora vai estar ocupada... "

. A D. FF, em contacto telefónico efetuado no dia 15 novembro de 2017 transmitiu inicialmente que "...vou sair do processo da BB... tenho mais netos... acho que a mãe deve ficar com ela... " Para além disso, no desenvolvimento do telefonema verbalizou evidências da rutura da relação com a sua filha e com o Sr. HH apresentando no discurso argumentos que colocavam em causa a idoneidade destes: ...a AA não quer a filha mais comigo...ela não para em trabalho nenhum, ...trabalhou num bar de streep tease,... esteve numa casa de prostituição ... no algarve trabalhou em três sítios, ... foi despedida, ... já foi apanhada a roubar, ...deve-me dinheiro, ...a AA sempre foi uma cruz, ... o Sr. HH...ft chamava estúpida à BB,... a BB tem medo dele, do palavreado dele... não tomava banho...

. No seguimento de novo contacto telefónico, no dia 17 de novembro, a D. FF mostrou vontade em realizar visita com a BB e referiu que "...eu estou bem, tenho um quarto para a BB... a AA está com consumos outra vez... ofendeu-me e à minha amiga por telefone. „sei que a BB está bem cuidada... mais vale ela estar mais 6 meses na família de acolhimento até resolvermos isto... "

. Perante as alterações sócio familiares e habitacionais descritas pela D. FF, esta foi aconselhada a atualizar a sua situação pessoal, bem como a alteração de morada junto do tribunal.

. Na visita que ocorreu no dia 15 de novembro de 2017, a progenitora fez-se acompanhar pelo Sr. HH, afirmando que mantém residência em casa deste e que exerce atividade profissional num restaurante (a servir ao balcão), sem proteção social. No entanto, reafirma que mantém procura ativa de emprego noutra área. Reiterou que não pretende que a sua mãe efetue visitas à BB, por considerar que é um elemento desestabilizador para a neta. Mais refere que, atualmente, considera ser a única solução para o projeto de vida da BB.

Ambos relataram que a D. FF só está bem se as pessoas fizerem o que pretende, caso contrário é "uma pessoa conflituosa..., fazia barulho para o prédio todo..., ameaça que se matava. „foi morar para casa de um senhor e foi despejada ao fim de uma semana...agora está em casa de outra pessoa... "

, neste sentido, a D. AA foi aconselhada a comunicar a sua intenção/opinião ao tribunal.

. Na última visita, realizada no dia 29 de novembro de 2017, estiveram presentes a progenitora e o Sr. HH. Decorre que na manhã que antecedeu a visita, a D, FF, através de contacto telefónico com esta equipa, transmitiu vontade em participar na mesma, contudo referiu que, após contacto com a filha, esta "ainda estava descontrolada, arrogante e como não está o melhor clima, não viria a esta visita e que tentaria estar na próxima... De salientar que a D. AA afirmou à filha e à equipa técnica, em contexto de visita, que a avó viria na próxima visita.

6 - Em 19-04-2018 (referência ......09), a equipa EMAT de ... concluiu, em síntese, relativamente ao pai da criança, CC, que o seu agregado familiar reunia as condições básicas necessárias para receber a criança e que CC demostrara disponibilidade para receber a filha. Contudo, tal integração deveria ocorrer de forma gradual, uma vez que o progenitor apenas efetuara três visitas à criança, devendo manter-se a medida de acolhimento familiar, com convívios aos fins-de-semana e férias escolares.1

7 - Em 30-05-2018 (referência ......91) foi junto aos autos relatório conjunto da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS com o seguinte teor:

"A família de acolhimento tem propiciado experiências promotoras do desenvolvimento integral da BB, nomeadamente, nos domínios socioeducativo, afetivo, familiar, escolar e de saúde. A BB encontra-se bem integrada nas atividades de vida diária, demonstrando uma adaptação positiva às dinâmicas familiares. Não apresenta qualquer resistência a nível da alimentação e do sono.

No contexto escolar, e de acordo com a avaliação da educadora II, é uma criança que está bem integrada no contexto de sala; apresenta boa interação com os pares e corresponde às atividades propostas. É caracterizada como uma criança feliz, autónoma e determinada. Ao nível da avaliação curricular, tem adquirido as competências nas diferentes áreas de aprendizagem (Formação Pessoal e Social; Expressão e Comunicação; Conhecimento do Mundo).

Ao nível da situação de saúde, a família mantém o acompanhamento médico regular nas consultas de especialidade, nomeadamente, pediatria e pedopsiquiatria no centro hospitalar de ....

Possui, também, acompanhamento em medicina familiar e infantil na Unidade de Saúde Familiar. Recentemente, de forma preventiva e para avaliação, a menor foi encaminhada para a especialidade de

otorrinolaringologia.

Relação com a família biológica

Relativamente ao regime de visitas estão definidas, com ambos os progenitores, visitas com periocidade quinzenal, com duração de uma hora:

. A progenitora e a avó materna realizam visitas conjuntas, registando-se algumas nas quais não compareceram conforme agendado (03/01/2018; 02/05/2018 e 15/05/2018) e outras em que os atrasos por parte da D. AA foram significativos. Normalmente trazerem lanche, composto por gomas, leite achocolatado, croissants de chocolate, chocolates, entre outros doces. Durante as visitas é comum a BB brincar com o telemóvel da avó e jogarem às escondidas e ao macaquinho do chinês por iniciativa da criança. Por vezes, utilizam os brinquedos colocados na sala ou recorrem aos brinquedos (bonecas, livros, etc.) que a avó traz. De salientar que a avó se revela mais participativa nas brincadeiras, enquanto a progenitora, na maioria das visitas, assume uma postura mais passiva e observadora.

. O progenitor CC efetuou, até à data, três visitas à filha (25 de janeiro, 10 de fevereiro e 24 de março de 2018), fazendo-se acompanhar por JJ, com quem declara viver em união de facto;

Da mediação e supervisão das visitas efetuadas pelo Serviço de Acolhimento Familiar de Crianças e Jovens da ..., observou-se a presença de uma interação positiva, com dinâmicas adequadas às necessidades e interesses da criança. A companheira do Sr. CC mostrou-se atenta e diligente nas interações, apresentando linguagem apropriada à idade da menor, sendo o pai menos proativo nas sugestões e nas iniciativas a desenvolver. Durante estas visitas, a BB mostrou-se emocionalmente disponível, serena e satisfeita, participando e comunicando de forma espontânea com o pai e com a sua companheira. Durante as visitas é comum utilizarem jogos didáticos colocados à disposição, bem como outros materiais que utilizam para pintar e desenhar.

A última visita programada para dia 7 de abril foi adiada, a pedido do progenitor, tendo alegado motivos profissionais, sendo que na semana seguinte a mesma não se poderia realizar por indisponibilidade da família de acolhimento. O progenitor ficou de contactar o serviço de acolhimento familiar para, de acordo com a sua disponibilidade reagendar nova visita, no entanto, até à data, não efetuou qualquer contato e mantém-se incontactável telefonicamente.

Situação atual dos progenitores

Relativamente ao relatório de acompanhamento que antecede, datado de 14 dezembro de 2017, comunicam-se as seguintes alterações:

, A progenitora efetuou atividade profissional, como empregada de limpeza, entre janeiro e maio, alegando estar ao serviço do "T.. ..... .........", com contrato de trabalho estabelecido com empresa de trabalho temporário, entregando os respetivos recibos de vencimento como comprovativo, auferindo cerca de 6006 mensais;

Comunicou, em fevereiro, que deixou de morar com o Sr. HH, voltando a residir com o Sr. KK (namorado) e restante agregado familiar em .... Nesta data declarou pretender mudar para um apartamento, tipologia T3, com o objetivo de obter condições habitacionais para receber a filha;

Em abril, a progenitora declarou que ponderava regressar ao ... para trabalhar, à semelhança dos anos anteriores, durante os meses de verão, realizando visitas uma vez por mês à BB. Em entrevista no dia 25 de maio de 2018, confirmou que cessou esta semana a atividade profissional referida e que iria, desde já, para o ... trabalhar na restauração, como servente. Afirma que pretende ganhar mais dinheiro para, no futuro, ter capacidade económica para alugar uma habitação e poder receber a filha.

. A avó materna, D. FF, deixou de morar em ... para ir residir em casa particular na ..., na qual realizou trabalho em regime interno (empregada doméstica) durante o mês de março. Alegando que este emprego estaria a ser desgastante fisicamente, pelo elevado número de horas de trabalho, deixou esta atividade e afirmou que estará a morar num quarto alugado em ..., nomeadamente na habitação do ex-marido, Sr. GG.

Mantém apoio económico reiterado, por intermédio do Rendimento Social de Inserção e alega que iniciou, recentemente, domicílios, em regime noturno, a pessoa idosa, sem qualquer proteção social. Refere que procura casa para estabilizar a sua situação pessoal. No que concerne à BB, afirma "está fora de questão ela vir para mim, quem tem de lutar pela BB é a AA, eu apenas poderei ser um apoio" (sic).

. No que concerne à situação do progenitor, de acordo com a avaliação da equipa técnica (EMAT ...) junta aos autos, o seu agregado familiar possui disponibilidade e reúne as condições básicas necessárias para receber a BB.

Conclusão

O acolhimento familiar tem proporcionado um ambiente securizante para a menor, promotor de um desenvolvimento cognitivo, psicoafectivo e social harmonioso. A família de acolhimento tem respondido de forma adequada às necessidades da BB, promovendo o seu desenvolvimento global e da prestação dos cuidados básicos, de saúde e acompanhamento escolar.

A progenitora embora pretenda ser solução para o projeto de vida da filha, mantém instabilidade pessoal, habitacional e familiar, não possuindo condições para assegurar os cuidados à BB.

A avó materna mantém instabilidade pessoal, habitacional e familiar e não se apresenta como solução para o projeto de vida da BB.

Relativamente ao progenitor, embora a qualidade da interação pai/filha observada nas visitas realizadas seja positiva e a avaliação social revele que o progenitor possui as condições básicas para receber a BB, a constância das suas intenções, atenta na efetiva deslocação para visitar a filha de forma regular, não se revela promotora, para já, da definição de um plano de reunificação familiar. Parece-nos primordial, para a preparação da criança, que a presença do agregado do progenitor seja assídua e regular para serem ponderados convívios aos fins-de- semana e nas férias escolares.

Neste sentido, a equipa articulará com a coordenadora de caso, Dr. a LL (EMAT ...), com o intuito de obter informação sobre a atual situação do progenitor e preparação de futuros contactos.".

9 - Notificados nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 85. °, da LPCJP, a progenitora pronunciou-se em 29-11-2018 (referência ......22), requerendo a cessação da medida de acolhimento familiar e a entrega da filha e a 03-12-2018 (referência ......69), a avó materna veio informar que tinha condições para acolher a criança.

10 - Em 11-12-2018 (referência ......95), foi junto aos autos relatório conjunto da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, com o seguinte teor, "Evolução da Situação e Resultados da Intervenção Da avaliação da execução da medida, constata-se que a BB se encontra bem-adaptada ao contexto e dinâmicas familiares atuais. E uma criança afável, determinada e bem-disposta, interagindo facilmente com todos os elementos da família de acolhimento. No seu discurso revela satisfação ao relatar as rotinas e dinâmicas do quotidiano. A nível do comportamento, apresenta, por vezes, alguma resistência no cumprimento das regras, com

necessidade de implementação de estratégias e práticas educativas ajustadas à idade. Como atividade extracurricular, frequenta, de forma regular, a natação.

No contexto escolar, e de acordo com a educadora MM, na sequência de reunião realizada no dia 6 de dezembro, a BB teve uma integração rápida e positiva no atual enquadramento socioeducativo (alteração de jardim de infância efetuada no início ano letivo devido a mudança de residência da família de acolhimento), revela-se uma criança feliz, cumpridora das regras e rotinas da sala e que apresenta um desenvolvimento global adequado à idade. Na interação com os pares é caracterizada como uma criança calma e que mantém distância das situações de conflito entre os colegas. Nas tarefas propostas revela boa capacidade de aprendizagem e de execução. Por vezes, mostra-se introvertida e "aérea", situação ultrapassada com estratégias como o reforço positivo e o elogio, relativamente aos cuidadores, a educadora afirma que a família de acolhimento é atenta e preocupada, sendo patente que a BB está bem cuidada e nutre muito carinho e afeto pela família de acolhimento.

A nível da situação de saúde, a família mantém o acompanhamento médico regular nas consultas de medicina familiar e infantil na Unidade de Saúde Familiar e na especialidade de pediatria, no Centro Hospitalar de .... Na especialidade de pedopsiquiatria a criança já obteve alta hospitalar.

A BB foi encaminhada para acompanhamento em consulta individual de psicologia de forma a contribuir para uma maior estabilidade emocional e apoiar na compreensão da sua situação familiar atual, atendendo às expetativas criadas pela família biológica e à dificuldade na gestão de frustração latente perante as mesmas, trabalhando-se a sua história familiar e vida quotidiana.

Relação/contactos com a família biológica materna

A progenitora e a avó materna realizam visitas conjuntas com regularidade quinzenal. As visitas são caracterizadas, maioritariamente, pela seguinte dinâmica: a criança cumprimenta a mãe e avó, com abraço e beijo, que por vezes, apenas ocorre depois da BB ter os doces/prendas que ambas trazem; as interações decorrem através do uso do telemóvel, ora da mãe, ora da avó para realização de jogos e pela realização de atividades/jogos lúdicos promovidos e, totalmente, orientados pela BB: desenhar, jogar às escondidas, ao macaquinho do chinês, às compras, às professoras.

Estas visitas mostram-se, por vezes, prejudiciais para o equilíbrio emocional da BB, uma vez que, a mãe e avó continuam a criar expectativas irrealistas e imprevisibilidade relativamente à reintegração familiar. Esta situação gera, na criança, sentimentos de frustração e ansiedade, evidenciados nas alterações de comportamento nos dias subsequentes às visitas. Situação sócio-familiar dos progenitores

No seguimento do relatório de acompanhamento que antecede, datado de 29 maio de 2018, comunicam-se as seguintes alterações, ao nível das condições pessoais e familiares dos progenitores:

Relativamente à progenitora, declarou ter exercido atividade profissional nos meses de junho, julho e agosto no ..., à semelhança dos anos anteriores, na área da restauração; durante este período efetuou visita presencial no dia 27 de junho (aniversário da filha) e manteve contacto telefónico em algumas das visitas quinzenais que foram efetuadas pela avó materna;

♦ retomou as visitas quinzenais a partir do dia 29 de agosto de 2018 (após ter regressado do ...);

. em entrevista realizada no dia 03 de dezembro de 2018, recusou atualizar a sua situação atual pessoal, habitacional e laboral, alegando que pretende fazer, autonomamente, essa atualização junto do tribunal e com o apoio do seu advogado atual;

. das informações recolhidas noutros contactos, nomeadamente, durante a mediação de visitas, a D. AA afirma não reunir as condições para receber a sua filha, mas que as pretende obter; terá reiniciado atividade profissional no mês de novembro; estará a residir, de favor, na habitação do pai do namorado (KK), juntamente com o seu restante agregado familiar em .... De referir que, a progenitora verbalizou recentemente que o seu namorado já não reside consigo, tendo ido viver com a mãe;

. a avó materna, D. FF, estará a morar num quarto arrendado em ..., especificamente na habitação do ex-marido, Sr. GG, e referiu ter formalizado candidatura a habitação social, junto da Gaiurb, Câmara Municipal de ..., verbalizando a intenção de, futuramente, receber a filha AA e a neta BB.

Relativamente ao progenitor,

. A avaliação da equipa técnica da EMAT ..., junta aos autos, referia que o seu agregado familiar possuía disponibilidade e reunia as condições básicas necessárias para integrar a BB;

. Entendeu-se primordial, aferir a constância das intenções do progenitor, através da efetiva deslocação do mesmo para visitar a filha de forma regular. A última visita entre o progenitor e a filha ocorreu, no dia 24 de março de 2018 e desde esta data não solicitou visita;

. Em virtude do progenitor não se mostrar pró-ativo para a marcação de visitas e estar incontactável, efetuou-se articulação com a coordenadora de caso, Dr. a LL (EMAT ...), obtendo-se novos contactos telefónicos do Sr. CC, tendo este declarado que estava a passar por alguns problemas pessoais, que teria de ir aos .... Agendou-se visita para dia 23 de junho de 2018, que decorreu de forma positiva, com interação adequada por parte do progenitor e da sua companheira.

. O Sr, CC assumiu o compromisso de contactar a equipa técnica quando tivesse disponibilidade e vontade para fazer novas visitas, contudo, até à data não requereu visita, nem estabeleceu qualquer contacto com a equipa e consequentemente com a sua filha;

• Perante a ausência de contacto por parte do progenitor, não se encontram reunidas condições para se ponderar a definição de um plano de reunificação familiar, junto do seu agregado familiar.

Conclusão

O acolhimento familiar tem proporcionado um ambiente securizante para a criança, promotor de um desenvolvimento cognitivo, psicoafectivo e social harmonioso. A família de acolhimento tem respondido de forma

adequada às necessidades da BB, promovendo o seu desenvolvimento global e assegurando a prestação dos cuidados básicos, de saúde e acompanhamento escolar.

A progenitora declara querer ser considerada no projeto de vida da filha, no entanto, mantém instabilidade pessoal, habitacional e familiar, não possuindo condições, para assegurar os cuidados à BB.

A avó materna mantém instabilidade pessoal e habitacional e não se apresenta como solução para o projeto de vida da BB.

O progenitor não contacta com a filha há quase seis meses, não tendo apresentando interesse num plano de visitas à menor e numa eventual reunificação familiar.".

11- Em 12-02-2019 (referências .......86 e .......58), por acordo de promoção e proteção, foi aplicada a favor da criança, a medida de acolhimento familiar, pelo período de um ano, com as seguintes condições:

a) Os pais e avó materna aceitam que continue a ser aplicada a favor da menor BB, a medida de promoção e protecção de acolhimento familiar.

b) Obrigações que os progenitores e a avó materna aceitam cumprir: i) A avó materna seja submetida a uma avaliação psicológica.

ii) A progenitora seja submetida a um programa de educação parental.

iii) Acompanhamento da mãe pela Segurança Social Central, sendo, oportunamente, indicado um gestor de caso da área da sua residência.

iv) A mãe poderá visitar a menor na Instituição e, posteriormente, pode sair com a mesma, caso estejam reunidas condições para o efeito, informando, previamente, para onde vai e com horário controlado e estando contactável telefonicamente.

v) A Segurança Social deve providenciar pela ajuda económica à progenitora, com vista a que venha a ser, eventualmente, aplicada a medida de promoção e protecção de apoio junto da mesma.

vi) Caso a progenitora venha a reunir, oportunamente, condições emocionais, habitacionais e sociais, a menor pode deslocar-se até à sua residência e aí, eventualmente, vir a pernoitar.

vil) A avó materna poderá continuar a fazer supervisionadas à menor, na Instituição, desde que não simultaneamente com a progenitora.

viii) O pai poderá visitar a menor na Instituição.

ix) As visitas de fim-de-semana da menor à progenitora deverão ser procedidas de parecer favorável da Segurança Social, após visita domiciliária, para conhecimento das suas condições habitacionais.

x) Todos os intervenientes aceitam a intervenção do Técnico da Segurança Social que vier a ser indicado para acompanhar a execução da medida junto da mãe, que apresentará relatórios semestrais.

ii) A duração deste acordo será de um ano.

12- Do relatório de avaliação psicológico efetuado à criança BB, em junho de 2019 (referência ......51), consta o seguinte:

"A avaliação da BB foi requerida para estudo do comportamento emocional. Durante a avaliação, foram propostos um conjunto de atividades apresentadas sob a forma de provas de referência a norma e a critérios, com o objetivo de definir o atual perfil emocional da BB.

A Avaliação Psicológica decorreu em dois momentos. No primeiro momento, a BB não foi tão colaborante nas atividades propostas, encontrava-se muito agitada e um pouco birrenta. Já no segundo momento, apresentou os níveis de motivação e de colaboração esperados durante a realização das diferentes provas correspondentes à avaliação.

A BB demonstrou ser uma criança com capacidade para estabelecer uma interação adequada e empática com o adulto; é uma criança alegre e muito faladora. É uma criança com picos emocionais e comportamentais, facilmente amua e faz birras (principalmente quando contrariada ou aquando de um "não"), bem como tem a necessidade constante de ter a atenção dirigida para ela.

Com recurso à técnica projetiva do Desenho da Família e da Figura Humana considerou- se importante analisar qualitativamente os desenhos da BB.

A BB evidencia no seu Desenho da Figura Humana, de autorrepresentação, uma boa autoestima, recorre a um traçado organizado e cuidado, com pormenores na figura, membros, cabeça e olhos. O facto de ter o cuidado em pintar o seu desenho, com cores vivas e uma pintura cuidadosa, dentro dos contornos, salienta um gosto e valorização pessoal

Na representação gráfica do Desenho da Família, a BB fez a representação da sua família de acolhimento, valorizando cada elemento que a constitui com traçado firme e seguro e recorreu a cores. A BB, representou toda a família de acolhimento junta, havendo a perceção de uma estrutura emocional estável e equilibrada, apoiada numa segurança familiar expressa através do colorido geral do desenho. Todos os elementos têm um semblante de alegria.

Demonstra que tem noção de conceito de família.

Os resultados obtidos, mostram-nos que a BB é uma criança que se encontra bem integrada na família de acolhimento, conta as experiências por que vai passando com a mesma, bem como conta como são as visitas com a família biológica. De salientar que, nas semanas que a BB vai à visita, verifica-se uma grande agitação psicomotora, ansiedade, comportamentos de birra e por vezes de oposição.

Tem vindo a verbalizar com alguma angústia, que "a mãe prometeu que me vinha buscar quando as aulas começassem, mas ainda não veio...mentiu... " e também que "a avó me disse que me ia levar para casa dela " e quando questionada sobre o que sente, disse "quero ficar com a mamã EE

Tendo em conta os aspetos acima referidos, e com a intervenção que tem vindo a ser feita, é notório que a BB demonstra instabilidade emocional e comportamental nas semanas de visita, bem como ansiedade. É visível a boa integração na família de acolhimento, conseguindo estabilidade e segurança com os elementos da mesma. É importante o Apoio Psicológico no sentido de desenvolver as competências e estratégias específicas, para promoção do seu bem-estar emocional.'.

13 - Em julho de 2019 foi realizado relatório de acompanhamento por parte da equipa técnica da Associação...IPSS, que atesta que as visitas da progenitora e da avó não ocorriam de maneira proveitosa para a criança, assim como que a mesma reconhecia os membros da família de acolhimento como as figuras parentais de referência, verbalizando sentimentos de pertença e evidenciando uma relação de vinculação segura.

14 - Efetuadas várias marcações em consultas de Psicologia Forense no INML, a avó da criança, FF, faltou às mesmas.

15 - Em 03-02-2020 (referência ......34), foi junto aos autos relatório conjunto da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, com o seguinte teor:

"Evolução da Situação e Resultados da Intervenção

Da avaliação da execução da medida, reforça-se que a BB se encontra bem integrada no contexto familiar com o qual reside desde julho de 2016. Identifica na família de acolhimento os cuidadores e principais figuras parentais de referência, demonstrando nas verbalizações e atitudes uma relação de vinculação segura. Nas observações diretas e no discurso apresentado, a BB demonstra satisfação ao relatar as rotinas e dinâmicas do quotidiano. Ao nível comportamental, mantém resistência no cumprimento de algumas regras, sendo ultrapassadas com a manutenção de estratégias e práticas educativas ajustadas à idade (negociação, assertividade, persistência,). A BB continua a apresentar alterações comportamentais e do sono no dia e dias subsequentes à visita com a família biológica.

Como atividade extracurricular, mantém a frequência da natação no contexto escolar, e de acordo com a avaliação do primeiro período, a BB demonstra iniciativa, interesse e motivação para o estudo. Relaciona-se com os pares e com os adultos com respeito e compreensão, cumprindo com as regras. Realiza as atividades/tarefas propostas de forma eficaz, salientando-se que deverá manter o bom trabalho e empenho para manter e/ou potenciar a obtenção de melhores resultados. No enquadramento educativo, para além das unidades curriculares frequenta atividades de enriquecimento curricular, nomeadamente, Atividade Física e Desportiva, Artes, Agir e atividades de Relaxamento/Yoga.

Ao nível da saúde, a família de acolhimento mantém o acompanhamento médico regular nas consultas de medicina familiar e infantil na Unidade de Saúde Familiar e na especialidade de pediatria, no Centro Hospitalar de ....

Mantém acompanhamento na especialidade de psicologia, pela Dra. NN, na ..., com objetivos de intervenção centrados na gestão comportamental e emocional, registando-se ligeiras melhorias. A Dra. NN assinala a existência de picos emocionais nas sessões coincidentes com a semana de visita à família biológica, pelo que nestas mesmas sessões se mostra pouco colaborante. Na semana em que não há visita, a sua postura mostra-se colaborante, realizando todas as tarefas propostas.

Relação / contactos da criança com a família biológica

. De acordo com a informação que antecede, a progenitora, AA, terá ido trabalhar para ..., onde diz ter residido de fevereiro a de julho de 2019, no entanto, conforme comunicado, não apresentou qualquer tipo de documento comprovativo da sua situação em ..., durante o período que esteve no estrangeiro, manteve contacto com a BB, por intermédio de videochamada;

. Após o regresso de ..., a progenitora, comunicou, em julho, que tinha decidido ir trabalhar para um restaurante, que um tio estaria a explorar, em ..., distrito da .... Nesta altura verbalizou que pretendia arrendar casa/apartamento neste município, pelo facto das rendas serem muito económicas e pretender reorganizar a sua vida nesta localidade. A participação nas visitas foi sendo irregular atendendo às dificuldades de deslocação; em outubro, a progenitora informa que a situação junto do tio não correu como esperado, pelo que iria regressar, ficando a residir temporariamente, em casa de um amigo, no ...; neste período verbaliza querer arrendar casa para si e para a sua mãe e solicitar o apoio da segurança social proposto em fevereiro. Retoma as visitas com regularidade quinzenal;

A D. FF corrobora a pretensão, contudo refere que a filha estaria a trabalhar num "barzinho que se chateou com o tio da ... e que voltaria para .... Mais referiu que a sua relação com o Sr. GG não resultou, deixando de residir com este, estando a trabalhar em casa de um idoso, de segunda a quinta-feira, prestando-lhe os cuidados e ficando de sexta-feira a domingo em casa de uma amiga, em ...;

♦ Em novembro, a progenitora declara que não pretende solicitar ajuda aos serviços da segurança social, por não querer indicar a morada onde está temporariamente (habitação dos pais do amigo); confirma que iniciou nova atividade profissional, realizando tarefas de limpeza em alojamentos locais no concelho do ..., apresentando, nesta altura, contrato de trabalho, o qual se junta em anexo;

. Em dezembro, a progenitora refere que residirá na ..., em casa de uma pessoa idosa, à qual fará companhia e obterá outro rendimento por estar a dar este apoio;

A avó materna manteve visitas supervisionadas, com regularidade quinzenal, durante os períodos de ausência da mãe. Nas visitas em que a progenitora participou, efetuou visita juntamente com a sua ascendente;

• A dinâmica das visitas é pautada por uma interação relacional e de manutenção dos laços familiares, pela realização de jogos colocados à disposição na visita, bem como, outros jogos propostos pela BB, realização de desenhos e uso do telemóvel da avó para realização de outros jogos e visualização de fotografias. A progenitora e a avó, por vezes, trazem lanche, noutras ocasiões vão com a menor comprar o mesmo ao café ou ao supermercado nas imediações do local de visita. A progenitora e a avó, mantêm o reforço verbal à BB, durante as visitas, que estão a melhorar as condições familiares para viverem juntas;

. A D. AA perante a sua instabilidade pessoal, relacional, habitacional e profissional refere ser fruto de um percurso de vida com muitas dificuldades e sem apoios. Justifica que, a sua relação com a D. FF não é positiva, salientando que a sua mãe a prejudica permanentemente, quer na vida pessoal, quer no processo da filha. Entende, atualmente, ter maior maturidade e apresenta um discurso de esperança em obter mais tempo para reorganizar a sua vida para no futuro vir a ser a solução para o projeto de vida da BB;

. Relativamente ao progenitor, CC, conforme referido na informação que antecede, mantém ausência de contactos, sem realização de visitas com a BB desde 23 de junho de 2018.

Face ao exposto, somos de concluir que as ações acordadas com a família biológica, na sentença de 12 de fevereiro de 2019, não foram concretizadas.".

16- Nesse seguimento, em 04-03-2020, (com a referência .......30), em face do silêncio dos progenitores e da avó materna, regularmente notificados que foram para se pronunciarem quanto à revisão da medida de promoção e proteção, foi determinada a sua prorrogação por mais 1 um ano.

17- Em 29-09-2020 (referência ......23), foi junto aos autos relatório conjunto da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, com o seguinte teor:

"Evolução da Situação e Resultados da Intervenção

Da avaliação da execução da medida, entende-se que a BB se encontra bem integrada no contexto familiar com o qual reside. Reconhece a importância da família de acolhimento no seu dia-a-dia, identificando-os como as principais figuras parentais de referência, evidenciando uma relação de vinculação segura. A BB demonstra ser uma criança feliz, muito comunicativa e apresenta satisfação ao descrever as suas rotinas e dinâmicas do quotidiano.

Com o intuito de continuar a promover o desenvolvimento das competências pessoais e sociais da criança, têm sido mantidas estratégias educativas como o reforço positivo, a persistência e a manutenção de regras e limites ajustadas às necessidades da sua faixa etária.

Como atividades extracurriculares, gradualmente, irá retomar a frequência da natação e iniciar a frequência da dança. No contexto escolar, de realçar a transição, com bom aproveitamento, da BB para o segundo ano de

escolaridade. De acordo com a avaliação escolar, demostra empenho e motivação na realização das tarefas propostas, revelando "relativa facilidade no acompanhamento dos conteúdos lecionados Mantém o enquadramento escolar e a mesma professora titular. Encontra-se inscrita em centro de estudos como componente de apoio à família nas tardes em que não possui componente letiva.

Ao nível da saúde, a família mantém o acompanhamento médico regular nas consultas de medicina familiar e infantil na Unidade de Saúde Familiar e na especialidade de pediatria, no Centro Hospitalar de .... Pontualmente, realiza tratamento ao nível de medicina dentária. Mais recentemente, a BB foi encaminhada para consulta de despiste e avaliação nas especialidades de alergologia e otorrinolaringologia, aguardando marcação.

Intervenção psicológica com a criança

O acompanhamento na especialidade de psicologia, pela Dra. NN, na ..., foi mantido, por intermédio de consultas em videochamada durante o período de confinamento e, desde julho, foram retomadas as consultas presenciais. Neste âmbito, a intervenção mantém-se focada na gestão comportamental e emocional, bem como na melhoria da atenção/concentração e impulsividade. A Dra. NN realça a evolução positiva e colaboração da criança na intervenção, contudo assinala novas alterações de comportamento recentes, evidenciadas por episódios de dificuldades ao nível do sono, aumento de agressividade e sentimentos de insegurança, os quais poderão estar interligados às promessas da progenitora no seu regresso e na hipótese de a BB voltar a viver com ela.

A BB, atualmente, revela ser uma criança consciente do seu percurso de vida, com sentido crítico, verbalizando e identificando a existência na sua vida de "quatro mundos": a sua "casa" e da família de acolhimento; a "casa" da mãe; a "casa" do pai; e a "casa" da avó. Apresenta inseguranças e medos quanto ao seu futuro, quando confrontada com as expectativas transmitidas pela progenitora e pela avó, afirma: "não quero ir viver com a minha mãe, tenho medo, se fosse viver com ela, se calhar não me deixava ver a EE O "mundo" idealizado da BB compreende viver ao mesmo tempo, e na mesma casa, com a família de acolhimento e com a mãe.

Relação / contactos da criança com a família biológica

, Atendendo à suspensão das visitas, decorrente do surto de COVID-19, as visitas presenciais, com a progenitora e com a avó, foram substituídas por contactos telefónicos, durante os meses de março a maio.

Em junho, procedeu-se ao reinício das visitas presenciais, que contou com a presença da avó materna, no dia 23 de junho de 2020 e no dia 16 de setembro de 2020. Este hiato entre marcação de visitas deveu-se ao surgimento de situação de saúde que impedia a deslocação da avó às visitas.

. A progenitora não realiza visita presencial com a BB desde o dia 10 de março de 2020, altura em que alterou residência para .... Desde então, mantém contactos telefónicos quinzenais com filha e com a família de acolhimento para manutenção dos laços familiares e partilha de situações da vida diária. A família de acolhimento,

pontualmente, envia fotografias da BB na realização de atividades da vida quotidiana (na piscina, a andar de bicicleta, entre outras).

. A BB nos últimos contactos tem questionado de forma mais regular a situação da progenitora, onde está, onde trabalha, onde vive e com quem, bem como, questões relativas ao seu passado. A progenitora no seu discurso assume à filha que não tem condições para ficar com ela, mas que vai fazer tudo para voltar a viver com ela. Situação da família biológica

. Na informação que antecede, reforçou-se a instabilidade pessoal, relacional, habitacional e profissional da progenitora, que terá residido no ..., em ..., no ... e na ....

♦ Desde então, terá ido para ... e posteriormente para o ..., nomeadamente em ..., onde refere, atualmente, estar a trabalhar num bar, sem contrato de trabalho. Mais menciona que pretende trabalhar nesta localidade até ao fim de setembro, regressando a ... em outubro, onde afirma que residirá com o seu pai e pretende procurar nova ocupação profissional.

. Da auscultação realizada à progenitora realça-se que a mesma verbaliza estar consciente da sua impossibilidade/incapacidade para ficar com a filha; que o seu percurso de vida não lhe possibilitou outra estabilidade; que a BB está bem integrada, cuidada e acompanhada na família de acolhimento; que a sua mãe prejudicou sistematicamente a sua situação de vida e a da BB; que não mantém contacto há alguns meses com a sua mãe e que acha prejudicial para a BB continuar a manter contacto/visitas da avó materna. ♦ Da entrevista com a D. FF salienta-se que confirma a ausência de contactos com a filha AA por iniciativa desta; nos últimos meses afirma ter trabalhado como cuidadora de idosos em ...; refere ter estado alojada em ..., posteriormente no ... e, atualmente, diz estar a residir em ... na habitação de uma pessoa idosa de quem afirma ser cuidadora.

Relativamente ao progenitor, CC, reforça-se que não efetua qualquer contacto/visita com a BB desde 23 de junho de 2018, Face ao exposto, considera-se que a instabilidade e a ausência dos elementos da família biológica (mãe, avó e pai) continuam a revelar que não existem alternativas executáveis em meio natural de vida que sejam uma resposta para o projeto de vida da criança.

Não obstante, a execução da medida estar a ser promotora do desenvolvimento integral da criança, considera-se que perante as inseguranças expressas pela BB, é nosso entendimento que a menor necessita de estabilidade e previsibilidade quanto ao seu futuro, para que o seu quotidiano não seja pautado por incertezas e expectativas sistematicamente criadas e não concretizadas, quer pela mãe quer pela avó, pois tais incertezas quanto ao futuro, geram insegurança e ansiedade que se traduzem numa constante inquietação para a criança, a qual necessita urgentemente de uma resposta segura e duradoura.".

18 - Em 09-10-2020, em novo relatório, conclui-se, em síntese, que, a criança BB tinha desenvolvido relações afetivas estruturantes e de referência para o seu saudável e harmonioso desenvolvimento com a referida família, que a família de acolhimento estava disponível para continuar com a medida, assim como a progenitora AA, considerava que a sua filha estava bem na família de acolhimento, e esclareceu que tem boas relações com esta família.

19 - Do relatório em psicologia junto em 16-11-2020 (referência ......68), resulta que "A BB foi confrontada com a possibilidade de regressar à mãe biológica, a qual trata por AA, tendo respondido prontamente que não quer ficar com ela, mas sim com a mãe EE e o pai DD, Família de Acolhimento, referindo, no entanto, que gostaria de continuar a ver a mãe de vez em quando." e que "É visível a boa integração da criança com a Família de Acolhimento, conseguindo estabilidade e segurança com os elementos da mesma, tendo já incutido as regras e rotinas de família.".

20 - Em 14-05-2021 (referência ......33), foram juntos aos autos relatório da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, donde resulta, em síntese que:

"Atendendo ao exposto, a BB continua bem integrada na família de acolhimento, verificando-se que mantém com os atuais cuidadores uma vinculação segura. Os contactos com a família biológica têm sido mais espaçados, porém continuando a verificar-se não terem um impacto positivo na criança. A progenitora e a avó materna continuam com uma situação pessoal e profissional instável, não se constituindo como alternativa.

Não obstante se verificar que a BB se encontra estável do ponto de vista emocional e bem integrada na família de acolhimento, considera-se necessário proporcionar a esta criança um projeto de vida que se constitua seguro e duradouro. A medida de acolhimento, por si, deve constituir-se como uma medida temporária, com vista à definição do projeto de vida futuro da criança. Estando a BB atualmente com 7 anos e não se perspetivando o regresso à família de origem, urge encontrar uma alternativa, uma vez que o tempo útil da criança se está a esgotar. A família de acolhimento mantém disponibilidade para manter o acolhimento da BB, nos moldes atuais, com apoio técnico da Associação...IPSS. Mais somos a salientar que, embora a BB verbalize desejar continuar a manter contacto com a progenitora, o que se tem verificado ao longo do período de acompanhamento deste processo é que os contactos da criança com a família biológica são desestruturantes e promovem o desequilíbrio emocional da BB: provocam distúrbios do sono, ansiedade e medos relativamente ao futuro.

Como tal, considera-se, salvo melhor opinião, que a atual medida de promoção e proteção, de acolhimento familiar, deve ser prorrogada, por um período de seis meses. Não obstante, irá esta EMAT diligenciar, juntamente com a equipa da Associação...IPSS, para melhor definição do projeto de vida da BB

21 - Nesse seguimento, em 16-06-2021, (com a referência .......14), em face do silêncio dos progenitores e da avó materna, regularmente notificados que foram para se pronunciarem quanto à revisão da medida de promoção e proteção, foi determinada a sua prorrogação por mais 1 um ano.

22 - Nos relatórios da Segurança Social e da equipa técnica da Associação...IPSS, juntos a 17-01-2022 (referência ......27) respetivamente, que versaram sobre o acompanhamento da execução da medida, foi sugerido que, em sede da sua revisão, fosse substituída por outra, de confiança a pessoa selecionada para a adoção, a família de acolhimento ou a instituição com vista à adoção, ao abrigo do estatuído nos artigos 35.°, n.° 1, alínea g), 38.°-A, 62°, n.°s 1 e 3, alínea b), e 62.°-A, da Lei de Proteção de Crianças e Jovens em Perigo, por se considerar que os pais da criança não se constituíam como garante da promoção dos direitos e proteção de BB e não existia alternativa na família alargada.

23 - A avó materna da menor FF considera que atualmente não dispõe de condições de ficar com a neta e que o projeto de vida desta passará pela reunificação junto da progenitora.

24 - Do certificado de registo criminal de FF consta que foi condenada:

- Por decisão proferida no dia 28/07/2008, transitada em julgado em 29/09/2008, no âmbito do processo n.° 968/05.0... do Tribunal Judicial da ..., relativamente a factos ocorridos em 14/11/2005, que integram a prática de um crime de maus-tratos ou sobrecarga a menores, na pena de 13 meses de prisão, com sujeição a deveres, suspensa por igual período, suspensão essa que veio a ser prorrogada por mais um ano, declarada extinta em 30/10/2010.

- por decisão proferida no dia 01/10/2014, transitada em julgado em 31/10/2014, no âmbito do processo n.° 112/13.0... do Tribunal Judicial de ..., relativamente a factos ocorridos em 19/01/2013, que integram a prática de um crime de violência doméstica contra cônjuge, na pena de 2 anos de prisão, com sujeição a deveres, suspensa por igual período e na condição de pagar ao ofendido a quantia de 6 1.500,00, dentro daquele prazo.

25 - O progenitor CC reside nos ... e está completamente alheado dos problemas, das necessidades e do processo de crescimento da filha.

26 - O progenitor CC, disse não ter meios económicos para ter a menor aos seus cuidados, admitindo, que não mantém contacto com ela há muito tempo, entendendo não ser alternativa para a filha.

27 - Do certificado de registo criminal do pai da menor, consta que foi condenado pela prática de dois crimes de condução sem habilitação legal, por decisões proferidas e, 12/10/2021 e 15/12/2021.

28 - A progenitora da BB, AA refere que pretende que a filha seja entregue aos seus cuidados.

29 - A progenitora da menor encontra-se a viver em ..., com o pai e o namorado.

30 - A progenitora não tem trabalho fixo, fazendo trabalhos de empregada doméstica, pelos quais é remunerada em montante que não foi possível apurar.

31 - A progenitora não tem uma estrutura organizada para receber a filha aos cuidados e não tem quarto para esta.

32 - A progenitora da BB não reúne condições emocionais, de maturidade, laborais e familiares que lhe permitam que a filha seja entregue aos seus cuidados.

33 - Do certificado de registo criminal da progenitora da menor, nada consta.

34 - DD e EE, família de acolhimento da BB, ouvidos em 15-02-2022, (referência .......68) e em sede de julgamento (referência ......34), assumem-se, apenas, como família de acolhimento da BB, não estando disponíveis para a apadrinhar, estando dispostos e disponíveis para a ajudar sempre e enquanto for necessário. Esclarecem que são uma família para a BB, tratando-a como filha, no sentido de lhe assegurarem tudo o que precisa, mas apenas como família de acolhimento e não como pais, no sentido de não quererem assumir a sua "paternidade". Que caso a medida de acolhimento residencial seja prorrogada, aceitam continuar a ser família de acolhimento, estando dispostos a ser família de acolhimento da BB, mesmo para além da sua maioridade civil.

35 - A BB está completamente adaptada à família de acolhimento e à escola, identificando os elementos da família de acolhimento, referindo-se a eles de forma muito positiva.

36 - A BB é uma criança muito ativa, bem desenvolvida, perspicaz, feliz, muito carinhosa e afetiva e uma excelente aluna.

37 - A BB trata os membros da família de acolhimento por pai e por mãe. 38- As visitas à família biológica criam incertezas e ansiedade à BB.

39 - Depois das visitas, a BB vem nervosa.

40 - Quando a BB fala com a mãe fica alterada.

41 - A BB foi ouvida em 15-02-2022, (referência .......68), pela menor tendo dito que: "... vive com a mãe (EE), o pai (DD) e o mano (OO), que tem ... anos de idade. Gosta de estar com eles. Frequenta o 3º ano. Gosta de estar com a EE e queria estar com ela para o resto da vida. Ao mesmo tempo gosta da AA e da avó. Que a avó lhe disse que no dia 15 tinha que escolher entre elas e a EE e que devia escolher ficar com elas porque a mãe ia dar-lhe tudo.

Relativamente a viver com o pai disse que já não vê há muto tempo e que quer ficar com a EE.

Na hipótese de não poder ficar a viver com a EE nunca pensou em viver com outra família. Tem muitos amigos na escola.

Está feliz.

As visitas à avó correm bem, que a sua família é a família da EE e tem muitos amigos da escola, mas gosta de estar com a avó e a AA, a avó disse para ela escolher a AA, mas ela escolhe a EE.

Está feliz onde está, não se imagina a sair desta família para outra. As visitas da avó são nos Associação...IPSS e quer que continue assim. Não sabe o nome do pai nem o conhece e não quer ir passar uns dias com o pai.

Disse que se não tivesse mais visitas da avó e a mãe ficava um bocadinho triste. Questionada sobre se pudesse escolher pessoas para ir numa viagem de barco à vela numa viagem de uma semana quem levaria consigo disse que levaria a mãe, o pai, o mano e a PP, a sua melhor amiga.

Disse que não quer ir a casa da avó. Disse que não quer passear com a mãe AA, nem com a avó. Diz que quer que as visitas continuem a decorrer como vêm acontecendo, ou seja, no Associação...IPSS. Não sabe o nome do seu pai biológico.


*

Não provado:

A) - A mãe da BB está disponível para a receber de imediato.

B) - A mãe da menor é uma pessoa trabalhadora e tem apoio de familiares.

C)A progenitora não para em nenhum trabalho.2

D) A progenitora trabalhou num bar de streep tease;

E) progenitora esteve numa casa de prostituição.

F) A progenitora, no algarve, trabalhou em três sítios.

G) A progenitora foi despedida.

H) A progenitora foi apanhada a roubar.

I) A progenitora deve dinheiro à mãe.

J) O Sr. HH chamava estúpida à BB

k) A BB tinha medo dele.

L) A família de acolhimento enviasse fotografias da BB.

B. Do Direito

1. A matéria de facto e a prova

Constitui entendimento uniformemente preconizado que em recurso de revista o Supremo não conhece da matéria de facto fixada pelas instâncias, excepto se configurarem o desrespeito de regras de direito, por se basearem em meios de prova com valor legalmente tabelado ou se estiver em causa a admissibilidade de meios de prova – artigo 674.º, nº3, do CPC.3

A recorrente invoca - 1ª a 4ª conclusões - que o acórdão errou ao considerar factos provados, atendendo: “a avó da menor e as técnicas sociais dizem mal da recorrente não tem valor jurídico nenhum, sem se darem por provados os factos que elas afirmam contra a recorrente (…) confirmados em audiência de julgamento e sujeitos ao princípio do contraditório. “; A instituição particular de solidariedade social, APAV, é composta por técnicos sociais para apoio às vítimas, não tendo nenhuma das suas técnicas competências para afirmar com valor científico que a recorrente era toxicodependente e bipolar, o que só pode ser atestado por médicos de psiquiatria, padecendo o acórdão recorrido de falta de rigor científico e de dar por provados meros rumores. 3ª Quando o acórdão recorrido escreve, como prova da toxicodependência, que a recorrente esteve internada num centro para desintoxicação da droga e se verifica, por factos notórios e do conhecimento público, que essa instituição não se destina à desintoxicação da droga, mas ao internamento de jovens, demonstra-se a sua displicência na elaboração da matéria da facto provada e o incumprimento do princípio da instrução da prova, em que se exige a indagação dos factos, violando a lei o acórdão recorrido ao dar por provado quem dizia mal da recorrente, sem uma análise crítica das provas.” 4ªAadesão que o acórdão recorrido fez às informações e relatórios sociais com vista à adopção da filha da recorrente nunca poderia acontecer sem se submeterem todas essas informações e relatórios ao princípio do contraditório, carecendo o acórdão recorrido de sentido crítico em relação a todos esses relatórios e informações, violando a lei que impõe ao julgador um exame rigoroso das provas. Uma mãe não pode perder uma filha com base em rumores ou no que dizem de si, tem de haver rigor e imparcialidade na avaliação da prova.»

À margem da discordância da recorrente do sentido probatório acolhido, não se observa violação de norma de direito probatório e já se disse, que não cuida esta instância em discretear acerca da convicção do tribunal a quo, assente nas declarações e relatórios indicados que a fundamentaram, sujeitos ao princípio da livre convicção do julgador.

O princípio da livre apreciação da prova, determina que esta é apreciada, não de acordo com regras legais pré-estabelecidas, mas sim, segundo as regras da experiência comum e de acordo com a livre convicção do juiz, uma livre convicção que não pode ser arbitrária ou subjectiva e, por consequência, exige -se motivada, permitindo o seu controle e a garantia da objetividade.

A sublinhar que no acórdão a decisão sobre a matéria de facto impugnada encontra-se agora claramente motivada, de forma coerente, sendo possível reconstituir o iter lógico seguido pelo tribunal para alcançar o juízo probatório veiculado sobre os factos.


*

Improcede a alegação da recorrente.

2. Os critérios de legalidade para a medida decretada

A recorrente põe em crise a decisão de futura adopção da filha, argumentando de relevante, que não estão verificados os pressupostos legais do artigo 1978º do Código Civil e que a interpretação conferida na decisão afronta o artigo 2º da Constituição e o artigo 9º da Convenção dos Direitos da Criança.

Afirma em suporte que foi afastada da filha por razões de debilidade económica que não lhe retiram o estatuto elegível para cuidar da filha e que cabe ao Estado auxiliar e promover as condições adequadas à família biológica, o que não sucedeu, desrespeitando-se assim o princípio da prevalência da família biológica como meio natural da criança.

Como ressalta na 32ª Conclusão do seu recurso “O pensamento de que cabe ao Estado, aos seus serviços e aos seus poderes, decidir qual a melhor família onde se deve educar uma criança, em vez de ajudar as famílias naturais a ter melhores condições para educar as suas crianças, não é mais do que uma nacionalização da educação dos menores só possível em regimes totalitários.»

Mais alega que o avô materno manteve disponibilidade para receber a neta, e também foi excluído pela sua situação económica.

No restante argumentário recursivo, enumera factos que dados como provados, no seu entender, não correspondem à verdade.

Apreciando.

A medida de confiança do menor para futura adopção, pressupõe o diagnóstico pretérito e consistente da situação de perigo junto da família biológica, na prognose da sua vida decorrer num meio familiar securizante que viabilize o seu crescimento saudável, acompanhado, harmonioso e prospetivo de um futuro como cidadão integrado na sociedade.

A situação de perigo em que se encontrava a BB em 2015, com dois anos de idade, no seio da família biológica, foi criteriosamente acompanhada e auxiliada ao longo de 6/7 anos, fomentando por todos os meios, inclusive na componente económica, mas mais do que isso, com o objectivo de capacitar a progenitora (também a avó materna) para exercer o poder-dever paternal num futuro breve.

Assim decorre da extensa factualidade circunstanciada no ponto 3 dos factos provados.

A progenitora deixou a filha aos cuidados da avó materna, que não tinha, como declarou, condições para tal.

A mudança de residência constante e a composição instalável do agregado familiar, com reflexo negativo comprovado na BB, que determinou pela situação de perigo a medida provisória de acolhimento familiar da criança então com ¾ anos. – v. ponto 3. Parágrafo 19 a 23.

No decurso dos dois anos subsequentes, no final de 2017, a avó materna não demonstrou condições mínimas de estabilidade habitacional e familiar para receber de novo a BB, situação que a progenitora também manifestou oposição, apesar de não veicular pretensão de passar a cuidar da filha-v. ponto 5 dos factos.

Em 2018, face à situação de estabilidade familiar demonstrada pelo pai da BB, tudo apontava para que fosse integrada no seu novo núcleo familiar, o que, contudo, se frustrou por omissão daquele -ponto 6 dos factos.

Durante esse ano, pese embora o reporte e contacto permanente entre os serviços de apoio e a progenitora recorrente, não se constatou qualquer evolução positiva na instabilidade de residência, trabalho e agregado familiar, entre o ... e o ....

Situação de instabilidade que se estendia à avó materna, que recebia efectivo apoio económico - v. ponto 6, parte final.

No final de 2018, ouvidas, declararam pretender que a menor lhe fosse de novo confiada.

Quadro de instabilidade que perdurava em 2019, verbalizando a progenitora não ter condições para cuidar da filha – v. ponto 11, concordando os pais pela prorrogação da medida de acolhimento, estabelecendo-se contactos, visitas, ajuda económica à mãe da menor e acompanhamento de técnico da segurança social.

Medidas que tinham por objectivo aproximar e concretizar a ligação da criança com a mãe e permitir o restabelecimento da situação familiar. Tal não se concretizou, a mãe da BB ausentou-se para o estrangeiro durante meses, e regressando, instalou centro de vida, sucessivamente na ... e ....

Correndo já o ano de 2020, os progenitores não responderam à notificação quanto à renovação da medida.

A mãe não visitou a filha desde março de 2020 e ausentou-se sucessivamente para ... e ..., não apresentando suporte de residência ou trabalho. O pai da BB desde 2018 que não contactou a filha – v. pontos 16 e 17.

Do outro lado, a BB foi crescendo em ambiente familiar seguro, emocionalmente estável, seguindo rotinas sociais e escolares com aproveitamento, frequentando actvidades extracurriculares e exibindo manifesto bem-estar físico e psíquico no quadro da família de acolhimento- v. pontos anteriores.

A avaliação especializada da menor e a situação favorável em que se encontrava em outubro de 2020, no confronto com a situação dos elementos da família biológica descrita, levaram à conclusão de “que a BB devia continuar com a referida família, que a família de acolhimento estava disponível para continuar com a medida, assim como a progenitora AA, considerava que a sua filha estava bem na família de acolhimento, e esclareceu que tem boas relações com esta família” - v. pontos 18 e 19.

Paralelamente e já em 14-05-2021 na sua avaliação - “embora a BB verbalize desejar continuar a manter contacto com a progenitora, o que se tem verificado ao longo do período de acompanhamento deste processo é que os contactos da criança com a família biológica são desestruturantes e promovem o desequilíbrio emocional da BB: provocam distúrbios do sono, ansiedade e medos relativamente ao futuro “–v. ponto 20.

Promovendo os serviços, ainda assim, o contacto com os pais e avó materna da menor para serem ouvidos quanto ao prolongamento da medida, silenciaram-ponto 21.

Mantendo-se inalterado este quadro factual, em 2022, a equipa técnica de acompanhamento, não podia objectivamente deixar de considerar no sue relatório final “que os pais da criança não se constituíam como garante da promoção dos direitos e proteção de BB e não existia alternativa na família alargada.

O excurso factual traça o diagnóstico da evolução da situação da BB e da família biológica, desde o início da intervenção.

Dele resultam evidenciadas as razões que justificam objectivamente o decretamento da medida de acolhimento para futura adopção - corresponde à solução que protege o superior interesse da BB, actualmente com 10 anos de idade.

Factualidade que demonstra que a recorrente, enquanto mãe, apesar das suas condições de vida pessoal e familiar erráticas, foi permanentemente auscultada sobre o destino da filha, convocada para participar no seu percurso, impulsionada a manter os laços afetivos e ajudada a criar condições favoráveis para poder vir a cuidar da filha, em ambiente estável e gerador de confiança.

Apesar disso, ao longo de quase seis anos, na situação pessoal da recorrente persistiram as notas vincadas de instabilidade emocional e psicológica , desagregada de um local, percorrendo o país e o estrangeiro em condições que não propiciam meios de sustento certo, conflituosa com a família, ausentando-se por longos períodos do contacto com a filha, e repetidamente indiferente às solicitações dos serviços de apoio e acompanhamento, i.e, não concretizou com acções qualquer projecto de vida futura que permita integrar a BB, inexistindo um comprometimento sério da progenitora e com tal objectivo.

De outro lado, afastada a hipótese de a menor ingressar na vida do pai, também na família alargada, sobretudo junto da avó materna, procurou-se acompanhar a sua situação, de molde a eventual confiança da neta, revelando igual instabilidade emocional e familiar, apesar do apoio económico, alternando entre a declaração de não ter condições para receber a neta, para em momento ulterior verbalizar o oposto.

Tanto assim, que a BB acabou por revelar sinais de sofrimento após as visitas entrecortadas da mãe e da avó materna, “gerando desequilíbrio emocional, distúrbios do sono, ansiedade e medos relativamente ao futuro”. -v. ponto 20 E 21.

O artigo 3.º da Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP) preceitua que a intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem quando este se encontra numa situação de perigo.

Situação que se verifica quando os pais, ou quem tenha a guarda de facto coloquem em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento.

Como resulta dos factos, a avó da BB ao cuidado de quem estava entregue com 3 anos de idade, manifestou ela própria não ter condições para tratar da neta e a filha estar ausente.

A situação pessoal da mãe da criança e da avó materna não se alteraram, inexistindo condições favoráveis na família natural, não se estabelecendo relações afetivas estruturantes e meio adequado ao desenvolvimento saudável e harmónico da BB.

Quadro de perigo para a criança, confirmado no acompanhamento da execução da medida (provisória) de confiança a família de acolhimento, com quem a BB vive desde então e lhe proporciona um meio caloroso e seguro, conferindo-lhe bem-estar e condições de crescimento estruturado e saudável.

Os pressupostos de lei da medida de confiança para futura adopção.

Interessa, desde logo, o disposto no artigo 4.º da LPCJP quanto aos princípios orientadores da intervenção - «A intervenção para a promoção dos direitos e proteção da criança e do jovem em perigo obedece aos seguintes princípios:

a) Interesse superior da criança e do jovem - a intervenção deve atender prioritariamente aos interesses e direitos da criança e do jovem, nomeadamente à continuidade de relações de afeto de qualidade e significativas, sem prejuízo da consideração que for devida a outros interesses legítimos no âmbito da pluralidade dos interesses presentes no caso concreto; (..)

Por seu turno, estabelece o artigo 38.º-A, alínea b), daquela LPCJP, que a medida de confiança a família de acolhimento com vista a futura adopção é aplicável quando se verifique alguma das situações previstas no artigo 1978.º do Código Civil que consiste na colocação da criança ou jovem em família de acolhimento com vista a futura adopção.

Dispondo o artigo 1978.º, n.º 1, do Código Civil

“O tribunal, no âmbito de um processo de promoção e proteção, pode confiar a criança com vista a futura adoção quando não existam ou se encontrem seriamente comprometidos os vínculos afetivos próprios da filiação, pela verificação objetiva de qualquer das seguintes situações:

(a) …b) …c).).

“d) Se os pais, por ação ou omissão, mesmo que por manifesta incapacidade devida a razões de doença mental, puserem em perigo grave a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança;

e) (..)

2. Na verificação das situações previstas no número anterior, o tribunal deve atender prioritariamente aos direitos e interesses da criança.

3. Considera-se que a criança se encontra em perigo quando se verificar alguma das situações assim qualificadas pela legislação relativa à proteção e à promoção dos direitos das crianças.

4. A confiança com fundamento nas situações previstas nas alíneas a), c), d) e e) do n.º 1 não pode ser decidida se a criança se encontrar a viver com ascendente, colateral até ao 3.º grau ou tutor e a seu cargo, salvo se aqueles familiares ou o tutor puserem em perigo, de forma grave, a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o desenvolvimento da criança ou se o tribunal concluir que a situação não é adequada a assegurar suficientemente o interesse daquela”.

A aplicação da medida de confiança com vista à adoção pressupõe que se encontrem seriamente comprometidos os vínculos próprios da filiação, mercê da verificação objetiva de qualquer das situações previstas no n.º 1 do artigo 1978.º do Código Civil

Conforme pronunciou o recente acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 02-02-2023, que acompanhamos - « (..) o pressuposto comum da aplicação da medida de confiança é a inexistência ou o sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação, apresentando-se as hipóteses previstas nas diversas alíneas do n.º 1 como situações meramente indiciária Neste sentido, a doutrina maioritária tem vindo a consolidar o entendimento de que não basta concluir-se pela verificação de uma das situações descritas nas diferentes alíneas do n.º 1 do artigo 1978.º do CC; para além disso, haverá que comprovar se as mesmas traduzem, em concreto, inexistência ou sério comprometimento dos vínculos afectivos próprios da filiação.

N] ão exige uma verificação de culpa de vontade consciente ou de imprevisão censurável, por parte dos progenitores, mas antes uma simples situação de impreparação, de falta de aptidão, de inexistência de possibilidade de simbolizar conscientemente a necessidade de criação de vínculos cuidadores, posto que, antes da idade adulta, o ser humano é totalmente dependente de terceiros para sobreviver.”.

Acrescenta o mesmo Acórdão, com relevância para a apreciação do caso dos autos, convocando o entendimento constante do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 27-02-2014 (proc. n.º 1035/06.5TBVFX-A. L1-2), consultável em www.dgsi.pt, o seguinte:

“[A]inda que se considere que o “comprometimento sério dos vínculos afectivos próprios da filiação”, referido no corpo do art. 1978.º, n.º1 CCiv, é o verdadeiro requisito da confiança com vista a futura adopção, apenas indiciado ou presumido pelas previsões das diversas alíneas citadas do normativo, é necessário salientar que esses vínculos afectivos não se constituem como uma abstracção, isto é, “não basta que haja relação afetiva entre pais e filhos, é necessário que esta assuma a natureza de verdadeira relação pai/mãe – filho, com a inerente auto-responsabilização do progenitor pelo cuidar do filho, por lhe dar orientação, estimulá-lo, valorizá-lo, amá-lo e demonstrar esse amor de forma objetiva e constante, de molde que a própria criança encare o progenitor como referência com as referidas caraterísticas; pais são aqueles que cuidam dos filhos no dia a dia, são aqueles que cuidam da segurança, da saúde física e do bem estar emocional das crianças, assumindo na íntegra essa responsabilidade” [negrito nosso]s da sua verificação. »4

Nos autos.

Apreciámos a factualidade que no caso em juízo corrobora em nosso entendimento a motivação do acórdão recorrido, segundo a qual, a única medida adequada que respeita os direitos da BB e alcança o seu superior interesse, é a medida de confiança a família com vista a futura adopção.

Não pode a recorrente pretender que o tempo da BB, que “não é o tempo dos adultos”, pare até que altere o quadro de condições de vida, sem a sujeitar à permanente instabilidade, ou à revelada incapacidade parental para constituir uma família que integre e proteja a filha.

À progenitora foram dadas todas as oportunidades para assumir uma maternidade responsável e a construção do caminho de condições de vida para assegurar a confiança da filha.

Vale dizer que, se a progenitora não logrou inverter tais factores desfavoráveis durante seis anos, não se antevê provável que tal suceda no futuro.

Por último, a recorrente alude ao primado “incondicional” de manter a criança com a família biológica.

Tal não constitui argumento decisivo na escolha do caminho para o futuro projeto de vida da criança e da proteção do seu superior interesse.

A propósito da articulação entre a preservação da criança em perigo no seio da família biológica e princípio da prevalência da família nas situações de adopção, o Supremo Tribunal de Justiça já se pronunciou repetidamente e seguindo a mesma linha de orientação - este princípio da prevalência da família, em ordem à satisfação do interesse superior da criança, pode ter ou terá de ceder quando se configurar uma situação em que os progenitores, por acção ou omissão dos pais, colocam em causa e fazem perigar a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o são desenvolvimento da criança, que assim fica posto em perigo.

Remetemos de novo para a fundamentação do citado aresto, que acompanhou, por seu turno, a fundamentação do anterior Acórdão do STJ de 10/11/2022. (proc. n.º 1455/20.2T8GDM.P1. S1):

«A salvaguarda do superior interesse da criança deve obedecer ao princípio da prevalência da família, mas no sentido lato, que abarca a prevalência das medidas que a integrem em família, quer na sua família biológica, quer promovendo a sua adoção ou outra forma de integração familiar estável, a par dos princípios da indispensabilidade, da proporcionalidade, da actualidade e da necessidade da intervenção precoce (cf. art. 4° al. a), c), d), e) e h) da Lei nº 47/99 de 1/9].

O primado do interesse das crianças constitui um princípio fundamental de Direito da Família e das Crianças consagrado no Direito Internacional (artigo 3. ° da Convenção das Nações Unidas sobre os direitos das crianças) e no Direito da União Europeia (artigo 24. °, n.° 2, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia).

No direito nacional, a Constituição, apesar de não se referir expressamente a tal princípio, consagra direitos fundamentais específicos das crianças, designadamente o direito da criança ao desenvolvimento integral, onde se insere o direito à manutenção das suas relações afetivas profundas (artigo 69.°, n.° 1, da CRP), como tem sido entendimento da doutrina (cfr. Armando Leandro, "Direito e Direitos dos Menores, síntese da situação em Portugal, no domínio do direito civil e no domínio do direito para-penal e penal", Infância e Juventude, n.° especial, 1997, p. 263 e Dulce Rocha, "Adopção - consentimento - conceito de abandono", Revista do Ministério Público, Lisboa, A.230, n°92 (Out.-Dez.2002), pp. 98 e 107)

A família é o lugar, por natureza e por excelência, do afecto e do amor, onde por todos os seus elementos, avós, pais, filhos e irmãos, vivem e partilham os sonhos, as tristezas e as alegrias, os sucessos e as desventuras.

A primazia da integração familiar das crianças (prevalência da família) afirma-se como modo de exercício do direito/dever de providenciar pelo normal desenvolvimento, formação, educação e manutenção dos filhos, assim se observando e cumprindo o princípio constitucional ínsito no art. 37° da CRP, segundo o qual "os pais têm o direito e o dever de educação e manutenção dos filhos" e "os filhos não podem ser separados dos pais, salvo quando estes não cumpram os seus deveres fundamentais para com eles e sempre mediante decisão judicial".

Contudo, este princípio da prevalência da família, em ordem à satisfação do interesse superior da criança, pode ter ou terá de ceder quando se configurar uma situação em que os progenitores, por acção ou omissão dos pais, colocam em causa e fazem perigar a segurança, a saúde, a formação, a educação ou o são desenvolvimento da criança, que assim fica posto em perigo.

É unânime a jurisprudência deste Supremo Tribunal de Justiça no sentido de que a salvaguarda do superior interesse de uma criança em situação de perigo deve obedecer ao princípio da prevalência da família (entre outros os Ac. de 13/10/2020, no processo 1397/16.6T8BCL.GI. S2, de 16/12/2020 no processo 1210/17.7T8CSC.L2. S1, de 29/10/2020, no processo 634/09.8TBPVZ-B. P1 .SI e de 14/07/2021, no processo 1906/20.6T8VCT.G1. S1).

Este princípio da prevalência da família encontra-se desenhado de harmonia com o art. 9º da Convenção sobre os Direitos das Crianças (adoptada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 20 de Novembro de 1989 e ratificada por Portugal em 21 de Setembro de 1990), que preceitua que "Os Estados Partes garantem que a criança não é separada dos seus pais contra a vontade destes, salvo se as autoridades competentes decidirem, sem prejuízo de revisão judicial e de harmonia com a legislação e o processo aplicáveis, que essa separação é necessária no interesse superior da criança. Tal decisão pode mostrar-se necessária no caso de, por exemplo, os pais maltratarem ou negligenciarem a criança ou no caso de os pais viverem separados e uma decisão sobre o lugar da residência da criança tiver de ser tomada."

Tal decorrendo também do n° 6 do art. 36° da CRP, que admite expressamente a aplicação da medida estadual, particularmente gravosa, consubstanciada na separação dos filhos daqueles, embora impondo que se verifique a especial justificação do não cumprimento pelos pais dos seus deveres "fundamentais" para com os filhos, ainda que a título de negligência" e a reserva de jurisdição, "sempre mediante decisão judicial".

Das expostas exigências constitucionais decorre, com clareza, que, sendo o interesse superior da criança o critério norteador que deve presidir a toda e qualquer decisão do tribunal em matéria de promoção e proteção, deve esse critério colocar-se acima dos direitos e interesses dos pais quando estes sejam conflituantes com os do seu próprio filho.

Impõe o princípio do superior interesse da criança que no caso de a criança se encontrar colocada em perigo pela sua própria família biológica, nomeadamente pelos seus progenitores, sejam decretadas medidas de proteção que visem a sua segurança e saúde junto de uma terceira pessoa, seja junto de outro familiar ou de confiança a pessoa idónea, tendo em vista, quando a família se revelar impotente para cuidar da criança com carácter duradouro, afastando-a da situação de perigo, que a criança venha a ser confiada tendo em vista futura adopção, por esta via também se privilegiando o princípio da prevalência da família, agora adoptiva.

Neste sentido se pronunciando também com unanimidade, este Supremo Tribunal de Justiça, entre outros, nos Acórdãos de 14/07/2016 no processo 8605/13.3TBCSC.L1 .SI, de 18/10/2018 no processo 533/14.1TBPFR.P2. S1, de 30/04/2020 no processo 2353/19.8T8BRG.GI. S1, de 25/09/2018 no processo 20085/16.7PRT.P1. S1. S1. S1, de 13/10/2020 no processo 1397/16.6T8BCL.G 1. S2, de 09/02/2021 no processo 211/20.2T8STC.EI. S1 e de 19/10/2021 no processo 686/18.0T8PTG-A. E1.S1


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Para concluirmos que a situação de facto reúne os pressupostos legais consagrados no artigo 1978.º n.º 1, alínea d), e n.º 3, do Código Civil.

No acórdão recorrido faz-se uma análise minuciosa da situação de facto provada – com base na qual aplicou as normas jurídicas, para em concreto concluir pela medida de promoção e protecção de confiança com vista a futura adopção, prevista no artigo 35.º, n.º 1, alínea g), 38, °-A, 62. °, n.°s 1 e 3, alínea b) e 62. °-A, da LPCJP, medida que se revela proporcional e ajustada de acordo com a respetiva fundamentação.


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Improcedem as invocadas ilegalidades.

IV - Decisão

Pelo exposto, julga-se o recurso improcedente, confirmando-se o acórdão recorrido.

As custas são a cargo da recorrente, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário que lhe foi atribuído.

Lisboa, 4.07.2024

Isabel Salgado (relatora)

Emídio Santos

Maria da Graça Trigo

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1. Por lapso material na numeração, o acórdão indica como ponto 7., que alteramos.

2. C) a M) factos não provados aditados pela Relação no último acórdão.

3. Inter alia, o Acórdão do STJ de 21.01.2021, no proc n.º 844/18.7T8BNV. E1.S1,:« Os poderes do Supremo nesta matéria abarcam ainda o controlo da aplicação da lei adjetiva em qualquer das dimensões destinadas à fixação da matéria de facto provada e não provada – art.º 674.º, n.º 1, al. b), do CPC –, com a restrição que emerge do disposto no art.º 662.º, n.º 4, do CPC que exclui a sindicabilidade do juízo de apreciação da prova efetuado pelo Tribunal da Relação e a aferição da formação da convicção desse Tribunal a partir de meios de prova sujeitos ao princípio da livre apreciação». ; e o Acórdão do STJ de 17.11.2021, proc n.º 4113/18.4T8ALM.L1.S1, in www.dgsi.pt.↩︎

4. Sublinhado e negrito nossos; proc. nº 377/18.1T8FAF.P1. S1, sendo relatora Maria da Graça Trigo, e membro deste colectivo; Apud também os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27-05-2021 (proc. 2389/15.8T8PRT-D. P1.S1) e de 23-06-2022 (proc. n.º 23290/19.0T8LSB.L1. S1), todos disponíveis em www.dgsi.pt.