Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ00032006 | ||
Relator: | LOUREIRO PIPA | ||
Descritores: | CONTRATO DE TRABALHO HORÁRIO DE TRABALHO TEMPO PARCIAL RETRIBUIÇÃO PRINCÍPIO DA PROPORCIONALIDADE | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ199706040002624 | ||
Data do Acordão: | 06/04/1997 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 584/95 | ||
Data: | 10/02/1996 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Área Temática: | DIR TRAB - CONTRAT INDIV TRAB / REG COL TRAB. DIR PROC TRAB. | ||
Legislação Nacional: | DL 409/71 DE 1971/09/27 ARTIGO 5 ARTIGO 11 N1 N2 ARTIGO 43 N3 C. ACT CELEBRADO ENTRE A ASSOCIAÇÃO PORTUGUESA DE SEGURADORES E OUTROS E A FENSIQ IN BTE N5 DE 1986/02/05 CLAUS9. CONST89 ARTIGO 59 N1 A. CPT81 ARTIGO 30 N1 N3. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | I - O período normal de trabalho consiste na duração do trabalho que o trabalhador se compromete a prestar, no número de horas diárias, semanais ou mensais que afecta a sua actividade ao serviço da empresa, à qual competirá fazer a distribuição desse período de trabalho da forma que melhor sirva os seus interesses, fixando as horas do início e do termo do período normal do trabalho diário, bem como dos intervalos para descanso. II - Os efeitos do contrato a tempo parcial assentam em dois princípios: o da proporcionalidade e o da equiparação ou assimilação; aquele respeita aos direitos e deveres que são redutíveis em função do tempo de trabalho prestado, designadamente a retribuição, a qual deverá ser paga proporcionalmente ao tempo de trabalho combinado, de acordo com o valor hora dos contratos a tempo completo da mesma categoria. | ||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam, em conferência, na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: A demandou a Companhia de Seguros B, S.A. em acção com processo ordinário de contrato de trabalho alegando, em síntese, que trabalha por conta da Ré, mediante contrato de trabalho, desde 1979 exercendo funções de médico especialista. Está abrangido pelo A.C.T. celebrado entre a Associação Portuguesa de Seguradores e a Fensiq - Federação Nacional de Sindicatos de Quadros (B.T.E. - 1. série, n. 5 de 8 de Fevereiro de 1986), correspondendo à sua categoria profissional a letra H da tabela remuneratória. Porém a partir de 1986, tem-lhe sido pago um vencimento mensal muito inferior ao que lhe é devido por força do referido A.C.T. e suas actualizações. Reclamou, por isso, desde Janeiro de 1986 a Outubro, inclusive, de 1993 a quantia de 15036541 escudos a título de diferenças salariais, nela se incluindo ordenados mensais, prémios de antiguidade e subsídios de férias e de Natal. Pede, igualmente, juros de mora pelas diferenças salariais respeitantes aos anos de 1979 (Julho) a Dezembro de 1985, diferenças que lhe foram reconhecidas judicialmente no âmbito do processo 177/87, por decisão transitada em julgado. Tais juros ascendem à quantia de 796832 escudos, à qual acrescerá, a título de juros diferenças salariais devidas entre 1986 e 1993, a quantia de 7887193 escudos. Reclama, finalmente, que seja reconhecido como trabalhador a "tempo normal" e não a tempo parcial" - como a Ré tem feito constar dos recibos a partir de finais de 1991 - independentemente do horário praticado nas instalações da Ré. Contestou a Ré no sentido de que o Autor cumpria um horário a tempo parcial de 4 horas semanais distribuídas por dois dias da semana, tendo-lhe sido paga a retribuição correspondente a tal período de serviço e sendo certo que as tabelas constantes do A.C.T. foram fixadas em função de horários de trabalho a tempo completo. O Autor respondeu à contestação por, em seu entender, ela conter matéria de excepção. Foi proferido o despacho saneador e elaborados a especificação e o questionário, dos quais a Ré reclamou com êxito parcial, como se vê do despacho de folha 186. Efectuado o julgamento a acção foi julgada parcialmente procedente, tendo a Ré sido condenada no pagamento de diferenças salariais desde 1 de Agosto de 1987 a Novembro de 1993, nos termos a liquidar em execução de sentença, bem como nos respectivos juros a partir da citação. A Ré foi absolvida do demais pedido. Ambas as partes recorreram, tendo sido julgado procedente o recurso da Ré e improcedente o do Autor. De novo inconformado pediu o Autor a presente Revista, na qual formulou as seguintes conclusões. DO HORÁRIO DO RECORRENTE 1) As cláusulas 8. e 9. do A.C.T. Fensiq vêm definir de forma clara "horário normal de trabalho" e "período normal de trabalho", estabelecendo na parte final da 8. e no n. 3 da 9. um regime excepcional aplicável aos médicos subtraindo-os, assim, à aplicabilidade das regras gerais contidas naquelas cláusulas; 2) Esse regime excepcional resulta da especificidade própria da actividade médica e da responsabilidade e diversidade da natureza das tarefas que a integram como tão bem é explicado no n. 1 da cláusula 4. do Anexo II desse A.C.T.; 3) Ou seja, atendendo a essa excepcionalidade da actividade médica, a lei permite nos termos da já mencionada cláusula 4. que o período normal de trabalho e a duração do trabalho semanal sejam livre e arbitrariamente fixados por acordo entre a entidade patronal e o trabalhador; 4) Será a empresa e o trabalhador quem, através do contrato individual de trabalho, definirão pontualmente qual deverá ser o período norma de trabalho, que tanto poderá ser de 4 (quatro) horas semanais, como de 7 (sete) horas diárias; 5) Só fazendo uma interpretação deste tipo se poderá respeitar a excepcionalidade que a lei obriga a ter em conta na definição do horário de trabalho e período de trabalho dos médicos de outra forma não seria necessária a regra excepcional e aplicar-se-ia o regime geral; 6) Quis o legislador fugir à aplicação da regra da proporcionalidade da retribuição em função do número de horas de trabalho prestado porque o trabalho aqui em causa não é um trabalho igual, mas acrescido de responsabilidades e especificidades que o legislador quis salvaguardar; 7) Não podemos ignorar o espírito da lei e ter atenção um regra básica de interpretação das normas que é a de que o intérprete deve presumir que o legislador se expressou da melhor forma; 8) Se o intérprete não deve distinguir onde o legislador não fez distinção, também não é menos verdade que se o legislador distinguiu expressamente os médicos, aplicando-lhe um regime especial, ainda por cima justificando porque é que o fazia, então há que respeitar a sua vontade e cumpri-la. DAS DIFERENÇAS SALARIAIS: 9) Entendeu a douta sentença do tribunal "a quo" e bem, a nosso ver, que o recorrente é trabalhador da Recorrida e que essa relação laboral foi integrada num instrumento de contratação colectiva conhecido por A.C.T. - Fensiq de 1986, o qual contém normas imperativas que só podem ser afastadas por outras que expressem tratamento mais favorável ao trabalhador, pelo que a ora Recorrida tem que pagar ao trabalhador as diferenças salariais; 10) Entendemos que essas diferenças salariais devem ser pagas não só desde Agosto de 1987, tal como entendeu a douta sentença do tribunal de 1. instância, mas desde a data da entrada em vigor do A.C.T., em 1 de Janeiro de 1986 até ao momento actual; 11) E isto porque a causa de pedir ou fundamento jurídico são substancialmente diferentes na primeira acção proposta pelo recorrente em 30 de Julho de 1987 e a presente, objecto do recurso - na primeira estamos perante o C.I.T. - na segunda estamos perante a aplicação concreta de um A.C.T. e um C.I.T. pré-existente; 12) Aliás, as diferenças salariais sempre existiram porque a Recorrida nem sequer pagou ao Recorrente o valor proporcional a 4 horas por 35 horas e 30 minutos de trabalho por semana, com base numa remuneração de 170000 escudos, correspondente à letra H) da tabela salarial. ACTUALIZAÇÃO DOS SALÁRIOS: 13) Sendo o recorrente trabalhador da recorrida com contrato individual de trabalho, o que foi reconhecido por sentença confirmada e transitada em julgado, não pode ser retirado o direito à actualização anual que foi objecto desse pleito; 14) Tendo posteriormente passado a vigorar na regulamentação das relações entre esse trabalhador e a recorrida num A.C.T., da aplicação deste não pode ser reduzido o direito à mencionada actualização, já reconhecidos judicialmente; 15) Como corolário do direito a actualização anual dos salários mensais do recorrente, tem este direito a ser pago de acordo com o valor das sucessivas tabelas correspondentes à letra H) daquele C.C.T. independentemente da subscrição do Sindicato em que se encontra filiado; 16) Caso assim se não entenda, e nos anos em que não houve actualização daquela tabela, como foi o caso de 1990, o montante deve aferir-se pelo C.C.T. dos Seguros, em conformidade com a decisão da acção que transitou em julgado. DA MORA E DOS JUROS SOBRE AS DIFERENÇAS NO ÂMBITO DO A.C.T. DE 1986: 17) Nos termos do n. 2 do artigo 805 do Código Civil o devedor constitui-se em mora, independentemente da interpelação, se a obrigação tiver prazo certo; 18) O salário mensal que constitui contrapartida da prestação de trabalho é uma típica obrigação com prazo certo, a que se refere a alínea a) do n. 2 do artigo 805 do Código Civil; 19) Tratando-se de prestação pecuniária e incorrendo o devedor em mora, são devidos juros à taxa legal a partir da data da sua constituição nessa situação por força do disposto nos artigos 804 a 806 do Código Civil; 20) Não pode afastar este princípio o facto do devedor ter criado uma situação de hipotético tempo parcial, tendo sido a conduta da Recorrida que a levou à mora. DA OBRIGAÇÃO DE JUROS DAS DIFERENÇAS VERIFICADAS DE 1979 A 1985: 21) Apesar da obrigação de juros ser acessória, constitui realidade autónoma susceptível de ser objecto de um pedido, nada obstando a que possa ser feito na presente acção uma vez que resulta da violação do direito à actualização, que como tal foi definitivamente julgado na primeira acção, integrando a previsão da ressalva do n. 3 do artigo 30 do Código de Processo do Trabalho. DA EXECUÇÃO DA SENTENÇA: 22) O pedido em concreto formulado nesta acção pode ser decidido sem o recurso a execução da sentença por depender apenas de cálculos matemáticos e fornecendo os autos todos os elementos para se proceder ao cálculo dos montantes devidos; 23) O douto Acórdão ora em recurso violou, entre outros, os artigos 59 n. 1 alínea a) da Constituição da República, o artigo 1 do Decreto 49408, de 24 de Novembro de 1969, cláusula 8. parte final e 9. a 3 do A.C.T. Fensiq, bem como a cláusula 4. do Anexo II desse A.C.T., artigo 30 do Código de Processo do Trabalho e artigos 804 a 806 do Código Civil e 661 do Código de Processo Civil. A recorrida contra-alegou no sentido da plena confirmação do acórdão recorrido com a consequente negação da Revista. A Excelentíssima Procuradora Geral Adjunta elaborou o douto Parecer de folhas 436-439 - notificando-a prestar - pronunciando-se pela negação da Revista. A tal parecer respondeu a recorrente nos termos da exposição de folhas 441-443. Tiveram vista os Excelentíssimos Adjuntos. Tudo visto, cumpre decidir. A Relação deu como provada a seguinte matéria de facto: a) O Autor foi admitido em 1979 ao serviço da R. tendo para o efeito ajustado entre si e reduzido a escrito o contrato de trabalho junto a folha como documento n. 1; b) Por documento datado de 5 de Janeiro de 1979, o Autor compromete-se a prestar o seu trabalho como médico da R., nomeadamente, na observação, preenchimento dos boletins, prática de actos de pequena cirúrgia e tratamento de fracturas a sinistrados da mesma e outros actos médicos cirúrgicos em geral ou especificadamente de cirúrgia vascular; c) O Autor foi admitido com a categoria de médico especialista de cirúrgia geral ou angiológica; d) A R. fixou ao Autor horário e local de trabalho, fornecendo pessoal auxiliar, efectuando as marcações e apresentando os sinistrados à observação do Autor; e) A actividade exercida pelo Autor é de grande responsabilidade, exigindo conhecimentos técnicos especificos; f) O Autor executa, pois, serviços que a R. determina na área médica para que se encontra habilitado, sendo acompanhado por superiores hierárquicos ao serviço da mesma R.; g) O Autor está sob a disciplina, sujeito a hierarquia a contrato da R. e que lhe determina os sinistrados que pretende ver observados ou tratados pelo Autor; h) Em 1987 o Autor intentou acção contra a R. que deu entrada no Tribunal do Trabalho de Lisboa em 29 de Julho desse ano e que teve o n. 177/87 da 2. Secção - 9. juízo e redistribuído ao 1. juízo - 3. Secção; i) Nesta acção o A. pediu que fosse declarado ter direito à actualização da remuneração mensal devida pelo trabalho que contratualmente prestava à R. - com referência ao documento de folha 97; j) Em 23 de Setembro de 1989 foi proferida nessa acção sentença transitada em julgado e cujo teor consta do documento de folhas 101 a 104; l) A R. interpôs recurso dessa sentença; m) Ao qual foi negado provimento; n) Ainda inconformada interpôs o R. recurso para o S.T.J., que confirmou a decisão das instâncias por acórdão de 19/11/01 ("sic"); o) Em fins de Outubro de 1991 a Ré faz substituir nos recibos das remunerações do Autor a expressão "ordenado" por "avenças"; p) Situação que se alterou logo em Dezembro de 1991, altura em que a R. passou a inscrever no recibo as expressões salário base e diuturnidades em "tempo parcial"; q) O Autor requereu em 16 de Janeiro e 1992, por via da execução de sentença, a liquidação dessas diferenças salariais pedindo ainda juros e fazendo a aplicação da convenção colectiva de trabalho até aquele momento; r) A R. contestou tal liquidação apenas aceitando pagar as diferenças salariais singelas desde 1 de Julho de 1979 até Janeiro de 1986, invocando a inexistência de título executivo que abrangesse esse âmbito; s) Em Abril de 1991 foi proferida decisão no processo de liquidação, conforme documento de folhas 106 a 109; t) O Autor está enquadrado na letra H por ter a categoria de médico especialista; u) A R. pagou ao Autor os seguintes ordenados mensais: - de 1986 até 1991: 7020 escudos - a partir de Janeiro de 1992: 23830 escudos v) A R. obrigou-se a efectuar ao Autor uma remuneração sujeita às imposições fiscais legais, bem como subsídio de férias e de Natal ou quaisquer outras regalias sociais do C.T.T. de Seguros em vigor, bem como as obrigações dela decorrentes; x) A Ré tem exigido ao Autor o cumprimento do horário de trabalho estipulado, existindo controlo de assiduidade; y) Atendendo aos dados curriculares do Autor o R. sempre o considerou médico especialista, integrado na categoria profissional assim designada. Sempre tendo efectuado pagamento de ordenados sem qualquer referência ao regime de horário, limitando-se a escrever nos recibos a expressão "ordenado"; z) O Autor é associado do Sindicato Independente dos Médicos; aa) A partir de finais de 1991 a R. passou a designar nos mesmos recibos o Autor como médico; bb) O Autor auferia, de início, 5000 escudos por mês correspondente a 4 horas semanais, distribuídas por duas horas às terças e outras duas horas às quintas feiras, em cada semana; cc) O Autor sempre trabalhou esses períodos; dd) O S.M.E. subscreveu o A.C.T. Fensiq e respectiva tabela no ano de 1986, todavia não subscreveu o acordo salarial porque recusou fazê-lo em 1987 a recusa que manteve nos anos posteriores até hoje em dia; ee) Desde 1987 até 1993 não foi publicada qualquer actualização, nem houve qualquer alteração das tabelas referentes aos médicos; ff) No ano de 1990 a actualização média no C.T.T. dos Seguros foi de 13,05 por cento. A questão essencial em discussão no recurso é a de saber se o Autor tem direito a receber a totalidade da retribuição correspondente à sua categoria profissional no A.C.T. dos Seguros e a Fensiq (B.T.E. n. 5 de 8 de Fevereiro de 1986), independentemente de cumprir um período normal de trabalho de 4 horas por semana, quando o mesmo período para a generalidade dos trabalhadores abrangidos pelo A.C.T. em causa é de 35 horas e 30 minutos por semana. O recorrente fundamenta tal entendimento no facto daquele A.C.T. ter previsto para os médicos um regime especial, nos termos do qual o período normal de trabalho diário e semanal, bem como o respectivo horário de trabalho, seriam fixados por acordo das partes no contrato individual de trabalho, donde resultaria que fosse qual fosse o período de trabalho acordado sempre ao mesmo corresponderia a retribuição integral prevista para a sua categoria na mencionada convenção colectiva. Não podemos acompanhar a tese do recorrente - vejamos porquê. Pelo contrato de trabalho o trabalhador põe à disposição da entidade patronal a sua força de trabalho no exercício da actividade contratada. Não o faz, porém, ilimitadamente, quer no espaço, quer no tempo, pois que se obriga tão somente a efectuar a prestação num certo local e durante um certo tempo. É este último o projecto que nos interessa. Na verdade, a disponibilidade do trabalhador para com a entidade patronal está limitada a certo lapso de tempo, tem uma determinada duração, que não pode, em regra, exceder limites máximos legalmente fixados. Dentro desses limites - que ao tempo dos factos correspondiam a 8 horas diárias e 44 semanais (artigo 5 do Decreto-Lei 409/71, de 27 de Setembro) - podem as partes, por convenção colectiva ou contrato individual, estabelecer jornadas de trabalho diferentes. O período normal de trabalho consiste, pois, na duração do trabalho que o trabalhador se compromete a prestar, no número de horas diárias, semanais ou mensais que afecta a sua actividade ao serviço da empresa. A esta compete fazer a distribuição desse período de trabalho da forma que melhor sirva os seus interesses, fixando as horas do início e do termo do período normal de trabalho diário, bem como dos intervalos para descanso. A isso se chama o horário de trabalho, como resulta do artigo 11 ns. 1 e 2 do Decreto-Lei 409/71. Ora bem, o A.C.T. celebrado entre a Associação Portuguesa de Seguradores e Outras e a Fensiq - Federação dos Sindicatos de Quadros (B.T.E. n. 5 de 8 de Fevereiro de 1986) em vigor desde 13 de Fevereiro de 1986, mas desde 1 de Janeiro de 1986, quanto às tabelas salariais, dispunha na cláusula 9. que o período normal de trabalho semanal era de 35 horas e 30 minutos (n. 2) sendo o período normal de trabalho diário de 7 horas da 3. a 6. feira e de 7,30 horas à 2. feira (n. 1). Acrescentava o n. 3 que "o período normal de trabalho e a duração de trabalho semanal dos médicos, são os constantes no clausulado especifico dos médicos". Tal clausulado constava da cláusula 4. do Anexo II, nela se estabelecendo que "o período normal de trabalho e a duração do trabalho semanal são fixados por acordo entre a empresa e o trabalhador no contrato individual de trabalho (n. 1), sendo também por acordo fixado o horário do trabalho (n. 2). Foi no âmbito e no quadro deste dispositivo que A. e R. celebraram o contrato de trabalho com fotocópia a folhas 12 e 13, nos termos do qual o primeiro se obrigou a prestar à segunda a sua actividade de médico especialista, mediante a retribuição mensal de 5000 escudos para um período normal de trabalho de 4 horas por semana, sendo 2 horas prestadas à 3. feira e as outras 2 prestadas à 5. feira. Na tese do recorrente, um tal período de trabalho, porque especifico dos médicos, deveria ser remunerado pela totalidade da retribuição que naquele A.C.T. se previa para a sua categoria profissional, ou seja, pela letra H da Tabela Salarial II E), sem atender a qualquer proporcionalidade em função do período de trabalho efectivamente prestado. Ou seja, nesta lógica, entre dois médicos especialistas prestando à mesma empresa serviços iguais mas cumprindo um, por absurdo, um período de trabalho semanal de 2 horas e, outro, de 30 horas. Não haveria lugar a qualquer diferenciação remuneratória, ambos devendo receber a retribuição prevista na tabela salarial para a sua categoria profissional. É manifesta a incongruência de tal posição e a sua imoralidade e injustiça. Além da sua ilegalidade, na medida em que viola o princípio de para trabalho igual - salário igual, consagrado no artigo 59 n. 1 alínea a) da Constituição. Na verdade, a interpretação correcta a dar ao n. 3 da cláusula 9., ao remeter para clausulado especifico dos médicos a fixação do período normal de trabalho e a sua duração semanal, é a de tão só se pretender dar às partes a possibilidade de fixarem livremente aqueles períodos de trabalho de acordo com as disponibilidades de tempo dos médicos, não os amarrando às regras imperativas que em tal domínio se impunham à generalidade dos trabalhadores sujeitos aos A.C.T. em questão. Tal interpretação vai, aliás, na linha dos termos do contrato celebrado entre as partes, no qual se refere expressamente que o Autor poderá prestar serviços a outras empresas, bem como exercer qualquer função pública, desde que não houvesse prejuízo na assistência a prestar à Ré nos termos acordados - o que tem implícita a ideia da eventualidade do pluriemprego por parte do Autor. O clausulado específico para os médicos traduz, afinal, a possibilidade de celebrarem as partes contratos a tempo parcial, os quais estão previstos no artigo 43 do Decreto-Lei 409/71. No n. 3 deste artigo estabelece-se que a retribuição "não poderá ser inferior à fracção da retribuição do trabalho a tempo completo correspondente ao período de trabalho ajustado". Os efeitos do contrato a tempo parcial assentam em dois princípios: o da proporcionalidade e o da equiparação ou assimilação. O primeiro - que é o que agora nos interessa - respeita àqueles direitos e deveres que são redutíveis em função do tempo de trabalho prestado, designadamente, a retribuição, a qual deverá ser paga, segundo o citado n. 3 do artigo 43 do Decreto-Lei 409/71, proporcionalmente ao tempo de trabalho combinado, de acordo com o valor hora dos contratos a tempo completo da mesma categoria. É este, a nosso ver, o critério correcto a ter em conta no caso dos autos, sendo evidente que a grelha salarial prevista no Anexo II para os médicos pressupõe um período normal de trabalho a tempo completo nos termos previstos para a generalidade dos trabalhadores abrangidos pelo A.C.T. em causa. Não tem, assim direito o Autor a quaisquer diferenças salariais a partir de 1986 bem como - como é evidente - aos respectivos juros de mora, deste modo improcedendo os ns. 1 a 12 e 17 a 20 das conclusões. Pede também o Autor a actualização salarial a partir de 1987, mas a verdade é que se provou que a partir daquele ano não foi publicada qualquer actualização, nem houve qualquer alteração das tabelas referentes aos médicos no âmbito do A.C.T. de 1986 - provando-se, também, que o Sindicato Independente dos Médicos, do qual o Autor era associado, não subscreveu qualquer acordo salarial a partir de 1987. Não tem o recorrente direito, por isso, a qualquer actualização, como bem se decidiu no acórdão recorrido, improcedendo os ns. 13 a 16 das conclusões. Pretende também o recorrente que a Ré, ora recorrida, seja condenada no pagamento de juros de mora com relação a diferenças salariais a que havia sido condenada na acção que o Autor contra ela intentou em 1987, diferenças essas respeitantes aos anos de 1979 a 1985. Tais juros não foram pedidos naquela acção, devendo, tê-lo sido por força do disposto no n. 1 do artigo 30 n. 1 do Código de Processo do Trabalho, não integrando o caso dos autos a previsão do n. 3 da referida disposição legal. De qualquer forma, foi decidido, com trânsito em julgado, que não havia lugar a condenação em juros pelas diferenças salariais em causa por não constarem as mesmas do título executivo. O que significa que está tal decisão coberta pelo caso julgado, não podendo ser, por isso, sujeita a nova agravação judicial. Improcedem, assim, os ns. 21 a 23 das conclusões, os dois últimos respeitantes à questão da eventual desnecessidade da condenação em execução da sentença, sem sentido face ao resultado do recurso. Nestes termos. Acorda-se nesta Secção em negar a Revista, confirmando-se a decisão recorrida. Custas legais a cargo do recorrente. Lisboa, 4 de Junho de 1997 Loureiro Pipa, Almeida Deveza, Manuel Pereira. Decisões impugnadas: I - Sentença de 3 de Abril de 1995 do Tribunal do Trabalho de Lisboa, 2. Juízo, 2. Secção; II - Acórdão de 2 de Outubro de 1996 da Relação de Lisboa. |