Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 3ª SECÇÃO | ||
Relator: | SOUSA FONTE | ||
Descritores: | RECURSO PENAL COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA IN DUBIO PRO REO DUPLA CONFORME ADMISSIBILIDADE DE RECURSO REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS PENA ÚNICA MEDIDA CONCRETA DA PENA IMAGEM GLOBAL DO FACTO PLURIOCASIONALIDADE FUNDAMENTAÇÃO | ||
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Data do Acordão: | 03/17/2016 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | RECURSO PENAL | ||
Decisão: | PROVIDO PARCIALMENTE | ||
Área Temática: | DIREITO PENAL - CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS DO FACTO / PENAS ESCOLHA E MEDIDA DA PENA / REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS. DIREITO PROCESSUAL PENAL - SENTENÇA ( NULIDADES ) - RECURSOS / ADMISSIBILIDADE DO RECURSO / PODERES DE COGNIÇÃO DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA. | ||
Doutrina: | - Alberto do Reis, “Código de Processo Civil”, anotado, vol. 5, 140. - Antunes Varela e Outros, Manual de Processo Civil, 669. - Eduardo Correia, Direito Criminal, II, 382. - Figueiredo Dias, Direito Penal Português - As Consequências Jurídicas do Crime, (1993), 232, 291; Direito Penal, Parte Geral, Tomo I, 2ª edição, 81, 84, 220, 248, 274. - Miguel Teixeira de Sousa, Estudos Sobre o Novo Processo Civil, 221, 222 - Oliveira Mendes, no “Código de Processo Penal” Comentado, Almedina, 2014, 1183/84. - Rodrigues Bastos, Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III (1972), 246. - Taipa de Carvalho, Direito Penal, Parte Geral – Questões Fundamentais, 83 e 84. | ||
Legislação Nacional: | CÓDIGO DE EXECUÇÃO DAS PENAS E MEDIDAS PRIVATIVAS DA LIBERDADE, APROVADO PELA LEI N.º 115/2009, DE 15 DE OUTUBRO: - ARTIGO 2.º. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL (CPP): - ARTIGOS 379.º, N.º2, 400.º, N.º 1, AL. F), 410.º, N.º2, 414º, Nº 2, 420.º, N.º 1, ALÍNEA B), 432.º, N.º 1, AL. B), 434.º. CÓDIGO PENAL (CP): - ARTIGOS 9.º, 40.º, N.º1, 71.º, N.º1, 72.º. CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA PORTUGUESA (CRP): - ARTIGO 32.º, N.º1. D.L. N.º 401/82, DE 23 DE SETEMBRO, REGIME PENAL ESPECIAL PARA JOVENS: - ARTIGO 4.º. | ||
Jurisprudência Nacional: | ACÓRDÃOS DO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: -DE 11.02.09, Pº 113/09-3ª; DE 04.03.09, Pº 160/09-3ª; DE 25.03.09, Pº 486/09-3ª; DE 16.04.09, Pº 491/09-5ª; DE 29.04.09, Pº 391/09-3ª; DE 07.05.09, Pº 108/09-5ª; DE 27.05.09, Pº 384/07.0GDVFR.S1-3ª, DE 12.11.2009, Pº Nº 200/06.0JAPTM-3ª, DE 23.06.10, P.º N.º 1/07.8ZCLSB.L1.S1-3.ª, DE 09.06.2011, P.º N.º 4095/07.8TPPRT.P1.S1- 5.ª, DE 26.04.2012, P.º N.º 438/07.2PBVCT.G1.S1-5.ª, DE 12.09.2012, P.º N.º 269/08.2TABNV.L1.S1-3ª E DE 29.05.2013, Pº Nº 344/11.6JALRA.E1). ACÓRDÃOS DE 11.06.2014, P.º N.º 54/12.7SVLSB.L1.S1 E DE 10.09.2014, P.º N.º 223/10.4SMPRT.P1.S1-3.ª. -DE 12.11.2009, Pº Nº 200/06.0JAPTM-3.ª E DE 20.10.2010, P.º N.º 651/09.8PBFAR.E1.S1-3.ª. -DE 29.03.2012, P.º N.º 316/07.5GBSTS.S1-3ª; DE 26.04.2012, P.º N.º 70/08.3ELSB.L1.S1-5.ª; DE 21.06.2012, P.º N.º 778/06.8GAMAI.S1-5.ª; DE 05.07.2012, P.ºS N.ºS 246/11.6SAGRD.S1 E 145/06.SPBBRG.S1; DE 15.11.2012, P.º N.º 178/09.8PQPRT-A.P1.S1, DE 14.03.2013, P.º N.º 287/12.6TCLSB, DE 30.04.2013, P.º N.º 11/09.0GASTS.S1, DE 13.05.2013, P.º N.º 392/10.3PCCBR.C2.S1, E DE 06.03.2014, P.º N.º 352/10.4PGOER.S1, TODOS DA 3.ª SECÇÃO. -DE 26.02.2014, P.º N.º 732/11.8GBSSB.L1.S1 E DE 10.09.2014, P.º N.º 223/10.4SMPRT.P1.S1. -DE 26.03.2014, P.º N.º 15/10. 0JAGRD.E2.S2-3.ª SECÇÃO. -DE 10.09.2014, P.º N.º 223/10.4SMPRT.P1.S1, 3.ª SECÇÃO. -DE 20.09.2007, P.º N.º 2820/07-5ª SECÇÃO, DE 02.04.2008, P.º N.º 803/07-3.ª SECÇÃO, DE 25.06.2008, P.º N.º 1412/08-5.ª SECÇÃO, DE 09.06.2010, P.º N.º 468/06.1PGLSB.S2-5.ª SECÇÃO, DE 17.02.2011, P.º N.º 518/03.3TAPRD-A.S1-5.ª SECÇÃO, DE 16.03.2011, P.ºS NºS 92/08.4GDGMR.S1 E 188/07.0PBBRR.S1, AMBOS DA 5.ª SECÇÃO, DE 05.06.2012, P.º Nº 1276/10.0PAESP.P1.S1-3.ª SECÇÃO, DE 28.06.2012, P.º N.º 14447/08.0TDPRT.S1-5.ª SECÇÃO, DE 15.11.2012, P.º N.º 5/04.2TASJP.P1.S1-3.ª SECÇÃO, DE 21.03.2013, P.º N.º 153/10.0PBVCT.S1-3.ª SECÇÃO, DE 04.07.2013, P.º N.º 144/10.0JBLSB.L1.S1-5.ª SECÇÃO, DE 20.02.2014, P.º N.º 99/12.7JALRA.L1.S1-5.ª SECÇÃO, DE 26.02.2014, P.º N.º 732/11.8GBSSB.L1.S1, DE 06.03.2014, P.º N.º 352/10.4PEOER.S1-3.ª SECÇÃO, DE 07.05.2014, P.º N.º 9/10.6PCLRS:L1.S1-5.ª SECÇÃO, DE 25.06.2014, P.º N.º 14447/08.0TDPRT.S1-3.ª SECÇÃO, DE 19.02.2015, P.º N.º 1735/10.5PBGMR.S1-5.ª SECÇÃO, DE 15.04.2015, P.º N.º 1474/12.2PJPRT.P1.S1-5.ª SECÇÃO, DE 11.06.2015, P.º N.º 401/13.4JAPRT.P1.S1-5.ª SECÇÃO E DE 18.02.2016, P.º N.º 2927/13.0TAMAI.P1-3.ª SECÇÃO. | ||
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Sumário : | I - O princípio in dubio pro reo é um princípio geral, estruturante do processo penal, decorrente do princípio da presunção da inocência do arguido e, como tal, assume a natureza de uma questão de direito de que o STJ, como tribunal de revista, deve conhecer. A pretensa violação do princípio in dubio pro reo invocada pelos recorrentes reconduz-se a uma discordância sobre a matéria de facto dada como provada, pelo que, estando em causa uma pura decisão sobre a matéria de facto, corroborada pelo acórdão da Relação, não pode o STJ, funcionando como 2.ª instância de recurso, como tribunal de revista, intrometer-se nessa decisão, como resulta do art. 434.º, do CPP, tanto mais que não se vislumbram qualquer dos vícios a que alude o art. 410.º, n.º 2, do CPP. II - É de rejeitar parcialmente o recurso, nos termos dos arts. 432.º, n.º 1, al. b) e 400.º, n.º 1, al. f), do CPP, por existir dupla conforme, no que diz respeito às penas parcelares de 7 e 5 anos de prisão, aplicadas pelo tribunal colectivo e confirmadas pelo tribunal da Relação. Constitui jurisprudência uniforme do STJ que, no caso de concurso de crimes, só é admissível recurso para o STJ relativamente aos crimes punidos com pena de prisão superior a 8 anos de prisão e/ou à pena conjunta superior a essa medida. III - O dever de fundamentação da pena única não tem que assumir nem o rigor nem a extensão exigidos para a fundamentação das penas parcelares, sendo que só a falta absoluta de fundamentação, embora referida ou aos fundamentos de facto ou aos fundamentos de direito, é que conduz à nulidade da decisão. No caso, a fundamentação é deficiente, mas não inexistente, pelo que inexiste qualquer nulidade, sendo que mesmo que de nulidade se tratasse, o vício sempre seria suprido pelo STJ, nos termos da parte final do n.º 2 do art. 379.º do CPP, pois que os factos provados mostram-se suficientes para alicerçar uma fundamentação completa da medida da pena única. IV - O STJ tem vindo a entender, sem divergências, que, no caso de concurso de crimes, as circunstâncias susceptíveis de justificarem a atenuação especial da pena, por aplicação quer do regime especial para jovens, quer do regime geral do art. 72.º, do CP, actuam no momento da determinação da medida concreta de cada uma das penas singulares e não (ou também não) no momento da determinação da pena única. V - Nos termos do art. 77.º, n.º 1, do CP, a medida da pena única é fixada em função dos critérios gerais da culpa e das exigências de prevenção estabelecidos nos arts. 40.º, n.º 1 e 71.º, n.º 1 e, ainda, do critério especial da 2.ª parte do referido preceito, isto é, na medida da pena do concurso são também necessariamente considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente, por forma a ter uma imagem da gravidade do ilícito global, bem como a, na avaliação da personalidade do agente, verificar se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade. VI - A conduta dos arguidos, assaltando uma residência e agredindo os seus habitantes (3 irmãos, todos de idade avançada) causou um intolerável alarme social, sendo, as exigências de prevenção geral elevadas. A culpa também se situa num patamar elevado, uma vez que os recorrentes planearam o assalto, actuando com dolo intenso. A ausência de antecedentes criminais dos arguidos, conjugada com a sua juventude, não permite concluir que os crimes praticados são reconduzíveis a uma carreira criminosa ou a uma tendência criminosa, ou mesmo a mera pluriocasionalidade, pelo que não se pode atribuir à pluralidade de crimes praticados um efeito especialmente agravante. Tudo ponderado, entende-se ser de aplicar ao arguido X a pena única de 8 anos de prisão (em vez da pena 10 anos de prisão) e ao arguido Y a pena única de 8 anos e 6 meses de prisão (em vez da pena de 10 anos de prisão), residindo entre arguidos, nos facto de o arguido X à data dos factos ter apenas 19 anos de idade. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça 1.Relatório 1.1. No processo em epígrafe, da comarca do Porto, Vila do Conde – Inst. Central – 2ª Secção Criminal – J3, responderam, com outros, os arguidos – AA, nascido em ...., filho de ... e de ... solteiro, residente na Rua ..., e – BB, nascido em ... em ..., filho de ... residente na ..., sob a acusação de cada um deles ter praticado, em co-autoria material e concurso real, 3 crimes de roubo, na forma consumada, p. e p. pelos arts. 210º, nºs 1 e 2-alínea b), e 204º, nº 2-alíneas e) e g), do CPenal. A final, cada um deles foi condenado, pela prática de três crimes de roubo agravado, p. p. pelos arts. 210°, n°s 1 e 2-alínea b), e 204º, n° 2- alíneas d) e e), do CPenal, – em 7 (sete) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da ofendida CC; – em 5 (cinco) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da ofendida DD; – em 5 (cinco) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa do ofendido EE. Em cúmulo jurídico foi, cada um dos Arguidos, condenado na pena conjunta de 10 anos de prisão (acórdão de fls. 2229 e segs.). 1.2. Inconformados, ambos interpuseram recurso para o Tribunal da Relação do Porto que, pelo acórdão de 30.09.2015, fls. 2563 e segs., lhes negou provimento e confirmou a decisão da 1ª Instância. 1.3. Ainda inconformados, recorreram para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo terminado as respectivas motivações com as seguintes conclusões que transcrevemos: 1.3.1. O arguido BB (fls. 2636 e segs.): «i PRINCÍPIO “ IN DÚBIO PRO REO” 1. Cita o douto Acórdão: - O Recorrente BB alega que "a sentença recorrida, para além da não relevância e enquadramento em que os factos se passaram, peca, ainda pelo exagero da pena aplicada" e que "o tribunal a quo não teve em consideração as declarações do arguido, e assim violando o princípio "in dúbio Pró Reo”; mais adiante, tece considerações sobre o depoimento de Maria de Fátima Dias, verificando-se que o enquadramento dos factos que refere mais não é do que a apreciação que faz desse depoimento. - Diz ainda o Recorrente BB que "o tribunal "a quo" não teve em consideração as declarações do arguido, e assim violando [o] princípio "in dubio pro reo'' que deve ser tratado como erro na apreciação da prova. - Como já se referiu na apreciação do recurso do arguido AA, o que resulta do princípio “in dubio pro reo” é que, quando o tribunal fica na dúvida quanto à ocorrência de determinado facto, deve daí retirar a consequência jurídica que mais beneficie o arguido, o que não ocorreu, pois do acórdão recorrido não decorre nem da matéria de facto dada como provada, nem da sua fundamentação, que o tribunal “a quo” tenha tido alguma dúvida que tenha resolvido em prejuízo do recorrente. A verdade é que o tribunal “a quo” não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova, não tendo fixado qualquer facto que pudesse questionar a prática do ilícito cometido pelo recorrente, pelo que não tinha de fazer apelo ao aludido princípio. - As declarações do Recorrente não mereceram credibilidade ao tribunal a quo, mas isso não significa a alegada violação do princípio “in dubio pro reo”, como flui do acabado de referir a propósito. Nem poderiam merecer credibilidade, perante o acervo da prova produzida. 2. A argumentação do Acórdão que se recorre assenta, fundamentalmente, no raciocínio de que o Tribunal da 1.ª instância não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova, pelo que não tinha de fazer apelo ao princípio do “in dúbio pro reo”. 3. Visto que, perante a prova produzida não decorre nem da matéria de facto dada como provada, nem da sua fundamentação, qualquer dúvida. 4. Concluindo que, as declarações do Recorrente não merecem credibilidade e que isso não significa a existência da violação do princípio “in dubio pro reo”. 5. Este princípio é um corolário da presunção de inocência, consagrada constitucionalmente no artigo 32.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa. 6. Constitui um dos direitos fundamentais dos cidadãos, conforme o disposto no artigo 18.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, artigo 11.º da Declaração Universal dos Direitos do Homem, artigo 6.º, n.º 2 da Convenção Europeia para a Proteção dos Direitos e Liberdades Fundamentais, e artigo 14.º, n.º 2 do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos. 7. Estabelece este princípio uma imposição dirigida ao julgador no sentido de se pronunciar de forma favorável ao arguido, quando não tiver certeza sobre os factos decisivos para a decisão da causa. 8. Assim, um non liquet na questão da prova tem de ser sempre valorado a favor do arguido, sendo com este sentido e conteúdo que o referenciado princípio se afirma. 9. No caso concreto, o tribunal de 1.ª instância baseou a sua convicção da prova dos factos, que deu como provados no reconhecimento pessoal levado a cabo pela Ofendida CC. 10. Já que o depoimento [das] demais testemunhas da acusação, como sendo FF, GG e HH, que referiram ter visto junto à residência dos ofendidos, uma viatura da marca VW, modelo Golf, branco, antigo, com indivíduos no seu interior (entre 3 a 4), pelas 6:30h/7:00h a dormir, e pelas 8:30h/9:00h junto ao mesmo. 11. Nem reconheceram o Recorrente quando confrontados com o mesmo em sede de audiência de julgamento. 12. O Recorrente negou a prática dos factos que lhes eram imputados. 13. Não entende o Recorrente o facto de o tribunal ignorar as suas declarações e, firmar a sua convicção com base num só depoimento. 14. Perante a prova produzida, o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida quanto a esse mesmo reconhecimento. 15. Na sua essência a prova produzida resulta do depoimento da Ofendida/Assistente CC, que, por sua vez, está em clara contradição com o depoimento do Recorrente. 16. Assim, erradamente defende o douto Acórdão quando menciona que o tribunal “a quo” não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova e quando refere que as declarações do Recorrente não merecem credibilidade. 17. Violando, por isso, o princípio “in dubio pro Reo” por não se ter feito prova rigorosa do crime de roubo, consequência da insuficiência da prova. SEM PRESCINDIR ii. EXCESSIVA MEDIDA DA PENA 18. Para determinação do cálculo da medida da pena aplicável, em concreto, defende o Tribunal de 1.ª Instância que o n.º 1 do artigo 71.° do CP vincula o julgador aos critérios da culpa do agente e da exigência de prevenção, devendo atender-se preponderantemente à medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos em concreto violados, pelo que, cabe à prevenção geral positiva ou de integração e não à culpa, fornecer a sub-moldura de prevenção correspondente à tutela dos bens jurídicos e á estabilização das expectativas comunitárias na validade ou reafirmação contrafáctica da norma violada. Dentro da sub-moldura encontrada actuará, depois, o princípio da culpa consagrado no artigo 13.° do CP, fixando o limite máximo da medida concreta da pena. E, atendendo aos factores descritos no n.° 2, do artigo 71.º do CP, actuando em ambivalência no sentido de, entre os diversos elementos que constituem um factor poderem alguns relevar, não só para a culpa, como também para a prevenção, assim como, de o mesmo elemento quando duplamente relevante poder assumir significado antinómico, importa referir: – A favor dos arguidos AA e BB releva a ausência de antecedentes criminais (no que se reporta a decisões proferidas por tribunais portugueses). – Em desfavor desses mesmos arguidos: i. a actuação dos arguidos, totalmente desproporcionada, como já dissemos, aos fins visados – subtracção de dinheiro e objectos de valor que no interior da residência dos ofendidos se encontrassem; ii. o uso totalmente gratuito, de violência física e limitação da liberdade de acção dos ofendidos, atendendo a que as vítimas eram pessoas de idade, o que era óbvio aos olhos do arguido, que se encontravam já no recato do seu lar, já a descansar ou a preparar-se para o efeito, não representando assim qualquer ameaça para aqueles agressores; iii. ainda a circunstância dos arguidos abandonarem a residência sem que antes, e já após a subtracção dos apontados bens, tenham deixado manietados e amarados a móveis da casa, os ofendidos, abandonados à sua sorte; iv. a intensidade do dolo, directo. – Todos estes pontos evidenciam profundas exigências de prevenção geral que no caso se fazem sentir, atento o alarme social que situações como as dos autos causam sempre no seio de uma comunidade, nomeadamente atento o número crescente de idosos que residem sozinhos. – Também exigências de prevenção especial se tornam prementes, a fim de fazer notar aos arguidos, mormente ao arguido AA, atenta a sua jovem idade, que há que "arrepiar" caminho, actuando em conformidade com as regas vigentes, em respeito com os demais direitos dos cidadãos e bens jurídicos penais devidamente tutelados. – Frise-se ainda que a actuação dos arguidos em relação a cada um dos ofendidos, merece censura diferente, uma vez que as lesões que cada um deles apresentou é de gravidade diversa. – Tudo ponderado, atendendo aos limites abstractos das penas, têm-se por ajustadas e proporcionais, as seguintes penas: (…) – para o arguido BB, pela prática, em co-autoria material, de um crime de roubo (agravado), na pessoa da ofendida CC, uma pena de 7 (sete) anos de prisão, na pessoa da ofendida DD, uma pena de 5 (cinco) anos de prisão e na pessoa do ofendido António, uma pena de 5 (cinco) anos de prisão. – Pena única de concurso: i. Por força do disposto no artigo 77.° Código Penal, temos que o agente que praticou vários crimes numa situação de concurso de crimes, antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena tendo esta como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. ii. Assim, dentro de uma moldura penal de concurso, para cada um dos arguidos, de 7 (sete) a 17 (dezassete) anos de prisão, mostra-se adequada por proporcional, atendendo, em conjunto, aos factos os (acima descritos e cuja gravidade e culpa no cometimento dos mesmos por parte dos arguidos acima criticamente analisámos) e à sua personalidade manifestada na violência desproporcionada e gratuita das suas condutas, (artigo 770.º, n.º 1, 2ª parte Código Penal), uma pena única de concurso, para cada um dos arguidos, de 10 (dez) anos de prisão. 1. Defende, por sua vez o douto Acórdão, que: – Como se pode ver, tudo o que, em harmonia com os critérios definidos no artigo 71.° do CP, se impunha que fosse ponderado o foi pelo tribunal a quo. O que o recorrente BB alega para fundamentar as penas que sugere não infirmam o bem fundado do decidido quanto à medida das penas parcelares e única, sendo de salientar que a integração social, familiar e laboral do recorrente o não impediu da prática de tão graves crimes, do modo como praticou e com as consequências descritas na factualidade provada, mostrando-se ingentes as exigências de prevenção geral, perante as quais as penas sugeridas consistiriam um bónus que de que o recorrente não se mostra merecedor. – Quer-se com isto dizer que as penas parcelares se mostram ajustadas à gravidade dos factos e à culpa do recorrente, como ajustada a pena única, tendo em consideração esses mesmos factos no seu conjunto e a personalidade que eles revelam, em conformidade com o critério definido no artigo 77.° do CP.O Recorrente entende, ainda, que a sentença recorrida peca pelo exagero da pena aplicada. 19, A argumentação do Acórdão que se recorre assenta, fundamentalmente, na gravidade dos factos e na culpa do Recorrente, e na conformidade destes com o critério definido no artigo 77.º do CP para concluir que as penas parcelares aplicadas se mostram ajustadas, como ajustada a pena única. 20. Ousa o Recorrente censurar o douto Acórdão, pois entende que a fixação da pena única de 10 anos de prisão é manifestamente excessiva, 21. Sendo violados por incorreta interpretação os artigos 40° n.º 1 e n.º 2, artigo 71.º ambos do Código Penal e artigo 18.º, n.º 2 da CRP. Senão vejamos [sic], 22. A aplicação da pena visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, artigo 40.º, n.º 1 do Código Penal, sendo que a medida da pena não pode ultrapassar a medida da culpa, em caso algum, artigo 40.º, n.º 2 do Código Penal. 23. A prevenção geral e especial e a culpa são os fatores a ter em conta na aplicação da pena e determinação da sua medida – artigo 40.º, n.º 1 e 2 do Código Penal. 24. Nos termos do disposto no artigo 71.º do Código Penal, a determinação da medida da pena é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, atendendo-se a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele. 25. Assim, o limite máximo da pena concreta, dentro da moldura abstracta, tem como limite a culpa do agente (nulla pena sine culpa). 26. Conclusão, a pena concreta irá então resultar da medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos em cada caso, tutela das expectativas da comunidade na manutenção e reforço da norma violada (prevenção geral positiva), reforçada pela necessidade de reintegração social do agente (prevenção especial positiva), sempre com respeito pelo limite inultrapassável da medida da culpa. 27. Haverá, ainda, que ponderar o grau de ilicitude do facto, o seu modo de execução, a gravidade das suas consequências, o grau de violação dos deveres impostos ao agente, a intensidade do dolo ou da negligência, os sentimentos manifestados no cometimento do crime, a motivação do agente, as condições pessoais e económicas do agente, a conduta anterior e posterior ao facto, e a falta de preparação do agente para manter uma conduta lícita. 28. Sem descorar dos princípios consagrados constitucionalmente no artigo 18.º, n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, da necessidade e proporcionalidade da pena e da proibição do excesso. 29. O Recorrente foi condenado pela prática de três crimes de roubo (agravado), punível com pena de 3 a 15 anos de prisão. 30. Pelo exposto, ponderado no nosso caso concreto, e na nossa modesta opinião parece-nos adequado, aplicar ao Recorrente as seguintes penas: – uma pena de 5 (seis) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da Ofendida CC; – uma pena de 3 (três) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa da Ofendida DD; – uma pena de 3 (três) anos de prisão, pelo crime de roubo cometido na pessoa do Ofendido EE. – Considerando a globalidade dos factos e a personalidade do Arguido BB, condená-lo numa pena única de concurso de 6 (seis) anos e 5 (cinco) meses de prisão. 31. Porque nos parece suficiente para satisfazer de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e ao mesmo tempo exagerada e desajustada a condenação do Recorrente numa pena única de 10 anos de prisão. 32. Salvo melhor opinião mantendo-se a condenação do Recorrente numa pena única de 10 anos de prisão, não estaremos perante uma pena justa e estaremos a contribuir para a desinserção social do agente e desinserção familiar. 33. Aliás, com a aplicação de uma pena única de 10 anos de prisão, não se salvaguarda a necessidade de prevenção geral, nem de prevenção especial. NESTE TERMOS, SEMPRE COM O DOUTO SANEAMENTO DE V.ª EX.ª CONCEDENDO-SE INTEGRAL PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE SER REVOGADA O ACÓRDÃO RECORRIDO, E CONSEQUENTEMENTE: A. Absolver-se o Recorrente do crime a que foi condenado, por violação do princípio “in dubio pro reo”, e por, B. Violada a presunção de inocência plasmada no artigo 32º, nº 2 da Constituição R. Portuguesa, porquanto a sentença valorou negativamente a circunstância dos arguidos terem negado a prática dos factos de que se mostram acusados, SEM PRESCINDIR, E SUBSIDIARIAMENTE, C. Ser reduzida a pena de prisão aplicada ao Recorrente». 1.3.2. O arguido AA (fls. 2663 e segs.): «1 – O recurso interposto visa contestar a dosemetria da pena única aplicada ao arguido nos presentes autos, uma vez que, se trata de uma decisão que confirmou na íntegra o acórdão proferido pela 1ª instância, sendo apenas possível interpor recurso da decisão, nessa parte, porquanto a pena aplicada, é no caso concreto, superior a 8 anos de prisão. 2 – Os fundamentos aduzidos, são indicados nos pontos 8 a 16 da motivação do recurso, que por questões de brevidade aqui se dão por reproduzidos, e que tal como aí se refere, não foram suficientemente valorados, aquando da determinação da pena única aplicada. Assim, 3 – e tendo por assente, que a medida da pena unitária reveste uma especificidade própria: por um lado, está-se perante uma nova moldura penal, mais ampla, abrangente, com maior latitude da atribuída a cada um dos crimes; por outro, porque se trata de uma nova pena, uma pena final, de síntese, correspondente a um novo ilícito (agora global), e a de uma nova culpa (agora outra culpa, ponderada pelos factos conjuntos, em relação), com outra específica fundamentação, que acresce à decorrente do art. 71.º do CP. 4 – No caso concreto, independentemente da gravidade dos factos praticados e do elevado grau de ilicitude que os mesmos apresentam, factores já considerados na determinação das penas aplicadas por cada um dos crimes praticados, (crimes de roubo agravado), haveria ainda o julgador, que atender que os 3 crimes foram praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar. Que face ao CRC do arguido, constituem um acto isolado, porquanto, o arguido não tinha à data dos factos antecedentes criminais, e regista bom comportamento posterior aos factos. Na verdade, o arguido era ainda muito jovem, quando adoptou as condutas desviantes, e soube arrepiar caminho, uma vez que decorridos que foram 4 anos após a prática dos factos não voltou a delinquir. No E.P não regista infracções disciplinares, tudo apontado, para que os actos cometidos, o tenham sido de forma inopinada e não denotando uma personalidade avessa ao direito ou com propensão para a criminalidade. 5 – Acresce ainda que, as circunstâncias que estiveram subjacentes á prática dos crimes, foram com o decurso do tempo alteradas. O arguido constitui agregado familiar, desenvolvia, à data da detenção, actividade profissional regular, conta com o apoio da progenitora e da companheira, que o visitam regularmente no E.P, e estão inseridas na comunidade da área de residência. 6 – E, face a tal circunstancialismo, é entendimento do recorrente, que a ter sido valorado tudo o que de positivo foi provado, conjugado, com a idade em que praticou os factos e o tempo que decorreu entre a sua prática e a condenação, deveria o tribunal: 6.1. – Ter atenuação especial da pena, nos termos e para os efeitos do D.L 401/82,de 23 de Setembro e arts 72 e 73 do C.P., fixando a pena única de 7 anos de prisão. 6.2. – Caso assim não entenda e em obediência aos critérios estabelecidos pelos arts 77 e 71 do C.P., fixado a pena única na pena de 8 anos de prisão. 7 – Violou-se o disposto nos arts 77, 71, 72 e 73 todos do C.P e o D.L 401/82,de 23 de Setembro. Revogando-se a decisão recorrida nos termos sobreditos far-se-á justiça». 1.4. O Senhor Procurador-geral Adjunto do Tribunal a quo entende que os Recorrentes não têm razão, porquanto: «(…) O tribunal da primeira instância justificou, com sabedoria, o “quantum” da pena unitária encontrada. (…) O Tribunal Superior, sufragou o entendimento do tribunal recorrido. (…) É de frisar que foram dois tribunais coletivos, a entenderem que a pena aplicada foi justa» (cfr. respostas de fls. 2676 e 2678). 1.5. Recebido o processo no Supremo Tribunal de Justiça, o Senhor Procurador-geral Adjunto, depois de delimitar o objecto de cada um dos recursos em conformidade com as conclusões que encerram as respectivas motivações [«A – AA: – Pena única: Defende a aplicação do regime de jovens adultos (DL 401/82) ou, no indeferimento desta pretensão, a redução da pena para os 8 anos de prisão. B – BB: – Violação do princípio in dubio pro reo: Alega que tal princípio foi violado posto que a convicção do tribunal assentou no reconhecimento pessoal levado a cabo pela ofendida CC ao passo que as restantes testemunhas não o reconheceram e o arguido negou a prática dos factos; – Pena única: Pretende a redução da pena única para 6 anos e 5 meses de prisão, também como decorrência do desagravamento das penas parcelares (para 5, 3 e 3 anos de prisão»], alegou, em síntese: – invocando o disposto no artº 400º, nº 1, alínea f) do CPP, que, tendo o Tribunal da Relação confirmando a decisão da 1ª Instância, «devem os recursos ser rejeitados, não só no que respeita à medida das penas parcelares (BB), como também em relação às questões respeitantes aos correspondentes crimes (AA, atenuação especial por aplicação do DL 401/82, com incidência nas molduras de cada um dos crimes)»; – que as questões relativas à matéria de facto mostram-se definitivamente resolvidas pela Relação, escapando aos poderes de cognição do STJ, porquanto essas questões «(ou delas instrumentais) deverão considerar-se definitivamente decididas pela Relação, como sucede relativamente à alegada violação do princípio in dubio pro reo»; – que, a medidas das «penas únicas …não merec[em] reparo», porquanto. «situando-se no primeiro terço da moldura do concurso, acatam os critérios fixados no art. 77.º do Cód. Penal, sendo adequadas à personalidade dos agentes e ilícito global, acautelando as exigências de prevenção geral, muito elevadas, e especial de socialização, menos acentuadas». 1.6. Cumprido o disposto no artº 417º, nº 2, do CPP, os Recorrentes nada disseram. Tudo visto, cumpre apreciar e decidir. 2. É do seguinte teor a decisão sobre a matéria de facto, tal como fixada no acórdão recorrido (fls. 1586 e sgs.): «Factos provados Da apreciação feita em audiência de discussão e julgamento resultaram provados os seguintes factos, com relevo para a decisão da causa: 1. Em data não concretamente apurada, mas pelo menos antes do dia 1 de Agosto de 2010, os arguidos AA e BB, juntamente com pelo menos mais dois indivíduos, cuja identidade não se logrou nos presentes autos apurar, estabeleceram um plano entre si para assaltarem a residência sita na Rua .... 2. Na execução desse plano, no dia 1 de Agosto dc 2010, pelas 23:30 h, os arguidos AA e BB, juntamente com aqueles indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, introduziram-se na residência de CC, DD e EE, sita na morada indicada em 1., saltando para o efeito uma vedação e abrindo uma janela da cozinha com recurso a um pé de cabra. 3. Aí entrados, os arguidos AA e BB, juntamente com os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, agrediram os referidos CC, DD e EE, com socos no rosto e no corpo. 4. Acto contínuo, os arguidos AA e BB, juntamente com os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar manietaram aqueles e amarraram-nos de pés e mãos com recurso a abraçadeiras plásticas de cor preta, pertencentes aos arguidos e a várias peças de roupa, designadamente meias e gravatas, estas pertencentes aos ofendidos. 5. Os arguidos AA e BB, juntamente com os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, exigiram que a ofendida CC revelasse os locais onde guardavam dinheiro e ouro, o que esta fez. 6. Após, os arguidos AA e BB, juntamente com os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, revistaram a residência, tendo-se apropriado de 3.500,00 € em notas do BCE, várias peças em ouro e uma medalha de cor dourada, com a inscrição "Marco de Canaveses", que levaram consigo, tendo deixado aqueles ofendidos no local, amarrados e amordaçados. 7. Como consequência directa e necessária das agressões perpetradas pelos arguidos AA e BB, bem como pelos demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, os ofendidos necessitaram de recorrer a assistência médica, tendo sofrido dores e lesões melhor descritas nos relatórios das perícias de avaliação de dano corporal juntas a fls. 50 a 56, nomeadamente. 8. A ofendida CC sofreu, na face, várias equimoses em várias fases de reabsorção de cor azulada, com um diâmetro médio de 3 cm, situadas na região malar esquerda e infra palpebral esquerdas e queixo e conjuntivite hemorrágica; no abdómen, várias equimoses cm várias fases de reabsorção de cor azulada, sem sinais de infecção, com um diâmetro médio de 5 cm, situadas na face externa da região nadegueira esquerda; no membro superior direito urna equimose em fase de reabsorção de cor azulada, situada na face externa do punho, com um comprimento de 3 cm; no membro superior esquerdo, urna equimose em fase de reabsorção de cor azulada, situada na face externa do punho, com um comprimento de 4 um, no membro inferior direito, várias equimoses em várias fases de reabsorção de cor azulada, sem sinais de infecção, com um diâmetro médio de 3 cm, situadas na face anterior da perna e face posterior da coxa. 9. Tais lesões determinaram 12 dias para a cura, com 1 dia de afectação da capacidade de trabalho em geral e de capacidade de trabalho profissional. 10. O ofendido EE apresentava uma equimose de cor azulada, em fase de reabsorção, sem sinais de infecção, situada na face, na região malar esquerda, com 4 cm de diâmetro. 11. Tais lesões determinaram 5 dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho em geral e de capacidade de trabalho profissional. 12. A ofendida DD apresentava hipersensibilidade na hemi-face esquerda, na região malar; no membro superior direito, uma equimose de cor azulada, em fase de reabsorção, sem sinais de infecção, situada na face externa do punho, com um diâmetro de 3 cm; no membro superior esquerdo, uma equimose de cor azulada, em fase de reabsorção, sem sinais de infecção, situada na face externa do punho. 13. Tais lesões determinaram 5 dias para a cura, sem afectação da capacidade de trabalho em geral e de capacidade de trabalho profissional. 14. Cerca das 24:00h, os arguidos AA e BB e os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, puseram-se em fuga, utilizando para o efeito a viatura automóvel da marca VW, modelo Golf, de cor branca, com a matrícula "QC-...". 15. Tal viatura estava, à data dos factos, e desde 12 de Julho de 2010, segurada cm nome de ...., pai do arguido AA. 16. Os arguidos AA e BB e os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, fugiram do local na referida viatura em direcção a Espanha, tendo sido registada a sua passagem irregular na Via Verde, na portagem de Valença, pelas 04:02 h do dia 2 de Agosto de 2010. 17. Na manhã do dia 2 de Agosto de 2010, II apresentou queixa pelo finto [“furto”, naturalmente] de tal viatura, que se encontrava estacionada junto à sua residência na Rua ..., indicando corno hora provável do furto o período compreendido entre as 20:15 h do dia 1.08.2010 e as 8:30 h do dia 2 de Agosto de 2010. 18. A queixa referida no ponto 17. da fundamentação de facto deu origem aos NUIPC n.° 950/10.6 GBGMR. 19. Na sequência de tal queixa apresentada, pelas 01:00 h do dia 3 de Agosto de 2010, a viatura foi apreendida pela polícia espanhola, na confluência da ... em Pontevedra, Vigo-Espanha. 20. Aquando da apreensão da viatura, foi identificado como condutor da mesma o arguido AA, encontrando-se este acompanhado de mais três indivíduos do sexo masculino, dois dos quais os aqui arguidos BB e JJ, e dois indivíduos do sexo feminino de nomes LL e MM. 21. No interior da referida viatura foram encontrados os seguintes objectos debaixo do banco do condutor: um pé de cabra de cores amarela e preta, uma chave de parafusos de estrela com pega plástica transparente, uma chave de fendas plana com pega plástica de cor azul, uma bolsa contendo várias abraçadeiras de plástico de cor preta, duas meias com losangos, uma medalha de cor dourada com a inscrição "Marco de Canaveses", um relógio da marca Louis Valentin, uma caixa com a inscrição "O meu terço", contendo um terço prateado, uma chave de viatura Volkswagen, com porta-chaves com a inscrição (Nossa Senhora) "Fátima". 22. Os arguidos AA e BB agiram em comunhão de esforços e de intentos com os demais indivíduos cuja identidade não foi possível apurar, na sequência dc um plano previamente delineado entre todos, com o propósito concretizado de, mediante o recurso à violência fisica, se apropriarem dos bens supra descritos em 6., que pertenciam aos ofendidos, bem sabendo que agiam contra a vontade destes, seus legítimos proprietários. 23. Os arguidos AA e BB agiram de forma livre, deliberada e consciente, perfeitamente conhecedores de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei. Quanto às condições pessoais, económicas c familiares dos arguidos Consta do relatório Social realizado que [o] arguido AA declarou aos serviços do IRS: 24. O processo social de desenvolvimento da personalidade de AA decorreu no país de origem, junto dos dois irmãos, mais velhos, e dos pais, situação que se alterou quando ele tinha dez anos de idade, com a emigração do grupo familiar para Espanha, zona de Vigo, onde se fixaram e frequentou quatro anos de escolaridade. 25.AA tinha a idade de catorze anos quando os pais se separaram, e depois acompanhou o pai quando este optou por vir para Portugal em busca de uma condição mais favorável para subsistir, fixando-se na zona de Guimarães, processo facilitado pela comunidade romena ali residente. 26.Desde então AA colaborou com o progenitor nas actividades de recolha e venda de sucatas, e sazonal de apanha de uva na época da vindima, além de outros trabalhos esporádicos, meio para assegurar a subsistência de ambos. 27. À data de Agosto de 2010, o arguido já vivia em união de facto com ...., a actual companheira, da mesma nacionalidade, que conheceu em Espanha e, por proximidade ao local de trabalho, ainda que sazonal, moraram na zona de Vila Nova de Foz Côa. 28. Estavam autonomizados do pai do arguido, que também terá iniciado vida em comum com uma companheira de nacionalidade romena, e que continuava a residir em Abação, Guimarães, situação alterada no final de 2013, quando ocorreu o falecimento daquele. 29. Posteriormente, o arguido e a companheira fixaram-se na cidade dc Aveiro, assegurando a subsistência com a actividade do arguido na recolha e comercialização informal de sucatas, enquanto a companheira prestava serviços dc limpeza em domicílios particulares, e residiam em apartamento arrendado. 30. O arguido tinha entretanto diligenciado a regularização da situação de permanência em Portugal, e também concretizara a obtenção dc título de condução de veículos automóveis. 31. Em Espanha, Vigo, onde o arguido se deslocava amiúde, estarão a residir a mãe, a irmã e a avó, e a primeira manifesta-lhe apoio, consideradas as deslocações para visita no EP. 32. A companheira tem sido acolhida e apoiada pela mãe do arguido, estando presentemente em Portugal, para apoiar o arguido no decurso do julgamento, acolhida no espaço residencial de uma amiga, no Porto. 33. No cumprimento da medida de coacção, o arguido está a apresentar uma postura de respeito ao regulamento interno e adaptada no relacionamento interpessoal com os funcionários e os outros reclusos, com urna presença discreta, privilegiando a permanência no espaço celular. 34. Quando em liberdade, o arguido perspectiva retomar o estilo de vida que tinha em Portugal, continuando a vida em comum com a companheira e a actividade laborai na recolha e venda de sucatas, como meio de subsistência e de reconhecimento social. … Consta do relatório Social realizado que [o] arguido BB declarou aos serviços do IRS: 42. BB é romeno, sem familiares no território nacional, tendo os seus interesses de cidadania centrados no retorno à República da Roménia. 43. BB afirma ser filho único do casamento dos seus progenitores, que o ambiente familiar era afectuoso e gratificante e lhe proporcionou as condições suficientes à realização académica e à qualificação profissional com o curso técnico de serralheiro mecânico. 44. Desempenhou as funções profissionais de aplicador de isolamentos de edifícios até à presente reclusão, mediados por curtos períodos de desemprego, conseguindo assegurar a regularidade de rendimentos e a estruturação do seu agregado familiar. 45. Assume que não teve qualquer confronto com o sistema de administração da justiça do seu país. 46. À data de reclusão, o arguido mantinha o agregado familiar composto pela companheira, pela filha do casal e pelos seus pais. 47. Auferia €300 mensais da actividade laborai referida e que a sua companheira desempenhava funções laborais na Suíça por períodos de três meses conseguindo auferir CHF2000.00 por mês permitindo ao agregado desfrutar de uma condição financeira confortável para os padrões do seu país. 48. BB não padece de problemas de saúde nem de qualquer comportamento aditivo que perturbem o seu quotidiano e a sua capacidade de trabalho projectando-se no retomar ao seu agregado e ao desempenho das funções laborais. 49. Conformado ao disciplinado exigido no Estabelecimento Prisional do Porto, permanece desocupado por falta de colocação laboral. 50. A proximidade relacional com os seus familiares tem sido apenas mantida por um regime regular de contactos telefónicos. Mais se provou 51. Os arguidos AA, BB e JJ não sofreram condenações por tribunais portugueses por crimes cometidos em território nacional. Factos não provados i) O arguido JJ, de comum acordo e em conjugação de esforços com os arguidos AA e BB praticou os factos descritos em 1. a 7. dos factos provados. ii) O arguido JJ agiu com o propósito concretizado de, mediante o recurso à violência fisica, e cm conjunto com os demais arguidos AA e BB, se apropriar dos bens supra descritos em 6., que pertenciam aos ofendidos, bem sabendo que agia contra a vontade destes, seus legítimos proprietários. iii) O arguido JJ agiu de forma livre, deliberada e consciente, perfeitamente conhecedor de que a sua conduta era proibida e punida por lei. iv) Os arguidos ameaçaram de morte os ofendidos, na ocasião referida em 5. dos factos provados. v) A quantia monetária de que os arguidos AA e BB se apoderaram era no montante de 5.700,00 €. vi) Os arguidos AA e BB apoderaram-se de cheques do BP1, documentação diversa, vários talheres. vii) A queixosa ... é companheira do pai do arguido AA. Quanto ao mais constante da acusação, por não se tratar de matéria de facto relevante para o objecto do processo não se pronunciou este colectivo de juízes». 3. Objecto dos recursos Nos termos das disposições conjugadas dos arts. 412º, nº 1, do CPP e 635º, nº 4, do CPC, são as conclusões que encerram a motivação que definem o objecto do recurso. Em face das conclusões acima transcritas, são as seguintes as questões que os Recorrentes querem submeter ao exame do Supremo Tribunal de Justiça: 3.1. o arguido BB: a) – a violação do princípio in dubio pro reo (conclusões 1 a 17); b) – a medida da pena, que reputa de excessiva, impugnando quer a medida de cada uma das penas parcelares quer a medida da pena conjunta, como decorre expressamente da conclusão 30; 3.2. o arguido AA questiona apenas a medida da pena conjunta que entende dever ser fixada em 7 anos de prisão, ou 8, caso se entenda não poder ser especialmente atenuada. 4. Fundamentação 4.1. Questão Prévia. Da rejeição de segmentos dos recursos interpostos Como vimos, o Senhor Procurador-geral Adjunto do Supremo Tribunal de Justiça entende: a) que o recurso do arguido Marius deve ser rejeitado, por não ser admissível, nos segmentos em que censura o Tribunal da Relação por violação do princípio in dúbio pro reo e pela medida das penas parcelares aplicadas; b) que o recurso do arguido AA deve ser rejeitado, também por não ser admissível, na parte em que reclama a atenuação especial da pena conjunta por aplicação do Regime Penal Especial para Jovens, aprovado pelo DL 401/82, de 23 de Setembro. Vejamos. 4.1.1. A violação do princípio in dúbio pro reo À alegada violação, pelo Tribunal da Relação, do princípio in dubio pro reo, referem-se, como vimos, as conclusões 1 a 17 da motivação do recurso do arguido BB. Em síntese, o Recorrente argumenta que o Tribunal da 1ª instância «baseou a sua convicção da prova dos factos, que deu como provados no reconhecimento pessoal levado a cabo pela Ofendida CC», desprezando as declarações que prestou em audiência em que negou a prática dos factos que lhe iam imputados. Perante a prova produzida [isto é, «o depoimento da Ofendida … está em clara contradição com o depoimento do Recorrente»], continua, «o tribunal deveria ter ficado em estado de dúvida quanto a esse reconhecimento». Por isso, conclui, o acórdão recorrido errou quando «menciona que o tribunal “a quo” não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova e quando refere que as declarações do Recorrente não merecem credibilidade», violando o princípio “in dubio pro reo”, «por não ter sido feito prova rigorosa do crime de roubo…». Este trecho da alegação do Recorrente evidencia de forma muito clara que a razão por que discorda da decisão sobre a matéria de facto não é, afinal, a pretensa violação do princípio in dubio pro reo, mas, antes e apenas, porque retira da prova produzida conclusão oposta à do Tribunal Colectivo que, em sua opinião, devia ter levado o Tribunal da Relação a revogar a decisão sobre a matéria de facto. Mas quem julga é… o Tribunal. E tratando-se, como se trata, de pura decisão sobre a matéria de facto, corroborada que foi pelo Tribunal da Relação O acórdão recorrido refere, a este propósito o seguinte: «… diz … o recorrente BB que “o tribunal “a quo” não teve em consideração as declarações do arguido, e assim violando princípio “in dubio Pró Reo”” que deve ser tratado como erro na apreciação da prova. … o que resulta do princípio in dubio pro reo é que, quando o tribunal fica na dúvida quanto à ocorrência de determinado facto, deve daí retirar a consequência jurídica que mais beneficie o arguido, o que não ocorreu, pois do acórdão recorrido não decorre nem da matéria de facto dada como provada, nem da sua fundamentação, que o tribunal a quo tenha tido alguma dúvida que tenha resolvido em prejuízo do recorrente. A verdade é que o tribunal a quo não teve qualquer hesitação quanto à valoração da prova, não tendo fixado qualquer facto que pudesse questionar a prática do ilícito cometido pelo recorrente, pelo que não tinha de fazer apelo ao aludido princípio. As declarações do recorrente não mereceram credibilidade ao tribunal a quo, mas isso não significa a alegada violação do princípio in dubio pro reo, como flui do acabado de referir a propósito. Nem poderiam merecer credibilidade, perante o acervo da prova produzida., não pode o Supremo Tribunal de Justiça, funcionando como 2ª instância de recurso, como tribunal de revista, intrometer-se nessa decisão, como resulta do disposto no artº 434º do CPP, tanto mais que não vislumbramos aí qualquer dos vícios do nº 2 do seu artº 410º. Com efeito, a decisão sobre a matéria de facto só pode ser questionada pelo Supremo Tribunal de Justiça em duas situações: (a) se, por averiguação oficiosa, (é este efectivamente o sentido da sua jurisprudência constante e uniforme), constatar que a decisão enferma de algum daqueles vícios (isto é, ao fim e ao cabo, se a matéria de facto fixada pelas instâncias inviabiliza ou não constitui base suficiente ou idónea para a decisão de direito, como se exprime o nº 3 do artº 682º do CPC) – caso em que, se não for possível decidir a causa, determinará o reenvio do processo para novo julgamento, no termos do artº 426º, nº 1; (b) se ocorrer alguma das situações excepcionais (é assim mesmo que a lei se exprime) previstas no nº 3 do artº 674º, ainda do CPC que, afinal, se traduzem em casos de violação da lei – hipótese em que alterará correspondentemente os factos que vêm fixados, conforme dispõe o nº 2 do citado artº 682º. Mas nem a situação que se nos apresenta é subsumível a qualquer dessas hipóteses excepcionais nem o Recorrente insinua sequer a sua verificação. Requer, pura e simplesmente, que, contra a convicção das Instâncias, privilegiemos as suas declarações em detrimento das prestadas por uma das Ofendidas. É verdade que o artº 127º do CPP prescreve que, «salvo quando a lei dispuser diferentemente, a prova é apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção da entidade competente» e que livre convicção não é sinónimo de livre arbítrio. Como ensina Figueiredo Dias Em “Direito Processual Penal”, Primeiro Volume, 1974, 202 e segs., «a liberdade de apreciação da prova é, no fundo, uma liberdade de acordo com um dever – o dever de perseguir a chamada “verdade material” – de tal sorte que a apreciação há-de ser, em concreto, recondutível a critérios objectivos e, portanto, em geral susceptível de motivação e de controlo». Por isso que a consequência mais relevante da aceitação destes limites à discricionariedade seja, segundo o mesmo Autor, a de que, «sempre que tais limites se mostrem violados, será matéria susceptível de recurso “de direito” para o STJ…Este será o caso, nomeadamente, de o tribunal a quo ter incorrido em erro lógico, em uma contradição material, ou ter violado regras da vida e da experiência». Esta é, também, a doutrina que o Supremo Tribunal de Justiça tem seguido de forma, pode dizer-se uniforme, de há uns anos a esta parte. No caso sub judice, no entanto, lendo a motivação do recurso e correspondentes conclusões o que verificamos, repetimos, é que o Recorrente se limita a confrontar as suas declarações com as prestadas por uma das Ofendidas. E não passa daí, pois não aponta uma única situação que possa sequer indiciar violação de qualquer dos limites apontados. Certo que o princípio in dubio pro reo é um princípio geral, estruturante, do processo penal decorrente do princípio da presunção da inocência do arguido. Como tal, assume a natureza de uma questão de direito de que o Supremo Tribunal de Justiça, como tribunal de revista, deve conhecer. Mas apenas, naturalmente, quando da globalidade do próprio texto da decisão, designadamente da fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, resultar que o tribunal, apesar da hesitação sobre a prova de determinado facto, decidiu em sentido desfavorável ao arguido. Não é esse manifestamente, dizemo-lo mais uma vez, o caso dos autos. Lendo aquela fundamentação ou a decisão em geral, nada detectamos, como o acórdão recorrido não detectou, que indicie ter perpassado pela mente dos Senhores Juízes qualquer dúvida sobre a comprovação dos factos julgados provados – razão por que o Tribunal da Relação, o Tribunal recorrido, não tinha que, nem legalmente podia, revogar a decisão sobre a matéria de facto por aplicação do princípio in dubio pro reo. O apelo a este princípio não tem, por isso, no nosso caso, qualquer cabimento. Nesta conformidade, procedendo a questão prévia suscitada pelo Senhor Procurador-geral Adjunto, rejeitamos, por ser manifestamente improcedente, nos termos dos arts. 434º, 414º, nº 2 e 420º, nº 1, alínea a), do CPP, este segmento do recurso do arguido BB. 4.1.2. A impugnação das penas parcelares pelo mesmo Arguido Recordemos que o arguido BB foi condenado, na 1ª Instância, numa pena parcelar de 7 (sete) anos e em duas penas de 5 (cinco) anos, de prisão. E que o acórdão recorrido confirmou integralmente essa decisão. Pretende agora (cfr. conclusão 30) a redução da primeira daquelas penas para 5 anos e, cada uma das restantes, para 3 anos, de prisão. O Senhor Procurador-geral Adjunto invocou o disposto no artº 400º, nº 1, alínea f), do CPP para concluir pela inadmissibilidade desse segmento do recurso. Com toda a razão, dizemos desde já. De facto, a alínea b) do nº 1 do artº 432º do CPP, autoriza o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça «das decisões que não sejam irrecorríveis proferidas pelas relações, em recurso, nos termos do artigo 400º». Por sua vez, a alínea f) do nº 1 deste artº 400º prescreve que «não é admissível recurso de acórdãos condenatórios proferidos em recurso, pelas relações, que confirmem decisões da 1ª Instância e apliquem pena de prisão não superior a 8 anos». O Supremo Tribunal de Justiça vem entendendo pacificamente serem dois os pressupostos de irrecorribilidade fixados neste preceito: por um lado, que o acórdão da relação confirme a decisão da 1ª instância; por outro, que a pena aplicada na relação não seja superior a 8 anos de prisão. Em causa, repetimos, um acórdão condenatório, proferido em recurso pelo Tribunal da Relação do Porto, que confirmou a decisão da 1ª Instância que fixou as penas parcelares em 7 (sete) e 5 (cinco) anos, de prisão. É a chamada dupla conforme. Quanto ao segundo pressuposto, também constitui jurisprudência uniforme deste Tribunal a de que, no caso de concurso de crimes, só é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça relativamente aos crimes (relativamente às questões suscitadas a propósito dos crimes) punidos com pena de prisão superior a 8 anos e/ou à pena conjunta superior a essa medida. Com efeito, o Supremo Tribunal de Justiça, na esteira da interpretação praticamente consensual que fazia deste mesmo preceito na versão anterior à Reforma de 2007, vem entendendo, também agora de forma pacífica, que, no caso de um concurso de crimes, o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da relação que confirme decisão da 1ª instância apenas é admissível relativamente ao(s) crime(s) punido(s) com prisão superior a 8 anos e/ou relativamente às questões sobre os pressupostos do próprio concurso e da formação da pena conjunta, quando esta ultrapasse naturalmente aquele limite (cfr., entre outros, os Acs. 11.02.09, Pº 113/09-3ª; de 04.03.09, Pº 160/09-3ª; de 25.03.09, Pº 486/09-3ª; de 16.04.09, Pº 491/09-5ª; de 29.04.09, Pº 391/09-3ª; de 07.05.09, Pº 108/09-5ª; de 27.05.09, Pº 384/07.0GDVFR.S1-3ª, de 12.11.2009, Pº nº 200/06.0JAPTM-3ª, de 23.06.10, Pº nº 1/07.8ZCLSB.L1.S1-3ª, de 09.06.2011, Pº nº 4095/07.8TPPRT.P1.S1-5ª , de 26.04.2012, Pº nº 438/07.2PBVCT.G1.S1-5ª, de 12.09.2012, Pº nº 269/08.2TABNV.L1.S1-3ª e de 29.05.2013, Pº nº 344/11.6JALRA.E1). Continuamos a não ver razões para nos afastarmos desta orientação, como, aliás, reafirmamos nos Acórdãos de 11.06.2014, Pº nº 54/12.7SVLSB.L1.S1 e de 10.09.2014, Pº nº 223/10.4SMPRT.P1.S1-3ª. De facto, mal se compreenderia que a admissibilidade de recurso incidente sobre determinado crime estivesse dependente da circunstância aleatória de o seu julgamento ter sido feito ou não em conjunto com outros crimes (cfr. arts. 24º e segs. do CPP). Por outro lado, como se recorda naquele Acórdão de 16.04.2009, invocando jurisprudência anterior, «seria um contra-senso, na perspectiva da restrição do recurso para o STJ, acentuada pela aludida reforma [a Reforma de 2007, entenda-se], que o legislador, ao falar de pena aplicada em concreto, em vez de pena aplicável em abstracto como anteriormente, pretendesse levar o STJ a conhecer de todos os crimes que formam um concurso de infracções, mesmo que tais crimes correspondam àquela noção que normalmente se designa de criminalidade bagatelar ou que, tendo já passado pelo crivo da Relação, e não sendo crimes de bagatela, viram as respectivas condenações confirmadas por aquela, até um limite de gravidade tido como razoável (na opção legislativa, 8 anos de prisão) a partir do qual se justifica a revisão do caso pelo STJ». E, como também aí se ponderou, «… se o sistema português fosse “um sistema de pena unitária, não se exigindo a discriminação das penas parcelares e tudo se passando como se o conjunto dos factos praticados pelo agente constituísse um só crime a punir segundo a culpa e as exigências da prevenção” (…) o recurso interposto para o Supremo deveria, sem dúvida, abranger toda a decisão. [Num tal sistema] ao agente é aplicada uma única pena e, em consequência, será por referência a ela que se [há-de definir] o âmbito do recurso. Mas sendo a pena do cúmulo uma pena única conjunta, já não se justifica um conhecimento amplo do recurso de forma a abranger cada um dos crimes que entram no concurso, mesmo daqueles que são tidos por irrecorríveis para o Supremo. Conforme refere Figueiredo Dias, “o tribunal tem de determinar a pena que caberia a cada um dos crimes em concurso, como se de crimes singulares, objecto de cognições autónomas, se tratasse, para tanto seguindo o procedimento normal de determinação da pena. … Dados os diversos efeitos – desde logo em tema de determinação do limite máximo da pena conjunta, mas também, v. g. em matéria de recursos, de amnistia, de penas acessórias, efeitos das penas e medidas de segurança, de concurso superveniente, etc. – que se ligam à penas dos diversos crimes concorrentes, ou penas parcelares, têm elas não só de constar especificadamente da sentença como a sua medida tem de ser autonomamente fundamentada … “(…). Poder-se-á assim afirmar, em síntese, que embora no caso de concurso de infracções venha a final a ser aplicada uma pena única conjunta, na decisão não deixam de ser também aplicadas penas parcelares que, ressalvada a questão da sua execução, não perdem a respectiva individualidade» (cfr. os Acórdãos de 12.11.2009, Pº nº 200/06.0JAPTM-3ª e de 20.10.2010, Pº nº 651/09.8PBFAR.E1.S1-3ª). Por outro lado, continuamos também a entender que a restrição da possibilidade de recurso para o Supremo Tribunal da Justiça, acentuada pela Reforma de 2007, não colide com a garantia constitucional do direito ao recurso, consagrada no artº 32º, nº 1, da CRP. Por um lado, porque o legislador ordinário não só não suprimiu o segundo grau de recurso como também não restringiu de forma arbitrária – porque o fez em função da gravidade das concretas punições cominadas, isto é, em função da concreta gravidade dos crimes em julgamento – o direito de o arguido recorrer para o Supremo Tribunal de Justiça. Por outro lado, no nosso caso, a causa já foi reapreciada por um tribunal superior, no seguimento de um recurso interposto pelo Recorrente. Deste modo, procedendo a questão prévia suscitada, também rejeitamos, agora por não ser admissível, nos termos dos arts. 420º, nº 1, alínea b), 414º, nº 2, 432º, nº 1, alínea b) e 400º, nº 1, alínea f), todos do CPP este segmento do recurso do arguido BB. 4.1.3. Da atenuação especial da pena aplicada ao arguido AA por aplicação do regime do DL 401/82. O objecto do seu recurso cinge-se expressamente à medida «da pena que foi fixada em cúmulo», como afirma logo no nº 2 do corpo da motivação e reafirma na 1ª conclusão. Para além de outros fundamentos para justificar a pretendida redução dessa pena, o Arguido invoca a sua idade à data dos factos, 19 anos, e o regime do DL 401/82, de 23 de Setembro. Como assim, como um dos fundamentos dessa pretensão, será apreciado em conjunto com os demais, com vista a julgar da sua procedência ou improcedência. 4.2. O objecto admissível de ambos os recursos incide, pois, sobre a medida da pena conjunta. 4.2.1. O acórdão da 1ª instância, em sede de “Escolha e determinação da medida da pena” (fls. 2253 e segs.), começou por abordar as “circunstâncias atenuantes aplicáveis” – tendo afastado a aplicação do “Regime Penal Especial para Jovens” do DL 401/82 ao arguido Cosmin Burlacu e recusado a atenuação especial, nos termos do artº 73º do CPenal, de qualquer das penas em que ia condenar os dois Arguidos/recorrentes –, passou depois à fixação da medida das penas parcelares, para o que convocou a doutrina dos arts. 40º e 71º do CPenal e, finalmente, fixou a medida da “pena única do concurso”. A propósito desta última operação, considerou e decidiu o seguinte, fls. 2256/2257: «Pena única do concurso Por força do disposto no artigo 77° Código Penal, temos que o agente que praticou vários crimes numa situação de concurso de crimes, antes de transitar em julgado a condenação por qualquer deles, é condenado numa única pena tendo esta como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar 25 anos tratando-se de pena de prisão e 900 dias tratando-se de pena de multa e como limite mínimo, a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes. Assim, dentro de uma moldura penal de concurso, para cada um dos arguidos, de 7 (sete) a 17 (dezassete) anos de prisão, mostra-se adequada por proporcional, atendendo, em conjunto, aos factos (acima descritos e cuja gravidade e culpa no cometimento dos mesmos por parte dos arguidos acima criticamente analisámos) e à sua personalidade manifestada na violência desproporcionada e gratuita das suas condutas, (artigo 77°, n.° 1, 2ª parte Código Penal), uma pena única de concurso, para cada um dos arguidos, de 10 (dez) anos de prisão». 4.2.2. Tendo os Arguidos/recorrentes questionado, além do mais, nos recursos que interpuseram desse acórdão, a medida da pena conjunta em que foram condenados (cfr. as conclusões 17, 18 e 26, do recurso do arguido AA e 43, do recurso do arguido Marius, tal como transcritas, respectivamente, a fls. 2571 a 2574 e 2583, do acórdão agora em recurso), o Tribunal da Relação pronunciou-se sobre a questão, do modo seguinte: «O recorrente AA alega ter-se tratado de um acto isolado, terem decorrido mais de quatro anos sem que tenha cometido qualquer outro acto ilícito, manter, no EP, um comportamento ajustado, dispor de apoio familiar e ter apenas, à data, 19 anos de idade, sugerindo as seguintes penas: - cinco anos de prisão pelo crime de roubo em que é ofendida CC; - três anos de prisão pelo crime de roubo em que é ofendida DD; - três anos de prisão pelo crime de roubo em que é ofendido EE. Tendo em consideração o elevado grau de ilicitude dos factos, o modo de actuação, a idade das vítimas, a gravidade das suas consequências, a circunstância de as vítimas terem sido deixadas amarradas, as penas parcelares e única sugeridas pelo recorrente constituiriam manifesto desajuste à protecção dos bens jurídicos tutelados e às necessidades de prevenção, mal se percebendo que ouse, sequer, pensar em penas concretizadas no limite mínimo da respectiva moldura penal, sem qualquer razão que o justifique. Na ponderação dos factores referidos na decisão recorrida, a medida das penas parcelares mostra-se ajustada à gravidade dos factos e à culpa do recorrente AA, em harmonia com o disposto no art. 71.º do CP, bem como ajustada a medida da pena única, dentro dos critérios definidos no art. 77.º do mesmo diploma. …. O recorrente BB considera a medida da pena excessiva, sugerindo penas para cada um dos crimes de roubo idênticas às sugeridas pelo recorrente AA. A sustentar esta pretensão, alega ser primário, ser socialmente integrado no seu país de origem, onde sempre trabalhou, não ter residência em Portugal, onde nunca tinha estado e o lapso de tempo decorrido desde a data da prática dos factos. Quanto a não residir em Portugal, onde alegadamente nunca tinha estado, não se vê em que medida tal circunstância deveria ser ponderado na concretização das penas nem o recorrente esclarece tão particular argumento. … Como se pode ver, tudo o que, em harmonia com os critérios definidos no art. 71.º do CP, se impunha que fosse ponderado o foi pelo tribunal a quo. O que o recorrente BB alega para fundamentar as penas que sugere não infirmam o bem fundado do decidido quanto à medida das penas parcelares e única, sendo de salientar que a integração social, familiar e laboral do recorrente o não impediu da prática de tão graves crimes, do modo como praticou e com as consequências descritas na factualidade provada, mostrando-se ingentes as exigências de prevenção geral, perante as quais as penas sugeridas consistiriam um bónus que de que o recorrente não se mostra merecedor. Quer-se com isto dizer que as penas parcelares se mostram ajustadas à gravidade dos factos e à culpa do recorrente, como ajustada a pena única, tendo em consideração esses mesmos factos no seu conjunto e a personalidade que eles revelam, em conformidade com o critério definido no art. 77.º do CP». 4.2.3. Os Recorrentes impugnam, como vimos, esta decisão. 4.2.3.1. O arguido BB, com os fundamentos alinhados nas conclusões 18 e segs. (fls. 2659 e segs.): Depois de transcrever a fundamentação dos acórdãos da 1ª Instância e do Tribunal da Relação sobre a medida da pena, afirma (conclusão 20) censurar «…o douto Acórdão, pois entende que a fixação da pena única de 10 anos de prisão é manifestamente excessiva». De seguida, invoca a doutrina dos arts. 40º e 71º do CPenal, indica as penas parcelares que entende deviam ter sido aplicadas – a pena de 7 anos de prisão deve ser reduzida para 5 anos; cada uma das penas de 5 anos de prisão deve ser reduzida para 3 anos – e conclui (conclusões 30 e 31) que, considerando a globalidade dos factos e a sua personalidade, a pena conjunta devia/deve ser fixada em 6 anos e 5 meses de prisão que lhe parece suficiente para satisfazer de forma adequada as finalidades da punição, sendo exagerada e desajustada a pena em que vem condenado. 4.2.3.2. Por sua vez, o arguido AA argumentando do modo seguinte (conclusões 4 e segs., por referência a fls. 2663 e segs. da motivação): Embora não questione «o elevado grau de ilicitude dos factos, o modo de actuação, a idade das vítimas, a gravidade das suas consequências, a circunstância de estas terem sido deixadas amarradas», entende que esses factores já foram considerados na determinação das penas aplicadas por cada um dos crimes praticados. Além disso, não foi suficientemente valorado, - que os 3 crimes foram praticados nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar; - que constituem um acto isolado, «não associado a personalidade avessa ao direito»: não tinha antecedentes criminais e, passados que são mais de 4 anos sobre a sua prática, tem tido bom comportamento; - que as circunstâncias subjacentes à prática dos crimes foram alteradas: constituiu família, desenvolvia, à data da detenção, actividade profissional regular; está integrado social e familiarmente; - que tinha então 19 anos de idade; - que, no EP, tem tido comportamento ajustado sem sanções disciplinares, o que, tudo conjugado, devia ter determinado: a) – a atenuação especial da pena, por aplicação do regime «do DL 401/82, de 23 de Setembro e arts. 72 e 73 do C.P., fixando-se a pena única de 7 anos de prisão» ou, (b) – na hipótese de se entender não ser de aplicar este regime penal especial, a aplicação de uma pena conjunta de 8 anos de prisão. 4.3. Do mérito dos recursos. 4.3.1. Para apreciação do mérito dos recursos, começaremos, naturalmente, por alinhar o critério legal da determinação da medida da pena conjunta. Vejamos, pois. Nos termos do artº 77º, nº 1, do CPenal, a medida da pena conjunta é fixada em função dos critérios gerais da culpa e das exigências de prevenção estabelecidos nos seus arts. 40º, nº 1 e 71º, nº 1 e, ainda, do critério especial da 2ª parte do referido preceito. Isto é, na medida da pena do concurso são também necessariamente considerados, em conjunto, os factos e a personalidade do agente. Por isso é que Figueiredo Dias ensina Em “… As Consequências Jurídicas do Crime”, (1993), 291. , no que vem sendo seguido, sem divergências, pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça (Cfr., dos mais recentes, os Acórdãos de 29.03.2012, Pº nº 316/07.5GBSTS.S1-3ª; de 26.04.2012, Pº nº 70/08.3ELSB.L1.S1-5ª; de 21.06.2012, Pº nº 778/06.8GAMAI.S1-5ª; de 05.07.2012, Pºs nºs 246/11.6SAGRD.S1 e 145/06.SPBBRG.S1; de 15.11.2012, Pº Nº 178/09.8PQPRT-A.P1.S1,de 14.03.2013, Pº nº 287/12.6TCLSB, de 30.04.2013, Pº nº 11/09.0GASTS.S1, de 13.05.2013, Pº nº 392/10.3PCCBR.C2.S1, e de 06.03.2014, Pº nº 352/10.4PGOER.S1, todos da 3ª Secção), que «a exigência deste critério especial obriga logo (…) a que do teor da sentença conste uma especial fundamentação, em função de um tal critério, da medida da pena do concurso… só assim se evitando que a medida da pena do concurso surja como fruto de um acto intuitivo – da «arte» do juiz, uma vez mais – ou puramente mecânico e portanto arbitrário» (sublinhado e negrito nossos). Aplicando esta doutrina, diz, por exemplo, aquele Acórdão de 29.03.2012 que o «especial dever de fundamentação» exige a ponderação do «conjunto de todos os factos cometidos pelo arguido, de modo a surpreenderem-se, ou não, conexões entre os diversos comportamentos ajuizados, através duma visão ou imagem global do facto, encarado na sua dimensão e expressão global, tendo em conta o que ressalta do contexto factual narrado e atender ao fio condutor presente na repetição criminosa, procurando estabelecer uma relação desses factos com a personalidade do agente, tendo-se em conta a caracterização desta, com sua projecção nos crimes praticados». Voltando àquele critério, temos que o conjunto dos factos praticados nos indica a gravidade do ilícito global perpetrado, sendo decisiva para a sua avaliação a conexão e o tipo de conexão que entre os factos concorrentes se verifique; por sua vez, na avaliação da personalidade – unitária – do agente relevará, sobretudo, a questão de saber se o conjunto dos factos é reconduzível a uma tendência (ou eventualmente mesmo a uma «carreira») criminosa, ou tão-só a uma pluriocasionalidade que não radica na personalidade, só no primeiro caso se justificando atribuir à pluralidade de crimes um efeito agravante dentro da moldura penal conjunta. Relevo especial na operação terá ainda o juízo sobre o efeito previsível da pena no comportamento futuro do agente (exigências de prevenção especial de socialização). E os factores que intervieram na determinação de cada uma das penas parcelares não devem, por regra, ser de novo valorados na medida da pena conjunta, sob pena de violação do princípio da proibição da dupla valoração, salvo, naturalmente, quando esse factor seja referido, não a um dos crimes singulares, mas ao conjunto deles, porque, então, «não haverá razão para invocar a proibição da dupla valoração». Por outro lado, nos termos do artº 40º, nº 1, do CPenal, a aplicação das penas visa a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. À culpa está reservado o papel de limite intransponível da medida da pena, diz o nº 2 do mesmo preceito. Por sua vez, dispõe o nº 1 do artº 71º que a determinação da medida concreta da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção. E o número seguinte manda atender, para o efeito, a todas as circunstâncias – que enumera de forma exemplificativa nas suas diversas alíneas – que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor do agente ou contra ele: os “factores de medida da pena”, como lhes chama Figueiredo Dias Ob. cit. 232., os quais hão-de relevar naturalmente para efeitos da culpa e/ou da prevenção. Em síntese, continuando a seguir os ensinamentos do Mestre de quem a doutrina daqueles preceitos legais é tributária Cfr. o seu “Direito Penal – Parte Geral”, Tomo I, 2ª edição, 81 e 84., «(1) Toda a pena serve finalidades exclusivas de prevenção, geral e especial; (2) A pena concreta é limitada, no seu máximo inultrapassável, pela medida da culpa; (3) Dentro deste limite máximo ela é determinada no interior de uma moldura de prevenção geral de integração, cujo limite superior é oferecido pelo ponto óptimo de tutela dos bens jurídicos e cujo limite inferior é constituído pelas exigências mínimas de defesa do ordenamento jurídico; (4) Dentro desta moldura de prevenção geral de integração a medida da pena é encontrada em função de exigências de prevenção especial, em regra positiva ou de socialização, excepcionalmente negativa, de intimidação ou de segurança individuais», sendo estas que vão determinar, em última instância, a medida da pena. A medida da pena é, assim, à luz do direito vigente, função da medida da necessidade de tutela dos bens jurídicos, traduzida na tutela das expectativas comunitárias na manutenção e reforço da validade da norma violada, a determinar em consonância com as circunstâncias do caso concreto, em face do modo de execução do crime, da motivação do agente, das consequências da sua conduta, etc. Mas do mesmo modo que o Estado usa do seu ius puniendi, também tem o dever de oferecer ao condenado o mínimo de condições para prevenir a reincidência (cfr., o artº 2º do Código de Execução das Penas e Medidas Privativas da Liberdade, aprovado pela Lei 115/2009, de 15 de Outubro), nisso se traduzindo essencialmente as razões de prevenção especial (de socialização). Como nota Taipa de Carvalho Cfr “Direito Penal, Parte Geral – Questões Fundamentais”, 83 e 84., «a função da ressocialização não significa uma espécie de “lavagem ao cérebro”, … mas, sim e apenas, uma tentativa de interpelação e consequente auto-adesão do delinquente à indispensabilidade social dos valores essenciais (…) para a possibilitação da realização pessoal de todos e cada um dos membros da sociedade. Em síntese, significa uma prevenção da reincidência». Entre as razões de prevenção especial não pode, porém, escamotear-se a função de dissuasão ou intimidação do delinquente (prevenção especial negativa) que, segundo o mesmo Autor, em nada é incompatível com a função de ressocialização, porque se trata, não de intimidar por intimidar, mas antes de uma dissuasão, através do sofrimento inerente à pena, «humanamente necessária para reforçar no delinquente o sentimento de necessidade de se auto-ressocializar, ou seja de não reincidir». Este tem sido o caminho que temos seguido, como pode ver-se por, entre outros, os Acórdão de 26.02.2014, Pº nº 732/11.8GBSSB.L1.S1 e de 10.09.2014, Pº nº 223/10.4SMPRT.P1.S1. 4.3.2. Apreciemos, portanto, à luz destas considerações, os fundamentos dos recursos. 4.3.2.1. Antes, porém, olhando para a fundamentação do acórdão recorrido, dir-se-á que essa fundamentação, no que respeita à medida da pena conjunta, é demasiado sóbria, quando não mesmo deficiente, por incompleta. Mas, como concede Figueiredo Dias Loc. cit. na nota anterior., o dever de fundamentação da pena conjunta não tem que assumir nem o rigor nem a extensão exigidos para a fundamentação das penas parcelares. E, como vem entendendo a doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, embora referida ou aos fundamentos de facto ou aos fundamentos de direito, é que conduz à nulidade da decisão. A fundamentação insuficiente, deficiente ou não convincente não constitui nulidade da decisão, embora justifique a sua impugnação mediante recurso Cfr. Alberto do Reis, “Código de Processo Civil, anotado”, vol. 5, 140; Rodrigues Bastos, “Notas ao Código de Processo Civil, Vol. III (1972), 246; Antunes Varela e Outros, “Manual de Processo Civil”, 669 e Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, 221,222.. Esta é, também, a solução adoptada, por exemplo, nos Acórdãos de 26.03.2014, Pº nº 15/10. 0JAGRD.E2.S2-3ª Secção – que, citando Alberto do Reis, perfilhou o entendimento de que só a falta absoluta de fundamentação, «por ausência total de explicação da razão por que se decide de determinada maneira» determina a nulidade do despacho/sentença. A «insuficiência ou a mediocridade da motivação [que] é espécie diferente [da falta absoluta de motivação] afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade» – e de 10.09.2014, Pº nº 223/10.4SMPRT.P1.S1, também desta Secção, que invocou o primeiro. Seja como for, mesmo que de nulidade se tratasse no caso sub judice, o vício sempre teria de ser por nós suprido, nos termos da parte final do nº 2 do artº 379º do CPP, pois que os factos provados se mostram suficientes para alicerçar uma fundamentação completa da medida da pena conjunta Neste sentido, cfr. Oliveira Mendes no “Código de Processo Penal, Comentado” (2014), 1183/84.. 4.3.2.2. Nada obstando, pois, ao julgamento do objecto dos recursos que, tal como o definimos, se cinge, em qualquer dos casos, à medida da pena conjunta em que cada um dos Recorrentes foi condenado, apreciemos as razões dos Recorrentes. 4.3.2.2.1. Um dos fundamentos que o recorrente AA invoca para ver reduzida a pena conjunta em que foi condenado é o de que devia ter sido especialmente atenuada ao abrigo do Regime Penal Especial do DL 401/82, de 23 de Setembro. No parecer que emitiu, o Senhor Procurador-geral Adjunto do Supremo Tribunal de Justiça considerou o recurso inadmissível, nessa parte, por o aludido Regime Especial só ter «incidência nas molduras de cada um dos crimes». O Supremo Tribunal de Justiça vem efectivamente entendendo, sem divergências, que, no caso de concurso de crimes, as circunstâncias susceptíveis de justificarem a atenuação especial da pena, por aplicação quer do “Regime Especial” do DL 401/82, de 23 de Setembro (cfr. o seu artº 4º) quer do regime geral do artº 72º do CPenal, actuam no momento da determinação da medida concreta de cada uma das penas singulares e não (ou também não) no momento da determinação da pena conjunta (cfr. neste sentido, entre outros, os Acórdãos de 20.09.2007, Pº nº 2820/07-5ª Secção, de 02.04.2008, Pº nº 803/07-3ª Secção, de 25.06.2008, Pº nº 1412/08-5ª Secção, de 09.06.2010, Pº nº 468/06.1PGLSB.S2-5ª Secção, de 17.02.2011, Pº nº 518/03.3TAPRD-A.S1-5ª Secção, de 16.03.2011, Pºs nºs 92/08.4GDGMR.S1 e 188/07.0PBBRR.S1, ambos da 5ª Secção, de 05.06.2012, Pº nº 1276/10.0PAESP.P1.S1-3ª Secção, de 28.06.2012, Pº nº 14447/08.0TDPRT.S1-5ª Secção, de 15.11.2012, Pº nº 5/04.2TASJP.P1.S1-3ª Secção, de 21.03.2013, Pº nº 153/10.0PBVCT.S1-3ª Secção, de 04.07.2013, Pº nº 144/10.0JBLSB.L1.S1-5ª Secção, de 20.02.2014, Pº nº 99/12.7JALRA.L1.S1-5ª Secção, de 26.02.2014, Pº nº 732/11.8GBSSB.L1.S1, de 06.03.2014, Pº nº 352/10.4PEOER.S1-3ª Secção, de 07.05.2014, Pº nº 9/10.6PCLRS:L1.S1-5ª Secção, de 25.06.2014, Pº nº 14447/08.0TDPRT.S1-3ª Secção, de 19.02.2015, Pº nº 1735/10.5PBGMR.S1-5ª Secção, de 15.04.2015, Pº nº 1474/12.2PJPRT.P1.S1-5ª Secção, de 11.06.2015, Pº nº 401/13.4JAPRT.P1.S1-5ª Secção e de 18.02.2016, Pº nº 2927/13.0TAMAI.P1-3ª Secção). Justamente porque, na determinação da pena do concurso, o tribunal, nos termos do artº 77º do CPenal, fixa, em primeiro lugar, a medida da pena que entende caber a cada um dos crimes do concurso, como se de crimes singulares se tratasse, seguindo o programa para o efeito traçado pelos arts. 40º e 71º, do mesmo Código, penas parcelares essas com que, depois, cria a moldura penal do concurso (cfr. nº 2 daquele artº 77º). Vale isto por dizer que é no momento da determinação de cada uma das penas parcelares que o tribunal há-de atender às particulares circunstâncias do respectivo crime e não no momento da determinação da pena conjunta, sem embargo, naturalmente, de esta ser função da avaliação, em conjunto, dos factos e da personalidade do agente. Consequentemente, a pretensão da atenuação especial da pena conjunta, não pode ser agora atendida – razão por que improcede este fundamento do recurso do arguido AA. (Note-se que, tendo qualquer daquelas vias da atenuação especial sido apreciada e recusada pela 1ª Instância relativamente aos crimes parcelares, e tendo essa decisão sido confirmada pelo Tribunal da Relação, o correspondente segmento do acórdão recorrido não é susceptível de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, como atrás verificamos). 4.3.2.2.2. O arguido BB «ousa», como o próprio diz, censurar o acórdão recorrido. Mas em momento algum aduz especificadamente os fundamentos da sua impugnação. Com efeito, tendo-se proposto demonstrar terem sido «violados por incorrecta interpretação os artigos 40º, nº 1 e 2, artigo 71º ambos do Código Penal e artigo 18º da CRP», o discurso que se segue fica-se pela invocação de Figueiredo Dias, em “… As Consequências Jurídicas do Crime”, e da doutrina que decorre da interpretação dos referidos preceitos, sem nunca ter cotejado a sua conduta com qualquer dos factores da medida da pena. Aliás, no contexto da motivação, a pretensão de ver a pena conjunta reduzida para 6 anos e 5 meses de prisão é essencialmente consequência da apetecida redução das penas parcelares, segmento do recurso este que, como vimos, foi rejeitado. Apesar disso, acautelando o soçobro dessa pretensão, disse que essa pena lhe parece «suficiente para satisfazer de forma adequada e suficiente as finalidades da punição e ao mesmo tempo exagerada e desajustada a [sua] condenação numa pena única de 10 anos de prisão», porquanto, mantendo-a, «não estaremos perante uma pena justa e estaremos a contribuir para a desinserção social do agente e desinserção familiar», além de que «não salvaguarda a necessidade de prevenção geral nem de prevenção especial». Mais uma vez, uma alegação sem referência ao substrato factual que justifica as conclusões que alinha mas, apesar disso, suficiente para nos habilitar a conhecer e a apreciar as razões do seu recurso. O arguido AA foi mais concreto, como anotamos. Prossigamos, então, seguindo o itinerário que indicamos para a fixação da pena conjunta O conjunto dos factos provados mostra: – que os Arguidos – os Recorrentes e os dois companheiros que não foram identificados – gizaram um plano prévio para assaltarem a residência dos Ofendidos; – que actuaram pela calada da noite – 23:30h – munidos de um instrumento (pé de de cabra) apropriado para arrombarem a janela da cozinha daquela habitação e de material adequado a manietar «de pés e mãos» os três Residentes, depois de os terem sovado (socos no rosto e no corpo de que resultaram as consequências referidas nos nºs 7 a 13 dos “Factos Provados”); – que, dominados os Ofendidos e exigida a localização do dinheiro e ouro, os Arguidos se apropriaram de €3.500,00 em notas e de várias peças em ouro, após o que abandonaram a casa, deixando os donos «amarrados e amordaçados», e fugiram para Espanha. Ora, é das regras da experiência comum que os assaltos a residências, com ofensa da integridade física dos seus habitantes, sejam os cometidos em meios pequenos, sejam os praticados nas grandes metrópoles, são geradores de forte clima de insegurança e de intranquilidade entre a população em geral, sediada ou não no local onde foram consumados. Numa época de globalização como a nossa, a notícia de ocorrências desse tipo, mesmo nos locais mais recônditos – o que, convenhamos, não é o caso dos autos – depressa se espalha à escala nacional (e não só) através dos meios de comunicação social e das redes sociais que chegam a todo o lado e que preenchem as primeiras páginas e os seus repetidos noticiários sobre os «casos do dia». No caso dos presentes autos, foram três irmãos as pessoas atacadas, todos de idade avançada (como se vê do auto de inquirição e dos relatórios médico-legais de fls. 35, 50, 54 e 59, à data dos factos a ofendida DD tinha ultrapassado os 85 anos, o António os 82 e a Maria de Fátima, a mais nova, os 65) e indefesas. Por isso que o clima de incerteza, de insegurança e de intranquilidade que o caso concreto provocou tenha especial incidência na avaliação das exigências de prevenção geral que o acórdão da 1ª Instância, confirmado pelo acórdão recorrido, classificou de «profundas, atento o alarme social … nomeadamente atento o número crescente de idosos que residem sozinhos». Corroboramos, pela nossa parte, a graduação deste factor da determinação da medida da pena conjunta, atendendo ao tremendo e intolerável alarme social que a concreta actuação do grupo dos Recorrentes notoriamente causou, aterradora como foi da integridade física das vítimas e usurpadora da sua fazenda. No caso, e neste particular, não há que distinguir relativamente à conduta de qualquer dos Arguidos. Por outro lado, a culpa, enquanto juízo de censura dirigido a cada um dos Recorrentes, por a sua conduta criminosa se revelar expressão de uma atitude interna juridicamente desaprovada e pela qual têm de responder perante a exigências do dever-ser sócio-comunitário Cfr. Figueiredo Dias, “Direito Penal, Parte Geral”, Tomo I, 2ª edição, 274. , também se situa num patamar elevado, como o mostra a circunstância de os Recorrentes e os seus dois outros companheiros não identificados terem planeado o assalto e previsto o uso de violência física, razão por que se muniram dos utensílios que lhes pareceram necessários para o executar com êxito, como efectivamente executaram. E agiram sempre «de forma livre, deliberada e consciente, perfeitamente conhecedores de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei», com dolo intenso, portanto. Embora não seja directamente reportado a este factor da medida da pena conjunta, importa aqui atender ao argumento do arguido AA de que não foi suficientemente ponderada a circunstância de, então, ter 19 anos de idade. Decidimos atrás que o Regime Penal Especial para Jovens estabelecido pelo DL 401/82, de 23 de Setembro, por imperativo do artº 9º do CPenal, para os jovens que à data da prática do crime tenham completado 16 anos sem terem atingido os 21, não era aplicável à determinação da pena conjunta. E, tendo o arguido BB, na altura, completado os 22 anos, a questão não se coloca quanto a ele. Todavia, a exclusão daquele regime especial relativamente à pena conjunta não significa que, na sua determinação, não se deva atender à juventude do agente, sem que com isso se viole o princípio da proibição da dupla valoração, porquanto se trata agora de circunstância referida, não a um ou cada um dos crimes singulares, mas ao conjunto deles, enquanto factor que interessa à culpa global e/ou à exigências de prevenção especial. Vejamos, então. A idade era uma das circunstâncias que figurava na tabela Figueiredo Dias, Ob. cit., 220. de atenuantes gerais do artº 39º do CPenal de 1886, concretamente no seu nº 3: no que para aqui interessaria, ser o agente menor de 21 anos. A esse propósito, dizia Eduardo Correia “Direito Criminal”, II, 382. que «se a idade é pressuposto da imputabilidade [vd. Artº 17º da OTM, DL 44288, de 20.04.1962, que alterou o nº 1 do artº 42º do CPenal de 1886; relativamente ao CPenal vigente, vd. Artº 19º], compreende-se que a menoridade em geral atenue a pena». Por isso é que o artº 39º, nº 3, do CPenal 1886 incluía no elenco das «circunstâncias atenuantes da responsabilidade criminal … ser menor de … 21 anos…». O Código Penal actual, como se vê do disposto no seu artº 71º, nº 2, acabou, porém, com aquelas tabelas de atenuantes gerais. Mas a consideração da idade do arguido continua a poder relevar, agora no âmbito das «condições pessoais do agente», atendíveis, para efeitos da medida da pena, pela alínea d) daquele preceito Dada a ambivalência de alguns dos factores da medida concreta da pena e, até, do seu significado antinómico, consoante sejam valorados para efeitos de culpa ou de prevenção, diminuindo (atenuando) as exigências de culpa e aumentando (agravando) as exigências de prevenção, ou vice-versa, Figueiredo Dias Ob. cit. 220 e 248. adverte, a propósito das «condições pessoais do agente» – alínea d) do nº 2 daquele artº 71º –, para o cuidado com que tem de ser manipulado este factor, justamente pela «particularíssima ambivalência» de que é dotado: «só em concreto se pode determinar o papel, agravante ou atenuante, que desempenham circunstâncias como as da … sua [do agente] idade, quando conexionadas com o círculo de deveres especiais que ao agente incumbiam». Nesta perspectiva, aceitamos que a idade do arguido AA atenue ligeiramente a sua culpa. Mais moderado ainda, porque mais maduro, será o efeito atenuativo da idade do arguido BB. Quanto à gravidade do ilícito global, o que deixámos dito quanto ao planeamento, à execução dos crimes e seus resultados e consequências, coloca-a, sem dúvida, num patamar elevado. Aliás, o arguido AA é o primeiro a reconhecer, como deixámos dito, «a gravidade dos factos praticados e o elevado grau de ilicitude que os mesmos representam». Na avaliação da personalidade, temos de considerar que os três crimes foram praticados, como o mesmo Arguido alega, «nas mesmas circunstâncias de tempo, modo e lugar». Materialmente, desprezando a sua qualificação jurídica, estamos, de facto, perante uma única e isolada acção criminosa (de que resultou, é certo, a prática de três crimes de roubo, por três serem os ofendidos) a que acresce a circunstância de, em função dos “Factos provados” não serem conhecidos, a qualquer dos Recorrentes, antecedentes criminais. Esta circunstância, conjugada com a sua juventude, não permite naturalmente concluir que os crimes praticados são reconduzíveis a uma carreira ou a uma tendência criminosa, ou mesmo a mera pluriocasionalidade. Por isso que, na esteira daquela lição de Figueiredo Dias, não possamos atribuir à pluralidade dos crimes praticados, um efeito especialmente agravante dentro da moldura penal do concurso. Quanto às condições pessoais dos Arguidos constatamos que o que o acórdão da 1ª instância refere como “factos provados” (nºs 24 a 34, relativamente ao arguido AA; nºs 42 a 50., relativamente ao arguido BB), não é senão o que os dois Recorrentes declararam ao IRS, como da própria decisão sobre a matéria de facto consta. Na economia do texto da decisão o que ficou provado foi, pois, que os Arguidos declararam o que aí consta e não que o que aí consta tenha ficado provado, circunstância que retira aos respectivos factos efeito atenuativo. Por isso, sem valor atenuativo o facto de no nº 46º constar que o arguido BB «assume que não teve qualquer confronto com o sistema de administração da justiça do seu país», a República da Roménia. Aliás, consta da informação de fls. 782, evidentemente mais credível do que aquela «declaração» do Arguido, que foi condenado, no seu país, por crimes contra o património praticados em 2010 e 2011 – o que, tratando-se embora de factos praticados depois dos crimes por que está a responder, contraria aquela assunção, considerando a data do julgamento em Portugal. Como também aí consta que foi condenado na Alemanha por furto praticado em 24.08.2010 – isto é, escassas 3 semanas depois dos roubos praticados em Portugal – sendo procurado para cumprir aí uma pena de 3 anos de prisão, e que praticou um crime de furto em França, em 27.04.2012. Mas tratando-se de factos também não julgados provados pelas instâncias, não poderão ser considerados para os efeitos que nos ocupam, designadamente para deles retirarmos qualquer efeito agravativo da pena conjunta. Referimo-los apenas como contraponto das próprias declarações do Arguido sobre o seu percurso criminal. Quanto às demais condições pessoais dos Recorrentes, tal como emergem das declarações que prestaram ao IRS, nada temos a opor. Neste contexto, considerando apenas os factos efectivamente julgados provados, designadamente a juventude dos Arguidos (neste plano, a idade não funciona como atenuante), entendemos que as exigências de prevenção especial, tanto de socialização como de intimidação são prementes, embora moderadas. Postas estas considerações, atendendo designadamente a que os factos provados não indiciam que os crimes agora em julgamento sejam fruto nem de uma carreira, nem de uma tendência criminosa, nem sequer que outros igualmente criminosos tenham sido praticados anteriormente pelos mesmos Arguidos, julgamos que a pena conjunta a que devem ser condenados não deve afastar-se significativamente do limite mínimo da respectiva moldura (7 a 17 anos de prisão). E assim, considerando a diferença de idades dos dois Recorrentes, mais madura e, por isso, mais responsável a do arguido BB, julgamos adequada (a) a pena conjunta de 8 (oito) anos de prisão para o arguido AA e (b) a pena conjunta de 8 (oito) anos e meio para o arguido BB, qualquer delas perfeitamente suportada pela culpa de cada um deles. 5. Em conformidade com o exposto, acordam na Secção Criminal do Supremo Tribunal de Justiça em: 5.1. na procedência das questões prévias suscitadas pelo Senhor Procurador-geral Adjunto, 5.1.1. rejeitar, por ser manifestamente improcedente, nos termos das disposições legais invocadas em 4.1.1, supra, o segmento do recurso do arguido BB em que alegou a violação do princípio in dubio pro reo; 5.1.2. rejeitar¸ por não ser admissível, nos termos das disposições legais invocadas em 4.1.2., supra, o segmento do recurso do mesmo Arguido em que impugnou as penas parcelares em que foi; 5.2. julgar, no mais, parcialmente procedente o recurso interposto pelo mesmo Arguido e, em consequência, condená-lo na pena conjunta de 8 (oito) anos e meio de prisão; 5.3. julgar parcialmente procedente o recurso interposto pelo arguido AA e, em consequência, condená-lo na pena conjunta de 8 (oito) anos de prisão; 5.4. revogar, na parte correspondente (medida das penas conjuntas), o acórdão recorrido e confirmá-lo no mais. Sem custas (artº 513º, nº 1, do CPP) Lisboa, 17 de Março de 2016 Processado e revisto pelo Relator Sousa Fonte (Relator) Santos Cabral |