Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
| ||
Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | DUARTE SOARES | ||
![]() | ![]() | ||
Nº do Documento: | SJ200301160041692 | ||
Data do Acordão: | 01/16/2003 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 9923/01 | ||
Data: | 05/28/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
![]() | ![]() | ||
Meio Processual: | AGRAVO. | ||
![]() | ![]() | ||
Sumário : | |||
![]() | ![]() | ||
Decisão Texto Integral: | Acordam em Conferência no Supremo Tribunal de Justiça Empresa de Transportes "A", Lda instaurou acção ordinária contra "B", Ltd. pedindo que se declare a inexistência da qualidade desta como sua sócia. Houve contestação e réplica e, após a audiência de discussão e julgamento com gravação da prova produzida, e das apresentações das alegações de direito e antes da prolacção da sentença, requereu a R, com o fundamento de que a procuração junta com a petição inicial fora subscrita, em 8/10/96 pelos sócios da Autora C e D os quais haviam sido suspensos da gerência da A por decisão proferida em 1ª instância em 26/07/96, depois confirmada na Relação e no Supremo, nos termos do art.40º do CPC que fosse fixado à A para suprir a falta sob pena de ficar sem efeito o que tiver sido praticado pelo seu mandatário. Após resposta da A defendendo que não existia apontada irregularidade, foi indeferida a pretensão da R. Recorreu esta tendo o agravo sido admitido com subida diferida e efeito meramente devolutivo. Entretanto foi proferida sentença final julgando a acção procedente declarando-se ineficaz, em relação à A, o negócio de cessão de quotas referido nos autos e decidindo-se que a R não é sócia da A. Da sentença apelou a R e a Relação de Lisboa, conhecendo do agravo que então subiu, concedeu-lhe provimento revogando o despacho recorrido e ordenou a notificação da agravada - Autora - para juntar nova procuração outorgada por todos os sócios nos termos do art. 21º e 40º do CPC e 253º e 260º do C. Soc. Comerciais sob pena de, não o fazendo, ficar sem efeito tudo quanto foi praticado. Quanto à apelação, julgou prejudicado o seu conhecimento face à decisão quanto ao agravo. Agrava agora a A para o Supremo Tribunal e, alegando, conclui assim: 1 - Dispõe o contrato social da A que esta se obriga com a assinatura de dois gerentes. 2 - Face à decisão no processo cautelar invocada nos autos que suspendeu os gerentes nomeados, a gerência ficou a pertencer a todos os sócios. 3 - Assim sendo, perante o disposto na citada cláusula contratual, a sociedade A vincula-se com a assinatura de quaisquer dos sócios, como resulta do disposto no art. 261º do CSC: 4 - A parte dispositiva do acórdão recorrido viola não só a primeira parte do referido nº 1 do art. 261º, como também a cláusula contratual citada, como ainda a segunda parte do mesmo preceito legal segundo a qual se consideram válidas as deliberações que reúnam os votos da maioria e a sociedade vinculada pelos negócios jurídicos concluídos pela maioria dos gerentes ou por ela ratificados. 5 - Nos termos do art. 252º do CSM, as sociedades por quotas, como é o caso da A, "é administrada e representada por um ou mais gerentes... e devem ser pessoas singulares com capacidade jurídica plena" sendo que "os gerentes não podem fazer-se representar no exercício do seu cargo" (art. 252º nº 5 do CSC). 6 - A agravada "B" é uma pessoa colectiva donde não pode exercer, nem por si nem por representante, o cargo de gerência numa sociedade por quotas, tendo o legislador expressamente afastado o regime das sociedades anónimas previsto no art. 390º nº 4 ao impor de forma imperativa que os gerentes das sociedades por quotas sejam pessoas singulares. 7 - O carácter imperativo de tal imposição estabelecida na 2ª parte do nº 1 do art. 252º do CSC resulta também da norma do art. 535º do CSC segundo a qual, nas sociedades constituídas anteriormente à entrada em vigor do CSC nas quais as funções de gerência fossem exercidas por pessoas colectivas, estas deviam cessar tais funções pelo menos no fim do ano civil seguinte àquele em que o novo Código entrasse em vigor, ou seja, até 31/12/87. 8 - Seria aliás um contracenso, como se refere na decisão da 1ª instância, impor-se, para a outorga da procuração, a intervenção da sociedade agravada - "B" - para se instaurar ou ratificar uma acção contra ela própria, sob pena de esta ficar investida na dupla qualidade de R e de representante da A. 9 - A entender-se pela necessidade de ratificação ou junção de nova procuração com ratificação do processado, nunca poderá entender-se subordinada à exigência da intervenção ou assinatura da agravada mas sim, e então, e somente pela intervenção da maioria dos sócios singulares com poderes de gerentes, ou seja, os sócios C, D e E. 10 - Foram violados os arts. 261º nº 1, 260º nº, 252º nº 5 e 535º do CSC devendo considerar-se regular a procuração junta aos autos ou, quando menos, que seja determinada a emissão de nova procuração e ratificação do processado a subscrever pela maioria dos sócio com poderes de gerência ou, quando menos, pelos sócios singulares. Respondeu a recorrida pugnando pela confirmação do julgado. Foram colhidos os vistos. Cumpre decidir. É uma acção instaurada pela sociedade por quotas Empresa de Transporte "A", Lda contra a R "B", Ltd. que se arroga a qualidade de sua sócia. Como decorre da matéria de facto provada, para cujo elenco tal como se descreve na sentença (fls. 1064) nos remetemos, a A ora recorrente é uma sociedade por quotas com o capital social de 50.005.000$00 distribuído por 5 quotas sendo três no valor nominal de 15.865.750$00 de que são titulares C; D e E em contitularidade das duas na proporção de 1/4 em plena propriedade para cada uma e metade em nua propriedade, com o usufruto dessa metade para F; e G que depois a cedeu à ora R "B"; uma de 383.750$00; uma no valor de 1.984.000$00 e outra no de 40.000$00 amortizada. O objecto deste recurso está confinado à decisão da Relação que conheceu do agravo do despacho que ordenou a notificação da A para regularizar o mandato judicial juntando procuração a favor de quem a pudesse representar e, seguidamente, para ratificar todo o processado. A procuração junta pela A foi passada a favor de C e D seus sócios, que, por decisão transitada proferida em procedimento cautelar haviam sido suspensos da gerência. É óbvio que ao fazer-se representar pelos dois gerentes cujas funções haviam sido suspensas por decisão de 26/07/96 proferida, em processo cautelar e na qual se determinou que a gerência da sociedade A passaria a pertencer a todos os sócios incluindo a ora requerente - a aqui R "B" - com todos os direitos e obrigações que derivem desta qualidade de sócio de 1/3 do capital social, a A não está regularmente representada neste processo. Não podiam, pois, as instâncias providenciar pela regularidade da sua representação que, no caso, só o poderia ser através de mandato passado por quem, de acordo com o pacto social e as normas aplicáveis pudesse validamente representá-la. E, desde logo, teriam, em geral, de ser afastados aqueles dois gerentes por estarem judicialmente impedidos de o fazer e, naturalmente, a ora R "B" por não ter a natural capacidade para o efeito - art. 535º do CSC - e, sobretudo, porque seria absurda a sua intervenção enquanto representante da A numa acção instaurada por esta contra si própria. Daí que, mal se perceba que um litígio que tem por objecto a determinação da qualidade de sócio de uma determinada sociedade, não tenha sido instaurada a respectiva acção, em nome individual, pelos próprios sócios que põem em causa essa qualidade, e dirigida contra a própria sociedade e a entidade que se arroga a qualidade de sócio. Só assim se evitariam as dificuldades - no plano dos pressupostos processuais - com que aqui nos deparamos, e que são potenciadas pela circunstância de o s gerentes que em nome da sociedade instauraram a acção serem exactamente aqueles cujas funções de gerência foram suspensas em procedimento cautelar instaurado, precisamente, pela aqui R. Porém, uma vez que a suspensão dos gerentes coloca a sociedade A, provisoriamente, numa situação de gerência plural alargada por força do da norma do nº 1 do art. 253º do CSC (se faltarem definitivamente todos os gerentes, todos os sócios assumem, por força de lei os poderes de gerência até que sejam designados os gerentes) e nada impedindo que seja própria sociedade a impugnar judicialmente a qualidade de quem se arroga ser seu sócio, haverá que encontrar a fórmula de assegurar uma representação eficaz da sociedade A que só o poderá ser nos termos do art. 261º do CSC que regula o modo de funcionamento da gerência plural. Isto é, no caso em apreço, e antevendo-se que não haverá unanimidade dos sócios para o efeito, a outorga da procuração, excluídos nos termos acima expostos os sócios suspensos da gerência e a ora R, terá de ser feita pelos restantes mas desde que, para a respectiva deliberação, reúnam os votos da maioria. De todo o modo, é essa uma questão que só poderá ser avaliada depois de cumprida a notificação para apresentação de nova procuração a favor do mandatário judicial que as instâncias não poderiam deixar de ordenar. Daqui decorre a improcedência, no essencial, das conclusões do agravo. Nestes termos, negam-lhe provimento com custas pela agravante. Lisboa, 16 de Janeiro de 2003 Duarte Soares Abel Freire Ferreira Girão |