Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça
Processo:
03S1697
Nº Convencional: JSTJ000
Relator: DINIS ROLDÃO
Descritores: CONTRATO COLECTIVO DE TRABALHO
CONTRATAÇÃO COLECTIVA
CONTRATO DE TRABALHO
TRANSPORTE RODOVIÁRIO
REGIME APLICÁVEL
REGIME DE TRABALHO
Nº do Documento: SJ200310010016974
Data do Acordão: 10/01/2003
Votação: UNANIMIDADE
Tribunal Recurso: T REL COIMBRA
Processo no Tribunal Recurso: 3250/02
Data: 01/16/2003
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REVISTA.
Sumário : O Contrato Colectivo de Trabalho previsto para a actividade de transporte público de mercadorias não é aplicável, por força de PE, a uma empresa cuja actividade seja a cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e de exteriores, apesar de nesse comércio se incluir o transporte das mesmas e objectos correlacionados.
Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça:

1. "A" intentou no Tribunal do Trabalho de Leiria acção declarativa, com processo comum, contra "Viveiros B, S.A.", e "C, Lda.", na qual pediu que as Rés sejam condenadas solidariamente a pagar-lhe as quantias de 3.611.305$00 de retribuição específica, 340.300$00 de prémio TIR, 625.900$00 de diferenças salariais, 56.980$00 de diuturnidades e juros, à taxa legal, sobre todas essas quantias, contados desde a citação até integral pagamento.
Para tanto, alegou o Autor, em resumo, que a 1ª Ré se dedica à actividade de transportes e comércio de flores e a 2ª Ré à de transportes internacionais de mercadorias, ambas empresas do mesmo grupo e com o mesmo sócio gerente e mesma sede.
Trabalhou subordinadamente, como motorista de pesados no serviço internacional, para a 1ª Ré, desde 1/3/94 até 30/9/98, data em que passou a constar do mapa de pessoal da 2ª Ré, mas garantindo a 1ª Ré a manutenção do vínculo contratual e todos os créditos sobre a mesma.
Às relações laborais entre o Autor e as Rés aplicam-se os CCTVs para as Empresas de Transportes Rodoviários de Mercadorias, com P.E.s, que especificou, bem como a PRT para os trabalhadores rodoviários no BTE 42/75.
O Autor rescindiu o contrato de trabalho que o ligava à 2ª Ré, com efeitos desde 30/7/2001, mediante o legal aviso prévio, ficando ambas as Rés a dever-lhe parte da retribuição específica a que se refere a cláusula 74º nº. 7 do CCTV (no BTE 16/82 com PE no BTE 33/82).
A 1ª Ré não lhe pagou parte da ajuda de custo (designada prémio TIR), conforme nota final do Anexo II do CCTV (no período de Janeiro de 1994 até Setembro de 1998 e em 1999 e 2000), nem lhe actualizou os salários desde Janeiro de 1994 a Setembro de 1998.
Também não lhe pagou as diuturnidades devidas de Março de 1997 a Setembro de 1998.

2. Realizada, sem êxito conciliatório, a audiência de partes, ambas as Rés foram notificadas para contestar a acção, o que fizeram.
A Ré "Viveiros B, S.A.", alegou, em síntese, que nunca exerceu a actividade de transportes, pois estatutariamente tem como objecto social a actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais.
O Autor deixou de trabalhar para si em 31 de Janeiro de 1999 e não em 30 de Setembro de 1998.
Conduzia as suas viaturas pesadas de mercadorias e o transporte nunca foi feito em regime de aluguer.
Ela, Ré, não tinha alvará para o exercício da actividade de transporte, até porque o seu objecto social o não permitia.
À relação laboral foi aplicado o CCT entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outros (no BTE 38/86 com alterações subsequentes), CCT que integra a categoria de motorista no nível de qualificação das profissões de apoio - Anexo III, grau III, pelo que o Autor não tem o direito às invocadas ajudas de custo, às retribuições específicas ou aos montantes de remuneração de base indicados na petição.
Todo o trabalho extraordinário que o Autor prestou foi-lhe pago.
Só em 2000 aparecem colectivamente convencionadas as diuturnidades, mas então já o Autor não era seu trabalhador.

3. Por sua vez, a Ré "C, Lda.", alegou, em resumo, que o Autor foi admitido ao seu serviço em 1 de Fevereiro de 1999, tendo-lhe reconhecido a antiguidade enquanto ao serviço da 1ª Ré.
Não assumiu a responsabilidade por créditos laborais do Autor sobre a co-Ré, que não fossem férias e subsídio de férias vencidas em 1 de Janeiro de 1999 e o proporcional do subsídio de Natal.
Aceita serem-lhe aplicáveis os CCT invocados pelo Autor, desde 1 de Fevereiro de 1999.
Porém, não aceita os valores indicados pelo Autor quanto à retribuição específica, pois esta resulta de 2 horas de trabalho extraordinário, ou seja, 55.235$00, em 30 dias, a partir do salário-base de 98.200$00.
A título de retribuição específica a Ré deve ao Autor, no que respeita aos subsídios de férias e Natal de 2000, o total de 110.470$00.
A ajuda de custo, designada prémio TIR, não pode ser considerada retribuição para o efeito do seu pagamento nas férias e subsídios de férias e Natal.

4. Dispensada que foi a realização de audiência preliminar e não tendo sido elaborada base instrutória, veio a ter lugar a audiência de discussão e julgamento, efectuada em duas sessões, na última das quais ficaram consignados em acta os factos tidos por provados.
Foi depois proferida sentença, cujo final decisório tem este teor:
"Pelos fundamentos expostos, o tribunal julga a acção parcialmente procedente e, por via de consequência, condena:
I) A ré "Viveiros B, S.A." a pagar ao autor A:
a) As diferenças de retribuição-base no total de 625.900$00, ou seja, € 3.121,98 (três mil cento vinte um euros e noventa oito cêntimos);
b) A quantia de 56.980$00, ou seja, € 284,22 (duzentos oitenta quatro euros e vinte dois cêntimos) de diuturnidades;
c) A quantia de 3.210.470$00, ou seja, € 16.013,76 (dezasseis mil treze euros e setenta seis cêntimos) de retribuição específica - "cláusula 74 nº. 7".
d) O montante total de 160.950$00, ou seja, € 802,82 (oitocentos dois euros e oitenta dois cêntimos) de ajudas de custo - "prémios TIR";
e) Os juros de mora à taxa legal, incidentes sobre todas essas quantias, contados desde a citação de 16/11/2001 até integral pagamento;
II) A ré "C, Lda." a pagar ao mesmo autor 339.840$00, ou seja, € 1.695,11 (mil seiscentos noventa cinco euros e onze cêntimos) de retribuição especifica - "cláusula 74 nº. 7", acrescendo a tal quantia os juros de mora à taxa legal contados desde a citação de 16/11/2001 até integral pagamento.
E o tribunal julga a acção parcialmente improcedente, absolvendo as rés da parte restante do pedido.
Valor tributário da causa: € 23.116,71 mais juros de mora à taxa legal sobre essa quantia desde 16/11/2001 até à elaboração da conta, conforme cálculo a efectuar pela secretaria.
Custas na proporção de 87% pela 1ª ré, 8% pela 2ª ré e 5% pelo A.
Notifique, registe e cumpra o disposto no artº. 76º do C.P.T. "
Inconformada com o decidido, somente a Ré "Viveiros B, S.A.", interpôs recurso para a Relação de Coimbra, a qual, por acórdão de 16 de Janeiro de 2003, julgou improcedente a apelação e confirmou a sentença da 1ª instância.

5. Discordante do acórdão da Relação, recorre agora a mesma Ré de revista para este Supremo Tribunal de Justiça, tendo apresentado atempadamente as suas alegações, que terminam com as seguintes conclusões:
1- O CCT entre a ANTRAM/FESTRU é aplicável às empresas de indústria de transportes públicos rodoviários de mercadorias (Cláusula 1ª).
2- A recorrente é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, incluindo-se nesse comércio o transporte das mesmas e objectos correlacionados.
3- A actividade constante do registo comercial é a cultura e comércio de plantas.
4- Da matéria de facto considerada como provada nunca resultou que a recorrente exercesse outra actividade que não esta. E muito menos que transportasse por conta de outrem, mercadorias, em regime de aluguer.
5- A recorrente transportava, sim, as mercadorias decorrentes exclusivamente da sua actividade agrícola e comercial.
6- Provado que a R. tem por actividade o comércio de plantas, transporte de produtos conexos com a sua actividade, não se pode concluir que procedesse a transportes públicos ocasionais de mercadorias.
7- Sendo objecto social da R. a compra e venda de plantas e transporte dos mesmos e objectos correlacionados, só por este facto demonstrado ficou que procedia a transporte particular de mercadorias.
8- De qualquer forma não impende sobre a R. o ónus de provar que se tratava de transportes de mercadorias particulares em vez de mercadorias de terceiros pela forma remunerada, já que é sobre o A. que impende o ónus de prova dos factos constitutivos de direito a que se arroga, dado que invoca a aplicação de um CCT que não é conexo com a actividade comercial da R..
9- Demonstrado que foi que a recorrente não exercia, nem nunca exerceu, a indústria de transportes rodoviários de mercadorias, em regime de aluguer remunerado, nunca tendo nisso consistido o seu objecto mercantil, quer a título principal, quer subsidiário, não lhe é corolariamente aplicável o CCTV entre a ANTRAM e a FESTRU.
10- Só pelo facto da R. proceder ao transporte de mercadorias no estrangeiro, não é aplicável o CCTV entre ANTRAM/FESTRU já que tal contrato colectivo de trabalho só é aplicável ao exercício da actividade de transporte de mercadorias sob a forma remunerada - contrato de transporte - quer no país, quer no estrangeiro, e não ao transporte particular de mercadorias, mesmo que no estrangeiro.
11- O que o CCTV entre ANTRAM/FESTRU prevê em relação à actividade do motorista no estrangeiro é retribuição especial por força desse regime de deslocação para as empresas que se dedicam à actividade de transportes públicos de mercadorias.
12- Não tendo sido alegada factualidade integradora do conceito "método do encosto que consiste no empréstimo feito por empresas detentoras de alvará para transportes a empresas que o não possuam" nunca poderá ser considerado que a R. usasse de tal prática e daí concluir-se que exercia a actividade de transportes públicos ocasionais de mercadorias.
13- Às relações de trabalho entre A. e R. é aplicável o CCT entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outros e a Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas do Sul, e outros.
14- Tendo a R. no âmbito da sua actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, necessidade de transportar as mercadorias que adquire no estrangeiro, contratou motoristas que conduzem as suas viaturas de acordo com o CCT dos Agricultores do Ribatejo.
15- Pelo facto de o motorista de uma empresa que exerça uma actividade no âmbito do CCTV dos Agricultores do Ribatejo se deslocar ao estrangeiro, nem por isso deixa de exercer uma actividade de apoio e como tal deva ser remunerado por CCTV diferente daquele que se aplica à actividade da R..
16- Constituindo a actividade de motorista nos termos do CCT dos Agricultores de Ribatejo uma actividade de apoio, enquadra-se tal na actividade comercial exercida pela R..
17- Sendo este CCT aplicável no presente caso, forçoso é concluir que, a Recorrente nada deve ao A. já que não tem este direito a quaisquer diferenças salariais como as que reclamou nos presentes autos, e porque a recorrente sempre lhe processou e pagou os montantes que, por força das respectivas tabelas salariais, lhe eram devidos.
18- Pelo que fez a sentença recorrida uma errada interpretação dos factos provados e uma incorrecta aplicação das normas jurídicas concernentes ao caso.
19- Por todo o exposto, violou ainda a sentença recorrida o disposto no artº. 342º do C. C. nos nºs. 2 e 3 do artº. 659º do C.P.C.; os artigos 5º e 27º do DL nº. 519-C1/79 de 29.12 e procedeu a errada interpretação do disposto nos artigos 15º e 16º da LCT.
A recorrente solicita, em fecho das suas alegações, que seja dado provimento ao recurso e revogada a decisão recorrida.

6. O recorrido alinhou, por sua vez, nas suas contra-alegações, estas conclusões:
1 - Da análise feita da prova documental, junta pelo A. no início da audiência de julgamento, sob Docs. 1 e 2, resulta claro que a Recorrente efectuava transportes em regime de aluguer.
2 - Resultou ainda provado que as empresas detentoras de alvará, emitiam guias (CMR - documento que permite o veículo circular internacionalmente e que é apresentado aos agentes policiais quando solicitado), onde consta a matrícula do veículo e o nº. do alvará.
3 - E que a Recorrente necessitava do empréstimo do alvará por empresas detentoras do mesmo para a prática de transportes públicos internacionais.
4 - O alvará só poderia ser para o exercício dos transportes públicos.
5 - A Recorrente alega no ponto nº. 1 da matéria de facto, que os transportes que efectuava era o de mercadorias correlacionadas com o seu comércio, e não outras.
6 - Contudo, foi considerado provado, a utilização pela Recorrente do método do "encosto", pelo que é indubitável que esta efectuava o transporte público de mercadorias em regime de aluguer.
7 - Facto esse provado, não só pelo depoimento das testemunhas, mas também e conforme já referido, pelos documentos juntos aos autos, designadamente os documentos juntos pelo A. em audiência de julgamento sob Docs. nºs. 1 e 2.
8 - Se a Ré, só efectuasse, como pretende dizer, transporte de produtos exclusivamente seus, a questão do licenciamento para o transporte internacional, feito pela Ré mediante o aludido método do "encosto", nem tão pouco se colocava.
9 - A Douta Sentença só podia condenar a Recorrente a pagar ao Recorrido as quantias constantes da Douta sentença, por força da aplicação da CCT entre a ANTRAM e a FESTRU.
10 - Não existe qualquer violação, por parte da Decisão Recorrida dos preceitos legais, nem tão pouco qualquer erro de interpretação das normas jurídicas aplicáveis.
O recorrido pede, no termo das suas contra-alegações, a confirmação do acórdão recorrido.

7. Neste Supremo Tribunal, o Exmo. Procurador-Geral-Adjunto emitiu o douto parecer de folhas 271 a 273 dos autos, em que se pronuncia pela não concessão da revista.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
8. O acórdão recorrido deu como assente a seguinte matéria de facto:
1. A 1ª Ré é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, incluindo-se nesse comércio o transporte das mesmas e objectos correlacionados.
2. A 1ª Ré tem aquela actividade centrada em ..., Porto de Mós, onde tem a sua sede.
3. A 2ª Ré é uma empresa de transportes internacionais de mercadorias com a mesma referida sede em ..., Porto de Mós.
4. Os sócios da 1ª Ré e da 2ª Ré são os mesmos.
5. O Autor celebrou com a 1ª Ré um contrato de trabalho, exercendo ele a actividade de motorista de pesados, no serviço internacional.
6. O Autor trabalhou sob as ordens, direcção e fiscalização da 1ª Ré, como motorista, desde 1/3/94 até 31/01/1999.
7. Nessa altura a 1ª Ré dispunha ainda de outro motorista, também para o exercício da actividade de transporte.
8. A 1ª Ré comunicou aos seus motoristas que estes passariam a constar do mapa de pessoal da 2ª Ré, o que efectivamente veio a suceder desde 1/02/1999, sendo desde então a 2ª Ré quem procedeu aos descontos para a Segurança Social relativamente aos salários respectivos que pagava.
9. Com a passagem dos ditos motoristas para a 2ª Ré, a 1ª Ré garantiu-lhes, através de uma «circular», que os mesmos mantinham todos os seus direitos, designadamente quanto à categoria, salários e diuturnidades.
10. O Autor encontra-se filiado no Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro (STTRUC), o qual por sua vez, se encontra filiado na Federação dos Sindicatos dos Transportes Rodoviários e Urbanos (FESTRU).
11. No âmbito das suas funções ao serviço da 1ª Ré, o Autor efectuava transportes de mercadorias entre Portugal e diversos países da Europa (Holanda, Itália e Inglaterra), tal como os continuou a fazer ao serviço da 2ª Ré.
12. A realização desses transportes implicava para o Autor a deslocação frequente ao estrangeiro, onde permanecia durante vários dias seguidos por cada viagem.
13. Em 1994 a 1ª Ré pagava ao A. o salário mensal ilíquido de base de 80.000$00, mais o "subsídio de deslocação", que em Dezembro foi de 16.650$00.
14. Em 1995 a 1ª Ré pagava ao Autor o salário mensal ilíquido de base de 80.000$00, mais o "subsídio de deslocação", que em Dezembro foi de 13.365$00.
15. Em 1996 a 1ª Ré pagava ao Autor o salário mensal ilíquido de base de 80.000$00, mais o "subsídio de deslocação", que em Dezembro foi de 10.490$00.
16. Em 1997 a 1ª Ré pagava ao Autor o salário mensal ilíquido de base de 80.000$00 até Setembro inclusive e de 84.000$00 desde Outubro, mais o "subsídio de deslocação", que em Dezembro foi de 11.270$00.
17. Em 1998 a 1ª Ré pagava ao Autor o salário mensal ilíquido de base de 84.000$00, mais o "subsídio de deslocação", que em Dezembro foi de 14.215$00.
18. Nos meses de Janeiro a Maio/98, o "subsídio de deslocação" pago foi de 16.650$00 ilíquidos em cada um desses meses, em Junho/98 foi de 12.038$00, em Agosto/98 de 8.964$00, em Outubro/98 de 19.243$00 e em Novembro e Dezembro/98 foi de 21.200$00 cada mês.
19. A 2ª Ré não pagou ao Autor quaisquer quantias a título de "subsídio de deslocação".
20. Só em Outubro/98 começaram a ser pagas diuturnidades ao Autor, nesse mês 1.200$00, em Novembro e Dezembro/98 2.590$00 cada mês, em Janeiro/99 5.180$00.
21. Nenhuma das Rés pagou ao Autor quaisquer quantias de retribuição específica, referida à chamada «cláusula 74 nº. 7» ou com qualquer outra designação, até Setembro/98 inclusive.
22. Ao Autor foram pagas apenas as seguintes quantias como ajudas de custo, também chamadas «prémio TIR»: em Janeiro/98, com referência ao mês anterior, 15.881$00; a partir de Julho/99 inclusive 21.200$00 ao mês, designadas nos recibos como «ajudas de custo serviço internacional».
23. Os referidos "subsídios de deslocação" eram de montante inferior ao que resultaria do prémio TIR mensal porque só eram pagos pelos dias do mês em que o Autor estava deslocado no estrangeiro.
24. A partir da intervenção inspectiva da IGT na empresa, a 1ª ré começou a pagar ao Autor, a partir de Outubro/98, quantias que considerava em aplicação da chamada «cláusula 74 nº. 7» e que nos recibos designava por «hora extra 50%» e «hora extra 75%», sistema que se manteve na 2ª Ré a partir de Fevereiro/99.
25. Nestes termos, a 1ª ré pagou ao Autor:
- em Outubro/98: "hora extra 50%" 25.515$00, "hora extra 75%" 29.768$00;
- em cada um dos meses de Novembro, Dezembro/98 e Janeiro/99: "hora extra 50%" 24.280$00, "hora extra 75%" 28.327$00.
26. E nos mesmos termos, a 2ª Ré pagou ao Autor:
- em cada um dos meses de Julho a Dezembro/99 e Junho/2000: "hora extra 50%" 24.280$00, "hora extra 75%" 28.327$00;
- em Novembro/2000: "hora extra 50%" 48.560$00, "hora extra 75%" 56.654$00.
27. Em Dezembro/98, a 1ª Ré pagou ao Autor, do subsídio de Natal, apenas 98.200$00 ilíquidos.
28. Em Julho/99, a 2ª Ré pagou ao Autor, do subsídio de férias, apenas 98.200$00 ilíquidos e, em Junho/2000, do mesmo, apenas 98.200$00 ilíquidos.
29. Em Dezembro/99, a 2ª Ré pagou ao Autor, do subsídio de Natal, apenas 98.200$00 ilíquidos.
30. Em Novembro/2000, a 2ª Ré pagou ao Autor, do subsídio de Natal, apenas 98.200$00 ilíquidos.
31. Em 25/5/2001, o Autor enviou uma carta registada à 2ª Ré, através da qual lhe comunicou que punha termo ao contrato existente entre ambos, com efeitos a partir de 30/7/2001.
32. Assim, a partir de 30/7/2001 o Autor deixou de trabalhar por conta da 2ª Ré.
33. Ao Autor não foram pagas, de retribuição específica, as seguintes quantias:
- de Março a Dezembro/94, incluindo subsídios de férias e Natal: 44.182$00x11;
- de Janeiro a Dezembro/95, incluindo subsídios de férias e Natal: 44.182$00x14;
- de Janeiro a Dezembro/96, incluindo subsídios de férias e Natal: 53.340$00x14;
- de Janeiro a Dezembro/97, incluindo subsídios de férias e Natal: 56.640$00x14;
- de Janeiro a Setembro/98, incluindo subsídio de férias: 56.640$00x10;
- de 1999: férias e subsídios de férias e Natal: 56.640$00x 3;
- de 2000: férias e subsídios de férias e Natal: 56.640$00 x 3;
34. Em relação às ajudas de custo também designadas prémios TIR, não foram pagas ao Autor as seguintes quantias diferenciais relativamente a: - Março a Dezembro/94, incluindo subsídios de férias e Natal: 1.950$ x 12; - Janeiro a Dezembro/95, incluindo subsídios de férias e Natal: 1.950$x 14; - Janeiro a Dezembro/96, incluindo subsídios de férias e Natal: 3800$ x 14;
- Janeiro a Dezembro/97, incluindo subsídios de férias e Natal: 4.550$x 14;
- Janeiro a Setembro/98, incluindo subsídio de férias: 4.550$ x 10;
- 1999: férias e subsídios de férias e Natal: 21.200$ x 3;
- 2000: férias e subsídios de férias e Natal. 21.200$ x 3
35. A 1ª Ré não tinha alvará para o exercício da actividade de transporte.
36. A 2ª Ré reconheceu a antiguidade do Autor enquanto ao serviço da 1ª Ré.
37. A 2ª Ré possuía alvará para o exercício da sua actividade de transportes.
38. Enquanto os ditos motoristas se mantiveram ao serviço da 1ª Ré, esta utilizava o chamado método do "encosto".
39. Método usual, que consiste num empréstimo feito por empresas detentoras de alvará para transportes, a empresas que o não possuam.
40. A 2ª Ré assumiu a responsabilidade pelos créditos do Autor relativos a férias e subsídio de férias vencidas a 1/1/99 e o proporcional de subsídio de Natal.
41. A 1ª Ré pagou mensalmente ao Autor 16.650$00 de Março/1994 a Setembro/1998 como "subsídio de deslocação", designação que, para o Autor, equivale a "prémio TIR".

9. Como é sabido, o Supremo Tribunal de Justiça, quando funciona como tribunal de revista, aplica o regime jurídico que julga adequado aos factos fixados pelo tribunal recorrido (artigos 729º, nº. 1, do C.P.C. e 87º, nº. 2, do C.P.T.).
Será, pois, atendendo aos factos atrás aludidos que iremos decidir o recurso, cujo objecto - como decorre das conclusões do recorrente e do disposto nos artigos 684º, nº. 3, e 690º, nº. 1, do C.P.C. - se acha circunscrito a questão de saber se à relação laboral estabelecida entre a sociedade "Viveiros B, SA.", e o recorrido eram (ou não) aplicáveis os Contratos Colectivos de Trabalho celebrados entre a ANTRAM-Associação Nacional dos Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU-Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos e outros.
Essa relação laboral, como resulta dos factos apurados pelas instâncias, manteve-se desde 1 de Março de 1994 até 31 de Janeiro de 1999.
Durante esse período de tempo o recorrido exerceu, sob as ordens, direcção e fiscalização da recorrente, a actividade de motorista de pesados, no serviço internacional, efectuando transportes de mercadorias entre Portugal e diversos países da Europa (Holanda, Itália e Inglaterra).
Está filiado no Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Urbanos do Centro (STTRUC), o qual se encontra filiado na Federação dos Sindicatos dos Transportes Rodoviários e Urbanos (FESTRU).
Por sua vez, a recorrente é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, incluindo-se nesse comércio o transporte das mesmas e objectos correlacionados e tem actividade centrada em ..., Porto de Mós, onde também tem a sua sede.
Desconhece-se - por nada ter sido considerado provado a esse respeito nas instâncias - se é associada de alguma associação patronal, nomeadamente da ANTRAM.
Como é geralmente sabido - e como resulta do disposto nos artigos 7º e 8º do Decreto-Lei nº. 519-C1/79, de 29/12 - as convenções colectivas de trabalho apenas obrigam as entidades patronais que as subscrevem e as inscritas nas associações patronais signatárias, bem como os trabalhadores ao seu serviço que sejam membros, quer das associações celebrantes, quer das associações sindicais representadas pelas associações sindicais celebrantes.
Não estando demonstrado na acção que a recorrente era associada da ANTRAM, as convenções colectivas de trabalho (e suas alterações), que por esta foram subscritas e que se acham publicadas nos BTEs, 1ª Série, nºs. 25, de 8/7/92, 25, de 8/7/93, 24, de 29/6/94, 20, de 29/5/96 e 30, de 15/8/97, só poderão ter aplicação à relação laboral em causa por força de normas de Portarias de Extensão que tal determinem.
Para fundamentar a aplicação dos referidos CCTs foram invocadas pela recorrido, na sua petição inicial, as Portarias de Extensão publicadas nos BTEs nºs. 36, de 29/9/93, 30, de 15/8/94, 38, de 15/10/96 e 45, de 8/12/97.
Ora, no nº. 1 do artigo 1º da primeira dessas PEs determina-se isto:
"As disposições constantes dos CTT celebrados entre a ANTRAM-Associação Nacional dos Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e o SITRA-Sindicato dos Trabalhadores de Transportes Rodoviários e Afins e entre a mesma associação patronal e a FESTRU-Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos e outros, publicados, respectivamente, no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª Série, nºs. 23, de 22 de Junho de 1993, e 25, de 8 de Julho de 1993, são tornadas extensivas a todas as entidades patronais não inscritas na associação patronal signatária que no continente exerçam actividade económica por aquela abrangida e aos trabalhadores ao serviço das mesmas das profissões e categorias profissionais previstas filiados nas associações sindicais signatárias, bem como a todas as entidades patronais inscritas ou não na associação patronal signatária, que no continente exerçam a actividade económica por aquela abrangida e aos trabalhadores ao serviço das mesmas das profissões e categorias profissionais previstas não filiados nas associações sindicais signatárias."
No nº. 1 do artigo 1º da segunda dessas PEs - a de 1994 - determina-se:
"As disposições constantes dos CCT celebrados entre a ANTRAM-Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e o SITRA-Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Afins e outros e entre a FESTRU-Federação dos Sindicatos de Transportadores Rodoviários e Urbanos e outros, publicado no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº. 24, de 29 de Junho de 1994, são tornadas extensivas a todas as entidades patronais não inscritas na associação patronal signatária que no continente exerçam a actividade económica por aquela abrangida e aos trabalhadores ao serviço das mesmas das profissões e categorias profissionais previstas filiados nas associações sindicais signatárias, bem como a todas as entidades patronais inscritas ou não na associação patronal signatária que no continente exerçam a actividade económica por aquela abrangida e aos trabalhadores ao serviço das mesmas das profissões e categorias profissionais previstas não filiados nas associações sindicais signatárias."
No nº. 1 do artigo 1º da PE de 1996 estipula-se:
"As condições de trabalho constantes das alterações dos contratos colectivos de trabalho celebrados entre a ANTRAM-Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU-Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos e outros e entre a mesma associação patronal e o SITRA-Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Afins e outros, publicadas, respectivamente, no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nºs. 20 e 22, de 29 de Maio e 15 de Junho, ambos de 1996, são aplicáveis, no território do continente:
a) Às relações de trabalho entre entidades patronais não filiadas na associação patronal outorgante que exerçam a actividade económica abrangida pelas convenções e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nelas previstas;
b) As relações de trabalho entre entidades patronais filiadas na associação patronal outorgante e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas nas convenções não representados pelas associações sindicais signatárias."
Por fim, no nº 1 do artigo 1º da PE de 1997, estabelece-se:
"As condições de trabalho constantes das alterações do contrato colectivo de trabalho celebrado entre a ANTRAM-Associação Nacional de Transportadores Públicos Rodoviários de Mercadorias e a FESTRU-Federação dos Sindicatos de Transportes Rodoviários e Urbanos e outros, publicadas no Boletim do Trabalho e Emprego, 1ª série, nº. 30, de 15 de Agosto de 1997, são estendidas, no território do continente:
a) Às relações de trabalho entre entidades patronais não filiadas na associação patronal outorgante que exerçam a actividade económica abrangida pela convenção e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nelas previstas;
b) Às relações de trabalho entre entidades patronais filiadas na associação patronal outorgante e trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas na convenção não representados pelas associações sindicais outorgantes."
Vemos, assim, que o traço comum determinante da extensão dos Contratos Colectivos de Trabalho às empresas não associadas da ANTRAM é o exercício da mesma actividade económica.
E qual é, afinal, essa actividade económica ?
É, como o inculca a própria designação da associação patronal subscritora, o transporte público rodoviário de mercadorias.
Trata-se, no fundo, da actividade económica a que se refere a secção I, classe 6024, sub-classe 60240, do Anexo da Classificação das Actividades Económicas constante do Decreto-Lei nº. 182/93, de 14/5 (a actividade de transportes rodoviários de mercadorias).
Exercem essa actividade e são associadas da ANTRAM as empresas que prestam serviços de transportes rodoviários de mercadorias para terceiros, que lhes pagam os serviços prestados.
São as chamadas empresas de transportes, como tal conhecidas, ou empresas da indústria de transportes, para se usar a terminologia constante dos CCTVs (vide a cláusulas 1ª de cada um deles).
Ora, dos factos apurados, não resulta que a recorrente desenvolvesse essa actividade de transportes rodoviários públicos ao tempo em que o recorrido para ela trabalhou.
Sabe-se que a recorrente é uma sociedade anónima que se dedica à actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, incluindo-se nesse comércio o transporte das mesmas e objectos correlacionados.
Dedica-se, portanto, a uma actividade diferente da desenvolvida pelas associadas da ANTRAM.
Era no âmbito das suas funções de motorista, ao serviço da recorrente, que o Autor efectuava transportes de mercadorias entre Portugal e diversos países da Europa (Holanda, Itália e Inglaterra).
E, não estando demonstrado na acção que esses transportes fossem prestados a terceiros, terceiros esses que pagassem à recorrente os serviços prestados, não podemos ter por assente que ela, para além da actividade de cultura e comércio de plantas ornamentais de interiores e exteriores, na qual estava incluído o necessário transporte, também exercia a actividade de transporte rodoviário público de mercadorias.
Há no País muitas empresas que têm necessidade de efectuar o transporte de matérias-primas e de produtos acabados, por elas fabricados ou simplesmente comercializados, no desenvolvimento das suas actividades económicas.
É esse, por exemplo, o caso das empresas das indústrias alimentares, nomeadamente das que exploram a indústria de lacticínios.
Trata-se de organizações empresariais que, apesar de efectuarem transportes rodoviários de mercadorias, não se dedicam à indústria de transportes rodoviários de mercadorias.
Têm veículos pesados de carga, mas para uso delas mesmas e no seu exclusivo interesse.
É certo que se provou que a recorrente não tinha alvará para o exercício da actividade de transporte e que, enquanto o Autor e outro motorista se mantiveram ao seu serviço, utilizava o chamado método do "encosto", método esse usual, que consiste num empréstimo feito por empresas detentoras de alvará para transportes, a empresas que o não possuam.
Daí não pode, porém, a nosso ver, retirar-se a conclusão de que a recorrente exercia, em permanência e com continuidade (ou até esporadicamente) a actividade de transporte rodoviário público de mercadorias, pois que nenhuma prova se fez na acção acerca de quaisquer transportes remunerados que ela tenha realizado para terceiros.
Cabia ao Autor o ónus da alegação e prova dos factos comprovativos do exercício pela ora recorrente, durante o período de tempo em causa, da actividade de transporte rodoviário público de mercadorias e de que foi ocupado, como motorista, na prestação desses serviços, nos termos do artigo 342º, nº. 1, do Código Civil, por forma a demonstrar ter estado a sua relação laboral regulada pelas convenções colectivas de trabalho celebradas pela ANTRAM, por força das Portarias de Extensão por ele invocadas.
Não tendo essa prova sido feita, não pode este Supremo Tribunal extrair a conclusão de que as normas desses instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho se aplicam à relação laboral estabelecida entre as partes.
E, assim sendo - e como todo pedido do Autor formulado em relação à recorrente assentou numa aplicação de cláusulas dos mencionados CTTVs, que, portanto, constituíram a única fonte normativa dos direitos invocados - óbvio é que tem de improceder aquele pedido.
Deste modo, procedem as conclusões da recorrente.

10. Decisão:
Em face do exposto, concede-se a revista e, revogando-se o acórdão recorrido, absolve-se a Ré "Viveiros B, SA.", de todo o pedido contra ela formulado na acção pelo Autor A, pelo que fica sem efeito a sua condenação constante da parte I) do segmento final condenatório da sentença da 1ª instância alíneas a), b), c), d) e e), a qual subsistirá no respeitante à co-Ré.
Custas do recurso a cargo do recorrido.
As custas da acção serão suportadas pelo Autor e pela co-Ré "C, Lda.", na proporção do respectivo decaimento.

Lisboa, 1 de Outubro de 2003
Diniz Roldão
Fernandes Cadilha
Manuel Pereira