Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 5ª SECÇÃO | ||
Relator: | ARMÉNIO SOTTOMAYOR | ||
Descritores: | RECURSO DE DECISÃO CONTRA JURISPRUDÊNCIA FIXADA SUSPENSÃO PROVISÓRIA DO PROCESSO ADMISSIBILIDADE DE RECURSO DESPACHO DECISÃO JUDICIAL REJEIÇÃO DE RECURSO | ||
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Data do Acordão: | 05/12/2011 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO DE DECISÃO CONTRA JURISPRUDÊNCIA FIXADA | ||
Decisão: | INUTILIDADE/ IMPOSSIBILIDADE DA LIDE | ||
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Sumário : | I - A norma do art. 446.º do CPP, que permite o recurso directo para o STJ no caso de divergência de jurisprudência fixada, refere-se aos actos decisórios do juiz, que, segundo o disposto no art. 97.º, n.º 1, do CPP, tomam a forma de sentenças, quando conhecerem a final do objecto do processo [al. a)] e de despachos, quando conhecerem de qualquer questão interlocutória ou quando puserem termo ao processo fora do caso previsto na alínea anterior [al. b)]. II - Ao firmar jurisprudência no Ac. n.º 16/2009, de 18-11-2009, no sentido de que “A discordância do Juiz de Instrução em relação à determinação do Ministério Público, visando a suspensão provisória do processo, nos termos e para os efeitos do nº1 do artigo 281º do Código de Processo Penal, não é passível de recurso”, entendeu o STJ que o acto de discordância do juiz de instrução em relação à determinação do MP, visando a suspensão provisória do processo, não tem características nem natureza de acto decisório. III - Por idênticas razões, não é de admitir recurso extraordinário por violação de jurisprudência fixada quando o juiz, com fundamento na existência de inconstitucionalidade, se pronunciou em sentido divergente do Ac. de Uniformização de Jurisprudência n.º 8/2008, publicado no DR 146, 1.ª Série, de 05-08-2008. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. A GNR participou ao Ministério Público que, em 28 de Dezembro de 2008, pelas 17H15, na Rua ..., comarca de ..., haviam sido encontrados diversos indivíduos que eram portadores de haxixe, entre os quais o arguido AA, identificado nos autos, que detinha 8,2 g daquela substância e BB, igualmente identificado, que detinha 6,0 g da referida substância. Terminado o inquérito, o Ministério Público considerou suficientemente indiciado que o arguido AA, consumidor habitual de canabis, trazia consigo 4 pedaços de resina de canabis com o peso líquido de 7,844 g e que, nas mesmas circunstâncias, BB, consumidor ocasional de canabis, trazia consigo um pedaço do mesmo produto com o peso líquido de 5,902 g, substância que qualquer deles destinava ao seu próprio consumo, incorrendo, assim, na prática em autoria material de um crime p. e p. pelo art. 40º nº 2 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela Anexa I-C. Porque entendia estarem reunidas condições para a suspensão provisória do processo, o Ministério Público ordenou tal suspensão por 3 meses, sob condição de AA entregar, nesse prazo, à Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários F..., a quantia de € 400,00 e de BB, entregar a “Mundos da Vida – Associação para a Educação e Solidariedade”, a quantia de € 300,00. Mais ordenou que o autos fossem conclusos ao Juiz de Instrução Criminal nos termos e para os efeitos do disposto no art. 281º nº 1 do CPP. Por este Magistrado foi proferido o seguinte despacho: “O despacho do Ministério Público de suspensão provisória dos autos, conforme referido, seguiu e acolher o entendimento preconizado no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 08/2008, publicado na I Série do Diário da República de 05-08-2008, em cujo sumário se pode ler: "Não obstante a derrogação operada pelo artigo 28.º da Lei n.º 30/2000, de 29 de Novembro, o art.º 40.º, n.º 2, do decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, manteve-se em vigor não só quanto ao cultivo como relativamente à aquisição ou detenção, para consumo próprio, de plantas, substâncias ou preparações compreendidas nas tabelas I a IV, em quantidade superior à necessária para o consumo médio individual durante o período de 10 dias". Não podemos concordar com este entendimento, desde logo porque violador de preceitos constitucionais fundamentais. Efectivamente, com a ressalva do cultivo, o normativo contido no art.º 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 15/93 de 22-01 foi expressamente revogado pelo art.º 28.° da Lei n.º 30/2000 de 29-11, o que significa que actualmente não há punição para o tipo de conduta descrito no caso dos autos, ou seja, não é criminalmente punível a conduta do arguido que detém na sua posse produto estupefaciente para seu consumo em quantidade superior para dez dias; se assim é, verifica-se que é inconstitucional o entendimento preconizado no citado Acórdão do STJ e a aplicação do referido art.o 40.°, n.º 2, do Decreto-lei n.º 15/93 de 22-01, na parte em que não se refere ao cultivo (ou, se preferirmos, na parte em que se refere ao consumo), por tal aplicação normativa ser violadora do art.º 29.°, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, sendo ainda tal aplicação de tal normativo violadora do preceituado no art.º 161.°, al.ª c) e 165.°, n. 1, al.ª c), ambos da Constituição da República Portuguesa, não dispondo o Supremo Tribunal de Justiça, nem o Ministério Público no caso dos autos, do poder de definir, estabelecer e sobretudo repristinar leis. Em conformidade com o exposto, porque inconstitucional a aplicação do art.º 40.º, n.º 2, do Decreto-lei n.º 15/93 de 22-01 (na parte em que se refere à posse ou detenção de produto estupefaciente para consumo próprio em quantidade superior a dez dias), não concordo com a suspensão provisória dos autos, entendendo que não há matéria criminal no caso dos autos, recusando, por conseguinte, a aplicação daquele normativo legal - cfr. também o art.º 277.° e 280.°, n.º 1, al.ª a), ambos da Constituição da República Portuguesa. Transitado o despacho, após decurso do prazo legal contado desde a notificação ao Ministério Público e aos arguidos, veio a ser interposto pelo Ministério Público, dentro do prazo de 30 dias, recurso extraordinário por violação de jurisprudência fixada, nos termos dos arts. 399º e 446º do Código de Processo Penal. Da motivação, constam as seguintes conclusões: 1. A prova colhida nos autos consente que concluamos pela existência de indícios suficientes da prática, por banda de cada um dos arguidos, de um crime p. e p. pelo art. 40°, nº 2 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, por referência à Tabela Anexa I-C. 2. O Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça nº 8/2008, de 25 de Junho, fixou jurisprudência no sentido da vigência do art. 40°, n° 2, do Decreto-lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, na parte relativa ao consumo. 3. A decisão judicial de que ora se recorre, ao decidir não aplicar ao caso concreto o preceito legal em referência, por considerá-lo inconstitucional, foi contra jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça. 4. A inconstitucionalidade, nos moldes em que surge delineada no despacho recorrido, radica no erróneo pressuposto de que o preceito cuja aplicação convocámos foi expressamente revogado pelo art. 28.° da Lei n° 30/2000, de 29 de Novembro. 5. Não deverá ser mantida a decisão em recurso, uma vez que não se surpreende a existência de qualquer inconstitucionalidade no quadro em que aí surge anotada. Nestes termos e nos demais de direito aplicável … deve o recurso ser julgado procedente, revogando-se o despacho recorrido, que deverá ser substituído por outro que, reconhecendo a constitucionalidade da norma contida no art. 40°, n.º 2 do Decreto-Lei nº 15/93, de 22 de Janeiro, na parte relevante, se pronuncie quanto à admissibilidade, no caso, da proposta suspensão provisória do processo. Neste Supremo Tribunal, o Ministério Público emitiu parecer, no qual começou por se pronunciar acerca da inaplicabilidade do acórdão de fixação de jurisprudência nº 16/2009 (DR – 1ª Se de 24-12-2009) aos recursos extraordinários por violação de jurisprudência fixada. Quanto ao objecto do recurso, entende, em suma, que “não se tendo operado qualquer alteração legislativa, nem havendo sido produzida jurisprudência com argumentos novos, ponderosos e especialmente relevantes, pelos quais se considere ultrapassada a jurisprudência fixada e que justifiquem o reexame da mesma, certo sendo que a Lei 18/2009, afinal também nada de novo trouxe, nem se colocando uma possibilidade de alteração do sentido da deliberação assumida, é de manter a orientação fixada. (cf. Ac. do STJ tirado na 5.ª Secção, P.º n.° 21/08.5GAGDL.S1, de 3.01.2009).” Colhidos os vistos em simultâneo, o processo é presente à conferência para decisão. 2. Primeiramente, há que apreciar a questão da recorribilidade da decisão, que o Ministério Público suscita no seu parecer. O art. 446º do Código de Processo Penal estabelece no seu nº 1: É admissível recurso directo para o Supremo Tribunal de Justiça de qualquer decisão proferida contra jurisprudência por ele fixada, a interpor no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida, sendo correspondentemente aplicáveis as disposições do presente capítulo. Esta norma ao referir-se a decisão está a remeter para os actos decisórios do juiz, que, segundo o disposto no art. 97º nº 1, tomam a forma de sentenças, quando conhecerem a final do objecto do processo [al. a)] e de despachos, quando conhecerem de qualquer questão interlocutória ou quando puserem termo ao processo fora do caso previsto na alínea anterior [al. b)], tomando ainda o nome de acórdãos quando proferidos por tribunal colegial. Depois de referir que o Código não nos dá directamente a noção de actos decisórios, Germano Marques da Silva (Curso de Processo Penal, II, pág. 19) considera, a partir da norma do art. 97º nº 1 do Código de Processo Penal, que “actos decisórios dos juízes são os actos em que o juiz dá solução ao processo, pondo-lhe termo, conhecendo ou não do deu objecto, ou a qualquer questão interlocutória, não sendo decisórios nem os actos de mero expediente, nem aqueles que não traduzem a solução de qualquer questão. O acto decisório põe termo a uma questão, definitivamente ou num dado grau de jurisdição, optando o juiz por uma de entre duas ou mais soluções possíveis.” São estes actos decisórios, obrigatoriamente fundamentados, conforme impõe o nº 5 do art. 97º, que, no caso de divergiram de jurisprudência fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, são objecto de recurso extraordinário contra jurisprudência fixada, cuja interposição é obrigatória para o Ministério Público. Contudo, pelo Acórdão de Uniformização de Jurisprudência nº 16/2009, de 18-11-2009 (DR 1ª Se, de 24-12-2009) o Supremo Tribunal de Justiça fixou jurisprudência no seguinte sentido: “A discordância do Juiz de Instrução em relação á determinação do Ministério Público, visando a suspensão provisória do processo, nos termos e para os efeitos do nº1 do artigo 281 do Código de Processo Penal, não é passível de recurso”. Nos termos do disposto no art. 281º nº 1 do Código de Processo Penal, “Se o crime for punível com pena de prisão não superior a 5 anos ou com sanção diferente da prisão, o Ministério Público, oficiosamente ou a requerimento do arguido ou do assistente, determina, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo, mediante a imposição ao arguido de injunções e regras de conduta”, fazendo a lei depender a aplicação do instituto da verificação de um conjunto de pressupostos, que taxativamente indica. Para aferir da possibilidade de o acto de «concordância» do juiz de instrução ser susceptível de recurso, o acórdão nº 16/2009 confrontou-se com a questão da caracterização desse acto e da respectiva natureza jurídica. A este respeito, escreveu-se no ponto VI do referido acórdão, a cuja transcrição integral se vai proceder: Eixo essencial da questão da recorribilidade da denominada «concordância» judicial é a definição da sua natureza jurídica. Na verdade, dispõe o artigo 359.º do Código de Processo Penal que é permitido recorrer dos acórdãos, das sentenças e dos despachos cuja irrecorribilidade não estiver prevista na lei. Existe uma relação linear e convergente entre este normativo e o complexo de actos que consubstanciam a actuação processual do juiz no processo penal, os quais o artigo 97.º do mesmo diploma, cataloga e alberga sobre a designação de acto decisório. Falamos, assim, dos actos do juiz que conhecem afinal do objecto do processo, e tomam a forma de sentença; que conhecem uma qualquer questão interlocutória; ou que põem termo ao processo e que tomam a forma de despacho. A questão que então se coloca é de saber se a denominada «concordância» do juiz integra qualquer uma das hipóteses citada e assume, assim, a natureza de acto decisório e, como tal, é recorrível. Na verdade, nem todos os actos praticados pelo juiz no processo assumem a natureza de acto decisório e certamente que um daqueles que suscita mais perplexidade pela sua morfologia equívoca é a denominada «concordância» do juiz. Efectivamente, como refere Roxin, os actos do juiz podem-se agrupar segundo a forma (sentenças ou despachos) e segundo o seu conteúdo, distinguindo-se entre aqueles que põem fim ao processo e aqueles que possibilitam a sua continuação. Os actos do juiz reconduzem-se, assim, a uma de duas tipologias diferentes: por um lado os actos que visam a ordenação, e impulso processual, e, por outro, os actos que visam a finalização do processo. Os primeiros visam a ordem do processo, adequando a tramitação do procedimento à lei adjectiva, e os segundos visam a resolução da questão substantiva, ou seja, o terminus da relação processual. Assumam uma, ou outra natureza, os actos judiciais, para revestirem a natureza de um acto decisório, devem ter por finalidade ou o conhecimento, a final, do objecto processo, ou a sua finalização, ainda que sem tomar conhecimento do respectivo objecto. No caso da denominada «concordância» do juiz de instrução, e excluída a possibilidade de assumir a integração categorial de despacho interlocutório, poderá afirmar-se que a mesma se define como acto decisório? Por alguma forma a caracterização do mesmo tipo de actos se prende com a própria estrutura e princípios do direito processual penal. Na verdade, na perspectiva jurídica assumida pela lei adjectiva aquele ramo do direito surge como uma regulamentação disciplinadora de investigação, e esclarecimento de um crime concreto, que permite a aplicação de uma consequência jurídica a quem, com a sua conduta, tenha realizado um tipo de crime. Nesta medida ele constitui, de um ponto de vista formal, um «procedimento» público que se desenrola desde a primeira actuação oficial tendente àquela investigação e esclarecimento até à obtenção de uma sentença com força de caso julgado ou até que se execute a reacção criminal a que o arguido foi condenado. Procedimento este que põe em causa não apenas o arguido, na sua relação com o detentor do poder punitivo representado pelos órgãos que no processo intervêm, mas uma série de «terceiros» — as testemunhas, os declarantes, os peritos, os intérpretes que estabelecem entre si e com os sujeitos processuais as relações jurídicas mais diversas e assumem no processo diferentes posições jurídicas. Foi justamente para se abranger juridicamente toda esta diversidade, apreendendo o processo como um unitário, que se procurou caracterizá-lo como relação jurídica processual. Tal relação, como bem aponta o Professor Figueiredo Dias, deverá ter subjacente uma compreensão como relação da vida social controlada pelo direito. O conceito de relação jurídica processual penal terá então, ao menos, o efeito útil de dar a entender, com nitidez, que, com o início do processo penal, se estabelecem necessariamente relações jurídicas entre o Estado e todos os diversos sujeitos processuais — se bem que a posição jurídica destes seja a mais diversa e diferenciada e que dali nascem para estes direitos e deveres processuais. Nesta perspectiva nos parece de assumir o entendimento de que a decisão que põe termo à causa é aquela que tem como consequência o arquivamento, ou encerramento do objecto do processo, mesmo que não se tenha conhecido do mérito. Em última análise trata-se da decisão que põe termo àquela relação jurídica processual penal, ou seja, que determina o «terminus» da relação entre o Estado e o cidadão imputado, configurando os precisos termos da sua situação jurídico-criminal. Então, repete-se, a questão a equacionar no caso vertente é somente a de saber se a denominada «concordância» do juiz de instrução é uma decisão que põe fim à relação processual penal, podendo subsumir-se no conceito de acto decisório, nos termos e para os efeitos do citado artigo 98.º do CPP. A resposta é, quanto a nós, manifestamente negativa, pois que o instituto da «concordância» judicial surge como um mero pressuposto da determinação do Ministério Público, essa sim sinalizando o fim daquela relação processual penal. Em última análise, a forma enviesada como o legislador inscreveu a intervenção do juiz de instrução na suspensão provisória, submetendo-a, através da figura da «concordância», a um regime desadequado em face dos princípios constitucionais e do processo (o juiz não concorda, o juiz decide) necessariamente que teria de conduzir a consequências não ponderadas. Como refere Anabela Rodrigues a verdadeira decisão de suspensão compete ao Ministério Público. Mais adianta a mesma autora que a concordância do juiz é, assim uma mera formalidade essencial, embora de conformação (validade) daquela decisão (do Ministério Público) prevista pelo legislador em nome da ideia que fundamenta o instituto. Não se trata assim de uma decisão de que se possa recorrer. É certo que, em termos formais -categoriais, a não concordância do juiz assume a forma de um «despacho» mas, em termos materiais, não é um acto decisório que assuma aquela força. Tratando -se, como se trata, de um controlo da legalidade, nenhuma razão há para intervir — não faria sentido — uma 2.ª instância quanto a essa fiscalização. Entendemos, assim, que o despacho judicial que consubstancia a denominada «concordância» do juiz na suspensão provisória do processo é um acto processual de natureza judicial, não decisório, que constitui o pressuposto formal, e substancial, da determinação do Ministério Público de suspensão do processo nos termos do n.º 1 do artigo 281.º do Código de Processo Penal. Como decorre da leitura integral do acórdão nº 16/2009, a questão da natureza do acto de concordância do juiz de instrução foi, aliás, um dos pontos em que não houve unanimidade na decisão. Vários foram os votos de vencido onde se defendeu tratar-se de um verdadeiro acto decisório do juiz. “Ele decide (não emite uma opinião ou um parecer, mas sim uma decisão) se estão ou não verificados os pressupostos formais e materiais de aplicabilidade da suspensão” – assim se escreveu no voto de vencido do Cons. Maia Costa, a que outros Conselheiros aderiram, como foi o caso do relator e da adjunta do presente acórdão. Não tendo feito vencimento esta posição, não se tratando pois de um acto decisório e tendo a jurisprudência que fixada entendido não ser passível de recurso a discordância do juiz de instrução em relação à determinação do Ministério Público, visando a suspensão provisória do processo, haverá que considerar que, por idênticas razões às que ali foram expostas, também não é susceptível de recurso extraordinário por violação de jurisprudência fixada, uma vez que este recurso tem por objecto a decisão que contrarie a jurisprudência que o Supremo Tribunal de Justiça fixou. O Ministério Público neste Supremo Tribunal assenta a sua posição quanto à recorribilidade em sede de recurso extraordinário na circunstância de não se visar aqui a questão do merecimento ou não da discordância do juiz na suspensão provisória do processo, mas, antes, verificar se a posição do juiz de instrução tem fundamentos válidos para alterar ou não o acórdão de fixação de jurisprudência nº 8/2008. Só que para tal seria necessário que o acto extraordinariamente impugnado fosse uma decisão, pois só as decisões têm idoneidade para divergir da jurisprudência anteriormente fixada e, como se referiu já, o Supremo Tribunal de Justiça entendeu que tal acto judicial não tem natureza de decisão. Deste entendimento não resulta, porém, uma aplicação da lei em desarmonia com a interpretação fixada pelo Supremo Tribunal de Justiça, uma vez que a não concordância do juiz tem apenas, como consequência, que os autos seguirão como processo comum, com dedução da acusação e realização de julgamento, aí se aplicando, ou não, a jurisprudência que o Supremo fixou, mas sempre, então, com possibilidade de recurso ordinário e extraordinário. Nestes termos acordam no Supremo Tribunal de Justiça em julgar não admissível o presente recurso extraordinário de decisão proferida contra jurisprudência fixada, em virtude o acto em que o juiz que, com fundamento na existência de inconstitucionalidade, se pronunciou em sentido divergente do acórdão de uniformização de jurisprudência nº 8/2008, publicado no Diário da República nº 146 - 1ª Série, de 5-08-2008, não ter a natureza jurídica de «decisão». Sem custas, por delas o Ministério Público estar isento. Lisboa, 12 de Maio de 2011 Arménio Sottomayor (relator) ** Isabel Pais Martins |