Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
1268/06.4TBEPS.G1-A.S1
Nº Convencional: 1.ª SECÇÃO
Relator: MARIA JOÃO VAZ TOMÉ
Descritores: RECURSO
ADMISSIBILIDADE DO RECURSO
SUCUMBÊNCIA
DECAIMENTO
ALÇADA
VALOR DA CAUSA
JUROS DE MORA
RECLAMAÇÃO
Data do Acordão: 09/20/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA
Decisão: INDEFERIDA
Sumário :
I. A recorribilidade depende da proporção do decaimento, devendo este ser superior a metade da alçada do Tribunal que proferiu a decisão impugnada.

II. Os juros de mora vencidos na pendência da ação não relevam para a determinação do valor da causa, nem tão pouco podem ser levados em linha de conta para encontrar o valor da sucumbência com vista a apurar se a decisão é ou não recorrível.

Decisão Texto Integral:

Despacho

(artigo 643.º, n.º 4, do CPC)



I - Enquadramento

1. A Associação Equestre, Tauromáquica e Desportiva de ... intentou ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra AA, BB e CC, pedindo que os Réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia de €42.648,68, correspondente ao valor das obras efetuadas no prédio, os juros de mora vencidos no valor de €1.954,73, a quantia de €20.000,00 a título de danos não patrimoniais, e os juros de mora vincendos à taxa legal, calculados sobre os valores base antes liquidados.

2. Alega, em síntese, que a 1 de outubro de 1998 foi celebrado entre a Autora e o Réu AA - que outorgou por si e na qualidade de cabeça-de-casal das “heranças indivisas” referidas no ponto 8.º da petição inicial - o “contrato de arrendamento” do prédio de que os Réus são comproprietários, tendo a Autora realizado obras no mesmo prédio nos anos de 1998, 1999, 2000, 2001, 2002, 2003, no valor total de €42.648,68. A realização dessas obras foi autorizada pelos Réus e estas obras, no seu conjunto, enquadram-se na cláusula sexta do contrato, tendo a Autora o direito de ser indemnizada do respetivo valor. Refere ainda que os Réus procederam à denúncia do arrendamento, mas tal denúncia não é válida nem eficaz, não tendo sido feita com a antecedência legalmente prevista. Os Réus apoderaram-se do prédio a 30 de setembro de 2005, impedindo a Autora de continuar a desenvolver as suas atividades pelo menos durante o período de doze meses, causando-lhe danos não patrimoniais. Os Réus, a 2 de novembro de 2005, destruíram tudo o que a Autora havia construído.

3. Os Réus AA e CC apresentaram contestação e deduziram pedido reconvencional. Concluem que a ação deve ser julgada improcedente, por não provada, devendo ser absolvidos dos pedidos formulados pela Autora, de um lado e, de outro, que o pedido reconvencional deve ser julgado procedente, por provado e, em consequência, a Autora deve ser condenada a pagar-lhes a quantia de €36.450,00, conforme explicitado nos artigos 45.º a 55.º da contestação-reconvenção, o montante de €25.000,00, a título de danos não patrimoniais, e juros de mora sobre as quantias referidas, à taxa legal, desde a citação, até efetivo pagamento. Para o efeito, impugnam parcialmente a matéria de facto, alegando, em síntese, que, a ser verdadeiro, o referido “contrato de arrendamento” é nulo, as obras executadas não têm licença e são ilegais, foi ordenada a demolição das obras efetuadas e, por isso, os Réus terão, consequentemente, de suportar todas as despesas implicadas pela demolição. Referem, ainda, que a entender-se que tais obras são benfeitorias, apenas aquelas indicadas no artigo 9.º da contestação são indemnizáveis. A bancada, as estacas em madeira e quatro postes com holofote foram levantados e levados do local por ordem da Autora. Menciona que a conduta da Autora lhes causou forte abalo psíquico. Por outro lado, a Autora terá de ser condenada a pagar aos Réus o valor de €36.450,00 pelos custos de demolição das obras, abate dos cedros e extração das suas raízes, assim como a quantia de €25.000,00, a título de danos não patrimoniais, bem como os juros de mora sobre as referidas quantias, à taxa legal desde a citação até efetivo pagamento.

4. Por seu turno, a Ré BB apresentou contestação, dizendo que:

a) deve ser absolvida da instância;

b) a presente ação deve ser julgada não provada e improcedente;

c) a Autora deve ser condenada como litigante de má-fé, nos termos do alegado nos artigos 67º a 73 da contestação;

d) a Autora deve ser condenada a pagar as custas e procuradoria condigna.

5. Para tanto, a Ré impugna parcialmente a factualidade alegada pela Autora, invoca a nulidade do contrato por não ter sido celebrado por escritura pública, por o Réu AA não ter legitimidade para assinar e por tal contrato estar submetido a uma condição de realização impossível inserta na sua cláusula sétima. Invocou também que o contrato em causa não a vincula, que que tal negócio apenas pode configurar um contrato-promessa, que efetuou uma denúncia na Câmara Municipal ..., em virtude de as obras terem sido realizadas pela Autora sem autorização e sem licenciamento, que a Autora não tem exercido, nos últimos anos, qualquer atividade e que a sede, as boxes e o alpendre ainda se encontram no local. Menciona que é parte ilegítima nos presentes autos, já que não tem qualquer ligação ao contrato invocado, nem tão pouco usurpou o que quer que alegadamente pertencesse à Autora e, como tal, deve ser absolvida da instância. Os representantes da Autora sabem que a Ré nada teve a ver com os factos enunciados nos pontos 134.º a 140.º da petição inicial e, apesar disso, imputam tais factos à Ré, provocando-lhe angústia e abalo psíquico. A conduta da Autora configura um uso indevido e anormal do processo e dos tribunais, e de má-fé, alegando factos que sabe não serem verdadeiros.

6. A Autora Associação Equestre, Tauromáquica e Desportiva de ... apresentou réplica, concluindo pela improcedência das exceções invocadas pelos Réus, da reconvenção deduzida e pela necessidade de apreciar, na devida altura, a atuação processual dos Réus cuja condenação por má-fé reclamará.

7. Os réus AA e CC apresentaram tréplica, concluindo nos mesmos moldes da contestação-reconvenção.

8. Foi elaborado despacho saneador, que relegou o conhecimento das exceções para sentença, foram selecionados os factos assentes e foi organizada a base instrutória.

9. Perante a morte do Réu AA na pendência da causa, no apenso B destes autos foi proferida sentença que declarou BB, AA, DD e CC habilitados, em substituição do falecido AA.

10. Realizou-se julgamento e foi proferida sentença que decidiu o seguinte:

4.1. Julga-se improcedente a presente ação e, consequentemente, absolvem-se os réus dos pedidos contra eles formulados.

4.2. Julga-se improcedente a reconvenção, absolvendo-se a autora-reconvinda dos pedidos contra ela deduzidos.

4.3. Julga-se não provado e improcedente o incidente de falsidade deduzido pelos réus AA (falecido) e CC relativamente aos documentos juntos como contrato de arrendamento a fls. 315 a 317, como doc. 119 de fls. 151, e como doc. 121 de fls. 153

4.4. Absolve-se a autora do pedido de condenação como litigante de má-fé.

11. Não conformada, a Autora Associação Equestre, Tauromáquica e Desportiva de ... interpôs recurso, que foi admitido como sendo de apelação, a subir nos próprios autos, com efeito devolutivo (fls. 1074).

12. Os Réus/Recorridos DD e CC apresentaram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e pela manutenção da sentença.

13. Por acórdão de 30 de setembro de 2021, o Tribunal da Relação de Guimarães decidiu o seguinte:

Pelo exposto, tendo em conta o que antecede, acorda-se em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, condenar os réus e apelados a pagarem à autora e apelante a quantia de €13.678,46 (treze mil, seiscentos e setenta e oito euros e quarenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento e, no mais, improcedente, nessa parte se confirmando a douta sentença recorrida.

Custas por apelante e apelados, na proporção de decaimento.

Notifique”.

14. Não conformada, a Ré BB interpôs recurso de revista, formulando as seguintes Conclusões:

a) - Nos termos do artigo 607°, n.° 4, Ia parte do Código de Processo Civil, aplicável por remissão do artigo 663°, n.° 2 do mesmo diploma, o dever de fundamentação, no que respeita à apreciação ou reapreciação da matéria de facto, comporta o dever de analisar criticamente as provas.

b) - O julgador deve assim indicar os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade da convicção sobre o julgamento do facto como provado ou não provado.

c) - Essa obrigação impende sobre o juiz de julgamento, mas também sobre o juiz de recurso, quando o mesmo tenha por objecto a reapreciação da decisão proferida sobre a matéria de facto.

d) - O Tribunal a quo não procedeu à análise crítica da prova nos pontos de facto cuja resposta alterou no douto acórdão recorrido.

e) - O texto do acórdão recorrido é omisso quanto aos fundamentos que determinaram a valoração da prova que sustentou as alterações à decisão sobre a matéria de facto.

f) - Não é possível averiguar da razoabilidade da convicção do Tribunal a quo sobre o julgamento dos factos constantes dos quesitos cuja resposta foi alterada.

g) - Tendo o Tribunal a quo decidido de modo diverso em relação à decisão de Ia instância, impunha-se, que expusesse de forma fundamentada de que modo é que as declarações do legal representante da A. e os diversos documentos mencionados na douta decisão recorrida formaram a sua convicção no sentido da alteração da matéria de facto.

II

h) - O acórdão recorrido é nulo, nos termos do artigo 615°, n.° 1, alínea b) do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 666° do mesmo diploma, o que expressamente se invoca.

i) - Tendo em conta os critérios de interpretação plasmados nos artigos 236°, 237° e 238° do Código Civil, não se pode retirar da cláusula sexta do contrato de arrendamento que os respectivos outorgantes tenham pretendido atribuir a natureza de benfeitoria indemnizável a todas e quaisquer obras realizadas no locado.

j) - As partes quiseram reproduzir no contrato o que se mostra legalmente estabelecido relativamente a benfeitorias, apenas afastando a distinção entre benfeitorias úteis e necessárias.

k) - Não parece consentâneo com o conteúdo do contrato que as partes tenham pretendido impor aos senhorios o encargo de indemnizar a arrendatária de obras que pudessem ser levantadas por esta sem detrimento do prédio, nem que aos senhorios ficassem a pertencer bens ou obras com a natureza especificamente destinada aos fins da A.

1) - As obras ilegais por falta de licença não podem assumir, nos termos do artigo 216° do Código Civil, a natureza de benfeitorias.

m) - Ainda que se considerasse que as benfeitorias invocadas pela A. devessem ser compensadas, o que não se concebe, o valor a pagar nunca corresponderia ao quantitativo das despesas suportadas mas sim ao montante equivalente ao incremento do valor do imóvel, o qual, no caso, não foi provado.

n) - Deveria o Tribunal a quo ter decidido pela inexistência de qualquer direito da A. a ser indemnizada por benfeitorias.

o) - A decisão do Tribunal a quo violou o disposto nos artigos 216°, 236°, 237° e 238° do Código Civil.”

15. O mesmo fizeram DD e CC, apresentando as seguintes Conclusões:

1.º

O Acórdão em crise é nulo:

Porquanto ,

2.º

O Tribunal recorrido na reapreciação da matéria de facto relativamente aos pontos de facto dos quesitos 13.º, 15.º , 16.º, 24.º, 25.º, 26.º, 40.º, 45.º, não fundamenta as razões pelas quais os meios de prova invocados que sustentam as alterações á decisão sobre a matéria de facto o levaram a decidir daquela forma.

3.°

Acresce que , o Tribunal de l.a Instância decidiu que relativamente aos quesitos 13.° , 15. °, 16.°, 24.°, 25.°, 26.°, 40.° e 45.°: “ os concretos custos e despesas invocados e julgados não provados (...) não encontram qualquer sustentação face á prova produzida, sendo certo que não foram confirmados por qualquer dos depoimentos prestados, pelo menos de forma convincente, nem foram situados no tempo, ou confirmados os documentos juntos aos autos com a petição que a eles se referem “ .

4.°

Face ao exposto , se o Tribunal de l.a Instância entendeu que relativamente aos quesitos 13.° , 15.°, 16.°, 24.°, 25.°, 26.°, 40 .° e 45.° não existia prova documental nem testemunhal, o tribunal de 2.a instância tinha a obrigação de fundamentar de que modo as declarações do legal representante da A. e os documentos referidos no Acórdão levaram o Tribunal de 2.a instância a alterar a matéria de facto relativamente aos quesitos 13.° , 15.° , 16.°, 24.° , 25. ° , 26.°, 40.° e 45.°.

5.°

O Tribunal de 2.a Instância, violou, por isso , os arte. 663.º, n.° 2 do C.P.C. e os arts. 607.° (n.° 4) a 612.° do C.P.C.,

6.°

O Acórdão recorrido é, por conseguinte, nulo, nos termos do art. 615.°, n.° 1, b) , do C.P.C., aplicável por força do art. 666.° , do C.P.C.

Sem prescindir ,

7.°

Existe erro na apreciação da prova e na fixação dos factos materiais :

8.°

Deve o STJ alterar para não provado a resposta ao quesito 13; alterar a resposta ao quesito 15.° para não provado; manter a formulação decidida na l.a Instância no que concerne ao quesito 16.°; alterar a resposta dada aos quesitos 24.° e 25.° para não provado; manter a resposta ao quesito 26.°, decidida pela l.a Instância; manter a resposta ao quesito 40.°, decidida na l.a Instância; finalmente, manter a resposta dada ao quesito 45.°, também, decidida na l.a Instância.

9.°

Por se verificar o caso excepcional previsto no n.° 3 do art. 674.° do C.P.C.

10.°

Isto é, por existir no Acórdão recorrido ofensa expressa á lei,

11.°

Porquanto, os documentos em que o Tribunal da Relação assenta a sua decisão não têm a aptidão probatória que este Tribunal lhes atribui .

Dado que,

12.°

Tendo sido validamente impugnados pelos Recorrentes, não têm força probatória plena (art. 376.° do Código Civil por interpretação a contrario).

13.°

Não tendo a recorrida em sede de julgamento logrado provar (nem convencer de) sua genuinidade e veracidade, tendo, por isso, o Tribunal a quo, e bem, considerado que “ os concretos custos e despesas invocados e não julgados provados não encontram qualquer sustentação face á prova produzida, sendo certo que não foram confirmados por qualquer dos depoimentos prestados , pelo menos de forma convincente, nem foram situados no tempo, ou confirmados os documentos juntos aos autos com a petição que a eles se referem“.

14.º

Acresce que, as declarações de parte do representante legal da Recorrida não têm em face do anterior C.P.C. qualquer aptidão e força probatória, já que, as mesmas não eram admitidas, que, aliás, saliente-se, em face do seu interesse no desfecho favorável da acção a favor da Autora/Recorrida são as mesmas totalmente parciais e sem credibilidade.

Sem prescindir,

15.º

Não enferma de qualquer vicio o item 2.49 dos Factos Provados, decidido na 1.ª Instância:

Já que,

16.º

Ao decidir (como decidiu) o Tribunal da Relação de Guimarães, relativamente á resposta ao quesito 60.º, o que fez (ao dar razão á Recorrida ) foi ocultar a verdade dos factos que realmente aconteceram (comprovados pelo juiz do julgamento da 1.ª Instância ), ou seja, que a Recorrida aceitou deixar o local em questão e retirar de lá os seus bens, conforme o Tribunal de 1.ª Instância considerou demonstrado e provado, na sua procura e descoberta da verdade material (dentro do âmbito do N.C.P.C.- vide art. 411.º - , que o Acordão recorrido violou, pois tal decorre do poder inquisitório que confere ao juiz do julgamento tomar em consideração na decisão os factos que “sejam complemento ou concretização de outros que as partes oportunamente hajam alegado“, visando suprir certas deficiências da alegação, conforme decidiu o STJ no Ac. 01.07.2004 , processo n.º: 03B3417 , Cons. Noronha do Nascimento, dgsi.pt), 17.º E, por conseguinte, deve ser alterada a decisão quanto á resposta ao quesito 60.º, devendo ser mantida a decisão da 1.ª Instância . Sem prescindir,

18.º

Finalmente, no que concerne á Indemnização por benfeitorias:

19.º

Os Recorrentes corroboram na integra a interpretação que o Tribunal da 1.ª Instância fez relativamente á clausula 6.ª do Contrato de arrendamento.

20.º

Recorrendo aos critérios de interpretação plasmados nos arts. 236.º , 237.º e 238.º do Código Civil não poderá extrair-se em sede interpretativa da declaração, que as partes pretenderam atribuir natureza de benfeitoria indemnizável a todas e quaisquer obras realizadas no locado, independentemente da sua natureza.

21.º

Com efeito, cita-se, “(…) não parece consentâneo com o conteúdo do contrato, atenta a natureza rústica do prédio e do fim a que se destinou o arrendamento, que as partes tenham pretendido impor aos senhorios o encargo de indemnizar a arrendatária de obras que pudessem ser levantadas por esta sem detrimento do prédio, nem que aos senhorios ficassem a pertencer bens ou obras com a natureza especificamente destinada aos fins da associação autora, quando parece óbvio que os senhorios não assumiriam o prosseguimento dos mesmos fins a que o contrato se destinou(escola de equitação, actividades tauromáquicas e afins).

22.º

Fixado deste modo o sentido da cláusula sexta, conclui -se que competia à Recorrida/Autora alegar e provar quais as benfeitorias realizadas que não podiam ser levantadas e qual o incremento patrimonial que acrescentaram ao prédio.

23.º

Por outro lado, terão de considerar-se excluídas do direito a indemnização convencionado as benfeitorias que poderiam ser levantadas sem detrimento do prédio.

24.º

Ora, não só a autora omitiu qualquer alegação a esse respeito, como veio a demonstrar-se que as obras realizadas o foram sem prévia licença municipal.

25.º

Com efeito, provou-se que previamente ao início das obras, a autora não pediu, nem obteve, licenciamento da Câmara Municipal ..., das mesmas.

26.º

Ora, sendo as obras ilegais por falta de licença, as mesmas não assumem a natureza de benfeitorias nos termos do art. 216º do Código Civil, porquanto estas têm como pressuposto que se destinem a evitar a perda ou deterioração da coisa (necessárias),ou que lhe aumentem o valor (úteis).

27.º

Em conformidade, as obras realizadas pela Recorrida/ autora não poderão em concreto ser consideradas como benfeitorias, na medida em que não só as mesmas foram realizadas sem licença, como não alegou ou provou a autora, como lhe competia por força do disposto no art. 342º do Código Civil, que as mesmas determinaram uma valorização do prédio, com o consequente enriquecimento dos réus à custa do correspondente empobrecimento da autora.

28.º

Nestes termos, embora se possa admitir que a bancada, os postes de iluminação, os holofotes, os materiais com que foi instalado o picadeiro, as cadeiras, mesas e os demais equipamentos do bar, pudessem ser levantados, o certo é que a Recorrida/autora não o peticiona, nem alega ter sido impedida de os levantar, o mesmo sucedendo com os cedros.

29.º

Assim, como resulta, designadamente, das respostas parcialmente negativas aos quesitos 61º a 64º, não logrou a Recorrida/autora demonstrar aquela sua alegação, sendo que a mesma sempre não conduziria à atribuição de indemnização por benfeitorias nos termos peticionados, mas sim seria eventualmente susceptível de fundamentar indemnização por facto ilícito (destruição de coisa alheia) que, no entanto, não foi invocada, nem peticionada.

30.º

Relativamente às construções realizadas, designadamente, da sede e boxes para cavalos, sendo estas destituídas de licença, como resulta do exposto, as mesmas não são passíveis de ser indemnizadas, na medida em que não se traduzem num incremento patrimonial com que os réus se enriqueceram.“

31.º

Devia o Tribunal da Relação de Guimarães ter decidido pela inexistência de qualquer direito da A./recorrida a ser indemnizada por benfeitorias .

32.º

A decisão do Tribunal da Relação de Guimarães violou o disposto nos arts. 216.º, 236.º , 237.º e 238.º do Código Civil.

33.º

E, por conseguinte, deve ser revogado o Acordão recorrido.

Termos em que,

E nos demais que V.ªs Ex.ªs doutamente suprirão, concedendo provimento ao presente recurso, julgando procedentes as conclusões 1.º a 33.º, inclusive, e decidindo de acordo com as mesmas, deve ser revogado o acórdão recorrido, que deve ser substituído por Acórdão que, julgando totalmente improcedente a acção, absolva os Réus da condenação de pagarem á Autora a quantia de €13.678,46 , acrescida de juros de mora á taxa legal , desde a citação até integral pagamento , o que se requer , contribuirão V.ªs Ex.ªs para a realização do Direito e da JUSTIÇA”.

16. Por despacho de 26 de maio de 2022, o Senhor Desembargador-Relator decidiu o seguinte:

“O artigo 296º nº 1 NCPC prescreve que “a toda a causa deve ser atribuído um valor certo, expresso em moeda legal, o qual representa a utilidade económica do pedido”, ao qual se atende para determinar a relação da causa com a alçada do tribunal (nº 2).

No artigo 44º nº 1 da Lei de Organização do Sistema Judiciário (Lei nº 62/2013, de 26/08) dispõe-se que “em matéria cível, a alçada dos tribunais da Relação é de €30.000,00 e a dos tribunais de primeira instância é de €5.000,00.”

Estabelece o artigo 629º nº 1 NCPC que “o recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa.”

Há, assim, em regra, dois elementos cuja conjugação é indispensável para seja admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça: que a causa tenha valor superior a €30.000,00 e que a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a €15.000,00.

A presente ação tem o valor de €126.053,41, pelo que tendo os réus sido condenados, nesta instância, a pagar à autora a quantia de €13.678,46 (treze mil, seiscentos e setenta e oito euros e

quarenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento, a decisão impugnada não é desfavorável para os recorrentes em valor superior a €15.000,00, motivo pelo qual o recurso não é admissível e, como tal, não o admito.

*

Nas alegações dos recursos de revista, vieram os réus invocar a nulidade do acórdão proferido nesta instância, nos termos do disposto no artigo 615º nº 1 alínea d) e 666º NCPC.

Uma vez que não é admissível o recurso de revista excecional para o Supremo Tribunal de Justiça, o prazo para a arguição da nulidade é de 10 dias, pelo que, tendo sido as partes notificadas do acórdão em 01/10/2021, o prazo para a invocação das nulidades (que é de 10 dias – artigo 149º NCPC) terminou em 14/10/2021, podendo ser suscitado até ao 3º dia útil seguinte (artigo 139º NCPC), isto é, até 19/10/2021, pelo que tendo a nulidade sido invocada em 04/11/2021, por um lado e em 08/11/2021, por outro, a invocação da aludida nulidade é manifestamente intempestiva, motivo pelo qual se indefere o requerido.

Custas pelos réus requerentes, face ao seu decaimento (artigo 527º nº 1 e 2 NCPC).

Notifique.

17. Os Réus/Recorrentes DD e CC, à luz do art. 643.º do CPC, apresentaram reclamação do despacho do Senhor Desembargador-Relator com as seguintes Conclusões:

1.º

O Despacho reclamado violou e interpretou erroneamente, designadamente, o disposto no art. 629.º , n.º 1 , do C.P.C. .

2.º

É admissível e deve ser admitido o recurso de revista interposto ,

Porquanto ,

3.º

Ao invocar-se a nulidade do Acordão, nos termos do disposto no art. 615.º, n.º 1 , alínea d) e 666.º do C.P.C., que constitui um dos fundamentos da revista nos termos da alínea c) , n.º 1 , do art. 674.º do C.P.C.;

4.º

Acarreta tal que o valor da presente acção de €126.053,41 é o que importa para o recurso interposto para o STJ seja admissível.

5.º

Acresce que, e sem prescindir, a condenação dos RR. no TRG no montante de €13.678,46 e nos juros á taxa legal, desde a citação , implica que o valor da condenação excede os €15.000,00, sendo, por isso , a condenação desfavorável aos Recorrentes (aqui Reclamantes) em valor superior a € 15.000,00 .

Pelo que ,

6.º

Sempre o recurso de revista tem que ser admitido .

Termos em que ,

Deve ser admitida a presente Reclamação, julgando-se procedentes as conclusões 1.º ,2.º , 3.º, 4.º, 5.º e 6.º , substituindo-se a decisão reclamada por decisão que admita o recurso de revista interposto, contribuirão V.ªs Ex.ªs para a realização do Direito e da Justiça”.

18. Por despacho de 5 de maio de 2023, a Relatora decidiu o seguinte:

Nos termos expostos, indefere-se a reclamação apresentada pelos Réus/Recorrentes DD e CC, confirmando-se o despacho reclamado e, por isso, não se admitindo o recurso por si interposto.

Custas pelos Réus/Recorrentes/Reclamantes, sem prejuízo do apoio judiciário de que possam beneficiar.

19. Uma vez mais não conformados, os Réus/Recorrentes DD e CC vieram impugnar a decisão da Relatora nos termos do art. 652.º, n.º 3, do CPC, ex vi do art. 643.º, n.º 4, do mesmo corpo de normas. Invocam a violação do art. 629.º, n.º 1, do CPC, e referem que, quando esteja em causa a nulidade de acórdão, que constitui um dos fundamentos da revista, nos termos do art. 674.º, n.º 1, al. c), do CPC, o que releva é o valor da ação – in casu, de € 126.053,41. Referem ainda que a condenação dos Réus, no montante de € 13.678,46 e nos juros à taxa lega desde a citação implica que o valor da condenação exceda o montante de € 15.000.

20. Por seu turno, a Autora/Recorrida Associação Equestre, Tauromáquica e Desportiva de ... respondeu, pugnando pela manutenção da decisão reclamada.

II – Questões a decidir

Estão em causa as seguintes questões de saber:

- se o recurso é ou não admissível atendendo apenas ao valor da ação e descurando o valor da sucumbência, por ser nele invocada a nulidade do acórdão recorrido;

- se os juros de mora vencidos na pendência da ação relevam ou não para a determinação do valor da sucumbência com vista a apurar se a decisão é ou não recorrível.

III. Fundamentação

A. De Facto

Foram dados como provados os seguintes factos:

I. Factos Provados

2.1. Existe um terreno de cultura de regadio com videiras em ramada, situado no Lugar de ..., freguesia de ..., concelho de ..., a confrontar do norte, sul e poente com caminho e do nascente com EE e caminho, inscrito na matriz predial rústica sob o artigo 2065º e descrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o número ...47/..., e aí inscrita a aquisição a favor dos réus AA, pela apresentação de 2/12/2001 (½), e BB por apresentação de 1/03/2006 (¼), esta por legado de FF, conforme documento de fls. 122 a 125, junto ao processo cautelar apenso e que aqui se dá por reproduzido. (A))

2.2. A autora é uma associação constituída por escritura pública celebrada no dia 12 de janeiro de 1998, que tem por objeto a preservação, divulgação e promoção da cultura e desportos equestre e tauromáquico, conforme resulta do documento de fls. 30 a 39 que aqui se dá por reproduzido. (B) e citado documento)

2.3. No dia 1 de outubro de 1998, foi redigido um acordo intitulado de "contrato de arrendamento", onde constam como outorgantes o falecido réu AA (primeiro outorgante) "por si e na qualidade de cabeça-de-casal das heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito de GG, HH e II" e a autora (segunda outorgante), junto aos autos de fls. 40 a 42 (cópia) e de fls. 315 a 317 (original) e que aqui damos por reproduzido. (segundo B))

2.4. O acordo referido em 2.3. apresentava as seguintes cláusulas:

"PRIMEIRA

O primeiro outorgante é Cabeça-de-Casal nas heranças ilíquidas e indivisas abertas por óbito de GG, HH e II.

Do acervo hereditário da herança daquela GG e HH faz parte o prédio rústico, composto de cultura de regadio e videiras em ramada, no sítio de ..., freguesia de ..., do concelho de ..., a confrontar do Norte, Sul e Poente com caminho e do Nascente com caminho e EE, com a área de 7680 metros quadrados, inscrito na matriz predial respetiva sob o artigo 2065º.

SEGUNDA

Pelo presente contrato o primeiro outorgante dá de arrendamento à segunda, o aludido prédio rústico.

TERCEIRA

O prazo do arrendamento é de sete anos tacitamente prorrogável por sucessivos períodos de um ano e teve o seu início no dia 1 de outubro de 1998.

QUARTA

A renda anual é de 250.000$00 (duzentos e cinquenta mil escudos), a pagar até ao dia 29 de setembro do ano a que respeitar, no domicílio do primeiro outorgante.

QUINTA

O prédio arrendado destina-se à instalação de uma escola de equitação, tauromaquia e afins, no desenvolvimento do objeto da Associação e com o mesmo coincidente.

A segunda outorgante não poderá realizar quaisquer obras sem o consentimento expresso e dado por escrito do primeiro outorgante, ficando desde já autorizada a colocação da instalação elétrica, águas e saneamento, em todo o prédio, bem como a construção de um bar, com instalações sanitárias, com cerca de cinquenta metros quadrados, um picadeiro, com bancada respetiva, um pavilhão destinado a boxes, em forma de “U”, com a área máxima de 750 metros quadrados, em bloco de cimento ou tijolo, sendo que estas benfeitorias reverterão a favor dos senhorios, assistindo, no entanto, à inquilina o direito de reclamar daqueles o valor das mesmas ou o direito de retenção em relação ao locado, por aquele valor.

SÉTIMA

O primeiro outorgante obriga-se a adquirir o prédio objeto deste contrato, em qualquer partilha judicial ou extrajudicial, bem como a celebrar a competente escritura pública de arrendamento logo que o mesmo esteja registado a seu favor.

OITAVA

Para efeitos de celebração da escritura de arrendamento, o primeiro outorgante compromete-se a avisar a segunda do dia, hora e local em que a mesma será realizada, por carta registada, com aviso de receção, com a antecedência mínima de 15 dias (…). (C))

2.5. No mês de outubro de 1998 a autora começou por proceder à limpeza do prédio de silvas, pequenos arbustos e ervas, trabalhos com que a autora teve gastos com trabalhadores e máquina. (resposta aos quesitos 1º e 2º)

2.6. O terreno, à entrada para o lado esquerdo na parte onde fica o poço e o estanca-rios, apresenta-se mais alto em pelo menos 0,50 a 1,00 metros, numa área de entre 20 m2 a 50m2, em relação à área restante. (resposta ao quesito 3º)

2.7. Ainda no ano de 1998, a autora reconstruiu em pedra e cimento a parede de suporte da referida área, cimentou-a e levantou um gradeamento em ferro à volta. (resposta ao quesito 4º)

2.8. Com estes trabalhos a autora teve despesas. (resposta ao quesito 5º)

2.9. No ano de 1999 a autora construiu o picadeiro. (resposta ao quesito 6º)

2.10. Com vista à construção do picadeiro, a autora começou por definir uma área e, para isso, comprou e implantou no terreno prumos em madeira em pinho tratado com a altura de 2 metros e à distância cada um de 3 metros. (resposta ao quesito 7º)

2.11. A autora comprou os travessos de madeira em pinho tratado necessários para vedar e ligar o espaço entre cada prumo por 3 travessos. (resposta ao quesito 8º)

2.12. Aplanou o terreno com uma máquina e construiu valas para drenagem das águas. (resposta ao quesito 9º)

2.13. A autora deitou no terreno mais do que um camião de areia. (resposta ao quesito 11º)

2.14. A autora encomendou e colocou nas entradas do prédio dois portões de madeira. (resposta ao quesito 12º)

2.14.a) A autora comprou braçadeiras, rede, brocas, bicos, casquilhos, curvas, válvulas, arame, pregos, cofragem, verga de ferro, parafusos, tábuas, dobradiças e caixas estanques. (resposta ao quesito 13º)

2.14.b) A autora pagou ainda o custo do transporte de alguns dos referidos materiais. (resposta ao quesito 15º)

2.15. Com as obras mencionadas nas respostas aos quesitos 6º a 9º, 11º e 12º, a autora suportou despesas, tendo gasto €1.196,53 com os prumos e travessos em madeira, bem como €2.604,48 com os materiais e transportes referidos nos quesitos 13º e 15º. (resposta ao quesito 16º)

2.16. A autora instalou quatro postes em pinho tratado com a altura de 9 metros em quatro pontos definidos do terreno. (resposta ao quesito 17º)

2.18. Foram instalados holofotes naqueles postes. (resposta ao quesito 18º)

2.19. A autora definiu um espaço circular no prédio, destinado a garraiadas e vedou essa área em madeira. (resposta ao quesito 22º)

2.19.a) A autora comprou tochas, óleos, ferragens, rede, cordas, pregos, plásticos e fios elétricos. (resposta ao quesito 24º)

2.19.b) E custeou o transporte dos referidos materiais. (resposta ao quesito 25º)

2.20. Provado apenas que com os trabalhos referidos nas respostas aos quesitos 17º, 18º, 22º, 24º e 25º, a autora suportou as correspondentes despesas, consistentes em:

a) €16,96 pelos postes em pinho;

b) €1.200,00 pelos holofotes;

e) €9,08 pelos fios elétricos;

h) €157,46 na compra dos materiais indicados no quesito 24º;

i) €60,00 no custo do transporte. (resposta ao quesito 26º)

2.21. No ano de 2001 a autora construiu no terreno a sua sede com 50 metros quadrados. (resposta ao quesito 27º)

2.22. A sede foi levantada em blocos de cimento, com as paredes revestidas a cimento e pintura interior e exterior, o chão em cimento, com duas divisórias e a cobertura em telhas de lusalite. (resposta ao quesito 28º)

2.23. A sede dispunha de portas e janelas, um bar, uma sala e duas casas de banho, cada uma delas com porta para o exterior. (resposta ao quesito 29º)

2.24. A referida construção foi apoiada em colunas com formato quadrado, em madeira. (resposta ao quesito 30º)

2.25. A autora comprou anilhas, dobradiças, parafusos, fechaduras, fechos, pregos, cavilhas, caibros, colas, torneiras, tubos e grampos. (resposta ao quesito 32º)

2.25.a) E custeou o transporte de alguns dos materiais (resposta ao quesito 33º)

2.26. A autora equipou a sua sede com uma máquina de café, um frigorífico, uma arca frigorífica, cadeiras, mesas, prateleiras, uma banca em granito e louça de cozinha. (resposta ao quesito 34º)

2.27. Pelo menos no ano de 2002, a autora construiu ainda na parte norte do terreno cinco boxes para os cavalos e um alpendre. (resposta ao quesito 35º)

2.28. A referida estrutura foi levantada em blocos de cimento, com divisórias igualmente em blocos, e gradeamento em tubo galvanizado, com 1 metro por 3 metros de dimensão em cada box. (resposta ao quesito 36º)

2.29. A referida construção dispunha de pelo menos cinco portas, era suportada por colunas em madeira, coberta a telhas de lusalite, vigas de cimento, com chão em brita, areia e paralelo. (resposta ao quesito 37º)

2.30. A autora montou também toda a instalação elétrica, a canalização de água, bebedouros, comedouros e suportes de palha para os animais. (resposta ao quesito 38º)

2.31. Com a construção da sede e das boxes, a autora suportou os gastos para o efeito necessários, tendo suportado pelo menos os seguintes:

- em materiais de construção €4.500,00;

- no pagamento da mão de obra indicada em 31º €2.000,00;

- no pagamento do serviço da instalação de água e eletricidade a quantia de €350,16, conforme docs. 64 e 65 de fls. 97 e 98, e a quantia de €336,13 nos respetivos materiais conforme documentos 66 a 69 de fls. 99 a 102;

- no pagamento de bebedouros, comedouros e suportes de palha pelo menos a quantia de €192,30, conforme documento nº 63 de fls. 96. (resposta ao quesito 40º)

2.32. No ano de 2002, a autora construiu uma bancada em ferro galvanizado, com estrados e degraus em madeira. (resposta ao quesito 41º)

2.33. A autora comprou os materiais necessários para essa construção. (resposta ao quesito 42º)

2.34. Com esta construção a autora teve gastos com os materiais indicados em 41º e 42º, no montante de €862,08. (resposta ao quesito 45º)

2.35. Está instalado um balão de pressão no poço para assegurar o abastecimento de água. (resposta ao quesito 46º)

2.36. A autora desmontou os prumos e toda a vedação do picadeiro e instalou bases em betão nos prumos para os fixar e não cederem, montando depois tudo de novo. (resposta ao quesito 28º)

2.37. A autora contratou pessoal para esse trabalho. (resposta ao quesito 48º)

2.38. A autora vedou o terreno com rede de ovelheira e suportes em madeira. (resposta ao quesito 49º)

2.39. A autora plantou pelo menos onze cedros no terreno. (resposta ao quesito 50º)

2.40. A autora comprou os materiais necessários para esse efeito. (resposta ao quesito 51º)

2.41. Com estes trabalhos, a autora suportou as correspondentes despesas, tendo gasto pelo menos a quantia de €193,28 na rede ovelheira, conforme documento de fls. 88. (resposta ao quesito 52º)

2.42. Os réus passaram, por vezes, junto ao terreno, viram as obras à medida em que iam sendo executadas, e nunca mostraram qualquer tipo de discordância com as mesmas. (resposta ao quesito 54º)

2.43. No dia 29 de agosto de 2003 o falecido réu AA e a irmã, FF, enviaram uma carta à autora, junta aos autos como doc.s nºs 119 e 120, a fls. 151 e 152, com o seguinte teor: "AA (...) e irmã FF (..) vêm informar V. Ex.as de que não desejam prorrogar por qualquer outro período de tempo o arrendamento que persiste sobre o prédio rústico, de cultura de regadio e ramada, no lugar de ..., em ..., concelho de ... e inscrito na matriz sob o artigo 2065. O contrato de arrendamento por nós celebrado, pelo prazo de cinco anos e com início em 01 de outubro de 1998, tem o seu termo no próximo dia 30 de setembro do corrente ano (..) por esta forma se deixa denunciado o referido contrato de arrendamento, devendo V. Ex.as fazer a entrega do prédio em causa, a nós seus legítimos comproprietários, na data supra referida, livre e totalmente desocupada de pessoas e bens (...)". (D))

2.44. Após o facto referido em 2.43., a autora foi falar com o réu AA. (resposta ao quesito 56º)

2.45. Por carta datada de 6 de setembro de 2005 e expedida em 13-09-05, os réus comunicaram à autora "tal como já vos foi denunciado por escrito, vimos de novo confirmar que aguardamos a entrega do imóvel que ocupam e que aos signatários pertencem, no dia 30 de setembro do corrente, termo do prazo do arrendamento (...)", conforme documento junto a fls. 153, que aqui se dá por reproduzido, subscrito pelo falecido réu AA e pelos réus BB e BB. (E) e citado documento)

2.46. Pelo menos aos fins de semana, o local era frequentado cada dia por inúmeras pessoas, associados, familiares e amigos, que aí se demoravam a montar os cavalos e em garraiadas ou apenas a apreciar quem intervinha nessas atividades. (resposta ao quesito 57º)

2.47. A autora divulgava e promovia a cultura e desportos equestres e tauromáquico entre os moradores de ... e das vizinhas freguesias, e entre estas, ... e .... (resposta ao quesito 58º)

2.48. Após a comunicação referida em 2.45., os réus responderam que entendiam que o contrato se tinha prorrogado pelo menos por mais um ano. (resposta ao quesito 59º)

2.49. A autora informou também que pretendiam reunir-se com os réus para discutirem, o que foi aceite por estes. (resposta ao quesito 60º)

2.50. Em data não apurada de novembro de 2005, pelas 7.00 horas, o réu CC e o falecido réu AA, entraram no prédio referido em 2.1. pelo menos com uma máquina retroescavadora. (resposta ao quesito 61º)

2.51. Foram então deitados abaixo o picadeiro e a bancada, o sítio das garraiadas, e os postes de iluminação. (resposta ao quesito 62º)

2.52. Foi trancado o portão de acesso ao prédio com um cadeado. (resposta ao quesito 64º)

2.53. Previamente ao início das obras, a autora não pediu, nem obteve, licenciamento da Câmara Municipal de ..., das mesmas. (art. 15º da contestação dos réus AA e CC, não impugnado, e documento junto a fls. 603 a 610).

2.54. A autora requereu o licenciamento municipal de tais obras por requerimento entrado em 9/05/2002, conforme documento de fls. 604, que aqui se dá por reproduzido, do qual consta além do mais a informação datada de 2005/02/04: o projeto de arquitetura foi aprovado através do despacho datado de 2002/10/20. Decorridos mais de sies meses sobre a data da notificação, o requerente não solicitou a aprovação dos projetos de especialidades (…). Deverá o requerente ser notificado a (…) apresentar o projeto de arquitetura visando a eventual legalização da obra. (citado documento)

2.55. Por despacho de 31/05/2006, a autora foi notificada por aquela Câmara Municipal para apresentar no prazo de trinta dias projeto para eventual legalização das obras executadas sem licença ou autorização municipal, sob pena de, não o fazendo, iniciar-se processo com vista à reposição da legalidade, com recurso à demolição da obra executada ilegalmente, conforme documento de fls. 570 a 572 e a fls. 630, que aqui se dá por reproduzido. (art. 17º da contestação dos réus HH e CC, não impugnado, e citados documentos)

2.56. Decorrido o prazo fixado, a autora não apresentou qualquer projeto, tendo sido proposta a demolição após a audição do interessado. (art. 18º da contestação dos réus HH e CC, não impugnado, e citados documentos)

2.57. Por despacho de 28/04/2008, proferido pelo Senhor Vereador da Câmara Municipal de ..., foi suspenso o referido tratamento administrativo até decisão do tribunal, conforme documento de fls. 591 a 592 junto pela autora. (citado documento)

2.58. Para demolição de dois barracos em blocos de cimento (destinados um a bar, com retrete e outro a boxes) e transporte do entulho serão necessários pelo menos €3.300,00. (resposta ao quesito 70º)

2.59. Para abate, extração e transporte dos onze cedros existentes, são necessários €350,00. (resposta ao quesito 72º)

2.60. Para desmontagem da rede colocada pela autora e seu transporte para o Ecocentro de ..., são necessários €700,00. (resposta ao quesito 73º)

2.61. Desde o início, que os réus frequentaram as instalações da autora. (resposta ao quesito 77º)

2.62. Pelo menos o falecido réu AA recebia a renda paga pela autora. (resposta ao quesito 78º)

2.63. Pelas apresentações 31/011121 e 01/011220, desde 2001, foi inscrita a aquisição de ½ a favor de FF e de ½ a favor do falecido réu AA do prédio em questão, por partilha da herança de GG e marido HH, conforme certidão junta a fls. 122 a 126 dos autos de providência cautelar apensos. (certidão ora referida)

2.64. Em 12 de Fevereiro de 2007, o referido prédio (art. 2065º rústico) encontrava-se inscrito nos serviços de Finanças do concelho de ... a favor do falecido AA ( ½ ) e dos réus BB ( ¼ ) e CC ( ¼ ), conforme certidão de fls. 127 a 129 dos autos de providência cautelar apensos. (certidão ora referida)

2.65. Correu termos no Tribunal Judicial de ... ação para divisão de coisa comum com o nº 1526/06.8..., no ...º Juízo, em que eram requerentes o aqui falecido réu AA e o réu CC, e requerida a aqui ré BB e outro, tendo além do mais como objeto o prédio referido em 2.1., conforme certidão junta a fls. 136 a 140 dos autos de providência cautelar apensos.

II. Factos não Provados

2.66. Contratou 10 trabalhadores para com a sachola e o ancinho cavarem desnivelarem os cantos e as partes do terreno onde a máquina não chegava, abrir valas e comprimir o terreno; (resposta ao quesito 10º)

2.67. E custeou o gasóleo para as máquinas; (resposta ao quesito 14º)

2.68. Para os serviços referidos de 17º a 19º, contratou dois trabalhadores pelo período de dois dias; (resposta ao quesito 20º)

2.69. Para abrir as valas e fazer passar os tubos elétricos numa extensão de 500 metros contratou uma máquina por meio dia; (resposta ao quesito 21º)

2.70. Para o efeito, comprou dois tratores de madeira e contratou seis trabalhadores pelo período de um dia; (resposta ao quesito 23º)

2.71. Nesta construção trabalharam quatro pessoas durante vinte dias, com a remuneração diária de €50,00 cada; (resposta ao quesito 39º)

2.72. E custeou o transporte de alguns dos materiais; (resposta ao quesito 43º)

2.73. Para levantar a bancada contratou dois homens pelo período de quinze dias por €50,00 diários; (resposta ao quesito 44º)

2.74. Os réus CC e BB eram associados da autora, tomaram conhecimento antes da execução das obras e estiveram presentes na realização das mesmas; (resposta ao quesito 55º)

2.75. Arrancaram a instalação elétrica, os tubos de água e saneamento, as vedações, as portas, os holofotes, o motor de água, os equipamentos do bar e os cedros; (resposta ao quesito 63º)

2.76. A autora na pessoa dos seus diretores e associados viveu e vive um sofrimento mágoa profundos com a interrupção abrupta das suas atividades por parte dos réus; (resposta ao quesito 65º)

2.77. O prédio voltou ao estado de abandono em que se encontrava antes de ser dado de arrendamento à autora; (resposta ao quesito 66º)

2.78. A assinatura constante do documento junto de fls. 315 a 317 “AA” não foi feita pelo punho do réu AA; (resposta ao quesito 67º)

2.79. A assinatura “AA” constante do documento junto de fls. 151 não foi feita pelo punho do réu AA; (resposta ao quesito 68º)

2.80. As assinaturas “AA” e “CC” constantes do documento junto de fls. 153 não foram feitas pelo punho de cada um dos réus AA e CC; (resposta ao quesito 69º)

2.81. Para demolição do picadeiro os réus terão de pagar €2.700,00 a três trabalhadores pelo período de dez dias, €2.250,00 para cinco dias de máquina e €3.500,00para cinco dias de camião para transporte do entulho; A assinatura “AA” constante do documento junto de fls. 151 não foi feita pelo punho do réu AA; (resposta ao quesito 71º)

2.82. Pelos factos mencionados de 67º a 73º da base instrutória os réus sofreram e sofrem forte abalo psíquico; A assinatura “AA” constante do documento junto de fls. 151 não foi feita pelo punho do réu AA; (resposta ao quesito 74º)

2.83. A autora sabe que a ré BB não teve qualquer conhecimento ou intervenção nos factos mencionados da base instrutória; A assinatura “AA” constante do documento junto de fls. 151 não foi feita pelo punho do réu AA; (resposta ao quesito 75º)”.

B. De Direito

(In)admissibilidade do recurso

1. De acordo com o art. 629.º, n.º 1, do CPC, “O recurso ordinário só é admissível quando a causa tenha valor superior à alçada do tribunal de que se recorre e a decisão impugnada seja desfavorável ao recorrente em valor superior a metade da alçada desse tribunal, atendendo-se, em caso de fundada dúvida acerca do valor da sucumbência, somente ao valor da causa”.

2. A recorribilidade depende, pois, da proporção do decaimento, devendo este ser superior a metade da alçada do Tribunal que proferiu a decisão impugnada.

3. No caso em apreço, os Réus/Recorrentes/Reclamantes DD e CC ficaram vencidos em valor inferior a metade da alçada dos Tribunais da Relação. Com efeito, tendo a ação o valor de €126.053,41 e havendo os Réus sido condenados, pelo Tribunal da Relação de Guimarães, a pagar à Autora a quantia de €13.678,46 (treze mil, seiscentos e setenta e oito euros e quarenta e seis cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação, até integral pagamento, a decisão impugnada não é desfavorável para os Recorrentes em valor superior a €15.000,00. Por conseguinte, o recurso não é admissível.

4. É, assim, evidente que a decisão impugnada não é desfavorável aos Réus/Recorrentes/Reclamantes em valor superior a metade da alçada dos Tribunais da Relação (sucumbência), posto que esta, em matéria cível, está fixada em € 30.000,00 (arts. 629.º, n.º 1, e 635.º, n.º 4, do CPC, e art. 44.º, n.º 1, da LOSJ).

5. Com efeito, para que pudesse recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça, os Réus/Recorrentes/Reclamantes teriam de ter decaído, pelo menos, em € 15.000,01 – o que, manifestamente, não sucede.

6. Note-se, de resto, que os juros de mora vencidos na pendência da ação não relevam para a determinação do valor da causa, nem tão pouco podem ser levados em linha de conta para encontrar o valor da sucumbência com vista a apurar se a decisão é ou não recorrível.

7. Com efeito, de acordo com o art. 297.º, n.º 2, 2.ª parte, do CPC, “mas quando, como acessório do pedido principal, se pedirem juros, rendas e rendimentos já vencidos e os que se vencerem durante a pendência da causa, na fixação do valor atende-se somente aos interesses já vencidos”.

8. Compreende-se a irrelevância do pedido de juros para a determinação do valor da causa. É que o pedido de condenação em juros não constitui o objeto próprio da ação e está fora do âmbito da controvérsia, surgindo apenas como consequência da dedução do pedido principal.

9. Assim, se o pedido de condenação em juros não releva para a determinação do valor da causa, também não pode ser considerado para determinar o valor do decaimento do pedido com vista a apurar se a decisão é recorrível ou não.

10. O recurso de revista é inadmissível, sendo o valor da sucumbência, perante o acórdão do Tribunal da Relação, inferior a metade da alçada do Tribunal de que se recorre e não tendo por fundamento qualquer das situações previstas no art. 629.º do CPC.

11. Impõe-se, pois, concluir que, não ultrapassando a sucumbência dos Réus/Recorrente/reclamantes, perante o objeto do recurso, metade da alçada dos Tribunais da Relação, a revista é, no caso em apreço, inadmissível (arts. 629.º, n.º 1, 635.º, n.º 4, 671.º, n.º 3, do CPC, 672.º, do CPC, e art. 44.º, n.º 1, da LOSJ.

III – Decisão

Nos termos expostos, indefere-se a reclamação apresentada pelos Réus/Recorrentes DD e CC, confirmando-se o despacho reclamado e, por isso, não se admitindo o recurso por si interposto.

Custas pelos Réus/Recorrentes/Reclamantes, sem prejuízo do apoio judiciário de que possam beneficiar.

Lisboa, 20 de Setembro de 2023


Maria João Vaz Tomé (Relatora)

António Magalhães

Jorge Leal