Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | 4.ª SECÇÃO | ||
Relator: | JÚLIO GOMES | ||
Descritores: | DIREITO DE OPOSIÇÃO TRANSMISSÃO DA UNIDADE ECONÓMICA TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO CESSÃO DE POSIÇÃO CONTRATUAL CONVENÇÃO COLETIVA DE TRABALHO PRINCÍPIO DA FILIAÇÃO | ||
Data do Acordão: | 03/06/2024 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
Meio Processual: | REVISTA | ||
Decisão: | CONCEDIDA A REVISTA. | ||
Sumário : |
I- Da existência de uma cláusula de uma convenção coletiva de manutenção da posição de empregador no caso de sucessão de prestadores de serviços junto do mesmo cliente não decorre automaticamente que se verifique a manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos, que é um indício extremamente importante na hipótese de a atividade assentar fundamentalmente na mão-de-obra como sucede frequentemente em atividades de segurança privada. II- Há, com efeito, que ter presente que rege entre nós o princípio da filiação. Acresce que mesmo uma convenção coletiva que tenha sido objeto de extensão por portaria não tem eficácia erga omnes, não se aplicando aos trabalhadores filiados em outro sindicato que não outorgou a convenção. III- O indício de grande relevância nestes casos é a manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos e não a circunstância de no serviço o novo prestador ter conservado o mesmo número de postos de trabalho (mas não os mesmos trabalhadores). IV- O fundamento para o direito de oposição do trabalhador não pode deixar de ter em conta a informação que lhe foi, ou não, proporcionada, nomeadamente quanto às medidas projetadas pelo eventual transmissário em relação aos trabalhadores abrangidos pela transmissão. Se a única informação que lhe foi prestada foi a identidade do eventual transmissário, existe um risco de prejuízo sério que o trabalhador não está minimamente em condições de avaliar, pelo que pode opor-se alegando que confia no seu empregador e carece de razões objetivas para confiar no potencial transmissário. V- A cessão da posição contratual de empregador operada por convenção coletiva, que não constitua transmissão de unidade económica, está também ela sujeita ao consentimento do próprio trabalhador interessado, como sucede com qualquer cessão de posição contratual. | ||
Decisão Texto Integral: | Processo n.º 889/21.0T8EVR.E1.S1 Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça, 1. Relatório AA intentou contra Strong Charon – Soluções de Segurança, S.A. e Especial 1 - Segurança Privada S.A. ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, formulando os seguintes pedidos: “Face ao exposto, requer o Trabalhador Autor muito respeitosamente a V/ Exa., se digne: 1) Declarar como transmitido ou não transmitido pela 1ª Ré ( Strong Sharon) à 2ª Ré (Especial 1) o contrato individual de trabalho titulado pelo Autor Trabalhador, AA. 2) Declarar ilícito o despedimento do Autor Trabalhador, com a consequente reintegração do trabalhador nos quadros da 1ª Ré ou 2ª Ré, com a mesma categoria e antiguidade, ou subsidiariamente, ao pagamento de uma indemnização nos termos do Art. 391º/ 1 a) do CT, não inferior ao valor de 16.730,00 € (Dezasseis Mil Setecentos e Trinta Euros) 3) Condenar a 1ª ou 2ª Ré a pagar os seguintes créditos laborais: retribuições que deixou de auferir desde Janeiro de 2021 até ao trânsito em Julgado da presente Acção (valor de cerca de 3985,00 € até data de propositura da Acção), proporcionais de subsídio de Natal de 2021 (cerca de 398,50 €), proporcionais de férias (cerca de 398,50 €) e proporcionais de subsídio de férias (cerca de 398,50 €), valor de 5.180,50 €; acrescendo o valor de juros de mora à taxa legal em vigor, vencidos desde a data da cessação do contrato de trabalho até à data da propositura da presente Acção , no montante de 95,00 €, bem como os que vencerem até integral pagamento, perfazendo à presente data um valor global a título de créditos devidos ao Autor trabalhador, um valor global de 5275,50 € (Cinco Mil Duzentos e Setenta e Cinco Euros e Cinquenta Cêntimos), com aplicação do Art. 45º da supra mencionada Convenção Colectiva de Trabalho, a Entidade Empregadora será obrigada a indemnizar o Autor / Trabalhador no montante mínimo de 3 vezes do montante em falta, ou seja, neste caso concreto, o valor de 15 826,50€ (Quinze Mil Oitocentos e Vinte Seis Euros e Cinquenta Cêntimos). 4) Valor de Danos morais no montante de 1000 € (Mil Euros). 5) Condenar a 1ª Ré ou 2ª Ré no valor de juros de mora vencidos desde a data da propositura da Acção até à data do integral pagamento”. As Réus contestaram. O Autor apresentou articulado de resposta à exceção de ilegitimidade passiva da Ré Especial 1 - Segurança Privada S.A.. Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a exceção de ilegitimidade, e foi realizada a audiência de julgamento. Em 25.08.2022, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo: “Em face do exposto, decide-se julgar a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência: 1- Declara-se que a posição de empregador no contrato de trabalho celebrado entre o Autor AA e a 1.ª Ré STRONG CHARON – SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A. se transmitiu para a 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. 2- Declara-se ilícito o despedimento do Autor AA pela 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. 3- Condena-se a 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. a pagar ao Autor AA a quantia global de € 13.004,44 (treze mil e quatro euros e quarenta e quatro cêntimos), a título de indemnização em substituição de reintegração, acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, que se fixa presentemente em 4%, contados desde a data da respetiva citação até efetivo e integral pagamento. 4- Condena-se a 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. a pagar ao Autor AA a quantia correspondente às retribuições que o mesmo deixou de auferir desde o respetivo despedimento (1 de Janeiro de 2021), até ao trânsito em julgado da presente decisão – incluindo os montantes devidos a título de férias e subsídio de férias que se venceram em 1 de Janeiro de 2021, bem como de proporcionais de férias, subsídio de férias e de subsídio de Natal, vencidos após a referida data –, à qual deverão ser deduzidas (i) as importâncias que o trabalhador tenha auferido com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento, (ii) a retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da ação, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento, e (iii) o subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período em causa, devendo a 2.ª Ré entregar essa quantia ao Instituto da Segurança Social, I.P., sendo a referida quantia acrescida de juros de mora à taxa legal em vigor, que se fixa presentemente em 4%, contados desde a data do respetivo vencimento até efetivo e integral pagamento, e devendo a mesma, se necessário, ser liquidada em sede de ulterior incidente de liquidação. 5- Condena-se a 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. a pagar ao Autor AA a quantia de € 750,00 (setecentos e cinquenta euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos na sequência do respetivo despedimento ilícito, acrescida de juros de mora vincendos, contados desde a data da presente sentença até efetivo e integral pagamento, à taxa legal em vigor, que se fixa presentemente em 4%. 6- Absolve-se a 2.ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. do demais peticionado pelo Autor AA nos presentes autos. 7- Absolve-se a 1.ª Ré STRONG CHARON – SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A. de tudo quanto peticionado pelo Autor AA nos presentes autos. 8- Condena-se o Autor AA e a 2. ª Ré ESPECIAL 1, SEGURANÇA PRIVADA, S.A. no pagamento das custas, na proporção do respetivo decaimento, que se fixa em 25 % e 75 %, respetivamente, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário e/ou isenção de que eventualmente beneficiem.” A Ré Especial 1 - Segurança Privada S.A. interpôs recurso de apelação. Por acórdão do Tribunal da Relação de 30.03.2023 foi decidido negar provimento ao recurso e confirmar a sentença recorrida. A Ré Especial 1 - Segurança Privada S.A.. interpôs recurso de revista excecional, arguindo, além do mais, a nulidade do acórdão. A Ré Strong Charon – Soluções de Segurança, S.A. contra-alegou. O recurso foi admitido por despacho de 25.06.2023. Por acórdão de 28.06.2023, o Tribunal da Relação de Évora indeferiu a arguição da nulidade. A Formação prevista no artigo 672.º n.º 3 do CPC junto da Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça admitiu a revista excecional. Em conformidade com o disposto no artigo 87.º n.º 3 do CPT, o Ministério Público emitiu Parecer no sentido da improcedência do recurso e da manutenção do Acórdão recorrido. Sublinhe-se que sustentou não estar demonstrada, no entanto, a existência de transmissão de unidade económica; destarte, concluiu que a transmissão da posição contratual de empregador para a 2.ª Ré decorria unicamente da cláusula da convenção coletiva. Tanto a 1.ª Ré, como a 2.ª Ré responderam ao Parecer. 2. Fundamentação De Facto Foi a seguinte a matéria de facto dada como provada nas instâncias 1. A 1.ª Ré Strong Charon e a 2.ª Ré Especial 1 são sociedades comerciais que se dedicam à prestação de serviços de segurança privada. 2. Entre o Autor e a P..., S.A. foi celebrado escrito denominado de ‘contrato de trabalho a termo certo n.º 3236’, em 6 de Agosto de 2007, mediante o qual declararam que a segunda admitia o primeiro ao seu serviço para exercer as funções inerentes à categoria de vigilante, a partir da data acima referida e pelo período de 12 meses, mediante o pagamento da quantia de € 595,13, a título de retribuição mensal. 3. Em Outubro de 2008, a P..., S.A. foi incorporada, por fusão, na C..., Lda. 4. Em Junho de 2018, na sequência de um processo de fusão, o Autor foi integrado pela 1.ª Ré Strong Charon como seu trabalhador, mantendo todos os direitos regalias e demais características e condições emergentes do escrito de contrato de trabalho acima referenciado. (Quanto à prestação de serviços pela 1.ª Ré Strong Charon na Herdade do ...) 5. Em data não concretamente apurada, a 1.ª Ré Strong Charon e a sociedade P..., S.A. acordaram na prestação de serviços de vigilância por parte da primeira nas instalações da Herdade do ..., sita no Lote ..., mediante o pagamento de um preço acordado pelas partes. 6. Os serviços acordados consistiam em assegurar durante 24 horas por dia quatro vigilantes, em regime de turnos rotativos e alternados, nas instalações da Herdade do ..., os quais deveriam executar: (i) funções de controlo e registo de acessos e permanência de pessoas, viaturas e movimentos de cargas nas instalações, (ii) abertura e encerramento das instalações, (iii) elaboração de relatórios diários de ocorrências e (iv) rondas de vigilância às referidas instalações, com recurso a um sistema de registo/picagem. 7. Desde data não concretamente apurada, mas não posterior a 1 de Janeiro de 2020, e até 31 de Dezembro de 2020, exerceram as suas funções de vigilantes, por conta, sob as ordens e autoridade da 1.ª Ré Strong Charon, nas instalações da Herdade do ...: (i) o Autor AA, (ii) BB (iii) CC e (iv) DD. 8. Os referidos vigilantes actuavam de forma organizada, executando as funções descritas em 6. e tendo como local de trabalho a portaria existente na Herdade do .... 9. Desde data não posterior a 1 de Janeiro de 2020, os serviços acima descritos passaram a ser supervisionados directamente pelo responsável do cliente EE, o qual transmitia aos vigilantes da 1.ª Ré algumas instruções de serviço a ser realizado nas referidas instalações. 10. Para o exercício das referidas funções, os vigilantes acima identificados utilizavam um conjunto de chaves das instalações, pertencentes à cliente P..., S.A. 11. Para além do conjunto de chaves acima referido, os vigilantes utilizavam, no exercício das referidas funções, fardas, registos de relatório, uma lanterna, um sistema de rondas e pistola de picagem, que pertenciam à 1.ª Ré Strong Charon e que continham o modelo e imagem identificativos da mesma. 12. Os vigilantes acima identificados utilizavam também, no exercício das respectivas funções, uma secretária e uma cadeira, que os próprios levaram para as instalações em causa. 13. Por carta datada de 17 de Novembro de 2020, enviada pela P..., S.A. à 1.ª Ré Strong Charon, e por esta recebida, a primeira comunica à mesma que: « (…) Assunto: Denúncia da Prestação de Serviços de Vigilância e Segurança. Exmos. Senhores, Fazemos referência aos serviços de vigilância e segurança privada prestados por V. Exas. À sociedade P..., S.A. (a “P...”), desde 2017. A P... vem, pela presente, informar V. Exas. da sua intenção de fazer cessar a prestação de serviços de vigilância e segurança privada. Assim, informamos V. Exas. que deverão cessar a prestação de serviços de vigilância e segurança privada em 31 de Dezembro de 2020». (Quanto às comunicações trocadas entre o Autor e as Rés) 14. Por carta datada de 11 de Dezembro de 2020, enviada pela 1.ª Ré Strong Charon ao Autor, e por este recebida, a primeira comunicou ao mesmo que: «(…) Assunto: Informação sobre a transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente – Herdade do ... – e nova Entidade Empregadora – Artigo 286.º do Código do Trabalho. Exmo. Senhor,V. Ex.ª foi devidamente informado que os serviços de vigilância prestados pela STRONG CHARON, SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A. nas instalações do cliente, foram adjudicados à Empresa de Segurança Especial 1, Segurança Privada SA, com efeito a partir do dia 1 de Janeiro de 2021. Assim, e a partir dessa data, a COPS será a entidade patronal de V. Ex.ª, conforme resulta do disposto nos art.º 285.º a 287.º do Código do Trabalho, que regulam a transmissão de empresa ou estabelecimento. Reiteramos que não resultam quaisquer consequências de maior ou substanciais em termos jurídicos, económicos ou sociais para V. Ex.ª porquanto lhe é garantida a manutenção de todos os seus direitos, designadamente, a manutenção de antiguidade, de retribuição, e da categoria profissional em que se enquadra. Mais informamos V. Exa. que se pretender que esta empresa remeta para a COPS informação relativa à sua situação sindical, deverá solicitá-lo expressamente e por escrito devidamente assinado. É que se trata de informação sensível que, como tal, merece sigilo e protecção especial que não afastaremos sem a sua solicitação. Informamos também, que a consulta prevista ao abrigo do art.º 286º do CT, se encontra agendada, para o dia 28 de Dezembro de 2020 entre as 09:30h-12h e as 14h-17h nas instalações sitas na Rua ...» 15. Por carta datada de 11 de Dezembro de 2020, enviada pela 1.ª Ré Strong Charon à 2.ª Ré Especial 1, e por esta recebida, a primeira comunicou à mesma que: «(…) Assunto: Informação sobre a transmissão do estabelecimento referente ao cliente: Herdade do ... e a consequente transmissão dos contratos de trabalho dos trabalhadores que ali prestam serviço. Exmos. Senhores, Como é do conhecimento de V. Exas., a Especial 1, Segurança Privada SA irá suceder à STRONG CHARON, SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A. (adiante STRONG CHARON) na prestação de serviços de vigilância ao cliente Herdade do .... A transmissão é motivada pela adjudicação da prestação de serviços de vigilância a um novo operador, a Especial 1, Segurança Privada SA, e terá efeitos a partir do próximo dia 1 de Janeiro de 2021. A transmissão de empresa ou de estabelecimento está prevista e regulada nos artigos 285.º a 287.º do Código do Trabalho, nos quais é definido que em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa ou estabelecimento, ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, “transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respectivos trabalhadores”. Verificando-se, como se verifica no caso concreto, a transmissão para a Especial 1, Segurança Privada SA da exploração das unidades económicas anteriormente exploradas pela STRONG CHARON, SOLUÇÕES DE SEGURANÇA, S.A., a transferência dos contratos de trabalho para a Especial 1, Segurança Privada SA é automática, resulta da imposição da lei e tem por fim salvaguardar a manutenção dos direitos dos trabalhadores, designadamente, a manutenção de antiguidade, de retribuição e da categoria profissional que se enquadram, garantindo-lhes o direito à segurança no emprego e a manutenção de todos os seus direitos. Neste seguimento, para se concretizar a transmissão dos contratos de trabalho em cumprimento do Código do Trabalho e para execução do Contrato Individual de Trabalho de cada trabalhador ao serviço da unidade económica que passará a ser explorada por V. Exas. procederemos ao envio de dados pessoais relativos aos trabalhadores ao serviço em tal/tais unidade(s). Este envio constitui um tratamento de dados pessoais nos termos do disposto no Regulamento Geral de Dados Pessoais e o respectivo tratamento está legitimado pelo disposto no art.º 6.º, n.º 1, alínea b) e alínea c) do aludido diploma, uma vez que o tratamento é necessário para a execução do contrato de trabalho no qual o titular dos dados é parte, bem como é necessário para o cumprimento de uma obrigação jurídica do responsável pelo tratamento (cfr. art.º 285.º do Código do Trabalho). (…)». 16. Por carta datada de 11 de Dezembro de 2020, a 1.ª Ré Strong Charon comunicou à Autoridade para as Condições do Trabalho que a 2.ª Ré Especial 1 iria suceder-lhe na prestação de serviços de vigilância na Herdade do ..., a partir do dia 1 de Janeiro de 2021, tendo expedido a todos os trabalhadores da unidade económica em causa e aos seus representantes as «comunicações nos termos e para os efeitos do artigo 286.º, n.º 1, n.º 2 e n.º 4 e n.º 6 do Código do Trabalho». 17. Por carta datada de 16 de Dezembro de 2020, enviada pela 1.ª Ré Strong Charon ao Autor, e por este recebida, a primeira comunicou ao mesmo que: «(…) Assunto: Informação sobre a transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente – Herdade do ... – e nova Entidade Empregadora – Artigo 286.º do Código do Trabalho. Exmo. Senhor, No seguimento da missiva de dia 11/12/2020 referente à transmissão do cliente Herdade do ..., somos a informar que a empresa sucessora é a Especial 1, Segurança Privada SA. Pelo que a referência à empresa COPS não deverá ser considerada. (…)». 18. Por carta datada de 16 de Dezembro de 2020, enviada pelo Autor à 1.ª Ré Strong Charon, e por esta recebida, o primeiro comunicou à segunda que: «(…) Assunto: Transmissão do estabelecimento correspondente ao Cliente – Herdade do ... – e nova Entidade Empregadora – Artigo 286.º do Código do Trabalho. Exmos. Senhores, Em resposta à carta de V. Exas. com data de 11 de Dezembro de 2020 (a qual recepcionei no dia 15 de Dezembro do corrente ano) e sobre o assunto supra identificado, cumpre-me informar que tive a melhor atenção sobre o teor da mesma, pelo que, tenho por conveniente expor a V. Exas. o seguinte: 1- Sou Funcionário da STRONG CHARON desde 2007. 2- No âmbito das minhas funções de Vigilante da STRONG CHARON, actualmente presto maioritariamente serviço nas Instalações do Hotel ..., sem prejuízo, de ao longo dos anos, ter prestado serviço também em outras instalações. 3- Nunca tive qualquer vínculo laboral com o referido Hotel ou prestei qualquer serviço como funcionário do Hotel. Ou seja: sempre prestei serviço no Hotel no âmbito das minhas funções de Vigilante e de funcionário da STRONG CHARON e não do Hotel aqui já referido. 4- Face ao exposto, venho manifestar a V. Exas. a minha vontade em me manter na empresa para a qual tenho trabalhado e dado todo o meu empenho aos longos anos, a STRONG CHARON. 5- Com efeito, no âmbito e para os efeitos do disposto do artigo 286-A do Código do Trabalho, o qual prevê a possibilidade de oposição, venho manifestar aqui pela presente que, não tenho qualquer motivação profissional ou pessoal para sair da empresa que tanto confio e onde presto serviço há tantos anos, querendo-me manter como funcionário da STRONG CHARON. 6- Nestes termos, dirijo-me a V. Exas., apelando que me mantenham como funcionário da vossa empresa, a qual há 13 anos sirvo com todo o orgulho e com o meu melhor empenho a todos os níveis. 7- Convicto que darão uma resposta positiva à minha manifestação de manter o meu vínculo laboral com V. Exas., despeço-me com toda a consideração e apresento os meus melhores cumprimentos (…)». 19. Por carta datada de 24 de Dezembro de 2020, enviada pela 1.ª Ré Strong Charon ao Autor, e por este recebida, a primeira comunicou ao mesmo que: «(…) Exmo.(a). Senhor(a), Acusamos a recepção, em 18.12.2020, da carta de V. Ex.ª na qual comunica a sua oposição à transmissão do seu contrato de trabalho para a empresa de Segurança ESPECIAL 1. A oposição manifestada por V. Ex.ª não está factual nem legalmente sustentada, pelo que não se integra na previsão do número 1 do artigo 286.º-A do CT. Assim sendo, não existindo fundamento para a oposição apresentada por V. Ex.ª, a mesma é inválida e, consequentemente, não produz quaisquer efeitos, pelo que o seu contrato de trabalho se transmitirá para a ESPECIAL 1 com efeitos a partir de 01.01.2021, mantendo-se inalterado o seu posto de trabalho. Informamos que V. Ex.ª mantém na íntegra, por força da lei, todos os seus direitos, regalias, antiguidade e categoria profissional, pelo que em caso de incumprimento pela empresa ESPECIAL 1, deverá dar imediatamente conhecimento desta situação à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e/ou ao seu Sindicato». 20. Em 28 de Dezembro de 2020, na sequência de um contacto telefónico realizado pelo Autor à 2.ª Ré Especial 1, os responsáveis desta última informaram o mesmo de que não iria ocorrer qualquer transmissão de estabelecimento e que o mesmo continuava a ser trabalhador da 1.ª Ré Strong Charon. 21. Por carta datada de 24 de Março de 2021, enviada pelo Autor à 2.ª Ré Especial 1, e por esta recebida, o primeiro comunicou à segunda que: «(…) Assunto: 1- Comunicação da STRONG CHARON sobre transmissão do seu funcionário AA, para a empresa ESPECIAL 1, com efeitos a partir de 01 de Janeiro de 2021 e com manutenção de todos os direitos contratuais e antiguidade (conforme carta enviada pela STRONG CHARON ao aqui identificado funcionário, em 11 de Dezembro de 2020 e rectificada em 16 de Dezembro, cujas cartas constam em anexo). 2- Face à continuada ausência de indicações pela ESPECIAL 1 ao Trabalhador ora aqui signatário, quanto ao local de trabalho onde o já referido funcionário acima identificado se deve apresentar, continua o mesmo a aguardar que a vossa empresa ESPECIAL 1 comunique o local de trabalho e demais informação inerente, com vista a se apresentar ao trabalho no âmbito das suas funções de vigilante. 3- Em virtude de ainda não ter sido pago qualquer vencimento mensal pela ESPECIAL 1 ao Trabalhador aqui signatário, e para efeitos da sobrevivência dor referido funcionário, e caso ainda essa empresa continue sem pagar o vencimento e sem atribuir local de trabalho ao Trabalhador, resulta que face ao tempo decorrido e mantendo-se o silêncio de V. Exas., vê-se o Trabalhador obrigado a vir agora e por agora, a solicitar o competente preenchimento e devida (s) assinatura(s) do Modelo próprio para o efeito de pedido de Subsídio de Desemprego, até ver regularizada a sua situação laboral pela empresa ESPECIAL 1 com a atribuição de local de trabalho e pagamento de vencimento. (…) Após o contacto telefónico com V. Exas., em 28 de Dezembro de 2020, onde me informaram que a minha entidade patronal continuava a ser a STRONG CHARON e que devia de entrar em contacto com a mesma, e não obstante de já o ter feito por escrito, efectuei a diligência de contactar a STRONG CHARON pessoalmente, deslocando-me à sede da mesma, onde me voltaram a informar a mim e a outros colegas presentes e visados também nesta referida transferência, que efectivamente a partir de 1 de Janeiro de 2021, a minha actual entidade patronal é a ESPECIAL 1. Não obstante as minhas diligências junto de V. Exas. para aclarar esta situação, até porque no dia 1 de Janeiro de 2021, já me encontrava a trabalhar nas vossas Instalações (Herdade do ...) (instalações objecto de transferência para a ESPECIAL 1), tendo V. Exas. transmitido que teria que terminar a minha jornada de trabalho porque não integrava a empresa ESPECIAL 1. Certo é, que continuo até à presente data, a aguardar indicações da vossa parte para me apresentar ao serviço: reforçando que a STRONG CHARON manteve a sua posição de que no dia 01 de Janeiro de 2021, já seria vosso trabalhador. Assim e em virtude de ainda não ter recepcionado nenhuma indicação por parte dessa empresa para me apresentar ao serviço (nem verbal, nem escrita), não obstante as diligências efectuadas enquanto Trabalhador, venho assim solicitar a V. Exas. que me informem por favor, quanto ao local, data, horários e toda as demais informações necessárias com vista a ser-me possível prosseguir as minhas funções profissionais de Vigilante (assegurando todos os meus direitos e deveres como Trabalhador com antiguidade laboral desde 2007). Tendo em conta também que, ainda não me foi pago qualquer vencimento mensal por parte dessa empresa ESPECIAL 1 e, sem prejuízo de continuar a aguardar a indicação para me apresentar ao serviço, lamentavelmente, caso essa empresa continue a não me indicar um local de trabalho e continue sem me pagar o meu vencimento mensal, vejo-me no entanto, para feitos da minha sobrevivência e face ao tempo decorrido, obrigado a vir agora e por agora, solicitar a assinatura /preenchimento do modelo competente para os devidos efeitos (Mod. RP 5044/2018-DGSS) que se junta em anexo, para efectuar o pedido de Subsidio de Desemprego. (…)». 22. Por carta enviada em 23 de Fevereiro de 2021, e recebida pelo Autor, a Autoridade para as Condições do Trabalho remeteu ao mesmo um documento denominado de ‘declaração de situação de desemprego (modelo RP 5044/2018 – DGSS)’. (Quanto à prestação de serviços pela 2.ª Ré Especial 1 na Herdade do ...) 23. Em 29 de Dezembro de 2020, a 2.ª Ré Especial 1 e a sociedade P..., S.A. celebraram um escrito denominado de ‘contrato de prestação de serviço’, mediante o qual declararam que a primeira prestaria à segunda os serviços de segurança e vigilância, na Herdade do ..., sita no Lote ..., com início no dia 1 de Janeiro de 2021 e termo em 31 de Dezembro de 2021, com renovação automática por iguais períodos, e mediante o pagamento de um preço acordado pelas partes. 24. A partir das 20h00m do dia 31 de Dezembro de 2020, a 2.ª Ré Especial 1 passou a prestar os referidos serviços de vigilância nas instalações da Herdade do .... 25. Os serviços prestados pela 2.ª Ré Especial 1 nas instalações da Herdade do ..., a partir da data e hora acima referidas, coincidem com os serviços até então prestados pela 1.ª Ré Strong Charon à referida sociedade e melhor discriminados no ponto 6., tendo a mesma ao seu serviço 4 vigilantes no referido local, igualmente organizados em regime de turnos rotativos e alternados, 24 horas por dia. 26. Nem a 1.ª Ré Strong Charon nem a 2ª Ré Especial 1 aceitaram o Autor e os demais vigilantes identificados em 7. como seus trabalhadores, a partir das 20h00m do dia 31 de Dezembro de 2020. 27. Em 1 de Janeiro de 2021, o Autor tinha a respectiva formação profissional e o cartão profissional de vigilante actualizados e em vigor. 28. A partir das 20h00m do dia 31 de Dezembro de 2020, passaram a exercer funções de vigilantes nas instalações da Herdade do ..., por conta e sob as ordens e direcção da 2.ª Ré Especial 1 os trabalhadores FF, GG, HH e II. 29. Os trabalhadores acima identificados celebraram escritos denominados de ‘contratos de trabalho’ com a 2.ª Ré Especial 1, nos primeiros dias de Janeiro de 2021. 30. A 2.ª Ré Especial 1 não utiliza, nos serviços por si prestados na Herdade do ..., fardas, impressos, bastões de ronda, alvarás ou licenças da 1.ª Ré Strong Charon. 31. Os trabalhadores da 2.ª Ré Especial 1 que exercem funções nas instalações na Herdade do ... utilizam fardas e registos de relatórios fornecidas pela 2.ª Ré, com o modelo e imagem identificativos da mesma. 32. Além dos equipamentos acima referidos, os trabalhadores da 2.ª Ré Especial 1 utilizam igualmente, no âmbito das respectivas funções, o conjunto de chaves das instalações da Herdade do ... acima referenciado, bem como uma secretária, cadeira, lanterna e sistema de registo de rondas/picagens próprios, tendo como local de trabalho a portaria referida em 8. 33. A 2.ª Ré Especial 1 tem métodos de trabalho próprios, códigos de conduta próprios, normas de serviço próprias e procedimentos internos próprios, diversos dos da 1.ª Ré Strong Charon. 34. A 2.ª Ré Especial 1 organizou a afectação dos seus vigilantes, elaborou mapas de horário de trabalho, planeamento de férias e substituição de trabalhadores tendo em vista o início da prestação de serviços de vigilância nas instalações do hotel Herdade do .... 35. A 1.ª Ré Strong Charon não entregou à 2.ª Ré Especial 1 alvarás, licenças ou peças de uniforme para o exercício da actividade, nem quaisquer informações sobre as instalações da Herdade do .... 36. Desde data não concretamente apurada, mas ocorrida no Verão de 2021 e coincidente com a abertura do hotel na Herdade do ..., a 2.ª Ré Especial 1 reduziu para 2 o número de vigilantes a exercer actividade nas referidas instalações. 37. Em 31 de Dezembro de 2020, o Autor auferia € 796,19, a título de retribuição mensal base. 38. Desde o dia 31 de Dezembro de 2020, o Autor não recebeu qualquer quantia a título de retribuição, por parte da 1.ª Ré Strong Charon e/ou da 2.ª Ré Especial 1. 39. O Autor não tem outro meio de subsistência, que não seja o rendimento do seu trabalho. 40. O Autor é portador de uma patologia do foro cardíaco. 41. O Autor sentiu uma tristeza profunda, angústia, ansiedade, perturbações de humor e de sono na sequência e por causa da conduta das Rés acima descrita. De Direito O Recorrente arguiu uma nulidade por omissão de pronúncia relativamente à questão do exercício do direito de oposição por parte do Autor. O Acórdão recorrido negou que a questão pudesse ser objeto do recurso de apelação por em seu entender o Recorrente carecer de legitimidade para colocá-la e afirmou que a mesma estava “estabilizada”. Não se coibiu, todavia, de se pronunciar no sentido de que o direito de oposição não teria sido validamente exercida, o que, em rigor, depois de ter declarado a questão inadmissível parece ser obter dicta. No entanto, a questão será tratada adiante. O Acórdão ora recorrido começa por afirmar que “[a] questão essencial em apreciação no recurso consiste na identificação da figura jurídica de transmissão de empresa ou estabelecimento, para os fins do art. 285.º do Código do Trabalho, na versão ainda em vigor à data dos factos – a que lhe foi conferida pela Lei 14/2018, de 19 de Março, visto não ser aplicável a resultante da Lei 18/2021, de 8 de Abril, pois a adjudicação dos serviços de vigilância à 2.ª Ré foi contratada em Dezembro de 2020, logo, fora do período temporal previsto na norma transitória do art. 3.º desta última Lei (norma esta que dispõe no sentido da nova lei se aplicar “aos concursos públicos ou outros meios de selecção, no sector público e privado, em curso durante o ano de 2021, incluindo aqueles cujo acto de adjudicação se encontre concretizado.”). Considerou igualmente que “[a]s Portarias n.ºs 185/2020 e 186/2020, ambas de 6 de Agosto, procederam à extensão das alterações aos contratos colectivos celebrados entre a AES e o STAD, por um lado, e entre a AES e a FETESE, pelo outro, ambas publicadas no BTE n.º 22/2020. Tais Portarias determinavam a sua não aplicação aos empregadores representados pela AESIRF mas (…) a 2.ª Ré não logrou provar tal filiação, pelo menos à data dos factos em discussão nos autos”. Assim, face à existência de Portarias de Extensão e como a 2.ª Ré não logrou fazer prova de que estava inscrita em outra associação de empregadores que celebrou outra convenção coletiva, o Tribunal decidiu que a Clausula 14.ª da convenção celebrada pela AES e o STAD e a AES e a FETESE, em vigor no ano de 2020, seria aplicável no caso dos autos, sublinhando que tais cláusulas tinham sensivelmente a mesma redação. E afirmou que “[p]odemos dar como adquirido que ambas as Rés se encontravam sujeitas, à data da transmissão, ao cumprimento das convenções colectivas celebradas pela AES com o STAD e com a FETESE, por força das portarias de extensão supra identificadas e do disposto no art. 514.º n.º 1 do Código do Trabalho”. Seguidamente o Tribunal da Relação sublinhou que “independentemente das dúvidas interpretativas que têm sido suscitadas quanto ao conceito legal de transmissão de estabelecimento, nada impede que uma convenção colectiva estabeleça o princípio da manutenção do contrato de trabalho em caso de sucessão de empregadores na execução do contrato de prestação de serviços de segurança privada, por tal se revelar mais favorável aos trabalhadores” e concluiu que “a 2.ª Ré estava obrigada a respeitar aquela cláusula 14.ª das convenções colectivas celebradas pela AES com o STAD e com a FETESE, por força das portarias de extensão, e como tal a aceitar o A. no exercício das funções de vigilante junto do cliente”. Mas afirma igualmente que: “De todo o modo, sempre o mesmo resultado seria obtido face às regras contidas no art. 285.º n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho, na versão da Lei 14/2018, pois efectivamente estamos perante uma transmissão de empresa ou estabelecimento que constitui uma unidade económica, de acordo com o conceito legal. A Secção Social desta Relação de Évora vem decidindo, de forma uniforme, que “I-Verifica-se uma transmissão de unidade económica, para efeitos do art. 285.º do Código do Trabalho, quando uma empresa de prestação de serviços de vigilância e segurança sucede, sem interrupções, a outra empresa de prestação de serviços de vigilância e segurança, por ter ganhado o concurso público e lhe ter sido adjudicado tal serviço, realizando-se a prestação com o mesmo cliente, no mesmo local, com os mesmos trabalhadores, a utilização dos mesmos indispensáveis meios de vigilância e segurança, pertencentes ao cliente, e tendo por objectivo a execução do serviço nas mesmas condições essenciais. II- A utilização de folhas de registo, relatórios e uniformes com modelos e imagens identificativos da empresa de segurança permitam a identificação da empresa responsável pela vigilância e segurança, mas não integram a unidade económica, no seu núcleo essencial identificativo.”1 Os autos demonstram que o A. exercia as funções inerentes à categoria de vigilante, sob as ordens e direcção da 1.ª Ré, nas instalações da cliente. Para o efeito utilizava as instalações da cliente, de quem os quatro vigilantes tinham as chaves, bem como outros equipamentos pertencentes à 1.ª Ré – farda, lanterna, sistema de rondas e pistola de picagem. Em 17.11.2020, a cliente denunciou o contrato pelo qual a 1.ª Ré realizava os serviços de vigilância na Herdade do ..., que depois veio a contratar com a 2.ª Ré, através do contrato celebrado em 29.12.2020. A 2.ª Ré não admitiu qualquer dos trabalhadores que desempenhavam funções no local, recusando receber o aqui A., apesar deste ter a respectiva formação profissional e o cartão de vigilante em vigor. E passou a exercer os mesmos serviços que a 1.ª Ré anteriormente prestava, também com 4 vigilantes que ali colocou. (…)” Após sublinhar que não se exige para que haja transmissão uma relação contratual direta entre as empresas de segurança e precisar que existia aqui uma unidade económica com suficiente autonomia, o Tribunal afirmou que “[m]antendo a 2.ª Ré o mesmo número de vigilantes que a 1.ª Ré havia colocado no local, continuando nas instalações da cliente para exercício da sua actividade, podemos afirmar a transmissão da mesma entidade económica, e como tal a ocorrência da figura jurídica de transmissão de estabelecimento identificada no art. 285.º n.ºs 1 e 5 do Código do Trabalho”. Por fim, o Acórdão refere-se ao exercício do direito de oposição pelo Autor nos seguintes termos: “Finalmente, quanto ao argumento relativo ao exercício do direito de oposição do A. à transmissão da posição do empregador no seu contrato de trabalho, esta questão foi suscitada na petição inicial e deduzido o competente pedido contra a 1.ª Ré, com tal fundamento. A sentença apreciou expressamente este pedido e concluiu pela sua improcedência, pelo que, sendo o A. o interessado na sua procedência, cabia-lhe recorrer desse segmento decisório, na sua qualidade de vencido em tal pretensão – art. 631.º n.º 1 do Código de Processo Civil. Não o tendo feito, esta questão está estabilizada e a 2.ª Ré não detém legitimidade para a invocar em sede de recurso. Ademais, como bem anota a sentença recorrida, a comunicação dirigida pelo A. à 1.ª Ré, em 16.12.2020, não contém qualquer motivação, seja de facto, seja de direito, quanto ao prejuízo que lhe seria causado pela transmissão, pois limita-se a informar que pretende manter-se como funcionário daquela Ré, afirmando «não ter qualquer motivação profissional ou pessoal para sair da empresa que tanto confio e onde presto serviço há tantos anos”. Cumpre apreciar. O objeto do presente recurso consiste em determinar quem – se a 1.ª se a 2.ª Ré – é responsável pelo despedimento ilícito do Autor que se traduziu na recusa em receber a sua prestação de trabalho a partir do dia 1 de janeiro de 2020. O que implica determinar quem era o seu empregador a essa data. As instâncias centraram a sua resposta na cláusula da convenção coletiva que previa a manutenção dos contratos de trabalho na hipótese de sucessão de empregadores na execução de contratos de prestação de serviços de segurança privada. A sentença subsumiu de imediato a questão no instituto da transmissão de unidade económica, podendo nela ler-se que “[o] objeto principal da presente ação passa por determinar se existiu, ou não, a transmissão do contrato de trabalho celebrado entre o Autor e a 1.ª Ré Strong Charon para a 2.ª Ré Especial 1; transmissão essa que assentará, por sua vez, na eventual transmissão do estabelecimento operada entre ambas as Rés”. O Acórdão recorrido, como já referimos, procedeu em duas etapas começando por decidir que a cláusula era aplicável já que a 2.ª Ré não tinha logrado provar que estava filiada a essa data em outra associação de empregadores e existia portaria de extensão. Depois concluiu que, de qualquer modo, se tinha verificado uma transmissão de unidade económica. Como é sabido, a nossa lei permite efetivamente que as convenções coletivas regulem a matéria da transmissão de unidade económica, embora apenas em sentido mais favorável ao trabalhador, como resulta do artigo 3.º n.º 3, alínea m), do Código do Trabalho. Por outro lado, e como a sentença e o Acórdão desenvolvida e certeiramente explicam, o Tribunal de Justiça tem, ao longo de décadas, desenvolvido um método indiciário para determinar se houve uma transmissão de unidade económica estavelmente afeta a uma atividade económica. O peso dos vários indícios varia, designadamente, em função da atividade económica concretamente exercida e do tipo de unidade económica em causa, sendo que em relação a atividades essencialmente baseadas no fator humano e na utilização da mão-de-obra o Tribunal recentemente reiterou a extrema importância do indício da manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos. Além disso já caracterizou atividades de segurança privada como as que estão em jogo nos presentes autos como atividades essencialmente baseadas na utilização da mão de obra. Foi a propósito deste indício que o Tribunal de Justiça se viu já várias vezes confrontado com a questão de saber se a referida manutenção era um indício relevante quando tinha resultado de uma cláusula de uma convenção coletiva, tendo respondido que tal manutenção da maioria ou do essencial do pessoal continuava a ser um indício de transmissão de unidade económica, sendo indiferente que na sua génese estivesse uma convenção coletiva. No seu Acórdão de 24 de janeiro de 2002, processo C-51/00 (Temco Service Industries SA) o Tribunal depois de afirmar que “[p]ara determinar se estão preenchidas as condições de uma transferência de entidade, há que tomar em consideração o conjunto de circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não dos elementos corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, o valor dos bens incorpóreos no momento da transferência, o emprego ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efetivos, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das atividades exercidas antes e depois da transferência e a duração de uma eventual suspensão destas atividades” e de reiterar que “[e]stes elementos não passam, todavia, de aspetos parciais da avaliação de conjunto que se impõe e não poderão, por isso, ser apreciados isoladamente” (n.º 24), concluiu que “[e]mbora a Temco tenha sustentado na audiência que a readmissão de uma parte do pessoal da GMC lhe foi imposta por uma convenção coletiva setorial (CCT de 5 de Maio de 1993), tal circunstância, de qualquer modo, não tem qualquer incidência sobre o facto de a transferência abranger uma entidade económica” (n.º 27), até pela coincidência de escopo entre tal convenção coletiva e a Diretiva (n.º 27: “é necessário sublinhar que o objetivo prosseguido pela CCT de 5 de Maio de 1993 é o mesmo que o prosseguido pela diretiva e que esta convenção coletiva visa expressamente, no que respeita à readmissão de uma parte do pessoal, um caso de readjudicação como a que está em causa no processo principal”). Esta posição foi reiterada em Acórdão do Tribunal de Justiça de 11 de julho de 2018, processo C-60/17 (Ángel Somosa Hermo). Neste processo o Tribunal Superior de Justiça da Galiza colocou ao Tribunal de Justiça, conjuntamente com outra, a seguinte questão: “O artigo 1.o, n.º 1, da Diretiva 2001/23 […] é aplicável quando uma empresa deixa de ser adjudicatária dos serviços prestados a um cliente devido à resolução do contrato de prestação de serviços em que a atividade assenta essencialmente na mão de obra (vigilância das instalações), e a nova adjudicatária [assume] uma parte essencial dos efetivos [afetados] à [prestação] do referido serviço, quando essa sub‑rogação nos contratos de trabalho é imposta pelas disposições da convenção coletiva [das empresas de segurança]?” Em resposta o Tribunal de Justiça afirmou (n.º 38 do Acórdão) que “embora o Governo espanhol sustente nas suas observações escritas que a VINSA foi obrigada a integrar o pessoal da Esabe Vigilancia por força de uma convenção coletiva, essa circunstância não tem, em todo caso, influência no facto de a transferência ser relativa a uma entidade económica”, acrescentando que “[d]e resto, há que sublinhar que o objetivo prosseguido pela Convenção Coletiva das Empresas de Segurança é o mesmo da Diretiva 2001/23 e que esta convenção coletiva visa expressamente, no que respeita à integração de uma parte do pessoal, o caso de uma nova adjudicação como a que está em causa no processo principal (v., neste sentido, Acórdão de 24 de janeiro de 2002, Temco, C‑51/00, EU:C:2002:48, n.o 27)”, tendo decidido que “há que responder à primeira questão que o artigo 1.o, n.o 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que esta diretiva se aplica a uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância de instalações celebrado com uma empresa e, para efeitos dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa que, por força de uma convenção coletiva, integra uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efetivos que a primeira empresa afetava à execução da referida prestação, desde que a operação seja acompanhada da transferência de uma entidade económica entre as duas empresas em causa” (n.º 39 e decisão). Em suma, se da aplicação da convenção coletiva resultar a manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos haverá um importante indício de transmissão. Importa, contudo, ter presente que no direito português não há convenções coletivas com eficácia erga omnes. Com efeito, nem mesmo as convenções que sejam objeto de uma portaria de extensão têm efeito, já que como este Supremo Tribunal de Justiça já teve ocasião de decidir uma convenção coletiva objeto de uma portaria de extensão não se aplica a trabalhadores filiados em outra associação sindical. E tão pouco se deve aplicar a empregadores filiados em outra associação de empregadores não outorgante. As instâncias preocuparam-se e bem com a filiação da 2.ª Ré. Mas não se pode deduzir automaticamente que porque a 2.ª Ré estava abrangida pelo âmbito subjetivo da convenção a cláusula de manutenção do contrato de trabalho operaria no caso concreto quando nada se apurou e nada consta dos factos provados quer quanto à filiação da 1.ª Ré, quer quanto à filiação do Autor. A cláusula estabelece uma obrigação entre empregadores abrangidos pela convenção embora com efeitos tendencialmente favoráveis aos trabalhadores, mas não poderá ser invocada por um empregador que não seja ele próprio abrangido pela convenção apesar da portaria de extensão, o que sucederá se a Strong Charom estivesse à data filiada em outra associação de empregadores não outorgante. E não se aplicará ao Autor se ele estivesse filiado em outro sindicato não outorgante. E diga-se, igualmente, que ainda que a cláusula fosse aplicável ao Autor não resultaria daí, sem mais, que houvesse um indício de transmissão de unidade económica já que nada foi provado quanto á filiação dos outros três trabalhadores que trabalhavam com o Autor no mesmo local de trabalho antes de 1 de janeiro de 2021. Se por hipótese pouco provável, mas que não se pode liminarmente arredar, esses três trabalhadores fossem filiados noutro sindicato a cláusula de manutenção do contrato de trabalho prevista na convenção coletiva objeto da extensão não lhes seria aplicável. Mas diga-se que mesmo que fosse, importaria, ainda, determinar porque é que não continuaram a trabalhar ao serviço da 2.ª Ré. Tudo o que está provado, efetivamente, é que não continuaram a trabalhar ao serviço da 2.ª Ré que passou a prestar o seu serviço ao cliente com outros quatro trabalhadores. Sendo a cláusula aplicável por exemplo aos quatro haveria em princípio manutenção da totalidade do pessoal e a circunstância de a 2.ª Ré não lhes ter dado trabalho não afastaria tal manutenção, tendo existido despedimentos ilícitos. Mas não se pode afastar, por exemplo, que um ou alguns desses trabalhadores tivesse exercido o seu direito de oposição à transmissão. Em suma, não há dados de facto provados que permitam, de todo, concluir nem que o Autor esteja abrangido pela cláusula de manutenção do contrato de trabalho, nem muito menos que tenha havido manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos. E, em rigor, não há praticamente face à matéria dada como provada, indícios de transmissão. E não se deve, em rigor, dizer que “[m]antendo a 2.ª Ré o mesmo número de vigilantes que a 1.ª Ré havia colocado no local, continuando nas instalações da cliente para exercício da sua atividade, podemos afirmar a transmissão da mesma entidade económica”. A mera sucessão de atividade não configura uma transmissão de atividade económica e é claro que a atividade de segurança das instalações terá que ser realizada nas instalações do cliente. Também o facto de o novo prestador recorrer ao mesmo número de trabalhadores que o anterior é praticamente irrelevante – o que interessava saber era se eram os mesmos (ou se o contrato de trabalho se manteve em relação aos anteriores). Neste aspeto, pois, é inteiramente exata a asserção do Parecer do Ministério Público, quando afirma que “[n]o caso sub judice não ficou provado que a recorrente tenha aceitado como trabalhadores os que trabalhavam para a recorrida, bem como não ficou provado que tenham sido transmitidos para a recorrente ativos corpóreos relevantes, ainda que pertencessem ao cliente a quem era prestado o serviço de vigilância e segurança, pelo que não se verificam os pressupostos para se considerar haver uma unidade económica que possa ter sido transferida para a recorrente, conforme previsto no art.º 285.º do CT”. E, como se afirmou no Acórdão deste Supremo Tribunal de Justiça de 13-09-2023, processo n.º 1150/20.2T8EVR.E1.S1, “[s]endo a atividade de segurança privada uma atividade que repousa fundamentalmente sobre a mão de obra, inexiste transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação (por este) de tais serviços a outra empresa, sem que para esta tenha transitado daquela qualquer trabalhador ou quaisquer outros recursos, competências ou instrumentos organizatórios, suscetíveis de consubstanciar uma “unidade económica””. Mas existe, a montante, uma outra questão que se afigura decisiva para determinar quem era o empregador do Autor a 1 de janeiro de 2021 e, por conseguinte, quem deve arcar com as consequências do despedimento, a saber, o exercício pelo Autor do direito de oposição à transmissão. O Tribunal da Relação, no Acórdão recorrido, excluiu a relevância ou a atendibilidade da questão nestes termos: “[Q]uanto ao argumento relativo ao exercício do direito de oposição do A. à transmissão da posição do empregador no seu contrato de trabalho, esta questão foi suscitada na petição inicial e deduzido o competente pedido contra a 1.ª Ré, com tal fundamento. A sentença apreciou expressamente este pedido e concluiu pela sua improcedência, pelo que, sendo o A. o interessado na sua procedência, cabia-lhe recorrer desse segmento decisório, na sua qualidade de vencido em tal pretensão – art. 631.º n.º 1 do Código de Processo Civil. Não o tendo feito, esta questão está estabilizada e a 2.ª Ré não detém legitimidade para a invocar em sede de recurso”. Não sufragamos este entendimento. Antes de mais, sublinhe-se que a questão colocada neste recurso é a de saber quem era o empregador do Autor a 1 de janeiro de 2021, questão que não pode, em rigor, ser respondida sem atender primeiro ao exercício do direito de oposição pelo trabalhador e sem decidir tal exercício foi ou não eficaz. Não se trata de um segmento autónomo que se possa considerar decidido e irrelevante para efeitos do recurso. E, sobretudo, trata-se de uma questão que a 2.ª Ré tinha toda a legitimidade para colocar, como colocou no recurso de apelação, porque lhe interessava diretamente. Assim, a questão não está de todo “estabilizada” e tem que ser respondida. A 1.ª instância considerou que “compulsado o teor da comunicação de oposição dirigida pelo Autor à 1.ª Ré Strong Charon, é possível concluir que a mesma carece de qualquer motivação, seja de facto, seja de direito, limitando-se o Autor a informar a mesma que pretende «manter[-se] como funcionário» da mesma, por «não te[r] qualquer motivação profissional ou pessoal para sair da empresa que tanto confio e onde presto serviço há tantos anos»» (cf. ponto 18. da factualidade provada). Em face do exposto, resulta manifesto ser improcedente a oposição comunicada pelo Autor à 1.ª Ré Strong Charon, nos termos assinalados”. O Tribunal da Relação, ainda que, como atrás dissemos, tenha decidido que a questão estava já definitivamente resolvida, acrescentou, por seu turno, que “[a]demais, como bem anota a sentença recorrida, a comunicação dirigida pelo A. à 1.ª Ré, em 16.12.2020, não contém qualquer motivação, seja de facto, seja de direito, quanto ao prejuízo que lhe seria causado pela transmissão, pois limita-se a informar que pretende manter-se como funcionário daquela Ré, afirmando «não ter qualquer motivação profissional ou pessoal para sair da empresa que tanto confio e onde presto serviço há tantos anos», tendo o Acórdão recorrido aduzido, ainda, que “[t]rata-se de uma mera manifestação de vontade, não fundamentada em prejuízo sério para o trabalhador ou na falta de confiança quanto à política de organização do trabalho do adquirente, pelo que os requisitos do art. 286.º-A n.º 1 do Código do Trabalho não estão preenchidos”. Como resulta dos factos dados como provados, mais precisamente do facto 14, a 1.ª Ré começou por enviar a 11 de dezembro de 2020 uma carta ao Autor em que lhe comunicava, designadamente, que o seu novo empregador seria a COPS, informação que depois corrigiu a 16 de dezembro, informando o Autor que, afinal, o seu novo empregador seria a 2.ª Ré, a Especial 1 (facto 17). Em resposta à primeira missiva, o Autor a 16 de dezembro enviou uma carta à 1.ª Ré, exercendo expressamente o seu direito de oposição (facto 18). Como é sabido, embora parte da doutrina e da jurisprudência nacionais já defendessem que o trabalhador, no exercício da sua autonomia contratual, deveria ter este direito de se opor a que a transmissão da posição contratual de empregador ocorresse contra a sua vontade, o direito de oposição veio a ser expressamente reconhecido no nosso Código do Trabalho, pelo artigo 286.º-A, introduzido pela Lei n.º 14/2018 de 19 de março. Mais precisamente o n.º 1 do referido artigo reza assim: “O trabalhador pode exercer o seu direito de oposição à transmissão da posição do empregador no seu contrato de trabalho em caso de transmissão, cessão ou reversão de empresa ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento que constitua unidade económica, nos termos dos números 1, 2 ou 10 do artigo 285.º, quando aquela possa causar-lhe prejuízo sério, nomeadamente por manifesta falta de solvabilidade ou situação financeira difícil do adquirente ou, ainda, se a política de organização de trabalho deste não lhe merecer confiança”. O atual n.º 3 do artigo 286.º-A (anterior n.º 2) exige que a oposição seja feita por escrito e com a menção, designadamente, do fundamento da oposição. Antes de mais, importa assinalar que o prejuízo sério a que alude a lei não é um prejuízo já ocorrido, tanto mais que o trabalhador está aqui a exercer o seu direito de oposição em momento anterior à transmissão. E isto resulta inequivocamente da letra da lei: “quando aquela possa causar-lhe prejuízo sério”. Trata-se, pois, de uma possibilidade de prejuízo sério. Depois, atente-se a que a lei para que o trabalhador funde este temor de um prejuízo futuro enuncia, mas a título meramente exemplificativo – “nomeadamente” – duas situações: a manifesta falta de solvabilidade ou a situação financeira difícil do adquirente. Trata-se apenas de dois exemplos e não de uma enumeração taxativa. A lei refere-se, depois, a desconfiança do trabalhador face à política de organização do trabalho do adquirente. O Acórdão da Relação do Porto, de 20-09-2021, proc. n.º 2203/20.2T8VFR.P1, citado expressamente pela sentença de 1.ª instância, afirma, a este propósito, o seguinte: “Quanto à falta de confiança na política de organização do trabalho do adquirente, ainda que envolva um juízo de prognose do trabalhador, de conteúdo subjetivo e indeterminado, essa não confiabilidade poderá ser de alguma forma sindicada pela análise dos factos invocados, dos quais possa resultar essa desconfiança à luz de um critério objetivo e razoável, tendo em conta a perspetiva de um trabalhador médio, possuidor dos conhecimentos e na concreta situação do trabalhador em causa”(o sublinhado é nosso) Com efeito, importa ter presente que a lei consagra uma obrigação de informação do empregador aos seus trabalhadores por ocasião da transferência. Assim o transmitente deve informar os trabalhadores abrangidos pela transmissão “sobre a data e motivos da transmissão, suas consequências jurídicas, económicas e sociais, para os trabalhadores e medidas projetadas em relação a estes (…)” (números 1 e 2 do artigo 286.º), ainda que neste caso com adaptações. Não se ignora que a lei tomou como paradigma de transmissão aquela que assenta em um contrato entre o transmitente e o transmissário – como resulta da parte final do n.º 1 do artigo 286.º, que prevê, inclusive, a informação sobre o conteúdo do contrato. Como as instâncias bem destacaram, a transmissão de unidade económica, segundo jurisprudência reiterada do Tribunal de Justiça, não carece de qualquer contrato entre transmitente e transmissário. Em casos como o presente, em que não há qualquer vínculo contratual nem qualquer colaboração entre o eventual transmitente e o eventual transmissário – casos designados por alguma doutrina alemã como transmissão “hostil” – o transmitente não estará, frequentemente, em condições de proporcionar informação relevante sobre, por exemplo, as medidas projetadas em relação aos trabalhadores abrangidos pela transmissão. Limitar-se-á, como sucedeu, a identificar o eventual transmissário e a informar o trabalhador de que o seu contrato continuará com o novo empregador. No caso dos autos a Strong Charon na carta referida no facto 14 afirmou ao Autor que “não resultam quaisquer consequências de maior ou substanciais em termos jurídicos, económicos ou sociais para V. Ex.ª porquanto lhe é garantida a manutenção de todos os seus direitos, designadamente, a manutenção de antiguidade, de retribuição, e da categoria profissional em que se enquadra” (ver também a asserção contida na carta mencionada no facto 19: “Informamos que V. Ex.ª mantém na íntegra, por força da lei, todos os seus direitos, regalias, antiguidade e categoria profissional, pelo que em caso de incumprimento pela empresa ESPECIAL 1, deverá dar imediatamente conhecimento desta situação à Autoridade para as Condições do Trabalho (ACT) e/ou ao seu Sindicato”). Como é sabido, esta “garantia” vale o que vale: se das regras da transmissão de unidade económica resulta a manutenção do contrato de trabalho com o mesmo empregador e a preservação dos direitos do trabalhador, tal não impede que o novo empregador venha a tomar no exercício dos poderes que a lei lhe faculta medidas que podem revelar-se gravemente prejudiciais para o trabalhador – no limite fazer cessar o contrato por extinção do posto de trabalho – ou que venha a não respeitar a lei e os direitos do trabalhador. Em suma, em casos como este o que é proposto ao trabalhador é um “salto no escuro”, sem qualquer outra informação que não seja a da mera identidade do eventual transmissário. À carta referida no facto 14 o trabalhador respondeu exercendo o direito de oposição e apresentou o seguinte fundamento: “não tenho qualquer motivação profissional ou pessoal para sair da empresa que tanto confio e onde presto serviço há tantos anos, querendo-me manter como funcionário da STRONG CHARON”. As instâncias consideraram insuficiente o motivo aduzido. No entanto, a densidade do motivo invocado tem que ter em conta a informação prestada ao trabalhador, o que lhe era conhecido e cognoscível. Tudo o que o trabalhador conhecia no caso dos autos, reitera-se, era a identidade do eventual transmissário. O temor de que a transmissão lhe causaria prejuízo sério fundamentava-se em que o trabalhador confiava no seu empregador, a 1.ª Ré, que conhecia há muitos anos, mas não confiava na 2.ª Ré da qual, aliás, nada sabia nem tinha a obrigação de saber. Ter o grau de exigência das instâncias quanto ao fundamento a apresentar pelo trabalhador, em casos como o presente em que este não recebeu qualquer informação, designadamente sobre as medidas projetadas pelo novo empregador em relação aos trabalhadores abrangidos pela transmissão, significa, na prática, esvaziar o direito de oposição, o qual dificilmente poderá ser exercido, a não ser em casos excecionais (imagine-se que o transmissário já andava na “boca do mundo” por conflitos laborais ou não pagamento de salários) e converter-se-á, assim, em uma ilusão. E é irrealista considerar exigível ao trabalhador que no curto prazo para exercer o seu direito de oposição solicitasse informação a uma empresa que nunca o reconheceu como trabalhador sobre a política de organização do trabalho desta. Como também que se informasse sobre as duas circunstâncias referidas no número 1 do artigo 286.º-A a título meramente exemplificativo, como situações de provável prejuízo sério: deveria indagar junto da empresa que lhe foi indicada como potencial transmissário qual a sua solvabilidade ou situação financeira? O trabalhador disse ao seu empregador, confio em si e, implicitamente, disse também, que não tinha razões para confiar na outra empresa da qual não tinha obrigação de saber fosse o que fosse. Sublinhe-se, de resto, que também a manutenção do contrato de trabalho por força de uma convenção coletiva, embora tendencialmente mais favorável ao trabalhador, pode no caso concreto não o ser, o que implica a necessidade de consentimento do trabalhador para a cedência da posição contratual de empregador. Efetivamente e como decorre do artigo 424.º do Código Civil e tem sido reiteradamente afirmado por este Supremo Tribunal de Justiça – Acórdão de 18-03-2004, proferido no processo 03B3912 e Acórdão de 27-10-2022, processo n.º 10662/20.7T8LSB-A.L2.S1 – a cessão da posição contratual carece do consentimento do contraente cedido. A autonomia negocial coletiva não suprime a autonomia negocial individual, decorrendo da dignidade do trabalhador e da sua autonomia a necessidade deste consentimento, mesmo quando a cessão decorre de convenção coletiva. Tendo o trabalhador exercido valida e eficazmente o seu direito de oposição há que concluir que a transmissão da posição contratual não se efetivou e que o seu empregador era e continuou a ser a Strong Charon – Soluções de Segurança, SA, que foi quem o despediu ilicitamente ao recusar-lhe a prestação de trabalho. A ilicitude do despedimento não está em causa no presente recurso, tanto mais que se tratou de um despedimento desprovido de qualquer procedimento e que decorre dos factos provados a intenção inequívoca da Strong Charon – Soluções de Segurança, SA, de deixar de ser o empregador do Autor. Assim, há que revogar a decisão do Acórdão recorrido que absolveu a 1.ª Ré e condenou a 2.ª, condenando a 1.ª Ré, Strong Charon, a suportar as consequências do despedimento ilícito, tendo em atenção o pedido do Autor e a sua opção pela indemnização substitutiva da reintegração. Como a fixação da indemnização de antiguidade terá que ter em conta designadamente o grau de culpa do genuíno empregador, esta e outras operações deverão ser levadas a cabo pelas instâncias, pelo que o processo deverá baixar às instâncias para o efeito. Decisão: Concedida a revista. Decide-se que a posição de empregador no contrato de trabalho do Autor não foi transferida para a 2.ª Ré, sendo o empregador a Strong Charon – Soluções de Segurança, SA. Decide-se que o Autor foi objeto de um despedimento ilícito, da responsabilidade do seu empregador, condenando-se este, ou seja, a 1.ª Ré, Strong Charon – Soluções de Segurança, SA, a suportar as consequências legais do despedimento ilícito de que o Autor foi vítima. Determina-se a baixa do processo para o cálculo de tais consequências, mormente da indemnização substitutiva da reintegração, compensação por danos não patrimoniais e salários de tramitação. Absolve-se a 2.ª Ré, Especial 1 - Segurança Privada S.A, de todos os pedidos. Custas do julgamento na 1.ª instância pelo Autor e Pela 1.ª Ré, Strong Charon – Soluções de Segurança, em função do respetivo decaimento. Custas dos recursos pela 1.ª Ré, Strong Charon. Lisboa, 6 de março de 2024 Júlio Gomes (Relator) Ramalho Pinto Domingos José de Morais
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1. O Acórdão citado é o Acórdão do Tribunal da Relação de 11.02.2021 (Proc. 100/20.0T8SNS.E1); referem-se, igualmente, outros Acórdãos, todos da mesma Relação: os Acórdãos de 28.01.2021 (Proc. 959/18.1T8BJA.E1), de 10.03.2022 (Proc. 1746/20.2T8PTM.E1), de 24.03.2022 (Proc. 620/20.7T8STR.E1) e de 30.06.2022 (Proc. 2082/20.0T8FAR.E1).↩︎ |