Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
199/10.STBGRD-F.C1.S1
Nº Convencional: 7.ª SECÇÃO
Relator: SOUSA LAMEIRA
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
HABILITAÇÃO DE HERDEIROS
EXECUTADO
PRAZO
CONTRATO DE MÚTUO
PRESCRIÇÃO DE CRÉDITOS
PRAZO DE PRESCRIÇÃO
PRESTAÇÕES PERIÓDICAS
VENCIMENTO ANTECIPADO
INCUMPRIMENTO
JUROS
Data do Acordão: 02/29/2024
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: NEGADA A REVISTA
Sumário :
I. Falecendo um dos executados pode um outro executado, habilitado para prosseguir em nome do falecido, deduzir embargos, ainda que ele próprio não estivesse em prazo para o fazer.

II. Mantém-se válida a doutrina do AUJ n.º 6/2022 de 30.06, aplicável aos contratos de mútuo bancário em que está em causa o pagamento de quotas mensais de capital e juros, pelo que o prazo de prescrição é de 5 anos (al.e) do artigo 310 do CC)

Decisão Texto Integral:

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça


I – RELATÓRIO

l. Na execução movida por Ertow Asset Management, S.A, contra AA, BB, CC e DD para pagamento da quantia de € 229.098,30, AA veio deduzir oposição mediante embargos, alegando que:

A obrigação exequenda resultou de contrato de mútuo outorgado por escritura pública de Mútuo com Hipoteca de 2 de Março de 2000, mas que nunca se chegou a efectivar a entrega da quantia mutuada.

O acordo de mútuo com hipoteca estabeleceu um plano de amortização por vinte anos, aí se prevendo o reembolso da quantia mutuada em “duzentas e vinte e duas prestações mensais, constantes e sucessivas, de capital e juros”, ou seja, mediante o pagamento de quotas mensais de amortização do capital mutuado pagáveis com os juros.

A execução deu entrada em juízo em 09/02/2010.

Os mutuários nunca pagaram qualquer quota de amortização desde a data em que o mútuo com hipoteca foi outorgado, pelo que, a serem tais obrigações devidas, os devedores entraram em incumprimento logo na primeira prestação, a 02/04/2000, relativamente a juros, ou a 02/10/2001, relativamente à amortização e juros da quantia mutuada.

Consequentemente, desde a data do vencimento da primeira quota de amortização da quantia mutuada e juros não paga até à data de interposição da acção executiva e subsequente citação dos executados, decorreram mais de 5 anos, pelo que aquelas obrigações se mostram extintas por prescrição.

Conclui pedindo que se declare que se mostra extinto por prescrição o direito a exigir o cumprimento judicial da obrigação exequenda, requerendo, em consequência, que se determine a extinção da instância e a consequente extinção das hipotecas constituídas para garantia da quantia exequenda

2. A embargada/exequente contestou, alegando que o montante de capital mutuado de € 107,740,3 foi transferido na data da escritura de mútuo e hipoteca, como resulta do extracto bancário que junta.

Refere ter emprestado, em função daquela escritura de mútuo e hipoteca, «aos pais do embargante, BB e AA», pelo prazo de 20 anos, aquela importância a liquidar em prestações mensais, constantes e sucessivas de capital e juros, e que, atento o incumprimento do contrato, procedeu à interpelação do mutuário solicitando-lhe a regularização do incumprimento, sendo que, com o não pagamento pontual de uma prestação, venceram-se as demais, mas, ainda que assim não se entendesse, a interrupção da prescrição sempre teria operado através da citação para a execução em 11/7/2011 e em 29/11/2011, visto que estando vencidas todas as prestações e ficando sem efeito o plano de pagamento acordado, os valores em divida voltam a assumir a sua natureza de capital e de juros, ficando o capital sujeito ao prazo ordinário de 20 anos, como tem vindo a ser decidido nos tribunais, invocando jurisprudência nesse sentido.

3. Foi proferida sentença, em que, após prolação do despacho saneador em que se julgou regular a instância, se veio a decidir pela improcedência dos embargos.

4. Inconformado com o decidido, o Apelante/executado interpôs recurso de apelação, tendo o Tribunal da Relação de Coimbra, por Acórdão de 7 de Novembro de 2023 decidido:

«em julgar procedente a apelação, revogar a sentença recorrida e julgar procedentes os embargos de executado».

5. Inconformado veio a Exequente Ertow Asset Management, S.A., interpor recurso de revista formulando as seguintes conclusões:

1. Veio o Tribunal a quo decidir, da seguinte forma: “Pelo exposto, acorda este Tribunal em julgar procedente a apelação, revogar a sentença recorrida e julgar procedentes os embargos de executado.”.

2. Ressalvando-se o devido respeito pela opinião dos Ilustres Julgadores a quo, vem a Recorrente interpor recurso do Acórdão proferido, porquanto crê que a decisão, assenta num pressuposto errado, não resultando a correcta aplicação da Lei ao caso dos presentes autos.

3. A presente execução foi iniciada em 09.02.2010.

4. No âmbito da mesma, foram penhorados os bens imóveis dados em garantia à aqui Recorrente.

5. Em 20.05.2022, foram deduzidos Embargos pelo Executado AA, alegando para tanto a Prescrição e a Inexistência da Dívida.

6. Nessa conformidade, foi apresentada a respectiva Contestação a 29.08.2022, tendo sido alegado, em suma, pela ora Exequente o seguinte: “Atento o incumprimento do pagamento acordado, aliás confessado pelo próprio Embargante no artigo 8º da PI de embargos, quando assume que nunca pagou, CONFISSÃO que se aceita para não mais ser retirada, deu entrada a presente ação executiva para pagamento de quantia certa, em 09/02/2010, pelo valor de €229.098,30.”. “Contrariamente ao alegado pelo Embargante, não estamos perante uma dívida de “quotas de amortização.””. “O não pagamento pontual de uma prestação implicou o imediato vencimento das restantes, pelo que, tratando-se de uma obrigação única com prestações fracionadas, o prazo de prescrição quanto ao capital é de 20 anos, nos termos previstos no artigo 309º do CC.”. “Ainda que assim não se entendesse, a interrupção da prescrição sempre teria operado através da citação efetuada nos presentes autos em 11/07/2011 e em 29/11/2011, conforme documentos nos autos e que ora se juntam para maior facilidade de consulta, como Doc. 2 e Doc. 3.”. “Termos em que, estando a dívida vencida, consideram-se vencidas todas as prestações, ficando sem efeito o plano de pagamento acordado, pelo que os valores em divida voltam a assumir a sua natureza original de capital e de juros, ficando o capital sujeito ao prazo ordinário de 20 anos.”.

7. Não tendo sido realizada Audiência Prévia, por acordo das partes, foi, então, proferida a respectiva Sentença, nos seguintes termos: “Há que responder em primeiro lugar à primeira questão. São os embargos admissíveis? Não.”. “Precludiu-se, pelo decurso do prazo, o direito que tinha de se opor à execução mediante a dedução de embargos de executado. Seriam, assim, sempre de rejeitar os presentes embargos de executado.”. “Não obstante serem inadmissíveis os embargos, não pode deixar de se dizer que nunca procederia a excepção de prescrição, tal como não procederia a excepção inominada de falta de efectivação da quantia mutuada -neste caso, a alegação feita, é temerária, podendo até integrar o instituto da litigância de má-fé.”. “No que respeita à prescrição, como bem refere a embargada, o facto de se vencer uma prestação não paga e se vencerem todas as posteriores, não releva para a sua prescrição, porquanto esta respeita a cada uma das prestações e não ao todo da dívida.”. “Improcederia sempre a excepção peremptória de prescrição, tendo-se interrompido o prazo com a citação na execução, em 29 de Dezembro de 2012.”. “Face ao exposto, julgam-se totalmente improcedentes, por não provados, os presentes embargos de executado, interpostos pelo embargante/executado AA contra a embargada/exequente Ertow Asset Management, S.A..”.

8. A 28.11.2022, o Executado/Embargante apresenta alegações de Recurso para o douto Tribunal da Relação, alegando para tanto a nulidade da Sentença ora proferida, por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.

9. Não foram apresentadas contra-alegações pela Exequente.

10. Tendo sido proferido Acórdão, no passado dia 08 de Novembro de 2023, com os seguintes fundamentos: “…porque se deve concluir, em face da doutrina estabelecida no recente Acórdão Uniformizador 6/2022, que a divida reclamada nos autos se mostra prescrita.”. “Pelo exposto, acorda este Tribunal em julgar procedente a apelação, revogar a sentença recorrida e julgar procedentes os embargos de executado.”.

11. Ora, é com espanto que a Exequente é notificada da decisão supra referida, porquanto e não obstante tudo o que já foi dito em sede de Contestação, ficou plenamente demonstrado com a douta Sentença proferida a 21.10.2022 que os Embargos de Executado não são tempestivos e que a excepção peremptória de prescrição é improcedente, tendo-se interrompido o prazo com a citação na execução, em 29 de Dezembro de 2012.

12. Contudo, caso assim não se entenda e por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que ao crédito peticionado deverá ser aplicável o prazo de prescrição ordinário de vinte anos, previsto no artigo 309.º do C.C..

13. No Contrato de Mútuo existe uma única obrigação do Mutuário, a restituição do crédito mutuado.

14. A obrigação do Mutuário é logo devida pela celebração do Contrato de Mútuo – obrigação instantânea.

15. A possibilidade que o mutuante/credor confere ao mutuário/devedor de cumprir a obrigação de restituição do crédito através de prestações instantâneas fracionadas não se confunde com obrigações duradouras de execução continuada.

16. A restituição do crédito mutuado através de prestações fracionadas constitui o cumprimento parcial da mesma dívida/obrigação.

17. Aplicando-se assim, à obrigação de restituição do crédito, o prazo de prescrição ordinária previsto no artigo 309.º do C.C.

18. O prazo de prescrição excecional previsto no artigo 310.º do Código Civil é aplicável às obrigações de natureza duradoura onde se integram as obrigações periodicamente renováveis.

19. Esta situação não se confunde com o modo de cumprimento de um Contrato de Mútuo, convencionado entre as partes.

20. A obrigação de restituição do crédito mutuado é instantânea à celebração do Contrato de Mútuo.

21. O facto de o cumprimento da obrigação instantânea poder ser fracionado no tempo através de prestações não se confunde com a situação de créditos/obrigações periodicamente renováveis, com o decurso do tempo.

22. Conforme os ensinamentos do Professor Antunes Varela, dizem-se instantâneas as prestações em que o comportamento exigível do devedor se esgota num só momento (quae unico actu perficiuntur), (vide Antunes Varela, in “Das Obrigações em Geral”, Vol. I, 5ª ed., pg. 85).

23. No Contrato de Mútuo a obrigação é independente da duração da relação contratual.

24. No Contrato de Mútuo, a obrigação constitui-se numa única prestação ainda que o cumprimento possa ser diferido no tempo através de prestações fracionadas.

25. De acordo com a natureza da obrigação em causa, aos Contratos e inerente obrigação/crédito peticionado nos presentes autos não é aplicável o prazo excepcional de prescrição nos termos do artigo 310.º do Código Civil, mas sim o prazo de prescrição ordinário de vinte anos previsto no artigo 309.º do Código Civil.

26. Razão pela qual não se aceita o Acórdão recorrido.

27. O Tribunal a quo sempre devia ter decidido no sentido de julgar os Embargos de Executado extemporâneos e a excepção ora invocada improcedente.

28. Decisão que não se aceita e que viola o direito de crédito da Recorrente.

29. Razão pela qual se recorre da presente decisão.

30. Em suma, ao decidir o Tribunal a quo, em julgar procedente a excepção em apreço, não fez a correcta interpretação e aplicação da letra da lei ao caso concreto.

31. Entende a Recorrente que esta decisão de qual aqui se recorre, violou o sentido do artigo 9.º do Código Civil.

32. E bem assim, os artigos 3.º, n.º 3, 6.º, 7.º, n.º 1 e 547.º do C.P.C e o artigo 20.º da CRP, entre outros.

33. Imperando a necessidade de revogação do Acórdão de que aqui se recorre.

6 O Apelante/executado apresentou contra-alegações, tendo formulado as seguintes conclusões:

A) O objecto do recurso na parte relativa à verificação da excepção peremptória da prescrição deve ser julgado nos termos e em conformidade com o acórdão de uniformização de jurisprudência do STJ nº 6/2022 de 30.06.2022 (Proc. 1736/19.8T8AGD-B.P1.S1), publicado no DR, 1ª série, nº 184, de 22.09.2022, julgando e decidindo que:

«I – No caso de quotas de amortização do capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do artº. 310º, alínea e), do Código Civil, em relação ao vencimento de cada prestação;

II – Ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do artigo 781º daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo a quo na data desse vencimento e em relação a todas as quotas assim vencidas.»

B) O objecto do recurso na parte relativa à alegada violação dos princípios processuais do contraditório, do inquisitório, da cooperação, do processo equitativo e da garantia de acesso ao direito e à tutela da justiça, e a consequente e alegada violação da lei de processo no que concerne ao disposto nos artºs. 3º, nº 3, 6º, 7º, nº 1, e 547º do CPC e no artº. 20º da CRP, não desenvolvendo, nem concretizando a Recorrente os fundamentos de direito de modo a permitir compreender de forma cabal o sentido da sua alegação contra o douto acórdão a quo e em que medida as referidas normas da lei de processo foram violadas ou foram objecto de errada aplicação, deverá improceder totalmente.

Conclui pedindo a improcedência do recurso.

II – FUNDAMENTAÇÃO

Foram dados como provados os seguintes factos:

1. A presente execução é fundada em contrato de mútuo outorgado por escritura pública de Mútuo com Hipoteca, outorgada em 2 de Março de 2000. (artigos 1º e 7º da contestação)

2. A quantia mutuada ascendia ao montante de 21.600.000$00, equivalente, actualmente, a 107.740,35 euros; (artigos 2º e 5º do requerimento inicial)

3. O acordo de mútuo com hipoteca estabeleceu um plano de amortização tendo sido “celebrado pelo prazo de vinte anos”; (artigo 3º do requerimento inicial)

4. No acordo previa-se que a quantia mutuada deveria ser reembolsada em “em duzentas e vinte e duas prestações mensais, constantes e sucessivas, de capital e juros, cada uma no valor de cento e sessenta e um mil e sessenta e três escudos”; (artigo 4º do requerimento inicial)

5. A interposição da Execução deu entrada em juízo em 09.02.2010, pelo valor de 229.098,30 euros; (artigo 6º do requerimento inicial e 3º da contestação)

6. A quantia exequenda, no montante total de 229.098,30 euros, compreende a totalidade do capital mutuado, 107.740,35 euros, acrescida de juros e outros encargos no montante global de 121.357,95 euros; (artigo 7º do requerimento inicial)

7. Os mutuários nunca pagaram qualquer quota de amortização do capital mutuado pagáveis com os juros desde a data em que o mútuo com hipoteca foi outorgado, tendo entrado em incumprimento logo na primeira prestação, ou seja, a 02.04.2000, relativamente a juros, ou a 02.10.2001, relativamente à amortização e juros da quantia mutuada; (artigo 8º do requerimento inicial)

8. O valor de € 107.740,35, foi transferido em 02.03.2000, data da escritura de mútuo com hipoteca, título executivo dos autos. (artigo 1º da contestação)

9. A taxa de juros contratada foi à taxa anual de 7.75%; o incumprimento do contrato de mútuo em 06.06.2000; o capital em dívida de 107.740,35 euros e a taxa de juro à data do incumprimento de 5,75%, a ser acrescida da sobretaxa de mora de 4%; (artigo 2º da contestação)

10. A Embargada, por escritura pública, lavrada a 2 de março de 2000, emprestou aos pais do Embargante, BB e AA, pelo prazo de 20 anos, a importância de Euros 107.740,35, a liquidar em prestações mensais, constantes e sucessivas de capital e juros, acrescidas do imposto de selo em vigor, e nas demais condições constantes do referido título; (artigo 6º da contestação)

11. Atento o incumprimento do contrato, a Embargada procedeu à interpelação do mutuário, solicitando a regularização do incumprimento, a fim de a Embargada não ser forçada a ter que proceder à execução judicial da dívida; (artigo 8º da contestação)

12. O não pagamento pontual de uma prestação implicou o imediato vencimento das restantes; (artigo 9º da contestação)

13. Os executados primitivos BB e AA foram citados nos autos de execução, respectivamente, em 11.07.2011 e em 29.12.2012. (artigo 10º da contestação)

E ainda que:

14. BB e AA foram citados para, no prazo de 20 dias, pagarem ou oporem-se à execução;

15. O embargante, executado primitivo nos autos principais, não pagou nem deduziu oposição à execução, naquele prazo.

16. Foi também habilitado para prosseguir na execução nos lugares dos executados BB e de CC.

E julgou não provados os seguintes factos:

- A quantia mutuada, não se chegou a efectivar; (artigo 1º do requerimento inicial)

- O executado AA foi citado em 29.11.2011. (artigo 10º da contestação).

III – DA SUBSUNÇÃO – APRECIAÇÃO

Verificados que estão os pressupostos de actuação deste tribunal, corridos os vistos, cumpre decidir.

A) O objecto do recurso é definido pelas conclusões das alegações da Recorrente, artigo 635 do Código de Processo Civil.

As questões a decidir são as seguintes:

1- Os embargos são tempestivos?

2- Ocorre ou não a invocada prescrição?

B) Vejamos a primeira questão: Os embargos são tempestivos?

A resposta não pode deixar de ser afirmativa.

Como bem salienta o Acórdão recorrido, e é pacifico, o Embargante foi efectivamente citado em 11.12.2012. Mas foi citado por si, na sua qualidade de executado.

Todavia a execução foi também interposta contra CC e DD, demandados na qualidade de garantes do cumprimento do mútuo.

Ora o CC, quando ainda não tinha sido citado para a execução ou, de todo o modo, quando ainda se encontrava a decorrer o prazo para se defender na execução, faleceu em .../.../2015.

Foram, então habilitados como seus herdeiros, para contra eles prosseguir a execução, DD, sua mulher, EE, BB e AA.

A BB veio a falecer em .../.../2016, tendo sido habilitados como seus herdeiros, para contra eles prosseguir a execução, FF, seu filho, e o Embargante, seu marido.

O Embargante, AA, na qualidade de habilitado por morte de CC, foi notificado, em 29/4/2022, para deduzir embargos, tendo deduzido os presentes embargos.

O embargante deduz os embargos na qualidade de sucessor do executado CC.

Os embargos são assim claramente tempestivos.

Deste modo, e sem necessidade de outras considerações, improcede a primeira questão objecto desta revista.

C) Resolvida a primeira questão vejamos a segunda: Ocorre ou não a invocada prescrição?

A resposta não pode igualmente ser afirmativa.

Efectivamente esta questão foi resolvida pelo AUJ n.º 6/2022, de 30.06.2022, in Diário da República n.º 184/2022, Série I de 22/09.

E, não vemos razões, de facto ou de direito, para não aderir inteiramente ao aí decidido, uma vez que continuam a ser inteiramente válidas quer a fundamentação quer a conclusão desse Acórdão Uniformizador.

O Acórdão de Uniformização de Jurisprudência n.º 6/2022 uniformizou jurisprudência nos seguintes termos:

«I- No caso de quotas de amortização de capital mutuado pagável com juros, a prescrição opera no prazo de cinco anos, nos termos do art.º 310.º al. e) do Código Civil, em relação ao vencimento de cada prestação.

II- Ocorrendo o seu vencimento antecipado, designadamente nos termos do art.º 781.º daquele mesmo diploma, o prazo de prescrição mantém-se, incidindo o seu termo “a quo” na data desse vencimento e em relação a todas as quotas vencidas».

Como resulta do texto do citado AUJ a posição que foi sufragada tinha já sido seguida por inúmeras decisões quer do STJ quer das Relações.

Efectivamente podemos ler no AUJ em apreço que «A posição doutrinal que, em II, entendemos a mais adequada, ou seja, a aplicação da prescrição de 5 anos à acumulação das quotas de amortização do capital por perda de benefício do prazo (artigo 781.º CCiv), vem sustentada na quase totalidade da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, designadamente no Ac. S.T.J. 29/9/2016, revista n.º 201/13.1TBMIR-A.C1.S1 (Lopes do Rego) cit. e também nos Acs. S.T.J. 8/4/2021, revista n.º 5329/19.1T8STB-A.E1.S1 (Nuno Pinto Oliveira), S.T.J. 9/2/2021, revista n.º 15273/18.4T8SNT-A.L1.S1 (Fernando Samões), S.T.J. 14/1/2021, revista n.º 6238/16.1T8VNF-A.G1.S1 (Tibério Nunes da Silva), S.T.J. 12/11/2020, revista n.º 7214/18.5T8STB-A.E1.S1 (Maria do Rosário Morgado), S.T.J. 3/11/2020, revista n.º 8563/15.0T8STB-A.E1.S1 (Fátima Gomes), S.T.J. 23/1/2020, revista n.º 4518/17.8T8LOU-A.P1.S1 (Nuno Pinto Oliveira), S.T.J. 27/3/2014, revista n.º 189/12.6TBHRT-A.L1.S1 (Silva Gonçalves), e em numerosas decisões das Relações».

Dúvidas não restam quanto ao caminho a seguir, devendo entender-se que prescrevem no prazo de 5 anos, após o seu vencimento, conforme previsto na alínea e) do artigo 310º do CC, todas as prestações de créditos vencidos emergentes de mútuos bancários e não pagas.

Descendo ao caso concreto.

Provou-se que em Março de 2000 a Caixa Económica da Guarda concedeu um empréstimo ao Executado AA e outros.

Os mutuários nunca pagaram qualquer prestação (quota de amortização) do capital mutuado (pagável com os juros desde a data em que o mútuo com hipoteca foi outorgado).

A execução foi interposta em 09-02-2010.

Torna-se manifesto que quando a execução foi intentada há muito que se encontravam decorridos os 5 anos necessários para a prescrição ocorrer.

O incumprimento verificou-se logo na primeira prestação, ou seja, a 02/04/2000, relativamente a juros, ou a 02/10/2001, relativamente à amortização e juros da quantia mutuada.

Dúvidas não podem subsistir em como ocorreu a prescrição, pelo que se encontra extinto o crédito exequendo.

Impõe-se, assim, a improcedência da invocada questão e, consequentemente, da presente revista.

III - Decisão

Nos termos expostos acordam os juízes que compõem este Tribunal em julgar improcedente a presente revista e, em consequência, confirma-se o Acórdão recorrido.

Custas pela Recorrente.

Lisboa, 29 de fevereiro de 2024

José Sousa Lameira (relator)

Conselheira Maria Fátima Gomes

Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza