Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | PIRES DA GRAÇA | ||
Descritores: | HABEAS CORPUS PRISÃO PREVENTIVA PRAZO DA PRISÃO PREVENTIVA RECURSO PARA O TRIBUNAL CONSTITUCIONAL CONDENAÇÃO EM DUAS INSTÂNCIAS SUCESSIVAS DUPLA CONFORME PRINCÍPIO DA LEGALIDADE | ||
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Data do Acordão: | 08/03/2012 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | N | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | HABEAS CORPUS | ||
Decisão: | INDEFERIDO | ||
Área Temática: | DIREITO PROCESSUAL PENAL - MEDIDAS DE COACÇÃO/ MODOS DE IMPUGNAÇÃO | ||
Doutrina: | - J.J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP, Constituição da República Portuguesa Anotada, Artigo 1.º a 107.º, 4ª edição revista, volume I, Coimbra Editora, 2007, II, pp. 508, 510. - Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4ª edição actualizada, Universidade Católica Editora, p. 620, nota 18. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 191.º, 202.º, 212.º, N.º1, 219.º, N.º2, 215.º, 222.º, 223.º, N.º1, 400.º, ALÍNEA F), 468.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGOS 27.º, N.ºS1 E 3, 31.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 20-12-2006, PROC. N.º 4705/06 - 3.ª; -DE 29-05-02, PROC. N.º 2090/02- 3.ª. ACÓRDÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL: -DE 24-9-2003, PROC. N.º 571/03. | ||
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Sumário : | I - A previsão – e precisão – da providência de habeas corpus, como garantia constitucional, não exclui a sua natureza específica, vocacionada para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, como remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, traduzidas em abuso de poder, ou por serem ofensas sine lege ou, grosseiramente contra legem, traduzidas em violação directa, imediata, patente e grosseira dos pressupostos e das condições da aplicação da prisão, que se apresente como abuso de poder, concretizado em atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável. II - A recorrente considera ilegal, por excesso de prazo, a prisão preventiva em que se encontra, remetendo assim para os termos do art. 222.º, n.º 1, al. c), do CPP. III - Tendo a arguida sido colocada em prisão preventiva em 21-03-2009, e havendo recurso para o TC, o prazo de duração máxima de prisão preventiva seria, no caso vertente, de 3 anos e 10 meses, pelo que só terminaria em 21-01-2013. IV - Porém, acresce, ainda, que, nos termos do n.º 6 do art. 215.º do CPP, o prazo máximo da prisão preventiva se eleva para metade da pena que tiver sido fixada, no caso de um arguido ter sido condenado em duas instâncias sucessivas. V - Esta norma do n.º 6 do art. 215.º do CPP não se confunde nem identifica com a conformidade ou “dupla conforme”, determinada pela al. f) do art. 400.º do CPP. Esta tem em vista critério legal definidor e limitativo de irrecorribilidade da decisão da Relação para o STJ, quando houver confirmado, ainda que in mellius, decisão da 1.ª instância. Aquela funtamenta-se na razoabilidade do prazo limitativo da liberdade, ínsito à duração de uma medida de coacção que restrinja essa liberdade, tendo pois natureza meramente cautelar, na sequência, e de harmonia, com o princípio da legalidade, previsto no art. 191.º do CPP. VI - In casu, tendo a arguida sido condenada em 14 anos de prisão, pena esta confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo de duração da prisão preventiva, eleva-se para metade da pena aplicada, ou seja, para 7 anos, pelo que iniciando-se o prazo de prisão preventiva da arguida em 21-03-2009 é manifesto não ter ainda decorrido o prazo máximo da mesma – que só terminará em 21-03-2016 –, mantendo-se a prisão da requerente dentro do prazo fixado por lei, não sendo por isso ilegal. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Nos autos de processo comum nº 1324-08.4PPPRT-A, da 2ª Vara Criminal do Porto, a arguida AA, ali identificada, e actualmente detida no Estabelecimento Prisional de Santa Cruz do Bispo, vem, por intermédio de seu Exmo Advogado, requerer providência de habeas corpus, nos termos do art.º 31.° da C.R.P. e do art.º 222 n.º 2 alínea c) e segs do C.P .Penal, com os seguintes fundamentos:- 1 -- A medida de coacção, Prisão Preventiva; foi aplicada a ora recorrente em sede de 1º interrogatório em 18 de Março de 2009. 2 - Foi tal medida aplicada à ora recorrente, uma vez que a mesma se encontrava indiciada, pela prática de 1 (um) crime de associação criminosa" p. e p. pelo art. 299º nº1 e nº 2 do C6dígo Penal, 218 (duzentos e dezoito) crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pe1as disposições conjugadas dos arts. 203º nº 1 e art. 204º nº 2 al. e) do Código Penal) 17 (dezassete) crimes de furto qualificado) na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.s 22º e 23º e arts. 203º.nº1 e artº 204º nº 2, alínea e), do Código Penal; (quatro) crimes de furto simples p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 203º nº 1 e art. 204º nº 2 al, e) e nº 4, do Código Penal, 43 (quarenta e três) crimes de falsificação de documento p. e., p. pelo artº 256º nº 1 e nº 3 do Código Penal, 15 (quinze) crimes de falsas declarações p. p. pelo artº 359° nº 2 parte final) do Código Penal e i (um) , crime de detenção de arma, p. e p, pelo art. 86° n° 1 al. c) da Lei nº 5/2006 4e 23 de Fevereiro (actualmente, nos termos da redacção dada pela Lei nº 17/2009 de 6 de Maio),conforme se pode ler no supra mencionado despacho. 3 - Em 10 de Fevereiro de 2010 foi proferida a acusação contra a ora requerente sendo imputada à mesma 1 (um) crime de associação criminosa" p. e p. pelo art. 299º nº1 e nº 2 do C6dígo Penal, 218 (duzentos e dezoito) crimes de furto qualificado, na forma consumada, p. e p. pe1as disposições conjugadas dos arts. 203º nº 1 e art. 204º nº 2 al. e) do Código Penal) 17 (dezassete) crimes de furto qualificado) na forma tentada, p. e p. pelas disposições conjugadas dos art.s 22º e 23º e arts. 203º.nº1 e artº 204º nº 2, alínea e), do Código Penal; (quatro) crimes de furto simples p. e p. pelas disposições conjugadas dos arts. 203º nº 1 e art. 204º nº 2 al. e) e nº 4, do Código Penal, 43 (quarenta e três) crimes de falsificação de documento p. e., p. pelo artº 256º nº 1 e nº 3 do Código Penal, 15 (quinze) crimes de falsas declarações p.p. pelo artº 359° nº 2 (parte final) do Código Penal e i (um), crime de detenção de arma, p. e p, pelo art. 86° n° 1 al. c) da Lei nº 5/2006 de 23 de Fevereiro (actualmente, nos termos da redacção dada pela Lei nº 17/2009 de 6 de Maio), 4 – Realizada Audiência de Discussão e Julgamento, a ora recorrente veio a ser condenada, operada a legal convolação, na pena de 14 anos de prisão efectiva, por 28 (vinte e oito) crimes de furto qualificado, p. e p. pelos arts.º 203, nº 1, e 204, nº2 al e) do Código Penal, 1 (um) crime de furto qualificado tentado p. e p. pelos arts. 22°, 23º,203° nº1 e 204 nº 2 al. e) do C.P, e um crime de falsificação de documento agravado, p. e p. pelo artº, 256º nº 1, al. a) e nº 3 do Código Penal 5- Em 8 de Fevereiro de 2010,foi proferido despacho onde após o reexame dos pressupostos da prisão preventiva se ordenou a manutenção de tal medida de coacção, Sucede porém, 5- Que tal manutenção teria de respeitar os prazos de duração máxima da prisão preventiva, segundo o artº 215 C.P.P. 6- No entanto no caso concreto a ora requerente já se encontra em prisão preventiva há mais de 3 anos e 4 meses, o que excede o Período máximo previsto no artº 215º C.P.P. 7 - À semelhança dos restantes prazos máximos fixados na lei processual penal para a manutenção de medidas de coacção, o prazo máximo de 3 anos e 4 meses, no caso em concreto, de submissão â prisão preventiva, visa precaver eventuais violações, e injustiças proporcionais pela manutenção da medida de coacção mais gravosa a arguidos que beneficiam, de resto, até trânsito em julgado de decisão válida do principio constitucional in dubio pro reu 8 - O artº 28.º n.º 4. da CRP, confere aos prazos máximos de prisão preventiva a dignidade de imperativo Constitucional, 9 .- E indubitável que a situação da arguida é coincidente com o preceito supra referido, na medida em que a mesma encontra-se presa preventivamente sem que tenha havido condenação com transito em julgado há mais de 3 anos e 4 meses. 10 - Nestes termos encontrámos fundamentos quer de Direito quer de Facto para que a presente providência seja procedente. 11 - De facto o requerente encontra-se. numa situação de precariedade. Processual, e que por ser actual legitima os seu pedido de Habeas Corpus. 12 - Vejamos a este propósito o vertido no Ac. Do STJ de 6 de Fevereiro de 1997 que diz que" Um pedido de habeas corpus respeitante a uma prisão determinada por decisão judicial só poderá ter provimento em casos extremos, de abuso de poder ou erro grosseiro de aplicação do direito (manutenção da prisão para além. dos prazos legais ou fixados por decisão judicial), prisão por facto pelo qual a lei a não admita ou, eventualmente, prisão ordenada por autoridade judicial incompetente para ordenar, nos termos do art.º 222.º do G.PP.)) 13 - O arguido tem actualmente 33 anos e encontra-se em prisão preventiva há já mais de 3, (três) anos e 4 (quatro) meses consecutivos; pelo que, a sua libertação é imperativa e urgente, nos termos do art.º 217.° nº 1 do C.P.P.” Nestes termos e nos demais de direito, requer-se a Vexa e ao Venerando Órgão a que preside que decrete a prisão ilegal e se digne ordenar a imediata libertação do ora recorrente uma vez que a manutenção da aplicação de tal medida de coacção viola os direitos constitucionalmente reconhecidos ao arguido bem como os previstos nos art.º 202 e 204º do C.P. Penal. FAZENDO-SE ASSIM JUSTIÇA.” - Foi prestada a informação judicial a que alude o art.° 223.°, n.º 1, in fine do C.P.P., onde se refere que “o prazo máximo da prisão preventiva aplicada à arguida passou a ser de 7 anos. E encontrando-se a requerente privada da liberdade desde 21 de Março de 2009, não se mostrando excedido o prazo desta, não há lugar a prisão ilegal”, concluindo “que a prisão da arguida AA não é ilegal, pelo que se deverá manter. "- Convocou-se a Secção Criminal deste Supremo Tribunal, e efectuadas as devidas notificações, realizou-se a audiência pública, nos termos legais.- A Secção Criminal reuniu seguidamente para deliberação, a qual imediatamente se torna pública.- O artigo 31º nº 1 da Constituição da República Portuguesa, integrante do título II (Direitos, Liberdades e garantias) e capítulo I (Direitos, liberdades e garantias pessoais), determina que haverá habeas corpus contra o abuso de poder, por virtude de prisão ou detenção ilegal, a requerer perante o tribunal competente.“Sendo o único caso de garantia específica e extraordinária constitucionalmente prevista para a defesa de direitos fundamentais, o habeas corpus testemunha a especial importância constitucional do direito á liberdade”. (JJ. Gomes Canotilho e Vital Moreira, CRP, Constituição da República Portuguesa Anotada, Artigo 1.º a 107.º, 4ª edição revista, volume I, Coimbra Editora, 2007, II, p. 508) É uma providência urgente e, expedita, com uma celeridade incompatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação, destinada a responder a situações de gravidade extrema visando reagir, de modo imediato, contra a privação arbitrária da liberdade ou contra a manutenção de uma prisão manifestamente ilegal, ilegalidade essa que se deve configurar como violação directa, imediata, patente e grosseira dos seus pressupostos e das condições da sua aplicação. Atenta a natureza da providência, para que o exame da situação de detenção ou prisão reclame petição de habeas corpus, há que se deparar com abuso de poder, consubstanciado em atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável – integrando uma das hipóteses previstas no artigo 222º nº 2, do Código de Processo Penal (acórdão do Tribunal Constitucional de 24 de Setembro de 2003, proc. nº 571/03) “Este abuso de poder exterioriza-se nomeadamente na existência de medidas restritivas ilegais de prisão e detenção decididas em condições especialmente arbitrárias ou gravosas.” (J.J. Canotilho e V. Moreira, ibidem) A providência de habeas corpus, enquanto remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, que se traduzam em abuso de poder, ou por serem ofensas sem lei ou por serem grosseiramente contra a lei, não constitui no sistema nacional um recurso dos recursos e muito menos um recurso contra os recursos. Tal não significa que a providência deva ser concebida, como frequentemente o foi, como só podendo ser usada contra a ilegalidade da prisão quando não possa reagir-se contra essa situação de outro modo, designadamente por via dos recursos ordinários (cf. Ac. deste Supremo, de 29-05-02, Proc. n.º 2090/02- 3.ª Secção, onde se explana desenvolvidamente essa tese). Aliás, resulta do artigo 219º nº 2 do CPP, que mesmo em caso de recurso de decisão que aplicar, mantiver ou substituir medidas de coacção legalmente previstas, inexiste relação de dependência ou de caso julgado entre esse recurso e a providência de habeas corpus, independentemente dos respectivos fundamentos. Com efeito, a excepcionalidade da providência não se refere à sua subsidiariedade em relação aos meios de impugnação ordinários das decisões judiciais, mas antes e apenas à circunstância de se tratar de providência vocacionada a responder a situações de gravidade extrema, com uma celeridade incompatível com a prévia exaustação dos recursos ordinários e com a sua própria tramitação. Como referem JJ. Gomes Canotilho e Vital Moreira, (ibidem,. Pº 508) “(…) o habeas corpus vale em primeira linha contra o abuso do poder por parte das autoridades policiais, designadamente das autoridades de polícia judiciária; mas não é impossível conceber a sua utilização como remédio contra o abuso de poder do próprio juiz, em substituição da via normal do recurso ou em caso de inexistência de recurso.” E escrevem os mesmos autores (ibidem,,V, .p. 510): “(…)(1) a providência do habeas corpus é uma providência à margem do processo penal ordinário; (2) configura-se como um instituto processual constitucional específico com dimensões mistas de acção cautelar e de recurso judicial. (…)” Em suma: A previsão - e precisão - da providência, como garantia constitucional, não exclui, porém, a sua natureza específica, vocacionada para casos graves, anómalos, de privação de liberdade, como remédio de urgência perante ofensas graves à liberdade, traduzidas em abuso de poder, ou por serem ofensas sine lege ou, grosseiramente contra legem, traduzidas em violação directa, imediata, patente e grosseira dos pressupostos e das condições da aplicação da prisão, que se apresente como abuso de poder, concretizado em atentado ilegítimo à liberdade individual – grave, grosseiro e rapidamente verificável. - O artigo 222º do Código de Processo Penal, que se refere ao habeas corpus em virtude de prisão ilegal, estabelece no nº 1, que a qualquer pessoa que se encontrar ilegalmente presa, o Supremo Tribunal de Justiça concede, sob petição, a providência do habeas corpus.Contudo, nos termos do nº 2 do preceito, esta providência “deve fundar-se em ilegalidade da prisão proveniente de: a) Ter sido efectuada ou ordenada por entidade incompetente; b) Ser motivada por facto pelo qual a lei a não permite; ou c) Manter-se para além dos prazos fixados pela lei ou por decisão judicial; - A recorrente considera ilegal, por excesso de prazo, a prisão preventiva em que se encontra, remetendo assim para os termos do artº 222º nº 1 al. c) do CPP.- 1- A requerente AA encontra-se em prisão preventiva à ordem dos supra referidos autos desde 21/03/2009, na sequência de interrogatório judicial iniciado em 20 de Março de 2009, e terminado com a prolação do respectivo despacho no dia seguinte. 2- A requerente for condenada, por acórdão proferido nos mesmos autos em 10.02.2011, na pena única de 14 (catorze) anos de prisão. 3- Na sequência de recurso interposto para o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão proferido em 21.09.2011, foram julgados totalmente improcedentes todos os recursos interpostos pelos arguidos/condenados, entre os quais, o da arguida AA, mantendo-se o acórdão objecto de recurso, na íntegra. 4- Por despacho proferido em 20/12/2011, forem admitidos os recursos, entre outros, da arguida AA e remetido o processo para o Supremo Tribunal de Justiça. 5 – Por acórdão de 9-05-12, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu: “a) Rejeitar parcialmente os recursos interpostos pelos arguidos AA, BB, CC, DD e EE, exceptuando os segmentos em que os arguidos impugnam a medida das penas conjuntas; b) Negar provimento a todos os recursos na parte em que não foram rejeitados, confirmando a decisão recorrida.” 6. O processo foi remetido para o Tribunal Constitucional, em virtude de ter sido interposto recurso, entre outros, pela arguida AA. 7- Na fase de inquérito, o processo foi declarado de especial complexidade nos termos do arte 215°, nº 3 e 4, do CPP.. - O artigo 212º do CPP dispõe no nº 1:As medidas de coacção são imediatamente revogadas, por despacho do juiz, sempre que se verificar: a) Terem sido aplicadas fora das hipóteses ou das condições previstas na lei; ou b) Terem deixado de subsistir as circunstâncias que justificaram a sua aplicação. Por outro lado, de harmonia com o artº 215º º 1 e 2do mesmo diploma: “A prisão preventiva extingue-se quando, desde o seu início, tiverem decorrido: (…) d) Um ano e seis meses sem que tenha havido condenação com trânsito em julgado 2. Os prazos referidos no número anterior são elevados respectivamente para (…) dois anos, em casos de terrorismo, criminalidade violenta ou altamente organizada, ou quando se proceder por crime punível com pena de prisão de máximo superior a oito anos, ou por crime: […] d) De […] falsificação […] É o caso do crime de falsificação de documento agravado, por que foi condenada a arguida. O prazo referido é elevado para 3 anos e 4 meses, nos termos do nº 3 do artº 215º, uma vez que, na fase de inquérito, o processo foi declarado de especial complexidade nos termos do art.º 215°, nº 3 e 4, do CPP Acresce que, de harmonia com o disposto no art 215º do CPP, “Os prazos referidos nas alíneas c) e d) do nº 1, bem como os correspondentemente referidos nos nºs 2 e 3, são acrescentados de seis meses se tiver havido recurso para o Tribunal Constitucional ou se o processo penal tiver sido suspenso para julgamento em outro tribunal de questão prejudicial.” O que significaria, desde logo, que tendo a arguida sido colocada em prisão preventiva em 21 de Março de 2009, e havendo recurso para o Tribunal Constitucional, o prazo de duração máxima de prisão preventiva seria de 3 anos e 10 meses e não de 3 anos e 4 meses, pelo que só terminaria em 21 de Janeiro de 2013. Porém, acresce ainda que, nos termos do nº 6 do artº 215º do CPP: “No caso de o arguido ter sido condenado a pena de prisão em primeira instância e a sentença condenatória ter sido confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo da prisão preventiva eleva-se para metade da pena que tiver sido fixada.” Esta norma, o nº 6 do artº 215º do CPP, não se confunde nem identifica, com a conformidade ou “dupla conforme”, determinada pela al. f) do art.º 400.º do CPP: - Esta tem em vista critério legal definidor e limitativo de irrecorribilidade da decisão da Relação para o Supremo, quando houver confirmado, ainda que in mellius, decisão da primeira instância. Aquela fundamenta-se na razoabilidade do prazo limitativo da liberdade, ínsito à duração de uma medida de coacção que restrinja essa liberdade, tendo pois natureza e função meramente cautelar, na sequência e, de harmonia com o princípio da legalidade, previsto no artº 191º do CPP. e, obviamente, sem prejuízo da conformidade normativa constitucional, sendo certo que a Constituição Política da República Portuguesa no artº 27º nº 3 permite a privação da liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determinar, nos casos ali indicados nas respectivas alíneas, em que se inclui a detenção ou prisão preventiva por fortes indícios de prática de crime doloso a que corresponde pena de prisão cujo limite máximo seja superior a três anos e que o art.º 202º do CPP, burilou, nas respectivas alíneas, entre as quais a al. d). A lei é clara quando estatui que o prazo máximo da prisão preventiva se eleva para metade da pena que tiver sido fixada, no caso de um arguido ter sido condenado em duas instâncias sucessivas. Em idêntico sentido escreve Paulo Pinto de Albuquerque, Comentário do Código de Processo Penal, 4ª edição actualizada, Universidade Católica Editora, p. 620, nota 18: “A regra da “confirmação” em matéria de medidas de coacção não deve ser interpretada no mesmo sentido que a regra da “dupla conforme” em matéria de recurso de sentença (ver a a anotação ao artigo 400º), uma vez que o propósito destas duas regras é diferente: a regra da “dupla conforme” visa evitar a interposição de recurso para o STJ, a regra da “confirmação” em matéria de medidas de coacção visa alargar o prazo de duração das mesmas precisamente quando há recurso para o STJ ou para o TC.” In casu, tendo a arguida ora peticionante, sido condenada, em 14 (catorze) anos de prisão, pena esta confirmada em sede de recurso ordinário, o prazo máximo de duração da prisão preventiva, eleva-se para metade da pena aplicada, ou seja para 7 (sete) anos, pelo que iniciando-se o prazo da prisão preventiva da arguida, nos referidos autos, em 21 de Março de 2009, é manifesto ainda não ter decorrido o prazo máximo da prisão preventiva do mesmo – que só terminará em 21 de Março de 2016 -, mantendo-se a prisão da requerente dentro do prazo fixado por lei, e por isso não é ilegal. Pelo exposto, sendo a prisão preventiva do arguido peticionante ordenada pela competente autoridade judiciária, sendo aplicada a prisão preventiva por facto pelo qual a lei permite, e mantendo-se a prisão dentro do prazo máximo de duração da prisão preventiva não se encontra o requerente em situação de prisão ilegal, não se prefigurando a existência dos pressupostos de concessão da providência extraordinária do habeas corpus. _ Termos em que, decidindo: Acordam os deste Supremo, em indeferir, por falta de fundamento bastante, a petição de habeas corpus formulada pela arguida AA, através de seu Exmo Advogado. Tributam a requerente em 3 Ucs de taxa de justiça. Supremo Tribunal de Justiça, 3 de Agosto de 2012 Elaborado e revisto pelo relator Pires da Graça (relator) Rodrigues da Costa Álvaro Rodrigues |