Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
07S1698
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: BRAVO SERRA
Descritores: CADUCIDADE DO PROCEDIMENTO DISCIPLINAR
PRAZO
Nº do Documento: SJ200709120016984
Data do Acordão: 09/12/2007
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Decisão: NEGADA A REVISTA.
Sumário : I - O prazo de caducidade do procedimento disciplinar contemplado no art. 31.º, n.º 1 da LCT inicia-se com o efectivo conhecimento, por banda do empregador, dos factos que podem ser considerados como infracção disciplinar, cessando com a instauração de processo de inquérito ou de averiguações, nos casos em que haja, legalmente, possibilidade de lançar mão destes meios de apuramento, ou com a instauração de processo disciplinar, se este for iniciado imediatamente, como é o caso de haver verificação directa de infracções por parte do agente trabalhador.
II - Se o conhecimento objectivado da prática das infracções disciplinares por parte do trabalhador apenas adveio ao Conselho de Administração do empregador com o relatório de uma auditoria, não pode afirmar-se que tal conhecimento já ocorrera em antecedente reunião daquele Conselho, em que foram dadas pelos responsáveis da auditoria, então em curso, informações não concretizadas que permitiam apenas um conhecimento genérico, dotado ainda de vacuidade e não claramente definido, sobre rupturas de tesouraria, deficiências organizacionais e irregularidades na utilização das verbas postas à disposição do empregador.
Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça:

I

1. Pelo 2º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa instaurou AA contra Empresa-A – Centro de Formação Profissional da Indústria da Construção Civil e Obras Públicas do Sul, acção de processo comum emergente de contrato individual de trabalho, solicitando que fosse declarada a ilicitude do despedimento do autor e a condenação do réu a pagar-lhe a quantia equivalente às retribuições que aquele deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da proferenda sentença e a indemnização correspondente a um mês de retribuição base por cada ano de antiguidade ou fracção.

Alegou, em síntese, que desde 1984 exerceu as funções de director do réu e, tendo-lhe sido instaurado processo disciplinar visando o seu despedimento, nele foram ouvidas testemunhas sem que, para tanto, fosse notificado ou ouvido o advogado do autor, sendo que o despedimento de que foi alvo deve ser entendido como ilícito, já que foram incorrectamente imputados factos à autoria do autor e a deliberação de despedimento foi tomada pelo Conselho de Administração do réu e não proposta pelos outorgantes do protocolo que o instituiu.

Tendo, por sentença proferida naquele Juízo, sido a acção julgada improcedente, com a consequente absolvição do réu dos pedidos contra ele formulados, arguiu o autor nulidade daquela peça processual – consistente em não ter sido apreciada a questão da caducidade do procedimento disciplinar – e apelou da mesma.

O Juiz da 1ª instância, reconhecendo a arguida nulidade, supriu esta, vindo a julgar improcedente a excepção de caducidade do procedimento disciplinar.

Do decidido quanto à improcedência da excepção veio também o autor a interpor recurso de apelação.

Tendo o Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 24 de Janeiro de 2007, julgado improcedentes as apelações, pediu o autor revista para este Supremo Tribunal.

2. Na alegação adrede produzida, o recorrente formulou as seguintes «conclusões»: –

1º O presente recurso está circunscrito à questão da caducidade do exercício da acção disciplinar pelo recorrido contra o recorrente.
2º Trata-se apenas de analisar a questão de fundo respeitante ao exercício da acção disciplinar na óptica da sua caducidade, já que as questões processuais da tempestividade da sua arguição estão definitivamente julgadas pelas instâncias no sentido da sua aceitação e admissibilidade processuais.
3º O Empresa-A , ora recorrido, já durante o ano de 1991 dirigiu ao recorrente o questionário de fls. 178/180, evidenciando já nessa data fundadas dúvidas sobre a licitude dos comportamentos do recorrente no conspecto do cumprimento do contrato de trabalho.
4º Em acta de 15/01/1992 (fls. 174 e 175 dos autos) do Conselho de Administração do recorrido mostra-se que o recorrido identificou graves anomalias que vinham a verificar-se no funcionamento do Empresa-A , e muito especialmente as rupturas de tesouraria ocorridas, com detecções de graves irregularidades.
5º E que em consequência da tomada de conhecimento dessas graves irregularidades, o Presidente do Conselho de Administração do Empresa-A propôs a exoneração do Director (ora recorrente) mediante prévio pronunciamento do Conselho de Administração junto dos outorgantes do Empresa-A .
6º O Conselho de Administração deliberou, porém, obter um prévio parecer jurídico sobre o assunto, apesar de na data da acta (15.01.1992) ter tomado conhecimento dos factos que invocou no processo disciplinar instaurado em 18/05/1992 contra o recorrente, e na contestação da presente acção, como fundamento do despedimento operado.
7º Este comportamento do Empresa-A ofende frontalmente a norma do DL 49408 de 14/11/9 então em vigor, segundo o qual o procedimento disciplinar deve exercer-se nos sessenta dias subsequentes àquele em que a entidade patronal teve conhecimento da infracção e da respectiva imputação ao agente (o aqui recorrente).
8º Fazer deslizar ou dilatar o início do prazo para desencadear o procedimento disciplinar para momento ulterior ao da emissão de um parecer jurídico e ou do encerramento de inquérito com produção de um relatório final, constitui uma mistificação e manipulação dos prazos para o exercício da acção disciplinar.
9º O exercício da acção disciplinar do recorrido contra o recorrente estava [à] data de 18/05/92 ferido de caducidade.
10º O que vale dizer que o processo disciplinar não foi instaurado. E assim sendo,
11º o recorrente não poderia ter sido despedido.
TERMOS EM QUE DEVE SER DADO PROVIMENTO À PRESENTE REVISTA, COM A LEGAL CONSEQUÊNCIA DE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE E PROVADA, E POR VIA DELA, O DESPEDIMENTO COM JUSTA CAUSA DELIBERADO PELO RECORRIDO, SER DECLARADO ILÍCITO E O R. CONDENADO NO PAGAMENTO DA QUANTIA EQUIVALENTE AO VALOR DAS RETRIBUIÇÕES QUE O A. DEIXOU DE AUFERIR DESDE A DATA DO DESPEDIMENTO ATÉ À DATA DO ACÓRDÃO PROFERENDO, E AINDA EM INDEMNIZAÇÃO CORRESPONDENTE A UM MÊS DE REMUNERAÇÃO DE BASE PARA CADA ANO DE ANTIGUIDADE OU FRACÇÃO, NOS TERMOS DO DISPOSTO NO ARTIGO 13º DO DL 64-A/89 DE 26-02-89 EM VIGOR À DATA DOS FACTOS E DA PROPOSITURA DA ACÇÃO, TUDO A LIQUIDAR EM EXECUÇÃO DE SENTENÇA, COM CUSTAS E PROCURADORIA, NAS TRÊS INSTÂNCIAS, A CARGO DO RECORRIDO.

O recorrido respondeu à alegação propugnando por dever ser negado provimento ao recurso.

O Ex.mo Representante do Ministério Público junto deste Supremo exarou «parecer» no sentido de se não conceder a revista.

A esse «parecer» respondeu o autor, continuando a defender o seu ponto de vista já explanado na alegação da revista.

Corridos os vistos, cumpre decidir.
II
1. Com bem resulta das extractadas «conclusões» da alegação produzida pelo recorrente, a única questão aqui a decidir consiste em saber se se deve, ou não, considerar extinto, por caducidade, o exercício do direito de acção disciplinar prosseguido pelo recorrido relativamente ao recorrente.

2. Não se colocando qualquer circunstancialismo subsumível ao que se encontra prescrito no nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil, haverá este Supremo Tribunal de aceitar o seguinte quadro fáctico tido por provado pelas instâncias: –

– a) O autor exerceu funções de director do réu desde 1984, embora só em 1988 haja sido nomeado oficialmente para o cargo;
– b) Por ofício nº 5733, de 18 de Maio de 1992, dirigido pelo réu ao autor e por este recebido em 25 daqueles mês e ano, foi comunicada a este último a intenção do primeiro proceder ao despedimento imediato com justa causa pelos fundamentos constantes da Nota de Culpa a ele anexada;
– c) No mesmo ofício, o réu comunicou a suspensão preventiva do autor relativamente à sua actividade como director;
– d) O autor apresentou contestação, arrolou testemunhas e juntou documentos;
– e) O instrutor do processo disciplinar, após inquirição das testemunhas sem a presença do advogado constituído pelo autor para esse processo, advogado esse que não foi notificado para a inquirição, após a análise da contestação, emitiu o Relatório Final, cujos termos aqui se dão por reproduzidos, no qual se conclui que a actuação do autor preenchia os requisitos das alíneas d), e) e f) do número 2 do artigo 9° do [Regime Jurídico aprovado pelo] Decreto-Lei nº 64-A/89 de 27 de Fevereiro, o que era sancionado com o despedimento com justa causa;
– f) Em reunião extraordinária documentada na Acta nº 24/92, de 8 de Outubro, o Conselho de Administração do réu, com a presença de quatro administradores deste – BB, CC, DD e EE – reanalisou aquele Relatório Final e decidiu despedir com justa causa o autor;
– g) Deliberou ainda submeter ao Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional a homologação daquela decisão;
– h) Por despacho de 19 de Outubro de 1992, proferido pelo Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, foi o autor exonerado do cargo de director do réu;
– i) Nesse despacho não é consignado se o despedimento do réu foi efectuado com ou sem justa causa;
– j) Pelo ofício nº 10898, de 28 de Outubro de 1992, expedido pelo réu, foi comunicado ao autor que foi proferida sanção de despedimento com justa causa no processo disciplinar instaurado;
– k) O autor auferia, à data do despedimento, a remuneração mensal ilíquida de Esc. 684.081$00;
– l) Eram funções do autor:
– Organizar os serviços do réu;
– Propor ao Conselho de Administração a exoneração de pessoal;
- Manter o Conselho de Administração regularmente informado sobre o ritmo de execução do plano de actividades e da situação financeira do réu, bem como dos eventuais desvios às previsões e objectivos daquele plano;
– Propor ao Conselho de Administração todas as iniciativas que entendesse úteis para o bom funcionamento e desenvolvimento do réu, ainda que não [constassem] do plano de actividades;
– Responder e responsabilizar-se perante o Conselho de Administração pela correcta utilização das verbas à disposição do réu;
– m) Tendo sido ordenada, pelo Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, uma auditoria aos serviços do réu, dela resultou que: –
– 1) Por determinação do Conselho de Administração, todas as aquisições de bens e equipamentos e obras deveriam ser formalmente aprovadas pelo Conselho de Administração;
– 2) Por princípio, todas as adjudicações de equipamentos e obras deveriam ser feitas após consulta, pelos serviços competentes, de, pelo menos, três fornecedores;
– 3) O Conselho de Administração recomendou por diversas vezes ao autor o cumprimento dos princípios consignados no Decreto-Lei nº 211/79, de 12 de Julho de 1979, a partir do momento em que ficou claro que os Centros Protocolares estavam sujeitos à fiscalização do Tribunal de Contas;
– 4) Foi definida a regra de que as aquisições de bens e serviços correntes deveriam iniciar-se com a requisição interna dos serviços utilizadores finais;
– 5) As requisições externas deveriam ser feitas pelo sector de compras, seja a solicitação do armazém, seja a solicitação dos utilizadores finais, quando os bens não fossem geridos em sistema de stock;
– 6) No início de cada ano, deveria proceder-se à consulta de diversas entidades fornecedoras de materiais de consumo;
– 7) Existiam orientações no sentido da obrigatoriedade de consulta de três fornecedores de cada produto;
– 8) O armazém deveria proceder à recepção de todos os bens, mesmos os que não constituíam stock;
– n) O autor, que tinha a obrigação de organizar os serviços do réu, jamais elaborou normas internas que correspondessem às orientações do Conselho de Administração no tocante ao que se encontra legalmente consignado sobre a aquisição de bens e serviços nos organismos públicos;
– o) O autor não organizou normas internas sobre: –
– Condições em que pudessem ser realizados ajustes directos ou compras a dinheiro;
– Condições em que seriam obrigatórios concursos para a aquisição de bens e serviços;
– Quem deveria seleccionar os fornecedores a consultar;
– Quem deveria elaborar pareceres técnicos sobre os bens e serviços a adquirir;
– Condições de recepção das propostas de fornecimento desses bens e serviços;
– Prazos de respostas;
– Condições e informações obrigatórias sobre os fornecedores;
– p) Essas normas internas eram absolutamente necessárias ao bom funcionamento do réu;
– q) Não existe no réu a definição ou a organização das aquisições de bens e serviços, em processos de aquisição, das quais constem elementos de informação obrigatórios, nomeadamente:
– Numeração sequencial anual de controlo;
– Especificações ou requisições dos produtos ou serviços adquiridos;
– Consultas e propostas dos fornecedores;
– Fotocópias das segundas vias das facturas ou guias de remessa da qual [constem] a recepção dos bens e serviços;
– Requisições externas (notas de encomenda);
– r) Tais elementos revelam-se necessários à boa e transparente administração do réu e à análise da aplicação dos fundos públicos postos à sua disposição;
– s) O autor não organizou, nos serviços do réu, informação sobre os fornecedores, nomeadamente tabelas de preços, descontos, condições de pagamento, situação perante a segurança social, sendo que tudo isso é igualmente necessário ao bom funcionamento dos serviços do mesmo réu;
– t) O autor permitiu que uma parte da retribuição paga aos trabalhadores do réu não fosse objecto de descontos para a Segurança Social e de retenção de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares;
– u) Da mesma forma que permitiu pagamentos a entidades fornecedoras, ou alegadamente fornecedoras, de bens e serviços ao réu de valores superiores a trezentos mil escudos, sem que lhes fosse exigida certidão comprovativa da sua situação perante a Segurança Social, como foi o caso de: –
– FF;
Companhia Portuguesa Empresa-B;
Empresa-C – Equipamentos, Ferramentas e Materiais de Construção, Lda;
Empresa-D – Soluções e Equipamentos Informáticos, Lda;
Empresa-E – Comércio de Importação, Exportação e Distribuição de Produtos e Serviços, Lda;
Empresa-F – Projectos e Montagens Eléctricas e de Instrumentos, Lda;
Empresa-G, (Indústrias Metalomecânicas);
Empresa-H, (Materiais de Construção);
Empresa-I, (Materiais de Construção);
Empresa-J, (Sociedade de Venda de Materiais de Construção);
Restaurante ..., de GG;
– HH;
– v) Em consequência de não ter implementado as medidas adequadas nos serviços do réu, o autor permitiu que não fossem consultados fornecedores de bens e serviços, nomeadamente: –
– 1) Para alugueres de equipamento informático, estudos e projectos informáticos, desenvolvimento de projectos informáticos, compra de equipamentos e materiais informáticos e compra de outros equipamentos, à Empresa-K, SA, nos valores de: –
– em 1987, Esc. 9.412.610$00;
– em 1988, Esc. 38.998.748$00;
– em 1989, Esc. 24.565.437$00;
– em 1990, Esc. 17.717.176$00;
– em 1991, e até Novembro, Esc. 10.237.309$00, tudo num total de Esc. 100.931.280$00;
– 2) Aquisição de máquinas e equipamentos de construção civil usados à sociedade Empresa-L, Lda, e ainda a respectiva reparação de algum desse material, pelos valores seguintes: –
– em 1987, Esc. 31.184.744$00;
– em 1988, Esc. 107.115.682$00;
– em 1989, Esc. 12.040.899$00, tudo num total de Esc. 150.341.325$00;
– w) Essas aquisições, nunca cabalmente explicadas, dado o seu elevado valor, careciam de ser e não foram objecto de consulta à concorrência, já que, nomeadamente, o equipamento adquirido à sociedade Empresa-L, Lda, tinha uma média de idade de construção da ordem dos quinze anos e com o prazo de vida útil há muito ultrapassado;
– x) Algum desse material nunca chegou a ser utilizado, nem sequer montado, embora tenha custado cerca de 20.000 contos – como é o caso da grua automotante, marca Potain, modelo 246-B, – e outro foi objecto de grandes reparações, pelo facto de serem máquinas e equipamentos obsoletos com o período de vida útil há muito ultrapassado;
– y) O autor, pesem embora as recomendações do Conselho de Administração, nunca deu cumprimento ou deu instruções para que fosse dado cumprimento às normas impostas pelo Decreto-Lei nº 211/79, de 12 de Julho;
– z) Face à ausência de normas de aquisição e utilização de materiais e bens de consumo, o autor permitiu que fossem adquiridos bens no mercado sem que os mesmos tivessem sido requisitados pelo sector de compras e, da mesma forma, que bens e serviços fossem utilizados internamente sem requisição interna, bens e serviços esses no valor de centenas de milhares de contos;
– aa) Dada a ausência de normas de aquisição de equipamentos e materiais, resultaram «aquisições fraudulentas» por elementos réu, no valor de milhares de contos;
– bb) Porque o autor não procedeu ao controlo das propostas de aquisição de bens e produtos, permitiu que elementos do réu procedessem a consultas de aquisição de bens em pequenas quantidades – que, assim se tornavam mais caros –, em vez de consultas para a aquisição de bens nas quantidades que, previsivelmente, iriam ser adquiridas no decurso do ano;
– cc) Vindo ainda a circunstância de ausência de normas sobre a aquisição de equipamentos e materiais permitir «aquisições fraudulentas» no valor de muitos milhares de contos;
– dd) As aquisições de materiais que se revelaram «fraudulentas» nunca foram objecto de consultas de preços ao mercado;
– ee) Nenhum dos fornecedores envolvidos em «aquisições fraudulentas» referidos no item 47º da Nota de Culpa foi objecto de consulta prévia para fornecimento de bens e serviços;
– ff) Da falta de controlo que o autor permitiu resultou que os bens fornecidos eram recebidos no armazém, não constando depois onde eram utilizados, assim permitindo o seu descaminho em valores muito elevados, que não foi possível quantificar por falta de organização dos serviços do réu;
– gg) Perante a ausência de controlo dos serviços, o autor permitiu que o responsável pelo Departamento Administrativo e Financeiro, II, no qual, nem o Conselho de Administração, nem o autor, delegaram poderes para a aquisição de bens não duradouros e serviços, tenha cometido «fraudes» no valor de muitas dezenas de milhares de contos, através de pretensas aquisições de bens e serviços, a saber: –
– 1) «Desvio» do cheque nº 7299504 do B.P.A., no valor de Esc. 1.101.689$00, passado em nome de FF;
– 2) «Desvio» do cheque nº 21188809 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 2.241.486$00, passado em nome de JJ;
– 3) «Desvio» do cheque nº 21188810 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 2.947.148$00, passado em nome de KK;
– 4) «Desvio» do cheque nº 21188845 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.695.276$00, passado em nome de LL;
– 5) «Desvio» do cheque nº 21188864 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 807.955$00, passado em nome de MM;
– 6) «Desvio» do cheque nº 21188856 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.321.211$00, passado em nome de NN;
– 7) «Desvio» do cheque nº 21188888 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.322.211$00, passado em nome de NN;
– 8) «Desvio» do cheque nº 21188889 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.322.071$00, passado em nome de NN;
– 9) «Desvio» do cheque nº 21188963 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.738.386$00, passado em nome de NN;
– 10) «Desvio» do cheque nº 21188897 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 2.028.934$00, passado em nome de OO;
– 11) «Desvio» do cheque nº 21188929 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 667.554$00, passado em nome de NN;
– 12) «Desvio» do cheque nº 21188945 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 3.252.951$00, passado em nome de NN;
– 13) «Desvio» do cheque nº 21188953 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.915.641$00, passado em nome de PP;
– 14) «Desvio» do cheque nº 21188969 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 5.301.036$00, passado em nome de NN;
– 15) «Desvio» do cheque nº 20046602 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.931.208$00, passado em nome de Empresa-E;
– 16) «Desvio» do cheque nº 20046601 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 2.121.823$00, passado em nome de Empresa-E;
– 17) «Desvio» do cheque nº 21188924 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.894.347$00, passado a favor de QQ;
– 18) «Desvio» do cheque nº 21188954 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.259.918$00, passado a favor de RR;
– 19) «Desvio» do cheque nº 21188972 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.011.044$00, passado a favor de Empresa-M, Ldª;
– 20) «Desvio» do cheque nº 20046603 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.913.916$00, passado a favor de Empresa-M, Ldª;
– 21) «Desvio» do cheque nº 20046606 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.238.691$00, passado a favor de Empresa-M, Ldª;
– 22) «Desvio» do cheque nº 5577469 do Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 1.384.578$00, passado a favor de Empresa-M, Ldª;
– 23) «Desvio» do cheque nº 21188962 do C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 3.6419769$00, passado a favor de SS;
– 24) «Desvio» do cheque nº 5577404, sobre o Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 2.233.461$00, passado a favor de KK;
– 25) «Desvio» do cheque nº 20046604, sobre o C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.564.394$00, passado a favor de KK;
– 26) «Desvio» do cheque nº 20046605, sobre o C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.861.566$00, passado a favor de KK;
– 27) «Desvio» do cheque nº 20046607, sobre o C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.861.833$00, passado a favor de KK;
– 28) «Desvio» do cheque nº 20046608, sobre o C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.928.634$00, passado a favor de KK;
– 29) «Desvio» do cheque nº 5577450, sobre o Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 1.084.787$00, passado a favor de KK;
– 30) «Desvio» do cheque nº 20046609, sobre o C.F.P./C.L.P., no valor de Esc. 1.862.055$00, passado a favor de TT;
– 31) «Desvio» do cheque n 5577475, sobre o Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 1.259.330$00, passado a favor de TT;
– 32) «Desvio» do cheque nº 5577476, do Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 2.092.689$00, passado a favor de TT;
– 33) «Desvio» do cheque nº 3437360, do Banco Português do Atlântico, no valor de Esc. 110.426$00, passado a favor de UU;
– 34) «Desvio» do cheque nº 3437391, do Banco Português do Atlântico, no valor de Esc. 759.986$00, passado a favor de UU;
– 35) «Desvio» do cheque nº 5577495, do Banco Fonsecas e Burnay, no valor de Esc. 1.346.851$00, passado a favor de UU;
– 36) «Desvio» do cheque nº 20046611, sobre o Crédit Lyonnais, no valor de Esc. 2.638.182$00, passado a favor de UU;
– 37) «Desvio» do cheque nº 6264149, do Crédit Lyonnais, no valor de Esc. 350.250$00, passado a favor de VV;
– hh) Os cheques acima discriminados, nuns casos, foram levantados por empregados do réu, que entregaram o respectivo produto a XX, responsável do Departamento Administrativo e Financeiro, noutros, depositados directamente na conta pessoal do referido II e, noutros, pagos a pessoas desconhecidas, conforme informação colhida junto dos Bancos sacados;
– ii) Resulta da auditoria supra referida em 13, sem tomar em conta os mais que duvidosos fornecimentos de bens e serviços alegadamente fornecidos por Empresa-K, SA (mais de cem mil contos) e por Empresa-L (mais de cento e cinquenta mil contos), cujos fornecimentos não puderam ser devidamente averiguados por escusa de prestação de informações e por informações deficientes, que os prejuízos apurados decorrentes de «fraudes» e «desvio de fundos» levados a efeito por elementos dos serviços do réu, e de fundos deste, somam Esc. 65.494.742$00;
– jj) As «fraudes» cometidas só foram possíveis pela falta de organização dos serviços dependentes do autor e porque este não implementou um conjunto mínimo de normas de funcionamento que impediriam que as mesmas tivesse ocorrido e, por outro lado, porque não cumpriu, nem fez cumprir, a legislação de carácter imperativo, como seja a obrigatoriedade de exigir, aos pretensos fornecedores, comprovativo de terem a situação contributiva com a Segurança Social regularizada;
– kk) Os cheques constantes das alíneas L1) e Ni) [da matéria considerada assente] foram emitidos a favor de sacadores «fictícios» e «falsificados» os respectivos endossos, neles se apondo, por outrem, os nomes dos sacadores;
– ll) […] [O Tribunal a quo deu, neste ponto (?) como matéria de facto provada que o autor, até pelas funções desempenhadas, estava obrigado a cumprir as normas decorrentes do contrato de trabalho e a legislação em geral];
– mm) O réu é ainda suportado economicamente com fundos públicos, que lhe são entregues através do Instituto de Emprego e Formação Profissional, com vista a formação profissional de jovens operários e técnicos de construção civil e obras públicas;
– nn) Em 9 de Novembro de 1988, o Conselho de Administração deliberou “(...) criar uma conta bancária da responsabilidade do Director, cujo movimento será assegurado por duas assinaturas, uma do Director ou do Adjunto e outra do Chefe de Contabilidade ou da Secretaria. Tal conta destina-se a pagamento de despesas de funcionamento até ao limite máximo de Esc. 500.000$00 por acto, com excepção dos pagamentos referentes a impostos, contribuições, fornecimentos de água e luz e outras análogas, para as quais não se estabelece qualquer limitação (...)”;
– oo) O réu recebia por duodécimos;
– pp) O relatório final e confidencial da auditoria referida em 13) foi concluído em 8 de Abril de 1992, nele se fazendo um «levantamento» definitivo e global das diversas irregularidades detectadas na actividade e funcionamento do réu, designadamente as que vieram a ser imputadas ao autor em sede de processo disciplinar;
– qq) Nesse relatório pode ler-se, em dados passos: –
Em 17/10/91, foi realizada pelos auditores uma 1.ª reunião formal com os antigos e actuais elementos do CA do Empresa-A a fim de fazer o ponto de situação dos trabalhos realizados.
Em 17/12/91 foi feita uma 2.ª reunião de ponto de situação com o Conselho de Administração do Empresa-A . Nesta reunião foi referido pelos auditores que um dos elementos-chave de prova das fraudes até então detectadas, a identificação das pessoas ou entidades que procederem ao levantamento efectivo dos cheques ainda não tinha sido obtido.
Muito embora esperemos receber mais informação dos fornecedores e bancos e, em consequência, encetar novas diligências eventualmente necessárias, consideramos que este relatório constitui a nossa posição final sobre as graves irregularidades reportadas. A recepção de novos elementos de informação críticos ou duvidosos poderá obrigar a novas diligências e investigações. Caso se justifique, este relatório poderá ser complementado no futuro com novos desenvolvimentos.
Esperamos elaborar uma INFORMAÇÃO FINAL a quando da conclusão definitiva dos trabalhos";
– rr) Com data de 4 de Maio de 1992, a fls. 1 desse mesmo relatório final e confidencial, o Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional exarou despacho por via do qual ordenou “ao Presidente do CA para proceder à instauração de procedimento disciplinar aos funcionários autores dos ilícitos disciplinares constantes do relatório, tomando as providências cautelares adequadas”;
– ss) Na acta da reunião do Conselho de Administração do réu, realizada em 15 de Janeiro de 1992, pode ler-se o seguinte: –
“(...) A reunião desenvolveu-se na continuação da outra reunião conjunta com a Comissão de Fiscalização, onde também esteve presente o Sr. Magalhães da Silva, actual responsável pelo Departamento de Gestão Financeira e de Controle do Centro.
Destinou-se a apreciar os aspectos debatidos nessa reunião anterior, relacionados com a actual situação do Empresa-A , quer no que se refere às diversas anomalias que se têm verificado no seu funcionamento, nomeadamente rupturas de tesouraria graves e deficiências organizacionais, quer irregularidades detectadas pela auditoria que está a decorrer e já divulgadas ao Conselho de Administração.
A justificação desta reunião extraordinária foi evidenciada pelo Sr. Presidente como uma necessidade de todos os membros do Conselho de Administração reflectirem sobre as questões atrás apontadas, com vista à tomada de medidas eficazes para a estabilização do Empresa-A e evitar a degradação dos seus objectivos no futuro.
Foram debatidas as questões focadas na reunião anterior e considerou-se que as mesmas estão já a afectar muito negativamente o funcionamento do Centro e que, por isso, urge melhorar de imediato a sua Gestão Operacional.
Neste contexto o representante da AICE apresentou a seguinte proposta:
1. Considerando que nos últimos tempos se têm verificado no Empresa-A sucessivas situações de ruptura de tesouraria, com graves prejuízos para o eficaz funcionamento do Centro.
2. Considerando que o relatório da auditoria levada a cabo por determinação do IEFP indica a existência de graves irregularidades na utilização das verbas postas à disposição do Centro.
3. Considerando, finalmente, que é ao Director do Centro que, nos termos do Protocolo – Capítulo I – Cláusula XI n.º 2, alíneas a) e i), cabe a organização de Serviços, sendo ainda responsável pela correcta utilização das verbas.
PROPONHO O SEGUINTE:
A) Que o Conselho de Administração se pronuncie junto dos outorgantes no sentido da exoneração imediata do Director, solicitando que seja esclarecido qual a Entidade que detém o poder disciplinar sobre o titular daquele órgão.
B) Que o Conselho de Administração dê formalmente conhecimento aos outorgantes dos resultados já apurados na auditoria realizada, a fim de que possam ser desencadeados os procedimentos legais adequados.
C) Que seja revogada a delegação de competências conferida ao Director (constante da acta n.º 2/88).
Os restantes membros do Conselho de Administração ponderaram sobre a referida proposta, sendo decidido reanalisá-la numa próxima reunião, após obtenção de parecer jurídico, a fim de ser tomada uma posição final, devidamente ponderada, no âmbito das suas competências".

2. No que concerne ao problema de saber se teria, ou não ocorrido a caducidade do direito de exercício da acção disciplinar, o aresto em sindicância discreteou assim: –
“(…)
O art. 31º da LCT estabelece o prazo de 60 dias para que o processo disciplinar seja desencadeado, contando-se tal prazo a partir do conhecimento da infracção pela entidade patronal ou superior hierárquico com competência disciplinar.
E o processo disciplinar inicia-se com a manifestação clara e objectiva de instauração do processo disciplinar contra o trabalhador, não com a elaboração ou recebimento da nota de culpa. Como decidiu já o STJ no seu Acórdão de 10/4/91 (BMJ-406, pag. 442), que ‘O prazo de caducidade do procedimento disciplinar é, efectivamente, de 60 dias, mas inicia-se a partir do conhecimento da infracção, pela entidade patronal, ou por quem detenha o poder disciplinar, e cessa a partir do momento da instauração do respectivo processo de averiguações, quando estas tenham lugar, ou a instauração do processo disciplinar quando este seja imediatamente instaurado, independentemente de averiguações (no caso de verificação directa da infracção, por exemplo).’
Incumbia ao autor a prova da ultrapassagem de tal prazo de caducidade, nos termos do art. 342º-1 do CC, pois que de fundamento da presente acção se trata e não defesa por excepção.
Neste particular não podemos deixar de acompanhar as considerações feitas em 1ª instância pelo Mmº Juiz autor da sentença recorrida.
De facto, o teor da Acta do CA da ré de 15/1/1992 (facto nº 45) apenas permite concluir que, naquela altura, havia já notícia genérica de rupturas de tesouraria e irregularidades na utilização das verbas disponibilizadas à ré. Não resulta assim inequívoco, ou mesmo seguro, que a ré, já nessa altura estivesse na posse e conhecimento da factualidade concreta que veio a imputar ao autor no processo disciplinar.
Mais resulta dos factos provados nºs 13, 42, 43 e 44 que é a partir de 8/4/1992 que a ré toma efectivo e amplo conhecimento das irregularidades ‘designadamente as que vieram a ser imputadas ao Autor em sede de processo disciplinar’ – (facto nº 42).
Nem se diga que pelo facto de a 15/1/1992 o representante da AICE ter logo proposto a exoneração imediata do autor do cargo de Director e a revogação das competências que lhe estavam delegadas, isso significa que a ré já tinha conhecimento suficiente da actuação do autor que veio a ser concretamente imputada no processo disciplinar. É que, desde logo, porque essa proposta não mereceu imediata deliberação nessa data, ficando de ser reanalisada numa próxima reunião, o que pode indiciar que a ré ainda não estava na posse dos elementos decisivos e necessários para actuar contra o autor, quer a nível disciplinar, quer a nível meramente funcional.
Por outro lado, essa proposta pode apenas significar que perante o mau funcionamento da ré que já se tinha apurado, cautelarmente, haveria de se afastar imediatamente o autor das funções de Direcção, como responsável máximo pela sua organização interna (factos nº 12 e 14).
Como era ao autor que competia a prova inequívoca do conhecimento a 15/1/1992, por parte da ré, dos factos que lhe foram posteriormente imputados na nota de culpa e essa prova não foi feita, apenas se podendo configurar uma mera, incerta e insuficiente hipótese de tal ter acontecido, importa concluir, como se fez em 1ª instância, pela improcedência da invocada caducidade do procedimento disciplinar, com consequente improcedência deste fundamento da acção (e não improcedência da excepção peremptória da caducidade, como se escreveu na sentença recorrida, a fols. 1103).
(…)”

Rebela-se o autor, ora recorrente, contra o assim decidido, expondo um ponto de vista de harmonia com o qual, em súmula, tendo o Conselho de Administração do réu, em 15 de Janeiro de 1992, tomado conhecimento das anomalias verificadas nos seus serviços, das deficiências organizacionais e das irregularidades na utilização das verbas postas à disposição do mesmo réu, detectadas pela auditoria determinada pelo Secretário de Estado do Emprego e Formação Profissional, e sendo o autor responsável pela correcta utilização de tais verbas, isso significa que, em tal data, o réu era já perfeita e cabalmente sabedor dos factos integradores de infracção disciplinar e do respectivo agente – o agora impugnante; e, assim, deveria o réu exercer, nos sessenta dias subsequentes, o procedimento disciplinar contra o autor, pelo que, não o tendo feito, então, era manifesta a caducidade da acção disciplinar.

Adianta-se, desde já, que se não tem por procedente aquele ponto de vista.

Na verdade, como resulta do acervo fáctico acima enunciado, o Conselho de Administração do recorrido, na sua reunião de 15 de Janeiro de 1992, apreciou a situação do Empresa-A , verificando as anomalias do seu funcionamento, nomeadamente rupturas graves de tesouraria, deficiências organizacionais e irregularidades que já tinham sido detectadas pela auditoria que ainda se encontrava a decorrer aos serviços e que já tinham sido transmitidas àquele Conselho, vindo o representante da AICE, aí presente, a propor, nessa mesma reunião, a exoneração do autor.

E, relativamente a essa proposta, aquele órgão de administração deliberou, porque se levantavam dúvidas sobre a sua competência, solicitar um parecer jurídico.

Mais se apurou que o relatório da auditoria unicamente foi concluído em 8 de Abril de 1992, nele se vindo a efectuar o «levantamento» definitivo e global das irregularidades na actividade e funcionamento do Empresa-A , designadamente aquelas que vieram a ser imputadas ao autor no processo disciplinar, de cuja instauração e nota de culpa este teve conhecimento em 25 de Maio de 1992.

Por outro lado, da factualidade provada extrai-se inequivocamente que é de considerar complexo e de não fácil apuramento todo o circunstancialismo de que se revestiu a actuação do autor, pelo que somente com base nos elementos recolhidos pela auditoria seria possível ao réu efectuar um juízo minimamente fundado de imputação concreta de factos subsumíveis a infracção disciplinar.

Ora, como tem sido entendido por este Supremo Tribunal, o prazo de caducidade do procedimento disciplinar – que se deve exercer no prazo de sessenta dias – inicia-se com o efectivo conhecimento, por banda da entidade patronal, dos factos que podem ser considerados como infracção disciplinar, cessando com a instauração de processo de inquérito ou de averiguações, nos casos em que haja, legalmente, possibilidade de se lançar mão destes meios de apuramento, ou da instauração de processo disciplinar, se este for iniciado imediatamente, como é o caso de haver uma verificação directa de infracções por parte do agente trabalhador (cfr., por recente, o Acórdão de 30 de Maio de 2007, proferido na revista nº 673/2007).

Esgrime o recorrente, como se viu já, com o fundamento de que, aquando da reunião do Conselho Administrativo do réu, realizada em 15 de Janeiro de 1992, já este era conhecedor das infracções que vieram a ser objecto da nota de culpa e, por isso, quando foi instaurado o processo disciplinar, teriam já decorrido os sessenta dias a que alude o nº 1 do artº 31º do Regime Jurídico do Contrato Individual de trabalho aprovado pelo Decreto-Lei nº 49.408, de 24 de Novembro de 1969 (que é, aliás, o regime aplicável à situação sub specie, atenta a data dos factos).

Simplesmente, da acta daquela reunião não se extrai minimamente que, por parte do réu, houvesse já um conhecimento concreto da factualidade atinente à actuação do autor. Resulta, isso sim, um conhecimento genérico, dotado ainda de vacuidade e não claramente definido, sobre rupturas de tesouraria, deficiências organizacionais e irregularidades na utilização das verbas postas à disposição do réu, conforme informações não concretizadas que teriam sido dadas pelos responsáveis pela auditoria, que ainda estava a decorrer [cfr. items qq) e ss) de II 2.), o que é muito diferente de um conhecimento claro, directo e ostensivo ou de um fumus de imputação ao autor de comportamentos concretos que, desde logo, pudessem ser caracterizados como infracções disciplinares.

Não se pode, desta arte, sustentar que o réu, naquela ocasião, tinha um conhecimento minimamente objectivado da prática de infracções disciplinares por parte do autor. Esse conhecimento, como resulta da matéria provada, adveio do relatório da auditoria que tão só veio a lume em 8 de Abril de 1992. E, assim sendo, não se pode dizer que, in casu, a acção disciplinar foi exercida a destempo, isto é, passados os sessenta dias a que se reporta o nº 1 do já citado artº 31º

Neste contexto, é infundado sustentar que logrou o autor demonstrar que, na data pelo mesmo invocada – a da realização da reunião do Conselho de Administração do réu, ocorrida em 15 de Janeiro de 1992 –, eram já do conhecimento do recorrido os factos que vieram a originar a instauração do procedimento disciplinar.

Improcedem, pois, as «conclusões» da alegação do recurso.
III
Em face do que se deixa exposto, nega-se a revista.

Custas pelo recorrente.

Lisboa, 12 de Setembro de 2007
Bravo Serra (Relator)
Mário Pereira
Maria Laura Leonardo