Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ00036680 | ||
Relator: | CARDONA FERREIRA | ||
Descritores: | CONTRATO-PROMESSA DE COMPRA E VENDA FALTA DE ASSINATURA NULIDADE DO CONTRATO CONHECIMENTO OFICIOSO | ||
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Nº do Documento: | SJ199803170001671 | ||
Data do Acordão: | 03/17/1998 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 1343/97 | ||
Data: | 09/25/1997 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADA A REVISTA. | ||
Área Temática: | DIR CIV - TEORIA GERAL / DIR OBG. DIR REGIS NOT. | ||
Legislação Nacional: | CCIV66 ARTIGO 219 ARTIGO 286 ARTIGO 410 N2. DL 379/86 DE 1986/11/11. CNOT67 ARTIGO 166. | ||
Jurisprudência Nacional: | ASSENTO STJ DE 1995/03/28 IN BMJ N445 PAG67. | ||
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Sumário : | I - É formalidade "ad substantiam" de um contrato-promessa de compra e venda a(s) assinatura(s) do(s) promitente(s) - artigo 410 n. 2 do C.Civil de 1966. II - A falta de qualquer assinatura relevante é questão substantiva de conhecimento oficioso que implica nulidade do contrato-promessa. III - A assinatura a rogo tem os mesmos efeitos da assinatura do promitente se feita conforme prevê o artigo 166 do CNOT67 (hoje, artigo 154 do CNOT95). | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam no Supremo Tribunal da Justiça: I. Pela comarca do Montijo, A propôs esta acção, dita de consignação em depósito, contra B e C. Basicamente, a autora invocou um "hipotético" contrato-promessa, por força do qual recebera um sinal de 500000 escudos; e, tendo resolvido esse contrato, pretendia entregar o dobro do sinal. Pediu, por isso, que lhe fosse admitido o depósito de 1000000 escudos (fls. 2 e segs.). Os réus contestaram e pediram a execução específica daquele contrato-promessa, que seria de compra e venda de uma fracção predial (fls. 25/26). A autora respondeu (fls. 31 e segs.). O processo foi mandado remeter para o Tribunal de Círculo do Barreiro (fls. 49/50). O pedido da execução específica foi admitido como reconvenção (fls. 59). O réu foi absolvido da instância (fls. 60). E, nesse saneador sentença, quer a acção, quer a reconvenção foram julgadas improcedentes, mais se decidindo que, por nulidade do contrato-promessa, o autor restituisse, à ré, 500000 escudos (fls. 60/65). Os réus apelaram (fls. 67). Por Acórdão de fls. 100 e segs., a Relação de Lisboa confirmou o sentenciado. A ré recorreu, de revista, para este Supremo (fls. 105). E, alegando, concluiu (fls. 109 e segs.): a) O contrato-promessa em causa é válido e eficaz; b) A autora ratificou a gestão de sua filha ao chamar a si a autoria na acção, invocando aquele contrato-promessa e reconhecendo-lhe efeitos; c) O contrato-promessa não é nulo, pois a omissão dos requisitos previstos no nº 3 do art.º 410º (C. Civil) apenas é invocável pelo transmitente se foi o transmissário que, culposamente, o provocou, o que não foi, sequer, alegado; d) O Tribunal não pode conhecer, oficiosamente, da nulidade prevista no nº 3 do art.º 410º do C. Civil; e) O douto despacho-sentença e o Acórdão que o confirmou violaram os arts.º 268º e 469º do C. Civil, ao não reconhecer a ratificação ou aprovação operadas pela autora; f) Violaram os arts.º 410º nº3 e 286º do C. Civil, ao aplicar o regime deste último a uma nulidade atípica prevista naquele, bem como os arts.º 219º e 220º do mesmo Código, ao atropelar o princípio da consensualidade; g) "Violou", ainda, o Assento do STJ 3/95, de 01.02.95, ao declarar "ex officio" a referida nulidade; h) "Caiu", ainda, na previsão do art.º 668º nº 1 d) do CPC, ao conhecer de questões de que não podia tomar conhecimento, pelo que "a sentença" é nula por essa via. Finalizando, a recorrente pede revogação do Acórdão recorrido e do despacho-sentença, para o processo prosseguir "os seus termos". A recorrida contra-alegou, defendendo a manutenção do Acórdão recorrido (fls. 115 e segs.). Foram colhidos os vistos legais (fls. 124v./125). II. O Acórdão recorrido assentou no seguinte circunstancialismo (fls. 101): 1) A autora é dona da fracção autónoma A. correspondente ao r/c esquerdo do prédio urbano sito em R. D. Jorge Mestre de Santiago, 5, Montijo, descrito na Conservatória do Registo Predial do Montijo sob o nº 9845, a fls. 155 v. do livro B-26 e inscrito na respectiva matriz predial, sob o art.º 4352; 2) A propriedade dessa fracção veio à titularidade da autora por legado testamentário do seu irmão, D, falecido em 03.12.92; 3) A instância de B, a autora acedeu a prometer vender a fracção referida pelo preço de 2500000 escudos, e que o mesmo dizia que era para sua filha E; 4) Em 02.07.93, o dito B redigiu o documento de fls. 37; 5) Tal documento é do seguinte teor: "Montijo, 2 de Julho de 1993. Declaração de venda e compra de propriedades. Eu abaixo assinado, declaro ter vendido um r/chão Esq. Nº 5 situado na Rua D. Jorge Mestre de Santiago, no Montijo, à E estado solteira contribuinte Nº ... no montante de 2500000 escudos digo dois milhões e quinhentos mil escudos, tendo recebido em princípio de pagamentos um cheque nº 40036072 Nova Rede o montante de 500000 escudos o resto do pagamento no acto da Escritura que oportunamente se concretiza. Vendedora A cont. 151147990". 6) No verso desse documento encontra-se ainda escrito: "Em nome da minha Mãe, A (por não saber assinar) declaro ter recebido o cheque referido em 05 de Julho de 1993 F". 7) O cheque, no valor de 500000 escudos, foi depositado pela autora, a seu favor; 8) Em 09.11.93, a autora enviou, a B, a carta com aviso de recepção na qual a autora mantém o seu propósito de anular o contrato celebrado, devolver o "sinal" em dobro, reaver o documento que o B apelida de contrato-promessa e obter esclarecimento sobre a ocupação da fracção por um alcoólico e família. III. A primeira questão a clarificar consiste em evidenciar a improcedência do pedido da autora tendo transitado a respectiva decisão. Agora, só está em causa recurso da ré e, portanto, aquele que foi admitido, também transitadamente, como pedido reconvencional. Este pedido, aliás feito de forma estranha - mas, como se disse, admitido - consiste na execução específica do discutido contrato-promessa. Claro que já diria La Palice que, para haver execução específica de contrato-promessa, terá de haver contrato-promessa. E é manifesto que, quando se fala em haver contrato-promessa, fala-se em havê-lo válido e eficaz. Aqui, o problema essencial não está no nº3 mas, sim , no nº2 do art.º 410º do C. Civil (DL 379/86, de 11.11): 1 ... 2 ... a promessa respeitante à celebração do contrato para a qual a lei exija documento, quer autêntico, quer particular, só vale se constar de documento assinado pela parte que se vincula ou por ambas, consoante o contrato-promessa seja unilateral ou bilateral. 3 .... A recorrente "cruza" o nº 2 com o nº 3 daquele art.º 410º." O problema não é reconhecimento de assinaturas, ou de licenças urbanísticas, ou de culpabilidade a esse respeito. É um problema, basicamente, de existência de assinaturas e, portanto, de uma condição de validade do documento prevista por aquele art.º 410º nº 2 como formalidade "ad substantiam". Aliás, nunca se poderia tratar de um contrato bilateral, posto que o respectivo texto só revela o que poderia ser uma promessa de venda e só tem uma assinatura de quem seria o promitente-alienante. Quando muito, tratar-se-ia de uma promessa unilateral. IV. Mas quando a lei fala de assinatura, é seguro, quer pela letra, quer pela lógica do preceito, que respeita à assinatura do ou dos promitentes. E o documento em causa, além de todas as suas demais imperfeições, não está assinado por qualquer pretenso promitente. É certo que, infelizmente, em Portugal ainda há que admitir a hipótese de um promitente não saber assinar. E é aqui que continuam a ser admissíveis as assinaturas a rogo. Simplesmente, para que exista, relevantemente, uma assinatura a rogo, ela, para o ser, tem de revestir-se de circunstâncias cautelares impostas pela lei. Caso contrário, qualquer pessoa poderia, inaceitavelmente, vincular outrém. Ao tempo do papel em causa, 05.07.1993, vigorava o C. Not. de 1967, aliás várias vezes alterado. Então a assinatura a rogo vinculante, pressupunha, especialmente, que o rogo fosse dado ou confirmado perante Notário e depois de lido o documento ao rogante, como é natural, presencialmente (hoje, art.º 154º do C. Not. de 1995, o que revela uma continuidade normativa evidenciadora da sua importância. Não estamos, ainda, portanto, no campo directo do reconhecimento de assinaturas (nº 3 do art.º 410º do C. Civil) mas, sim, de autenticidade e validade do rogo; donde o assunto nada ter a ver com o Assento do STJ, uniformizador de Jurisprudência, de 01.02.1995. Sem aquelas formalidades, o rogo é nulo e, sendo-o, o documento não tem qualquer assinatura válida, donde resulta que o pretenso contrato-promessa é nulo. Nulidade, esta, que é de conhecimento oficioso (art.º 286º e 219º, última parte, do C. Civil; sobre o tema do conhecimento oficioso, Assento do STJ, uniformizador de Jurisprudência, de 28.03.1995, in D. R., 1ª série, de 17.05 1995 e BMJ 445, 67). Esta questão nada tem a ver com a gestão de negócios, desde logo porque a instância não foi colocada nessa perspectiva e é certo que as partes não podem deixar de assumir o princípio da auto- -reponsabilidade das partes. Ademais, não vem reflectido, no circunstancialismo provado, qualquer contexto de gestão de negócios e, ainda, o assunto nada tem a ver com pretenso relacionamento gestor- -gestido. Face à nulidade substantiva decorrente do nº 2 do art.º 410º do C. Civil, seguramente o Acórdão recorrido não cometeu a nulidade processual que o recorrente lhe atribui. E mais não se justifica acrescentar. V. Resumindo, para concluir: É formalidade "ad substantiam" de um contrato-promessa de compra e venda a(s) assinatura(s) do(s) promitente(s) - art.º 410º nº 2 do C. Civil. 2. A falta de qualquer assinatura relevante é questão substantiva de conhecimento oficioso que implica nulidade do contrato-promessa. 3. A assinatura a rogo teria os mesmos efeitos da assinatura do promitente se fosse feita conforme previa o art.º 166º C. Not. de 1967 (hoje, art.º 154 do C. Not. de 1995), o que não é caso vertente. VI. Donde, concluindo: Acorda-se em negar a revista. Custas pelo recorrente. Lisboa, 17 de Maio de 1998. Cardona Ferreira, Aragão Seia, Lopes Pinto. |