Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00000710 | ||
Relator: | BARATA FIGUEIRA | ||
Descritores: | ARRENDAMENTO PERDA OU DETERIORAÇÃO DA COISA INDEMNIZAÇÃO | ||
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Nº do Documento: | SJ200112060013432 | ||
Data do Acordão: | 12/06/2001 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 908/00 | ||
Data: | 12/11/2000 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Área Temática: | DIR CIV - DIR CONTRAT. | ||
Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 1038 1 ARTIGO 1043 N1 ARTIGO 1044 N1. RAU90 ARTIGO 63 N2 ARTIGO 64 N1 H. | ||
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Sumário : | I- A lei responsabiliza o arrendatário pelas deteriorações provenientes do uso imprudente do prédio - a aferir pelo julgador em função da diligência de um bom pai de família - e não da sua não utilização. II- O arrendatário não é responsável se as deteriorações provierem de facto seu, mas não culposo. III- A degradação por vetustez não cuidada do senhorio, relacionada com deteriorações não reparadas por este, configura caso de força maior. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: "A" intentou, acção com processo ordinário contra o ESTADO PORTUGUÊS, pedindo a condenação deste a levar a cabo no prédio urbano abaixo identificado, de que é proprietária, as obras discriminadas no caderno de encargos junto, ou, em alternativa a pagar-lhe a quantia de 11.821.500$00, acrescida de juros de mora, desde a citação até efectivo pagamento, para que ela própria as possa realizar. A fundamentar o pedido alega, em resumo, que o Réu, como arrendatário do aludido prédio, desde 1953 até 1994, não a avisou, nem os seus antepossuidores, da sua progressiva degradação, a impor a realização de obras urgentes de conservação e reparação, sendo certo que a mesma resultou da utilização imprudente feita pelos seus agentes ao arrendado. O Réu contestou, excepcionando com a prescrição do direito à indemnização, e impugnando os factos alegados pela A., afirmando, entre o mais, que esta sempre esteve a par da progressiva degradação e da ruína natural do prédio, quer por percepção directa, quer pelos sucessivos e infrutíferos avisos que lhe fez para realizar as obras necessárias a evitá-la e a mantê-lo apto a satisfazer os fins para que foi arrendado. Na réplica, a A. alegou que só teve conhecimento do estado ruinoso do prédio, quando o Réu, findo o contrato, lhe entregou as chaves, em Agosto de 1994. Saneado, com relegação para o final do conhecimento da excepção suscitada, condensado e instruído o processo, procedeu-se ao julgamento da matéria de facto controvertida, tendo de seguida a Mma. Juíza proferido sentença, em que julgou a acção parcialmente procedente, condenando o Estado a pagar à A. quantia a liquidar em execução de sentença respeitante ao contributo daquele para a deterioração e degradação do imóvel, no período compreendido entre Janeiro de 1992 e Agosto de 1994, e absolvendo-o implicitamente do mais. (Não houve pronúncia sobre a excepção, omissão contra a qual, porém, não houve reacção, estando assim sanada qualquer eventual nulidade daí resultante). Inconformados com o decidido, a A. e o Estado recorreram da sentença para a Relação do Porto, mas este tribunal julgou improcedente a apelação daquela e procedente a do último, absolvendo-o integralmente do pedido, mediante acórdão de 11/12/2000. Deste acórdão traz agora a Autora, irresignada, a presente revista. Nas suas alegações e respectivas conclusões sustenta que o mesmo deve ser revogado e confirmada a sentença, salvo no tocante à condenação em quantia ilíquida, dado ser possível quantificá-la já, segundo critérios de equidade, condenando-se o Estado - por ter feito do locado uma utilização imprudente, ao tê-lo, unilateralmente encerrado e abandonado em Janeiro de 1992, quando a sua obrigação era mantê-lo e restitui-lo no estado em que o recebeu (conclusões a) a i)) - a pagar-lhe a quantia de, pelo menos, 4.500.000$00, como indemnização pelos danos que com isso lhe causou - conclusões j) a u). O Exmo. Magistrado do M.P. contra-alegou defendendo a correcção do julgado e batendo-se pela sua confirmação. Corridos os vistos legais, cumpre decidir. A matéria de facto relevante, dada como provada é a seguinte: 1. A A. adquiriu por contrato de compra e venda celebrado em 6/11/90, o prédio urbano composto de uma morada de casas de rés-do-chão, primeiro e segundo andares, destinada a habitação, com logradouro, sito ... descrito na Conservatória de ... sob o nº. 82/020 876, aí inscrito a favor dos vendedores pelas inscrições G-1, G-2, G-5 e G-6, e inscrito na respectiva matriz predial, anteriormente a 7 de Agosto de 1951, sob o art. 44º, com o valor matricial de 972.000$00. 2. Por contrato escrito celebrado no dia 4 de Maio de 1953, o então proprietário do prédio, ..., arrendou-o à Direcção Geral dos Serviços Florestais e Agrícolas, para a instalação da sede da Administração Florestal. 3. Tal contrato foi feito pelo prazo de três meses, renovável por iguais e sucessivos períodos de tempo, desde que nenhum dos contraentes o quisesse dar por findo. 4. A arrendatária fez a entrega das chaves do prédio à A., no dia 24 de Agosto de 1994. 5. Desde o mês de Janeiro de 1992 que o serviço público que, até então, vinha ocupando o imóvel, tinha deixado de aí funcionar, abandonando-o e transferindo-se para um prédio sito no lugar de Valverde, freguesia de Arcos de Valdevez. 6. Nos termos da cláusula 5ª. do contrato de arrendamento referido, ao inquilino estava vedada a feitura de quaisquer obras sem prévia autorização do locador e as que fizesse ficariam na posse deste, sem que tivesse que pagar qualquer indemnização. 7. Aquando de celebração do contrato de arrendamento, o arrendado encontrava-se em bom estado de manutenção. 8. Após a entrega das chaves, a garagem do rés-do-chão estava com as paredes degradadas e o alpendre com o madeiramento apodrecido, as escadas de acesso ao primeiro andar danificadas estruturalmente, a área de comércio do rés-do-chão, com estragos no pavimento, que era em soalho, e no tecto, de madeira, designadamente, na sanca de remate. 9. O quarto de banho estava em ruína, e a cozinha destruída e irrecuperável, a sala de jantar degradada e em ruína. 10. Os três quartos estavam degradados, um deles com a pintura a óleo, que tinha no tecto, danificada. 11. A varanda estava em total ruína, a escada interior, num dos andares, estava degradada e danificada estruturalmente e os dois corredores existentes no vão do telhado estavam degradados. 12. Um dos quartos sitos no vão do telhado estava em ruína, outro estava degradado, e o terceiro também estava degradado e com a cobertura/telhado destruída pela infiltração de água, além de ter a caixilharia interior e exterior totalmente danificada. 13. As deteriorações e degradações apresentadas pelo imóvel foram surgindo, de forma progressiva ao longo do tempo, por que se prolongou o contrato de arrendamento e foram objecto de um processo de progressivo agravamento que, nos últimos dois anos, antes da entrega das chaves, levou à sua degradação total e ruína. 14. A serem realizadas obras de conservação e de reparação, aquando do aparecimento do primeiro sinal de deteriorações, levariam a que estas desaparecessem, em vez de, como sucedeu, se terem vindo a agravar, ao ponto de levar o arrendado ao estado em que se encontra, que é de degradação e ruína. 15. O arrendatário nunca efectuou quaisquer obras de conservação e reparação. 16. Para restituir o prédio ao estado de manutenção em que se encontrava no momento em que foi entregue ao arrendatário, vai ser necessário proceder à realização de múltiplas obras de construção civil e reparações que abrangem na sua quase totalidade, além de outras urgentes ao sistema eléctrico, caixilharia, louças de cozinha e casa de banho e à recuperação das pinturas a óleo existentes em diversos tectos. 17. Os locadores primitivos sempre residiram nesta vila e sempre estiveram cientes da situação de degradação do arrendado. 18. Não obstante, nunca fizeram ou mandaram fazer quaisquer obras nem permitiram ao arrendatário que as fizesse, que, de forma insistente, lhes foram pedidas. 19. Os vendedores do arrendado à A. também sabiam do seu estado de degradação, quer por diversos contactos pessoais e telefónicos, quer das chefias várias do arrendatário. 20. Já em 19 de Agosto de 1987, por ofício da, então denominada Circunscrição Florestal do Porto, respondendo a uma proposta de venda daquele, referiu que o prédio se encontrava deteriorado por falta de obras de conservação do telhado e a sua recuperação seria onerosa. 21. Além disso, pelos serviços da Comissão de Coordenação da Região do Norte, foi mandada efectuar uma avaliação ao prédio, em Outubro de 1987, de que foi dado conhecimento a uma das vendedoras, B, que servia de intermediária junto dos Serviços da Administração Florestal, na qual se referia que a construção existente valia apenas pelas paredes exteriores e mestras, que as restantes partes constituíam elementos de desvalorização, pelos encargos de demolição e remoção que acarretavam, na urgente e indispensável reconstrução que se impunha para que o edifício passasse a ser utilizado em condições normais e que apenas o rés-do-chão estava a ser efectivamente utilizado, em condições minimamente satisfatórias. 22. Em 30 de Março de 1988, através do ofício nº. 1914, a Câmara Municipal desta Vila advertiu a B da eventualidade de proceder a uma vistoria e perguntou se os proprietários estavam na disposição de vender o imóvel, no seguimento duma queixa que lhe terá sido apresentada pelo arrendatário. 23. Neste ofício, a Câmara Municipal referiu, em concreto, o facto de o prédio não receber qualquer beneficiação, há muitos anos, ao contrário do determinado pelo R.G.E.U.. 24. Em resposta, a referida B informou que os comproprietários do prédio não estavam interessados no restauro do mesmo, designadamente por ausência de possibilidades económicas para tal e por a renda paga ser muito baixa. 25. O mau estado em que o arrendado se encontrava aquando do termo do contrato ficou a dever-se ao seu envelhecimento natural e à ausência de quaisquer obras de beneficiação e reparação desde 1953. 26. Na altura da compra, a A. já era conhecedora do estado de alguma degradação do prédio e que o mesmo se devia ao facto de os vendedores não terem possibilidades económicas para proceder à sua reparação e recuperação. 27. Os serviços da ex-Administração Florestal abandonaram o arrendado por este já não oferecer as mínimas condições. 28. O encerramento e abandono do prédio, desde Janeiro de 1992 até entrega das chaves, em 24 de Agosto de 1994, fez acelerar o processo da sua degradação e contribuiu para que apresentasse em Agosto de 1994, no estado descrito nos números 7 a 12. O Direito A questão a decidir, neste domínio, tendo em atenção a função delimitadora das conclusões da alegação, resume-se a saber se o Estado é obrigado a indemnizar a Autora pelas deteriorações apresentadas pelo locado no termo do contrato e, em caso afirmativo, se é possível condená-lo já a pagar-lhe uma quantia certa, em concreto, 4.500.000$00 para reparação das mesmas. A Recorrente aceita de forma expressa que a causa real dos danos sofridos pelo imóvel até Janeiro de 1992 enraíza na não realização de obras de conservação a que a mesma estava contratualmente obrigada, sendo, por isso, da sua exclusiva responsabilidade. Em relação a eles está posta de parte tal obrigação. Mas já a partir dessa data até à cessação do contrato de arrendamento - 24 de Agosto de 1994 - segundo ela, "os danos sofridos pelo arrendado passaram a ter uma outra causa, igualmente real, já que, agora, resultam de incumprimento contratual do arrendatário, o Estado, por nesse espaço de tempo não ter feito uma prudente utilização do mesmo". O seu ressarcimento seria, por isso, da responsabilidade deste. A capa protectora desta pretensão indemnização vai a Recorrente buscá-la aos artigos 1038º, al. d), 1043º, nº. 1, e 1044º, todos do CCV. O primeiro impõe ao arrendatário a obrigação de "não fazer do prédio uma utilização imprudente", o segundo obriga-o "a manter e a restituir a coisa no estado em que a recebeu, ressalvadas as deteriorações inerentes a uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato", e o último fá-lo "responder pela perda ou deteriorações da coisa, não exceptuadas no artigo anterior, salvo se resultarem de causa que não lhe seja imputável nem a terceiro a quem tenha permitido a utilização dela". Afirma a Recorrente, em abono do seu ponto de vista, que: - o Estado "não procedeu, inequivocamente, a uma prudente utilização do locado, já que nem sequer o utilizou, antes o abandonou e encerrou!"; - "tal actuação constitui até uma falta de cumprimento do contrato por parte do arrendatário ... legalmente considerada como um dos fundamentos da resolução do contrato pelo senhorio (arts. 63º. nº. 2, e alínea h) do nº. 1, do art. 64º, ambos do RAU)"; - "essa actuação de não utilização do arrendado conforme os fins do contrato e inerente actuação de seu encerramento e abandono durante o referido período temporal, sempre teria que entender-se como uma não prudente utilização do arrendado, uma vez que, atentas as regras da experiência e que são do conhecimento comum e generalizado das pessoas, ... qualquer prédio nunca deverá estar abandonado e encerrado, e muito menos, por um tempo prolongado, já que tal situação - por inerente falta de arejamento, exposição solar, etc., - contribui para uma sua muito mais rápida degradação, com o aparecimento muito mais rápido de uma série de danos (humidades, etc.) que de outra forma demorariam muito mais tempo a aparecer ou até nem chegariam a manifestar-se (são os chamados factos notórios, que não carecem de prova nem de alegação - art. 514º, nº. 1, do CPC)". Este arrazoado, salvo o devido respeito, não procede. Desde logo, só tem olhos para uma parcela mínima da realidade factual apurada, e vota ostentivamente ao ostracismo a sua parte mais substancial. Com efeito, se é ponto assente que o encerramento e o abandono do locado fez acelerar o processo da sua degradação e contribuiu para que apresentasse, em Agosto de 1994, o estado retratado nos números 7 a 12 da matéria de facto (cfr., nº. 28), é também inegável que "o mau estado em que o arrendado se encontrava, aquando do termo do contrato, ficou a dever-se ao seu envelhecimento natural e à ausência de quaisquer obras de beneficiação e reparação, desde 1953 - cfr. nº. 25 - (sublinhado nosso). É aqui, e não nos referidos abandono e encerramento, que, segundo as instâncias, se acoita a verdadeira causa do estado de ruína pelo qual a Recorrente quer ver responsabilizado o Estado. Mas, sendo assim, a pretensão daquela esboroa-se, por si mesma, pois, nem aquele envelhecimento, nem esta ausência de quaisquer obras de beneficiação e reparação são imputáveis a este; o primeiro, porque devido à usura inexorável do tempo - cfr. ponto 13 -, e a segunda, porque a obrigação de as realizar impendia, antes da venda do prédio, sobre os ombros dos primitivos senhorios e, depois desta, sobre os da A., que. com ela, passou a ocupar o lugar deles. Isto é tanto mais evidente quanto é certo que ao Estado estava até vedada contratualmente (cláusula 5ª.) a feitura de quaisquer obras no arrendado sem prévio consentimento dos locadores (nº. 6), os quais, sublinhe-se, não obstante lhes ter sido pedida de forma insistente, a sua realização, não só fizeram ouvidos de mercador, como não permitiram que ele próprio as efectuasse (nº. 14). Se a isto acrescentarmos que a "serem realizadas essas obras, aquando do aparecimento do primeiro sinal de deteriorações, levariam a que estas desaparecessem, em vez de, como sucedeu, se terem vindo a agravar, ao ponto de levar o arrendado ao estado em que encontra, que é de degradação total e ruína (nº. 14), deixa de crepitar qualquer dúvida de que o Estado pouco ou nada tem a ver com essa situação. Dissemos "pouco", porque estamos a lembrar-nos de que no nº. 28, se consigna que o encerramento e o abandono do prédio contribuíram para o estado de degradação que este apresentava quando as chaves foram entregues. A Recorrente, como acima se antecipou, caracteriza-os como uma utilização imprudente do prédio, violadora do dever imposto ao arrendatário no art. 1038º, al. d), do CCV, do dever de manutenção e de restituição da coisa no estado em que a recebeu, capazes de o fazer responder na medida do seu contributo para o estado de ruína apresentado - arts. 1043º, nº. 1, e 1044º, nº. 1, do mesmo diploma. Mas, não lhe assiste razão. Na verdade, a leitura daqueles preceitos conduz-nos à conclusão de que o que neles se tem em vista são as deteriorações provenientes do uso imprudente do prédio, a aferir pelo julgador, em função da diligência dum bónus pater familiae, isto é, pelo comportamento que, nas circunstâncias concretas, deverá exigir-se a uma pessoa de bem, e não da sua não utilização. Ora, a nosso ver, salvo o devido respeito, o encerramento ou o abandono do prédio não constituem um uso deste, prudente ou imprudente, caracterizando-se antes como um não uso, que, ao contrário do primeiro, que, em princípio, só dá lugar ao direito de ser ressarcido dos prejuízos daí decorrentes, pode ser causa de resolução do contrato, verificado o condicionalismo legal exigido para o efeito. Mesmo que, por necessidade de raciocínio, e na linha de pensamento da Recorrente, os mesmos pudessem ser havidos como uso do prédio, ainda assim, não seria possível, sem mais, responsabilizar o Estado pelas deteriorações que este ostentava no termo do contrato. Com efeito, com o Prof. Pereira Coelho, entendemos que o arrendatário "não é responsável se as deteriorações provieram de facto seu, mas facto não culposo. Seria injusto - escreve - o agravamento excepcional da responsabilidade do locatário" - Arrendamento (ed. pol.), 1988, pág. 204. Não pode ser de outra maneira. Se a obrigação que recai sobre o arrendatário é a de fazer uma utilização prudente, é lógico que a sua responsabilidade tem que estar ligada a um comportamento imprudente, o mesmo é dizer, negligente, culposo. Porém, nada foi alegado nesta matéria. Dir-se-à, no entanto, que tal culpa se presume nos termos do art. 799º, nº. 2, do CCV, e que bastava a A. ter alegado e provado o abandono e o encerramento do arrendado. Mesmo nesta perspectiva seria, como é, de excluir, no caso, a responsabilidade do Estado. É que, como exuberantemente vem provado, os serviços da ex-Administração Florestal abandonaram o arrendado, por este, dado o estado de degradação a que chegara, por vetustez não cuidada, face à não realização, durante quatro décadas, de quaisquer obras de conservação pelos sucessivos senhorios, já não oferecer as condições mínimas (cfr. nºs. 13, 14, 18, 21, 25 e 27), sendo certo, por um lado, que era sobre eles, incluindo a Recorrente, que, repisa-se, impendia a obrigação de as assegurar, realizando essas obras. Não esquecendo, por outro lado, que o inquilino, continuou a pagar as rendas até ao termo do contrato, não obstante o mencionado abandono. Ora, a degradação por vetustez não cuidada do senhorio, relacionada com deteriorações não reparadas por este, configura, a nossa ver, um verdadeiro caso de força maior. Neste sentido, Pinto Furtado, in Manual do Arrendamento Urbano, 2ª. ed., pág. 419. Daí que o abandono do prédio e o seu contributo para a degradação ocorrida enquanto subsistiu, não possam ser assacadas a conduta imprudente do Estado. Imprudentes, olhando ao que vem provado, como proprietários do arrendado, foram todos os senhorios, sem excepção, pois, como escreveu Pires de Lima, "imprudentes ou maus pais de família são os proprietários que deixam deteriorar as coisas por uso excessivo ou imoderado, os que não usam os meios convenientes de conservação" - cfr. Usufruto, Uso e Habitação, in BMJ nº. 79, pág. 44 - sublinhado nosso. É a própria Recorrente a reconhecer que não cumpriu a obrigação de fazer as reparações necessárias para manter o prédio apto a dar satisfação ao fim para que foi arrendado. Este dever, como é óbvio, não cessou no dia em que os Serviços Florestais o abandonaram em virtude de ter deixado de reunir as condições mínimas, na medida em que o contrato vigorou por mais dois anos, continuando o Estado a pagar as rendas nele estipuladas. De tudo o exposto resulta demonstrado que o Recorrido não tem obrigação de ressarcir a Recorrente pelos estragos para o encerramento do arrendado contribuiu, não se sabe em que medida. E, sendo assim, não há que condená-lo a pagar a esta qualquer quantia, líquida ou ilíquida. O recurso carece de total fundamento, nenhum reparo merecendo a Relação por ter julgado improcedente a apelação. Termos em que, com os fundamentos expostos, negam a revista, e confirmam, consequentemente, o acórdão. Custas pela Recorrente, aqui e nas instâncias. Lisboa, 6 de Dezembro de 2001 Barata Figueira Abílio Vasconcelos Duarte Soares |