Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
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| Nº Convencional: | JSTJ00026021 | ||
| Relator: | CHICHORRO RODRIGUES | ||
| Descritores: | LIBERDADE SINDICAL REGULAMENTAÇÃO COLECTIVA DE TRABALHO TRABALHO IGUAL SALÁRIO IGUAL | ||
| Nº do Documento: | SJ199412140040054 | ||
| Data do Acordão: | 12/14/1994 | ||
| Votação: | UNANIMIDADE | ||
| Referência de Publicação: | BMJ N442 ANO1995 PAG60 | ||
| Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
| Processo no Tribunal Recurso: | 01003/92 | ||
| Data: | 04/26/1993 | ||
| Texto Integral: | S | ||
| Privacidade: | 1 | ||
| Meio Processual: | REVISTA. | ||
| Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
| Indicações Eventuais: | N CORDEIRO MANUAL DE DIR TRAB PAG147. | ||
| Área Temática: | DIR TRAB - REG COL TRAB / CONTRAT INDIV TRAB. DIR CIV - DIR OBG. DIR CONST - DIR FUND. | ||
| Legislação Nacional: | CONST82 ARTIGO 55 N1. CCIV66 ARTIGO 805 N1. LCT69 ARTIGO 18 ARTIGO 82. DL 516-A1/79 DE 1979/12/29 ARTIGO 14 N2 N6. DL 519-C/79 DE 1979/12/29 ARTIGO 14. DL 421/83 DE 1983/12/02 ARTIGO 7. CCTV ENTRE A ANTRAN E A FESTRU CLAUS74 N7 N8. CCTV ENTRE ANTRAN E SITRA. | ||
| Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ PROC3833 DE 1994/04/13. | ||
| Sumário : | I - Ainda que determinada entidade patronal, com trabalhadores filiados em sindicatos inscritos em associações sindicais diferentes, tenha celebrado separadamente contratos colectivos de trabalho com cada uma destas associações sindicais, a circunstância de os trabalhadores filiados em um dos sindicatos poder ter direito a salário e regalias superiores aos de outro trabalhador de igual categoria filiado em sindicato diferente, não ofende o princípio constitucional de que "a trabalho igual deve corresponder salário igual", na medida em que a tal se contrapõe outro princípio constitucional de não menor força, qual seja o da liberdade sindical. II - O n. 7 da cláusula 74 do CCTV celebrado entre a ANTRAN e o FESTRU não viola o princípio constitucional de que a trabalho igual deve corresponder salário igual. | ||
| Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: A propôs esta acção com processo ordinário, emergente de contrato individual de trabalho, contra Transportes Ferreira da Cunha, Lda. pedindo a condenação que esta seja condenada a pagar-lhe a quantia global de 3549617 escudos, acrescida de juros de mora, tudo respeitante a diferenças salariais, retribuições vinculadas, ajudas de custo, diuturnidades, subsídios de férias e de Natal, remunerações de dias de descanso e feriados. Contestou a ré, não aceitando a responsabilidade imputada. Frustada a tentativa de conciliação, veio o processo a ser saneado, e, preparado para instrução e julgamento, respondido ao questionário, foi proferida sentença, julgando parcialmente procedente os pedidos, já que condenou a ré a pagar ao autor 68500 escudos de diferenças salariais, 6000 escudos de ajudas de custo, 92600 escudos, de retribuição referente ao período de Novembro/90 a Janeiro/91, prevenido na cláusula 74, n. 7 do CCTV, publicado no BTE n. 9, de 8 de Março de 1980 e n. 16 de 29 de Abril de 1982 e posteriores alterações, 12050 escudos de diuturnidades, um subsídio de férias e de Natal, com retribuições vencidas depois de Janeiro/1991, e a remuneração devida pelo tempo de trabalho suplementar prestado, a liquidar em execução de sentença. Irresignado recorreu o autor. A Relação concedeu-lhe provimento na parte referente à cláusula 74, 7 do CCTV, celebrado entre a ANTRAN e a FESTRU, condenando a apelada, ainda em 2212672 escudos, relativa à referida remuneração, referente ao tempo decorrido entre Julho/1983 e Outubro/1990, com juros de mora, à taxa de 15% desde a citação, sobre todas as quantias da condenação, salvas as respeitantes ás retribuições posteriores a Janeiro/91 e das deixadas para liquidar em execução de sentença. Do recurso pede revista a apelada. Conclui na alegação: "1. O douto Acórdão recorrido viola o princípio constitucional que determina que a trabalho igual deverá corresponder salário igual. 2. Pois implica que, na mesma empresa e a trabalhadores com a mesma categoria profissional, se apliquem vários C.C.T., o que se traduz em retribuições dissemelhantes. 3. Determinar a aplicabilidade do C.C.T. pela pura e simples filiação sindical do trabalhador e tendo em consideração que este dispõe de liberdade sindical - um outro princípio constitucional - podendo alterá-la quando entender, é obrigar a entidade patronal a averiguar, todos os dias, em que sindicato cada um dos seus trabalhadores está escrito. 4. Pois nem sequer se exige que exista comunicação á entidade patronal dessa inscrição. 5. O Acórdão recorrido, no modesto entender da recorrente, leva ao livre arbítrio, à insegurança e à injustiça, violando as mais elementares regras de um Estado de Direito. 6. É uma solução que implica insegurança, na medida em que a entidade patronal nunca saberá se está a aplicar o C.C.T. correcto pois, de um dia para o outro, o trabalhador pode alterar a sua inscrição sindical sem lhe comunicar. 7. É uma solução injusta, pois é beneficiar ou prejudicar em função das preferências político/sindicais. 8. Mesmo que se entenda que os C.C.T. não são concorrentes, a única solução justa e equitativa é, através do recurso à analogia, aplicar o artigo 14. do Decreto-Lei n. 519-C/79 de 29 de Dezembro. 9. E, como inexistiu escolha, quer por parte dos sindicatos, quer por parte da maioria dos trabalhadores, considerar aplicável o C.C.T. de publicação mais recente - o outorgado entre a ANTRAN e SITRA. 10. O estipulado nos ns. 7 e 8 da cláusula 74 do C.C.T., celebrado entre a ANTRAN e a FESTRU é ilegal, por contrariar normas legais imperativas - o artigo 7 do Decreto- Lei n. 421/83 de 2 de Dezembro. 11. Pois limita a retribuição do trabalho extraordinário a duas horas por dia, aos que são inaplicáveis as cláusulas referentes ao trabalho nocturno e extraordinário. 12. O recorrido encontrava-se obrigado a comunicar à recorrente a sua filiação sindical, no sentido de lhe exigir o pagamento das verbas previstas no C.C.T. outorgado entre a ANTRAN e a FESTRU. 13. Tal comunicação será sempre exigível no âmbito dos direitos e deveres de colaboração mútua que existem entre a entidade patronal e os trabalhadores que envolvem, entre outros, deveres de respeito e de lealdade. 14. Não se exigindo tal comunicação, permite-se que o trabalhador seja beneficiado, acumulando as retribuições previstas nos dois C.C.T. 15. Auferindo através de um deles enquanto mantivesse o vínculo contratual e, terminado este, exigindo judicialmente o pagamento em função do outro com a simples alegação e prova de que era filiado na FESTRU. 16. A manutenção do Douto Acórdão recorrido incentivaria, desta forma, que os trabalhadores não exercessem os seus deveres, (neste caso a aludida comunicação), no sentido desse facto poderem, posteriormente, beneficiarem. 17. A dívida da recorrente e que, eventualmente, venha a ser fixada, só se torna líquida após o trânsito em julgado da decisão. 18. Pelo que, os juros moratórios só deverão ser contados a partir dessa data". SIC. O recorrido não contra-alegou. O ilustre representante do Ministério Público junto deste Tribunal emite douto parecer no sentido de ser negada revista. Correu os vistos e vem para decidir. A Relação teve em consideração os seguintes factos, que considerou provados: a. O autor foi admitido ao serviço da ré para, sob as suas ordens e direcção dos seus legais representantes, exercer as suas funções de motorista de veículos de transportes pesados e de mercadorias. b. A ré dedica-se à actividade de transportes Rodoviários, e está inscrita na ANTRAN - Associação Nacional de Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias - há mais de oito anos. c. O Sindicato de Rodoviários do Norte encontra-se inscrito na FESTRU - Federação dos Transportes Rodoviários e Urbanos. d. A partir de Julho de 1983, por acordo das partes, o autor passou a exercer as funções de motorista, na condução de veículos pesados de transporte internacional de mercadorias. e. O autor encontra-se inscrito no Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte, há mais de oito anos. f. Ao serviço da ré, o autor auferiu os seguintes vencimentos mensais: - em Julho de 1983 ...................... 22500 escudos - de 1 de Agosto a 31 de Outubro de 1983 ... 23000 escudos - de 1 de Novembro de 1983 a 30 de Abril de 1984 ......... .......................................... 27700 escudos - de 1 de Janeiro de 1985 a 31 de Março de 1985 ......... .......................................... 29700 escudos - de 1 de Abril de 1985 a 31 de Maio de 1985 ............ .......................................... 32600 escudos - de 1 de Junho de 1985 a 31 de Março de 1986 ........... .......................................... 35400 escudos - de 1 de Abril de 1986 a 31 de Agosto de 1986 .......... .......................................... 39550 escudos - de 1 de Setembro de 1986 a 30 de Abril de 1987 ......... .......................................... 40500 escudos - de 1 de Maio de 1987 a 30 de Abril de 1988 ........... .......................................... 45550 escudos - de 1 de Maio de 1988 a 31 de Dezembro de 1988 ....... .......................................... 49450 escudos - de 1 de Janeiro de 1989 a 31 de Março de 1989 ..... .......................................... 57450 escudos - de 1 de Abril de 1989 a 30 de Junho de 1989 ....... ............................................ 59200 escudos - a partir de 1 de Abril de 1990 ...... 64800 escudos - O autor também, a título de ajuda de custo mensal recebeu: - de 1 de Abril de 1986 a 31 de Março de 1987 .......... ............................................. 5000 escudos - de 1 de Abril de 1987 a 31 de Março de 1988 .......... ............................................. 6000 escudos - de 1 de Abril de 1988 a 31 de Março de 1998 .......... ............................................. 8000 escudos - de 1 de Abril de 1989 a 31 de Março de 1990 .......... ............................................ 10000 escudos - a partir de 1 de Abril de 1990 ........... 13000 escudos g. Para além das remunerações auferidas, autor e ré acordaram ainda num prémio de produtividade no montante de 2 escudos no período de 1 de Julho de 1983 a 28 de Fevereiro de 1988 e de 3 escudos e cinquenta centavos a partir de 1 de Março de 1988, por cada quilómetro percorrido na viatura durante o transporte de mercadorias. h. A partir de 1 de Julho de 1983 a ré tem vindo a pagar ao autor a quantia mensal de 5000 escudos, a título de alimentação. i. E, em substituição do pagamento das refeições, à factura durante as deslocações, a ré acordou com o autor no pagamento das seguintes quantias por cada viagem ao estrangeiro: - de 1 de Julho de 1983 a 31 de Dezembro de 1985 ......... ............................................. 9000 escudos - de 1 de Janeiro de 1986 a 31 de Outubro de 1986 ........ ............................................ 14000 escudos - de 1 de Novembro de 1986 a 31 de Março de 1988 ......... ............................................ 20000 escudos - de 1 de Abril de 1988 a 31 de Maio de 1988 ............. ............................................ 25000 escudos - desde 1 de Junho de 1988 ................ 30000 escudos j. O horário de trabalho do autor foi sempre um horário ao nível de 45 horas semanais, com dois dias de descanso no fim de cada período de trabalho semanal. k. Somente a partir de Novembro de 1990, a ré começou a pagar ao autor algumas quantias mensais, a título da cláusula 74, n. 7 do C.C.T.V., publicado no BTE n. 9 de 8 de Março de 1980 e 16 de Abril de 1982 e posteriores alterações. l. Mais concretamente, a tal título, a ré pagou ao autor em Novembro de 1990 11880 escudos, em Dezembro de 1990, 12960 escudos e em Janeiro de 1991, 12150 escudos. m. A ré não pagou ao autor o valor das diuturnidades nos subsídios de férias dos anos de 1983, 1986, 1987 e 1988, e nos subsídios de Natal dos anos de 1985, 1986 e 1987. n. O autor trabalhou um número indeterminado de dias de descanso e um feriado a pedido e no interesse da ré, que não lhos pagou a esse titulo. o. A partir de 1985 existem dois contratos colectivos de trabalho celebrados, por um lado pela ANTRAN e, por outro, pela FESTRU e pela SITRA. p. Não foi cumprido, quer pelos sindicatos quer pelos trabalhadores, o preceituado no artigo 14 do Decreto-Lei 519-C/79, de 29 de Dezembro, tendo, todavia, a ré enviado em 22 de Outubro de 1990 ao Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte a carta mandada juntar em julgamento (folhas 49 e 50) e o autor subcrito o documento de adesão ao C.C.T. com a FESTRU, também mandado juntar em audiência. O Direito: A recorrente limita o objecto do recurso a dois aspectos do acórdão da Relação: num primeiro enquanto, julgando válido e aplicável ao contrato laboral a cláusula 74, 7 do CCTV, celebrado entre a ANTRAN e a FESTRU, condena a recorrente a pagar ao recorrido a remuneração aí instituída; no outro, insurge-se contra a condenação em juros moratórios desde a citação, entendendo que, a haver condenação, só serão devidos a partir do trânsito em julgado da decisão. Vejamos. A questão já foi tratada em acórdão - com objecto de recurso mais amplo em acórdão deste Supremo (de 13 de Abril de 1994 no proc. 3833) - sendo a mesma a recorrente, se bem que diferente o recorrido. Quanto à primeira questão, sobre a aplicabilidade da dita cláusula 74, 7 do CCT, entendeu-se, então, que sim. A recorrente, como se vê das suas alegações e respectiva conclusão (8), entende que existe concorrência de CCTs. Nas celebradas entre a ANTRAN, por um lado, e as associações sindicais FESTRU e SITRA, por outro, sendo aplicável a última, por mais recente (artigo 14, n. 2 e n. 6 do Decreto-Lei 516-A1/79 de 29 de Dezembro). Então, como agora, continua a entender-se não haver concorrência de CCTs, pela simples razão que o recorrido se encontra filiado no STRUN - Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte - que se encontra inscrito na FESTRU ((supra c. e e.), sendo, desta maneira este o CCTV que regula as relações laborais entre recorrente e recorrida, e não o CCTV celebrado entre a ANTRAN e a SITRA, já que não existe ligação da recorrido a esta última associação. Ao contrário do que afirma a recorrente, continua a entender-se que o n. 7 da cláusula 74 do CCTV celebrado entre a ANTRAN e a FESTRU não viola o princípio constitucional de que a trabalho igual deve corresponder salário igual. A Constituição da República afirma outro princípio de não menor força, qual é o da liberdade sindical ( 55, 1), que integra a liberdade de constituição de associações sindicais, a liberdade do trabalhador se inscrever em sindicato da sua escolha, desde que representativo da sua profissão, bem com a liberdade de sair do sindicato. Como afirma o Prof. Menezes Cordeiro "Manual..., a págs. 147), estes dois princípios constitucionais contundem um com o outro, obtendo-se a sua exequibilidade e harmonia através de uma progressiva política salarial. Repetindo-se o que se disse no acórdão de 13 de Abril passado, "Qualquer destes dois basilares princípios visa assegurar os interesses dos trabalhadores e os da justiça social. Esta está no horizonte do princípio que a recorrente diz violado no acórdão da Relação. Aqueles encontram apoio na instituição da liberdade sindical. A meta que o primeiro representa alcança-se percorrendo o caminho traçado pelo segundo." A aplicação do CCTV celebrado entre a ANTRAN e a SITRA às relações entre recorrente e recorrido, seria flagrante violação do princípio da liberdade sindical, enquanto impunha ao último o respeito de obrigações e o exercício de direitos à luz de CCTV em que era terceiro. Outrossim, se fosse vítima do princípio de a trabalho igual deve corresponder salário igual, em consequência de uma má opção sobre a inscrição sindical, de si mesmo se deveria queixar, não da entidade patronal. Também carece de razão a afirmação da recorrente de que o exercício da liberdade sindical, pelo respeito dos Contratos Colectivos de Trabalho" pela pura filiação sindical conduz ao livre arbítrio, à insegurança e à injustiça, violando as mais elementares regras de um Estado de Direito, já que obriga a entidade patronal a averiguar, quotidianamente, em que sindicato os seus trabalhadores estão inscritos pois não se exige a respectiva comunicação de mudança ao trabalhador. Não podemos esquecer que existem entre a entidade patronal e o trabalhador direitos e deveres de mútua colaboração, que envolvem, entre outros, deveres de respeito e de lealdade (artigo 18 da LTC), com relevo na definição das responsabilidades correspondentes. Não se compreenderia que a entidade patronal, ao cumprir a sua obrigação de pagar o trabalho o faça sem prévio conhecimento dos elementos que o integram, sendo exigível na ocasião um mútuo esclarecimento. Também a razão não assiste à recorrente, quando quer aplicar, por analogia, a regra do artigo 14 do Decreto-Lei 519-C/79 de 29 de Dezembro e, consequentemente o CCT de publicação mais recente - o outorgado entre a ANTRAN e o SITRA -. A analogia justifica-se e é meio de regular uma situação quando não existe norma que a preveja. No nosso caso temos um CCTV. aplicável e que foi aplicado pelo acórdão recorrido, o acordado entre a ANTRAN e a FESTRU, associação sindical em que está inscrito o Sindicato a que pertence o recorrido. Como se disse no já citado acórdão deste Supremo, o estipulado nos ns. 7 e 8 da 74. cláusula do CCT celebrado entre a ANTRAN e a FESTRU não contraria o artigo 7 do Decreto-Lei 421/83 de 2/12. A cláusula 74, no seu n. 7 diz: "Os trabalhadores têm o direito a uma retribuição mensal, que não será inferior à remuneração correspondente a duas horas de trabalho extraordinário." Por sua vez, o n. 8 da mesma cláusula acrescenta: " A esses trabalhadores, de acordo com o estabelecido no número anterior, não lhes é aplicável o disposto nas cláusulas 39 (retribuição de trabalho noturno) e a 4. (retribuição de trabalho extraordinário)". A ilegalidade resultaria de tais normas contrariarem aquele dispositivo da lei, segundo o qual todo o trabalho extraordinário deve ser pago. Certo é que a retribuição prevista no n. 7 da cláusula 74, dadas as suas particulares características, merece a qualificação de gratificação complementar, que, por resultar de contrato e natureza regular, integra o conceito de retribuição normal (artigo 82 da LCT). Nele (7) fixa-se um limite inferior, sem se fixar limite superior, o que corresponde às características e especifidade do transporte rodoviário internacional de mercadorias, de que o controle de trabalho suplementar efectivamente prestado não é fácil de conseguir. Assim, como não se fixa ao trabalhador a obrigação de prestar duas horas de trabalho extraordinário por dia, não se está a liberalizar o regime de prestação e do pagamento do trabalho extraordinário, ferindo princípios estabelecidos no Decreto-Lei 421/83. Limita-se o mesmo número 7 da cláusula 74 a atribuir uma compensação monetária, à semelhança da que é atribuída aos trabalhadores que exercem cargos de confiança e de direcção, com dispensa de horário de trabalho. Não há, pois, violação dos interesses protegidos pelo Decreto-Lei 421/83. Como atrás se disse, a circunstância do recorrido não ter dado conhecimento à recorrente do sindicato em que estava filiado, em termos de lealdade e de mútua colaboração que deve presidir às relações entre empregador e empregado, não assume relevo que sobreleve a negligência da recorrente não fazer constar dos seus arquivos a situação sindical do seu trabalhador, para os efeitos de saber o que devia pagar. E o certo é que, como se reconhece no acórdão recorrido, das quantias reclamadas pelo autor no artigo 47, alínea c) de I a XI da petição inicial, a recorrida nada pagou ao recorrente, não obstante ele ter direito às mesmas, por força da dita cláusula 74, n. 7, razão porque bem aplicou o direito o acórdão recorrido, neste aspecto, ao condenar a recorrente no seu pagamento. O outro aspecto em que a recorrente não se conforma com o acórdão recorrido é quanto à condenação em juros de mora, desde a citação. Sê-lo-iam tão somente a partir do trânsito em julgado da decisão. O caso situa-se no âmbito da responsabilidade contratual. Como princípio, rege o artigo 805, n. 1 do C.CIV., segundo o qual o devedor só fica em mora depois de ter sido interpelado para cumprir. Como excepções ao princípio que podem interessar à hipótese que nos é posta, o mesmo artigo estabelece a da obrigação ter prazo certo e a do crédito ser ilíquido; no primeiro caso, o prazo convencionado será o termo inicial para contagem da mora; no segundo, importa tornar líquido o crédito, para se iniciar a contagem da mora, salvo se a falta de liquidez for imputávelao devedor ( ns. 2, a) e 3). O acórdão recorrido, sobre juros, relegou para a execução da sentença a sua exigibilidade daqueles em que a condenação foi em forma ilíquida. Quanto às restantes - remuneração referente ao tempo decorrido entre Julho/1983 e Outubro/1990 - tinham prazo de vencimento, pelo que a citação funciona como interpelação. Não merece, pois, provimento o recurso sobre este aspecto, e outro não alcança. Tudo visto, acordam em negar revista. Custas pela recorrente. Lisboa, 14 de Dezembro de 1994. Chichorro Rodrigues. Henriques de Matos. Correia de Sousa. |