Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00030626 | ||
Relator: | MIRANDA GUSMÃO | ||
Descritores: | CONCORRÊNCIA DESLEAL NOVIDADE FIRMA | ||
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Nº do Documento: | SJ199609260001762 | ||
Data do Acordão: | 09/26/1996 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Referência de Publicação: | BMJ N459 ANO1996 PAG562 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
Indicações Eventuais: | F CORREIA IN LIÇÕES DE DIR COM VOLI PÁG281 1973 PÁG263. P COELHO IN LIÇÕES DE DIR COM VOLI 1957 PÁG244. | ||
Área Temática: | DIR ECON - DIR CONC. DIR COM - MAR PATENT. | ||
Legislação Nacional: | CPI40 ARTIGO 4 ARTIGO 36 ARTIGO 37 ARTIGO 73 ARTIGO 74 A ARTIGO 79 ARTIGO 126 ARTIGO 141 A ARTIGO 162 ARTIGO 190. CCOM888 ARTIGO 27. DL 176/80 DE 1980/05/30 ARTIGO 7. DL 42/89 DE 1989/02/03 ARTIGO 1 N1 N2 ARTIGO 2 N1 N2 ARTIGO 3 N2 ARTIGO 5. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃO STJ DE 1991/05/23 IN BMJ N407 PAG571. | ||
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Sumário : | I - No domínio do Código Comercial, segundo o princípio da verdade, a firma deverá corresponder à situação real a que respeita, não podendo conter elementos susceptíveis de a falsear ou de provocar confusão, quer quanto à identidade do empresário, tratando-se de comerciante em nome individual, quer quanto à identidade dos sócios, tratando-se de uma empresa colectiva, quer, ainda, quanto à natureza da sociedade e à índole ou âmbito do próprio estabelecimento. II - O princípio da novidade (inconfundibilidade) da firma ou da denominação consagrado no artigo 27 do Código Comercial e no artigo 2 do Decreto-Lei 42/89, de 3 de Fevereiro, não tem aplicação aos comerciantes (pessoas colectivas) que exerçam actividades ou ramos de comércio diferentes. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I 1. No Tribunal Judicial da Comarca de Oeiras, A, Portuguesa - Viagens e Turismo Limitada intentou acção declarativa com processo ordinário contra B, pedindo a condenação deste - deixar de utilizar no nome do seu estabelecimento a palavra "Melia", bem como a não utilizar em todos os sinais e documentos identificativos do mesmo, e ainda a indemnizar a autora pelos danos resultantes da sua actuação ilícita, nos termos dos artigos 211 e 227 do Código de Propriedade Industrial e artigo 827-A, do Código Civil, em indemnização a liquidar em execução de sentença. Fundamenta o seu pedido nos seguintes factos: - além de ter registado a firma, tem ainda registados o nome e a insígnia relativos a "Mélia" sob o n. 3123, tem igualmente registadas as "marcas" cujo elemento nominal distintivos e o vocábulo "Mélia", com os ns. 223488 e 223489; - o Réu, abusiva e ilicitamente, está a utilizar o nome "Melia" na sua actividade comercial, designadamente como nome do seu estabelecimento de Mediação de propriedades, com a denominação de "Predial Melia"; - ao utilizar tal denominação o Réu está a agir de uma forma que constitui um evidente atropelo de elementares regras de lealdade da concorrência; - não obstante a oposição e a recusa da pretensão do Réu, este continua a utilizar a denominação com manifesto prejuízo para a Autora; - a utilização do vocábulo diferenciador pelo Réu acarreta prejuízos e danos comerciais avultados para a Autora, que de momento não é possível ainda computar. - Contestou o Réu alegando, além do mais, que a designação "Predial Melia" faz parte da denominação social de uma sociedade de que o mesmo é sócio-gerente. É essa sociedade e não o Réu a proprietária do estabelecimento em causa. - A autora requereu a intervenção principal de Predial Melia - Actividade Imobiliária Lda, o que veio a ser deferido e, por tal, a requerida citada apresentou contestação. - Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, tendo sido proferida sentença que julgou a acção improcedente em relação ao Réu B e condenou a Ré a deixar de utilizar o vocábulo "Melia" na sua firma, no seu estabelecimento e noutro meio de identificação, absolvendo-o do pedido de indemnização contra ela formulada. 2. Os Réus e a Autora apelaram. A Relação de Lisboa, por acórdão de 30 de Novembro de 1994, negou provimento aos recursos. 3. A interveniente "Predial Melia - Sociedade de Mediação Imobiliária Lda pede revista, formulando nas suas alegações, as seguintes conclusões: 1) Nos termos do artigo 190 do anterior Código de Propriedade Industrial "a prova dos direitos da propriedade industrial faz-se apenas por meio dos títulos de registo correspondente às diversas categorias nele reguladas", não podendo por isso, substituir-se esse meio de prova por outros documentos; a recorrida não exibiu no processo tais títulos, marca e insígnia que reivindica nem da denominação social que usa pelo que não se poderá ter dado como provada a matéria constante das alíneas A), B), C) da especificação, sendo, apesar disso, lícito a esse Tribunal, nos termos do n. 2 do artigo 722 do Código de Processo Civil, por se tratar de uma nítida violação da lei, reconhecer a ausência de prova bastante para prova do direito da recorrida. 2) Não pode haver reprodução parcial dos elementos nominativos que compõem as marcas e as insígnias e quer no douto acórdão recorrido quer na decisão de primeira instância, levou-se apenas em conta que na insígnia n. 3123 e nas marcas ns. 223988 e 223989 o elemento nominal distintivo e o vocábulo "Meliá" tendo-se desprezado as letras VM que, como se pode verificar dos documentos juntos aos autos, são, aliás, as mais salientes do conjunto nominativo. 3) Tendo-se em conta que: a recorrida usa a denominação social Meliá Portuguesa - Viagens de Turismo Lda e a recorrente "Predial Meliá" - Sociedade de Mediação Imobiliária Lda; a recorrida se dedica ao exercício da actividade de turismo e agência de viagens e a recorrente tem como actividade de mediação no ramo imobiliário e ainda de que, como foi dada como provado, a recorrente apenas utiliza simultaneamente os elementos conjugados de "Predial Meliá", sendo este último correspondente ao diminutivo de Amélia, não é possível concluir pela existência de semelhanças que induzam em confusão. 4) A recorrente e a recorrida têm actividades completamente diferentes e as denominações sociais, entre si ou com as marcas e insígnia, não são confundíveis, pois nem sequer os elementos de fantasia são iguais (sobretudo no aspecto fonético e gráfico) e, sobretudo, por a denominação social e o nome do estabelecimento da recorrente serem sempre precedidos da palavra "Predial" o que lhe confere uma individualidade e eficácia distintiva que permite aos comerciantes e consumidores distingui-lo do nome, da denominação social e marcas da recorrida. 5) Os vocábulos a analisar não poderão ser "Meliá" e "Mélia" isoladamente, como se fez no douto acórdão recorrido, mas sim as denominações de cada uma das sociedades ou, no mínimo, os vocábulos "Predial Mélia" e "VM Meliá" pelo que não existe semelhança gráfica, fonética ou gramatical entre os vocábulos em confronto. 6) Mas ainda que se entendesse, na esteira do decidido no acórdão de 23 de Maio de 1991 publicado no B.M.J. n. 407, páginas 571 e seguintes, o princípio da novidade da firma ou denominação social não se aplica aos comerciantes que exercem actividades ou ramos de comércio diferentes, pois, nestas situações, não há o perigo de confusão das denominações que permita a um dos comerciantes a apropriação da clientela e dos fornecedores do outro. 7) O douto acórdão recorrido violou o disposto no artigo 190 do anterior Código da Propriedade Industrial e n. 1 do artigo 6 do actual C.P.I. e bem assim os artigos 228 e 229 e alínea a) do n. 1 do artigo 231 do actual Código de Propriedade Industrial, o n. 1 do artigo 1 e n. 2 do Decreto-Lei n. 42/89, de 3 de Fevereiro e artigos 141 e 142 do C.P.I. 4. A recorrida não apresentou contra-alegações. Corridos os vistos, cumpre decidir. II Elementos a tomar em conta: 1) A Autora usa a denominação social Meliá Portuguesa - Viagens e Turismo Limitada, tendo sido constituída em 15 de Março de 1967 e tendo por objecto principal o exercício de qualquer actividade comercial ou industrial de turismo, agência de viagens, transportes e representações, assim como o planeamento, construção e exploração de hotéis e ainda a exploração de qualquer ramo de comércio e indústria para que não seja necessário autorização especial e que o Conselho de Administração resolva explorar (alínea a) da especificação). 2) A Autora tem registado em seu nome a designação e insígnia "Meliá" sob o n. 3123 - alínea b) da especificação. 3) A Autora tem registadas as marcas cujo elemento nominal distintivo é o vocábulo "Meliá" com os ns. 223988 e 223989 - alínea c) da especificação. 4) Através do D.R. III série de 24 de Novembro de 1988 foi publicitada a constituição da Ré por escritura de 4 de Novembro de 1988. 5) Em 20 de Março de 1987 o primitivo Réu apresentou o pedido de inscrição do nome "Predial Meliá", relativamente ao qual foi indicado como motivo de recusa o artigo 144 n. 6 do Código de Propriedade Industrial. 6) Em 20 de Março de 1987 o Réu B pediu em seu nome a inscrição do estabelecimento denominado "Predial Meliá" sito na Avenida ..., que actualmente é explorado pela chamada sociedade "Predial Mélia Limitada". 7) A denominação usada pela Autora e referida em 1) é o primeiro vocábulo distintivo do seu grupo internacional de empresas de viagens e turismo, com património imobiliário em diversos países. 8) A denominação referida em 6) consta da lista telefónica para identificar o mencionado estabelecimento situado na avenida ... . 9) A Autora é notoriamente conhecida apenas por "Meliá" junto dos seus clientes e nos mercados nacional e internacional, sendo esse nome que a situa no grupo empresarial de nível mundial a que está. 10) O Réu é apenas mediador de seguros e no exercício dessa sua actividade usa o nome individual, B. 11) A expressão "Mélia" da Ré Predial Mélia - Actividade Imobiliária Limitada, corresponde ao diminutivo de Amélia, o nome da mãe do principal sócio-gerente. 12) Aparecendo sempre precedido do vocábulo "Predial". 13) O nome "Predial Mélia" já figurava na lista telefónica de 1 de Julho de 1988. III Questões a apreciar no presente recurso. - A apreciação e a decisão do presente recurso, delimitada pelas conclusões das alegações, passa pela análise de duas questões: a primeira, se não poderia ter sido dada como provada a matéria constante das alíneas A), B), C) da especificação; a segunda, se entre a denominação social Meliá Portuguesa - Viagens de Turismo Limitada e a "Predial Melia - Sociedade de Mediação Imobiliária não é possível concluir pela existência de semelhanças que induzam em confusão. Abordemos tais questões. IV Se não poderia ter sido dada como provada a matéria constante das alíneas A), B) e C) da especificação. 1. Posição da Relação e da recorrente: 1a) A Relação de Lisboa decidiu que com a petição inicial juntou a Autora documentação comparativa do registo a que o artigo 190 do Código de Propriedade Industrial faz referência e com base nos quais fundamentou o seu direito e formulou o pedido. Tais documentos não foram impugnados, quer pelo Réu, quer pela chamada. Sendo assim, há que admitir o que deles consta em relação ao articulado pela Autora, como verdadeiro. E foi com base neles, e por isso, que se formularam as alíneas A), B) e C) da especificação, em que se faz referência expressa à documentação junta. 1b) Por sua vez, a recorrente sustenta que, por um lado, os documentos juntos aos autos não provam os direitos de propriedade industrial invocados pela Autora, na medida em que o artigo 190 do Código de Propriedade Industrial fala em títulos de registo e não somente em registo, uma vez que só através do título é que pode surpreender-se quem é o actual titular dos direitos. Por outro lado, na apreciação do direito não pode ter-se apenas em conta que a marca e a insígnia da recorrida são compostas por um único elemento nominal distintivo que é o vocábulo "MELIA". É que embora tal facto resulte da alínea C) da especificação, sempre se fez questão de salientar que as marcas ns. 223988 e 223989 além do vocábulo "MELIÁ" incluem as letras "VM". Que dizer? 2. Na interpretação do artigo 190 do anterior Código da Propriedade Industrial (que prescreve "A prova dos direitos de propriedade industrial referidos no presente diploma faz-se por meio dos títulos de patente, de depósito e de registo correspondentes às diversas categorias nele reguladas) há que ter em conta diversos elementos, sobressaindo o elemento sistemático, que é constituído pelas disposições do instituto (tema, matéria, etc) em que se integra a norma interpretanda e pelas disposições reguladoras de institutos ou problemas afins. Analisando-se os diversos direitos de propriedade industrial - patente (artigos 4 a 36), modelos (artigos 37 a 73), marcas (artigos 74 a 162) nome e insígnia do estabelecimento (artigos 141 a 162) constata-se que os processos de concessão desses direitos terminam com a recusa ou a atribuição de um certificado ou título - patente e depósito nos modelos e recusa ou registo - marcas, nome e insígnia do estabelecimento. Sendo assim, o artigo 190 tem o sentido de a patente e o depósito de modelos serem provados através de título e a marca, nome e insígnia do estabelecimento serem provados através do registo. 3. A marca é um sinal distintivo de mercadorias ou produtos (artigo 74 do Código de Propriedade Industrial ou de serviços (artigo 7 do Decreto-Lei n. 176/80, de 30 de Maio, que pode ser constituída por um sinal ou conjunto de sinais nominativos (marca nominativa) figurativos ou emblemáticos (marca figurativa ou emblemática) ou por uma e outra coisa conjuntamente (marca mista) - artigo 79 do Código de Propriedade Industrial anterior. 4. Face ao resultado interpretativo a que se chegou do artigo 190 do Código de Propriedade Industrial anterior, tem-se como correcta a decisão da Relação de Lisboa em manter a matéria fáctica das alíneas A) e B) da especificação (a referida em 1) e 2), parágrafo II do presente acórdão). Na verdade, os documentos juntos a folhas sete e catorze comprovam tal matéria. 5. Face a noção, composição e prova das marcas, não se tem como correcta a decisão da Relação de Lisboa em manter a matéria fáctica vasada na alínea c) da especificação (a referida em 3), parágrafo II do presente acórdão). Na verdade, o documento de folha dezasseis prova que a Autora tem registadas duas marcas compostas pelos mesmos sinais nominativos: as letras VM e o vocábulo MELIA. Conclui-se, assim, que não podia ser dada como provada, como o foi, a alínea c) da especificação, dado o que se encontra provado, face ao citado documento, é que a Autora tem registadas duas marcas com as letras VM e o vocábulo MELIA. V Se não existe confundibilidade dos elementos "PREDIAL MÉLIA" E "MELIÁ PORTUGUESA - VIAGENS E TURISMO, LDA. 1. Posição da Relação e da recorrente. 1a) A Relação de Lisboa decidiu existir confundibilidade dos elementos "Predial Mélia" e "Meliá Portuguesa - Viagens e Turismo Lda" por, por um lado, pode dizer-se facto notório o conhecimento que grande parte das pessoas terá do nome Melia como empresa ligada a turismo - viagens e estadias em hotéis, pelo que, aparecendo uma empresa com idêntico nome - MELIA, com ou sem acento no "e" e Melia, com ou sem acento no "a" - poderá criar-se no homem médio a convicção de que se está perante empresas ligadas uma à outra: sabendo-se que a Autora é uma grande empresa, ou tida como tal, as pessoas poderão ser levadas a pensar que a empresa da Ré, já ligada à da Autora, terá um grande suporte financeiro. Julga-se, por isso, que há possibilidade de criar confusão no "homem médio" o uso da palavra "Melia" ou "Mélia" por parte da Ré recorrente. Por outro lado, a possibilidade de criar confusões no homem médio continua a existir ainda que, como no caso, se trate de empresas com ramos de negócio diferentes, porquanto, se para o público - os clientes - pode não haver perigo de confusão, esse perigo continua a subsistir, por exemplo, para os fornecedores de matérias primas, para os bancos, etc" - Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, volume I, página 281). 1b) Por sua vez, a recorrente sustenta que não existe possibilidades de confusão entre os elementos Predial Mélia e Meliá Portuguesa - Viagens e Turismo, Lda, porquanto: - a expressão "Predial Mélia" é suficientemente objectiva para transmitir ao público a mensagem da actividade que lhe está subjacente. - no juízo a desenvolver para se aquilatar das semelhanças ou diferenças, sobretudo pelo facto apurado de a palavra "Predial" preceder sempre "Mélia", não se pode considerar isoladamente um só elemento mas sim as denominações sociais completas ou, pelo menos, os outros conjuntos das marcas figurativas PREDIAL MÉLIA. - o confronto assim operado não pode de forma alguma suscitar confusões ao homem médio, até porque o cidadão interessado numa viagem jamais se deixará seduzir pela denominação "PREDIAL MÉLIA", e nem a própria recorrente jamais poderia prestar-lhe quaisquer serviços para satisfazer semelhante pretensão. - de acordo com o entendimento perfilhado no acórdão de 23 de Maio de 1991, publicado in B.M.J. 407, páginas 571 e seguintes, "o princípio da novidade da firma não tem aplicação aos comerciantes que exerçam actividades ou ramos de comércio diferentes, pois, nestas situações, não há perigo de confusão das denominações que permita a um dos comerciantes a apropriação da clientela e dos fornecedores de outro comerciante". Que dizer? 2. No domínio do Código Comercial, segundo o princípio da verdade, a firma (formada, conforme os casos, por um ou vários nomes de pessoas, completos ou abreviados - firma - nome -, por uma expressão alusiva ao comércio exercido na empresa - firma- denominação -), deverá corresponder à situação real a que respeita, não podendo conter elementos susceptíveis de a falsear ou de provocar confusão, quer quanto à identidade do empresário (tratando-se de comerciante em nome individual) quer quanto à identidade dos sócios (tratando-se de uma empresa colectiva) quer ainda quanto à natureza da sociedade e à índole ou ao âmbito do próprio estabelecimento" (FERRER CORREIA, Lições de Direito Comercial, volume I, 1973, página 263). - Este princípio, com o alcance dado por FERRER CORREIA, é realçado no artigo 1 n. 1 do Decreto-Lei 42/89, de 3 de Fevereiro, que enuncia que "os elementos componentes das firmas e das denominações devem ser verdadeiros e não induzir (não incutir) em erro sobre a identificação, natureza ou actividades do seu titular". - O n. 2 do artigo 1 do mesmo diploma legal, proíbe, com vista a proteger este princípio, o uso de certos elementos e expressões nas firmas, sendo certo que este princípio apresenta consagração diversa, conforme se refere à firma originária ou à firma adquirida (PUPO CORREIA, Direito Comercial, 3. edição, páginas 153 a 156). 3. O princípio da novidade da firma estava consagrado no artigo 27 do Código Comercial, que prescrevia que "a firma que cada comerciante adoptar deve ser completamente distinta das que já se achavam registadas na respectiva jurisdição; - Tal norma, tomado no seu sentido literal, torna muito difícil, quando não impossível, a constituição de firmas novas: por exemplo, nos casos de homonímia. Daqui que FERRER CORREIA tenha firmado a doutrina de que "novidade significa o mesmo que inconfundibilidade", porquanto "o princípio da novidade destina-se a permitir a terceiros a fácil identificação dos comerciantes com quem pretendam entrar em relações negociais. "Ora é evidente que esta identificação continua a ser possível, mesmo nos casos em que as firmas contenham elementos comuns. - O que se impõe é que estes elementos comuns não sejam os prevalecentes, isto é, os mais adequados a perdurar na memória do público, a impressionar". (obra citada, página 279. 4. À sombra do Código Comercial discutia-se o problema de saber se o princípio da novidade deveria valer para os comerciantes que o fossem de ramos diferentes. Para PINTO COELHO deveria, nestes casos, considerar-se legitimo o registo de firmas idênticas ou confundíveis (se olhadas em si mesmas) porque não haveria aí possibilidade de inferência entre a esfera em que opera uma e aquela em que opera a outra" (Lições de Direito Comercial, 1. volume, 1957, página 244). Para FERRER CORREIA, ainda aqui a diferenciação das firmas se impõe: é que, se para o público - os clientes - pode não haver perigo de confusão, este perigo continua a subsistir, por exemplo, para os fornecedores de matérias primas, para os bancos, etc. O princípio da novidade não se destina a proteger o titular da firma registada, mas ainda todos os terceiros que possam vir a ter relações negociais com a empresa. Por isso, o princípio da novidade vem a traduzir-se na atribuição ao titular de qualquer firma registada de um direito absoluto ou de exclusão dentro da área em que o referido princípio tem eficácia (obra citada, página 281). 5. O realce dado pelo Decreto-Lei n. 42/89 ao princípio da exclusividade é muito grande; basta analisar os artigos 2 ns. 1 e 2, 5 e 3 n. 2. Da análise de tais normas verifica-se que, por um lado, o sentido deste princípio não consiste em que não hajam elementos comuns entre as firmas: o que é necessário é que as novas firmas não sejam confundíveis com as anteriores quando encaradas de modo global. E o critério a usar para apurar essa inconfundibilidade deve ser o de verificar "com referência à diligência normal do homem médio, se uma firma pode ser confundida com outra, se uma pessoa que tinha em mente o nome de uma firma e pretendia dirigir-se a esta, poderá ser induzida em erro pela semelhança do nome e dirigir-se, portanto, à outra firma. A possibilidade de confusão deve subsistir de modo objectivo" (FERRER CORREIA, obra citada, página 280). Por outro lado, à luz do disposto no n. 2 do artigo 2 (que prescreve: "No juízo sobre a distinção e a insusceptibilidade de confusão ou erro, devem ser considerados o tipo de pessoa, o seu domicílio ou sede e, bem assim, a afinidade ou proximidade das actividades exercidas ou a exercer e o âmbito territorial destas") afigura-se-nos liquido que o problema da novidade (inconfundibilidade) não se põe em relação a firmas de comerciante (ou pessoas colectivas) que exerçam actividades de ramos diferentes. Se a solução dada por tal norma possa parecer criticável "de iure condendo" (atentas as observações e a tese defendida por FERRER CORREIA a diferenciação de firmas impõe-se, ainda, que diferentes os ramos de actividade - obra citada, página 281), o certo é que não subsiste presentemente os perigos que o insigne PROFESSOR apontava nas suas Lições de 1973, uma vez que é sabido "que as empresas muito se têm modernizado, informatizando os seus serviços, e atendem a continuar essa modernização. Hoje não têm razão de ser os perigos apontados por FERRER CORREIA e, tanto assim é, que o legislador adoptou, como vimos, a solução de não ter aplicação o princípio da novidade da firma ou de denominação social aos comerciantes (pessoas colectivas) que exercem actividades ou ramos de comércio diferentes. Solução que se enquadra no artigo 27 do Código Comercial conforme doutrina firmada no acórdão deste Supremo Tribunal de 23 de Maio de 1991 - B.M.J. n. 407, página 571. 6. Face às considerações expendidas em 2) e 5), em conjugação com a matéria fáctica fixada pela Relação, verifica-se que enquanto a Autora Meliá Portuguesa - Viagens e Turismo Lda tem a sua sede em Lisboa e objecto principal o exercício de qualquer actividade comercial ou industrial de turismo, agência de viagens, transportes e representações, assim como o planeamento, construção e exploração de hotéis e ainda a exploração de qualquer ramo de comércio e indústria para que não seja necessária autorização especial e que o conselho de administração resolva explorar, a chamada Predial Mélia - Actividades Imobiliárias tem a sua sede em Oeiras e por objecto, conforme ressalta da sua própria denominação, a actividade imobiliária - mediação. Autora e chamada exercem actividades diferentes, actividades que ressaltam ao homem médio, - face às próprias denominações de sorte que não há o perigo de confusão quer por parte da clientela de cada uma quer da parte dos fornecedores e dos bancos. Conclui-se, assim, não existir confundibilidade dos elementos PREDIAL - MÉLIA e "MELIÁ PORTUGUESA - VIAGENS E TURISMO LDA". VI Conclusão: Do exposto, poderá extrair-se que: "O princípio da novidade (inconfundibilidade da firma ou da denominação consagrado no artigo 27 do Código Comercial e no artigo 2 do Decreto-Lei n. 42/89, de 3 de Fevereiro, não tem aplicação aos comerciantes (pessoas colectivas) que exerçam actividades ou ramos de comércio diferentes". Face a tal conclusão, em conjugação com os elementos reunidos nos autos, poderá precisar-se que: 1) Não há possibilidade de confusão entre a Autora - que tem por objecto actividades ligadas ao turismo e planeamento e construção de hoteis - e a Ré - que tem por objecto a actividade imobiliária - mediação. 2) O acórdão recorrido merece censura por não ter observado o afirmado em 1). Termos em que se concede a revista e, assim, revoga-se o acórdão recorrido, com substituição por outro a absolver a chamada Predial Mélia - Actividades Imobiliárias Lda do pedido de condenação a deixar de utilizar no nome do seu estabelecimento a palavra "Melia". Custas pela Autora e nas instâncias e neste Supremo Tribunal. Lisboa, 26 de Setembro de 1996 Miranda Gusmão, Sá Couto, Sousa Inês. Datas das decisões impugnadas: I - 21 de Maio de 1994. II - 30 de Novembro de 1994. |