Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | AFONSO CORREIA | ||
Descritores: | RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS IMPUGNAÇÃO GRADUAÇÃO DE CRÉDITOS REVELIA FALTA DE CONTESTAÇÃO MÚTUO HIPOTECA PENHORA REGISTO PREDIAL GARANTIA REAL PREVALÊNCIA | ||
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Nº do Documento: | SJ200310280030366 | ||
Data do Acordão: | 10/28/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL PORTO | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 323/03 | ||
Data: | 03/17/2003 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
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Sumário : | |||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça Por apenso à acção executiva a correr termos no Tribunal Judicial da Comarca de Oliveira de Azeméis, com o n.º 650/98, do 2º Juízo Cível, em que é exequente a Caixa A e executados B e C e na qual foi penhorado, em 12 de Outubro de 1999, o prédio urbano inscrito na matriz predial urbana de Romariz, sob o artigo 968, e descrito na conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o n.º 00747/060597, vários credores vieram reclamar o pagamento dos seus créditos. As referidas reclamações foram liminarmente admitidas. Dado cumprimento ao disposto no art.º 866º, n.os 1 e 2 do C. P. Civil, houve impugnação de alguns créditos. Foi proferido despacho saneador, com selecção da matéria de facto assente e controvertida. Após desistência da impugnação efectuada foi proferida a sentença em que o Ex.mo Juiz, depois de ter por provados os factos atinentes, julgou verificados os aludidos créditos e, por fim, graduou-os pela ordem de prioridade das garantias de que gozavam, primeiro os créditos hipotecários e depois os garantidos por penhora. Inconformada com o assim decidido, a Caixa de A de Oliveira de Azeméis apelou à Relação do Porto, mas sem êxito, pois este Tribunal, declarando, embora, a nulidade da sentença como previsto na primeira parte da al. d) do n.º 1 do art. 668º do CPC, por omissão de pronúncia quanto a questão que aqui não interessa, no cumprimento do disposto no art. 715º do CPC, graduou os créditos por forma a confirmar a sentença. Ainda inconformada pede a Caixa revista para que se proceda à graduação nos termos que indica na conclusão 25ª. Como resulta da alegação que coroou com as seguintes Conclusões 1ª - A recorrente não impugnou o crédito reclamado pelo G, SA, em virtude de, ao tempo, desconhecer totalmente as operações de suporte da sua douta reclamação. 2ª - Entretanto, o próprio G, SA, juntou documentos que permitiram tomar conhecimento da realidade dos factos, justificando o recurso para o Venerando Tribunal da Relação do Porto. 3ª - O mesmo Tribunal não atendeu ao inconformismo da recorrente tão só por não se ter impugnado esses créditos face às disposições conjugadas dos artigos 866 n.º 2 e 3 e 868 n.º 4, ambos do C. P. C. 4ª - Mas não teve em conta a nova redacção da reforma de 95/96 do artigo 868º, n.º 4, que arreda o reconhecimento dos créditos nos casos em que haja excepções ao efeito cominatório da revelia, vigentes no processo declarativo. 5ª - E verifica-se no caso dos autos a excepção da alínea a) do artigo 485 do C.P.C. pois o credor reclamante D e mulher impugnaram (sic) os créditos do G, SA, o que aproveita ao recorrente. 6ª - Da "desistência da impugnação" por esse credor, posterior, não resulta a aplicação dos efeitos da revelia relativamente ao recorrente. 7ª - Sem prescindir, sempre seria aplicável no caso dos autos a alínea d) do mesmo artigo 485 por a prova dos empréstimos hipotecários ter de ser feita por documento escrito nos termos do artigo 80º, n.º 2, al. g), do Código do Notariado. 8ª - Afastado o reconhecimento automático, importa analisar a prova documental apresentada pelo reclamante G, SA, a propósito dos créditos garantidos pelas hipotecas registadas sob C-3 e C-4. 9ª - Devendo ser os documentos tidos em conta, mesmo que juntos posterior-mente, nos termos do artigo 523 n.º 2, ou 524 n.º 2, ambos do C.P.C.. 10ª - E assim, o reclamante G, SA, reclamou invocando a concessão de cinco empréstimos, tantos quantos as hipotecas de que beneficia: C-1, C-2, C-3, C-4 e C-6. 11ª - Um, garantido pela hipoteca C-1, no montante actualizado de 8,898,19 €. 12ª - Outro, garantido pela hipoteca C-2, no montante actualizado de 4.739,21 € 13ª - Depois "três" empréstimos no montante global de 108.595,03 € 14ª - A douta sentença de graduação gradua tal "crédito" em 1º e 3º lugares, sem discriminação de montantes. 15ª - Tal graduação não está correcta, pois não é indiferente imputar paga-mentos a qualquer dos empréstimos quando há garantias e graduação diversas. 16ª - Todavia, o próprio reclamante G, SA, inequivocamente, considerou-se pago dos empréstimos garantidos pelas hipotecas registadas sob C-3 e C-4. 17ª - Tais hipotecas são os documentos 3 e 4 juntos com a douta reclamação de créditos do B.E.S., SA, garantindo dois empréstimos específicos e concretos. 18ª - A fls. 349, consta o documento do próprio B.E.S, SA, comprovativo da aprovação de um outro empréstimo de 20.000.000$00. 19ª - Tal valor é disponibilizado pelo reclamante G, SA, aos executados mutuários em 1/8/97, conforme extracto junto e elaborado pelo próprio reclamante a fls. 439. 20ª - No mesmo extracto, elaborado e fornecido pelo próprio reclamante B.E.S., SA, a fls. 439 e 440, consta o pagamento dos três últimos empréstimos reclamados: a) - em 1/8/97, o garantido pela hipoteca C-6. b) - em 12/8/97, o garantido pela hipoteca C-3. c) - em 12/8/97, o garantido pela hipoteca C-4. 21ª - E o próprio reclamante, G, SA, para que não restassem dúvidas, conforme documentos por si elaborados e juntos a fls. 345 e 346, certifica, para efeitos de IRS, a liquidação dos empréstimos garantidos pelas hipotecas C-3 e C-4. 22ª - Tal declaração é verdadeira, tendo a sua falsidade implicações penais. 23ª - Tais documentos representam uma confissão do reclamante G, SA, seu autor, do pagamento dos empréstimos que reclama em conjunto, fazendo prova plena do aí constante (artigos 352º, 358º, n.º 2 e 376º todos do C. Civil). 24ª - Assim, o que o reclamante G, SA, dispõe é de um terceiro empréstimo, com o valor em débito de 108.595,03 € sem qualquer garantia real ou, quando muito, o que se conclui como hipótese académica, beneficiando da hipoteca registada sob C-6 e dentro dos seus limites. 25ª - Com todo o respeito, parece que a sentença de graduação de créditos deveria graduá-los do seguinte modo: 1º - Crédito do G, SA, no valor de 8.898,19 E, garantido pela hipoteca C -1. 2º - Crédito do G, SA, no valor de 4.739,21 E, garantido pela hipoteca C -2. 3º - Crédito de D e esposa, com a limitação da impugnação deduzida, garantido pela hipoteca C - 5. 4º - Crédito de E e esposa, garantido pela hipoteca C - 7. 5º - Crédito exequendo, garantido pela penhora F-1. 6º - Crédito reclamado pela recorrente, garantido pela penhora F-2. 7º - Crédito reclamado pelo Banco Y, SA, garantido pela penhora F-3. 26ª - Quando muito, caso se entenda que o empréstimo garantido pela hipoteca C-6 não foi pago, mas "modificado", seria graduado em 4º lugar o crédito reclamado pelo G, SA, dentro dos limites garantidos pela hipoteca, passando os restantes para 5º, 6º, 7º e 8º lugares respectivamente. 27ª - Do que não há duvidas, repita-se, certificado pelo próprio G, SA, a fls. 345, é o pagamento dos empréstimos garantidos pela hipotecas registadas sob C-3 e C-4. 28ª - Ao decidir como decidiu o douto acórdão recorrido, violou o disposto nos artigos 865º, 866º, 868º, 484º, 485º, 523º, 524º todos do CPC e 352º, 358º, n.º 2, 364º e 376º, estes do C. Civil. O Banco respondeu em defesa do decidido, repetindo que os ditos documentos representam simples operações contabilísticas levadas a cabo para permitir aos mutuários pagar uma só prestação. Colhidos os vistos de lei e nada obstando, cumpre decidir as questões submetidas à nossa apreciação, as de saber se I - a Recorrente está em tempo de impugnar ou beneficia da impugnação deduzida por outro reclamante - conclusões 1ª a 6ª; II - foram pagos os créditos reclamados pelo Banco G garantidos pelas inscrições hipotecárias C6, C3 e C4 - conclusões 7ª a 23ª e 27ª; III - deve alterar-se a graduação de créditos - conclusões 24ª a 26ª. Mas para tanto é mister ver que o Tribunal recorrido teve por assentes os seguintes factos: 1 - Na comarca de Oliveira de Azeméis correm por apenso à execução 650/98 os competentes autos de reclamação em que os reclamados B e marido C são executados para pagamento da quantia de Esc. 4.366.373$00 à exequente A de Oliveira de Azeméis; 2 - Nesta execução foi penhorado o prédio urbano pertencente aos executados, inscrito na matriz predial urbana de Romariz sob o artigo 968 e descrito na Conservatória do Registo Predial de Santa Maria da Feira sob o n.º 00747/060597, penhora esta registada em 20.10.99, pela inscrição F- 1; 3 - Este prédio foi também penhorado em 19.10.99 no âmbito da execução n.º 663/98, do 2º Juízo Cível, em que é exequente a A de Oliveira de Azeméis, para pagamento da quantia de Esc. 12.346.832$00, tendo essa penhora sido registada em 21.10.99 pela inscrição F 2; 4 - O mesmo prédio foi, ainda, penhorado em 17.03.99 no âmbito da execução em que é exequente Banco F, actualmente Banco B.P.I., para pagamento da quantia de Esc. 4.309.638$00, tendo essa penhora sido registada em 19.01.2000 pela inscrição F-3; 5 - O dito prédio encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor do Banco G para garantia do empréstimo de esc. 2.720.000$00 com o máximo de Esc. 4.216.000$00, registada em 28.4.1983, pela inscrição C-1; 6 - e encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor do Banco G para garantia do empréstimo de Esc. 2.872.000$00, com o máximo de Esc. 3.915.254$00, registada em 3.08.1988, pela inscrição C-2; 7 - O prédio encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor do Banco G para garantia de empréstimo de Esc. 7.000.000$00 com o máximo de Esc. 9.850.000$00, registada em 6.5.1997, pela inscrição C-3; 8 e encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor do Banco G para garantia de empréstimo de Esc. 6.000.000$00, com o máximo de Esc. 8.422.200$00, registada em 6.5.997, pela inscrição C-4; 9 - O prédio referido encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor de D e mulher H, para garantia de empréstimo de Esc. 7.000.000$00, registada em 21.09.98 pela inscrição C-5; 10 - e com hipoteca voluntária a favor do Banco G para garantia de empréstimo de Esc. 7.000.000$00, com o máximo de Esc. 10.025.400$00, registada em 02.10.98 pela inscrição C-6; 11 - o mesmo prédio encontra-se onerado com hipoteca voluntária a favor de E e mulher J, para garantia de empréstimo de Esc. 4.200.000$00, registada em 21.10.98 pela inscrição C-7; 12 - Relativamente ao empréstimo referido em 5, os reclamados devem ao Banco G a quantia de 1.916.695$00; 13 - Relativamente ao empréstimo referido em 6, os reclamados devem ao Banco G a quantia de Esc. 1.196.616$00; 14 - o prazo de amortização e taxa de juros dos empréstimos referidos em 7 e 8 foram alterados a pedido dos reclamados/executados; 15 - tendo os mesmos empréstimos e o empréstimo identificado em 10 sido unificados num empréstimo global de Esc. 20.000.000$00. 16 - tendo-lhes sido debitado na sua conta os dois empréstimos referidos em 7 e 8 e, após, creditados na mesma conta o valor dos três empréstimos - 20.000.000$00; 17 - Actualmente, e com referência em 15, os executados devem ao G a quantia de Esc. 18.430.695$00, correspondente a Esc. 1.766.578$00 de crédito vencido e Esc. 16.644.118$00 de crédito vincendo. Analisando o aplicável Direito Começaremos por ver se I - a Recorrente está em tempo de impugnar ou beneficia da impugnação deduzida por outro reclamante - conclusões 1ª a 6ª; II - foram pagas os créditos reclamados pelo Banco G garantidos pelas inscrições hipotecárias C6, C3 e C4 - conclusões 7ª a 23ª e 27ª; Admitidas as reclamações e notificado o despacho de admissão, podem os demais credores, dentro do prazo concedido ao exequente impugnar créditos reclamados desde que garantidos por bens sobre que os impugnantes tenham também invocado qualquer direito real de garantia - art. 866º, n.º 3 do CPC. «Trata-se, adentro dos ciclos inseridos na fase dos articulados, de uma contestação ao pedido formulado pelos credores reclamantes (1) ». Compreende-se: quanto mais credores concorrerem ao produto da venda de certo bem, menos tocará a cada um. Nos termos do n.º 2 do art. 868, não havendo impugnação ou necessidade de produção de prova, proferir-se-á sentença de verificação e graduação, sem prejuízo, porém, das excepções ao efeito cominatório da revelia, vigentes no processo declarativo - ressalva da parte final do n.º 2 e n.º 4 do mesmo art. 868º. O Legislador processual de 1995/96 pretendeu unificar o regime dos efeitos cominatórios da revelia submetendo-os ao vigorante no processo declarativo, como pode ver-se, quanto aos embargos, do relatório do Dec-lei n.º 329A/95, de 31 de Dezembro, e do n.º 3 do art. 817º do CPC. "A revelia pode ser absoluta ou relativa. A revelia é absoluta quando o réu não pratica qualquer acto na acção pendente; é relativa se o réu não contesta, mas pratica em juízo qualquer outro acto processual, designadamente a constituição de mandatário judicial. A revelia - quer a relativa, quer a absoluta - pode ser operante ou inoperante. É operante quando produz efeitos quanto à composição da acção; é inoperante quando esses efeitos não se realizam, isto é, quando a falta de contestação nada implica quanto à decisão da causa. As situações que conduzem à inoperância da revelia são comuns ao processo ordinário, sumário e sumaríssimo, pois que, na falta de uma regulamentação específica, vale para estes últimos o que se encontra estipulado para o processo ordinário (art.os 463º, n.º 1, e 464º). Não era assim na anterior versão do Código de Processo Civil, na qual havia regras específicas para a revelia em cada uma dessas formais processuais: cfr. art.ºs 485º, 784º, n.ºs 2 e 3, e 795º, n.º 1, CPC/61. A revelia é inoperante quando tenha havido citação edital (cfr. art.º 233º, n.º 1), desde que o réu não constitua mandatário judicial no prazo de contestação e permaneça na situação de revelia absoluta (art.ºs 484º, n.º 1, e 485º, al. b) 2ª parte). Se a citação edital se tiver realizado dada a ausência do citando em parte incerta (art.ºs 233º, n.º 6, e 248º), a revelia só se verifica se o Ministério Público, chamado a deduzir oposição nos termos do art.º 15º, n.º 1, não contestar a acção. A inoperância da revelia justifica-se, como se compreende facilmente, pela impossibilidade de garantir que, tendo havido citação edital, o citando teve conhecimento efectivo da causa proposta contra ele. A revelia é ainda inoperante nos seguintes casos: - apresentação de contestação por um dos réus, embora a inoperância se restrinja aos factos impugnados por essa parte (art.º 485º, al. a)); - incapacidade do réu (art.º 485º, al. b)), havendo que referir que essa revelia, ainda que inoperante, só se verifica após a oportunidade da sub-representação imposta pelo art.º 15º, n.º 1; - indisponibilidade do objecto do processo (art.º 485º, al. c), o que se justifica pela irrelevância da vontade do réu para produzir quaisquer efeitos sobre esse objecto (cfr. art.º 354º, al. b), CC); - finalmente, exigência de documento escrito para a prova dos factos (art.º 485º, al. d); cfr. art.º 364º CC), a qual, naturalmente, não pode ser suprida pela falta de contestação" (2). "A cominação fixada na lei para a revelia do réu sofre algumas limitações, o que significa que, em determinadas circunstâncias, apesar de o réu não ter contestado, e não obstante estarem verificados os requisitos previstos para o funcionamento da revelia, nem por isso se consideram confessados os factos articulados pelo autor. Os casos de revelia inoperante estão previstos no art. 485º do CPC. Assim, não se consideram confessados os factos: - quando, havendo vários réus, algum deles contestar, relativamente aos factos que o contestante impugnar {cfr. a al. a)}. Basta, pois, que um dos réus conteste a acção, para os factos por ele impugnados não poderem ser considerados como confessados em relação aos seus co-réus revéis. Desta forma, evita-se uma eventual discrepância no julgamento da matéria de facto, obstando-se a que os factos articulados pelo autor sejam, no mesmo processo, considerados como confessados quanto a uns réus e impugnados quanto a outros. Note-se que este benefício concedido aos réus revéis se circunscreve à matéria impugnada pelo réu contestante. Por isso, os factos da petição inicial que não hajam sido efectivamente impugnados são dados como assentes, em relação a todos os réus (cjg. o art. 490º, n.º 2 com o art. 485º, a) do CPC. ... - quando se trate de factos para prova dos quais se exija documento escrito [cfr. a al. d)], assim se adequando a lei instrumental ao art. 364.° do CC" (3). A alínea a) do art. 485º abrange tanto o litisconsórcio necessário como o voluntário (4). Analisando o disposto nos n.os 2 e 4 do art. 868º do CPC à luz destes ensinamentos doutrinários - cuja justeza não sofre contestação - e conjugando-os com o disposto nas al. a) e d) do art. 485º do CPC, sabido que o prazo de impugnação dos créditos reclamados (art. 866º, n.os 2 e 3, CPC) é um prazo peremptório (5) cujo decurso extingue o direito de praticar o acto - art. 145º, n.º 2, do CPC - é evidente que nenhum credor pode impugnar o crédito de outro reclamante depois de esgotado o prazo para tanto assinalado na lei. E isto é assim qualquer que tenha sido a causa (salvo justo impedimento aqui não invocado) de tal omissão. Podemos afirmar com a mesma certeza que, por força do disposto na al. a) do art. 485º do CPC, todos os reclamantes beneficiam da contestação de um deles, se bem que apenas em relação aos factos que esse impugnar. A Caixa reclamante, apesar de não ter impugnado o crédito e garantias do Banco G, beneficiaria do que em tal impugnação viesse a ser decidido, precisamente por a lei pretender, com este regime de inoperância da revelia relativa, uniformidade de julgados, evitando que o alegado pagamento de alguns créditos do G pudesse beneficiar, apenas, o impugnante quando todos os credores concorrem ao produto da venda do mesmo bem. Simplesmente, o credor tanto pode impugnar como nada dizer, pode desistir da impugnação deduzida, pode não produzir qualquer prova e, por esta forma, tornar ineficaz impugnação sujeita a julgamento. Estando, como é certo estarmos, em matéria da livre disponibilidade das Partes, nada impõe a permanência do impugnante na lide nem que os factos alega-dos venham a obter os favores da prova. Os reclamantes beneficiam da impugnação doutrem se e na medida em que tal impugnação resultar vitoriosa. Se o impugnante desistiu da impugnação ou decaiu tudo se passa como se jamais tivesse havido impugnação. E então, se os factos alegados permitirem a procedência do pedido, nada mais resta do que conhecer da existência dos créditos reclamados e graduá-los com o crédito do exequente - art. 868º, n.os 2 e 4, 484º e 485º do CPC. Concluímos, assim, que a Recorrente não está em tempo de impugnar nem beneficia da impugnação deduzida por outro reclamante. Com o que se desatende o levado às conclusões 1ª a 6ª. Entrando na apreciação da II questão diremos ser manifestamente falha de razão a afirmação contida em 7ª. É fora de qualquer dúvida que os actos de constituição, de modificação e de distrate de hipotecas tem de celebrar-se por escritura pública - art. 80º, n.º 2, g), do Cód. do Notariado - sendo igualmente de lei que a eficácia dos factos constitutivos de hipoteca depende da realização do registo, mesmo entre as próprias partes - art. 4º, n.º 2, do C. R. Predial. Mas as escrituras de mútuo com hipoteca invocadas pelo Banco G foram juntas aos autos e levadas ao registo, como se vê das inscrições C1, C2, C3, C4 e C6, a fs. 71 e 72. Onde a falta de prova dos empréstimos hipotecários? Mas, acrescenta a Recorrente, o Banco emitiu documentos - os juntos a fs. 345 e 346, 439 e 440 - que provam inequivocamente o pagamento dos créditos de 7 mil contos, 6 mil contos e sete mil contos, garantidos pelas inscrições hipotecárias C3, C4 e C6, respectivamente. A sentença teria graduado estes créditos sem discriminação de montantes e sem atender às garantias de cada um. A Caixa Recorrente insiste em não ver o que está à vista e já lhe foi explicado mais de uma vez. O documento de fs. 345 é fotocópia de carta dirigida ao executado, informando-o, para efeitos de dedução estabelecida na al. e) do n.º 1 do art. 55º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares, que foram pagas em 1997, relativamente a Empréstimo(s) para habitação que lhe foi/foram concedi-do(s) por esta Instituição de Crédito as seguintes importâncias: - juros 1.329.419$ - Capital 13.747.231$. O documento de fs. 346 é cópia de extracto de conta donde se vê que em 11 de Agosto de 1987 foram debitadas na conta de depósito à ordem do executado as quantias de 5.864.263$00 e 7.178.863$00. Onde a liquidação, o pagamento? O documento de fs. 440 é cópia de extracto de conta de depósito à ordem do executado, aí se vendo que em 11 e 12 de Agosto de 1997 foram debitadas em tal conta as quantias de 5.864.263$00 e 7.178.863$00 também constantes, como não podia deixar de ser, do visto documento de fs. 345; no documento de fs. 439 consta ter sido levada a débito da mesma conta, em 4.8.97, a quantia de 7 mil contos. Toda esta operação contabilística consta dos factos provados, conforme alegado fora pelo Banco e aqui se repete: "14 - o prazo de amortização e taxa de juros dos empréstimos referidos em 7 e 8 (de 7 e 6 mil contos, com as inscrições hipotecárias C3 e C4) foram alterados a pedido dos reclamados/executados; 15 - tendo os mesmos empréstimos e o empréstimo identificado em 10 (de sete mil contos e inscrição C6) sido unificados num empréstimo global de Esc. 20.000.000$00; 16 - tendo-lhes sido debitado na sua conta os dois empréstimos referidos em 7 e 8 e, após, creditados na mesma conta o valor dos três empréstimos - 20.000.000$00". Está bem de ver que os empréstimos de sete e seis mil contos não foram pagos com a sua unificação com um terceiro, antes o executado ficou a dever os mesmos empréstimos mais o outro de sete mil contos, de C6, no total de vinte mil contos (que em parte amortizou, como bem explicadinho está a fs. 694 e v.º). Concluímos, desta forma, que não foram pagos os créditos reclamados pelo Banco G garantidos pelas inscrições hipotecárias C6, C3 e C4, não tendo nenhum sentido o dito nas conclusões 7ª a 23ª e 27ª. Por último - é a III questão - resta saber se deve ser alterada a graduação que teria sido feita a esmo, sem discriminação de montantes, sem respeito pela individualidade dos empréstimos que teriam sido unificados, apesar de beneficiarem de garantias hipotecárias diferentes. Dir-se-á, antes de mais, ser indevida a acusação de que a graduação não respeitou a individualidade dos empréstimos e respectivas garantias, sobretudo depois do esclarecimento de fs. 271 e 272: "Ainda que os empréstimos estejam unificados, na reclamação de créditos apenas pode ser ordenado o pagamento pela ordem de preferência, que se afere pelas garantias reais existentes, e dentre estas, pela data do respectivo registo, sendo este obrigatório. E as garantias, in casu, são constituídas pelas hipotecas e não pela unificação de empréstimos, que jamais podem interferir nas garantias ou na prioridade de pagamento destas, salvo se houvesse expressamente um acto que assim fosse registado - o que não ocorreu no caso em apreço . Assim, a referência que consta aos pontos 16 a 18 da fundamentação fáctica visa que no pagamento se tenha em consideração o valor actual e devido, decorrente da unificação dos empréstimos, mas sendo cada empréstimo pago, de per se, pela natureza e valor de cada garantia". A graduação limitou-se a seguir a ordem das inscrições hipotecárias e, depois das hipotecas, a ordem das inscrições das penhoras. Por isso graduou em primeiro lugar os créditos do G garantidos pelas hipotecas de C1 a C4, a seguir o crédito hipotecário de C5, do D e esposa, em terceiro lugar o crédito do G com a inscrição hipotecária C6 e em quarto lugar o crédito com a inscrição hipotecária mais recente, a C7, dos credores Casimiro de Pinho e consorte. Vieram a seguir os créditos garantidos por penhora, graduados, também, de acordo com a ordem de registo: em 5º lugar o crédito garantido pela inscrição F1, o crédito exequendo, em 6º o da inscrição F2, também da exequente mas com registo posterior, reclamado nos termos do art. 871º do CPC, tal como o do Y, de F3 e, por isso, graduado e último lugar. Isso mesmo está claro no douto Acórdão em crise, com fundamento expresso no disposto nos art. 686º, 687º e 822º, n.º 1, do CC. Com efeito e como é sabido e consta do art. 686º, n.º 1, do CC, a hipoteca - que deve ser registada sob pena de não produzir efeitos, mesmo em relação às partes, ut art. 687º CC, 2º, n.º 1, h) e 4º, n.º 2, do C. R. Predial - confere ao credor o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas, pertencentes ao devedor ou a terceiro com preferência sobre os demais credores que não gozem de privilégio especial ou de prioridade de registo. A hipoteca assegura os acessórios do crédito que constem do registo mas, quanto a juros, não mais que os relativos a três anos - art. 693º CC. A penhora é a mais ténue das garantias reais, há até quem lhe não reconheça a natureza de garantia e a julgue simples acto executivo preparatório da venda. De qualquer forma e por disposição expressa da lei, o exequente adquire pela penhora o direito de ser pago com preferência a quem não tenha garantia real anterior - art. 822º, n.º 1, CC. Também a penhora de imóveis está sujeita a registo - art. 2º, n.º 1, al. n), do CRP e 838º, n.º 4, do CPC. Nos termos dos n.º 1 e 3 do art. 6º do C. R. Predial, o direito inscrito em primeiro lugar prevalece sobre os que se lhe seguirem relativamente aos mesmos bens, por ordem da data dos registos; o registo convertido em definitivo conserva a prioridade que tinha como provisório. Conjugando estes preceitos de lei, logo se vê que a garantia da hipoteca prevalece sobre a da penhora e, dentro cada garantia, a prioridade afere-se pela data do registo. Por isso as Instâncias graduaram em primeiro lugar os créditos garantidos por hipoteca e só depois os que beneficiavam da penhora. Na graduação de cada uma das garantias atenderam à data do respectivo registo, mesmo o provisório de F2, mas convertido em definitivo que, por isso, conserva a prioridade que tinha de acordo com a data do registo provisório. Foi inteiramente respeitada a lei. Como tal, desatende-se o concluído em 24ª a 26ª e recurso não merece provimento. Decisão Termos em que a) - se nega a revista e b) - se condena a Recorrente nas custas, por vencida - art. 446º, n.os 1 e 2, do CPC. Lisboa, 28 de Outubro de 2003 Afonso Correia Nuno Cameira Ribeiro de Almeida ----------------------------------- (1) - Curso de Processo Executivo..., Remédio Marques, Almedina, 371, nota 1037. (2) - Teixeira de Sousa, Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª ed., 208/209. (3) - Montalvão Machado, O Novo Processo Civil, 2ª ed., 179/180. (4) - R. Bastos, Notas ao CPC, III, nota 1 ao art.. 485º. (5) - Ver, por todos, Lebre de Freitas, A Acção Executiva, 2ª ed., 259. |