Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JSTJ000 | ||
Relator: | AZAMBUJA FONSECA | ||
Descritores: | TRABALHO RURAL LEI APLICÁVEL SANÇÃO DISCIPLINAR | ||
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Nº do Documento: | SJ200211060020884 | ||
Data do Acordão: | 11/06/2002 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Tribunal Recurso: | T REL LISBOA | ||
Processo no Tribunal Recurso: | 7934/01 | ||
Data: | 01/03/2002 | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | REVISTA. | ||
Decisão: | NEGADO PROVIMENTO. | ||
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Sumário : | I - À relação laboral de carácter agrícola entre o trabalhador - que presta o trabalho num prédio rústico, na lezíria de Vila Franca de Xira -, e a entidade patronal, é aplicável a PRT para a agricultura, publicada no BTE, 1ª Série, n.º 21, de 08-06-79. II - Face ao que dispõe a Base XXXVIII, n.º 3, desta PRT, é pela LCCT e LCT que se rege o despedimento do trabalhador. III - Mesmo que se entendesse que por força do disposto no n.º 2, da referida Base, tais leis não seriam aplicáveis na parte em que regulam o poder disciplinar, sempre as normas constantes do art.º 31, n.º1, da LCT, e art.º 9, n.º 1, da LCCT, seriam aplicáveis, dada a sua natureza absoluta e imperativa. IV - De outro modo existiria lacuna na lei que, nos termos do art.º 12, do CC, seria de integrar por recurso às disposições da LCCT e LCT. V - É, assim, de 60 dias o prazo de instauração do procedimento disciplinar - art.º 31, n.º 1, da LCT -, o conceito de justa causa de despedimento consta do art.º 9, n.º 1, da LCCT, e o despedimento do trabalhador apenas terá a natureza de sanção abusiva, se enquadrável no art.º 32, da LCT. VI - Uma sanção disciplinar só é abusiva quando ela se enquadra numa das quatro alíneas do n.º 1, do art.º 32, da LCT. VII - Para se poder qualificar uma sanção disciplinar como abusiva, é necessário que se prove, ou se presuma, uma relação directa de causa/efeito entre uma situação enquadrável numa das quatro alíneas referidas e a sanção aplicada. VIII - Sendo julgado lícito o despedimento do trabalhador, não pode tal sanção ter natureza abusiva. | ||
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Decisão Texto Integral: | Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: "AA", identificado nos autos, intentou, em 24.10.91, no Tribunal do Trabalho de Vila Franca de Xira, acção emergente de contrato individual de trabalho com processo ordinário, contra Sociedade Empresa-A, S.A., também nos autos identificada, alegando ter sido despedido pela Ré, sem justa causa, e através de processo disciplinar ferido de nulidade, constituindo a sanção aplicada uma sanção abusiva, tendo trabalhado como caseiro por conta da Ré, de 30.04.70 a 25.09.91 ( data do despedimento), após invocar e descrever os factos que teve por pertinentes para a procedência da acção, pediu a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de esc. 8.029.104$50 – referente a férias não gozadas, remuneração mínima especial, subsídio de capatazaria, diferenças salariais, falta de gozo do descanso semanal e de meio dia de descanso complementar, uma diuturnidade e indemnização de dois meses por cada ano ou fracção de antiguidade -, salários vincendos até à data da sentença, o valor de 11.000 Kg de trigo e juros moratórios à taxa legal. Mais pediu a concessão do benefício de apoio judiciário, na modalidade de total isenção do pagamento prévio de preparos e custas. Citada a Ré, contestou alegando, em síntese, ter despedido o A. na sequência de processo válido e com justa causa, não tendo este direito às quantias peticionadas, à excepção da respeitante às diuturnidades. E deduziu reconvenção, alegando que dos comportamentos do A. descritos na nota de culpa, por ter violado, grosseiramente, elementares deveres de diligência, lhe resultaram prejuízos no montante global de esc. 1.487.006$00, indemnização em que pediu a condenação do A. Ambas as Partes – na petição inicial e na contestação – pediram a condenação da Parte contrária como litigante de má-fé. O A. contestou o pedido reconvencional, alegando a sua ineptidão e impugnou os factos susceptíveis de integrarem os prejuízos alegados pela Ré. Saneada, instruída e julgada a causa, foi proferida a sentença de fls. 231 a 255 que, julgando a acção e a reconvenção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao A. a quantia global de esc. 2.549.886$00, a quantia correspondente a 5.000Kg de trigo da seara de trigo da Ré da colheita de 1991, a liquidar em execução de sentença e, ainda, nos juros moratórios legais e condenou o A. a pagar à ré a quantia de esc. 110.000$00. Anteriormente, pelo despacho de fls. 150vº-151, fora indeferido o pedido de apoio judiciário formulado pelo A. Inconformados, A e Ré, apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa, tendo o A., já na 2ª Instância, renovado o pedido de concessão de apoio judiciário – requerimento de fls. 340 a 343 – que lhe foi concedido, pelo despacho de fls.350 v. – 351 na pedida modalidade de dispensa de prévio pagamento de custas e preparos. Pelo Acórdão de fls. 355 a 367, o Venerando Tribunal da Relação anulou o julgamento da 1ª Instância para ampliação da matéria de facto. Realizado novo julgamento, com aditamento de cinco novos quesitos – acta de fls. 382 a 385 - foi prolatada a sentença de fls 391 a 410, que, julgando a acção e a reconvenção parcialmente procedente, condenou a Ré a pagar ao A. a quantia global de esc.4.189.480$00, a quantia correspondente a 5.000 Kg de trigo de seara de trigo da Ré, da colheita de 1991, a liquidar em execução de sentença, e juros de mora, à taxa anual de 15%, a contar da citação para as vencidas nessa data e para as vencidas posteriormente a contar da sentença ( de 18.11.94), até integral pagamento. Continuando inconformados, o A. e Ré apelaram para o Tribunal da Relação que, pelo Acórdão de fls. 597 a 606, decidiu “ voltar e anular o julgamento, para ampliação da matéria de facto relativa aos quesitos 77.º,78.º,79.º e 80.º, a fim de se poder dar uma solução completa à questão posta nos autos e a eles referente”. A Ré agravou para o Supremo Tribunal de Justiça que, pelo Acórdão de 26.2.97, a fls 633 a 636, negou provimento ao agravo. Regressados os autos à 1ª Instância, foi efectuado novo julgamento e dadas novas respostas aos quesitos 77.º, 78.º, 79.º e 80.º, após o que foi lavrada a sentença de 15.7.98, a fl.s 646 a 658 que decidiu: “ Nos termos expostos e nos mais de direito, julga-se a acção: a) improcedente por não provada quanto às quantias pedidas por violação do direito a férias – esc. 929 985$00 - ; por remuneração especial por trabalho sem observância dos limites ao período normal de trabalho diário – esc. 446 745$00 - ; por subsídio de capatazaria – esc. 118.000$00 ; por diferença entre a remuneração auferida pelo A. e a remuneração mais elevada de trabalhadores seus subordinados – esc. 254.967$70; por trabalho prestado em dias de descanso semanal – esc. 1.189.026$00 ; por trabalho prestado em dias de descanso complementar – esc. 594.513$80; por diferenças salariais, por diferenças salariais, por indemnização por despedimento na parte que excede a computada e absolvo a R. do pagamento daquelas remunerações; b) Julga-se a acção procedente por provada na parte restante e, assim, declara-se ilícito o despedimento do A. e condena-se a R. a pagar ao A. esc. 5.820.000$00 de remunerações vencidas desde o despedimento até à data da sentença; esc. 1.780.000$00 de indemnização de antiguidade; esc. 23.250$00 de retribuição relativa a 15,5 dias de salário descontado do seu vencimento; esc. 45.000$00 relativos a diuturnidades, o que perfaz a quantia de esc. 7.627.750$00. c) Condena-se ainda a R. a pagar ao A. a quantia correspondente a 5.000 Kg de seara de trigo da R. da colheita de 1991, a liquidar em execução de sentença; d) Condena-se a R. a pagar ao A. juros de mora a contar da citação para as vencidas nessa data e para as vencidas posteriormente a contar da sentença até integral pagamento, sendo a taxa de juro de 15% até 30.9.95 e de 10% daí em diante ( portaria 1171/95, de 25 de Setembro). Da reconvenção. Nos termos supracitados julga-se: a) improcedente por não provada a reconvenção quanto às quantias peticionadas de esc. 1.045.080$00, reportadas a prejuízos sofridos na seara de tomate; de esc 210.000$00, respeitantes a pretensos prejuízos pela não entrega de cevada na cooperativa do Vale do Sorraia e absolve-se o A. do pagamento daqueles montantes; b) Julga-se a reconvenção procedente por provada na parte restante e condena-se o A. a pagar à R. a quantia de esc. 110.000$00 por prejuízos causados pelo A. à R. com o levantamento de 156.500 ´pés de planta de tomate nas instalações da Empresa-B, ”. Inconformados, A e Ré, apelaram para o Tribunal da Relação de Lisboa. A Ré, pelo requerimento de fls. 723 e 724, veio requerer a rectificação da Sentença, com base em ter havido manifesto lapso da sentença que, tomando por base as anteriores sentenças proferidas nestes autos, reproduziu o nº 45 um facto que entretanto deixou de existir, por ter sido substituído por outro que tal sentença igualmente transcreveu, o nº 60 .Assim, nos termos do disposto no nº 1, do art.º 667.º do CPC, deve tal lapso ser corrigido, dando-se por não escrito o facto constante do nº 45 de sentença. A este pedido opôs-se o a. – a fls. 742 – por entender que não pode a Ré, depois de, em 19.11.98, ter alegado no recurso de apelação por ele interposto e não tendo recorrido da matéria de facto, vir, em 12.2.99, requerer a rectificação da sentença sobre matéria de que o A. recorreu, pelo que deve ser recusado o pedido da Ré, de acordo com o disposto no nº 2, do art. 667.º, do CPC. Por despacho de fls. 743 “ Nos termos expostos e nos do art. 667.º, nº 1 do Cód. Proc. Civil, corrige-se o lapso referido devendo considerar-se apenas a matéria constante do nº 60 da matéria provada e não escritos os factos constantes do nº 45 dessa parte da sentença”, não tendo este despacho sido objecto de oposição das Partes. Conhecendo das apelações, o Tribunal da Relação de Lisboa, por Acórdão de fls. 810 a 830, acordou: “ A ) em julgar parcialmente procedente a apelação da Ré, alterando a decisão recorrida apenas na parte em que esta se refere à declaração da inexistência da justa causa para despedimento do Autor e na condenação da Ré a pagar ao Autor a indemnização de 1.780.000$00 e a quantia de 5.820.000$00 de retribuições vencidas desde o despedimento até à data da sentença e respectivos juros, declarando-se, agora, a existência de justa causa para o despedimento do Autor e absolvendo-se a Ré do pagamento dessa indemnização e dessas retribuições e respectivos juros, mantendo-se, em tudo o mais, o decidido; B) em julgar improcedente a apelação do Autor” Inconformado, a fls. 833, recorre o A. para o Supremo Tribunal, de revista, com o fundamento de ter havido violação da lei substantiva por erro de interpretação e de aplicação, conforme se propõe provar nas alegações. Recebido o recurso como de revista, pelo despacho de fls 834, veio a fls. 837 a 857 juntar as suas alegações. Recebido o recurso como de revista, pelo despacho de fls. 834, veio, a fls. 837 a 857 juntar as suas alegações. Nela formulando as seguintes conclusões: “ I – As relações laborais de carácter agrícola estão excluídas do regime geral do contrato de trabalho ( Art.º1.º do Dec.-Lei 49.408 de 24.11.69). II – Por força do nº 2 da Base XXXVIII da Portaria para a agricultura publicado no BTE 1.º Série nº 21 de 08.06.87 o douto acórdão recorrido, entende que à relação laboral entre A e R. é aplicável o regime geral da cessação do contrato de trabalho ( Dec- Lei 64-A/89, de 27.02). III – Salvo o devido respeito o douto Tribunal a quo violou a lei e o direito porque exactamente o Art.º 1º, do referido Dec-Lei 64-A/89 dispõe que “ o presente regime aplica-se aos contratos não excluídos pelo Decreto-Lei nº 49.408, de 24/11/69 que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho”. IV – Em 15/10/86 foi publicado o BTE nº 38 1ª, Série com o CCT entre a Associação Agricultores do Ribatejo e outra e a federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas do Sul e Outros. V – Assim, com o devido respeito, não sendo aplicável a lei geral era aplicável às relações entre A. e R. o Contrato Colectivo de Trabalho. Até porque nos termos do artigo 59.º, do referido D.L.74-A/89, os CCT podem fixar os prazos do âmbito do processo disciplinar, e indemnizações devidas, aplicando-se aos CCT cuja revisão se operar após a data da publicação daquele diploma. VI - Acontece que o CCT em causa foi alvo de posteriores revisões a 1989, entre as quais a que foi depositada no Ministério do Emprego e Segurança Social em 27 de Fevereiro de 1991 e publicado no BTE nº 9 de 8 de Março de 1991. VII – Assim, sempre com o devido respeito, o exercício do procedimento disciplinar é regulado pelos Art.ºs 56.º, e seguintes, daquele CCT, no qual a cláusula 62.º, nº 1 dispõe que o poder disciplinar deve exercer-se nos 30 dias subsequentes àquele em que a entidade patronal ou superior hierárquico com competência disciplinar teve conhecimento da infracção, sob pena de caducidade, que o A. invocou na sua p.i.. VIII – Mesmo que se entenda que às relações laborais entre A. e R. se aplica a lei dos despedimentos, a justa causa de despedimento caracteriza-se por dois elementos essenciais: a existência de um comportamento culposo do trabalhador – consubstanciador de violação grave dos seus deveres profissionais e a imediata impossibilidade prática da subsistência do vínculo laboral com a entidade patronal determinada por tal comportamento. IX – O legislador prevê uma escala de sanções em que a sanção a aplicar deve ser proporcionada à gravidade da infracção e à culpabilidade do infractor e o vínculo laboral apenas se torna inviável quando nenhuma outra sanção é capaz de sanar a crise contratual aberta pelo comportamento do trabalhador. X – O nº 5 do Art.º 12.º, do Dec- Lei nº 64-A/89, de 27/2, dispõe que “ Para apreciação da justa causa deve o tribunal atender, no quadro da gestão da empresa, ao grau de lesão dos interesses da entidade empregadora, ao carácter das relações entre as partes ou entre o trabalhador e seus companheiros e às demais circunstâncias que no caso se mostrem relevantes”. XI – O despedimento foi efectuado com base na nota de culpa, porque a R. deu como provados todos os factos aí alegados e que o sustentavam. XII – Houve múltiplos factos imputados ao A., ora recorrente, que não foram provados e que na decisão proferida no processo disciplinar foram tidos como provados – e certamente como relevantes para a aplicação da sanção do despedimento que não resultaram provados na acção. XIII – Ressalta de toda a nota de culpa, e do douto acórdão recorrido, a exigência e imputação ao A, de atribuições e responsabilidades que pela descrição das suas funções não lhe cabiam efectuar e pelas quais não pode ser responsabilizado. XIV - É abundante a matéria de facto imputada ao A, na nota de culpa, a título de comportamento culposo que não resultou provada na acção. XV – Não se provou que o A, tivesse provocado constantes conflitos com outros trabalhadores da entidade empregadora. XVI – Provou-se que em 31 de Agosto de 1991 o A, agrediu com uma pedra o trabalhador da Ré BB, causando-lhe um hematoma.Ficou sem se saber em que contexto e por que motivos se verificou tal agressão, o que seria relevante para se avaliar da culpabilidade do trabalhador. XVII - Objectivamente considerada, tal conduta, ainda que devendo considerar-se de alguma gravidade, não é susceptível de justificar a aplicação da sanção máxima, isto é o despedimento. Não se descortina que pelo facto de o A, ter produzido uma agressão noutro trabalhador da empresa Ré, a relação de trabalho, que o ligava à Ré, se tivesse tornado inviável. XIX - Conforme se entendeu no douto acórdão do S.T.J. de 22.9.89 rel. Nº 2167, MJ, 1º./1 – 16 “ como a relação de trabalho tem vocação de perenidade, apenas se justifica o recurso à sanção expulsiva ou rescisória do contrato de trabalho, que o despedimento representa, quando se revelarem inadequadas para o caso as medidas conservatórias ou correctivas, à luz do princípio da proporcionalidade”. XX – Em fins de Agosto de 1991, quando o A, se dirigiu às instalações da Empresa-B , envolveu-se aí em desordem com um trabalhador desta empresa. A Ré acusou o A, de ter agredido aquele trabalhador, a murro, e de ter tentado agredi-lo com uma barra de ferro. Mas não fez prova destes factos. XXI – Provou-se apenas que, o A, se envolveu em desordem com um tal DD e que ambos se agarraram um ao outro, sendo separados por seareiros que se encontravam no local. Estes factos, que não tiveram lugar no âmbito da empresa Ré são de pouco valor para efeito de procedimento disciplinar, até por não se ter apurado se o A, actuou na intenção de agredir o seu contendor ou se, ao contrário para deste se defender. A conduta global do A, não foi gravada com esses factos. XXII – Referem-se outro factos em relação aos quais, o A, considera extinto por caducidade o procedimento disciplinar que a 1ª instância deu razão ao A, mas que no douto entender da 2ª instância, se não verifica. XXIII – Nesta parte resultou provado que o A, nos meses de Junho e Julho de 1991, destruiu cadeados e correntes de segurança, nas portas de água do Ramalhão, pertencentes à Associação de Beneficiários da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira. XXIV – Os cadeados e correntes de segurança aludidos não só não eram pertença da R. como também não se situavam na Herdade da R., sendo que não resultou provado o facto alegado pela R. de que tal conduta resultou risco de abastecimento de água para regra da Herdade do .... XXV – Não se vê, pois, que este comportamento do A, se deve considerar de grande gravidade, até porque os potenciais prejuízos não resultarem provados. XXVI – Com o devido respeito, ao contrário do que afirma o douto acórdão a conduta de retirar cadeados e correntes não era “ apta potencialmente a causar danos graves quer à Ré, quer às outras entidades que utilizavam aquela água para rega”. Retirando uma ilação não conforme de um facto dado como não provado. XXVII – E ao contrário do que a Ré afirma, a retirada dos cadeados e das correntes, era prática corrente na Lezíria por ser feita no interesse dos seareiros, um dos quais a Ré, para os beneficiar e não para os prejudicar. O comportamento do A, não é pois reprovável. XVIII - Sempre salvo o devido respeito, ao contrário do que referido no douto acórdão recorrido, os três factos relatados, vistos no seu conjunto, dado que apenas um se passou no âmbito da empresa Ré e os dois restantes fora desse âmbito, em factos que só ao A. dizem respeito e que não ficou provado que tivessem causado prejuízos à Ré, não constituem comportamento susceptível de integrar o conceito de justa causa. XIX - De gravidade relevante também não se pode considerar o facto de o A, ter utilizado dois motores de rega, pertença da R. para regar uma seara que explorava fora da propriedade do ... e de ter utilizado a camioneta e o reboque da R. para transporte de pessoal e de tomate da exploração do A, XXX - É que não ficou provado que destes factos tivesse resultado prejuízo para a Ré, tendo sido provado, ( facto n.º 22.º) que também a Ré utilizava um reboque propriedade do que estava carregado de cevada pertença da Ré. XXXI - Facto que contraria a afirmação do douto acórdão de que apenas se provou a utilização indevida de bens pertencentes à entidade patronal. Pelo que a utilização dos motores nada tem de reprovável tal como não tem a utilização do reboque feita pela Ré. XXXII - O douto acórdão recorrido, reconhece que a fraca produção da seara de tomate da Ré, não tem relevância negativa para o A, reconhecendo também não ser imputável ao A, o atraso da reparação da camioneta. XXXIII - Mas, salvo o devido respeito, não retira daí as devidas ilações, pois tais factos, especialmente o da fraca produção da seara, era na nota de culpa e nas doutas alegações da R. o principal facto contra o A, dado o elevado prejuízo que reclamava, e que suportou o despedimento do Autor. XXXIV - É absolutamente nítida a intenção da R. em pretender culpar o A, dos resultados da gestão a qual era da responsabilidade do Administrador da Ré que ali se deslocava com assiduidade nos últimos dois anos ( factos nºs 48.ºe 51.º) XXXV - Salvo o devido respeito, o douto acórdão recorrido ao considerar que o A, “ tinha um cargo de grande responsabilidade” e que as suas funções “eram de grande responsabilidade” não tem em conta o conteúdo da categoria efectiva do A, - Caseiro de Nível B – expressa na descrição de funções do CCT, anexos I, II e IV, que com a devida vénia se transcreve: “ É o trabalhador que, habitualmente em casa situada numa determinada propriedade ou exploração, tem a seu cargo vigiar e zelar por ela, executando, quando indispensável, trabalhos necessários à produção de produtos agrícolas e hortícolas. Pode dirigir ou contratar, de acordo com as instruções da entidade patronal, trabalhadores contratados com carácter eventual apenas para satisfazer necessidades de sementeira e colheita”. XXXVI - Desta definição de funções facilmente se alcança que a Ré, obrigava o A, a executar tarefas que excediam a sua função e categoria pelo que nenhuma responsabilidade lhe pode ser exigida por factos que não era obrigado a praticar e que constam da nota de culpa. XXXVII - Na tabela de VII graus do CCT a categoria profissional do A, figura no grau IV. Figurando no Grau I as funções de encarregado geral ou feitor, funções essas que condizem com a responsabilidade que a Ré, quer imputar ao A, mas que não eram as do A., XXXVIII - Não cabiam nas funções do A, efectuar transportes dos produtos produzidos pela Ré – ser o tractorista – o que esta lhe exigia, chegando ao ponto de referir nos recibos de ordenado que o A, tinha a profissão de Operador de Máquinas Agrícolas, o que o A, não aceitava e reclamava, pois competia-lhe apenas nesse aspecto, contratar os transportes pelo que dependia da disponibilidade de terceiros a rapidez com que os mesmos eram feitos. Foi o caso das entregas do tomate e da cevada. XXXIX - A cevada da Ré, depois de colhida, foi colocada a granel num reboque propriedade do A, que o douto acórdão não refere ( facto n.º 22.º), por não haver outro disponível. A cevada que estava a granel teve que ser ensacada para poder ser transportada, além que o A, procurou, sem êxito contratar um transportador. Na falta deste e a pedido da Ré, fez o favor de ser o tractorista para fazer a entrega da cevada na Cooperativa. Não tenso sido recebida pela Cooperativa a cevada foi enviada à Casa Agrícola da Quinta da Foz. XXXX - Uma vez mais e sempre com o devido respeito, ao contrário do que refere o douto acórdão recorrido, não houve falta grave dos deveres do A, ele não era obrigado a efectuar o transporte da cevada. Se o fez, depois de não conseguir que outros o fizessem, deveria ser agradecido e não culpado de falta de deveres. XXXXI -Também nesta matéria não ficou provado que a Ré tivesse dado ao A, a aludida ordem e muito menos que tivesse tido lugar em meados de Julho e que depois fosse repetida. Nem resultou provado que tivesse prejuízo para a Ré. XXXXII - Já se referiu que as funções do A, o não obrigavam a ser o tractorista da Ré, pelo que a referência a estar impedido de entrar nas instalações da Empresa-B , tem em vista apenas imputar-lhe uma responsabilidade que efectivamente não tinha. XXXXIII - O A, cumpriu a sua obrigação para com a R. ao entregar a terceiro o transporte do tomate para a Empresa-B . Já não pode ser responsabilizado pelo facto de o transportador não querer esperar pela descarga do produto. Colocada perante essa circunstância anormal, o A, tomou a medida mais “ expedita” que estava ao seu alcance para resolver a situação, que foi, na ausência do Administrador, telefonar ao filho deste, primo do Gerente da Empresa-B , informando do sucedido e sugerindo-lhe para contactar este com vista a que o reboque fosse conduzido para a fábrica, pois estava à porta desta. XXXXIV - Se a descarga foi feita apenas 4 dias depois, não pode ser acusado o A, de negligência censurável. Salvo o devido respeito, não tem razão o douto acórdão, pois aquela obrigação não era inerente ao cargo do A,. A ideia que teve, foi certamente mais expedita que procurar contratar outro transportador. Nenhuma razão existia, pois, para a Ré actuar disciplinarmente contra o A, que constitui mais um facto da nota de culpa não provado. XXXXV- O cheque bancário entregue pela Ré ao A, para o entregar a um fornecedor de combustível, é mais um dos factos que provam que aquela lhe imputava obrigações não contidas na sua categoria, onde não lhe era exigível tal trabalho administrativo. XXXXVI - A Ré tinha conhecimento pelo próprio A, que este não se relacionava com o Sr. CC e podia ter enviado o cheque por qualquer outro meio, como certamente fez para outros credores. Mas como a sua intenção era humilhar o A, manteve a ordem, mesmo sabendo que ela excedia as obrigações profissionais deste. XXXXVII- Pelas funções que ao A, competia desempenhar, não se pode deixar de concluir que a Ré terá incorrido em exagero ao procurar fazer recair sobre o aquele, toda a responsabilidade pelo mau resultado da produção de tomate, pela não entrega em tempo oportuno da cevada, do tomate e do cheque para pagamento de combustíveis e ainda pela reparação de uma camioneta. XXXXVIII - O A, não geria a exploração; não possuía a categoria de Feitor. Actuava de acordo com instruções recebidas do administrador da Ré e estas teriam de conter-se dentro das exigíveis à categoria reconhecida ao A., XXXXIX - Sempre com o devido respeito, ao contrário do decidido no douto acórdão recorrido, os factos que resultaram provados na acção não integram um comportamento culposo que, pela sua gravidade e consequências, tenham tornado praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. L - Ao decidir como decidiu o douto acórdão recorrido violou o disposto no Decreto- Lei nº 64-A/89, de 27/2 nomeadamente o disposto nos art.ºs 12.º, nº 1 alínea c) e 13.º, nº 1 alínea a) e nº 3 da Lei dos despedimentos, por ter declarado lícito o despedimento do A, por existência de justa causa, contrariando o doutamente decidido nas três sentenças da 1ª Instância. LI - O A, foi admitido ao serviço da Ré, quando tinha 33 anos de idade e foi despedido com 54 anos, trabalhou 21 anos de serviço activo durante os quais nunca mereceu da Ré qualquer censura ou acção disciplinar, facto que não foi tido em consideração pelo douto acórdão recorrido. LII - Entre a matéria considerada provada ( factos 1.º, 2.º, 3.º, 4.º, 5.º,6.º, 7.º, 8.º, 55,º e 56.º) existe prova de a Ré haver cometido uma sanção abusiva ao despedir o A., violando a Cláusula 59.ºdo CCT alínea d) de modo inequívoco por ter existido violação dos direitos e garantias que ao A, assistem, pelo que foram mal interpretadas tais factos provados, e assim deverá ser considerado abusivo o seu despedimento e nessa medida ser-lhe devida as quantias contratualmente fixadas, ao contrário do decidido pelo douto acórdão”. Pelo que pede a revogação do Acórdão recorrido e a confirmação da sentença da 1ª Instância. A ré contra- alegou a fls 859 a 872 – aí concluído, em síntese, pela aplicação, ao caso vertente, apenas da PRT publicada no BTE, 1ª S, nº 21, de 8.6.79, dado que, à data dos factos e do processo disciplinar movido ao A., inexistia P.E. que aplicasse ao concelho de Vila Franca de Xira, o CCT celebrado entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outra e a Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas do Sul e outros, publicado na BTE, 1ª S. nº 18, de 15.10.86, que não é directamente aplicável, por não resultar dos autos qualquer filiação sindical do A. ou inscrição da Ré em associação patronal. No mais, conclui pela manutenção do decidido no Acórdão recorrido. O Ex. mo Procurador-Geral Adjunto emitiu o Parecer de fls. 877 a 879, no sentido da concessão da revista. Notificado às Partes, respondeu a Ré, a fls. 881 a 883, pronunciando-se tal como nas contra-alegações, pelo improvimento da revista. Foram colhidos os vistos. É a seguinte a matéria de facto dada por provada no Acórdão recorrido, o mesmo que o havia sido na 1ª Instância: 1 - O A foi admitido para prestar serviço na herdade do ... em 30 de Abril de 1970. 2 - Pelo menos em 1982 passou a exercer as funções de caseiro, habitando, com a sua família, na propriedade, e, além de cuidar e vigiar, dirigindo a execução dos trabalhos de exploração, comprando sementes, adubos e plantas, contratando máquinas agrícolas e transportes, o A. contratava e dispensava pessoal admitido com carácter de eventual, conforme instruções da administração da R. 3 - Ultimamente, o A. auferia o vencimento mensal de esc. 60 000$00 4 - Fazia parte do contrato de trabalho do A. receber o equivalente a 2 ha na seara de trigo da sociedade R. 5 - E autorização para criar animais nas pastagens da sociedade R. 6 - A sociedade R. foi constituída em Março de 1987, passando a ser dona da Herdade do ... e entidade patronal do A; 7 - Em Setembro ou Outubro de 1990 a R. comunicou ao A. que no ano agrícola que se iria iniciar ele não poderia explorar directamente os 2 ha da propriedade conforme vinha fazendo. 8 – E ordenou-lhe que reduzisse o número de cabeças de gado que mantinha na propriedade. 9 - No dia 31 de Agosto de 1991 o A. agrediu com uma pedra o trabalhador da R. BB, provocando-lhe um hematoma no joelho direito. 10 - Em consequência disso o aludido trabalhador e mulher comunicaram ao administrador da R. que não poderiam continuar a trabalhar para esta. 11 - Em fins de Agosto de 1991 o A. deslocou-se em serviço às instalações da Empresa-B - Empresa de Concentrados do Ribatejo, S.A. e após uma troca de palavras com um empregado daquela empresa DD, envolveu-se em desordem com este, agarrando-se um ao outro e sendo, de seguida, separados por seareiros presentes no local. 12 - O A., nos meses de Junho e de Julho de 1991, destruiu cadeados e correntes de segurança nas portas do Ramalhão, pertencentes à Associação de Beneficiários da Lezíria Grande de Vila Franca de Xira. 13 - Estas portas de água encontravam-se situadas à entrada de uma vala de água – que parte do Tejo e atravessa a herdade do ..., conduzindo água para esta e outras propriedades, existentes ao longo dessa vala -, mas já entre terrenos da dita Herdade do ..., conduzindo água para esta e outras propriedades, existentes ao longo dessa vala -, mas já entre terrenos da dita Herdade do .... 14 - Em fases de rega e colheita de tomate o A. utilizou dois motores de rega, pertença da R., para regar uma seara de 4 hectares de tomate, que explorava directamente fora da propriedade do .... 15 - Bem como a camioneta e o reboque da R para transporte de pessoal para mão-de-obra na sua exploração e transporte do seu tomate. 16 - Na seara de tomate da R., de 1,5 ha, foram colhidas apenas cerca de 15 toneladas, a qual, normalmente, deveria ter produzido cerca de 75 toneladas. 17 - Em 11 de Setembro de 1991 foi verificado pelo Sr. Eng.º EE que a camioneta da R., com a matrícula EJ, se encontrava parada há vários dias, com o motor avariado e parte da caixa de madeira partida. 18 - Em data anterior a 11-9-91, o A. deslocou-se a Vila Franca de Xira, à oficina do Sr. FF, solicitando a reparação da camioneta da R., com a matrícula EJ. 19 - A R. tomou conhecimento de que entre 24 de Abril e 25 de Junho de 1991, o A levantou na Empresa-B 156.500 pés de tomate. 20 - Sendo a seara de tomate da R. de apenas 1,5 ha, a sua plantação e retancha nunca deveriam demorar mais de um mês a concluir. 21 - E normalmente não levariam mais de 60.000 pés na plantação e 10.000 na retancha. 22 - Após a ceifa da cevada produzida na propriedade do ..., em meados de Julho de 1991, foi esta colocada num reboque do A ., com vista a ser entregue na Cooperativa Transformadora dos Produtos Agrícolas do ..., CRL., 23 - O A. apenas em 4 de Setembro tentou fazer a entrega da cevada. 24 - Todavia, ao chegar à referida Cooperativa nesta data, foi-lhe dito que o prazo para entrega da cevada já tinha terminado, pelo que não a podia deixar lá. 25 - A cevada era de cerca de 5000 Kg. e valia cerca de esc. 210.000$00. 26 - O A., estando impedido de entrar nas instalações da Empresa-B , contratou um tractorista para levar o reboque com o tomate da R. às instalações daquela empresa no dia 6 de Setembro de 1991. 27 - Aquele tractorista limitou-se a levar o reboque até à estrada de acesso à Empresa-B , onde o deixou à beira da estrada, sem que o A. tomasse medidas imediatas para descarregamento do tomate. 28 - O mesmo tractorista avisou telefonicamente o A, à noite, de que não voltaria à Empresa-B , devido ao imenso tempo que perdia e deixou o reboque carregado em fila de espera. 29 - Desta situação deu o A. imediato conhecimento pelo telefone ao filho do administrador, GG, a quem, forneceu também a matrícula do reboque para fins de a mandar recolher. 30 - Mais sugeriu ao A que o Sr. GG pedisse ao Eng.º HH, seu primo e gerente da Empresa-B , que retirasse o reboque para a fábrica. 31 - Apenas 4 dias depois, no dia 10 de Setembro, foi o tomate descarregado. 32 - Estando já podre e completamente inutilizado, pelo que a Empresa-B não o comprou. 33 - O que provocou um prejuízo para a R. de esc. 121.926$00. 34 - Para pagamento de combustíveis que comprou ao Sr. CC, a R. entregou ao A., em 26-7-91, um cheque bancário, ordenando-lhe que o fosse entregar ao referido credor no próprio dia. 35 - No dia 22 de Agosto seguinte, a R teve conhecimento de que o referido cheque ainda não havia sido entregue ao CC. 36 - Em 31-8-91, o A. telefonou ao administrador da R. e comunicou-lhe que o Sr. BB e a sua mulher também contratada pela R., não queriam trabalhar mais para esta e se iam embora, pelo que o referido trabalhador deveria ir à propriedade fazer contas com eles. 37 - Quando lá se deslocou para o efeito, foi-lhe comunicado pelo Sr. BB que efectivamente não podia continuar a trabalhar para a R. sob a autoridade do A., que constantemente o insultava, bem como à mulher, tendo chegado a agredi-lo fisicamente com uma pedra, provocando-lhe um forte hematoma no joelho direito. 38 - A produção normal de tomate plantado na Herdade do ..., por seareiros a quem foram arrendadas partes da propriedade rondou os 50.000 Kg./ha em 1991. 39 - O preço pago pela Empresa-B por cada Kg. de tomate foi de esc. 17$418 em 1991. 40 - As terras do ... estão expostas à contaminação de produtos químicos expelidos pela Central Termo-Eléctrica do Carregado, o que, em alguns casos, tem afectado a produção das searas. 41 - A R. recebeu, pelo menos, uma indemnização relativa a uma seara de girassol 42 - Para a sua seara de cerca de 4 ha, o A. levantou, na Empresa-B , 20.000 pés de planta e, na Empresa-C, S.A. 51.000 pés. 43 - O A., ao levantar na Empresa-B 156.000 pés de planta de tomate, causou à R. um prejuízo de esc. 110 000$00. 44 - No ano de 1991 foram produzidos cerca de 2.500 Kg – de trigo por hectare na Herdade do .... 45 - ( eliminado, por despacho rectificativo de fls. 743). 46 - No mês de Setembro de 1990 o A. acidentou-se ao serviço da R. e, em consequência, esta retirou-lhe do salário a quantia de 23.250$00, referente a 15,5 dias. 47 - O A. é credor da R. da quantia de esc. 4.500$00, relativos a diuturnidades vencidas a partir de Janeiro de 1991. 48 - A pessoa responsável pela gestão da exploração da R era o administrador Eng. EE. 49 - Até 2 anos antes de 1991, o administrador da R. apenas ao fim de semana se deslocava à Herdade do ... 50 - Para fazer contas, como contratar e despedir pessoal, dar orientações e práticas culturais, designadamente quando adubar, colher, etc. 51 - E, desde então, passou a deslocar-se à propriedade com maior frequência, todos os fins de semana e até em dias de semana. 52 - No dia 14 de Setembro de 1991, o administrador da R. tentou entregar pessoalmente ao A. a nota de culpa elaborada no respectivo processo disciplinar, acompanhada da carta, na qual a R. exprimia a sua intenção de proceder ao despedimento do A .. 53 - O A. recusou-se a receber a nota de culpa e aquela carta. 54 - Carta e nota de culpa que, com conhecimento do A, lhe foram deixadas na sua própria casa, na Herdade do .... 55 - No mesmo mês de Setembro de 1991 o administrador da R. chamou o A. ao escritório da exploração e, a troco da quantia de esc. 500.000$00, pretendeu que ele aceitasse a cessação do contrato por mútuo acordo. 56 - Ainda em Setembro, o Eng.º EE chamou mais uma vez o A. ao escritório e fez nova tentativa de acordo, na qual só lhe propunha pagar a quantia de esc. 300.000$00 . 57 - No dia 25 de Setembro de 1991 o mesmo administrador da R. chamou o A. ao escritório e dizendo-lhe que estava despedido e entregou-lhe o recibo referente àquele mês, bem como um cheque no valor de esc. 182.863$00. 58 - Só lhe fazendo entrega do cheque contra o recebimento da carta de despedimento junta a fls. 17. 59 - Os trabalhadores da R. faziam 8 horas por dia, de 2ª feira a 6ª feira e ao sábado trabalhavam 4 horas pela manhã, gozando a tarde de sábado como descanso complementar e o domingo como descanso semanal. 60 – A R. emitia cheques para pagamento de salários ao A., variando o valor e a quantidade dos cheques mensalmente, não sendo possível apurar, concretamente, se o valor dos cheques era inferior ao declarado nos recibos, constando destes a declaração do A. de que recebia a quantia relativa ao ordenado ou salário do respectivo mês. A primeira decisão a tomar é quanto ao IRCT regulador da relação contratual laboral entre as Partes. A PRT para a agricultura, publicada no BTE, 1ª S., nº 21, de 8.6.79, a pág.s 1538 e seg.s ou o CCT celebrado entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outra e a Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas do Sul e outros, publicado no BTE, 1ª S, nº 38, de 15.10.86, a pág.s 2302 e seg.s ? Do douto Acórdão recorrido consta, a fls.821 – “ Previamente importa referir que está já adquirido no processo que apesar da relação laboral entre o A. e Ré ser de carácter agrícola e este tipo de contrato estar excluído do regime geral do contrato de trabalho ( art. 1º do Dec - Lei 49.408 de 24.11.69) é-lhe aplicável o regime geral da cessação do contrato de trabalho ( Dec – Lei 64-A/89 de 27.02) por força do nº 2 da Base XXXVIII da Portaria para a Agricultura publicada no BTE 1ª Série, nº 21, de 08.06.87”. Porém, com o respeito devido por este entendimento, não se considera que tal “ está já adquirido no processo”. Porque, nos termos do art. 664.º, do CPC, “ o juiz não está sujeito às alegações das partes no tocante à indagação, interpretação e aplicação das regras de direito …”. E tal entendimento nunca poderia resultar do que sobre direito aplicável consta da sentença então apelada, sendo facto que dela, a fls. 651, consta que “ o contrato de trabalho rural rege-se pela P.R.T. para a agricultura, publicado no BTE, 1ª Série, nº 21, de 08.06.87 [ por lapso de escrita, em vez de 8-6-79]” e que “ A relação laboral das partes na acção era ainda regulada pelo C.C.T. entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outro e a Federação dos Sindicatos Agrícolas do Sul e outros”, o que demonstra – embora sendo irrelevante, como já dito – que a sentença não considerou unicamente aplicável a PRT/79, mas também o CCT/86. Definição de direito aplicável só poderia existir se o S.T.J. , nos termos do art. 730.º, nº 1, do CPC, já houvesse definido, por decisão transitada em julgado, o direito aplicável, o que não ocorreu nos presentes autos. Por isso, nos termos do art. 729.º, nº 1, do CPC, há que, aos factos materiais fixados pelo tribunal recorrido, aplicar definitivamente o regime jurídico que se julgue adequado. Sem que, para tal, seja relevante o entendimento das Partes, sempre se refere que o A/ Recorrente entende aplicável o CCT/86 – vejam-se as transcritas conclusões I a VII, XXXV e XXXVII das suas alegações e a Ré/ Recorrida entende ser apenas a PRT/79, das conclusões das suas alegações constando, a fls 870, vº: “ 4.1 À data dos factos e do processo disciplinar em causa nestes autos, não existia Portaria de Extensão aplicável ao concelho de Vila Franca de Xira relativa ao CCT celebrado entre a Associação dos Agricultores do Ribatejo e outra e a Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores Agrícolas do Sul e outros, publicado no B.T.E., 1ª Série, nº 38, de 15.10.1986, pelo que este CCT não era aplicável na relação entre as partes. 4.2 Por força da remissão constante da PRT para a agricultura, publicado no B.T.E. , 1ª Série, nº 21, de 8.6.79, à cessação do contrato de trabalho existente entre a Recorrida e o Recorrente era aplicável o regime jurídico aprovado pelo Dec. – Lei nº 64-A/89, de 27 de Fevereiro.” Vejamos: Dispõe o art. 7.º, do D.L.519- C1/79, de 29.12: “ 1 - As convenções colectivas de trabalho obrigam as entidades patronais que as subscreverem e as inscritas nas associações patronais signatárias, bem como os trabalhadores ao serviço que sejam membros quer das associações celebrantes, quer das associações sindicais representadas pelas associações sindicais celebrantes. 2. As convenções outorgadas pelas uniões, federações e confederações obrigam as entidades patronais empregadoras e os trabalhadores inscritos, respectivamente, nas associações patronais e nos sindicatos representados nos termos dos estatutos daquelas organizações, quando outorguem em nome próprio ou em conformidade com os mandatos a que se refere o art.º 4.º”. Dos autos nada consta quanto a filiação sindical do A. nem quanto a inscrição da Ré em associação patronal que, nos termos do transcrito art.7.º, lhe torna aplicável o CCT/86, pelo que este IRCT só pode regulamentar a relação laboral em causa se existia Portaria de Extensão que a abranja, nos termos do art. 27.º, do D.L. 519- C1/79. A P.E. existente, publicada no BTE, 1ª S. nº 48, de 29.12.86, estende a aplicada do CCT/86: “ a) Às relações de trabalho estabelecidas entre todas as entidades patronais não inscritas nas associações outorgantes que, na área de aplicação da convenção, exerçam a actividade económica por aquela abrangida e aos trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais previstas e às relações de trabalho tituladas por trabalhadores das mesmas profissões e categorias profissionais não filiados nos sindicatos signatários ou representados pelas federações outorgantes e entidades patronais inscritas nas associações patronais celebrantes; b) Às relações de trabalho entre todas as entidades patronais que nos distritos de Leiria e de Lisboa, com excepção dos concelhos de Azambuja e Vila Franca de Xira, exerçam a actividade económica abrangida pela mencionada convenção colectiva de trabalho e os trabalhadores ao seu serviço das profissões e categorias profissionais nela previstos”. Dado que quanto à área da sua aplicação, o CCT/96 dispõe, na sua cl.ª 1.ª que “ O presente CCT aplica-se no distrito de Santarém e, no distrito de Lisboa, ao concelho de Azambuja” e situando-se o prémio rústico onde o A. prestava trabalho, na Lezíria de Vila Franca de Xira, há que concluir pela inaplicabilidade do CCT/86 mas antes da PRT/79. E, dispondo a Base XXXVII, nº 2, desta PRT, que “ O regime de cessação do contrato de trabalho regula-se pela lei geral com as adaptações constantes do número seguinte” é pelo Regime Jurídico da Cessação do Contrato Individual de Trabalho ( L. Desp), aprovado pelo D.L.64- A/89, de 27.2 e pelo Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho ( L.C.I.T.), aprovado pelo D.L. 49408, de 24.11.69, que se rege o despedimento do A., dado que a adaptação constante do nº 3, da citada Base XXXVIII, não tem aplicação no caso concreto. A entender-se que a L. Desp. e a LCIT, na parte em que regulam o exercício do poder disciplinar, não seriam aplicáveis por força do disposto no transcrito nº 2, da Base XXXVIII, sempre as normas constantes, pelo menos do art. 31.º, nº 1, da LCIT, e do art. 9.º, nº 1, da L. Desp. seriam aplicáveis, dada a sua natureza absoluta e imperativa. De outro modo existiria lacuna da lei que, nos termos do art. 12.º, do C.Civil, seria de interpor recurso às disposições da L. Desp. E da LCIT. É, assim, de sessenta dias o prazo de instauração de procedimento disciplinar – art. 31.º, nº 1, da LCIT -, o conceito de justa causa de despedimento consta do art. 9.º, nº 1, da L.Desp. e o despedimento do A. apenas terá a natureza de sanção abusiva, o enquadrável no disposto no art.32.º, da LCIT. Relativamente ao prazo de caducidade do procedimento disciplinar, questão que o Recorrente aflora sem referir os factos cujo procedimento estaria já caduco aquando da instauração do processo disciplinar – ver conclusão VII das alegações de revista -, no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 23.6.94, que transitou em julgado, a fls. 363, ficou decidido que, na aplicação à relação de trabalho entre A. e Ré do CCT/86, o disposto na sua cl.ª 62, nº 1, quanto ao prazo de exercício do poder disciplinar ( 30 dias) não se podia sobrepor ao prazo de 60 dias estabelecido, absoluta e imperativamente, no nº 1, do art.31.º, da LCIT, pelo que “ São, por isso, susceptíveis de valoração, para apreciar a justa causa de despedimento, os factos referidos nas respostas aos quesitos nono, décimo terceiro, décimo quarto e vigésimo primeiro, que a seu tempo transcrevemos”. Quanto à existência de justa causa de despedimento, pese embora o constante das inteligentes alegações de revista do A., douta e proficientemente, analisou o Acórdão recorrido a matéria fáctica provada e dela fez correcto enquadramento jurídico, pelo que, na concordância com o aí considerado e devido, para ele se remeter, nos termos dos art.ºs 713.º, nº 5, e 726.º, ambos do CPC. Para além da existência de justa causa de despedimento, suscita o A/Recorrente a questão da natureza abusiva de sanção que lhe foi aplicada, o despedimento. Desde logo, tendo julgado lícito o despedimento daqui decorre que tal sanção não pode ter natureza abusiva. E, uma sanção disciplinar só é abusiva quando ela é motivada por factos que se enquadrem nas quatro alíneas, melhor, numa das quatro alíneas do nº 1, do art. 32.º, da LCIT, que, inclusivamente, dispõe igualmente ao constante da cl.ª 59.ª, do CCT/86, já declarado inaplicável. Para se poder qualificar uma sanção disciplinar como abusiva é necessário que se prove, ou se presuma, uma relação directa de causa/efeito entre uma situação enquadrável numa das quatro referidas alíneas e a sanção aplicada. Contam Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, pág. 756, a abusividade da sanção implica a conjugação de dois elementos: um objectivo, consistente no facto de, a uma determinada actuação do trabalhador em defesa dos seus direitos se seguir um procedimento disciplinar; e um subjectivo, consistente em, com o procedimento disciplinar, a entidade patronal visar responder ao exercício, pelo trabalhador, das suas posições. O que significa, atentos os factos provados que mesmo que ilícito fosse a sanção aplicada, não havia prova da existência destes dois elementos, não funcionando aqui a presunção do nº 2, do art. 32.º, da LCIT, pelo que a sanção aplicada nunca poderia ser considerada abusiva. Improcede, assim, a revista do A, pelo que, decidindo, se lhe nega provimento e, consequentemente, se confirma o Acórdão recorrido. Custas pelo A., sem prejuízo do apoio judiciário concedido. Lisboa, 6 de Novembro de 2002 Azambuja Fonseca Diniz Nunes Mário Torres |